EDIÇÃO 016

ABRIL/21

NESTA EDIÇÃO:
CIDADE INVISÍVEL
FOLCLORE SELVAGEM
E MAIS: OS TEMAS DE WANDAVISION EM SEU RPG
PAPO DE DESIGNER: LETALIDADE EM MOUSE GUARD
ADAPTANDO: AMONG US EM ABISMO INFINITO
Conecte-se ao nosso Universo
em plena expansão!

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o ra ! !
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EDITORIAL
Quer mais RPG? Então se liga no Tiny Dungeon, próxi-
mo lançamento da RetroPunk. Nesta edição, além de nossa
seleção de artigos você vai poder conhecer este jogo com
uma bela resenha escrita pelo revisor dele.
Curtiu? Então se liga que teremos também uma edição
gratuita da Rolepunkers totalmente focada em Tiny Dun-
geon.
Mas as novidades não acabam por ai. Quem já apoia o
Punkverso já deve ter visto as novidades. Nossas aventuras
agora serão mais curtas, sendo mais fácil para vocês conse-
guirem ler todo o material que publicamos todo mês, mas
continuam com a mesma profundidade. Além disso tere-
mos o caderno de extras, que será uma ficha mensal com
estatísticas e detalhes de um NPC, Local ou Item para você
usar em suas mesas, cada mês para um sistema diferente.
Por fim, as metas extras também foram atualizadas, vale a
pena dar uma olhada e conferir.
A Rolepunkers não mudou seu conteúdo. Mas agora ela
sempre terá uma adaptação mais 5 artigos – até então eram
3 artigos +2 das metas extras. Desta forma focamos as me-
tas na produção de mais conteúdo.
As recompensas que está recebendo neste mês de Abril
– referentes à Março – são as últimas no formato antigo, a
partir de Maio as aventuras e demais itens já vem no novo
formato.
Espero que gostem.
– Fernando "del Angeles" Pires
ÍNDICE
RESENHA TINY DUNGEON................................03
Tiny Dungeon está quase ai e nesta resenha você vai conhecer um pouco mais
deste RPG Minimalista.
CIDADE INVISÍVEL...........................................07
A Netflix nos presenteou com uma bela série sobre o folclore brasileiro, e não
é que esse tema pode ser facilmente transposto para mesas de RPG?
LETALIDADE NO RPG.......................................19
Morte, dano e ferimentos são temas comuns nos nossos RPGs, mas eles po-
dem ser lidados de formas diferentes, principalmente em Mouse Guard.
UM SEGREDO DE VOCÊ....................................23
9 de Março de 1999, um orelhão, uma mente sem lembranças e uma única
memória, Meliora...
WANDAVISION: TEMAS....................................28
Wandavision trouxe uma nova visão sobre o tema de super heróis, e neste ar-
tigo trabalhamos algumas dessas ideias aplicadas nas mesas de RPG.
TABELA DE INTERLÚDIOS EXPANDIDA................32
Mais opções para a tabela de interlúdios de Savage Worlds e uma tabela para
gerar fuguras do passado aleatoriamente.
ABISMO INFINITO: AMONG US...........................38
Mortes em uma espaçonave. O Assassino é um dos tripulantes. O clima de
intriga e conspiração é nítido. Lembra alguma coisa? Que tal levar Among US
para Abismo Infinito?
COLABORADORES DESTA EDIÇÃO CRÉDITOS
EDITOR
DAVID DORNELLES Fernando "del Angeles" Pires e Nina Bichara
Graduando em Letras, produtor independente no estúdio Dados Selvagens. CONSELHO EDITORIAL
Dragão multi dimensional nas horas vagas. Daniel Martins,
G. Moraes e Rodrigo "Bigg" Campos
IDENTIDADE VISUAL
ENCHO CHAGAS G. Moraes
Pesquisador e desenvolvedor de jogos, especialista em experiência do
usuário, campeão mundial do Game Chef 2013 com o jogo Pulse. DIAGRAMAÇÃO
Fernando "del Angeles" Pires e
G. Moraes

FÁBIO BENCHIMOL REVISÃO

Praticante da nobre arte do RPG por mais de duas décadas, sabe que a Fernando "del Angeles" Pires
vontade de explorar mundos fantásticos nunca termina! ARTE INTERNA
Editoras originais e Internet (algumas editadas)

OLIVER BALBI
RPGista desde os 13 anos, professor, tradutor, revisor e escritor. Acredita
que a língua é a chave que abre todos os mundos. Quer tornar o RPG cada
vez mais inclusivo e seguro para todes.  - o textinho ficou assim

RUBENS ALVES
Autor, amante de RPGs indie e defensor do RPG como modo de aprender
tolerância e se conectar com novos pontos de vista. Também gosta de
escrever alguns contos quando tem oportunidade.

TCHELO ANDRADE
Escritor e Game Designer. Acredita fielmente que os jogos vão salvar o
mundo, pessoa por pessoa.
RESENHA Tiny Dungeon

O QUE É TINY
DUNGEON?

T
iny Dungeon é um sistema muito poderoso.
Digo isso depois de ter passado muitas horas
debruçado em cima do livro lendo palavra por
palavra e revisando cada linha. Sou um leitor ávido
de sistemas. Já são mais de 13 anos de hobby e fiz
testes com todos os tipos que encontrei, tanto mes-
trando quanto jogando, para achar o que eu realmen-
te gostava. Por isso posso dizer sem ressalvas: Tiny
Dungeon é um sistema muito poderoso.
Simples

POR OLIVER BALBI

 RESENHA
A primeira coisa que acontece
quando você começa a ler o livro é
perceber o quanto tudo aquilo foi feito
para ser simples. Veja bem, há uma diferença imensa
entre simples e simplista. Algo simplista seria um siste-
ma desconexo que tentaria facilitar regras, mas acabaria
perdendo seu foco e sua alma no processo.
Simples é um sistema redondinho, que roda per-
feitamente. Com rolagens de dados rápidas e eficien-
tes, feitas para trazer para mesas de RPG acostumadas
com batalhas de 3h e sets de dados caríssimos, um
frescor de poucos D6 e batalhas rápidas. É um daque-
les sistemas que você pode sentar, montar persona-
gem, entender o mundo e começar a jogar na mesma
tarde.
Para mim é o tipo de livro, ou pdf, que você leva no
bolso. Todas as pessoas que jogam RPG sabem a dificul-
dade de juntar grupos para jogar. Acho que todas elas
também já passaram pela frustração de estarem com o
grupo todo no mesmo lugar, mas não terem as fichas e
os dados para rolar. É aí que, inicialmente, Tiny Dun-
geon se encaixa.
O livro de Tiny Dungeon é organizado para ajudar o
RPG a ser mais sobre jogar e menos sobre burocracias.
Sempre joguei sistemas com regras cheias de detalhes
e livros de 300 páginas para quem estivesse jogando e
ainda mais umas 300 para quem fosse mestrar. Eu ama-
va ler e entender cada regra, e gosto até hoje, mas devo
admitir que fiquei encantado com essa proposta.
A mecânica básica do jogo é a seguinte: você vai jogar
de 1 a 3 D6 e com um 5 ou um 6, você tem um suces-
so. Normalmente as rolagens são feitas com 2 D6, o que
pode te dar dados a mais ou a menos são vantagens e
desvantagens. O máximo de dados que você pode rolar
independentemente da situação são 3D6. Você pode au-
mentar a sua taxa de acerto para 4, 5 e 6, mas você nunca
vai rolar mais de três dados.
Isso por si só já é revolucionário. Para quem entrou no
RPG tendo que ter D20 para acerto, D8 para vida e D10 para
dano isso pode ser inicialmente estranho. Sempre tive a im-
pressão que os meus sets de dados não estavam completos,
não importando quantos eu tinha de cada. Achei reconfor-
tante saber que com 3D6 consigo mestrar uma sessão.
Aqui está o primeiro dos poderes desse sistema: ele
torna o RPG mais acessível. Os preços de conjuntos de
dados não param de subir. Muitos sistemas exigem que
você tenha de 2 a 3 livros para conseguir jogar e, prag-
maticamente, nem todo mundo tem como comprar. Tiny
Dungeon tem essa proposta minimalista, que traz den-
tro do livro básico todas as regras necessárias e muitos
antagonistas de tipos e níveis de dificuldades diferentes.
Além disso tudo, traz alguns micro cenários prontinhos
para você só pegar seu grupo e mergulhar na história.
CRIAÇÃO AMPLA E RÁPIDA
Quando for definido em qual micro cenário o jogo vai
se passar, está na hora de montar as personagens. O
primeiro passo é escolher a sua Herança. Muito mais
4
Tiny Dungeon
abrangente do que o conceito de raça, Herança nos lem-
bra que não é só uma questão genética que define quem
nós somos, mas também a cultura na qual estamos inse-
ridos.
Sua Herança vai definir seus pontos de vida, que são
fixos. Todas as personagens que forem arvorídeos, por
exemplo, têm 9 pontos de vida. Você pode jogar com
classes mais comuns de RPGs, ou inovar com raças pro-
postas pelo livro como os próprios arvorídeos, salimar,
karhus ou lagartinos.
Depois disso partimos para os traços, que se parecem
com as Vantagens de Savage Worlds. Não existe o con-
ceito de classes em Tiny Dungeon. Tudo o que você é
capaz de fazer está definido nos traços. Todas as perso-
nagens começam 1 traço que ganham da sua Herança e
mais três que podem ser escolhidos.
As opções são tão variadas e instigantes que eu sin-
ceramente não senti falta das classes. A customização
é bem divertida de fazer, e você acaba tendo a possi-
bilidade de montar personagens muito diferentes en-
tre si.
Uma coisa interessante é que a escolha da arma na
qual a sua personagem vai ser proficiente não está in-
cluída nos traços. Você pode escolher entre três grupos
de arma: corpo a corpo leve, corpo a corpo pesada e as
armas a distância. Dentre eles você escolhe a arma na
qual você se especializa. Por exemplo, escolhendo o gru-
po de arma corpo a corpo pesada, você poderia escolher
uma espada longa para se especializar.
 RESENHA
O que vai mudar entre as armas
é, basicamente, o alcance. São três ti-
pos de distância, Próximo, onde as armas
corpo a corpo leve e pesadas alcançam. Perto, onde as
corpo a corpo pesadas e as a distância atingem. Longe,
onde só as à distância chegam. As magias podem ser
lançadas em qualquer uma das distâncias.
Uma coisa que pode chocar veteranos é que a escolha
da arma não influencia no dano dela. Um acerto num
ataque vai causar sempre 1 de dano. Nas regras básicas,
não importa se você está usando uma adaga, uma pisto-
la, ou uma bola de fogo, com as três você consegue ser
igualmente mortal. Me lembra aquelas cenas de filme,
nas quais uma faca por entre as costelas pode matar de
forma mais eficiente do que um tiro.
Algo que me deixou muito empolgado para montar per-
sonagens em Tiny Dungeon é que elas são mais pé no chão,
mais realistas, do que em vários outros sistemas. Ele se pro-
põe a trazer para o jogo de uma forma muito interessante
a resposta para as perguntas: Qual é a sua origem? Quem
você era antes de ser a pessoa de armadura pesada com uma
espada enorme lutando na guerra? Quem era a sua família?
Caímos tanto no clichê, minha família está morta e eu
estou vagando sozinhe pelo mundo desde criança, que
esquecemos que a maior parte das histórias não aconte-
ce assim. Ninguém nasce sabendo empunhar uma espa-
da e a maior parte das pessoas precisa trabalhar para vi-
ver. Por isso, durante a montagem de personagem você
precisa escolher o ramo da sua família.
Tiny Dungeon
O ramo da sua família é como se fosse a sua profissão Na montagem de personagem de Tiny Dungeon resi-
pré aventureire. Você é filhe de padeiros? Ferreiros? Te- de um dos poderes do sistema: a possibilidade de você
celãs? Então você pode usar as habilidades relacionadas criar uma personagem com a qual você se identifica.
à sua profissão com vantagem. Isso traz uma camada a Essa identificação não precisa estar ligada a páginas e
mais de profundidade para a sua personagem. Aquela páginas de regras. A complexidade é proposta muito
ladra de mão leves pode saber aplicar sua força sovan-
mais na criação da personalidade do que em mecânicas.
do massa de pão. A maga que nunca empunhou uma
Você pode tanto montar tanto uma aventureira mais pa-
espada pode ter os dedos calejados de ter passado sua
drão para uma one shot, quanto pensar nos detalhes dos
infância tecendo com sua avó.
100 anos que seu fay viveu com a mesma leveza.
Essa proposta abre mais um espaço de imersão na per-
sonagem, bem como o próximo passo: a crença. Tiny Dun-
geon nos convida a pensar nos valores e princípios antes
de eles serem colocados à prova e sem envolver pontos,
dados e recompensas mecânicas. Com uma frase simples,
você monta um guia de como interpretar a sua persona-
gem que vai te ajudar a tomar as decisões difíceis que pos-
sivelmente vão surgir no seu caminho.
Desafios sempre podem mudar a for-
ma como personagens vêem o mun-
do. Se a matança da guerra fizer
seu coração de ouro virar uma
pedra de gelo, você não vai
ter que continuar seguindo a
mesma crença. Bem como na
vida real, crenças são passíveis
de serem mudadas no decorrer
do jogo e isso pode fazer parte da
sua evolução como personagem.
5
 RESENHA
CAMADAS DE
COMPLEXIDADE
Depois disso, sua personagem está feita e
pronta para ser inserida em aventuras das mais diver-
sas. Mas antes de passar para as aventuras, fica aqui
uma informação para aqueles que sentiram muita falta
de mecânicas mais complexas. O livro tem uma parte
de regras adicionais nas quais você encontra, por exem-
plo, como usar dano variável, traços de prestígio que
se aproximam bastante do conceito de classes e afins.
Assim você pode montar seu jogo com tudo o que gos-
ta, acoplando algumas partes e tirando outras, deixando
com a sua cara.
Esse é outro dos poderes de Tiny Dungeon, a forma
como ele é personalizável. Mesmo sendo mais minima-
lista ele tem um espaço para você escolher o que gosta
dentro das propostas que ele oferece. Além disso, abre
possibilidades para você montar as suas regras da casa
de forma simples e direta.
O livro de Tiny Dungeon é um prato cheio para quem
mestra. Não só pela questão da personalização das re-
gras, mas por ter tudo o que você pode precisar para
uma aventura. Todas as regras necessárias estão lá. Al-
guns dos micro cenários são apaixonantes, outros são
completamente surreais. Como é um sistema adaptável,
as histórias apresentadas são muito diversas. Têm anta-
gonistas interessantes prontos e a proposta é que o XP
seja dado para o grupo todo não, de forma individual.
CENÁRIOS E MAIS CENÁRIOS
Nos micro cenários existem muitos tipos de univer-
so e as informações que você precisa para começar as
aventuras estão em cada um deles, incluindo mecânicas
adicionais necessárias e antagonistas específicos. Você
pode escolher uma história mais comum e ser alguém
se aventurando por labirintos com tesouros incontáveis
de onde apenas uma pessoa voltou. Ou você pode es-
colher estar apenas cuidando da sua vida vivendo na
sua caverna quando aventureiros gananciosos resolvem
destruir o seu lar e ainda te chamam de monstro!
Conhecer a sociedade goblin para além do estereóti-
po do batedor burro e entender a complexidade na qual
ela se baseia, viver num mundo em que o mal ganhou
e tudo bem, pois você ganhou junto, são possibilidades
reais. Estar num universo em que o País das Maravilhas,
o mundo do Mágico de Oz e a Terra do Nunca se cho-
caram e o Capitão Gancho e a Rainha de Copas tem um
romance, também é possível.
ANTAGONISTAS
Quanto aos antagonistas, o livro organiza de uma for-
ma que eu gostaria que fosse aplicada a mais sistemas.
Eles estão organizados em seis níveis de ameaça: bucha,
baixa, média, alta, heróica e solo. Dessa forma fica mais
simples de criar aquele combate que não estava progra-
mado, ou preparar as sessões certinho de acordo com
o nível de quem está jogando e você vai ter sempre um
dinossauro na manga quando precisar.
6
Tiny Dungeon
POR FIM..
Com regras práticas e adaptáveis, personagens rápidas de
montar e com a possibilidade de serem complexas e profun-
das, uma variedade enorme de micro cenários e antagonistas
bem montados, Tiny Dungeon é um sistema que dá vontade
de jogar e mestrar. E da vontade de fazer isso agora! Pois é
organizado de uma forma que torna isso gostoso e possível.
Mais do que isso, Tiny Dungeon é um sistema muito
poderoso, pois traz em si a possibilidade de trazer mais
pessoas para o hobby. Ele pode ser usado como um óti-
mo RPG de entrada. Com foco mais narrativo, pode ser
usado para campanhas leves e curtas ou para campa-
nhas complexas, intrincadas e sinistras. Por ser simples,
pessoas que nunca jogaram vão se sentir mais bem vin-
das e pessoas que nunca mestraram vão se sentir mais
confiantes para tentar iniciar.
Por precisar de pouca mecânica de rolagem de dados,
também tem o poder de trazer de volta pessoas que joga-
vam há anos e que perderam isso por causa da distopia
pandêmica na qual estamos vivendo. Muitas delas não se
adaptaram a plataformas com fichas programadas e com-
plexas. Além disso, jogar on-line pode ser um desafio para
jogos muito parados e lentos, pois perder o foco é muito fá-
cil. Tiny Dungeon traz o movimento e a versatilidade que
são necessários para sessões curtas e interessantes.
Tiny Dungeon é um sistema muito poderoso, pois tem
a possibilidade de se encaixar em vários contextos que
não eram contemplados e com isso manter vivo o hobby
de viver aventuras, por trás ou por dentro das histórias.
ADAPTANDO Savage Worlds

