Você está na página 1de 102

Gabriela M. N.

Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 1

PELE ESTRUTURA E FISIOLOGIA


A pele, que corresponde a 15% do peso corporal, é considerada o A pele é constituída, basicamente, por três camadas: EPIDERME (mais
maior órgão do corpo → reveste e delimita o organismo, protegendo- externa), DERME (intermediária) e a HIPODERME (mais profunda).
o e interagindo com o meio exterior. A pele apresenta alterações
- a transição entre a epiderme e a derme é denominada junção
constantes, sendo dotada de grande capacidade renovadora e de
dermoepidérmica ou zona da membrana basal → essa estrutura é
reparação, e de certo grau de impermeabilidade.
bastante irregular, sendo repleta de projeções da epiderme para
Sua mais importante e vital função é a conservação da homeostasia dentro da derme, chamados de cones interpapilares.
(termorregulação, controle hemodinâmico e produção e excreção de
metabólitos) → desempenha, ainda, função sensorial, por intermédio
dos elementos do sistema nervoso situado na derme, e função de
defesa contra agressões físicas, químicas e biológicas, para a qual se
destacam, pela sua importância, a ceratinização, o manto lipídico e o
sistema imunológico.
Funções da pele:
PROTEÇÃO : rigidez da pele ocorre pela sua espessura, coesão estrutural
entre os ceratinócitos e adesão da epiderme à derme; além disso, a
melanina e os antioxidantes presentes protegem a pele das radiações.
TERMORREGULAÇÃO : sistema de glândulas sudoríparas e a propriedade
de vasodilatação cutânea promovem a eliminação de suor e a
refrigeração do organismo, cruciais para a nossa sobrevivência.
RESPOSTA IMUNOLÓGICA : a resposta imune inata e adquirida atua
principalmente na pele, pois é a pele a primeira linha de defesa no
sistema imunológico contra substâncias tóxicas, bactérias e células
neoplásicas recém-formadas.
BARREIRA À PERDA DE ÁGUA E DE SUBSTÂNCIAS : sem a integridade da EPIDERME
epiderme e, principalmente, da camada córnea, a perda de água
corporal para o meio ambiente resultaria em desidratação, distúrbios É um tecido epitelial estratificado ceratinizado, com variações
hidroeletrolíticos, perda de proteína, resultando em morte → essa estruturais e funcionais significativas dependendo da localização
situação pode ser observada em muitas doenças dermatológicas e no anatômica.
paciente grande queimado. É constituída por:
SENSAÇÃO : a pele e as mucosas são órgãos sensoriais orientando-nos - sistema ceratinocítico, composto por células epiteliais denominadas
em nosso contato com o ambiente, além de poderem produzir CERATINÓCITOS (correspondem a 80% das células da epiderme)
sensações percebidas como agradáveis ou incômodas. responsáveis pelo corpo da epiderme e de seus anexos (pelos, unhas
EXCREÇÃO : através das glândulas écrinas, a pele excreta água, e glândulas).
eletrólitos, HCO3-, ureia, metais pesados etc. os ceratinócitos originam-se da intensa atividade mitótica na
ENDOCRINOMETABÓLICA : a pele é o sítio de conversão periférica e CAMADA BASAL da epiderme, passando por um processo de
síntese de muitas substâncias, entre elas estão hormônios sexuais diferenciação estrutural e metabólica à medida em que migram para a
como estronas, testosterona, diidrotestosterona e a vitamina D. superfície, formando a CAMADA ESPINHOSA (ou DE MALPIGHI) →
essas células, após passarem por um rápido estágio em que se
- a pele e seus anexos sofrem um grande impacto como resultado da apresentam com o citoplasma mais basofílico e granuloso, a CAMADA
ação hormonal por possuírem receptores tanto para estrógenos GRANULOSA, transformam-se subitamente em células anucleadas, os
quanto para andrógenos → o declínio hormonal que acompanha a corneócitos, sendo eliminadas para o meio ambiente na camada mais
idade afeta a estrutura e a função da pele e de seus fâneros. externa da epiderme, a CAMADA CÓRNEA (barreira compacta e
Existem dois tipos de pele: impermeável).
- pele glabra: encontrada nas palmas e plantas, não possui folículos
pilosos nem glândulas sebáceas e sua espessura é bem maior, e
podemos distinguir diferentes camadas na epiderme → sua superfície
é dotada de sulcos e cristas, levando ao extremo a formação dos
dermatóglifos, responsáveis pelas nossas impressões digitais;
- pele com pelos e glândulas sebáceas: sua espessura é extremamente
variável dependendo do local na superfície corpórea; também varia
quanto ao tipo e densidade dos pelos e glândulas sebáceas ao longo
do corpo.

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

- sistema melânico, formado pelos MELANÓCITOS → células de - CÉLULAS DE LANGERHANS, com função imunológica → são
origem ectodérmica, cuja principal função é a síntese de grânulos responsáveis pelo reconhecimento e apresentação de antígenos para
chamados melanossomas ricos em MELANINA, uma macromolécula os linfócitos T.
que absorve a radiação UV → através de longos dendritos, cada
- CÉLULAS DE MERKEL, integradas ao sistema nervoso e que contém
melanócito “inocula” seus melanossomos em aproximadamente 36
os grânulos osmiófilos, contendo neurotransmissores que são
ceratinócitos, formando o conjunto melanócito-ceratinócitos, liberados mediante pressão sobre a pele, assim, atuam como
denominado unidade epidermomelânica. receptores mecânicos.
o número total de melanócitos varia segundo o sítio
- CÉLULAS DENDRÍTICAS INDETERMINADAS (função mal definida).
anatômico, não em relação à raça → o que determina os diferentes
tons de pele é a morfologia, tamanho e distribuição dos A derme desempenha uma influência reguladora sobre a morfogênese
melanossomos. e diferenciação epidérmica, sendo fundamental para a determinação
de sua espessura, arquitetura, tipo de diferenciação e padrão dos seus
o bronzeamento produzido pelo sol ocorre pela excitação da
anexos. O pH da pele situa-se entre 4,6 e 5,8.
tirosinase pela radiação UV, levando à formação de melanossomos
maiores e mais numerosos.

ANEXOS CUTÂNEOS
São estruturas que surgem de modificações da epiderme ainda na vida GLÂNDULA SEBÁCEA: são glândulas exócrinas que possuem um ducto
embrionária, sendo elas: folículo pilossebáceo, glândulas sudoríparas (desemboca no folículo piloso) e uma porção acinar (formada por
e unhas. células espumosas holócrinas, que descamam por inteiro liberando
sua secreção, o sebo). Também podem desembocar diretamente na
FOLÍCULO PILOSSEBÁCEO superfície da pele. Sua atividade é máxima durante a puberdade, pois
É composto pelo folículo piloso, glândula sebácea e músculo eretor sua regulação é feita inteiramente por hormônios androgênios.
do pelo. Possui várias terminações nervosas e, em algumas regiões
(axilas, mamas, púbis), desembocam no folículo as glândulas GLÂNDULA SUDORÍPARA APÓCRINA : só se desenvolve nas regiões axilar,
apócrinas (sudoríparas). genital e periareolar, a partir da estrutura embrionária do folículo
piloso → entram em atividade na puberdade por ação de hormônios
FOLÍCULO PILOSO: forma-se na vida embrionária como uma projeção androgênios e também respondem a estímulos nervosos.
de queratinócitos modificados (tricócitos) para dentro da derme que
ocorre por influência de células mesenquimais que, mais tarde, - é formada pelo ducto (desemboca acima do ducto da glândula
constituem a papila folicular (se localiza na sua porção mais inferior). sebácea no folículo piloso) e porção acinar (localizada próxima à
Histologicamente, é dividido em infundíbulo, que se estende de sua hipoderme e composta por células cuboidais apócrinas).
abertura (óstio) à inserção do ducto da glândula sebácea; istmo, da - produz uma secreção oleosa e inodora, que é comumente
inserção da glândula sebácea à região da inserção do músculo eretor metabolizada pela flora bacteriana na axila e região genital, produzindo
do pelo e da protuberância (área de concentração de células-tronco); o odor forte.
e bulbo (ou porção inferior do folículo), que, na sua extremidade mais
GLÂNDULA SUDORÍPARA ÉCRINA : responsável pela sudorese e
inferior, tem a matriz, responsável pela produção do pelo e que abraça
termorregulação do corpo pela perda de calor promovida pelo suor
a papila folicular.
→ tem distribuição universal, concentrando nas palmas e plantas. O
- existem três tipos de pelos: pelos terminais (espessos e ácino (porção secretora) encontra-se bem próximo à hipoderme,
pigmentados – couro cabeludo, barba, axilas, região genital – sofrem emitindo um ducto que vai desembocar diretamente na superfície.
influência dos hormônios andrógenos); pelo lanugo (pelos finos
- a termorregulação obedece a um set-point hipotalâmico, que emite
encontrados no feto); pelo velus (finos e sem pigmento – encontrados
impulsos às glândulas através de terminações simpáticas colinérgicas
no adulto e cobrem a maior parte do corpo, não sendo afetados pelos
(e não noradrenérgica como ocorre com o resto do sistema simpático
androgênios).
no organismo).

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

APARELHO UNGUEAL - infecção mais profunda: erisipela e celulite;


Consistem em placas laminares de ceratina protegendo o dorso das - profunda com tendência à supuração: abscesso e fleimão;
falanges distais → seu crescimento é lento (0,5-1 mm por semana) e
- abertura do folículo pilossebáceo: ostiofoliculite;
distal, surgido a partir da matriz ungueal proximal. É composto de
lúnula, eponíquio, lâmina ungueal, leito ungueal e hiponíquio. - profundidade do folículo piloso: foliculite;
- folículo piloso juntamente com sua glândula sebácea: furúnculo e
DERME carbúnculo;

É uma camada de tecido conjuntivo abaixo da epiderme, composta - glândula sudorípara écrina: periporite e abscessos múltiplos dos
por uma rede complexa de fibras (principalmente colágeno e elastina) lactentes;
e preenchida com material amorfo (macromoléculas retentoras de - unha e suas dobras: paroníquia e panarício.
água, como o ácido hialurônico), na qual são acomodados vasos,
nervos e anexos epidérmicos. A pele normal é rica em bactérias, que podem ser agrupadas em:
Fibroblastos, histiócitos, células dendríticas e mastócitos são suas - RESIDENTES PERMANENTES: colonizam a pele e vivem nela como
células residentes (responsáveis pela síntese e destruição da matriz comensais, sendo de difícil remoção → é geralmente constituída por
extracelular), enquanto linfócitos, plasmócitos e outros elementos cocos Gram-positivos (estafilococos coagulase-negativos),
celulares do sangue são encontrados em número variável e de forma bastonetes Gram-positivos aeróbios e anaeróbios, difteroides
transitória. (Corynebacterium e Brevibacterium), bactérias Gram-negativas, além
A interação com a epiderme é fundamental para a manutenção dos de fungos → esses microrganismos são capazes de conviver com um
dois tecidos: colaboram na formação da junção dermoepidérmica e pH relativamente ácido (entre 5,0 e 6,0) e uma osmolaridade
dos anexos epidérmicos, assim como no processo de reparação da relativamente alta.
pele. essa flora permanente varia quantitativa e qualitativamente
A derme pode ser dividida em três partes distintas: de acordo com vários fatores, como idade, sexo, raça, grau de
umidade e os locais anatômicos.
- Derme superficial ou papilar: mais superficial, em contato com a
membrana basal → grande celularidade e predomina fibras colágenas - RESIDENTES TRANSITÓRIAS (podem colonizar a pele e permanecer
mais finas e dispostas verticalmente; nela em pequeno número, por tempo variável, e são de remoção
relativamente fácil) → é representada, principalmente, pelo
- Derme profunda ou reticular: constituída por feixes mais grossos de
Staphylococccus aureus e pelo Streptococcus pyogenes, que são
colágeno, ondulados e dispostos horizontalmente.
bactérias do ambiente, tornando-se patogênicas em geral quando há
- Derme adventiícia: disposta em torno dos anexos e vasos e perda da integridade da pele.
constituída de feixes finos de colágeno, como na derme papilar.
A pele, quando intacta, funciona como uma importante barreira contra
a invasão de micróbios nos tecidos orgânicos, porém, pequenas
HIPODERME (PANÍCULO ADIPOSO) abrasões e o caminho dos folículos pilosos podem servir como porta
de entrada, permitindo a proliferação de bactérias patogênicas no
É a camada mais profunda da pele, situada abaixo da derme reticular
tecido cutâneo ou subcutâneo → dentre as bactérias patogênicas que
e constituída de lóbulos de adipócitos delimitados por septos de
invadem a pele, destacam-se o Staphylococus aureus, Streptococcus
colágeno com vasos sanguíneos, linfáticos e nervos.
pyogenes e o bacilo Gram-negativo Pseudomonas aeruginosa.
O panículo adiposo proporciona a mobilidade da pele sobre a
musculatura e também age como isolante térmico, depósito de Mecanismos de defesa da pele
calorias, amortecedor de traumas e função endócrina (por ex., O turnover celular é a descamação superficial da pele, processo
conversão periférica de hormônios sexuais). fisiológico de renovação celular e eliminação de células mortas que
favorece a “limpeza” externa da pele por eliminar possíveis agentes
patógenos presentes nessa região bem como dificultar sua
PIODERMITES (INFECÇÕES BACTERIANAS DA PELE) proliferação. O pH da pele é ácido, em torno de 4,7 e 5,75, que
As piodermites são processos infecciosos purulentos da pele e dos também dificulta a proliferação e agressão bacteriana por tornar o meio
seus anexos. inóspito a determinados agentes agressores.

Podem ser primárias (infecção em pele saudável) ou secundárias A pele não é inerte, apesar de formar uma barreira física para entrada
(quando a pele estiver previamente lesada ou ocorrer a partir de uma de elementos, permite as secreções de substâncias sebáceas, essas
infecção inicial de outro órgão); supurativas (decorrentes da que contém elementos antibióticos protetores ao organismo, e
proliferação das bactérias na pele) ou não supurativas (manifestações também produz resposta imune pelas células de defesa presentes nas
de hipersensibilidade a antígenos bacterianos). camadas celulares, por exemplo, as células de Langherans, mastócitos
e células dendríticas. Além disso, a própria flora bacteriana natural da
Podem ser classificadas de acordo com: pele serve como uma proteção ao organismo por agirem contra as
ETIOLOGIA: estafilocócicas (Staphylococcus aureus) ou demais bactérias patogênicas → porém, em condições de quebra de
estreptocócicas (Streptococcus pyogenes); barreira física por lesão ou diminuição da resposta imunológica, a flora
residente permanente pode iniciar processos patológicos graves.
PROFUNDIDADE DA INFECÇÃO NA PELE:
Fatores predisponentes: presença de macerações e lesões cutâneas
- infecção superficial da pele → impetigo e síndrome da pele
prévias, obesidade, tratamento imunossupressor, disglobulinemias,
escaldada estafilocócica (SSSS);
disfunções leucocitárias, diabetes, desnutrição e outras
- infecção da epiderme e derme → ectima; imunodeficiências.

