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XIX Congresso Brasileiro de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica

Geotecnia e Desenvolvimento Urbano


COBRAMSEG 2018 – 28 de Agosto a 01 de Setembro, Salvador, Bahia, Brasil
©ABMS, 2018

Contribuição ao Processo de Dimensionamento de Cortinas


Atirantadas
Juliana Gonzalez Figueiredo
COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, juliana.gonzalez.f@gmail.com

Fernando Artur Brasil Danziger


COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil, danziger@coc.ufrj.br

Marcus Peigas Pacheco


Instituto Politécnico/UERJ, Rio de Janeiro, Brasil, marcus_pacheco@terra.com.br

RESUMO: No presente trabalho são feitas análises de situações de projeto de cortinas atirantadas
com aplicação do Método Brasileiro (desenvolvido por Nunes e Velloso e adaptado do método de
Culmann), do Método de Ranke-Ostermayer e de um programa comercial que se utiliza do Método
das Fatias. É analisada a influência da forma de consideração das forças de ancoragem na base das
fatias para os fatores de segurança globais e as diferenças obtidas pelos diferentes métodos de
cálculo, as quais evidenciam a necessidade urgente de estudos e pesquisas a esse respeito.

PALAVRAS-CHAVE: Cortina atirantada, Método de equilíbrio limite, Programas computacionais

1 INTRODUÇÃO exemplo 1,5. Por outro lado, a ruptura dita


interna, cujo método correspondente era
A análise de estabilidade de cortinas atirantadas denominado Método de Ranke-Ostermayer
tem, como uma das questões fundamentais que (1968), considerava as ancoragens fazendo
precisa ser considerada em projeto, a maneira parte do mecanismo de ruptura, e assim se
pela qual as ancoragens participam da podia calcular o comprimento livre dos tirantes.
estabilidade. Nas primeiras edições da norma As forças nas ancoragens advinham do empuxo
brasileira correspondente, a NB-565, duas de terras correspondente, geralmente calculado
situações necessitavam ser verificadas: as a partir da teoria de Rankine e de diagramas
denominadas ruptura externa e a ruptura aparentes, obtidos de valores medidos em solos
interna. e situações semelhantes.
No primeiro caso, a ruptura externa, a Havia, entretanto, uma questão fundamental
ancoragem não participava do mecanismo de nas considerações da norma: o Método
ruptura. O método usualmente empregado para Brasileiro considerava que o atrito era
a análise correspondente era o chamado Método totalmente mobilizado, e o fator de segurança
Brasileiro (desenvolvido por Nunes e Velloso, era aplicado somente ao termo de coesão. Por
1963), que considerava a ruptura plana, outro lado, o Método de Ranke-Ostermayer
constituindo-se numa adaptação do Método de referia-se apenas ao caso de areias. Assim, a
Culmann. A força de ancoragem era calculada a verificação com aplicação dos dois métodos era
partir da superfície crítica e as ancoragens eram impossível. Posteriormente, Pacheco e Danziger
posicionadas além da superfície que possuía um (1991) generalizaram o Método de Ranke-
fator de segurança mínimo aceitável, por Ostermayer para o caso de solos com coesão,
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permitindo assim a verificação dos dois correspondente. Dessa forma, é delimitada no


métodos. maciço a região que precisa de forças de
Hoje predominam os programas de ancoragem para ser estabilizada.
computador com o emprego de Métodos de Para definição das forças de ancoragens a
Fatias, em que, na maioria dos casos, a força serem utilizadas, utiliza-se o fator de segurança
das ancoragens atua de duas maneiras: ajudando e θ crítico e a relação λ entre o fator de
no equilíbrio de momentos e aumentando as segurança crítico e o desejado.
tensões na base das fatias. Essa última é uma
questão que demanda ainda muito estudo.
No presente trabalho são feitas análises de
situações de projeto de cortinas, com dimensões
usuais e características de solos residuais de
gnaisse, comparando-se os métodos Brasileiro,
de Ranke-Ostermayer e de Fatias (Bishop
simplificado) com emprego de um programa
comercial.