CIDADE INVISÍVEL

E
se as lendas da sua infância estiverem escondidas em toda parte? Foi com
essa provocação que, para bem ou mal, o trailer de “Cidade Invisível”
chamou a atenção de muita gente na internet. Com a premissa de apresen-
tar personagens do folclore brasileiro de forma atual, a série da Netflix estreou
esse ano e dividiu fortemente a opinião do público. Nesta edição, traremos uma
adaptação com novas regras, fichas e ideias para aventuras além de debater o
folclore para além das histórias infantis.

POR DAVID DORNELLES

 ADAPTANDO
ANTES DE MAIS NADA, O
QUE É FOLCLORE?
É muito comum vermos associações, quase como sinônimos,
da palavra folclore com “lendas” ou, até mesmo, “menti-
ras”. Engana-se, também, quem o toma por equivalente a
uma “mitologia brasileira”. Como dito por Raymond Wil-
liams, em meados do século XX, toda sociedade humana
expressa, à sua maneira, seu modo de ser, seus propósitos
e significados através de suas instituições, artes e conheci-
mentos. Folclore é isso. Essa manifestação cultural e iden-
titária. Composto não apenas de lendas, mas dos mais va-
riados costumes de um povo: música, comida, danças etc.
Essa maravilhosa constelação que compõe o imaginário e as
vivências de um povo é o que chamamos de Folclore.
FOLCLORIZAÇÃO, APROPRIAÇÃO E
APAGAMENTO
Falar de Cidade Invisível com ufanismo e sem reflexão
alguma, sem dúvidas, não é algo que caberia nesta re-
vista. Apesar de todo o sucesso estrondoso — tendo
sido Top 1 no Brasil por dias e Top 10 internacional-
mente —, a série não é perfeita. Não é difícil encontrar
críticas contra a série. Para além da escolha do Rio como
ambientação e quaisquer problemas de roteiro, é neces-
sário falar sobre apagamento e apropriação.
Inicialmente pode parecer muito bonito encher o pei-
to e falar “nossas lendas”, mas, no fim das contas, não é.
Desde a sua divulgação a série trata os encantados como
Savage Worlds
“histórias infantis” apagando a realidade de que, essas
figuras que compõem o imaginário de boa parte do país,
também são elementos sagrados na espiritualidade de
povos originários. Apesar de abordar temas importan-
tes como luta por terras e crenças, a série o faz apagando
totalmente as origens desses assuntos.
Esse debate, por si só, é muito maior do que o pró-
prio artigo. Ainda assim, é importante que venha à tona.
Mais do que incentivar ou proibir o uso desses elemen-
tos em jogo, convidamos você a refletir sobre como fazê-
-lo. Seja no folclore, como uma forma de conhecimento
e vivência que vai além de histórias infantis, ou na espi-
ritualidade, atual e praticada por muitas pessoas, os en-
cantados merecem respeito. Apenas com respeito você
será capaz de encantar seu jogo.
ENCANTANDO SEU JOGO
Apesar de todo o discurso prévio, em uma mesa de
RPG é inegável que a presença de seres fantásticos seja
um dos elementos mais cativantes. Não há problemas
nisso. A partir de agora, iremos nos referir a esses seres
do imaginário popular como encantados. Para encantar
sua mesa de SWADE é importante que você tenha em
mente a proposta e tom de jogo, além de referências.
Em Cidade Invisível temos uma trama investigativa
de fantasia urbana em que encantados são elementos
fundamentais da trama. Você pode optar por seguir a
mesma premissa ou abordar esses elementos de uma
forma diferente. Você e seu grupo pretendem seguir a
8
 ADAPTANDO
linha de um jogo investigativo ou
explorarão a relação dos encantados
com a sociedade de outras formas? Essa é
uma escolha que cabe a vocês. A fantasia urbana admite
todos os elementos maravilhosos como parte da realida-
de — ainda que, muitas vezes, apenas uma parcela das
personagens esteja plenamente ciente disso.
Nesse artigo apresentaremos algumas adaptações de en-
cantados, mas você não precisa prender-se apenas a esse
texto. Entretanto, infelizmente a internet está repleta de
informações incoerentes ou contraditórias sobre encanta-
dos. Por isso, recomendamos cautela na hora de fazer uma
pesquisa. Como referências adicionais sugerimos o “Abe-
cedário de personagens do folclore brasileiro” de Januária
Alves — uma das principais bases para a série — e Noir
Carnavalesco — um romance de fantasia urbana e investi-
gação com um boto detetive particular como protagonista.
Por fim, é interessante que vocês não deixem de lado
outros aspectos folclóricos para aterem-se apenas aos
encantados. Seguir por esse caminho seria tentar encai-
xar de modo artificial algo na narrativa. Ninguém preci-
sa forçar a barra para inserir uma cantiga ou uma festa
junina do nada no meio do jogo, mas pensem que o fol-
clore está sempre presente mesmo que em pano de fun-
do. Seja seguindo uma superstição, comendo um prato
típico ou qualquer coisa do tipo, apenas se mantenham
abertos para que, de vez em quando, esses elementos
cotidianos venham à tona dando um tempero único e,
assim, vocês possam se encantar também.
CRIAÇÃO DE PERSONAGENS
Assim como o tom e clima da mesa, o grau de poder das
personagens também precisa ser decidido em conjunto com
o grupo. Há uma clara diferença entre mortais e encantados.
Na série, por exemplo, com exceção de Eric, o protagonista,
nenhum mortal seria páreo para os seres fantásticos. Então,
a primeira etapa na criação de personagens é decidir se o
grupo será composto por mortais ou encantados.
Escolha feita, mãos à obra! No caso de mortais lidando
com o sobrenatural, seria interessante que personagens
já comecem com, pelo menos, dois progressos. Além
disso, caso o grupo queira jogar como encantados, ini-
ciar uma campanha com personagens com 4 progressos
seria uma solução interessante para evitar que as perso-
nagens pareçam tão frágeis quanto pessoas comuns.
Ainda há a possibilidade de um grupo misto. Nesse
caso, pode-se tentar nivelar um meio termo com três
progressos iniciais. De maneira superficial, o grupo se-
ria composto por alguns encantados ainda inexperien-
tes com seus poderes e mortais experiência o suficiente
para se colocar como igual com esses seres.
Raça: personagens humanas seguem as regras do li-
vro base para criação de personagem, mas não precisam
cumprir qualificações de Estágio para obter Vantagens
(ver Regras de Ambientação, a seguir). Encantados po-
dem ser customizados seguindo as regras de criação de
raças do livro base, porém recomenda-se a combinação
da complicação Segredo (Maior), por precisar esconder
sua identidade fantástica da sociedade, e a nova van-
9
Savage Worlds
tagem Antecedente Arcano (Encantado) (ver a seguir).
Por padrão, as fichas prontas deste seguem essa lógica
de raça customizada combinação:
□ Encantado [AA (Encantado) (+2);
□ Segredo (Maior) (-2);
□ Sorte (+2).
Perícia: siga as regras do livro base para perícias. Para
seguir o clima cinematográfico, vocês podem concordar
em, uma vez por sessão, a personagem poder realizar
um teste de perícia não treinada sem penalidades.
Equipamento: apesar de não serem muito presentes em
cena, armas de fogo estão presentes no cenário. Se forem
usadas, pondere sobre quais personagens teriam acesso a
elas e por que. Como cenário contemporâneo, armaduras
e escudos são praticamente inexistentes. Por isso, sugere-
-se uso de algumas regras de ambientação (vide a seguir).
Regras de Ambientação: para tentar reproduzir o clima
que a série passa, além do próprio conceito de fantasia ur-
bana, sugerimos a combinação de algumas regras de am-
bientação. Adicionais como Convicção e Nasce um Herói
acrescentam fatores pertinentes como crença e poder sobre-
natural de encantados — além das Vantagens, considere a
escolha de poderes de encantados ignorarem as qualifica-
ções de Estágio. Além disso, regras como Heróis sem Arma-
dura e Limite de Ferimentos equilibram um pouco a mor-
talidade — de modo que os poderes não tornem as coisas
fáceis demais para um dos lados. Por fim, Escolhas Difíceis
serve de tempero especial para compor um clima de tensão
durante o jogo.
 ADAPTANDO
NOVAS VANTAGENS E
COMPLICAÇÕES
A Edição Aventura de Savage Worlds é com-
pleta, rápida e furiosa. Ainda assim, ela é customizável
e modular. Então, é sempre interessante que adaptações
e cenário apresentem regras novas próprias para a pro-
posta de jogo. Por isso, trazemos um novo Antecedente
Arcano.
Em contraste com outro Antecedente Arcano, mais
especificamente o “Magia”, esse oferece mais pontos
de poder, mas com menos poderes iniciais. Na prática,
podemos exemplificar que alguns encantados como o
Tutu, por exemplo, não são tão cheios de truques como
a Cuca, mas detém energia para usar os poderes muitas
vezes.
Além disso, alguns encantados possuem problemas
bem particulares. O saci, por exemplo, depende bastan-
te do seu gorro (ou bandana, na série) ao mesmo tempo
vemos um corpo seco incorpóreo que depende de um
hospedeiro. Por esse motivo, oferecemos uma opção de
complicação chamada de “Fraqueza” mais flexível que
outras apresentadas no livro.
ANTECEDENTE ARCANO (ENCANTADO)
Como um reflexo da humanidade, os encantados ma-
nifestam de forma fantástica algum aspecto como: liber-
dade, medo, vingança etc. As manifestações dos pode-
res são as mais diversas e particulares variando de um
encantado para outro.
Savage Worlds
O uso de seus poderes não deve ser leviano nem de-
safiar a descrença alheia. Você recebe -2 nos testes de
Encanto se os fizer em locais movimentados e repleto de
pessoas. Entretanto, realizá-los na cidade invisível, isto
é, os lugares aos quais a sociedade dá as costas, você re-
cebe +2 nesses testes.
□ Perícia Arcana: Encanto (Espírito)
□ Poderes Iniciais: 2
□ Pontos de Poder: 15
FRAQUEZA (MENOR OU MAIOR)
Você possui um Calcanhar de Aquiles, um Segredo de
Sansão ou, simplesmente, um pequeno defeito que pre-
fere esconder. Seja como for, eventualmente isso se colo-
cará entre você e seus objetivos.
Uma fraqueza menor é um problema que pode ser fa-
cilmente resolvido em uma cena e, ainda que não resol-
vido, você consegue seguir em frente — você recebe -1
em suas jogadas se sua fraqueza estiver em cena. Uma
fraqueza maior será um desafio e tanto a ser superado
e talvez te impeça de fazer algo significativo — quando
sua fraqueza estiver em cena você recebe -2 em seus tes-
tes.
Uma vez por sessão, você recebe um bene por superar
uma fraqueza menor e uma ficha de convicção por su-
perar uma fraqueza maior.
10
 ADAPTANDO Savage Worlds

De voz entorpecente, olhar sedutor e fala aconchegante, Camila trabalha como cantora no Ca-
fofo Bar. Por trás de tanta beleza, uma trágica história envolve a encantada. A sereia é tão mortal
quanto sensual. Entretanto, Camila é muito mais que uma femme fatale na história. Com sua empa-
tia e inteligência, a encantada sabe ajudar quem precisa.
As manifestações de seus poderes são das mais variadas, indo desde o mais sutil olhar até uma transformação
completa em sereia. Sua voz entorpece e hipnotiza facilmente os desavisados.
□ Atributos: Agilidade d6, Astúcia d6, Espírito d8, Força d4, Vigor d10
□ Perícias: Atletismo d6, Conhecimento Geral d6, Encanto d10, Furtividade d4, Perceber d8, Persuadir d12,
Pilotar d6
□ Movimentação: 6; Aparar: 2; Resistência: 7
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando); Atraente; Novos Poderes; Sorte.
□ Complicações: Segredo (Maior) WCAMILA
□ Poderes: Limpeza Mental, Fantoche, Proteção Ambiental, Confusão.