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

PATOGENIA DAS PIODERMITES EPIDEMIOLOGIA DO IMPETIGO


Na patogenia das piodermites, diversos fatores devem ser O impetigo é uma doença universal, mas tem maior incidência e
considerados: impacto em áreas com condições socioeconômicas precárias, bem
- a interferência da flora residente → dificulta a colonização de outras como menor acesso ao sistema de saúde, pois afetam diretamente na
bactérias devido ao efeito supressor; higiene pessoal.
A principal faixa etária acometida é de bebês e crianças pré-escolares
- a barreira mecânica celular, com renovação constante da epiderme;
e escolares (entre 2 e 5 anos de idade) que, muitas vezes, tem
- o grau de hidratação da pele normal → quanto ↑ a umidade da pele, infecções de repetição pelo contato com adultos assintomáticos
mais fácil a multiplicação de bactérias; (bactérias podem colonizar a pele sem causar danos) → a forma mais
- o pH ácido dificulta e o pH alcalino facilita a multiplicação das predominante nessa faixa etária é a forma crostosa (não bolhosa).
bactérias; - as infecções de repetição, aglomerações e precárias condições de
- a barreira química (ácidos graxos não saturados - principalmente o higiene predizem picos de impetigo em crianças com convívio
oleico) produzidos à custa da ação da flora residente, sobretudo do próximo.
Propionibacterium acnes; Há predominância nos períodos quentes e úmidos como no verão,
- a patogenicidade e virulência do microrganismo → está relacionada pela maior proliferação bacteriana. Não há distinção entre sexos.
à capacidade de invasão da bactéria, pela presença de elementos O contato ocorre diretamente com a pele ou secreções de pessoas
antifagocitários na superfície do microrganismo e de sua capacidade infectadas ou colonizadas pelas bactérias e também por objetos
de produção de toxinas; pessoais como roupas e sabonetes, por isso, é essencial que existam
- a porta de entrada do germe → penetração diretamente na pele medidas de higiene pessoal.
produz inflamação e supuração e, consequentemente, a colonização
cutânea primária que pode determinar disseminação bacteriana via
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
hematogênica (causando bacteremia e septicemia); já quando a
infecção primária ocorre em outro órgão, as bactérias atingem a pele, IMPETIGO NÃO BOLHOSO (FORMA CROSTOSA)
determinando o comprometimento dos vasos cutâneos (trombose
vascular com hemorragia e até necrose do território cutâneo); O impetigo não bolhoso é a forma mais comum e mais contagiosa.
Isolam-se misturas de estafilococos e estreptococos, mas tem como
- a capacidade imunológica (celular e/ou humoral) do indivíduo → etiologia predominante o S. aureus, nos países industrializados e o S.
existem peptídeos antimicrobianos na superfície cutânea produzidos pyogenes nos países em desenvolvimento.
por ceratinócitos que, além da ação antibacteriana direta, são
ativadores potentes da resposta imune; além disso existem os A localização preferencial é em torno do nariz, da boca e nas
receptores Toll-like (detectam os patógenos invasores) e o sistema extremidades. A interrupção da barreira da pele permite a instalação
complemento. do processo infeccioso (exposição de receptores proteicos como a
fibronectina, que possibilitam a aderência pelo ácido teicoico das
bactérias) → ocorre no local de pequenos traumatismos como
impetigos escoriações, queimaduras e picadas de insetos.
São infecções piogênicas primárias da epiderme superficial Inicialmente ocorre mácula eritematosa que evolui rapidamente para
(subcórnea) e contagiosas → os agentes mais comuns são bolha e/ou vesícula de paredes finas transitória, porém a crosta
estafilococos e estreptococos 𝛃-hemolíticos do grupo A (S. resultante do dessecamento do conteúdo seroso ou seropurulento é
pyogenes) ou infecção mista. espessa e de coloração amarelada (lembra mel – melicérica).
- essas bactérias colonizam a pele e mucosa nasal (reservatórios Pode haver linfadenopatia satélite, mas as lesões não costumam deixar
naturais), sendo assim, em situações de quebra da barreira física da cicatrizes e não estão associadas a sintomas gerais (como a febre).
pele por trauma (coceira, feridas, microfissuras e picadas de inseto) Geralmente se resolve no intervalo de 2 semanas, se não tratado.
podem causar manifestações típicas do impetigo.
Os casos não complicados se curam sem deixar sequelas e a
- comumente ocorrem reinfecções se o reservatório não for complicação mais grave que pode ocorrer é a glomerulonefrite nos
identificado e devidamente tratado, bem como pode ocorrer infecções impetigos produzidos por estreptococos (pela deposição de
em pessoas próximas pelo contato direto com o paciente. imunocomplexos) → atinge mais frequentemente crianças entre os 2-
Utiliza-se o termo impetiginização quando o impetigo complica uma 4 anos, iniciando-se, em geral, 10 dias após o quadro cutâneo.
dermatose preexistente (p. ex., pediculose, escabiose, eczema etc.); - além dessa complicação, no impetigo estreptocócico podem ocorrer
nesse caso, em geral é de natureza estafilocócica. escarlatina, urticária e eritema polimorfo.
Acometem preferencialmente face e membros superiores, embora,
com disseminação por autoinoculação, possam comprometer
qualquer região.
- pápulas eritematosas surgem principalmente ao redor do nariz e da
boca → ao se romperem, tornam-se feridas inicialmente
avermelhadas e, depois, cobertas por crosta.
Existem duas formas: IMPETIGO BOLHOSO (estafilococos) e
IMPETIGO NÃO BOLHOSO (predomínio de vesicocrostas –
geralmente estreptococos ou infecção mista).

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

IMPETIGO BOLHOSO MEDIDAS DE CONTROLE


Ocorre mais em neonatos e lactentes. É mediado por toxinas Higiene pessoal, em especial lavagem de mãos; tratamento imediato
produzidas por subtipos de estafilococos e não há necessidade de dos casos iniciais; e desinfecção de ferimentos ou machucaduras.
solução de continuidade cutânea para o aparecimento das lesões → Em caso de epidemias deve-se impor, principalmente em creches,
essas exotoxinas agem contra as desmogleínas (proteínas de união
higiene rigorosa, em especial da lavagem das mãos.
dos ceratinócitos), fazendo com que os ceratinócitos se soltem,
percam a união entre si e haja o surgimento de bolhas na pele. Realizar cultura dos contactantes, em creches, para identificação dos
portadores assintomáticos em cavidade nasal para tratamento com
- é considerada a forma localizada da síndrome da pele escaldada
mupirocina.
estafilocócica.

Sindrome da pele escaldada


Tem como características clínicas a formação de vesículas que
rapidamente se transformam em bolhas grandes que sofrem processo
de pustulização → as crostas resultantes são finas e acastanhadas e,
por vezes, tomam aspecto circinado. estafilococica
As localizações preferenciais são face, períneo, nádegas e A SSSS (staphylococcal scalded skin syndrome) ou impetigo neonatal
extremidades. de Ritter von Ritterschein é uma doença bolhosa superficial produzida
pela toxina esfoliativa (esfoliatina) de subtipos do Staphylococcus
aureus → ocorre uma descamação da pele de forma intensa e difusa
após infecção pelo S. aureus.
- como o foco de infecção está distante dos locais de descamação, as
bolhas e a descamação não são infecciosos.

EPIDEMIOLOGIA
Acomete basicamente crianças, apresentando, na maioria das vezes,
curso benigno. Apesar de rara no adulto, mas quando presente tem
mortalidade de 60%, podendo chegar a 100% nos pacientes com
alguma doença de base, como insuficiência renal, imunossupressão,
etilismo, malignidade ou infecção por HIV.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é clínico, mas em alguns casos (falha terapêutica,
ETIOPATOGENIA
recorrência de lesões, pacientes imunodeprimidos ou para fins
epidemiológicos) pode-se realizar exames bacterioscópicos e cultura Duas exotoxinas participam na patogênese: toxina esfoliativa A (ETA)
para identificação do agente causal. e toxina esfoliativa B → essas exotoxinas agem na zona granulosa da
Entre os diagnósticos diferenciais, destacam-se herpes simples, epiderme, unindo-se à desmogleína 1 e, consequentemente, ativando
candidíase, dermatofitose, periporite e miliária. proteases que levam à formação de bolhas.
Cerca de 30% da população apresenta S. aureus na pele e nas
mucosas como organismo comensal, mas apenas 5% produzem a
TRATAMENTO toxina esfoliativa → isso ocorre porque, para o desenvolvimento de
Medida essencial é a limpeza e remoção das crostas com água morna SSSS, deve haver uma grande produção de toxinas ou deficiência na
e sabão → deve ser feita 2-3 vezes ao dia para prevenir a formação sua eliminação.
de novas crostas. Se houver dificuldade na retirada, as crostas devem
ser amolecidas previamente com óleo ou vaselina ligeiramente MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
aquecida. Em seguida, aplica-se pomada ou creme antibiótico, de uso
tópico e de baixo poder sensibilizante → por ex.: mupirocina ou ácido A infecção primária inicia-se, em geral, na conjuntiva, na nasofaringe,
fusídico, 2-3x/dia, durante 5 a 7 dias. no ouvido, no trato urinário ou na pele → paciente pode apresentar
fase prodrômica com febre, mal-estar, irritabilidade e prostração.
- é recomendável o uso de antissépticos (óxido amarelo de Hg a 0,5-
1%; ácido bórico a 2% em compressas ou cremes; permanganato de Em seguida, surge rash eritematoso escarlatiforme, mais pronunciado
potássio e outros). nas flexuras. A formação de bolhas flácidas ocorre em cerca de 24-
48h, de preferência nas flexuras (virilhas,
Quando há lesões disseminadas, é administrado antibiótico por via
nádegas, região posterior do joelho e
sistêmica → são indicados: penicilina comum ou semissintéticas
antebraço) e ao redor de orifícios, e, ao
penicilinase resistentes (como a oxacilina) ou as cefalosporinas.
se romperem, originam extensas áreas
- Cefalexina 500 mg, 30 a 50 mg/kg/dia VO, 4 x/dia, por 10 dias; ou exulceroexsudativas, de maneira que o
- Clindamicina 300 mg VO, 3 a 4 x/dia, por 10 dias; ou paciente assemelha-se a um grande
queimado.
- Amoxicilina 500 mg VO, 3 x/dia, por 10 dias; ou
- a descamação revela base eritematosa
- Azitromicina, 500 mg/dia VO, por 5 dias; ou de rápida cicatrização → pode ter sinal de Nikolsky (pele normal à
- Eritromicina 500 mg VO, 4 vezes/dia, por 10 dias. visualização, mas com o toque e tração da pele, ocorre a descamação).

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

DIAGNÓSTICO erisipela
O diagnóstico de SSSS baseia-se em três critérios: É uma infecção pelo Streptococcus pyogenes da derme superficial e
(1) a clínica, em que há eritrodermia, descamação ou formação de profunda, acometendo os vasos linfáticos, e que também se
bolhas; superficializa, atingindo a epiderme → pode ser considerada um tipo
especial de “celulite superficial”.
(2) o isolamento do S. aureus produtor de toxina esfoliativa → a
cultura deve ser feita de outras regiões, visto que as bolhas são - a porta de entrada da bactéria ocorre após perda da barreira cutânea,
estéreis; e podendo ser úlcera de estase ou lesões micóticas intertriginosas,
principalmente nos membros inferiores (especialmente quando há
(3) histopatologia característica, que consiste em clivagem
condições locais favoráveis ao desenvolvimento da infecção, como
intraepidérmica na altura da camada granulosa.
edema e estase venosa) → porém, há formas que ocorrem após
O principal diagnóstico diferencial da SSSS é com a necrólise traumas ou sem nenhuma lesão local.
epidérmica tóxica (NET), devendo ser afastada em especial pela
Fatores de risco: tinea pedis (infecção fúngica nos pés), insuficiência
histopatologia; nesta última, observa-se clivagem subepidérmica com
venosa, diabetes, tromboflebite, trauma, desnutrição,
necrose da epiderme.
imunodeficiência e doenças cardiorrespiratórias e hematológicas.

TRATAMENTO
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O paciente deve ser hospitalizado imediatamente e a antibioticoterapia,
O período de incubação é de 2 a 5 dias.
iniciada com a finalidade de erradicar o foco de infecção, além disso,
deve-se realizar o controle hidroeletrolítico rigoroso, para evitar Manifesta-se por eritema vivo e intenso edema doloroso, com bordas
complicações e também realizar a limpeza e curativos das áreas bem delimitadas (diferencia da celulite clássica), que avançam
descamadas (evitar infecções secundárias). rapidamente sobre a pele circunvizinha.
A antibioticoterapia deve ser parenteral, sendo a Oxacilina a droga de - quando o processo é intenso, surgem bolhas flácidas no centro da
primeira escolha → posteriormente, após a alta, é indicado o uso de lesão que podem se romper (erisipela bolhosa) e, até mesmo, necrose
Cefalexina, VO, por 7 a 14 dias. com posterior ulceração.
A lesão é quente e dolorosa, com preferência típica pela face (região
ectima malar) e pela face anterior, lateral ou medial da perna (em até 80%
dos casos).
Também chamada de impetigo ulcerativo, é uma infecção bacteriana
O início é agudo acompanhado de febre alta, calafrios, mal-estar,
que acomete mais crianças, frequentemente como evolução de lesões
adenite satélite à região acometida e náuseas.
de impetigo mal tratadas.
- o comprometimento linfático superficial facilita a disseminação lateral
De etiologia estreptocócica ou estreptoestafilocócica, inicia-se por
da infecção e determina um aspecto “em casca de laranja” da pele
pústula (vesícula de conteúdo purulento), que se aprofunda,
afetada.
originando uma lesão ulcerada (0,5-3 cm) recoberta por crosta
espessa e muito aderida, deixando, ao involuir, cicatriz. Pode ser Após a regressão pode haver surtos repetidos de erisipela (erisipela
única, mas, em geral, há várias lesões. recidivante) pela permanência de linfedema local, que favorece novos
surtos da infecção. Surtos sucessivos de erisipela podem conduzir ao
- as bordas são eritematosas, podendo ser infiltradas.
aumento progressivo da região, com edema e fibrose, que constitui o
Apresenta curso lento e doloroso e a localização preferencial é nas quadro da elefantíase.
pernas.
Como complicações, podem-se citar nefrite e septicemia. A
Diagnóstico é clínico, mas pode-se realizar o exame bacterioscópico mortalidade é rara, mas pode ocorrer sobretudo em crianças ou
e cultura para identificação do agente etiológico. Diagnóstico quando a doença acomete a face.
diferencial: leishmaniose cutânea e pioderma gangrenoso.
Além dos cuidados locais (água e sabão, compressas com água
boricada ou permanganato seguido de antibiótico tópico – mupirocina
2-3x/dia), muitas vezes utiliza-se antibiótico sistêmico contra
estreptococos.
A infecção determina cicatrizes e complicações, como celulite. Podem
ocorrer linfangite e glomerulonefrite.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