2 MÉTODOS ESTUDADOS
Figura 1. Representação das forças atuantes pelo Método
Brasileiro (adaptado de Craizer, 1981).
Para os métodos estudados, não serão
apresentados os polígonos de forças que atuam
sobre cada cunha e nem a dedução das É preciso atentar às restrições do método
equações, visto que são apresentados de forma exige. Seu uso é indicado apenas para taludes
detalhada em diversas publicações. verticais ou praticamente verticais e apenas
taludes de solo homogêneo podem ser
2.1 Método Brasileiro – Costa Nunes e considerados nas análises.
Velloso (1963) Destaca-se que este conceito da definição do
plano de ancoragem através do emprego do
O Método Brasileiro, baseado no Método de Método Brasileiro é recomendado pela NBR
Culmann (1866), foi desenvolvido por Nunes e 5629/06 para outras formas de superfície de
Velloso (1963) e utilizado no projeto da ruptura, não somente para a ruptura em cunha.
primeira cortina atirantada construída no Brasil,
em 1957. Porém, diferentemente do Método de 2.2 Método de Ranke-Ostermayer (1968) –
Culmann, Nunes e Vellloso (1963) consideram Método Alemão
que todo o atrito está mobilizado, e o fator de
segurança está associado apenas à força de O Método de Ranke-Ostermayer realiza a
coesão. análise da ruptura interna das cortinas
O método não considera a participação das atirantadas admitindo-se que os tirantes
ancoragens no mecanismo de ruptura. Parte-se participam do processo de ruptura. O
da hipótese que a ruptura ocorre ao longo de um dimensionamento do comprimento livre é
plano que passa pelo pé do talude, formando um realizado com o intuito de se alcançar o fator de
ângulo θ com a horizontal (Figura 1). segurança desejado.
Arbitra-se o fator de segurança de forma a O fator de segurança é obtido pela divisão de
atender o fator de segurança preconizado pela Ah poss, que é o valor da carga do tirante com a
norma (normalmente de 1,5), e, em função cunha de ruptura, por Ah existente. Ah existente é
deste, determina-se o plano de ancoragem determinada por meio do empuxo atuante Ea
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(calculado através de métodos usuais de Ao se incluir reforço na análise, se vai muito


empuxo) e do espaçamento entre os tirantes. além da intenção inicial e por este motivo deve-
Podem ser consideradas três situações de se tomar muito cuidado com as considerações
modelo de análise: talude com uma, duas e feitas em cada programa. Embora as limitações
múltiplas ancoragens. Para situações com duas não impeçam necessariamente o uso do método
ou mais ancoragens, deve-se verificar o na prática, entender as limitações é vital para a
posicionamento de cada bulbo de ancoragem interpretação dos resultados.
em relação aos outros bulbos, observando se
pode ser considerado um fator instabilizante ou 2.3.1. Programa SLOPE/W
não para a superfície a ser analisada.
Destaca-se que o método alemão foi O programa SLOPE/W versão 2012, da
desenvolvido, originalmente, para solos empresa GeoStudio, foi empregado nas análises
granulares, o que consistia em uma do presente trabalho. O programa é atualmente
impossibilidade, uma vez que as análises de bastante em análises de cortinas atirantadas,
ruptura externa admitem coesão. De forma a tendo a vantagem de ser extremamente intuitivo
solucionar este problema, Pacheco e Danziger na inserção dos dados.
(2001) apresentaram uma generalização do No entanto, por ser um programa com código
método, propiciando sua aplicação para solos não disponível, não é possível alterar as
com intercepto de coesão e ângulo de atrito. considerações e as equações utilizadas para
cada método que o programa disponibiliza.
2.3 Programa computacional com aplicação
do método das fatias 2.3.2. Distribuição de tensões nas fatias