Sendo uma pessoa abominável em vida, ele foi rejeitado pelo céu e inferno após sua morte. O corpo seco trata-se
dessa essência maligna desencarnada vagando pela terra. Esse encantado personifica a crueldade e egoísmo da
humanidade — sendo também um retrato do colonialismo e da arrogância.
Na série, diferente de alguns relatos, o corpo seco é incorpóreo e necessita de um hospedeiro tal qual um para-
sita. Seus poderes envolvem a capacidade de manipular alvos ou amedrontar alvos, assim como uma inexplicável
forma de causar dano que assemelha-se a drenar energia vital alheia.
□ Atributos: Agilidade d4, Astúcia d4, Espírito d12+2, Força d4, Vigor d12+2
□ Perícias: Atletismo d4, Conhecimento Geral d8, Encanto d12, Furtividade d8, Perceber d6, Persuadir d6.
□ Movimentação: 6; Aparar: 2; Resistência: 9
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando), Novos Poderes; Sorte.
□ Complicações: Segredo (Maior); Fraqueza (Maior) [incorpóreo].
WCORPO SECO □ Poderes: Drenar Pontos de Poder, Fantoche, Medo, Raio (Modificador: Dano).

11
 ADAPTANDO Savage Worlds

Outrora guardião da Mata Atlântica na Baía de Guanabara, agora oculto sob uma persona mar-
ginalizada e invisível na sociedade. Iberê é um encantado poderoso: o curupira. Seus pés invertidos
enganam tanto quem menospreza sua aparência quanto aqueles que tentarem segui-lo. O curupira é
um especialista em rastreamento e movimentação pelas matas, exímio caçador e guerreiro estrategista por excelência.
Seus cabelos ardem em chama quando seus poderes se manifestam. O curupira corre com uma velocidade so-
brenatural, com chamas ele pode tanto criar uma ilusão para confundir o inimigo na direção contrária quanto para
ferir o oponente com sua lança.
□ Atributos: Agilidade d10, Astúcia d8, Espírito d10, Força d8, Vigor d10
□ Perícias: Atletismo d10, Conhecimento Geral d8, Encanto d10, Furtividade d10, Lutar d10, Perceber d10, Persuadir d8.
□ Movimentação: 8; Aparar: 7; Resistência: 7
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando), Ligeiro, Novos Poderes; Sorte.
□ Complicações: Hábito (Maior) [cachaça]; Segredo (Maior). WIBERÊ
□ Equipamento: Lança.
□ Poderes: Ilusão, Ferir, Velocidade, Proteção Arcana.
A proprietária do Cafofo Bar é sagaz e influente entre os encantados. A mulher de olhar penetrante e voz mansa
é, na verdade, a cuca. Uma poderosa bruxa capaz de feitos inimagináveis. Seus encantos estão fortemente ligados
ao sono, medo e pesadelos. Inês é inteligente e costuma estar um passo à frente dos outros, não poupa esforços para
cumprir seus objetivos e pode ser tanto uma poderosa aliada quanto uma perigosa antagonista.
As suas manifestações envolvem a presença de lepidópteros, ou seja, borboletas e/ou mariposas. Isso ocorre por-
que, no Brasil, existem muitas lendas de bruxas envolvendo a ascalapha odorata — uma espécie de mariposa que
é associada à morte e mau agouro. Apesar de a série se permitir uma liberdade poética e usar outra espécie, com
apelo visual mais forte, ainda assim vemos uma representação de cuca ligada às lendas de bruxas — felizmente
fugindo da difundida cuca jacaré derivada de ilustrações das obras de Lobato.
□ Atributos: Agilidade d6, Astúcia d8, Espírito d12, Força d4, Vigor d12+2
□ Perícias: Atletismo d4, Conhecimento Geral d8, Encanto d12, Furtividade d6, Luta d4, Ocultismo d10,
Perceber d8, Persuadir d8.
□ Movimentação: 6; Aparar: 4; Resistência: 9
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando); Novos Poderes (2); Pontos de Poder (2); Surto de Poder; Sorte.
□ Complicações: Segredo (Maior)
WINÊS □ Poderes: Conjurar Aliado, Empatia, Medo, Mudança de forma, Sono e Teleporte.

12
 ADAPTANDO Savage Worlds

No lugar de um gorro, vemos uma bandana vermelha, surrada, amarrada na cabeça. Em vez
de um bambuzal, uma ocupação na Lapa. Uma prótese pode até disfarçá-lo a princípio, mas não
demora para que você reconheça o sorriso maroto de um saci.
Bem humorado e malandro, Isac é carismático e com uma língua de prata sem igual. O rapaz é amigável e con-
segue enganar até mesmo os encantados mais poderosos. Ágil, furtivo e repleto de truques, o saci une essas qua-
lidades à malandragem e esperteza com maestria. Apesar de ter apenas uma perna, ele é bastante ágil e sua movi-
mentação não é afetada. Sua fraqueza está em sua faixa vermelha na cabeça.
□ Atributos: Agilidade d10, Astúcia d8, Espírito d6, Força d4, Vigor d8
□ Perícias: Atletismo d6, Conhecimento Geral d6, Encanto d8, Furtividade d12, Lutar d6, Perceber d6,
Persuadir d8, Provocar d10.
□ Movimentação: 6; Aparar: 5; Resistência: 6
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando); Sorte; Sorte Grande. WISAC
□ Complicações: Segredo (Maior); Fraqueza (menor) [bandana]; Jovem (menor).
□ Equipamentos: Prótese, Bandana.
□ Poderes: Manipulação Elemental e Teleporte.

Apaixonado pela vida, o rapaz é espontâneo e sorridente. Extremamente amigável e boêmio, conquista e cativa
as pessoas em sua volta. Como boto, é entregue aos prazeres da vida e totalmente desprendido e desapegado. Seu
envolvimento com a Vila Toré o colocou em um grande perigo.
O Boto é extremamente sedutor e convincente em sua forma humanizada. Usa um chapéu para ocultar seu res-
piradouro no topo da testa e transforma-se rapidamente ao mergulhar nas águas. Sua forma de boto cor de rosa o
permite uma locomoção sobre humana sendo usada para tentar evitar conflitos além de suas capacidades.
□ Atributos: Agilidade d6, Astúcia d4, Espírito d8, Força d4, Vigor d10
□ Perícias: Atletismo d10, Conhecimento Geral d6, Encanto d8, Furtividade d8, Lutar d6, Perceber d8,
Persuadir d12.
□ Movimentação: 6; Aparar: 5 ; Resistência: 7.
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando); Atraente; Muito Atraente; Sorte.
□ Complicações: Segredo (Maior); Fraqueza (menor) [Desidratação].
WMANAUS □ Poderes: Empatia; Mudança de forma.

13
 ADAPTANDO Savage Worlds

Braço direito de Inês, Tutu é um homem forte e sério. De poucas palavras, fala muitas vezes
através de seu olhar intimidador. O segurança do Cafofo Bar é um dos encantados menos conhe-
cidos da Cidade invisível e nem por isso é inferior aos demais.
Tutu, assim como a Cuca, é um tipo de bicho-papão. Terror das crianças, pode possuir várias formas, sendo uma
delas um monstruoso porco do mato —, mas você pode usar as estatísticas do Touro do livro base presentes na
página 277. As histórias contam que muitas vezes a Cuca o chamava para auxiliá-la em seus intentos.
□ Atributos: Agilidade d4, Astúcia d4, Espírito d6, Força d10, Vigor d8
□ Perícias: Atletismo d10, Conhecimento Geral d4, Encanto d6, Furtividade d6, Intimidar d12, Lutar d12,
Perceber d6, Persuadir d4.
□ Movimentação: 6; Aparar: 8; Resistência: 8
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando); Brigão, Musculoso; Sorte.
□ Complicações: Segredo (Maior) WTUTU
□ Poderes: Aumentar Características, Mudança de forma.

AS CIDADES INVISÍVEIS
Tão importante quanto as personagens — e, até mes-
mo, considerada por alguns uma personagem da histó-
ria — é a cidade em que a trama se desenrola. Na série
da Netflix, uma escolha esperada e que foi motivo de
discussão pelo público: Rio de Janeiro. Confortável para
uma produção audiovisual, o Rio é um dos mais conhe-
cidos cartões postais do país lá fora — sendo muitas ve-
zes confundido pelos gringos como a capital do país.
Mais uma vez, é preciso falar de apagamento. Muito
se questionou sobre a possibilidade da série se passar no
norte ou na Amazônia. Entretanto, isso poderia reforçar
outro problema envolvendo estereótipos e exotização de
uma região do país. Antes de se pensar em outro lugar,
deveria-se pensar em como melhor usar o local escolhido.
Ora, o Rio também abriga, assim como outros estados no
norte e nordeste, grupos indígenas e quilombolas, além
de muita coisa que, ironicamente, ficou invisível na série.
Antes mesmo da violenta colonização portuguesa, a
Baía de Guanabara já era povoada pelos povos origi-
nários — grupos pertencentes ao tronco macro-jê, além
dos tupinambás e outros que perduram até hoje. Com a
chegada dos europeus, também vieram pessoas seques-
tradas da África que por séculos foram escravizadas —
dentre essas pessoas, muitos bantus. Com o passar dos
anos, o colonialismo enfraqueceu, mas esses povos so-
frem até hoje sem usufruir de equidade plena. Ainda as-
sim, a sociedade usufrui de sua cultura como se tapioca,
o dendê, o samba e muito mais não tivessem sido pagos
com sangue pelo direito de existir.
Hoje, o Rio, bem como outras capitais, é um grande
centro urbano diverso. As crenças de diferentes povos
com o passar dos séculos, passaram a habitar o imagi-
nários de todos — ainda que muitas vezes assumindo
novos aspectos diferentes de sua origem. Na série, en-
contramos os encantados habitando o bairro da Lapa.
Ao mesmo tempo que vemos um potencial ponto turís-
tico — devido à variedade de bares, pubs e restaurantes
— também se mostra um pouco da vida suburbana —
como a existência de ocupações e pessoas em situação
de rua, incluindo Iberê.
A escolha da Lapa como um dos focos da ambien-
tação parece uma das escolhas mais bem acertadas. O
contraste construído na própria região escapa do clichê
de “bairro rico versus bairro pobre”. Ao mesmo tempo,

14
 ADAPTANDO Savage Worlds

essa área da cidade, muitas vezes por conta própria! Convide seu grupo para contribuir relatando o mesmo som. Eventualmente, a polícia en-
marginalizada, parece ideal para a ha- e aprofundar o jogo com informações não apenas antes contra morta uma vítima de um Bradador.
bitação dos encantados — que igualmen- das sessões como também durante os jogos. 2. Um universitário desaparece durante uma viagem
te mesclam glamour e marginalidade. Para chegar na de férias no litoral. A única pista é uma bela mulher que
Cidade Invisível não é preciso cruzar um portal mágico. IDEIAS DE AVENTURA frequenta uma boate onde o rapaz foi visto pela última
Ela sempre esteve lá, basta enxergar. Preparamos 10 ganchos de aventura para sua Cidade vez. Testemunhas relatam que os dois tiveram algum
Na hora de planejar seu jogo, recomendamos que pen- Invisível. Escolha ou role um d10 para ter um ponto de envolvimento. Entretanto, não será tão fácil descobrir a
se na ambientação sendo a cidade da pessoa narradora. partida para seu jogo! verdade sobre a Alamoa.
Ainda assim, desafiamos você a descobrir mais sobre
1. Gritos, berros e urros rasgam a madrugada. Devido 3. Um grupo de homens é encontrado catatônico após
essa cidade. Desvele a cidade invisível contida na cida-
a isso, surgem denúncias em diversas partes da cidade invadirem uma reserva. Ainda que não demarcada, a
de que você mora. Algumas perguntas interessantes:
□ Como a cidade foi fundada e qual sua história até
agora?
□ Quais culturas e etnias estão presentes nesse lugar?
□ Quais manifestações culturais são reconhecidas so-
cialmente e quais são marginalizadas?
□ Quais as religiões e manifestações de espiritualida-
de você conhece nessa cidade? Elas são mesmo as
únicas?
□ Quais são os principais pontos de interesse e turis-
mo? Quais áreas tendem a ser evitadas? E por quê?
□ O que torna esse lugar único? Que comidas, falas,
músicas e outras coisas o caracterizam assim?
□ Que encantados estão presentes nessa cidade? Por quê?
Respondendo essas perguntas você tem a base para
estruturar sua ambientação. Unindo conhecimento pré-
vio a um pouco de pesquisa, o resultado será, sem dú-
vidas, um cenário repleto de profundidade e diversida-
de. Mais do que isso, você não precisa responder tudo