DIAGNÓSTICO O S. aureus e Streptococcus pyogenes são mais comuns em adultos


entre a 5ª e 6ª décadas de vida, acometendo mais extremidades e face.
O diagnóstico é fundamentalmente clínico. Pode-se realizar cultura
- celulite por anaeróbios e Gram-negativos é mais comum em
para identificação do agente infeccioso.
diabéticos ou imunodeprimidos.
Deve-se diferenciar de trombose venosa profunda e tromboflebite.
O uso de anticoagulantes favorece a rara apresentação hemorrágica e
as celulites recorrentes estão relacionadas a uma rede linfática já
TRATAMENTO comprometida.
A fisiopatologia da celulite não é bem elucidada, pois a carga de
A maioria dos pacientes não necessita de internação, exceto nos casos
microrganismos parece ser baixa, o que sugere que a celulite possa
de comorbidade (imunossuprimidos, lesões em face e falência do
ser mais uma reação às citocinas inflamatórias liberadas por
tratamento oral).
ceratinócitos e aos superantígenos bacterianos, do que uma infecção
Como medidas gerais, recomenda-se o repouso com membros tecidual maciça.
elevados, compressas frias, analgésicos (se febre ou dor) e
- a interação entre as proteínas de superfície do Streptococcus
desbridamento (se necessário). Alguns autores preconizam o uso de
pyogenes e as adesões na superfície dos ceratinócitos e das células
corticoterapia associada, pois com isso a evolução é mais rápida.
de Langerhans pode ser necessária para que a infecção se desenvolva.
Antibioticoterapia:
- casos graves (toxemia): Penicilina G cristalina 1-2 milhões U 4/4h; MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
- casos leves/moderados: Penicilina G procaína 600.000 U 12/12h ou
Penicilina V oral 250 mg 6/6h; O paciente geralmente apresenta início agudo com sinais flogísticos
intensos no local (eritema macular, dor, calor e edema), mais
- alérgicos a penicilina: Eritromicina 500 mg VO 6/6h. frequentemente encontrada em um membro inferior.
Outras substâncias alternativas e de igual benefício são as - a evolução é semelhante à da erisipela, sendo o eritema menos vivo
cefalosporinas (ampicilina, eritromicina e clavulanato + amoxicilina, e as bordas mal delimitadas.
ceftriaxone) → especialmente em caso de febre, calafrios e
manifestações sistêmicas graves. A presença de vesículas, bolhas, pústulas ou tecido necrótico
caracteriza infecção grave.
A profilaxia está indicada nos casos de erisipela de repetição, para
evitar a complicação linfática (elefantiasis mostra), sendo feita com Febre, calafrios, mal-estar e linfadenopatia regional podem estar
Penicilina G benzatina 1.200.000 U IM 4/4 semanas. associados.
A celulite hemorrágica (rara), principalmente descrita em pacientes

Celulite
com diabetes, imunodeprimidos e em uso de terapia anticoagulante,
é caracterizada por área de hemorragia dérmica e bolhas → TNF-α
A celulite é uma infecção aguda do tecido subcutâneo (derme parece ser responsável pelo dano vascular.
profunda e hipoderme) que se dissemina com bordas visualmente mal A celulite facial é mais comum em crianças, porém pode ser observada
definidas (em contraste com as bordas bem definidas da erisipela) e em adultos. A celulite pré-septal atinge de forma aguda os tecidos
o eritema menos vivo. palpebrais na região anterior ao septo orbitário → quando o processo
- pode envolver estruturas ainda mais profundas, como fáscia, ultrapassa os limites desse septo, passa a ser considerada celulite
músculos e tendões. orbitária, que constitui uma situação aguda, extremamente grave, pelo
risco de trombose séptica do seio cavernoso.
- como fatores predisponentes inclui-se trauma na região orbitária,
sinusite, e menos comuns, como dacriocistite (inflamação do saco
lacrimal), infecção dentária, infecção de pele, amigdalite, conjuntivite,
estado gripal, varicela e disseminação hematogênica.
Nos casos de celulite facial significativa, é mandatória uma avaliação
oftalmológica para descartar diplopia, defeito pupilar aferente e
redução da motilidade ocular → exames de imagem como radiografia
dos seios da face, ultrassonografia orbitária (pouco sensível) e TC de
ETIOPATOGENIA globo ocular são complementares ao diagnóstico.
A celulite se desenvolve quando microrganismos entram na derme e Complicações como glomerulonefrite pós-estreptocócica, linfadenite,
nos tecidos subcutâneos através de rupturas na barreira cutânea endocardite bacteriana subaguda e sepse são raras e mais comuns
(abrasão, ferida cutânea, mordedura, arranhadura, úlcera, em crianças e imunodeprimidos.
furunculose).
É causada pelo Staphylococcus aureus e, em segundo lugar, o
Streptococcus pyogenes (geralmente causa celulite não purulenta).
Entretanto, vários outros microrganismos podem excepcionalmente
resultar em celulite e geralmente isso ocorre em um hospedeiro com
imunidade alterada ou como o resultado de uma exposição específica
→ Pseudomonas aeruginosa, Pasteurella multocida, Capnocytophaga
canimorsus, Vibrio vulnificus e Cryptococcus neoformans.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Celulite x erisipela

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é clínico, mas em casos de dúvida, exame de imagem A cultura do foco purulento deve ser realizada em todos os casos de
como ultrassonografia de alta frequência, biópsia cutânea e cultura celulite associada a, ou adjacente a, uma ferida ou foco pustular →
para identificação do agente infeccioso podem auxiliar no diagnóstico. pode ajudar a identificar a presença de patógenos resistentes, como o
MRSA, e guiar a escolha do antibiótico.
- hemocultura geralmente é negativa, com exceção da infecção por H.
influenzae, que também cursa com leucocitose importante. Fatores de risco: episódio prévio de celulite; úlcera/ferida; dermatose;
tinha do pé interdigital; linfedema (após cirurgia e/ou radioterapia)
Os diagnósticos diferenciais mais importantes são tromboflebite
(pernas), angioedema e herpes-zoster (face) e erisipeloide (mãos).

TRATAMENTO
O tratamento inclui repouso com elevação do membro, analgesia e Em crianças < 5 anos, o H. influenzae é frequentemente o causador
antibioticoterapia sistêmica, que deve ser parenteral nos casos de celulite pré-septal e orbitária não relacionada com traumatismo →
intensos ou localizados na face, devendo-se considerar as tratamento é IV e pode ser feito com ampicilina, cloranfenicol ou
possibilidades etiológicas na escolha do tratamento. ceftriaxona.
A penicilina semissintética resistente à penicilinase ou a cefalosporina O uso de prednisona na dose de 0,5 mg/kg/dia é preconizado por
de primeira geração é uma terapia empírica adequada na maioria das alguns autores como terapia coadjuvante nos casos mais exuberantes
situações → preferência para cefalosporinas devido a maior causa ser ou com pouca resposta à antibioticoterapia.
por estafilos.
- na alergia grave à penicilina em que há a reação de
hipersensibilidade do tipo I imediata, é indicado um antibiótico não
betalactâmico.
- a fluoroquinolona pode ser indicada em alguns casos, mas os
médicos devem estar cientes de que tem sido associada a eventos
adversos incapacitantes e potencialmente irreversíveis do sistema
nervoso ou musculoesquelético, portanto, geralmente é reservada
como opção de segunda linha em infecções de pele e dos tecidos
moles quando for considerado inadequado usar outros antibióticos
comumente recomendados.
Etiologia estreptocócica: mesmo tratamento da erisipela → Penicilina
G cristalina 5 a 10 milhões U, via IM ou IV, a cada 4 ou 6 horas ou
Penicilina G procaína 400 mil unidades, 2-3 x/dia.
Etiologia estafilocócica (desde que não seja MRSA): Oxacilina 100 a
150 mg/kg/dia de 4/4h ou Cefalotina 100 a 150 mg/kg/dia IV, a cada
4 ou 6 horas.
Uma história de infecção por MRSA no paciente ou nos seus contatos
próximos deve levantar a suspeita desse organismo como a causa da
celulite → outros riscos incluem pessoas com exposição a hospitais
ou a cuidados em longo prazo, encarcerados, usuários de drogas
intravenosas, militares, homens que fazem sexo com homens ou
membros de equipe de atletismo.
- tratamentos sugeridos incluem vancomicina, clindamicina,
linezolida, daptomicina, doxiciclina e sulfametoxazol/trimetoprima ou
glicopeptídeos alternativos, como telavancina, dalbavancina ou
oritavancina.
Nos casos de celulite hemorrágica, é indicado, ainda, o uso de
corticosteroide sistêmico.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Foliculites
São localizações frequentes o couro cabeludo, a barba (sicose
lupoide) e os membros inferiores (foliculite decalvante de Arnozan-
São piodermites que se iniciam no folículo piloso, após uma oclusão Dubreuilh). A foliculite decalvante tem maior incidência no homem
folicular por queratina, hiper-hidratação ou infecção bacteriana ou adulto.
fúngica.
Compreendem forma superficial (ostiofoliculite) e duas formas
profundas (sicose e hordéolo) → o termo sicose aplica-se à foliculite
supurativa das regiões pilosas da face e ocorrem mais no adulto.
São doenças universais, que incidem em todas as idades.
Etiologia: Staphylococcus aureus (mais frequente) e bactérias Gram-
negativas (Enterobacter, Klebsiella, Escherichia, Serratia e Proteus).
São fatores favorecedores de foliculites, em geral: o barbear frequente
(cortes da pele podem servir como porta de entrada), dermatoses pré- O tratamento oferece resultados bastante precários e deve ser feito
existentes, uso prolongado de antibióticos, exposição a calor e com antibióticos por longos períodos → Dapsona pode ser útil na
umidade, obesidade e DM. dose de 100 mg/dia durante alguns poucos meses com resultados
As áreas mais frequentemente acometidas são face, couro cabeludo, após 2 meses e deve ser reduzida posteriormente para 25 mg/dia,
tronco, axilas, coxas, regiões inguinais e nádegas. assim como Dapsona tópica 1 a 2 vezes ao dia.
- também há relatos de eficácia na associação de Rifampicina (300
mg) e Clindamicina ((300 mg) 2x/dia, durante 2 meses.
FOLICULITE SUPERFICIAL
Também chamada de ostiofoliculite ou impetigo de Bockhart.
FOLICULITE QUELOIDIANA DA NUCA (ACNE KELOIDALIS)
Resulta da infecção do óstio folicular pelo
Caracteriza-se por sua localização típica na nuca. A doença se inicia
S. aureus e clinicamente apresenta-se
com foliculite profunda causada por estafilococos, posteriormente as
como pequena pústula folicular centrada
pústulas confluem e levam à formação de fístulas e fibrose de aspecto
por um pelo com pequeno halo
queloidiano.
eritematoso, de coloração branco-
amarelada, em número variável, que, após
ruptura e dessecação, recobre-se de
pequena crosta. No início podem ser
extremamente pruriginosas, mas são
indolores.
Na criança são comuns no couro
cabeludo, com reação ganglionar regional,
e, no adulto, nas faces anterior e interna das coxas e nádegas.
É um quadro crônico, rebelde e peculiar do homem adulto,
Geralmente apresentam resolução espontânea em 7 a 10 dias,
predominantemente de raça negra.
podendo deixar hiperpigmentação pós-inflamatória.
Medidas locais: remoção com pinça depiladora dos pelos encravados
O tratamento inclui o uso de antibióticos tópicos (ex.: mupirocina) e
e drenagem dos eventuais abscessos. O tratamento consiste no uso
sabões antissépticos, em geral suficientes. Além disso, deve-se
de antibióticos tópicos (clindamicina) e orais. Pode-se utilizar
recomendar o uso de roupas folgadas e porosas.
corticoide de alta potência tópico e intralesional.
Nas foliculites superficiais disseminadas e resistentes, empregam-se
Se a lesão for crônica e estável, excisão cirúrgica torna-se uma opção.
antibióticos sistêmicos: cefalosporinas, dicloxacilinas,
sulfametoxazol/trimetoprima, minociclina e clindamicina.
As foliculites de repetição podem estar associadas à contaminação FOLICULITE DA BARBA OU SICOSE
bacteriana nas narinas, no períneo, nas dobras cutâneas e à presença Caracteriza-se por sua localização (região da barba) e elevada
de comorbidades que induzam à imunossupressão → é indicado o cronicidade (se não tratadas) → exclusiva do adulto masculino.
uso de antibióticos tópicos nas regiões flexurais, interior das narinas
As pústulas podem apresentar-se isoladas ou confluentes, formando
e subungueais.
verdadeiras placas infiltradas,
centralizada por pelo.
FOLICULITES PROFUNDAS A sicose da barba não interfere no
crescimento da barba, mas a
FOLICULITE DECALVANTE chamada sicose lupoide é uma
É uma foliculite representada por pústulas relativamente superficiais, foliculite decalvante da barba, onde a
que leva à destruição dos folículos, resultando alopecia cicatricial. lesão é cicatricial.
É de evolução crônica e vai estendendo-se centrifugamente. Em Deve-se diferenciá-la principalmente
função da fibrose, vários fios podem emergir da mesma abertura da dermatofitose, herpes simples e pseudofoliculite.
folicular (politriquia) dando o aspecto típico de “cabelo de boneca”.

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

HORDÉOLO OU TERÇOL Existem alguns fatores de risco associados: histórico prévio ou familiar
e contato próximo com pessoas infectadas, obesidade (formação de
É a infecção aguda de cílios e glândulas de Meibomius (grandes dobras na pele que facilitam a proliferação bacteriana e dificultam
glândulas sebáceas localizadas nas placas tarsais das pálpebras). limpeza local), diabetes e outras situações de imunodepressão.
- quando a infecção atinge a glândula de Meibomius que produz a
camada lipídica do filme lacrimal, trata-se do hordéolo interno →
apresenta-se como nódulo eritematoso não na borda palpebral, mas MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
na face interna da pálpebra. Inicia-se por lesão eritematoinflamatória bastante dolorosa, centrada
- quando há infecção das glândulas de Zeiss e Moll, que são as por pelo, com evolução aguda (dias), levando à necrose central
glândulas sebáceas dos folículos pilosos correspondentes aos cílios, (carnegão), que acaba por eliminar-se.
constitui-se o hordéolo externo → apresenta-se como nódulo O furúnculo é um nódulo eritematoso, doloroso e quente → após 2-
eritematoso, discretamente edematoso, às vezes, centrado por pústula 4 dias, torna-se flutuante, formando uma tumoração eritematosa, com
localizado na borda palpebral. vários pontos de necrose, que evolui para grande área ulcerada; é
comum ocorrer discreta celulite perilesional.
- a ocorrência de várias lesões semelhantes determina o quadro de
furunculose.
É comum nas áreas mais pilosas e sujeitas à fricção, como axilas e
nádegas, e tem preferência pelo adulto jovem.