Os programas computacionais que utilizam o Utilizando o programa SLOPE/W, as cargas nos


método de equilíbrio limite possibilitam a tirantes podem ser consideradas de duas formas
análise de casos complexos. É possível nos cálculos: “cargas concentradas” ou “cargas
considerar-se estratigrafia complexa, condições distribuídas”, conforme será detalhado a seguir.
diversas de poro-pressão, vários modelos de No momento em que se definem as
resistência ao cisalhamento linear e não linear, características dos tirantes, é dada essa opção ao
quase qualquer tipo de forma de superfície de usuário.
deslizamento, cargas concentradas e reforço. De qualquer forma, os somatórios das cargas
A visualização gráfica de parâmetros de ancoragem consideradas no maciço são
diversos conduz a uma maior compreensão do exatamente os mesmos para ambos os casos.
método, particularmente as diferenças entre os
vários métodos disponíveis, mas também Opção de cargas concentradas - São aplicadas
evidenciou limitações nas formulações de as forças de ancoragem nas fatias que têm sua
equilíbrio limite. A exposição das limitações base interceptada pela linha de ação dos
revelou que o método talvez esteja sendo tirantes, e apenas nelas. Essa condição terá
empurrado para além do seu propósito. designação, por simplificação, de “cargas
O método de fatias foi inicialmente concentradas”. As outras fatias terão seu
concebido para a situação em que a tensão diagrama de corpo livre e polígono de forças
normal ao longo da superfície de deslizamento é afetado apenas pelas forças oriundas do próprio
influenciada principalmente pela gravidade solo e ação do nível d´água.
(peso da fatia). Desta forma, a tensão normal na É importante ressaltar que os valores das
base das fatias dependia basicamente do solo forças consideradas na base destas fatias
correspondente a cada fatia. específicas têm grandeza força por unidade de
comprimento. Como as nos tirantes são
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aplicadas pontualmente e os tirantes possuem Esta opção tem a vantagem de evitar os picos
um espaçamento horizontal pré-definido pelo nos valores das forças normais nas bases das
usuário do programa, o valor que é aplicado na fatias quando as cargas são consideradas nas
fatia consiste na carga aplicada a cada tirante bases das fatias (Figura 3). Logo, tem a
dividida pelo espaçamento horizontal. vantagem de apresentar valores mais prováveis
Utilizando esta opção, a distribuição de de distribuição de tensões, bem como essa
forças normais logicamente possui picos bem distribuição das tensões ajuda a superar
definidos. A Figura 2 apresenta um gráfico de problemas de convergência no programa
tensões normais na base das fatias versus (manual SLOPE/W, versão 2012).
número das fatias, referente a um dos casos
analisados neste trabalho.

Figura 3. Distribuição de tensões normais ao longo da


superfície de ruptura quando são consideradas “cargas
Figura 2. Distribuição de tensões normais ao longo da distribuídas”.
superfície de ruptura quando são consideradas cargas
concentradas. 3 CASOS ANALISADOS