15
 ADAPTANDO
terra pertence a um povo indígena
que já havia denunciado em vão, além
da caça ilegal, diversas ameaças dos caça-
dores. Contudo, a desgraça dos invasores não foi obra
dos interrogados, mas de Anhanga.
4. Uma clínica ilegal de aborto é fechada no subúrbio.
Os responsáveis fogem durante a operação da polícia
e uma mulher morre por ter o processo interrompido
pela ação dos militares. Após isso, uma assombração é
frequentemente vista no bairro: a porca dos sete leitões.
5. O Saci começa ser perseguido, tanto por encantados
quanto mortais, por causa de uma série de problemas
que, dessa vez, não são sua culpa. Na verdade, outro
encantado, Romãozinho, é o verdadeiro culpado.
6. Um jornalista conseguiu uma foto da Iara e publi-
cou uma matéria online. Alguns encantados querem ti-
rar satisfação com o homem enquanto outros preferem
ignorar e contar com a descrença da sociedade. Enquan-
to isso, Iara corre sério perigo.
7. O Saci é preso por tentar invadir uma propriedade
privada e vocês precisam livrar sua barra. O encantado
foi enquadrado tentando recuperar seu gorro (bandana)
que, por algum motivo, estava no local. Sem seus pode-
res, acabou sendo incriminado pela polícia.
8. Um estranho caso de assassinatos em série está sen-
do investigado. As vítimas são encontradas quase intac-
tas, exceto pela ausência do fígado. O papa figo é o res-
ponsável. Entretanto não será tão simples prendê-lo e,
muito menos, pará-lo.
9. Uma bela mulher pede ajuda do grupo afirmando
estar com a vida em risco. Após ter lucrado uma alta
quantia em dinheiro em jogos de azar, um bicheiro local
mandou capangas atrás dela. O que ninguém sabe é que
a dama é a Mãe d’Ouro.
10. Uma série de mortes sem causa determinada ocor-
ridas no mesmo condomínio são arquivadas. Todas as
vítimas foram encontradas em suas camas. Há uma pi-
sadeira à solta e continuará fazendo vítimas se não for
impedida.
SEMENTE DE AVENTURA: CASOS DE
FAMÍLIA
Uma Semente de Aventura apresenta ideias centrais
para serem desenvolvidas em jogo. A Semente de
Aventura em questão assume a premissa de que as
personagens atuam, de alguma maneira, como inves-
tigadores — seja oficialmente como parte da polícia
ou não.
RESUMO
Um homem é preso em flagrante por tentativa de homi-
cídio e a vítima desaparece sem prestar depoimento. A
questão é que os envolvidos nesse caso são encantados.
Cobra Norato e Maria Caninana, mais precisamente. Há
uma intriga que dura décadas e a moça, na verdade, é a
verdadeira ameaça. Enquanto estiver à solta, Maria con-
tinuará vitimando inocentes.
16
Savage Worlds
GANCHO
Há alguns dias que a morte de algumas mulheres foi relatada
nos jornais. A aventura começa com Caio Norato algemado
na delegacia. Se alguma personagem atuar na polícia, terá
contato direto com o suspeito. O rapaz afirma que estava com
uma arma, sem registro, por legítima defesa. Ele nega acusa-
ção por tentativa de assassinato e recusa-se a informar mais
detalhes sobre a vítima ou o ocorrido, porém o histórico de
outros três casos recentes complicam sua situação — isso co-
loca-o numa posição complicada com a polícia. Personagens
que forem civis poderiam estar próximos à localidade e terem
sido chamadas como testemunhas e serão ouvidas.
PANO DE FUNDO
Norato e Caninana são filhos do Boto. Após serem abando-
nadas nas águas pela mãe, encantam-se transformando-se
em grandes serpentes. Enquanto o rapaz cresceu pacífi-
co assumindo a forma humana pelas noites seguindo um
comportamento similar ao pai, a irmã cresceu violenta e
com desprezo pelos mortais. Ambos mantêm uma rivalida-
de perigosa e violenta. Enquanto o rapaz tenta impedir que
a irmã prejudique pescadores e marinheiros por prazer, a
moça não poupa esforços para arruinar a vida do irmão.
Certa noite, Caio encontra-se em uma boate da cidade.
Após a balada, o rapaz levaria uma mulher para seu apar-
tamento. Entretanto, é interceptado no caminho por uma
grande serpente que se revela, logo em seguida, Maria Ca-
ninana. A paquera foge do carro, mas os encantados tive-
ram suas identidades expostas.
 ADAPTANDO
Em seguida, Maria inicia uma caça-
da para realizar a queima de arquivo.
Ela assassina a moça que a viu manifestar
sua transformação, mas descobre que a mesma havia con-
tado a história — ainda que desacreditada — para duas
amigas. Assim, surgem mais duas vítimas nos dias seguin-
tes. A polícia encontra Norato apontando uma arma para a
irmã, que foge da cena, e todas as pistas posteriores apon-
tam-no como suspeito dos casos.
RESOLUÇÃO
A resolução do caso e da aventura pode seguir por di-
versas alternativas. Alguns fatos importantes para se ter
em mente:
□ Apesar de estar ligado com as vítimas (nas câmeras
e depoimentos de funcionários da boate) e não pos-
suir álibi na noite em que a primeira moça é vitima-
da, as personagens podem conseguir ajudá-lo com
álibis para as noites seguintes.
□ A causa mortis de todas as vítimas foi asfixia por estran-
gulamento (realizado pela forma de serpente de Maria);
□ Maria, se confrontada pelas personagens, tentará
dissuadi-las e, caso descoberta, não se entregará lu-
tando até a morte (ou tentando escapar se possível).
Dito isso, junte todas as peças, organize a aventura de
acordo com seu grupo e deixe que o grupo tente com-
pletar as lacunas do enredo! A semente de aventura é
apenas um ponto de partida que pode e deve ser adap-
tada de acordo com seus interesses e do grupo.
W MARIA CANINA
Astuta, egoísta e maquiavélica, a bela moça é um livro
que não deve ser julgado pela capa. Faz de tudo para
cumprir seus objetivos e usa seus poderes em qualquer
oportunidade em que se sentir confiante para não ser
percebida ou quando subestimar a vítima.
□ Atributos: Agilidade d6, Astúcia d4, Espírito d8,
Força d4, Vigor d10
□ Perícias: Atletismo d8, Conhecimento Geral d6,
Encanto d8, Furtividade d8, Lutar d10, Perceber d8,
Persuadir d6.
□ Movimentação: 6; Aparar: 7 ; Resistência: 7.
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando);
Atraente.
□ Complicações: Segredo (Maior).
□ Poderes: Medo; Mudança de forma.
W CAIO NORATO
Caio Norato
Rapaz bonito, bem humorado e procurando sempre
uma oportunidade para fazer uma piada e ser amigá-
vel. Evita ao máximo sua transformação. Adora a farra
da noite. Enquanto estiver na delegacia se mostrará um
pouco mais fechado e esquivo.
□ Atributos: Agilidade d4, Astúcia d10, Espírito d8,
Força d4, Vigor d6
□ Perícias: Atletismo d8, Conhecimento Geral d6,
Encanto d8, Furtividade d8, Lutar d6, Perceber d8,
Persuadir d10.
17
Savage Worlds
□ Movimentação: 6; Aparar: 5; Resistência: 5.
□ Vantagens: Antecedente Arcano (Encantando);
Atraente.
□ Complicações: Segredo (Maior).
□ Poderes: Empatia; Mudança de forma (Cobra
Gigante).
W COBRA GIGANTE
Uma gigantesca jibóia monstruosa. Escamas escuras
como a noite, sua visão é sinistra e assustadora.
□ Atributos: Agilidade d8, Astúcia d6, Espírito d10,
Força d12+7, Vigor d12
□ Perícias: Atletismo d6, Furtividade d10, Lutar d6,
Perceber d10,
□ Movimentação: 6; Aparar: 5; Resistência: 15
□ Vantagens: —
□ Habilidades Especiais:
□ Armadura +4: Pele Escamosa.
□ Sufocar: For.
□ Constrição: +2 em rolagens de Lutar e Atletismo
feitas para agarrar.
□ Tamanho 7 (Grande): uma cobra grande jovem
possui cerca de dez metros.
ENCANTANDO OUTROS JOGOS
Uma das coisas mais cativantes de SWADE é a possibilida-
de de transitar entre vários mundos e ambientações rápidas,
furiosas e selvagens. Você já tem em suas mãos o material
básico para sua própria Cidade Invisível em Savage Worlds,
 ADAPTANDO
mas o punkverso ainda nos permite
outras possibilidades! Por isso, vamos
falar sobre alguns outros jogos e pensar, jun-
tos, algumas possibilidades de levar os encantados até eles.
O mundo pós apocalíptico de Terra Devastada é resul-
tado do descontrole da ciência. Em sua base, o jogo apre-
senta um cenário de ficção científica e não há nenhuma
associação mística aos zumbis, porém isso não significa
que entre sobreviventes não haja espaço para as mais va-
riadas crenças. Pelo contrário, fé e esperança são elemen-
tos essenciais para sobreviver ao fim do mundo.
Por isso, uma forma de encantar suas mesas de TD é co-
locar a espiritualidade e crenças das personagens em jogo.
Talvez vocês joguem uma campanha inteira sem nenhuma
manifestação fantástica dos encantados, mas a caça neces-
sária surgir na hora certa pode ser um presente do curu-
pira para um grupo de famintos que tratar com respeito
o que sobrou das matas após o fim do mundo. De igual
modo, caçadores implacáveis e egoístas podem perder-se
e dar de cara com uma horda de zumbis. Seja como for,
não importa quando e onde, eles sempre estarão entre nós.
Em Rastro de Cthulhu já fomos apresentados aos mais
diversos horrores inomináveis, mas você sabia que no
suplemento Criaturas Terríveis tivemos uma aparição
da cuca como uma recompensa extra exclusiva para a
edição nacional? A bruxa apareceu com a clássica cara
de jacaré — o que em outros jogos poderia ser ridículo,
mas com certeza é aterrorizante para investigadores li-
dando com horrores dos Mythos.
Savage Worlds
Infelizmente, esse material foi exclusivo do financia-
mento e não está mais disponível. Não obstante, você
pode se inspirar na premissa apresentada por Criatu-
ras Terríveis para criar mistérios em suas mesas seguin-
do os rastros dos encantados. Apenas recomendamos
cuidado nas representações de culturas e povos. Evite
estereótipos e demonização superficial envolvendo os
encantados. Lovecraft é muitas vezes lembrado pela xe-
nofobia e racismo, porém isso não precisa nem deve ser
perpetuado em jogos baseados em sua obra.
Um dos próximos lançamentos anunciados pela edi-
tora é City of Misty. Talvez você se pergunte por quê
falar de um jogo que ainda não foi lançado, certo? A res-
posta é simples: esse jogo também pode ser uma boa
opção para sua própria cidade invisível. City of Misty é
um RPG de investigação com tropos de noir e pulp onde
as personagens são dotadas de poderes capazes de des-
velar as verdades que a Cidade oculta.
Imagine que a Cidade é como uma entidade viva que
mantém a população entorpecida numa rotina que os
impede de descobrir impensáveis segredos. As protago-
nistas do jogo são personagens com poderes sobrehu-
manos desvendando tais segredos que a Cidade escon-
de. Não é muito difícil imaginar uma ambientação em
nosso país em que encantados protagonizariam aven-
turas incríveis. Então, se eu fosse você não perderia as
novidades sobre o jogo!
18
 PAPO DE DESIGNER Mouse GUard

LETALIDADE NO RPG
O QUE PODEMOS APRENDER COM
MOUSE GUARD

P
raticamente em todo sistema de RPG, uma das mecânicas priori-
tárias é o sistema de combate. Rolagens de ataque, defesa, e cla-
ro… dano, e morte. Provavelmente uma herança dos primeiros
RPGs, que seguem influenciando desenvolvedores até os dias de hoje
após quase 50 anos.
Mas jogos diferentes contam histórias diferentes, e nem toda história
precisa lidar com a morte. Ou lidar de forma tão casual, banal, como em
nossa cultura literária, histórica, e consequentemente até a cultura pop.
Através de game design podemos criar ferramentas para contar histó-
rias diferentes dessa cultura massificada, e quem sabe trazer experiên-
cias mais adequadas e sensíveis.