Para tratamento, recomenda-se limpeza minuciosa com compressas


de água morna que, às vezes, é suficiente para formas mais
superficiais. Pode ser necessário antibióticos em colírios e pomadas
oftálmicas antibióticas.

FOLICULITE NECRÓTICA
Caracteriza-se por lesões foliculares superficiais, mas com necrose
Quando há confluência, ao mesmo tempo e no mesmo lugar de vários
que deixa cicatriz varioliforme → é também denominada,
furúnculos, o quadro recebe o nome de carbúnculo, que é a
impropriamente, de acne necrótica.
denominação mundial para este quadro clínico → deve-se reservar o
Atinge a face de adultos seborreicos, principalmente do sexo termo antraz para a infecção pelo B. anthracis, conforme a
masculino, após 40 anos de idade. nomenclatura inglesa.
Clinicamente reconhecem-se duas formas, varioliforme e miliar: - o carbúnculo é típico do idoso, sobretudo diabético.
- a foliculite necrótica varioliforme caracteriza-se por lesões papulosas
eritematosas que evoluem rapidamente a necrose, recobrindo-se de
crosta hemorrágica aderente que, em 3-4 semanas, é eliminada,
deixando cicatriz varioliforme → as lesões em geral surgem em surtos
e produzem prurido e ardor. Acometem particularmente a margem
anterior do couro cabeludo e as têmporas, mas eventualmente,
atingem as bochechas e o nariz e raramente a face anterior do tronco
e dorso.
- a forma miliar produz lesões vesicopustulosas esparsas no couro
cabeludo que não evoluem a necrose e não deixam cicatrizes.
O tratamento se faz com tetraciclinas a longo prazo. Se o prurido for
DIAGNÓSTICO
significativo, utilizam-se anti-histamínicos.
O diagnóstico é clínico, mas o exame bacteriológico e antibiograma
podem ser feitos no caso de suspeita de MRSA comunitário.
FOLICULITE PERFURANTE
O principal diagnóstico diferencial é com a miíase furunculoide, que
Sua localização é o nariz, iniciando-se por comprometimento de uma
apresenta menos inflamação e orifício central. Hidroadenite na fase
vibrissa, que acaba perfurando a pele e elevando-se por uma lesão
inicial, devido a ser recidivante, e cisto epidermoide infectado.
cutânea inflamatória.

Furunculo | carbunculo TRATAMENTO

A furunculose é uma infecção estafilocócica necrosante do folículo O furúnculo tem tempo de evolução autolimitado em torno de 10 a 14
piloso e da glândula sebácea anexa que destrói esses anexos e deixa dias; portanto, o uso de antibiótico sistêmico antiestafilococos se faz
cicatriz → pode levar à formação de furúnculos que se estendem além mais no sentido da prevenção de uma furunculose do que do
da região dos folículos, acometendo tecido subcutâneo (carbúnculo). tratamento da lesão. No início do furúnculo, compressas quentes são
úteis.

10
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

As lesões com flutuação ou muito dolorosas devem ser drenadas. Nas A descolonização é feita com sabonetes antissépticos, como
lesões importantes de face, recomenda-se o uso de antibiótico via clorexidina, e uso tópico de mupirocina, no vestíbulo nasal, por 5 dias.
parenteral. Rifampicina, 600 mg/dia durante 10 dias, também tem mostrado
eficácia.
Nos casos de furunculose, além de afastar doenças de base que
possam estar predispondo ao quadro, é de grande importância o
tratamento dos reservatórios bacterianos.

REFERÊNCIAS
MEDCURSO. 2019
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014

11
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 2

ECZEMAS O eczema atópico, em geral, inicia-se a partir do 3º ou 4º mês de vida,


mas pode ter início mais tardio, inclusive na adolescência e na idade
Os eczemas correspondem a um grupo de dermatoses inflamatórias, adulta.
pruriginosas (causado pela liberação de substâncias que excitam as
O eczema seborreico pode estar presente ao nascimento ou ocorrer
terminações nervosas cutâneas), de etiologias variadas, com
já nos primeiros dias de vida; contudo, é muito mais prevalente a partir
características clínicas e histopatológicas comuns e muito bem
da adolescência e da idade adulta.
definidas, determinando uma verdadeira síndrome eczematosa → as
lesões elementares que definem os eczemas são eritema, edema,
vesículas, crostas e descamação. HISTOPATOLOGIA
- além das lesões, observa-se o prurido que dependendo da duração
A característica básica do processo é de natureza seroexsudativa,
e intensidade surge outro elemento: a liquenificação, que traduz a acometendo a epiderme e derme papilar na fase aguda → na camada
cronicidade do processo (espessamento da pele com acentuação das de Malpighi da epiderme, há exocitose e edema intercelular, o qual
marcas cutâneas normais, sendo resultado do atrito ou fricção
progride em horas, provocando “espongiose” (afastamento entre si
crônicos).
das células da camada de Malpighi, com adelgaçamento das pontes
- todos os eczemas são dermatites, mas nem todas as dermatites são intercelulares e enchimento dos espaços com serosidade).
eczantematosas. - com a continuação do processo, ocorre marcado edema intracelular,
A síndrome eczematosa pode ser classificada em: que provoca degeneração reticular (intenso edema intracelular leva à
ruptura das células epidérmicas e formação de bolha); também ocorre
- AGUDA → quando ocorre eritema, edema, vesiculação e secreção;
destruição das pontes intercelulares, formando-se, então, as vesículas
- SUBAGUDA → se o eritema e o edema são menos intensos e intraepidérmicas (vesícula histopatológica), que, dependendo da
predominam as manifestações de secreção e formação de crostas; intensidade, acabam por exteriorizar-se (vesículas clínicas) → se
- CRÔNICA → eczema de evolução prolongada, com liquenificação, rompem e liberam o exsudato, que, ao secar, forma crostas.
placa eritematosa e descamação. - por outro lado, o edema intercelular altera a ceratinização normal,
dando origem à formação de paraceratose (permanência de núcleos
achatados nas lâminas ceratínicas mais exteriores), cuja expressão
EPIDEMIOLOGIA clínica é a escama.
Os eczemas ocorrem com muita frequência, sendo mais comum o - na derme papilar, há vasodilatação e edema, o que justifica o eritema.
eczema de contato, seguido do atópico e do seborreico. Acometem
igualmente ambos os sexos e todas as raças. Na fase crônica, há espessamento de todas as camadas da epiderme,
ou seja, hiperceratose, hipergranulosa e acantose irregular
Com relação à faixa etária, o eczema de contato pode ocorrer em (espessamento da camada espinhosa ou de Malpighi da epiderme que
qualquer época da vida, sendo a dermatite das fraldas (eczema de pode ser resultante de hiperplasia ou hipertrofia), acompanhado de
contato por irritante primário) muito frequente no lactente, enquanto o ocorrência sutil de linfócitos → a lesão se apresenta clinicamente
eczema de contato por sensibilização é mais frequente após a infância. como liquenificação.
A concomitância dos achados das fases aguda e crônica, no entanto,
com menor intensidade, configura a evolução subaguda do processo.

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ecZema De contato
Pode-se distinguir 2 tipos de dermatite de contato, com etiologia e
fisiopatogenia absolutamente distintas:

É uma dermatose causada por substâncias do meio ambiente que - DERMATITE DE CONTATO POR IRRITANTE PRIMÁRIO (DCIP) →
entram em contato com a pele, ou seja, é considerada de origem corresponde a cerca de 80% dos casos, sendo o resultado de um
exógena. efeito tóxico local;

- pode estar relacionada ao trabalho do paciente, medicamentos, - DERMATITE DE CONTATO ALÉRGICA (DCA) → 20% dos casos,
cosméticos, plantas, joias, remédios caseiros, substâncias químicas, sendo um tipo de reação de hipersensibilidade tardia desencadeada
entre outros. quando a pele entra em contato com uma substância química com a
qual o indivíduo já foi previamente sensibilizado.
DERMATITE DE CONTATO ALÉRGICA DERMATITE DE CONTATO IRRITATIVA
Cosméticos (fragrâncias e conservantes), sais
metálicos (níquel, cromo, cobalto, mercúrio),
Água, sabões, detergentes, solventes, graxas,
Causas comuns germicidas (formaldeído), aditivos da borracha
ácidos e álcalis, poeira, fibra de vidro, plantas
(tiurans), resinas plásticas (epóxi, acrílico), resina
(colofônio), látex, medicamentos tópicos
Concentração do agente Menor Maior
Mecanismo Imunológico tipo IV (linfócito T) Não imunológico (lesão direta nos queratinócitos)
Sensibilização Necessária Desnecessária
Predisposição individual Sim Não
Teste de contato Positivo Negativo
Tempo de aparecimento das lesões
Algumas horas a dias Alguns minutos até 48h
após contato
Demarcação anatômica das lesões Menos frequente Geralmente típica
Resolução clínica +/- 3 semanas Após 96 horas
Afastamento da causa; corticosteroide Afastamento da causa; corticosteroide
Tratamento
tópico/sistêmico; anti-histamínico sistêmico tópico/sistêmico; anti-histamínico sistêmico

DERMATITE DE CONTATO POR IRRITANTE PRIM ÁRIO (DCIP)


A DCIP decorre dos efeitos tóxicos e pró-inflamatórios de substâncias Não há necessidade de sensibilização prévia e não ocorre a formação
capazes de ativar a imunidade da pele ainda que de maneira não de células de memória → portanto, qualquer indivíduo em contato
específica. com tais substâncias poderá desenvolver a DCIP, que frequentemente
A DCIP é provocada, em geral, por substâncias alcalinas ou ácidas ficará restrita ao local do contato.
fracas que, não sendo capazes de provocar queimadura e/ou necrose, - as duas principais variáveis são a concentração da substância (até
produzem apenas irritação cutânea → essas substâncias, ao entrarem certo limite, pois caso contrário será cáustica e causará queimadura e
em contato com a pele, causam lesão aos queratinócitos, surgindo, não uma DCIP) e o tempo de exposição.
posteriormente, reação inflamatória na derme papilar.

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Existem variações na suscetibilidade dos indivíduos e de regiões do Na DCI aguda tardia, os sintomas cutâneos só aparecem em 8 a 24
mesmo indivíduo que dependem, principalmente, da espessura da horas após a exposição e são acompanhados de ardência (queimação)
camada córnea → assim, é mais provável a DCIP ocorrer na pele fina e não de prurido → é uma resposta inflamatória retardada.
do dorso da mão do que na região palmar, como também é mais fácil
nas mãos finas de quem não está acostumado a serviços domésticos,
pois o contato crônico e gradativo com tais substâncias é capaz de
promover um espessamento epidérmico.
Outros fatores – tais como atrito, umidade e exposição solar – também
podem influenciar a ocorrência dessa dermatite → a DCIP é
frequentemente dermatose de caráter ocupacional (pedreiros,
químicos, pintores, donas de casa etc.).
Duas condições muito corriqueiras são a dermatite das mãos da dona
de casa (detergentes e sabões são alcalinos) e a dermatite das fraldas
(ação irritativa de fezes e urina).

PATOGÊNESE
Diversos mecanismos patogênicos têm sido associados à DCI, como
desnaturação das queratinas epidérmicas, ruptura da barreira de
permeabilidade, dano às membranas celulares e efeitos citotóxicos DERMATITE DE CONTATO POR IRRITANTE – CRÔNICA
diretos.
A DCI cumulativa é a mais comum, desenvolvendo-se lentamente
As reações agudas resultam de lesão citotóxica direta aos após exposição aditiva repetida a agentes irritantes brandos,
queratinócitos → inicia-se com a penetração através da barreira de habitualmente nas mãos → essas exposições repetidas causam
permeabilidade, o leve dano aos queratinócitos e a liberação de distúrbio da função de barreira que possibilita a penetração na pele de
mediadores inflamatórios que resultam na ativação das células T. concentrações até mesmo subtóxicas do agente agressor,
- TNF-alfa e IL-1 são os principais mediadores, sendo capazes de desencadeando resposta inflamatória crônica.
induzir a produção de outras citocinas, quimiocinas e moléculas de Os sintomas incluem ferroadas, pontadas, ardência e prurido, dor
adesão, acarretando recrutamento de leucócitos ao local. quando surgem fissuras.
A lesão crônica resulta de exposições repetidas, que causam dano às O ressecamento e a aspereza predispõem a formação do eritema, que
membranas celulares, com ruptura da barreira cutânea, desnaturação devido à cronicidade evolui com hiperceratose e descamação e,
das proteínas e toxicidade celular. consequentemente, formação de fissuras e crostas.
- danos aos lipídios do estrato córneo (que medeiam a função de - as bordas bem demarcadas se transformam em mal definidas, com
barreira) estão associados à perda de coesão dos corneócitos, liquenificação.
descamação e à perda de água transepidérmica → essa perda de água
que desencadeia a síntese de lipídios, proliferação dos queratinócitos
e hiperqueratose transitória durante a restauração da barreira cutânea.
- após a exposição crônica, o resultado é o aumento do turnover
epidérmico manifestado clinicamente por uma reação eczematoide
irritativa.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

DERMATITE DE CONTATO POR IRRITANTE – AGUDA


Normalmente ocorre em acidentes de trabalho, quando a pele é
exposta a irritantes potentes.
Podem ocorrer sintomas subjetivos dentro de poucos segundos após
a exposição (ferroadas de tipo imediato) → as ferroadas de tipo tardio
surgem dentro de 1 a 2 minutos, alcançam a sua intensidade máxima
em 5 a 10 minutos e desaparecem em 30 minutos. TIPOS ESPECIAIS DE DCIP
Manifestações cutâneas surgem poucos minutos após a exposição ou DERMATITE DAS FRALDAS
demoram até > 24 horas → eritema nitidamente demarcado, edema
superficial, vesiculação. Gerlamente o prurido é discreto ou ausente, Trata-se de uma reação inflamatória aguda, que acomete as regiões
sendo substituído por sensação de dor ou queimação. cobertas pelas fraldas, geralmente em crianças com menos de 2 anos
(início frequente entre o 1º e o 2º mês de vida).
- nas reações mais graves, ocorrem vesículas e bolhas, podendo
evoluir com erosões e até mesmo necrose. Sua etiopatogenia envolve diversos fatores, sendo o principal fator
desencadeante a oclusão constante da pele pela fralda, com inevitável
hidratação e consequente maceração da epiderme.