Para a realização das análises pretendidas,


Opção de cargas distribuídas - Opção de análise foram feitas variações de parâmetros
adicionada mais recentemente ao programa, geotécnicos do solo e geométricos da cortina,
permite uma distribuição das cargas na base de tal como indicado a seguir.
todas as fatias interceptadas pela linha de ação
dos tirantes, não apenas nas que possuem sua a) Parâmetros geotécnicos do solo
base interceptada. Essa condição terá
designação, por simplificação, de “cargas Foram adotados dois grupos de parâmetros
distribuídas”. geotécnicos, considerados representativos de
Desta forma esta carga considerada, além de solos residuais, ou tropicais de uma maneira
ser a carga total do tirante dividida pelo geral. Para o primeiro grupo (denominado solo
espaçamento horizontal dos tirantes, ainda é 1), referentes a uma maior resistência do solo,
dividida pelo número de fatias que cada tirante adotou-se os valores de peso específico natural,
intercepta. γnat, de 18 kN/m³, coesão, c, de 10 kPa e ângulo
de atrito, , de 35°. Para o segundo grupo (solo
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2), os valores adotados foram γnat =18 kN/m³, c  Consideração de distribuição das tensões nas
= 5 kPa e =25°. fatias;
Considerou-se que a profundidade do nível  Quantidade de fatias utilizada na análise;
d´água encontra-se além do limite das regiões  Cargas atuantes nos tirantes, variando de 60
consideradas nas análises efetuadas, o que kN a 300 kN. Vale salientar que estas cargas
também é frequente em muitos casos (talvez a são dados de entrada do programa.
maioria) dos projetos de cortinas atirantadas em
encostas. Nas análises realizadas com o programa
Vale ressaltar que os parâmetros adotados já SLOPE/W 2012, para definição dos trechos
são admitidos estarem afetados pela sucção. livres dos tirantes a serem utilizados, partiu-se
Além disso, nenhuma consideração é feita no do critério do Método Brasileiro, recomendado
que diz respeito a eventuais variações por ação pela NBR-5629/06, qual seja ancorar-se os
de chuvas, tema que não faz parte do escopo da tirantes a partir da superfície de deslizamento
presente pesquisa. Os parâmetros de análise são com um fator de segurança de 1,5 sem levar em
considerados como parâmetros efetivos, a conta as forças de protensão introduzidas pelas
despeito da sucção, exclusivamente para as ancoragens no maciço. Ou seja, a primeira etapa
análises ora efetuadas. da análise consistiu em se pesquisar as
superfícies de deslizamento que apresentavam
b) Parâmetros geotécnicos da cortina FS = 1,5 para definir os planos de ancoragem
recomendados e assim os comprimentos livres
Foram consideradas três alturas de cortina, mínimos.
6 m, 9 m e 12 m, com diferentes comprimentos São apresentados a seguir nas figuras 4 e 5,
de trechos livres dos tirantes. Em todos os casos na forma de figura esquemática, os resultados
os seguintes parâmetros foram considerados obtidos através do Método Brasileiro e Método
constantes: de Ranke-Ostermayer para a cortina com 9 m. É
 Inclinação de 20° do tirante com a horizontal apresentado também, na figura 6, para esta
 Comprimento do bulbo de ancoragem de 6 mesma altura de cortina, o resultado da análise
metros no SLOPE/W para a opção de análise por
 Diâmetro do bulbo de 100 milímetros “cargas concentradas”, divisão em 30 fatias,
 Tensão de trabalho na superfície lateral do “solo 1”, carga aplicada para a qual FS ≥ 1,5.
tirante, no bulbo, de 160 kPa Vale salientar que o ponto que indica o fator
 Tirantes com cargas constantes, podendo-se de segurança na saída do programa SLOPE/W,
em princípio admitir-se como sendo cargas não corresponde exatamente ao centro do
de protensão círculo, o que é um erro da versão empregada
 Espaçamento horizontal dos tirantes de 2 m do programa. No resultado do programa é
apresentada a projeção da superfície potencial
c) Outros parâmetros de ruptura com FS ≈ 1,5, destaque para o trecho
livre e trecho ancorado mínimos recomendados
Uma vez que um dos principais objetivos do pelo programa (trecho ancorado recomendado
trabalho referia-se à questão das análises representado por retângulos brancos).
efetuadas pelo programa SLOPE/W, e a
influência da consideração das tensões na base
das fatias, outras variações de parâmetros foram
feitas:
 Distância do bulbo de ancoragem dos tirantes
à superfície potencial de ruptura;
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4 RESULTADOS OBTIDOS