POR ENCHO CHAGAS

 PAPO DE DESIGNER
Nesse artigo vamos discutir sobre
como mecânicas de letalidade de per-
sonagens precisam funcionar de formas
diferentes para atingir experiências diferentes. Como
exemplo principal, vamos conversar sobre as mecânicas
de Mouse Guard RPG: Um sistema que não possui mecâ-
nicas de pontos de vida, mas ainda oferece uma experiên-
cia significante e sensível sobre a mortalidade dos perso-
nagens, não somente criando histórias mais dramáticas
mas dando aos jogadores mais controle sobre a narrativa.
UM HISTÓRICO DE VIDA E MORTE EM
JOGOS
É compreensível que seja difícil sequer conceber a ideia
de um RPG sem mecânicas de combate ou pontos de
vida. Foram os jogos com os quais aprendemos a jogar,
e o tipo de histórias que queríamos contar em jogo. A
referência eram os épicos de fantasia, as batalhas me-
dievais, as aventuras capa e espada. Mas mesmo estes
tinham uma razão ao criar esta mecânica.
O próprio termo “pontos de vida”, ou Hit Points, ou
HP, por incrível que pareça, foi uma criação de Gary
Gygax nos anos 70 para o Dungeons & Dragons. Até
então não era um conceito comum em jogos. Lembran-
do que naquela época os jogos digitais estavam apenas
engatinhando, e os jogos de tabuleiro sempre focaram
em experiências um tanto mais lúdicas e coletivas, não
orientadas à experiência individual ou simulacionista.
Só depois a mecânica acabou seguindo adiante para os
Mouse GUard
videogames através de jogos como Rogue e os MUDs, e
então se infiltrou no game design de praticamente qual-
quer jogo.
Aqui estão dois conceitos de game design interessantes
para o nosso tema: O primeiro é como a representação do
jogador é feita dentro do ambiente lúdico, e outro é como
essa representação interfere na experiência do jogador.
Em jogos de estratégia é convencional o jogador não pre-
cisar de uma representação física, justamente para gerar a
ideia de uma entidade onisciente ou um comandante se-
guro à distância. Isso acontece tanto em jogos como xadrez
como nos “war games”, jogos de miniatura que originaram
a ideia de D&D. Essa experiência transmite a ideia da vida
dos personagens como recursos à disposição do jogador,
sem qualquer drama ou moral associada à sua perda. Isso
tem muito a ver com o tipo de consumidores e desenvol-
vedores de jogos em geral, normalmente de poder aquisi-
tivo maior e interessados nesse tipo de narrativa, comum
de classes dominantes, e então após a revolução industrial
acontece uma entrada em massa de outros tipos de consu-
midores... Mas isso é tema pra outro papo...
A ideia de “vitalidade” do jogador dentro de um jogo
nasce quando os jogos passam a oferecer uma experiên-
cia de representação física do jogador dentro do ambien-
te lúdico, o avatar do jogador. Inicialmente apenas para
marcar a posição ou estado dos personagens dentro do
jogo, como em Ludo, Jogo da Vida ou Banco Imobiliário.
Porém em todos esses jogos a ideia de “morte” nunca foi
a intenção da experiência.
20
 PAPO DE DESIGNER
Foram várias décadas de jogos sem
o conceito de resiliência e dano inseri-
dos nas mecânicas. Normalmente a morte
era utilizada unicamente como uma condição de derrota.
Morreu, perdeu. Mesmo nos jogos digitais a mecânica de
pontos de vida demorou a se tornar comum. Como os jo-
gos eram mais jogados em fliperamas, que cobravam fichas
por cada tentativa, era natural os desenvolvedores criarem
jogos mais rápidos e mortais. No máximo dar ‘vidas’, em
que o personagem morria instantaneamente a qualquer
contato com dano, mas podia retornar e tentar de novo
algumas vezes. Mas as barras de vida apenas aparecem
nos jogos de PC e consoles caseiros, principalmente os que
adaptaram a experiência do RPG para os jogos digitais.
No RPG, mais especificamente D&D, a história a ser
contada é a de personagens heróicos, dramáticos, que
sofrem para chegar ao seu objetivo final. É da natureza
das histórias épicas que a jornada não seja letal… afinal
não há nada muito heróico em ser vencido por qualquer
descuido contra um inimigo fraco, ou simplesmente re-
nascer novamente para tentar outra vez. Foi com esse
objetivo que Gygax criou a ideia dos pontos de vida, e
então influenciou game designers de todo tipo de jogos.
Hoje é uma mecânica razoavelmente banalizada, uma
convenção de design, que a maioria dos desenvolvedo-
res sequer cogita entender sua razão dentro da experiên-
cia de jogo. Quer mais letalidade? Coloca mais dano no
jogo. Quer menos letalidade? Coloca mais vida nos per-
sonagens. O que é razoavelmente decepcionante princi-
palmente nos jogos narrativos, onde temos muito mais
possibilidades, histórias a serem contadas, e não temos
limitações técnicas ou midiáticas quaisquer. O único li-
mite é a criatividade do game designer.
MOUSE GUARD RPG E O PESO DA
MORTE DE UM PROTAGONISTA
Apesar da intenção dos primeiros RPGs, criando mecâ-
nicas de pontos de vida, era estender a vida dos perso-
nagens para que os combates fossem mais demorados, e,
seguindo esse argumento, também mais recompensado-
res, hoje já entendemos que não é a forma mais eficiente
para o andamento do jogo. No caso dos RPGs clássicos,
sempre houve a “Regra de Ouro”, para que o Mestre
experiente pudesse ignorar as regras do jogo em prol da
carga narrativa e/ou dramática da sessão. No caso de jo-
gadores iniciantes, normalmente não têm outra solução
a não ser jogar cada combate exaustivamente 20 turnos
até o último ponto de vida, ou então assistir um perso-
nagem importante para o enredo sendo morto em um
encontro aleatório por conta de uma rolagem azarada.
E mesmo ao acompanhar o desenvolvimento de histó-
rias na literatura ou no cinema… a carga dramática nun-
ca esteve relacionada à duração dos combates. Aliás, na
maioria sequer tiveram a ver com qualquer tipo de vio-
lência. Então porque não adaptar essa condução narra-
tiva em forma de mecânicas para o RPG? De forma que
tanto jogadores iniciantes quanto experientes pudessem
ter a mesma experiência, e mantendo a responsabilida-
21
Mouse GUard
de das questões mecânicas dentro do sistema, sem re-
passá-las aos jogadores.
E provavelmente o melhor sistema para desprovar essa
“essencialidade” de um sistema de combate clássico é
Mouse Guard RPG. Um jogo que foi criado para simular
a mesma experiência dos quadrinhos que dão origem à
ambientação do jogo: a fragilidade e mortalidade dos ra-
tinhos, e a necessidade de trabalhar sempre em equipe.
A primeira observação é a ausência de qualquer mecâ-
nica de pontos de vida. O drama do jogo não está contido
na quantidade de dano que o personagem pode resistir até
seu fim, até porque isso não seria compatível com o cená-
rio. Os ratinhos são frágeis. Caso fossem realmente feridos,
isso provavelmente significaria sua morte. Ao invés disso,
o jogo possui determinadas condições que podem ser apli-
cadas aos personagens, como Cansado, Faminto, ou até
Ferido. Cada condição afeta rolamentos específicos, mas
não evoluem para a morte do personagem. Isso significa
que quanto mais prejudicados, mais difícil vai ser vencer
os próximos obstáculos, e certamente mais dramáticos.
Mas… como então se morre em Mouse Guard RPG?
Isso se dá através das mecânicas de Conflito. Um Confli-
to é toda vez que os personagens se encontram em uma
situação tensa, seja um combate, tentando esconder de
um predador, ou uma tempestade, ou até mesmo um
diálogo importante, tanto mestre como jogadores deter-
minam seus objetivos. Logo no começo Mestre e joga-
dores determinam os objetivos de cada um dos lados do
conflito, e eles disputam para ver quem vence.
 PAPO DE DESIGNER
Isso significa que para um persona-
gem morrer, o Mestre precisa declarar
no início do conflito que aquele se trata de
um combate mortal, e inclusive precisa determinar quantos
ratos podem (ou devem) morrer caso eles percam. Isso faz
com que, durante todo o conflito, os patrulheiros saibam o
risco que correm, tornando a cena inteira mais intensa.
Além disso, o jogo possui uma regra de Margem de
Vitória. Uma coisa é só ‘vencer’. Outra é vencer por uma
grande margem… ou ser derrotado por uma grande
margem. Neste caso o Mestre pode fazer novas exigên-
cias dos jogadores, e tomar mais recursos dos persona-
gens. Um dos recursos à mão é a própria vida dos per-
sonagens, que pode ser negociada.
Perceba que mesmo que o Mestre tenha declarado que
um personagem poderia morrer em um conflito, os jo-
gadores ainda podem escolher qual personagem faria
mais sentido falecer naquele ponto da história, ou po-
dem até negociar com o Mestre e trocar essa morte por
algo que talvez tivesse valor proporcional dentro da his-
tória. Talvez um personagem perder tudo o que lhe era
mais sagrado, ou até a possibilidade de completar sua
22
Mouse GUard
missão… tudo para manter os personagens vivos, caso
seja essa a vontade dos jogadores.
DIFERENTES EXPERIÊNCIAS DE
JOGO E O RPG
Há quem possa dizer, até por experiência reais, que qual-
quer sistema de RPG é capaz de gerar quaisquer tipos
de histórias, que o sistema é só um formato e que são os
jogadores quem comandam a narrativa. Como dito an-
teriormente, isso pode ser verdade considerando a ex-
periência de um grupo de jogadores e sua dependência
às regras de um sistema. Mas quando o jogador deixa de
usar as regras de um jogo, não estaria ele gerando uma
nova experiência, mais pessoal e efêmera, que tem mais
a ver com a dinâmica do seu grupo de amigos do que a
experiência proposta pelas regras de um jogo?
Quando Mouse Guard RPG propõe um jogo dramático,
sobre a fragilidade de um grupo de ratinhos, ele não espera
que os jogadores sejam os responsáveis por carregar tal pro-
posta. Lembramos sempre a clássica mecânica de Humani-
dade em Vampiro - A Máscara, que apenas pedia ao jogador
que tentasse interpretar seu personagem de uma forma es-
pecífica mas não tinha qualquer exigência ou impedimento
mecânico em quais habilidades poderia usar, ou em quem.
Game design é, principalmente, uma forma de imer-
gir o jogador em determinado cenário. O jogador não
deveria precisar de um conteúdo extra ou aula de atua-
ção para jogar o jogo… o jogo é quem deve convidá-lo a
fazer parte daquela experiência.
CONTO Rastro de Cthulhu

UM SEGREDO DE VOCÊ

U
m conto de 1999 para o seu tempo

A arte começa na obsessão.

E obsessão é clarividência.

Tobias Araújo não se lembrava o motivo, mas adorava quando fazia frio na
primavera. Essa era uma das coisas que mais lhe agradava em Nova Fronteira –
cidadezinha do interior de São Paulo. – Passou pela porta do seu apartamento, co-
locou o uniforme da sorveteria que trabalhava meio período na pia do banheiro,
jogou as chaves e o seu bichinho virtual verde em cima da penteadeira e se atirou
na cama. Tobias soltou um suspiro aliviado olhando para o teto, ignorando com-
pletamente a bagunça do recinto.