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

- a epiderme úmida é mais suscetível ao dano friccional ocasionado DERMATITE DE CONTATO IRRITATIVA PUSTULOSA E ACNEIFORME
pela fralda, tornando-se mais permeável aos irritantes presentes na
urina e nas fezes; Desencadeada por substâncias que levam à oclusão dos folículos
(graxas, óleos, fibra de vidro). Pode tornar-se pustulosa ou
- a inflamação induzida pela irritação friccional e química promove papulopustulosa, sendo essas pústulas estéreis e transitórias.
aumento da permeabilidade, facilitando, assim, infecção secundária
por Candida albicans, Proteus, Pseudomonas e B. faecalis.
DERMATITE DE CONTATO IRRITATIVA SUBJETIVA OU SENSORIAL
Manifesta-se clinicamente por lesões variadas, sendo mais intensa nas
superfícies convexas, enquanto as dobras são tipicamente poupadas. Caracterizada por relatos de pinicação ou queimação na ausência de
sinais cutâneos de irritações visíveis. Ocorre principalmente em face,
- inicialmente, a pele apresenta eritema de intensidade variável, com
sendo comum em usuários de cosméticos e pacientes com dermatose
brilho e pregueamento característicos; se houver agravamento do
preexistente, como dermatite atópica, rosácea e seborreica.
quadro, podem surgir edema, pápulas, vesiculação, erosões e
ulcerações → em uma fase mais tardia, o eritema perde o brilho e
ocorre descamação, que pode ser intensa. DERMATITE DE CONTATO IRRITATIVA TRANSPORTADA PELO AR
Eventualmente, surgem nódulos e pápulas simulando condiloma Geralmente ocorre na face, pescoço, parte anterior do tórax e nos
sifilítico ou erosões e ulcerações arredondadas, o que se denomina braços. As causas frequentes consistem em poeira, substâncias
dermatite das fraldas erosiva de Jacquet. irritantes e substâncias químicas voláteis.
Quando ocorre infecção por Candida albicans, a pele fica brilhante,
com descamação fina e induto esbranquiçado, acometendo DERMATITE VENENATA
primordialmente as dobras e, frequentemente, com lesões satélites
papulosas ou vesicopustulosas características. Ocorre após contato com plantas da família anacardiácea (gênero
Lithraea), como a aroeira, cajueiro, mangueira.
De início, agem como agentes etiológicos irritantes; mas o seu
princípio ativo (urushiol) é um potente antígeno, sendo capaz de
sensibilizar a maioria das pessoas → o quadro clínico passa a ser o
de eczema de contato, com erupção eritematovesicoescamosa.

O tratamento tem como base o uso de emolientes espessos, que agem


como barreira contra urina e fezes, e, principalmente, preparações
com óxido de zinco, elemento com ação anti-inflamatória.
- quando houver candidíase associada, cremes com nistatina ou
cetoconazol devem ser aplicados.
- nos casos com infecção bacteriana, antibióticos tópicos devem ser
utilizados.
Nos casos mais intensos, hidrocortisona a 1% pode ser administrada
por curto período de tempo. O uso de preparações com DIAGNÓSTICO
corticosteroides potentes não é recomendado, pois a oclusão
ocasionada pelas fraldas potencializa a ocorrência de efeitos colaterais O diagnóstico é estabelecido com base na história e no exame clínico,
locais, bem como eleva a absorção sistêmica. sendo que os testes de contato são negativos.

Uma complicação do uso intempestivo de corticosteroides tópicos de - o diagnóstico de dermatite de contato irritativa permanece como um
alta potência ou de forma prolongada no tratamento da dermatite das diagnóstico de exclusão → quando a dermatite não pode ser
fraldas é o granuloma glúteo infantil, caracterizado por nódulos explicada por um teste de contato positivo de um alérgeno conhecido.
assintomáticos, de coloração acastanhada ou violácea, na região das - outro aspecto que pode ajudar é que na DCI ocorre mais queimação
fraldas → não requer tratamento específico, além da suspensão do e pinicamento, enquanto na DCA ocorre muito prurido.
corticosteroide.
Diagnósticos diferenciais: o mais importante é com a dermatite de
contato alérgica; nas palmas das mãos e nas plantas dos pés (psoríase
DERMATITE ASTEATÓSICA palmoplantar) e em áreas expostas (dermatite de contato fotoalérgica).
Ocorre durante os meses secos de inverno. Prurido intenso é comum,
com a pele se apresentando seca com escamas ictiosiformes e com EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO
áreas características de pele superficialmente rachada (“eczema
craquelê”). A regressão ocorre em 2 semanas após a remoção dos estímulos
nocivos, sendo que em casos mais crônicos podem ser necessárias 6
semanas ou mais.
DERMATITE DE CONTATO IRRITATIVA TRAUMÁTICA
Mesmo com exposição contínua, alguns indivíduos podem apresentar
Desenvolve-se após um trauma agudo na pele, como queimaduras, “acomodação” ou “endurecimento”, como se fosse um mecanismo de
lacerações ou DCI aguda → lesões eczematosas, durando semanas a tolerância ou resistência → isso pode ocorrer por:
meses com eritema persistente, infiltração, escamas e fissuras.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

- melhora da barreira física (formação de um estrato córneo e estrato MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS


granuloso mais espesso e maior produção de ceramida);
A dermatite de contato alérgica (DCA) pode apresentar-se de três
- aumento da permeabilidade da pele a irritantes e alterações na
maneiras, sempre com muito prurido:
reatividade vascular que permitem uma remoção mais rápida de
substâncias irritantes; - aguda: eritema, vesículas, exsudação e crostas;
- alterações imunológicas que favorecem uma resposta anti- - subaguda: eritema, pápulas, escamas e crostas;
inflamatória a irritantes; - crônica: liquenificação.
- estado de hiporreatividade sistêmica após exposição repetitiva a É uma reação localizada na pele que houve o contato com o alérgeno,
irritantes em baixa dose. mas pode acontecer de ter uma distribuição difusa e desigual (devido
Prognóstico ruim está associado com histórico prévio de atopia, sexo a disseminação do alérgeno pelas mãos do paciente ao coçar).
feminino e presença de dermatite de contato alérgica. Quadros clínicos generalizados e até mesmo eritrodermia, que
caracteristicamente tende a ser mais exsudativa, podem ocorrer. Não
TRATAMENTO é infrequente a impetiginização secundária, bem como a função de
porta de entrada para desenvolvimento de erisipela ou celulite.
Profilaxia: evitar substâncias químicas irritantes ou cáusticas por meio
A morfotopografia é de grande ajuda no diagnóstico, por ex.:
do uso de equipamentos de proteção individuais (botas, luvas, roupas
especiais) → caso ocorra contato, lavar com água ou solução - face (cosméticos, perfumes, medicamentos tópicos, esmalte de
neutralizante fraca; uso de cremes protetores, pomadas e emolientes. unhas, tinturas para cabelos), orelhas (aparelhos auditivos, hastes
para limpeza, medicamentos tópicos), colo (perfumes, colares,
Aguda: identificação do agente causador; vesículas maiores podem cosméticos), pálpebras (esmalte de unhas, rímel, colírios,
ser drenadas; uso de glicocorticoides tópicos das classes I e II. condicionador e tintura de cabelos), boca e lábios (batons, pasta de
- em casos graves, pode-se indicar glicocorticoides sistêmicos dente, antisséptico oral, chicletes), axilas (desodorantes), mãos e
(prednisona: ciclo de 2 semanas, dose inicial de 60 mg, com redução antebraços (substâncias ocupacionais, plantas, pulseiras, relógio,
gradual em 10 mg). medicamentos tópicos), coxas e pernas (roupas, medicamentos
tópicos), pés (calçados, botas e meias), região genital (preservativo,
Subaguda e crônica: remover o agente causador; glicocorticoides
roupas, medicamento tópico), região anal (papel higiênico).
tópicos potentes (dipropionato de betametasona ou proprionato de
clobetasol) e lubrificação adequada.

DERMATITE DE CONTATO ALÉRGICA (DCA)


É considerada uma ruptura da tolerância aos haptenos do meio
ambiente → corresponde a uma reação de hipersensibilidade do tipo
IV (mediada por linfócitos T). É causada por uma reexposição a uma
substância à qual o indivíduo foi sensibilizado.
Sensibilizadores comuns incluem: metais (por ex., níquel em joias),
conservantes (por exemplo, formaldeído), fragrâncias (perfumes,
cosméticos), antibióticos tópicos e parafenilenodiamina (comumente
usados em tinturas de cabelo).

PATOGÊNESE
É uma resposta do tipo hipersensibilidade tardia, alérgeno-específica
que requer uma sensibilização anterior do indivíduo à substância
química.
Envolve uma fase se sensibilização inicial, quando o paciente entra
pela primeira vez em contato com a substância química, que penetra
na pele e inicia a cascata de eventos que resulta em sensibilização. A
reexposição subsequente acarreta apresentação do alérgeno
responsável a uma célula T já sensibilizada, ocasionando liberação de
citocinas e fatores quimiotáticos, resultando no eczema.
A exposição a um agente sensibilizante potente resulta em A denominada recall dermatitis pode ocorrer em pacientes
sensibilização dentro de uma semana ou mais, enquanto a exposição previamente sensibilizados e que, ao se exporem sistemicamente
a um alérgeno fraco pode levar meses a anos para sensibilizar → é (inalação pelas vias oral, intramuscular ou intravenosa) a um
esperado que o paciente diga que sempre usou determinado produto determinado agente ou relacionado a ele, seria capaz de desencadear
sem nunca ter apresentado aquela manifestação antes. a reativação de lesões em locais que já apresentaram previamente o
mesmo quadro de eczema → a manutenção do estímulo pode levar à
Em geral, a hipersensibilidade adquirida persiste por toda a vida, eritrodermia (dermatite descamativa inflamatória que envolve 90% ou
embora, eventualmente, ocorra o desenvolvimento de tolerância com mais da pele do paciente).
a exposição continuada, havendo então a cura.

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

DIAGNÓSTICO
Avaliação da história e dos achados clínicos, incluindo avaliação do TESTE DE CONTATO OU EPICUTÂNEOS ( PATCH-TEST)
local e distribuição:
São úteis na identificação de substâncias às quais o indivíduo é
- mapeamento topográfico: procura-se correlacionar o local do alérgico, no entanto, deve ser interpretado com critério, pois
eczema com várias exposições; assim, no eczema de pescoço, substâncias testadas, ainda que positivas, podem não estar
devemos investigar joias e adereços de metais e plásticos, perfumes, relacionadas com o problema atual, e a substância envolvida pode não
casacos, gravatas, corantes de tecidos, goma de colarinho, etc. ter sido testada. Outra possibilidade é que os componentes do teste
- seletividade profissional: investigar quais antígenos a pessoa está possam ter perdido, por qualquer motivo, o padrão.
exposta na sua atividade ocupacional → por ex., se em cabeleireiros, São 22 elementos presentes em testes internacionais, acrescidos de
investigar xampus, sabonetes, desodorantes, desinfetantes, perfumes mais 8 substâncias relacionadas com medicamentos tópicos e de uso
e outras substâncias usadas. frequente no nosso meio, totalizando 30 substâncias → esta bateria
- seletividade utilitária: pela história topográfica, suspeita-se de que o padrão é aplicada em todo paciente com suspeita de DCA.
eczema investigado esteja relacionado com um elemento de uso diário - por vezes, dependendo da ocupação profissional ou de lazer do
ou esporádico, procurando realizar testes dirigidos à substâncias que indivíduo, é possível adicionar elementos ao teste, desde que
entrem na confecção do objeto → por ex., se eczema dos pés, pensa- corretamente manipulados e diluídos.
se nos sapatos e nos seus principais constituintes.
- correlação antígeno/utilidade: uma vez determinado pelos testes que
o indivíduo é sensível a determinada substância, deve-se procurar
relacionar o eczema com os objetos que contenham o referido
alergênio.

HISTOPATOLOGIA
Aguda: grau variado de espongiose (edema intercelular), com
infiltrado inflamatório dérmico misto contendo linfócitos, histiócitos,
eosinófilos.
- se moderada a grave → espongiose acentuada com vesiculação
intraepidérmica.
Subaguda a crônica: hiperplasia epidérmica, espongiose com
acantose, alongamento e alargamento das papilas, hiperceratose,
infiltrado linfocítico.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Bateria específica de cosméticos


Quanto à técnica de execução, é importante salientar que, para a O produto exato que o paciente usa no seu trabalho e/ou em casa é
realização do teste, a dermatose do indivíduo deve estar em fase examinado e seus componentes comparados com as reações
inativa para não exacerbar o quadro. positivas → feito isso, os produtos podem ser divididos em grupos:
aqueles que são livres de alérgeno(s) suspeito(s) e são seguros para
As substâncias padronizadas são aplicadas no dorso do paciente, em
uso, e aqueles que contêm essas substâncias químicas e devem ser
pele limpa, seca e sã.
evitados.
- o paciente não pode estar em uso de corticosteroide tópico no local
do teste e de corticosteroide sistêmico, especialmente em doses Diagnósticos diferenciais: DCI, dermatite atópica, dermatite de estase,
imunossupressoras por 2 semanas; não deve molhar as fitas ou se dermatite seborreica, forma eritematosa de acne rosácea, psoríase.
expor ao sol; a prática de atividade física é desaconselhada para não
descolar as fitas ou molhá-las com suor. ORIENTAÇÕES E TRATAMENTO
- mesmo que o paciente esteja em vigência do uso de anti-
Na prevenção das dermatites de contato, o uso de equipamentos de
histamínicos, não é necessário suspendê-los para a realização do teste
proteção individual (EPI) no trabalho (como luvas, sapatos, macacões
de contato, pois não há correlação com o mecanismo fisiopatogênico
etc.) e o desenvolvimento de produtos hipoalergênicos seriam os
do eczema de contato.
principais objetivos a alcançar.
Após 48h da aplicação, os testes são retirados e é feita a primeira
Deve-se informar por escrito ao paciente: nome da substância
leitura → a segunda leitura é feita em 96h.
química, possíveis sinônimos, usos frequentes da substância, como
Os critérios adotados para leitura são os preconizados pelo evitar a exposição e possíveis substituições.
International Contact Dermatitis Research Group de 1981, nos quais:
No tratamento, a primeira providência nessas dermatites é afastar o
(–) negativo; (+) discreto eritema com algumas pápulas; (++) eritema,
agente causal e priorizar o tratamento de infecções secundárias
pápulas e vesículas; (+++) intenso eritema, pápulas e vesículas
eventuais. Esses procedimentos, associados ao uso de emolientes,
confluentes.
são suficientes nos casos leves de DCIP.
Na DCA, a conduta dependerá da fase e da extensão do quadro:
- na fase aguda, inicia-se o tratamento com banho ou compressas,
preferencialmente com soluções antissépticas como solução de
permanganato de potássio 1:40.000 durante as primeiras 24 h.
- em uma fase menos exsudativa (subaguda), utilizamos pasta d’água
ou creme de corticosteroide tópico.
- na fase crônica, está indicado o uso de corticosteroide em pomada,
fita oclusiva ou, mesmo, injeção intralesional.
- em casos generalizados ou de eritrodermia, indicam-se
corticosteroides sistêmicos (prednisona 0,5 mg/kg de peso).
Embora não haja atuação sobre o mecanismo fisiopatogênico, o uso
de anti-histamínicos de primeira geração pode ser útil na redução do
prurido, graças à sedação.
Pimecrolimo e tacrolimo são drogas imunomoduladoras que podem
substituir os corticosteroides, principalmente no eczema crônico, pois
seu uso não leva à atrofia de pele, como no caso dos corticosteroides
tópicos → tratamento de dermatites crônicas, como eczema de mãos
e em dermatites localizadas em áreas mais suscetíveis aos efeitos
colaterais dos corticoides, como face, dobras e região genital.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ECZema atopico EPIDEMIOLOGIA