4.1. Fator de segurança

Na Figura 7 é apresentado o gráfico dos fatores


de segurança com os resultados dos três
métodos analisados (Brasileiro, Ranke-
Ostermayer e Bishop Simplificado através do
Programa computacional) para a mesma cortina
de 9 m apresentada anteriormente.
Figura 4. Plano de ancoragem, comprimentos livres e Os fatores de segurança são fornecidos para
forças de ancoragem recomendados pelo Método todas as cargas nos tirantes analisadas e, para
Brasileiro – cortina 9 m. FS=1,50.
possibilitar a comparação entre os resultados,
utilizou-se neste gráfico os mesmos
comprimentos para os tirantes em todos os
métodos (comprimentos totais de 14, 11 e 9 m
com bulbos de 6 m).
Como as cargas nos tirantes para o método
de Ranke-Ostermayer são diferentes, foram
apresentados no gráfico os três valores de carga
obtidos para cada uma das linhas de tirantes.
Para o programa SLOPE/W, foram
fornecidos os resultados para a opção de cálculo
“cargas concentradas”. Foram feitas análises
para a divisão em 4, 8 e 30 fatias através do
Figura 5. Superfície crítica e comprimentos livres (para programa, porém, como os resultados para as
tirantes com bulbo de 6 m) recomendados pelo Método três opções variaram muito pouco, optou-se por
Ranke-Ostermayer – cortina 9 m. FS=1,51. apresentar no gráfico os resultados para as
análises com 30 fatias no programa.

4,33
FS=1,5

2,75

0,91

Figura 6. Análise de estabilidade da cortina atirantada


com 9 m de altura e bulbos de 6 m – “cargas
Figura 7. Gráfico dos fatores de segurança obtidos através
concentradas” nas bases das fatias – Carga aplicada: 220
da análise dos 3 métodos utilizados, cargas variando de
kN - “solo 1”. FS=1,57.
60 a 300 kN, cortinas de 9 m.
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Para esta cortina de 9 m, é possível observar mais concentradas, pois são consideradas
que a variação dos resultados obtidos pelo somente no ponto da superfície de ruptura que
programa de Equilíbrio Limite foi muito grande os tirantes interceptam.
(FS variando de 0,84 a 2,08). Deve-se ter cuidado portanto, com a adoção
Como através do Método de Ranke- destas hipóteses utilizadas pelo programa, pois,
Ostermayer os comprimentos livres dos tirantes por mais que tenha a vantagem de simplificar a
poderiam ser menores para um bulbo de 6 m análise, podem induzir a critérios de projeto que
(Figura 5), o fator de segurança para esta considerem uma situação crítica diferente da
cortina, com cargas atuantes da ordem de 80 que realmente ocorre no maciço terroso.
kN, foi muito superior aos resultados obtidos no
programa de equilíbrio limite (FSRanke-Ostermayer = 4.3. Comprimento dos tirantes
2,67).
Para os três métodos apresentados (Método
4.2. Distribuição de tensões na superfície de Brasileiro, Método de Ranke-Ostermayer e
ruptura Método de Bishop Simplificado através do
programa SLOPE/W), o comprimento
As forças consideradas atuantes nas fatias recomendado foi resumido na tabela 1. O
através da hipótese de cálculo de “cargas comprimento dos bulbos foi mantido com 6 m
distribuídas” possuem valores um pouco mais em todos para fins de comparação.
próximos da realidade do que a opção “cargas
concentradas”, já que as forças normais Tabela 1. Comprimento mínimo do trecho livre dos
apresentadas não possuem pico de valores nas tirantes recomendados nas análises, bulbo 6 m.
Comprimento Trecho Livre do Tirante (m)
fatias interceptadas pelos tirantes. Método / Programa
Altura
cortina (m) T1 T2 T3 T4 T5
Pôde ser observado nas análises de Método Brasileiro 3,57 1,11
estabilidade realizadas no SLOPE/W que os Método de Ranke-
6 1,50 0,50 -
valores para os fatores de segurança para as Ostermayer
Método de Bishop
duas hipóteses foram muito semelhantes. simplificado - SLOPE/W
2,69 1,00