POR TCHELO ANDRADE

 CONTO
Há algumas semanas ele passou a
se esquecer de acontecimentos impor-
tantes da sua vida. O mais curioso nesse
caso é que ele não parece estar obstinado em relembrar
tais coisas. Só existe uma memória que ele se esforça
para manter viva na sua cabeça.
Meliora, pensou.
Depois se revirou na cama de solteiro – o móvel rangeu
acusando o desgaste da madeira –, em seguida olhou
para o calendário na parede que apresentava a seguinte
data: Quinta-feira, 9 de março de 1999.
Meliora.
O rapaz de 26 anos, se levantou rapidamente quando
assimilou a data e a hora. Colocou uma touca cobrindo
seu cabelo encaracolado, vestiu uma jaqueta jeans clara
que combinava com sua pele negra e saiu tentando lem-
brar o caminho sagrado que sempre o levava quinta à
noite a um momento divino, com a sua deusa.
Ao chegar na esquina, tirou um cartão do bolso da cal-
ça jeans e o inseriu no orelhão. Uma luz verde se acen-
deu anunciando: Você tem 30 unidades. Sem pressa, To-
bias teclou cada dígito lentamente, como se apreciasse
cada instante daquele momento.
– Alô? – falou a voz de uma mulher do outro lado da
linha quando a ligação se completou. – Você quer falar
com quem?
– Com a Xica – respondeu Tobias.
– Sim gostosão, aqui é a própria – a mulher do outro
lado deixou a voz mais sensual. – Se você está em busca
de prazer, ligou para o lugar certo. O que você quer ou-
vir hoje?
Tobias sorriu, sabia que o verdadeiro nome de Xica
era Meliora Silvestrini e não só isso, Tobias sabia muita
coisa sobre Meliora.
– Senhor? – tornou Meliora quando o silêncio durou.
– Por favor, me chame de Tobias. Toda quinta eu te
ligo e mesmo assim você não se lembra de mim. Desse
jeito fico magoado.
– Eu me lembro de você, perfeitamente. Você é o úni-
co que liga no meu telesexo e não me pede para falar
besteirinhas.
– Sim, a voz de um anjo deve emanar apenas poesias.
Tô ansioso pra saber o que você vai ler para mim hoje.
– Então, eu estava arrumando as coisas por aqui, e me
deparei com um texto escrito pelo meu ex-namorado. É
um texto legal, se você não se importar, lindo, eu gosta-
ria de ler pra você.
– Manda ver.
Tobias ouviu a respiração da mulher se afastar do te-
lefone, pouco tempo depois ouviu o som de um caderno
sendo folheado e por fim a voz de Meliora veio:
– O texto é assim, espero que faça sentido para você...
Hoje acordei e me dei conta de que o fundamental em
existir é viver de paranoia. A arte começa na obsessão
e obsessão também é clarividência. A melhor coisa que
pode acontecer a um indivíduo obsessivo é saber como
irá arruinar a própria vida. Em algum momento da nossa
vida passamos a guardar um segredo incrível sobre nós
24
Rastro de Cthulhu
mesmos, tão bem protegido que até acabamos nos esque-
cendo dele. E é nesse momento que surge a obsessão.
De alguma forma, aquelas palavras trouxeram alguma
familiaridade à mente nebulosa de Tobias, ele coçou a
orelha e sentiu um líquido quente escorrendo de dentro
do seu ouvido para fora. De novo isso, pensou enquanto
passava a ponta dos dedos na orelha e limpava nas calças.
– Tobias? – chamou Meliora.
– Sim, eu estava aqui pensando. Você disse que era
um ex-namorado, queria saber porque vocês termina-
ram? Se eu tivesse essa chance eu jamais perderia você.
– Ele morreu.
A voz seca da mulher foi seguida pelo silêncio. Depois
a ligação caiu. Irritado, Tobias olhou para o visor do tele-
fone público e viu a mensagem: Você tem zero unidades.
O jovem não se controlou e bateu o telefone com força e
caminhou a passos largos de volta para o seu prédio.
Em algum momento passamos a guardar um segredo
incrível tão bem, que ocultamos de nós mesmos, lem-
brou olhando para o céu. Tobias, nesse momento, teve a
leve impressão de ter visto um cintilar esverdeado entre
as estrelas. Coçou os olhos e tornou a suspirar ansiando
a sua atividade para o dia seguinte.
Meliora.
Na manhã seguinte.
Uma jovem de cabelos vermelhos vibrantes passou
por baixo da cerca de arame, apanhou sua mochila do
 CONTO
chão e continuou pela trilha no bos-
que. Tobias estava tão focado na saia
justa e nas tatuagens de Meliora que qua-
se a perdeu de vista. Ele não acreditava no que a garota
estava fazendo, seguir uma mulher pela mata seria mais
difícil do que pelas calçadas se escondendo das pessoas.
Por isso, o homem improvisou uma máscara com a sua
camiseta.
De uma distância segura, Tobias podia ouvir Meliora
cantarolando no final da trilha e aos poucos a voz da
ruiva foi se fundindo ao canto dos pássaros e ao som de
água corrente. Da sua posição sorrateira, o rapaz negro
podia ver uma cachoeira que ganhava detalhes à medi-
da que ele se aproximava.
De repente, a voz de Meliora se esvaiu e Tobias se in-
quietou. Talvez eu tenha perdido ela de vista, pensou
enquanto acelerava para além de uma moita e esse foi
seu erro... Quando se adiantou ele deu de cara com Me-
liora e o pior é que ela já esperava por isso, a jovem ti-
nha consigo uma pistola cromada calibre trinta e oito,
apontada para a cabeça de Tobias, que diante disso se
desesperou.
25
Rastro de Cthulhu
– Você se borrou todo, né? – zombou Meliora quando
notou a reação do outro. – Se você se mexer eu juro por
Deus que eu explodo a sua cabeça!
Tobias obedeceu com o coração acelerado.
– Não preciso pensar muito para saber que você é o
virgem de ontem – ela se afastou cautelosa, sabe muito
bem que uma arma de fogo é mais eficaz entre três e
cinco metros de distância, afinal, seu falecido pai era um
policial militar. – Eu sei o seu nome, mas não irei falar.
Agora me responda, porque diabos você tá me seguin-
do?
– Meliora, eu não sou seu inimigo, eu não quero seu
mal – começou Tobias estendendo a mão para demons-
trar obediência. – Você é uma pessoa incrível, eu te co-
nheço, eu sei disso! Eu sei muito bem que é errado se-
guir uma mulher, mas eu tenho certeza que algo ruim
está prestes a lhe acontecer, alguma coisa sombria quer
te destruir, eu só quero te proteger. Por favor, me enten-
da.
– De onde veio essa maluquice toda?
– Desculpa, eu não tenho nenhuma prova, é só a mi-
nha intuição. Por algum motivo eu não consigo me lem-
brar de nada além de 1999. Mas você precisa acreditar
em mim, eu não quero nada físico. Eu sei que você é
muito linda pra mim. Eu só quero te ajudar, eu sinto que
sou o único que pode ajudar você.
– Quanta ladainha! Você já parou pra pensar que tal-
vez essa coisa sombria que me fará mal, seja você mes-
mo? Você me dá nojo!
 CONTO
Tobias ficou pensativo, talvez Me-
liora estivesse certa. No mesmo mo-
mento, sentiu o líquido quente escorrer
pela sua orelha novamente e pensou, Porque isso sem-
pre acontece quando estou nervoso?
– Tira essa máscara, otário! – ordenou Meliora sacu-
dindo a arma de fogo.
Tobias obedeceu calmamente fazendo o máximo para
não demonstrar hostilidade e quando Meliora viu seus
olhos cheios de lágrimas, ela estremeceu. Foi como se
tivesse visto um fantasma.
E era.
Suas pernas bambearam e ela caiu de joelhos, murmu-
rando no chão:
– Não... não é possível! Você está morto!
– Eu não entendo... Meliora?
Tobias deu um passo em direção a ela, para acudi-la.
Meliora recuperou a postura no mesmo instante e atirou
na árvore ao lado de Tobias.
– O próximo vai ser na cabeça! – gritou ela enquanto
as lágrimas desciam pelo seu rosto.
– Meliora, o que está acontecendo?
– Eu que pergunto. Você está morto. Eu juro, está mor-
to!
Tobias ficou encarando o momento crítico de Meliora
e depois de alguns segundos de silêncio, ela continuou:
– Meu falecido namorado, você tem o mesmo rosto
que ele. E não só isso, o mesmo nome também! Fico me
perguntando que tipo de brincadeira é essa?
– Então talvez seja isso. Algo assim explicaria minha
falta de memória e minha conexão com você. E se eu for
seu namorado e se eu não morri de fato?
– Impossível!
– Como você pode saber?
– Por que eu o matei! Eu atirei nele com essa arma e
depois queimei o seu cadáver!
Tobias sentiu uma pontada no peito com essa fala. A ga-
rota gentil, sublime que ele idealizou jamais faria algo as-
sim. Depois, secou as lágrimas e perguntou gaguejando:
– Por que você matou o seu namorado?
– Meu Tobias era um cara gentil, eu o amava. Não me
julgue como alguém cruel, você não sabe nada sobre
mim. Mas teve uma vez que ele sumiu por uma noite,
e quando voltou disse que foi visitar uma estrela verde
no céu e que ele agora tinha um segredo – Meliora secou
as lágrimas nos olhos sem piscar. – Depois disso, nosso
romance mudou. O Tobias ficou obcecado em descobrir
esse tal segredo que ele escondia dele mesmo e uma noi-
te, um abismo foi colocado entre nós. Ele acordou na
madrugada e tentou me matar, na briga eu peguei essa
arma e atirei nele. Eu não queria ser presa, então colo-
quei o corpo no carro, levei para fora da cidade e quei-
mei. E bem aqui nessa cachoeira foi onde despejei boa
parte das cinzas!
Tobias ouvindo cada palavra foi deixando a imagem
angelical de Meliora se transformar em algo mais sinis-
tro, sua paixão começou a ser gotejada por ódio e aos
poucos foi se afastando da sua consciência. Sem sua pai-
26
Rastro de Cthulhu
xão obsessiva por Meliora, sua mente ficou com um va-
zio e é nesse vazio que algo incomum poderia prosperar.
O pescoço do rapaz começou a se contorcer e num
rompante ele saltou em direção a Meliora, porém a jo-
vem não se afugentou e cumpriu sua promessa.
Ela explodiu a cabeça dele!
O trajeto da rajada terminou fazendo um buraco na
testa do outro. Tobias rolou pelo chão sacudindo o seu
corpo e o cheiro de carne queimada foi se misturando
com o cheiro de pólvora.
Meliora Silvestrini deu um grito abafado e um impul-
so quente lhe subiu pela garganta forçando a jovem a
vomitar próximo ao seu coturno. Ela estava pronta para
pegar o álcool e o isqueiro na sua bolsa quando a cabeça
de Tobias começou a arrastar o restante do corpo sem
vida. A cena pavorosa fez Meliora deixar a arma cair, em
seguida o som de ossos se quebrando pôde ser ouvido,
conforme a cabeça girava para lá e para cá, mostrando
um pus amarelado escorrendo pela orelha. A coisa ficou
ainda mais hedionda quando algo pútrido começou a
sair de dentro da orelha de Tobias, algo pútrido em um
formato de inseto.
Uma criatura esverdeada, muito parecida com uma
mosca e de incontáveis olhos ia se expelindo para fora
do ouvido de Tobias. Por mais que quisesse correr, Me-
liora não conseguia se mover e foi traída pela visão –
mesmo não querendo olhar, ela encarou a bizarrice.
Eis que então, a criatura falou com um sotaque de outro
mundo e uma voz chiada, muito aguda pôde ser ouvida:
 CONTO
– A raça humana já pereceu. A es-
trela verde de Shaggai vai se acender
no céu ao lado do nosso sultão demonía-
co... Aquele que está no centro de todo caos... Quando
a sua raça for extinta, nós fabricaremos nossos próprios
humanos, nossos fantoches para ir e vir por essa terra
prometida e servir na corte do magnífico AZA...
Um estouro interrompeu a voz aguda do monstro pe-
quenino.
Meliora não pensou duas vezes antes de agarrar sua
pistola e atirar contra aquilo. Se levantou agitada e
atirou mais vezes naquele corpo invertebrado. Não
satisfeita ela recarregou a arma trêmula e disparou no
que restou da cabeça e do corpo de Tobias. Nunca se
sabe de quais outros orifícios essas coisas poderiam
sair.
Com pressa, cobriu o corpo com folhas secas, despe-
jou álcool e o incendiou. Manteve a arma apontada o
tempo todo enquanto as chamas crepitavam. Sua mente
ficou vazia naquele dia.
E no dia seguinte.
Até que uma semana se passou.
Era quinta feira de novo e a cabeça de Meliora Silves-
trini continuava vazia. Por mais que tentasse ser forte,
ela não podia ignorar o trauma daquele acontecimento
na cachoeira.
Rastro de Cthulhu
O telefone tocou e Meliora atendeu sem pensar muito.
– Alô?
– Alô! É a Meliora? – A voz do outro lado parecia rouca,
mas era porque a ligação não era das melhores. – Olha, eu
sei que vai parecer loucura, mas eu acredito que você es-
teja em perigo! Algo aconteceu comigo e eu não me lem-
bro bem, só me lembro de estar em um lugar onde vários
homens repetiam o seu nome. E eu tenho quase certeza
que eles virão atrás de você. Desculpe, parece muita lou-
cura. Eu posso te explicar tudo, será que a gente pode se
encontrar? Se quiser a gente pode ir até a polícia...
– Qual é o seu nome? – perguntou ela respirando fundo.
– Meu nome é Tobias.
Silêncio.
– Meliora? Meliora? Será que podemos nos encontrar?
– insistiu a voz do outro lado da linha.
Meliora deixou o telefone em cima da cama, com o fio
esticado e caminhou até a janela do seu apartamento e
antes de olhar para baixo, olhou para o céu. Foi quando
ela vira uma estrela de brilho esverdeado e a mera ob-
servação daquele objeto cósmico congelara sua espinha.
Em algum momento da vida passamos a guardar um
segredo, algo tão incrível que o escondemos de nós mes-
mos. E a obsessão por essa busca, faz com que você seja
capaz de saber como será o seu fim, afinal, como bem
descobrimos, obsessão é clarividência.
Meliora do sétimo andar, olhou fixamente para o chão.
27
DE MESTRE PARA MESTRE Multissistema

WANDAVISION:
TEMAS
R
ecentemente WandaVision se tornou a série
mais assistida no mundo! A combinação de
sitcoms retrô, mistério, referências aos qua-
drinhos e leves doses de terror parece ter agradado
em cheio aos fãs, sem falar no fato de que a série é o
ponto de partida da esperada Fase 04 do Universo
Marvel Cinematográfico.

POR FABIO BENCHIMOL

 DE MESTRE PARA MESTRE
Mas, ainda que você não tenha as-
sistido a série, ou simplesmente não
goste desse universo, existem diversos te-
mas e recursos narrativos interessantes no programa, os
quais também podem ser utilizados em suas aventuras
e campanhas! Neste artigo, selecionamos alguns deles e
sugerimos formas interessantes de usá-los.
PARTE I - DIFERENTES ÉPOCAS,
DIFERENTES PERSPECTIVAS
WandaVision inicia sua jornada fazendo uma home-
nagem às sitcoms estadunidenses dos anos 50, e pros-
segue, a cada episódio, saltando através das décadas e
ajustando seus cenários, diálogos e visual dos persona-
gens. Embora essa ambientação seja atingida com mais
facilidade em uma mídia visual por conta de todos os
recursos cenográficos disponíveis, também é possível
utilizar o recurso de diferentes períodos históricos em
sua mesa de jogo mesmo sem recorrer à quase sempre
problemática viagem no tempo… veja algumas opções!
JOGAR COM UM ANTEPASSADO
Uma forma legal de usar épocas distintas em sua aven-
tura é fazer com que um (ou alguns) dos jogadores in-
terpretem um antepassado ou ancestral cuja história es-
teja interligada com a trama principal da aventura.
Mesmo que os personagens atuais não tenham aces-
so às mesmas informações ou memórias dos antepassa-
dos (isso fica a critério do Narrador), os jogadores cer-
Multissistema
tamente terão uma sensação de familiaridade quando,
por exemplo, encontrarem o mapa que o antepassado
escondeu séculos atrás, na esperança de que alguém fi-
nalmente encontrasse o tesouro! Isso pode potencializar
a imersão na trama principal, além de passar a ideia de
que os personagens estão envolvidos com algo grandio-
so, um mistério que atravessou gerações.
MESMO LOCAL, DIFERENTES PERÍODOS
Existe também a possibilidade de fazer com que o elo
de ligação entre diferentes períodos históricos seja um
lugar, e não uma pessoa ou objeto. Nesse caso, o am-
biente pode estar sob a influência de uma poderosa ma-
gia, ser o local de descanso de um Grande Antigo ou até
mesmo ser parte de uma realidade virtual afetada por
um vírus ou programa defeituoso.
Caso use esse recurso narrativo, o ideal é que, assim
como na série, a história dê saltos no tempo, com os per-
sonagens retornando após alguns anos ou décadas, para
finalizar algo em aberto ou impedir que o que quer que
tenha sido derrotado anteriormente, ressurja.
CENA INTRODUTÓRIA EM OUTRA ÉPOCA
Outro recurso interessante é fazer uma cena introdutória
ambientada em um período histórico distinto daquele
no qual a aventura irá se passar. Isso pode ser feito ape-
nas uma vez, no início da aventura, a cada novo capítulo
de uma campanha, ou até mesmo como uma cena de
interlúdio em algum momento apropriado, como, por
29
 DE MESTRE PARA MESTRE
exemplo, quando os personagens fo-
rem fazer uma longa viagem.
Mesmo que não haja nenhuma relação
de parentesco entre os personagens do passado e pre-
sente, e que cada cena apresente um novo grupo de per-
sonagens, elas devem ser focadas em algo ou alguém
que seja importante na trama, por exemplo, e cada nova
cena revelaria um pouco da história pregressa do objeto
ou pessoa através das eras. è preciso ter um certo cuida-
do para tornar essas cenas o mais objetivas possíveis, afi-
nal, a idéia é divertir e adicionar informações à história
principal, e não criar um novo grupo de personagens.
O ideal seria que, em algum ponto, os personagens ti-
vessem acesso ao conhecimento passado através dessas
cenas, mas, mesmo que isso não aconteça, os jogadores
poderão ficar mais interessados e imersos na trama.
MUDANÇA DE PERSPECTIVA
Outro recurso narrativo interessante é mudar o foco
através do qual a história é contada. WandaVision faz
isso, por exemplo, no episódio três, no qual a trama
abandona momentaneamente o cenário de Westview
e mostra alguns dos eventos que levaram à formação
do Hex, bem como revela que a história tem um escopo
bem maior do que inicialmente se imaginava.
No caso da sua aventura, talvez seja interessante sepa-
rar uma ou algumas sessões de jogo para narrar aconteci-
mentos que os personagens já presenciaram ou ouviram
falar, mas não tiveram participação direta. Talvez uma
batalha ou acontecimento isolado. Quem sabe os jogado-
res não iriam gostar de jogar uma sessão como vilões?
Também existe a possibilidade de narrar eventos dos quais
os personagens participaram, mas sob um outro ponto de
vista. Sabe aquela pequena missão que os aliados do grupo
completaram para ajudar os personagens a entrar ou sair da
fortaleza? Que tal transformar isso numa sessão? Os persona-
gens tombaram e estão à beira da morte? coloque jogadores
para interpretar os aliados que irão tentar resgatar o grupo!
Agora se você realmente gostar de desafios, que tal jo-
gar a mesma história com dois grupos diferentes, agindo
em lados opostos? As ações de um grupo poderiam ter
influência direta na maneira como o outro grupo avança
(ou não) na aventura!
MAS TUDO ISSO É MESMO REAL?
Talvez esse tema gere um certo trabalho adicional para o
Narrador, mas com certeza o resultado final vale a pena.
Os personagens podem estar inseridos em um contexto
onde acreditam terem entendido a situação, ou as regras
do local, ou alguma coisa semelhante… no entanto, tudo
o que presenciam não passa de algum efeito artificial
(magia, hipnose, alucinação, drogas, realidade virtual,
enfim… o que for mais adequado para o seu cenário).
A partir daí, os personagens vão recebendo pequenas
indicações de que algo está estranho e aos poucos vão
descobrindo que tudo o que tem como certo não passa
de uma grande ilusão (podem ser apenas alguns even-
tos, pode ser a vida inteira dos personagens). Esse tipo
30
Multissistema
de gancho funciona melhor como sendo o início de uma
aventura ou campanha, com os jogadores escapando des-
sa realidade imaginária e descobrindo o mundo real e a
si mesmos (eles podem ter até uma aparência diferente).
Esse recurso é a base de WandaVision, e dá margem
para uma infinidade de ganchos e tipos de história a se-
rem explorados.
PARTE II - TERROR
O terror nem sempre significa monstros horríveis, com
dentes afiados que atacam causando uma explosão de
sangue e entranhas. Muitas vezes a narrativa consegue
alcançar o objetivo de amedrontar ou causar desconfor-
to utilizando recursos muito diferentes.
Apesar do terror não ser o ponto principal de WandaVi-
sion, a série também flerta com esse gênero, especialmente
ao mostrar, ainda que de forma indireta e rápida, o efeito
dos poderes de Wanda nos moradores de Westview.
PESSOAS SEMPRE FELIZES
Em seus capítulos iniciais, a série trabalha bastante com
a ideia de que Westview é uma cidadezinha perfeita, onde
todos são felizes e tudo funciona às mil maravilhas… aos
poucos, é possível perceber que existem “rachaduras nas
paredes” e que a realidade pode não ser bem assim.
O terror pode estar embutido em algo aparentemente
inocente ou benigno, como uma cidade pacata onde todos
escondem um segredo sombrio, ou uma sociedade “per-
feita” onde algum grupo minoritário é prejudicado, etc.
DE MESTRE PARA MESTRE
Em termos gerais, qualquer ideia ou conceito de so-
ciedade que for levado ao extremo deve gerar distorções
e injustiças de algum tipo, afinal, o desafio das socie-
dades é justamente aprender a conviver e acomodar as
diferenças, e não extirpar tudo o que desviar do padrão
estabelecido. Só não esqueça de conversar com seu gru-
po para garantir que todos estejam confortáveis com a
temática que você escolher abordar e a forma como você
pretende conduzir a história, ok?
HEROÍNA OU VILÃ?
Ao seu próprio modo, WandaVision constrói sua trama
de modo a deixar dúvidas sobre o verdadeiro papel da
protagonista… seria ela apenas uma pessoa incompreen-
dida e emocionalmente abalada ou teria enlouquecido
completamente e se entregado ao lado mais sombrio de
sua personalidade? Essa incerteza ou conflito entre dife-
rentes aspectos de personalidade podem gerar situações
bastante interessantes em sua mesa de jogo.
Provavelmente não será possível utilizar esse recurso
com todos os personagens ao mesmo tempo, mas com
um pouco de planejamento, você pode colocar cada um
deles em seu próprio dilema moral ou situação que de-
safie suas convicções mais ferrenhas. Esse tipo de situa-
ção, além de ser uma ótima oportunidade de roleplay,
também pode mudar o rumo de uma história ou as mo-
tivações do personagem.
Outra possibilidade é escolher apenas um persona-
gem (se possível, aquele que naturalmente exerce mais
31
Multissistema
influência no grupo) e colocá-lo nessa jornada de esco-
lhas difíceis e realmente desafiadoras… será que o res-
tante do grupo apoiará todas as suas decisões? no final
da história, ele ainda será tão querido quanto no início?
PRISÃO SEM MUROS
Outro exemplo interessante, retirado do episódio do Hal-
loween, é a cena em que uma mulher está aprisionada
pelos poderes da Wanda e fica repetidamente tentando
pendurar um enfeite no gramado de sua casa… a câmera
dá um close no rosto da mulher enquanto a vemos fazer
sempre os mesmos gestos e uma lágrima escorre pelo seu
rosto, indicando que tem consciência de sua prisão.
Cenas como essa nos mostram que nem sempre a tortu-
ra precisa causar dor física. Criar situações que perturbem
o equilíbrio psicológico dos personagens é uma ferramen-
ta poderosa para causar medo (inclusive nos jogadores).
Ainda que jogos como Rastro de Cthulhu tenham mecâ-
nicas específicas para isso e criem situações com essa fi-
nalidade, esse efeito pode ser atingido em qualquer outro
sistema, desde que o Narrador conheça minimamente os
personagens e suas motivações e os jogadores estejam de
fato imersos na história e se importem com as emoções e
o destino de seus personagens.
Novamente, sempre é bom conversar com os jogadores
para que a experiência de jogo seja de fato interessante e
instigante e não cause nenhum tipo de gatilho ou situação
que estrague a diversão do grupo. Bom-senso sempre!
ROLANDO OS DADOS Savage Worlds