Nas últimas décadas, a frequência da doença atópica (rinite alérgica,
A dermatite atópica (DA) é a principal manifestação cutânea da atopia, asma e eczema atópico) tem aumentado em todo o mundo. Sua
definida por Cocca, em 1925, como a tendência hereditária a prevalência varia em função da localização geográfica, das condições
desenvolver alergia a antígenos alimentares ou inalantes, geralmente climáticas, do nível socioeconômico e da poluição, mas a prevalência
associada a outras doenças atópicas, como asma e rinite alérgica. atual é de aproximadamente 10-30% em crianças e 2-10% nos
- sinonímia: eczema atópico, prurigo disseminado e prurigo diatésico. adultos.
Trata-se de doença genética, de herança poligênica, com evidentes Os dados obtidos no ISAAC (International Study of Asthma and
alterações imunológicas, fortemente influenciada por fatores Allergies in Childhood) demonstram que, no Brasil, a prevalência da
ambientais e, eventualmente, emocionais. dermatite atópica é similar à de outras partes do mundo, estando em
torno de 10 a 15%.
É a doença crônica de pele mais comum, e sua crescente prevalência
apresenta um grande problema de saúde pública em todo o mundo. Fatores desencadeantes: aeroalérgenos (poeira e pólens), exotoxinas
de S. aureus, estreptococos do grupo A, fungos (raramente),
É caracterizada pelo prurido e uma evolução crônica recidivante → autoalérgenos, exacerbações com ingestão de ovos, leite, amendoim,
geralmente começa na infância (início precoce), mas pode se soja, peixe, trigo (mais comum em lactentes e crianças).
desenvolver em outras faixas etárias.
Três subgrupos de DA com base na idade de início surgiram a partir
de estudos epidemiológicos: ETIOPATOGENIA
- INÍCIO PRECOCE: se manifesta nos 2 primeiros anos da vida → é Parece existir uma interação entre fatores constitucionais e ambientais,
o tipo mais comum de DA, o qual se desenvolve durante os primeiros em que as imunidades humoral e celular ocupam l ugar de destaque.
6 meses (45%), durante o 1º ano (60%) e antes de 5 anos (85%).
aproximadamente 50% das crianças com o início precoce FATORES GENÉTICOS
da doença desenvolvem alérgenos específicos e anticorpos IgE até 2
A ocorrência de história familiar de atopia é um fator de risco forte
anos de idade;
para o desenvolvimento de DA → assegura o caráter hereditário,
cerca de 60% dos lactentes e crianças jovens com DA sendo provavelmente de herança poligênica.
entram em remissão por volta dos 12 anos de idade, mas em outros
Dois conjuntos de genes têm sido implicados na DA: genes que
a atividade da doença persiste na adolescência e na idade adulta.
codificam as proteínas da epiderme e genes que codificam proteínas
- INÍCIO TARDIO: começa depois da puberdade → há poucos estudos com funções imunológicas não específicas para a pele.
epidemiológicos recentes sobre DA no início da fase adulta.
- mutações no gene da filagrina, que codifica uma proteína que agrega
aproximadamente 30% dos pacientes com DA estão na os filamentos de queratina durante a diferenciação terminal da
categoria não IgE associada, e em adultos, a grande maioria desses epiderme, são responsáveis por ictiose vulgar (pele extremamente
doentes é mulher. seca) e representa um dos principais fatores de predisposição para
- INÍCIO EM IDOSOS: subcategoria incomum de DA que começa DA.
depois dos 60 anos de idade e foi identificada recentemente.
Um dos conceitos mais conhecidos na evolução das doenças alérgicas MECANISMOS INFLAMATÓRIOS
é a marcha atópica → progressão sequencial de condições alérgicas Os níveis de AMPc intracelulares estão diminuídos nos macrófagos,
diferentes observada a partir dos primeiros anos de vida. basófilos e linfócitos → esses baixos níveis seriam responsáveis
- em geral, a dermatite atópica (DA) é a primeira manifestação clínica principalmente pelo aumento da liberação de histamina, diminuição
da marcha atópica, seguida de asma e/ou rinite alérgica → dos linfócitos T supressores e aumento da produção de IgE.
aproximadamente 20-30% dos bebês com DA vão seguir este curso - a antiga hipótese do bloqueio dos receptores β-adrenérgicos para
desfavorável de doença, associado a manifestações alérgicas graves e justificar a diminuição dos níveis intracelulares de AMPc na DA, assim
persistentes. como a diminuição dos efeitos inibitórios das catecolaminas sobre a
multiplicação celular, com aumento de mitoses (explicaria a tendência
à hiperplasia epidérmica que, por sua vez, é potencializada pela
coçadura), evoluiu com a constatação de um defeito associado ao
aumento da atividade da enzima fosfodiesterase, degradadora de
AMPc.
Há muito se conhecem as alterações vasculares e farmacológicas,
caracterizadas pela tendência à vasoconstrição dos pequenos vasos e
manifestando-se por palidez, diminuição da temperatura das
extremidades e perioral, aumento de vasoconstrição pelo frio,
dermografismo branco, diminuição da reação à histamina na pele
comprometida, reação branca aos ésteres da nicotina e palidez
retardada à acetilcolina.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Alterações sudorais, alterações do manto lipídico da pele e baixo limiar - alguns linfócitos T, principalmente os pertencentes ao subtipo Th2,
ao prurido são outras características muito conhecidas da DA. liberam IL-4, que induz o linfócito B à produção de IgE nos linfonodos
aferentes → portanto, na pele do portador de DA, parece ocorrer um
- o limiar ao prurido nos indivíduos atópicos é mais baixo, e os
somatório de reações tipo I e tipo IV, que podem ser induzidas pelo
estímulos prurigênicos produzem, nos atópicos, prurido mais intenso,
mesmo antígeno.
mais duradouro e em áreas mais extensas do que em indivíduos
normais. - a IL-4 também estimula a produção de histamina pelos mastócitos e
inibe a produção de IFN-γ (ativa macrófagos) produzido pelos
- a sudorese, no atópico, geralmente se acompanha de prurido,
linfócitos T subtipo Th1 que poderia explicar a maior suscetibilidade
atribuído a uma retenção sudoral ou eliminação de alergênios pelo
à infecção que o atópico apresenta.
suor.
Recentemente, foi proposto que o desenvolvimento das lesões de pele
O estresse induzido no atópico provoca eritema e prurido nas áreas
na DA resulta da ativação sequencial de células Th2/Th1 → a fase de
de eczema. O perfil da personalidade desses indivíduos também é
peculiar, envolvendo labilidade emocional, hiperreatividade, iniciação da DA é induzida por citocinas (IL-4, IL-5) derivadas de
agressividade reprimida, insegurança e inteligência superior à média. células Th2 alergênio-específicas, ativadas.
- na pele, macrófagos e eosinófilos atraídos e ativados por citocinas
A imunopatologia do eczema atópico é complexa e controversa,
Th2 produzem IL-12, a qual leva à ativação de células Th1 e Th0
envolvendo distúrbios da imunidade humoral, imunidade celular e
alergênio-específicas e não específicas → as células Th1 ativadas
disfunção de outras células imunes.
produzem IFN-γ (responsável pela cronicidade das lesões da DA e
IMUNIDADE HUMORAL determina a gravidade da doença).
O anticorpo envolvido na imunopatologia do eczema atópico é a IgE, As lesões eczematosas parecem ser acentuadas em áreas de grande
produzida pelos linfócitos B. potencial de exposição a antígenos (face e mãos), em áreas de
aumento de vascularização (face e dobras) e em áreas de pele fina
O eczema atópico é associado à elevada produção de IgE e à e/ou cobertas, nas quais a penetração percutânea pode ser aumentada
reatividade alterada da pele e das mucosas, com aumento da (dobras antecubitais e poplíteas).
suscetibilidade a reações anafiláticas (células de Langerhans da
epiderme possuem receptores de IgE de alta afinidade). Os indivíduos atópicos também têm exacerbação das lesões,
associada à infecção da pele pelo S. aureus, principalmente, e, em
- aumento dos níveis séricos de IgE ocorre em 80% dos indivíduos alguns casos, pelo S. pyogenes. Colonização da pele pelo S. aureus
com eczema atópico, e parece ter correlação com a extensão e foi encontrada em 93% das lesões ativas e em 79% da pele normal de
gravidade da doença e com asma e/ou rinite alérgica. atópicos.
IMUNIDADE CELULAR - acredita-se que a colonização da pele do atópico pelo S. aureus pode
provocar processo inflamatório iniciado pela ativação dos linfócitos T,
Quanto à imunidade celular, os portadores de DA apresentam
em um mecanismo semelhante ao dos aeroalergênios, agravando o
diminuição de respostas de hipersensibilidade retardada (que se
processo eczematoso inicial, por meio da liberação de superantígenos
correlaciona inversamente com os níveis séricos de IgE),
(proteínas de alto peso molecular).
evidenciando-se por menor incidência de eczema de contato e
respostas a antígenos intradérmicos fúngicos (candidina), bacterianos
(PPD, SKD) e virais, além de serem menos suscetíveis à sensibilização
pelo DNCB (dinitroclorobenzeno).
Observa-se também diminuição no número de linfócitos T circulantes,
particularmente os linfócitos T supressores (Ts), alterando a
proporção CD4+/CD8+, que passa a ser de 7:1.
- o aumento do número de null cells circulantes parece corresponder
a células T imaturas.
A lesão eczematosa que ocorre na dermatite atópica é própria da
reação tipo IV envolvendo imunidade celular, e o infiltrado linfocitário
dérmico das lesões eczematosas é composto, predominantemente,
por linfócitos auxiliadores (CD4+).

DISFUNÇÃO DE OUTRAS CÉLULAS IMUNES


Diminuição da capacidade das células de Langerhans em estimular
linfócitos; redução da quimiotaxia de neutrófilos e monócitos;
aumento da liberação espontânea de histamina por basófilos e MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
mastócitos; e diminuição da citotoxicidade monocítica mediada por
anticorpos são achados relevantes, embora ainda sem papel Trata-se de dermatose crônica de evolução flutuante, podendo ocorrer
totalmente definido na etiopatogenia da DA. em qualquer idade a partir do 3º mês de vida. O prurido é intenso e
está sempre presente, sendo pior à noite e pode ser agravado por
Há um desequilíbrio entre a imunidade celular e humoral → linfócitos fatores exógeno (suor e roupas de lã).
T são ativados (importante na manutenção das lesões eczematosas)
A morfologia e a distribuição das lesões variam com a idade, tendendo
em reposta a antígeno a eles apresentado e produzem linfocinas, que
a ser mais exsudativas na primeira infância e liquenificadas nas faixas
são importantes na amplificação e propagação da resposta imune.
etárias mais avançadas.

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Tende-se a dividir a dermatite atópica nas seguintes fases: infantil, DA PRÉ-PUBERAL : ocorre entre 2 a 12 anos de idade → as lesões são
pré-puberal e adolescentes-adultos, podendo evoluir de uma fase para menos exsudativas e tendem a se tornar liquenificadas
outra, ou iniciar-se em qualquer uma delas. (espessamento, escurecimento e acentuação dos sulcos da pele),
comprometendo principalmente as áreas flexoras, como dobras
antecubitais e poplíteas, punhos, mas também as nádegas, raiz
posterior de coxa, dorso das mãos, tornozelos e pescoço.
O surgimento de vesiculação aguda, localizada ou generalizada,
sugere infecção secundária bacteriana ou viral. Nessa fase, aumenta a
hipersensibilidade a inalantes (pelo de animais, pólen, penas e poeira
domiciliar – ácaros). Observa-se incidência aumentada, nos atópicos,
de hipersensibilidade a níquel, neomicina, oleorresinas e lanolina.

DA NA ADOLESCÊNCIA/ADULTOS : ocorre em maiores de 12 anos, com


características da DA subaguda a crônica.
Com a chegada da adolescência, as lesões se tornam
DA INFANTIL (LESÕES AGUDAS) : ocorre até os 2 anos e surge, em geral,
papulodescamativas e, mais caracteristicamente, liquenificadas,
entre os 3 e 6 meses como áreas eritematocrostosas, inicialmente nas
sujeitas a surtos de agudização.
regiões malares (bochechas, muitas vezes poupando a face central),
disseminando-se, principalmente, para o couro cabeludo, pescoço, No adulto, sua distribuição usual é típica e compreende dobras
fronte, punhos, face de extensão de membros e área das fraldas. antecubitais e poplíteas, sendo também frequente o comprometimento
do pescoço, pálpebras, mãos e punhos e até mesmo envolvimento
- em lactentes, a DA muitas vezes é precedida e/ou acompanhada de
palpebral grave. A doença tende a atenuar com a idade, sendo rara
dermatite seborreica, que comumente se apresenta durante o 1º mês
sua persistência após os 30 anos.
de vida, como placas e crostas branco-amareladas, aderentes ao couro
cabeludo. Pacientes com DA contínua desde a infância são propensos a terem
escoriações graves e lesões cutâneas papulares crônicas, como
- dentição, infecções, distúrbios emocionais, alterações ambientais
resultado do hábito de coçar e esfregar.
(temperatura e umidade), imunizações e outros fatores podem agravar
ou desencadear a dermatite atópica.
Antígenos alimentares (ovo, castanha, leite, peixe, soja, galinha e
aditivos alimentares) podem ter papel importante até o final dessa fase.
Ao término do 2º ano de vida, observa-se resolução espontânea em
menos da metade dos casos, sendo que, na maioria, as lesões
tornam-se menos exsudativas, mais papulosas e com tendência a
liquenificação.

DA SENIL : ocorre em pessoas com > 60 anos, sendo caracterizada pela


xerose evidente (pele áspera e seca, que pode apresentar descamação
ou pequenas fissuras) e não costumam apresentar as lesões típicas
de área de flexão liquenificadas da DA em crianças e adultos jovens.