Porém, para algumas análises com cargas entre Método Brasileiro 6,49 3,84 1,19

200 kN e 300 kN, o fator de segurança Método de Ranke-


9 5,10 3,10 1,10 -
Ostermayer
apresentou uma redução brusca de valor para a Método de Bishop
4,33 2,75 0,91
opção de “cargas distribuídas”. Verificou-se a simplificado - SLOPE/W

Método Brasileiro 9,77 7,58 5,39 3,20 1,00


ocorrência desse erro nas análises para
Método de Ranke-
diferentes alturas de cortina, sendo este erro foi Ostermayer
12 10,00 8,00 6,00 4,00 1,80

mais recorrente para as análises com menor Método de Bishop


simplificado - SLOPE/W
6,21 5,18 3,95 2,51 0,84

divisão de fatias (4 e 8 fatias). No caso da


cortina mais alta (12 m), para a divisão com 30 Para as cortinas de 6 m e 9 m, o Método
fatias, também ocorreu esse problema, Brasileiro foi o que apresentou resultados mais
indicando que deveria ter sido utilizada uma elevados, enquanto para a cortina de 12 m, o
divisão ainda maior de fatias para evitá-lo. Método de Ranke-Ostermayer é que indica os
Partindo do princípio que as cargas nos maiores trechos livres, seguido pelo Método
tirantes se concentram nas bases das fatias, o Brasileiro.
programa SLOPE/W considera que o O programa SLOPE/W indicou, de maneira
incremento de tensões se dá somente ao longo geral, os menores comprimentos livres, com
da superfície de ruptura, o que é questionável. valores incluse menores dos que os
Esta concepção é assumida pelas duas hipóteses recomendados pela norma NBR 5629/06 e pela
possíveis de análise, sendo que na opção Fundação Geo Rio. Apenas para a cortina de 6
“cargas concentradas”, essas tensões são ainda m os trechos livres pelo Método Ranke-
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Ostermayer foram menores. Porém, este fato 2,39 m, 4,38 m e 5,17 m para as cortinas de
pode ser justificado pelos elevados altura 6 m, 9 m e 12 m respectivamente.
comprimentos do bulbo em relação a altura da Chama-se atenção para o fato de ter sido
cortina, já que o método considera a superfície obtido, para as 3 alturas de cortina, o mesmo
crítica atravessando o centro dos trechos fator de segurança pelo SLOPE/W para análises
ancorados. Conforme a altura da cortina com tirantes de comprimento bem diferentes.
aumenta, como o tamanho do bulbo se mantém Lembra-se que as análises foram feitas para os
igual em todas as análises, as dimensões comprimentos de bulbos de 6 m e para o
relativas do bulbo diminuem, com a superfície comprimento ancorado mínimo indicado pelo
crítica se aproximando da cunha ativa e SLOPE/W para cada altura de cortina.
consequentemente os comprimentos livres
mínimos indicados aumentando. Tabela 3 – Cálculo de FS com os comprimentos livres
Tendo sido os resultados entre o Método dos tirantes recomendados pelo SLOPE/W – cortina 6m.
Trecho livre Bulbo
Método / Programa FS
Brasileiro e de Ranke-Ostermayer (m) (m)

significativamente diferentes para algumas Método Ranke-Ostermayer


T1 = 6,00
6,00
2,63*
T2 = 4,00
alturas de cortina, realizou-se uma comparação Cortina H = 6m
Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) 1,55

na tabela 2 calculando-se o fator de segurança Método Ranke-Ostermayer


T1 = 2,69
6,00
2,20*
T2 = 1,00
pelo Método de Ranke-Ostermeyer utilizando Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) 1,55

os trechos livres recomendados pelo Método Método Ranke-Ostermayer T1 = 2,69


2,39
1,20*
T2 = 1,00
Brasileiro (ambos utilizando bulbos de 6 m). O Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) 1,55

resultado foi preocupante para a cortina de


maior altura, com o fator de segurança sendo Tabela 4 – Cálculo de FS com os comprimentos livres
1,19 em contraposição ao valor de 1,5 dos tirantes recomendados pelo SLOPE/W – cortina 9m.
Trecho livre Bulbo
Método / Programa FS
apresentado pelo Método Brasileiro. (m) (m)