TABELA DE
INTERLÚDIOS
EXTENDIDA

V
ocê gosta da regra de interlúdio em Savage
Worlds, mas acha que às vezes os temas po-
dem ser um pouco limitados? Essa tabela
foi feita pra você! E para a utilizar você só precisa
de um baralho, exatamente como faz para interlú-
dios normais. Se você não utiliza Savage Worlds,
mas gosta da ideia de permitir que os jogadores in-
terpretam cenas curtas sobre o passado dos perso-
nagens, essa tabela também pode ser útil.

POR RUBENS ALVES

 ROLANDO OS DADOS Savage Worlds

USANDO A TABELA # OUROS PAUS ESPADAS COPAS

Você precisar tirar duas cartas do bara- Ás de... Disputa Inveja Insegurança Dor
lho para decidir o tema do interlúdio. Dois de... Transtorno Rivalidade Arrogancia Inocencia
Três de... Medo Egoismo Compaixão Aprendizado
TIRANDO A PRIMEIRA CARTA Quatro de... Tranquilidade Amor Arrependimento Perda
O Naipe da carta decide o foco da lembrança.
Cinco de... Alegria Amizade Irritação Orgulho
NAIPE FOCO Seis de... Motivação Decepção Futilidade Vergonha
Lugar: A localidade tem um papel Sete de... Preocupação Temor Afeto Dever
Ouros
importante na lembrança Oito de... Perda Traição Transformação Abandono
Pessoas: Uma ou mais pessoas são elementos Nove de... Conquista Luxuria Cobiça Crença
Paus
importantes da lembrança
Dez de... Tristeza Engano Trauma Sorte
Atos: A lembrança está relacionada a alguma
Espadas Valete de... Glória Perda Mania Costume
atitude do personagem
Objetos: Um tipo de objeto ou item Dama de... Raiva Saudades Promessa Felicidade
Copas Rei de... Nostalgia Camaradagem Sonho Segurança
específico é o foco central da lembrança
Se qualquer uma das cartas for um coringa então o tema é livre, mas com um porém, os outros
TIRANDO A SEGUNDA CARTA jogadores podem cada um fazer uma pequena interrupção na história para adicionar um novo
A carta seguinte vai decidir o tema da lembrança, cada Coringa elemento a ela. Cabe ao jogador fazer o melhor uso desses elementos para criar um interlúdio
carta do baralho possui um tema diferente, totalizando 50 interessante. Se o grupo fizer um bom trabalho em conjunto ao criar o interldio conceda a
temas, note que há uma tabela para cada um dos naipes, todos um bene pela criatividade.
mas nessa etapa eles só servem para diferenciar as cartas. USANDO A TABELA SEM TER CARTAS A MÃO car cartas em /playing-cards/. Se você usa discord tam-
Tsc Tsc, despreparado você hein? Teoricamente seria pos- bém pode utilizar o bot Sidekick, que tem comandos para
USANDO APENAS UMA CARTA sível usar dados para consultar a tabela, mas não seria sacar cartas e as embaralhar de novo.
Se quiser agilizar mais você pode usar a tabela com ape- muito prático, ao invés de tomar um longo tempo expli-
nas uma carta, nesse caso a carta decide o tema e o foco cando como fazer isso eu vou dar algumas sugestões mais EXEMPLOS
ao mesmo tempo, embora isso possa limitar um pou- práticas. Existem diversas ferramentas online que permi- Se você ficou com dúvida como focos e temas podem
co as opções. Você também pode simplesmente ignorar tem sacar cartas aleatórias e elas podem ser acessadas de funcionar, aqui vão alguns exemplos.
o foco e deixar que os interlúdios sejam influenciados qualquer smartphone com acesso a internet. O exemplo Exemplo 1: O jogador tira a primeira carta do naipe de
apenas pelo tema. mais fácil é o site random.org, onde existe a opção de sa- espadas, o que significa que o foco serão os atos do perso-

33
 ROLANDO OS DADOS
nagem, depois ele tira a segunda carta,
dama de espadas, cujo tema é promessa. O
jogador pensa um pouco em um modo de rela-
cionar o tema ao foco e então descreve a seguinte lembrança:
“Uma vez eu eu fui aplicar um golpe em uma casa, uma
mulher atendeu, dona de casa, tão ocupada que não conseguia
raciocinar, caiu sem eu precisar sequer mostrar todos os docu-
mentos falsos. Depois que eu arranquei o dinheiro, ela pediu
licença por um momento porque o filho começou a chorar, ele
tinha alguma doença grave. Nesse dia eu deixei o dinheiro na
caixa de correio e prometi nunca mais tapear mães solteiras,
na verdade, qualquer pessoa honesta. “
Exemplo 2: O jogador tira o naipe de paus na primeira
carta, cujo foco é objetos e na segunda carta tira um va-
lete de paus, cujo tema é perda. Após pensar um pouco,
ele fala sobre como o personagem está admirando sua
velha espada, e conta:
“Não é uma espada muito boa, eu sei. Mas se eu usasse ou-
tra, seria como se deitar com um estranho. Meu avô forjou para
mim, ele era um ferreiro, mas estava mais acostumado a fazer
pregos e ferraduras do que espadas. Eu lembro de como passei o
inverno inteiro dizendo que queria uma espada de verdade, eu
era uma criança muito sonhadora, então ele fez essa, não tinha
fio. Quando a guerra começou ela foi afiada, a vila precisava
de todas as espadas possíveis para se defender dos saqueadores.
Quando o ataque veio meu pai morreu a empunhando e eu tirei
ela das mãos dele para tentar defender minha família. Minha
mãe e meus irmãos conseguiram fugir, mas deixamos tudo para
trás, exceto essa espada. É tudo que tenho daqueles tempos.”
Savage Worlds
FIGURAS DO PASSADO formação ao grupo, ou seja resgatado, espionado, mor-
to, etc, porque não torná-lo alguém um pouco mais sig-
Às vezes trombamos por aí com alguma figura do nosso
passado, então porque não nossos personagens? Se for nificativo? Role 1d20 para descobrir quem é essa figura
preciso que algum personagem aleatório dê alguma in- do passado.
D20
Um romance casual que terminou quando ambos perderam o interesse ao mesmo tempo, mas agora a
1
figura se encontra muito mais bem sucedida e influente do que você.
Uma rivalidade muito acirrada acerca de algo esdrúxulo, como quem consegue beber mais, ler mais livros
2
ou receber mais atenção de alguém, a figura continua tentando se provar melhor do que você.
Um amigo de infância companheiro de grandes lembranças que se tornou uma pessoa detestável sem nenhu-
3
ma semelhança a quem costumava ser.
Uma má influencia da juventude que tentou te convencer a fazer várias coisas duvidosas para beneficio
4
próprio, agora parece ter se regenerado e se tornado uma figura exemplar.
Um parente distante que te visitava de vez em quando, agora você começa a perceber que figura se parece muito
5 com você, ela é na verdade é seu verdadeiro pai/mãe que não pôde criar você então pediu para que parentes o
fizessem.
Uma figura que o atormentou muito quando ambos eram crianças, pregando peças cruéis e zombando. Ao se
6
encontrarem a figura demonstra vergonha e culpa em seu olhar.
Um antigo tutor que lhe ensinou boa parte do que você sabe hoje, demonstrando apenas paciência e
7
dedicação, ele continua fazendo o mesmo por outros hoje em dia, e fica feliz ao te rever.
Uma paixão intensa que nunca pôde ser concretizada para a tristeza de ambos. Um pequeno lampejo desse
8
sentimento retorna assim que trocam olhares mais uma vez.
Um inimigo que você quase matou em combate uma vez, deixando com uma terrível cicatriz. Ele
9 se tornou muito mais poderoso desde o último encontro, e pretende se vingar, mas de modo
meticuloso.
Uma companheira de aventuras que já salvou sua vida uma vez, antes de cada um seguir seu caminho.
10 Agora ela trabalha para mestres duvidosos, porque ganha mais com isso, ela não sente nenhum orgulho,
mas tampouco nenhuma vergonha de fazer o que precisa fazer para sobreviver.
34
ROLANDO OS DADOS Savage Worlds

D20
Um ferrenho rival com quem você já lutou muito no passado, vocês discordavam de absolutamente tudo, e por
11
isso tentavam superar um ao outro.
Uma vizinha gentil que sempre ajudava os necessitados e também já te ajudou algumas vezes. Ela
12
continua a ajudar as pessoas até hoje, só que agora está mais velha e sua situação financeira mais difícil.
Um colega com quem você já partilhou boas risadas, embora nunca tenha considerado um amigo de verdade.
13
Ele continua divertido como sempre.
Uma empregadora que sempre foi justa e generosa, o período em que você trabalhou para ela foi muito
14
benéfico. Agora ela parece estar tendo graves problemas para manter seus funcionários.
Um amigo de verdade que sempre confiou em você, até que se afastaram por um mal entendido e
15
algumas palavras duras no calor do momento. Ele parece ter guardado as mágoas dessa discussão.
Uma artista local que você sempre admirou durante a juventude até que ela simplesmente sumiu. Ela ela
16
está tentando reconquistar seu espaço após anos de silêncio.
Um parente que sempre pedia favores a você, sem nunca retribuir da mesma maneira, mas sempre vol-
17
tando para pedir mais favores. Mesmo após tanto tempo ele ainda acha que você deve ajudá-lo.
Uma pessoa obcecada com você, sempre tentando te impressionar chamar sua atenção. Mesmo após anos
18
essa obsessão parece não ter acabado.
Um aliado que traiu você em troca de algo que ele muito desejava, hoje ele tentar evitar sua presença e
19
criar desculpas esfarrapadas para o que fez, mas nunca se arrependeu de verdade.
Uma inimiga que já te derrotou uma vez, mas poupou sua vida, citando que não matar se puder evitar.
20 Ela deixa bastante claro que não vai hesitar uma segunda vez se ocorrer qualquer tentativa de vingança,
mas tampouco age como se você lhe devesse a vida.