ESTIGMAS ATÓPICOS
São constatações físicas de outras dermatites que são frequentemente
observadas em pacientes com DA.
Xerose: pele seca com placas finas em áreas sem inflamações
clinicamente aparentes; tipicamente piores a noite; usualmente mais
proeminente nas pernas, podendo ser generalizada.
Queratose pilar: início típico na infância; pápulas foliculares
queratóticas, normalmente com um aro de eritema ou um eritema de
segundo plano; afeta o aspecto lateral dos antebraços, coxas e
bochechas laterais.

10
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Ictiose vulgar: placas finas excessivas, brancas a marrons, com Sinal de Hertogue: falta ou afinamento das sobrancelhas laterais,
predominância nas pernas e poupam as articulações. muitas vezes devido à coçadura.
Dermografimos brancos: atrito a pele leva a um esbranquiçamento que
reflete a vasoconstrição excessiva. A aplicação de pressão suave sobre
a pele acometida não provoca eritema, como na pele normal, mas
empalidecimento.
Pitiríase alba: afeta crianças e adolescentes com DA, sendo
caracterizada por várias máculas maldefinidas e hipopigmentadas com
fina escamação, tipicamente localizadas na face, mas ocasionalmente
aparecem nos ombros e braços. As lesões são mais óbvias em
Hiperlinearidade palmar e plantar: proeminência aumentada de vincos indivíduos de pele pigmentada e/ou exposição ao sol. O uso regular
palmares e plantares (provavelmente mais associada com a ictiose). de protetores solares e outras formas de fotoproteção podem
Linhas de Dennie-Morgan: dobras horizontais simétricas e minimizar o seu aparecimento.
proeminentes, únicas ou duplas, logo abaixo da margem da pálpebra.

Escurecimento das pálpebras: a pele ao redor dos olhos está com


aparência de cinza a violeta, enquanto o restante da pele facial está
pálida; pode ter edema periorbital e liquenificação.
Dobras anteriores do pescoço: dobras horizontais ao longo do
pescoço anterior.

COMPLICAÇÕES
O acometimento ocular na DA ocorre entre 25 e 40%, sendo a - o eczema herpético ocorre pela rápida disseminação de infecção viral
dermatite palpebral a mais comum. A ceratoconjuntivite (conjuntivite por herpes simples sobre a pele eczematosa dos pacientes com DA
alérgica) pode se manifestar como prurido ocular bilateral, cansaço, → inicialmente desenvolve como uma erupção de vesículas, mas os
irritação ou sensação de corpo estranho, chegando, eventualmente, à indivíduos afetados mais frequentemente apresentam erosões
ulceração ou perfuração da córnea → prurido intenso e mantido leva monomórficas com crosta hemorrágica. Normalmente é generalizado
ao ceratocone, conificação da córnea (1% dos casos). e pode ocorrer em qualquer lugar, com predileção pela cabeça,
pescoço e tronco.
- em menos de 8% dos casos de DA, surge, em geral na 3ª década,
catarata uni ou bilateral.
- blefarite e conjuntivite são frequentes.
Ocorre aumento de suscetibilidade a infecções fúngicas
(dermatofitose), virais (molusco contagioso, verrugas vulgares e
herpes simples) e bacterianas, principalmente estafilocócica.
- considerando que S. aureus coloniza a pele da grande maioria dos
pacientes com DA, não é surpreendente que o surgimento de impetigo
(também pode ocorrer devido a Streptococcus pyogenes) ocorra
muito frequentemente.

11
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é basicamente clínico, corroborado muitas vezes por A confirmação diagnóstica é feita por meio dos critérios apresentados
uma história pessoal ou familial de atopia; eosinofilia e aumento da na tradicional classificação de Hanifin e Rajka (1980) → é necessária
IgE circulante podem reforçá-lo. a associação de um mínimo de 3 critérios maiores a 3 menores.
Prurido
Morfologia e distribuições típicas
Características maiores Liquenificação flexural em adultos
(deve ter 3 ou mais) Envolvimento facial e extensor em lactentes e crianças
Dermatite crônica ou cronicamente recorrente
História pessoal ou familiar de atopia – asma, rinite alérgica, dermatite atópica
Catarata (anterior subcapsular)
Ceratocone
Ceratose pilar
Conjuntivite recorrente
Dermatite das mãos – não alérgica irritativa
Dermatite dos mamilos
Dermografismo branco
Eczema – acentuação perifolicular
Escurecimento periorbital
Hiperlinearidade palmar
Características menores Ictiose
(deve ter 3 ou mais) IgE elevada
Infecções cutâneas
Intolerância à lã
Intolerância alimentar
Palidez facial/eritema facial
Pitiríase alba
Prega infraorbital (linhas de Dennie-Morgan)
Prurido quando transpira
Quelite
Reatividade cutânea imediata (tipo I)
Xerose

Em 1994, Williams et al. propuseram critérios simplificados, A partir de 2007, foi proposto que as questões subjetivas fossem
conhecidos como critérios UK (United Kingdom): presença de prurido eliminadas e uma nova pontuação de gravidade fosse atribuída,
cutâneo e três ou mais dos seguintes achados: envolvimento flexural, denominando-se este “novo” critério SCORAD objetivo, assim
história de atopia respiratória, xerodermia e erupção cutânea antes dos pontuado:
2 anos de idade.
- 0-14: dermatite atópica leve
Na histopatologia:
- 15-40: dermatite atópica moderada
- agudo: espongiose marcada, com acúmulo de fluido
- acima 41: dermatite atópica grave.
intraepidérmico, formação de vesículas ou bolhas → edemas
dérmicos podem estar presentes, em conjunto com linfócitos
perivasculares e número variável de eosinófilos. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
- subagudo: não há vesiculação, enquanto acantose, hiperqueratose e Devem ser consideradas: dermatite seborreica, dermatite de contato,
paraqueratose são evidentes. eczema numular, escabiose, psoríase (principalmente palmoplantar),
- crônico: espessamento da epiderme → espongiose e inflamação são dermatite herpetiforme e doença de Darier.
menos visíveis, mas pode haver aumento de mastócitos e fibrose Em crianças, por apresentarem erupção cutânea semelhante à DA,
dérmica. devem sempre ser consideradas algumas síndromes associadas a
* essas características não são específicas, podendo haver conclusões imunodeficiências (de hiper-IgE, Wiskott-Aldrich, agamaglobulinemia,
semelhantes na dermatite de contato alérgica. ataxia-telangiectasia, síndrome de Hurler, síndrome de Jung,
síndrome de Netherton), distúrbios metabólicos (fibrose cística,
A gravidade da DA é avaliada tanto pelo EASI (eczema area severity fenilcetonúria, doença celíaca, acrodermatite entropática), infiltrativas
index) quanto pelo SCORAD (scoring atopic dermatitis) → ambos (langerhoses) e genodermatoses (displasia ectodérmica anidrótica).
avaliam a área da pele acometida e a gravidade de uma lesão em
especial, destacando-se: eritema, edema, presença de crostas, sinais Adolescentes e adultos sem histórico pessoal ou familiar de atopia que
de escoriação e liquenificação. apresentam uma erupção eczematosa devem ter um histórico
completo e (quando indicado) teste de sensibilidade para avaliar a
- no SCORAD, considera-se ainda a avaliação do paciente ou cuidador possibilidade de dermatite de contato alérgica.
incluindo perguntas sobre a qualidade do sono e intensidade do
prurido nos últimos três dias que antecederam a avaliação.

12
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

A dermatite de contato de proteína também pode apresentar-se como Para o tratamento de erupções agudas da DA, corticosteroides tópicos
uma dermatite eczematosa crônica e é mais comum em indivíduos representam a terapia de primeira linha devido aos seus potentes
atópicos → as causas mais comuns incluem uma variedade de efeitos anti-inflamatórios → esses agentes suprimem a produção de
alimentos e produtos animais e é diagnosticada por meio de testes ou vários fatores de transcrição, o que conduz não só a redução da
pela observação de uma reação urticariforme em 30 minutos, com o expressão de citoquinas pró-inflamatórias, mas também para a
auxílio de um teste de sensibilidade, na pele previamente afetada. inibição do crescimento celular e diminuição da síntese de colágeno
Micose fungoide (MF) deve ser considerada em adolescentes e e outras proteínas estruturais.
adultos com dermatite crônica pouco responsiva ao tratamento com Aplicação imediata após o banho melhora a penetração cutânea e
corticosteroides tópicos. também diminui a queimação.

2) IMUNOMODULADORES
TRATAMENTO
São o pimecrolimo, em concentrações a 1% em cremes, para doença
Como é uma afecção crônica e recidivante, não existe um recurso para leve a moderada e o tacrolimo, em concentrações de 0,03% e 1% em
sua cura definitiva. O tratamento se baseia no controle dos sintomas pomadas, para doença moderada a grave.
e da reação inflamatória → objetivos são: evitar a coçadura, a Esses agentes são chamados de inibidores tópicos da calcineurina,
xerodermia e afastar os agravantes (sabões, lã, extremos de sendo supressores da ativação de células T e de modulação da
temperatura, baixa umidade ambiente, exposição a antígenos secreção de citocinas e de outros mediadores pró-inflamatórios.
inalantes, banhos demorados e quentes, roupas sintéticas,
substâncias irritantes à pele etc.). Possuem vantagem de não produzir os efeitos colaterais dos
corticoides tópicos (atrofia cutânea, telangiectasias e estrias) →
Cuidados gerais: ocasionalmente podem apresentar sensação de ardor e queimação.
- orientações sobre a doença e sua evolução, possíveis fatores de Porém, são produtos de alto custo.
piora, fatores ambientais, alimentares, psicológicos, predisposição São particularmente indicados em formas de dermatite atópica menos
familiar. intensas e localizadas em áreas com maior probabilidade de ocorrer
- banhos devem ser em água morna, não demorando mais de 3 a 5 efeitos adversos com corticoides tópicos – face, especialmente região
minutos e os sabonetes devem ser suaves ou neutros, sendo usados orbitária, dobras, genitais e quaisquer áreas do corpo que já mostrem
o menos possível (uma vez ao dia) → nunca friccionar a pele com os efeitos colaterais da corticoterapia tópica prolongada.
esponjas e similares. Essas drogas são extremamente úteis também como terapia de
- como a pele é seca, deve ser sempre usadas as substâncias manutenção após o uso de corticosteroides para a melhora de áreas
emolientes ou lubrificantes que evitem a desidratação → os mais de dermatite muito inflamadas.
ativos são à base de vaselina líquida ou óleo de amêndoas, sendo ICTs também são benéficos em pacientes com frequência de lesões
usados após o banho e, se necessário, mais vezes durante o dia. ou DA persistente que poderiam exigir o uso quase contínuo de
- uso de roupas de algodão e folgadas, para permitir a ventilação corticosteroides tópicos.
corporal adequada → evitar contato da pele com tecidos de lã e fibras
sintéticas. 3) ANTIBIÓTICOS TÓPICOS

- realizar o corte de unhas semanalmente, para evitar escoriações. Quando houver infecção secundária, utilizar a mupirocina a 2%, que
não deve ser empregada em áreas maiores que 20% da superfície
- recomenda-se a higienização do ambiente, com retirada de cortinas, corpórea, pelo risco de nefrotoxicidade. Pode ser substituída pelo
carpetes , entre outros itens que podem reter alergênicos inalantes em ácido fusídico a 2% ou gentamicina a 0,1%.
geral.
- nos casos especialmente rebeldes ou graves da primeira infância,
podem ser prescritas dietas restritivas, com posterior reexposição, TRATAMENTO SISTÊMICO
para determinar possíveis agentes alimentares provocadores. 1) CORTICOSTEROIDES SISTÊMICOS
Excepcionalmente nos casos de lesões agudas graves generalizadas
TRATAMENTO TÓPICO resistentes à administração tópica agressiva, o tratamento com um
corticosteroide sistêmico deve ser cuidadosamente considerado por
1) CORTICOSTEROIDES um período curto.
Corticosteroides tópicos são úteis em todas as formas clínicas da DA Em geral, o tratamento da DA com corticosteroides sistêmicos deve
e em todas as idades. ser evitado devido a uma propensão para erupções rebote
Crianças de 0 a 2 anos → corticosteroides de baixa potência, como significativas após sua interrupção e os efeitos colaterais inaceitáveis
hidrocortisona 0,5-1%, por períodos curtos (10 a 20 dias). de utilização em longo prazo.
Crianças > 2 anos → hidrocortisona 1-2% A droga de escolha é a prednisona 1 a 2 mg/kg/dia no início,
procurando reduzir a dose gradualmente de acordo com a melhora →
Corticoides de média potência (mometasona, desonida) na
deve-se procurar a menor dosagem possível, inclusive com a
concentração de 0,1% podem ser usados em casos mais moderados.
administração em dias alternados.
Corticoides de potência alta (betametasona, difluocortolona,
triamcinolona) e os de potência muito alta (clorobetasol) devem ser
usados somente em adolescentes e adultos e em lesões crônicas,
liquenificadas.

13
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

2) ANTIBIÓTICOS - PUVA tem os inconvenientes de uso sistêmico dos psoralênicos e


A pele do atópico tem colonização de S. aureus, cujo desenvolvimento os riscos de neoplasias.
é favorecido pela xerose, pelo prurido e pela liquenificação. Aparentemente, a melhor terapêutica baseada em luz é o UVB narrow-
A infecção é fator importante na exacerbação da afecção, por isso, band ou UVA associado a UVB.
deve ser cogitada sempre que ocorrer aumento do eritema, secreção
ou aparecimento de pústulas, principalmente se o quadro estiver
EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO
resistente ao tratamento.
Quando ocorrer infecção, é preciso recorrer a antibióticos via Sem tratamento, as áreas acometidas persistem por vários meses ou
sistêmica, de preferência após antibiograma, ou empregar a anos.
eritromicina, cefalosporina ou dicloxacilina por um período de 10 dias. Ocorre remissão espontânea, mais ou menos completa, durante a
infância em mais de 40% dos casos, com recidivas mais graves
3) ANTI-HISTAMÍNICOS ocasionais durante a adolescência. Em muitos pacientes, a doença
São indicados de maneira eletiva para o controle do prurido. persiste por 15 a 20 anos, porém, é menos grave.
Aqueles que são sedativos (hidroxizina, cetirizina, clorfeniramina) A DA de início no adulto frequentemente segue uma evolução grave.
ajudam a conciliar o sono e devem ser administrados, de preferência,
ao deitar (romper o “ciclo coceira–coçar”, especialmente em pacientes
com prurido que interrompe o sono, ou que se arranham DermatoZoonose
excessivamente durante a noite).
Dermatozoonose é uma designação ampla, que engloba toda e
Pode ser empregado um não sedativo pela manhã, como loratadina, qualquer alteração tegumentar (ocasional ou permanente),
fexofenadina e epinastina. Também pode ser empregada a doxepina desencadeada por protozoários, vermes, insetos e celenterados,
10 a 50 mg, via oral, por dia. sejam eles parasitas ou não.