Método Ranke-Ostermayer T1 = 8,00 2,67*


T2 = 5,00 6,00
Tabela 2 – Cálculo dos fatores de segurança Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) T3 = 3,00 1,57
Cortina H = 9m

utilizando os comprimentos livres dos tirantes Método Ranke-Ostermayer T1 = 4,33 1,36 *


recomendados pelo Método Brasileiro. T2 = 2,75 6,00
Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) T3 = 0,91 1,57
Trecho livre Bulbo
Método / Programa FS
(m) (m) Método Ranke-Ostermayer T1 = 4,33 0,92 *
T2 = 2,75 4,38
Cortina H = 6m

Método Brasileiro 1,50 Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) T3 = 0,91 1,57


T1 = 3,57
6,00
T2 = 1,11
Método Ranke-Ostermayer 2,84 *
Tabela 5 – Cálculo de FS com os comprimentos livres
dos tirantes recomendados pelo SLOPE/W – cortina 12m.
Cortina H = 9m

Método Brasileiro 1,50


T1 = 6,49
Trecho livre Bulbo
T2 = 3,84 6,00 Método / Programa FS
(m) (m)
T3 = 1,19
Método Ranke-Ostermayer 1,57 *
T1 = 12,0
Método Ranke-Ostermayer T2 = 9,0 1,72*
Cortina H = 12m

T1 = 9,77
Método Brasileiro 1,50 T3 = 7,0 6,00
T2 = 7,58
T4 = 4,0
T3 = 5,39 6,00 Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W) 1,58
T5 = 3,0
T4 = 3,20
Método Ranke-Ostermayer 1,19*
Cortina H = 12m

T5 = 1,00 T1 = 6,21
Método Ranke-Ostermayer 1,06*
T2 = 5,19
T3 = 3,95 6,00
T4 = 2,51
Foram também comparados nas tabelas 3 a 5 Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W)
T5 = 0,84
1,58

os resultados para as análises realizadas no T1 = 6,21


Método Ranke-Ostermayer 0,89*
T2 = 5,19
programa de equilíbrio limite e o Método de T3 = 3,95 5,17
Ranke-Ostermayer. Além de indicar qual o Método de Bishop Simplificado (SLOPE/W)
T4 = 2,51
T5 = 0,84
1,58