35
ADAPTANDO Abismo Infinito

AMONG US
ABISMO INFINITO

E
m 2020 não houve jogo que cresceu mais em popularidade que Among
Us. Lançado há dois anos atrás, o jogo encontrou na quarentena o
momento perfeito para explodir e chegar ao topo da lista dos jogos
indie mais vendidos na Steam.
Seu conceito é bastante simples: Os jogadores são tripulantes de uma es-
tação de pesquisa, terminando às pressas seu trabalho. Eles sabem que en-
tre eles existem impostores, cujo objetivo é matar o restante da tripulação e
impedir que suas tarefas sejam todas completadas.

POR ENCHO CHAGAS

 ADAPTANDO
Apesar de ser um jogo casual e rá-
pido, sem muito foco na narrativa ou
no contexto em que os personagens estão
inseridos, as dinâmicas de Among Us são capazes de
gerar situações de conflito, apreensão, e terror. E nos co-
loca a pensar o que realmente está acontecendo neste lu-
gar. Quem são estes personagens? O que os motivaram
a aceitar esta missão? Qual a motivação do impostor?
Qual forma melhor de fazer isso senão transportar este
cenário para uma mesa de RPG. E um jogo sobre espaço,
desconfiança, terror psicológico… existe melhor sistema
para receber esta adaptação do que Abismo Infinito?
Vamos analisar as mecânicas mais características de
Among Us, avaliar tudo o que sabemos sobre o contexto
do jogo, e trazer para dentro desta adaptação.
UM IMPOSTOR NA MESA DE RPG
O espírito de competição entre jogadores é uma ideia
que nem sempre é bem traduzida em um jogo de RPG.
Mas é possível, principalmente em partidas de uma ses-
são, como pode ser o caso de uma adaptação de Among
Us. Os jogadores podem determinar quem fará esse pa-
pel, ou deixar para o Mestre a escolha.
Porém, ao invés de simplesmente ter um jogador jogando
como um impostor, podemos utilizar a narrativa a nosso fa-
vor. Talvez utilizando personagens não jogadores como im-
postores ou simplesmente não definindo quem será o impos-
tor, deixando o desenrolar da história levantar oportunidades
para que os jogadores descubram durante a partida.
Seguem algumas opções possíveis e sugestões sobre
como a partida deve seguir em diferentes casos:
□ Impostores antagonistas: Esta é a solução mais fácil,
onde o Mestre tem controle total sobre a narrativa e
a partida segue como uma sessão de Abismo Infi-
nito normalmente. Claro que o Mestre pode mudar
de ideia durante a partida ou elevar a narrativa a
outro nível criando sugestões de que talvez um dos
jogadores seja o impostor sem saber. De qualquer
forma, mesmo funcionando como antagonistas, per-
sonagens jogadores quaisquer também devem lidar
com seus medos. Pensar os medos de um Impostor
são uma camada de profundidade bastante interes-
sante para sua sessão.
□ Protagonistas Impostores: Este é o formato mais ób-
vio, mas certamente o mais difícil de ser executado
em jogo. Além da questão de deixar o antagonismo
nas mãos de um jogador, que precisa ser alguém ex-
periente para ajudar o Mestre na construção de um
ambiente de tensão desejável, os jogadores também
precisarão estabelecer formas de se comunicar com
o Mestre em segredo. Talvez por mensagens em tex-
to passadas diretamente.
□ Jogadores que não sabem que são impostores: No
cinema e na literatura temos vários exemplos de
personagens sem consciência de que na verdade são
os vilões da história. Seja por não perceberem a con-
sequência dos seus atos, ou perderem o controle do
personagem por alguns instantes (por sonambulis-
37
Abismo Infinito
mo, esquizofrenia, ou algum tipo de lapso tempo-
ral). Esse é um conceito que encaixa muito bem com
a mecânica de manifestações do medo dos persona-
gens, nativa de Abismo Infinito, e provavelmente
a experiência mais interessante que esta adaptação
possa oferecer. Além disso é uma dinâmica que agre-
ga aos jogadores o clima de suspeita e desconfian-
ça, pois qualquer um pode se revelar o antagonista.
Mais à frente vamos falar também sobre adaptações
de outras mecânicas do jogo, como as reuniões da
tripulação, e então fazer mais sugestões sobre como
essa dinâmica de jogadores não conscientes de seus
atos poderia funcionar na ficção.
Um fato importante a se considerar em uma partida
de Among Us é que os jogadores sempre sabem sobre a
existência de impostores entre eles. Apesar de ser uma
informação que os jogadores sabem por conhecerem an-
tes as regras do jogo, essa informação também acrescen-
ta uma tensão de imediato entre os personagens. Isso
gera uma urgência na realização das tarefas, o clima de
suspeita por cada um dos demais personagens, e cau-
tela ao andar pelos corredores. Para fazer isso o Mestre
pode inserir personagens não jogadores, que morrerão
antes dos jogadores para indicar o progresso dos vilões,
inserir pistas de que algum ato suspeito apenas poderia
ser feito por um deles, ou então simplesmente informar
ao início do jogo que os personagens sempre souberam
que haveriam impostores, por suspeita de seus contra-
tantes ou algo do tipo.
 ADAPTANDO
CRIAÇÃO DE
PERSONAGENS
A ideia básica de uma partida de Among
Us é que os personagens são todos parceiros de traba-
lho, responsáveis pelos experimentos e manutenção
da estação.
MEDO PARTICULAR
Em Abismo Infinito, a história se desenvolve a partir do
medo de cada um dos personagens, que se manifestam
e atormentam os personagens. Isso faz com que a ten-
são natural da dinâmica entre tripulantes e impostores
acabe ficando em segundo plano. Claro, vai da intenção
do Mestre ou do jogador o tipo de história que estão se
propondo a jogar.
Caso o jogador queira focar mais sua experiência na
dinâmica de Among Us, é aconselhável que o Medo
Particular escolhido esteja mais diretamente relaciona-
do com o jogo, por exemplo: “Medo de ficar sozinho”,
“Medo de ser traído por um companheiro”, “Medo do
escuro”, “Medo de não conseguir ser capaz de comple-
tar a missão a tempo”, “Medo de ser o impostor sem
saber”, etc.
ÂNCORAS
O mesmo que foi descrito para o Medo Particular pode
ser dito para Âncoras. Caso o jogador queira focar sua
experiência nas dinâmicas de Among Us, já que espera-
-se que seja uma campanha mais curta, intensa, e mor-
Abismo Infinito
tal, Âncoras que estejam diretamente ligados às dinâmi-
cas do jogo podem ser mais facilmente ativadas durante
a partida.
CARGOS
Todas as tarefas da estação, em teoria, devem poder
ser realizadas por qualquer tripulante, já que a mor-
talidade da sessão será alta e o destino dos tripulan-
tes não podem ficar na mão de um ou outro jogador
apenas.
Porém os cargos não precisam ser deixados com-
pletamente de lado. A experiência de um engenheiro
pode ajudá-lo a encobrir um ato de sabotagem, ou um
médico pode determinar a quanto tempo um corpo
está morto.
Lembre-se que apesar de Among Us ser um jogo ca-
sual, a magia da imersão do RPG está nos detalhes, e
principalmente na interação e profundidade dos per-
sonagens. Os cargos determinam a função de cada tri-
pulante na estação, então são uma parte crucial de sua
motivação.
OS EFEITOS DA HIBERNAÇÃO
CRIOGÊNICA
Em Abismo Infinito, uma das maiores razões para o iní-
cio das manifestações do medo dos tripulantes são os
efeitos da hibernação criogênica. Após tanto tempo con-
gelados durante as viagens de dobra espacial, é normal
a tripulação sofrer efeitos de confusão mental.
38
 ADAPTANDO
Existem várias mecânicas de
Among Us que podem acabar sendo
justificadas graças às confusões mentais
geradas pela hibernação. Não somente as manifestações
do medo, mas o mestre pode gerar suspeitas não neces-
sariamente verdadeiras, para gerar conflito até mesmo
entre os tripulantes, ainda a partida não possua jogado-
res impostores.
Um tripulante que deveria estar em uma posição, mas
foi visto em outra sala. Alguém que parecia estar fingin-
do realizar uma tarefa. Tripulantes se locomovendo por
dentro da ventilação. Esse tipo de informações podem
ser elaboradas inclusive para auxiliar o Mestre a escon-
der seus reais planos sobre a identidade do impostor,
principalmente se os jogadores escolherem jogar uma
partida onde os jogadores não sabem quem é o impos-
tor. O próprio jogador pode ter visões sobre coisas que
ele não sabe se aconteceram mesmo ou não.
Além disso outras características menores também
podem ser consideradas. Já pensou como os jogadores
simplesmente aparecem na sala de reunião quando o
alarme é acionado? Como todos chegaram alí? Porque
um impostor não matou alguém no caminho, sabendo
que todos estariam distraídos? Mas, considerando que
todos os personagens estão sofrendo de um fenômeno
psicológico grave, e se ao apertar o botão o nível de es-
tresse é tão grande que eles chegam a perder a memória
do espaço de tempo do caminho até lá?
Abismo Infinito
A ESTAÇÃO DE PESQUISA ELIMINANDO UM IMPOSTOR
Certamente a partida de RPG não deve girar tanto em tor- A única forma de combater os impostores é se reunin-
no de mecânicas básicas como “termine 10 tarefas e ganhe do e, em conjunto, compartilhar suas experiências a fim
o jogo”, mas sim uma construção de uma história que seja
de encontrar o farsante e expulsá-lo da nave, através do
mais satisfatória para os personagens. Talvez realizar algu-
Airlock. A sala que normalmente é utilizada apenas para
mas tarefas cruciais, ou até mesmo realizar apenas missões
de manutenção em uma missão de revitalização da estação. garantir o controle de pressão atmosférica dentro da es-
As tarefas possíveis são distribuídas entre alguns ti- tação quando alguém se locomover para dentro ou fora
pos: dela. Porém, ao se colocar alguém lá e abrir as portas
□ Tarefas curtas: Tarefas que podem ser feitas em me- voltadas para o espaço, o tripulante será sugado para
nos de uma cena, como organizar recursos da es- fora junto com o restante de ar que estava preso com ele
tação em caixas diferentes, ou ativar o sistema de
dentro do airlock.
navegação para mover a estação.
É importante lembrar que os cientistas são completa-
□ Tarefas longas: Tarefas que tomam mais de uma
cena, podendo ser tediosamente contínuas (aguar- mente inofensivos, e portanto não carregam armas ou
dar upload de dados), ou exigir várias etapas (fazer saberiam se defender. O poder de equipe é sua única
testes em tubos de ensaio, que demoram um tempo arma, desde que eles consigam superar seus medos e
até darem resultados). sobreviver aos impostores.
□ Tarefas comuns: Tarefas que todos precisam reali-
zar, como passar seu crachá de entrada ou usar sua
chave individual no console principal da estação.
Impostores não têm como realizá-las, por não terem
os documentos ou itens adequados.
□ Tarefas de crise: O impostor pode sabotar a estação,
forçando algum tripulante a consertar o equipamen-
to danificado. São tarefas como consertar o reator, o
sistema de oxigênio, a iluminação, etc. Muitas vezes
impostores podem realizar estas tarefas na frente de
outros tripulantes para convencê-los de sua inocência.
39
 APOIADORES PUNKVERSO
BIBLIOTECÁRIO:
Alexandre Ferreira da Silveira, Fabiano de Jesus da Silva, Gabriel Alves Rodri-
gues, Janary Damacena, Joao Amadeu Nascimento Vieira, Jáder José Bandeira
Tófoli, Luciana Nietupski, Luis Gustavo Remistico, Luiz Felipe Bruno, Marcelo
Passamani Machado, Matheus Gonzaga, Nina Bichara, Paulo Ramon Nogueira
de Freitas, Roberto "Necrobeto" Barreto Miyoshi Moreira, Thallys de Freitas Soa-
res, Victor Henrique, Victor Hugo Scatamburlo, Victor Scudeler Bechelli, Wallas
Pereira Novo, Walter Cordova Souza

PUNKER:
Amauri Antunes Pereira Junior, Artur Barroso Mirço, Bruno Vassalo da Sil-
va, Chrysthowam A. Santos, Daniel Tschiedel, Denis Oliveira, Emanuel Guilher-
me, Fabio Carvalho, Fabio Ramalho Almeida, Felipe Figueiredo, Felipe Menezes
Machado, Fábio Corrêa, Gustavo José Jordan Prado, Gustavo Tenório Pinheiro,
Hades Oneiroi, Helio Rodrigues Machado Neto, Igor Luís, Jefferson Geovane,
Kadu Araujo, Kirlian Silvestre, Lauro Ângelo Gonçalves de Moraes, Lucas Bar-
ros, Luiz Fernando Rossafa Dias Macedo, Lyonn Jarrie Valladares Mirandela dos
Santos, Maiquel Leonel, Mateus Herpich, Maykel dos Santos Braz, Milton Dio-
go, Nicholas Ataide Minora, Pedro Feio, Rafael Panczinski de Oliveira, Ricardo,
Mallen Machado de Souza, Rodrigo Giesta Figueiredo, Romullo Assis dos San-
tos, Sérgio Ricardo Almeida Matuda, Tadashi Gabriel Nishihira Katsuren, Valdir
Possani, Vitor Bornéo, Vitor Carvalho, Vítor Alves Patriarcha, Yon Justino

MESTRE:
Cristian Rodrigo, Daniel Diego Lacerda Cirilo, Fábio Medeiros, Lucas Mestre
Ferreira Alves, Luis Felipe Nadal Unfried, Miguel Souza Silva, Patricia Brito, Pe-
ter Bidel Schwambach, Stefano Aires, Yuri kleiton Araújo Sanches
CATARSE.ME/PUNKVERSO
 EDIÇÃO 017
MAIO/21

NA PRÓXIMA EDIÇÃO:
RAYA E O ÚLTIMO DRAGÃO
PARA SAVAGE WORLDS
E MAIS: GANCHOS PARA FOUR AGAINST DARKNESS
DE MESTRE PARA MESTRE: CONSTRUÇÃO DE MUNDO
FERRAMENTAS DO MESTRE: JOGANDO SAVAGE WORLDS COM EXTRAS