comprimento livre que satisfaz a análise, o


SLOPE/W também indica o comprimento do
O resultado também foi preocupante, pois,
bulbo. Os valores indicados para os bulbos são
para alguns casos FS obtido através de Ranke-
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Ostermayer é menor que 1,5 e em outros menor FS=1,5, o resultado encontrado para o fator de
até que 1 (talude instável), enquanto O FS segurança através do método Ranke-Ostermayer
obtido pelo programa SLOPE/W se mantém não foi satisfatório, sendo menor que 1,5. Já
inalterado e maior que 1,5. para os casos das cortinas de 9 m e 12 m, os
Esta diferença tão significativa entre as resultados foram muito inferiores, com o talude
análises alerta quanto às premissas e aos se mostrando até instável de acordo com o
resultados encontrados pelo programa método (FS < 1). Para situações de contenção
SLOPE/W. mais complexas, como encostas com grande
inclinação e elevados desníveis, essa influência
5 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES do posicionamento do bulbo em relação à massa
ADICIONAIS instável de solo pode ser ainda mais importante,
devendo ser estudada com cautela.
Comparados os fatores de segurança obtidos Apesar da diferença na consideração das
para os três métodos utilizados (Brasileiro, forças utilizadas nas análises do programa
Ranke-Ostermayer e Bishop simplificado SLOPE/W (“cargas concentradas” e “cargas
através do programa SLOPE/W) e também o distribuídas”), os fatores de segurança, para um
comprimento mínimo indicado para o trecho mesmo grupo de parâmetros geotécnicos, de
livre dos tirantes envolvidos, foi possível maneira geral, foram muito próximos para as
observar que os resultados de trecho livre duas opções de cálculo. No entanto, para
mínimo indicados para o Método de Ranke- algumas análises, para a mesma cortina
Ostermayer (para pequenas cargas, menores que atirantada o programa apresentou diferenças
100 kN) foram muito superiores aos outros consideráveis no fator de segurança apenas pela
métodos para as cortinas de 6 m e 9 m. Tal fato forma de consideração das forças de ancoragem
ocorre devido ao método considerar a superfície na base das fatias. Para a opção de análise por
crítica atravessando o centro dos trechos “cargas distribuídas”, para algumas situações, o
ancorados e os trechos ancorados terem grande fator de segurança teve um valor muito fora da
comprimento relativo à altura destas cortinas tendência e redução brusca quando comparado
(bulbos com 6 m). com o resultado da análise por “cargas
Através da análise do emprego do programa concentradas”. De uma maneira geral, em
SLOPE/W, uma importante conclusão pôde ser ambas as hipóteses, mesmo o uso de apenas
obtida: estando o bulbo após a superfície quatro fatias foi satisfatório para as situações
potencial de ruptura encontrada pelo programa, analisadas. Observou-se, porém, que com o
o posicionamento do trecho ancorado não aumento da quantidade de fatias, esse erro pode
interfere no fator de segurança. Tal fato faz com ser evitado, mas deve-se tomar sempre o
que se obtenham fatores de segurança cuidado de verificar diferenças entre estas duas
satisfatórios (acima de 1,5) com comprimentos concepções de análise. Em alguns casos, a
livres bem reduzidos. A aplicação da hipótese de “cargas distribuídas” conduziu a
metodologia utilizada pelo Método Brasileiro e valores inconsistentes de FS, mesmo no caso de
recomendada pela NBR 5629/06, que não deve 30 fatias.
ser de forma alguma negligenciada, fica, no Destacou-se que a opção do SLOPE/W por
entanto, a cargo do projetista. Portanto, em “cargas distribuídas” apresenta uma distribuição
países onde o Método Brasileiro não é de tensões com valores um pouco mais realistas
amplamente utilizado, as análises por esse da situação que realmente ocorre no maciço
programa podem gerar soluções equivocadas. quando comparada com a opção “cargas
Para o caso da cortina de 6 m analisada no concentradas”. Mesmo ela pode não ser válida,
SLOPE/W, com trecho ancorado totalmente ou visto que o aumento de tensões pode não ficar
parcialmente dentro da área da superfície com concentrado apenas na superfície de ruptura.
XIX Congresso Brasileiro de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica
Geotecnia e Desenvolvimento Urbano
COBRAMSEG 2018 – 28 de Agosto a 01 de Setembro, Salvador, Bahia, Brasil
©ABMS, 2018

Para melhor avaliação das metodologias de Atirantadas: uma Extensão ao caso de Solos com
dimensionamento utilizadas para cortinas Coesão, III COBRAE – Conferência Brasileira sobre
Estabilidade de Encostas, pp. 525-530.
atirantadas, a monitoração dessas obras mostra- Pinelo, A.M.S. (1980). Dimensionamento de Ancoragens
se de suma importância. Através da medição e Cortinas Ancoradas, Lisboa, LNEC – Laboratório
das cargas e deslocamentos envolvidos, seria Nacional de Engenharia Civil, 170 p.
possível melhor avaliar a acurácia de previsões Ranke, A. e Ostermayer, H. (1968). Beitrag zur
feitas com programas de Equilíbrio Limite nos Stabilitatsuntersuchung Mehrfach Verankerter
Baugrubemumschlie (Contribubuição para a
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