4) IMUNOMODULADORES SISTÊMICOS Exemplos:

Talidomida: é o imunomodulador mais eficiente para o controle da DA, - parasitárias exclusivas do homem: pediculose de couro cabeludo e
ainda que não existam estudos controlados definitivos → efeito é oxiuríase
evidente entre a 3ª e 4ª semana de tratamento. Não deve ser - parasitárias não exclusivas do homem: miíase, picada de pulgas e
empregada quando há possibilidade de gravidez. mosquitos
IFN-γ: atua diminuindo a intensidade do prurido e a eosinofília. Há - não parasitárias: picadas de escorpião e aranhas, abelhas e
relatos de efeitos favoráveis em formas graves, porém, o tratamento é queimaduras por anêmonas e fisálias
oneroso.
Inibidores de fosfodiesterase (teofilina 300 mg, via oral, duas vezes ao
ESCABIOSE
dia por cinco dias): podem aliviar os surtos, porém o uso por mais
tempo leva à taquifilaxia (diminuição do efeito do fármaco em doses É uma doença contagiosa produzida pela fêmea fecundada do
consecutivas). Sarcoptes scabei variedade hominis, que vive toda a sua vida dentro
da epiderme (morre rapidamente fora dela) e produz uma dermatose
5) IMUNOSSUPRESSORES pruriginosa predominantemente noturna (ocorre pela migração do
Ciclosporina: indicada em formas graves e resistentes de DA na dose ácaro no interior da pele e pela reação de hipersensibilidade ao ácaro
de 3 a 5 mg/kg/dia. Há em geral melhora evidente em 2 semanas, e seus produtos metabólicos).
quando a dosagem pode ser diminuída, procurando-se a menor dose A transmissão tipicamente ocorre através de um contato direto com
necessária. O tempo de administração é indeterminado e não deve ser uma pessoa infectada; a transmissão de fômites (objeto ou substância
administrada com a eritromicina e quando houver suspeita de infecção capaz de absorver, reter e transportar organismos infecciosos, de um
pelo herpes-vírus e S. aureus. indivíduo a outro, como roupas pessoais e de cama) também é
- evitar o uso em crianças e em doentes com hipertensão, nefropatia possível e muito mais comum nos casos graves e/ou crostosos.
e hepatopatia. - apresenta relação com a promiscuidade, inclusive sexual, sendo
Metotrexato: há relato da administração em formas graves, dosagem incluída entre as doenças de transmissão sexual.
de 15 mg/semana ou 2,5 mg/4 vezes por semana com eventuais Trata-se de uma afecção universalmente distribuída sendo observada
melhoras. em diversas partes do mundo. Acomete todas as raças, idades
Azatioprina: há referência sobre o uso em formas graves, dosagem de (prevalência maior em crianças e pessoas sexualmente ativas) e
100/200 mg/dia por seis semanas, com eventuais melhoras. classes sociais, embora predomine nos indivíduos adultos de baixa
renda, que moram em ambientes aglomerados e com pouca higiene.
Micofenolato de mofetil: pode ser bastante útil em alguns doentes na
dose de 1,5 a 2 g/dia via oral. - já foram relatados surtos em hospitais, quartéis, creches e escolas.
- a escabiose crostosa (também conhecida como sarna norueguesa)
6) FOTOTERAPIA é mais encontrada em indivíduos imunocomprometidos (idosos, HIV+,
Todas as formas de fototerapia mostram-se úteis na dermatite atópica: transplantados), assim como naqueles com comprometimento das
UVB; UVB narrow-band; UVA em combinação com UVB; e PUVA. funções sensoriais e/ou capacidade de coçar (por ex., na hanseníase,
infecção por HTLV-1 ou paraplegia → apresentam prurido mínimo,
- UVB pode beneficiar a dermatite atópica leve.
apesar da infestação ser com um número elevado de ácaros, sendo
altamente contagiosos.

14
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

CICLO BIOLÓGICO E ETIOPATOGENIA


O Sarcoptes scabiei var. hominis é um acarino de pequenas Larvas, ninfas e formas adultas são encontradas na superfície da pele,
dimensões (mede cerca de 0,3 mm) → foi o primeiro parasita de onde as fêmeas fecundadas podem infectar outro ser humano ou
microscópico relacionado com uma doença humana. São até mesmo se disseminar por outras partes da pele da mesma pessoa.
ectoparasitos que precisam do hospedeiro para sua sobrevivência e
Na primeira infecção, o período de incubação é de 3 a 4 semanas,
reprodução.
quando aparece erupção pruriginosa, ou então de 1 ou 2 dias, nos
A escabiose é produzida exclusivamente pela fêmea fecundada, já que casos de reinfecção dos pacientes que se alergizarem.
o macho morre após a cópula. A fêmea penetra na epiderme, através
- indivíduos infectados assintomáticos são pouco comuns e podem
da camada córnea, geralmente à noite, fazendo um túnel subcórneo,
ser considerados “carreadores”.
com a progressão noturna de 2-3 mm/dia → seu ciclo vital é de 15-
30 dias, durante o qual elimina cerca de 40-50 ovos, morrendo em O prurido ocorre por dois mecanismos:
seguida. - alérgico: eosinofilia sanguínea, às vezes elevada, sobretudo na
- cada ovo origina, em 3 a 5 dias, uma larva hexápode (seis pernas) escabiose crostosa; ou
que migram para a superfície da pele e criam pequenos nichos na - mecânico, isto é, provocado pela progressão do parasita, a qual se
epiderme ou penetram nos folículos pilosos, criando um esconderijo faz especialmente à noite, como consequência do calor do leito; no
para o término da metamorfose → se transforma em ninfa (octópode) entanto, não se trata de um fenômeno biológico de noctividade do
e, finalmente, chega à fase adulta (machos ou fêmeas) → ciclo parasita.
biológico do ovo ao adulto dura, em média, 15 a 20 dias.
Além da eosinofilia, testes intradérmicos com antígenos específicos,
- nesse momento, a fêmea é fecundada pelo macho, adquirindo testes de transferência passiva e aumento de IgM e IgE falam a favor
condições de escavar seu túnel epidérmico e realizar a ovopostura, de um mecanismo imunoalérgico.
completando o ciclo.

15
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS SARNA CROSTOSA (ESCABIOSE CROSTOSA/SARNA NORUEGUESA)

Após o período variável de incubação, surge o quadro de pruridemia Apresenta-se com formação de crostas estratificadas, com graus
intensa, notavelmente mais à noite e ao amanhecer. variados de eritema e descamação, que podem chegar a centímetros
de espessura, localizadas, preferentemente, nas eminências ósseas,
A lesão típica é o túnel escabiótico, que mede 5 a 15 mm, de cor podendo, inclusive, comprometer unhas, face, cabeça e regiões
acinzentada clara ou da cor da pele, em geral sinuoso, tendo na palmoplantares.
extremidade migrante uma pequena vesícula ou pápula do tamanho
de uma cabeça de alfinete – a eminência acarina (onde se encontra o - a queixa de prurido pode estar ausente ou ser discreta.
parasita). Ocorre em indivíduos de hábitos higiênicos precários, desnutridos,
- esses túneis, cujo número aumenta com a duração da doença, neuropatas, deficientes mentais ou imunodeprimidos → nesses
localizam-se preferentemente em partes quentes do corpo, como nos casos, a quantidade de parasitas é astronômica (hiperinfestação).
dedos, nas pregas interdigitais, nos punhos, nos cotovelos, nos O diagnóstico diferencial da sarna crostosa inclui psoríase (inclusive
mamilos (sobretudo nas mulheres), nas pregas axilares, na genitália, apresentação rupioide), doença de Darier, farmacodermia, dermatite
nas nádegas e no hipogástrio → nas crianças, as lesões localizam-se seborreica e eczemas.
também no couro cabeludo, nas palmas e nas plantas.

As lesões dermatológicas podem ser variadas, como: pápulas,


nódulos, vesículas, pústulas, escoriações com impetiginização
secundária, liquenificação e áreas de eczematização, inclusive
ocorrendo em regiões em que não há túneis (regiões escapular e
abdominal).
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico baseia-se nas manifestações clínicas de prurido noturno
e os túneis simetricamente dispostos além da história de contato com
pessoas diagnosticadas → muitas vezes, devido à baixa sensibilidade
dos métodos diagnósticos, recorre-se à prova terapêutica (resposta
ao tratamento).
Pode-se fazer a confirmação por meio do exame microscópico do
raspado cutâneo das áreas infestadas com solução de KOH a 10%
Lesão abdominal
(achado do Sarcoptes na eminência acarina) → colher
Como complicação, pode haver evolução para glomerulonefrite, preferencialmente à noite.
principalmente pela infecção secundária.
O emprego do dermatoscópio viabiliza a confirmação do diagnóstico,
pelo achado de pequenas estruturas triangulares (asa delta) e
ESCABIOSE NODULAR enegrecidas acompanhadas de um pequeno segmento linear
encontrado na base do triângulo, que correspondem respectivamente
O paciente com escabiose pode desenvolver lesões nodulares de
à porção pigmentada anterior do ácaro e ao túnel escabiótico
coloração variável (coloração normal da pele, hipercrômicas ou
preenchido com ovos e fezes do parasita.
eritematosas) localizadas nas regiões axilares e inguinais (nas crianças
com alguns meses de vida) ou genital e bolsa escrotal (nos adultos e Além disso, pode-se realizar o método de fita gomada (caso haja o
crianças). acometimento de nádegas) e a biópsia cutânea.
- essas lesões são muito pruriginosas e podem permanecer por muito
tempo, mesmo após tratamento adequado e, normalmente, não é DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
possível isolar o ácaro delas (são desabitadas).
A menos que os túneis ou ácaros e ovos tenham sido observados,
muitas doenças cutâneas pruríticas devem ser consideradas no
diagnóstico diferencial: dermatite atópica, dermatite de contato
alérgica, autossensibilização, eczema numular, picadas de artrópodes,
pioderma, dermatite herpetiforme e pênfigo bolhoso.
Ocasionalmente, a escabiose pode imitar a histiocitose celular de
Langerhans, tanto clínica como histologicamente, e um infiltrado
denso de células de Langerhans pode estar presente.

16
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

TRATAMENTO LINDANO A 1% (GAMA-HEXACLORO-CICLO-HEXANO) : utilizado de forma


semelhante aos anteriores há mais de 40 anos no tratamento da
Antes de iniciar o tratamento da escabiose, é importante fazer um escabiose, pela eficácia e aceitabilidade cosmética, porém caiu em
levantamento de todos os habitantes da casa e avaliar os que estão de desuso pela neurotoxicidade, sobretudo em RN e crianças (uso
fato acometidos → em casos de dúvida, é melhor tratar todos, pois, associado ao aumento de tumores cerebrais em crianças). Não deve
do contrario, pode ocorrer novo ciclo epidemiológico familiar. Nesses ser utilizado em crianças, gestantes, durante o aleitamento e em
casos, pode-se realizar um tratamento reduzido em relação ao número pacientes com doenças neurológicas.
de aplicações da medicação (por ex., aplicar em uma noite e repetir
- no Brasil, teve comercialização proibida.
em outra 1 semana depois).
Roupas de cama, banho e pessoais usadas na semana anterior devem ENXOFRE : na forma de enxofre precipitado (5 a 10%) em vaselina
ser lavadas em água quente e separadamente; separar essas roupas líquida ou pasta d’água, por 3 noites consecutivas. Embora
em sacos por 10 dias. cosmeticamente pouco aceitável e ocasionalmente irrite a pele, é
efetivo e seguro.
Juntamente com anti-histamínicos sistêmicos, dados para o alívio do
prurido, devemos também prescrever medicações escabicidas tópicas - adequado para crianças com menos de 2 meses, gestantes e durante
ou sistêmicas, todas igualmente eficazes. a lactação.
- corticoesteroides tópicos também podem ser aplicados de 2 a 3x/dia
nos casos de prurido excessivo e de nódulos no pênis e na bolsa O tratamento sistêmico é feito com ivermectina, agente antiparasitário
escrotal → se não houver melhora, pode-se aplicar corticosteroides de amplo espectro, que é utilizado no tratamento oral da escabiose
intralesionais (0,1 mL de triancinolona 1 mg/mL). desde 1993 e é também bastante eficaz no tratamento das demais
ectoparasitoses.

MEDICAÇÕES ESCABICIDAS - existe na apresentação de comprimidos de 6 mg e a dose


preconizada é de 200 µg/kg, ou seja, 1 comprimido para cada 30 kg,
Se até 1 semana de tratamento persistirem as lesões, repetir o devendo ser empregado sempre para mais, já que a dose tóxica é 60
tratamento com outro escabicida. vezes a dose recomendada.
A medicação deve ser administrada por 2 a 3 noites seguidas e - deve ser evitado em crianças com menos de 15 kg, em pacientes
repetida uma vez 1 semana após. com alteração da barreira hematoencefálica (meningites, AVC, TCE) e
No adulto, aplicar do pescoço para baixo; em crianças de até 10 anos, no período de amamentação.
aplica-se inclusive na face e couro cabeludo. O seu mecanismo de ação é sobre os canais de cloro controlados pelo
- medicamentos devem ser removidos no banho na manhã seguinte. glutamato (presentes nos neurônios e células musculares dos ácaros
e nematódeos), e bem menos importante pelo GABA (presente no
Em termos gerais, todos os medicamentos causam dermatite por
homem apenas no SNC, daí as contraindicações mencionadas
irritante primário e, por isso, os pacientes devem ser orientados a
previamente), levando a uma paralisia flácida dos agentes etiológicos.
utilizar a medicação somente como prescrito. Frequentemente, o
prurido persiste em função da alergia ao ácaro, mesmo após iniciado O tratamento se faz com dose única ou, preferentemente, repetida
o tratamento. após 10 dias, em jejum ou longe das refeições.
Vários escabicidas tópicos estão disponíveis para tratamento da - recomenda-se o seu uso em formas especiais de escabiose
escabiose: (crostosa, pacientes com HIV/AIDS, imunodeprimidos) e deve ser
evitada utilização indiscriminada nas formas clássicas da doença, pelo
PERMETRINA : piretroide sintético, utilizada a 5% em loção/creme e
risco de resistência.
considerada muito efetiva e de baixa toxicidade por ser muito pouco
absorvida e rapidamente metabolizada. É recomendada aplicação
única à noite, e uma segunda após 5 a 7 dias. Não deve ser usada em PRURIDO APÓS O TRATAMENTO
crianças menores de 2 meses, gestantes e durante o aleitamento.
O prurido e as lesões podem persistir por 2-4 semanas após o
Reações adversas: sensação de queimação e ardor.
sucesso do tratamento → isso é referido como prurido ou dermatite
- inibe o transporte de sódio nos neurônios do artrópode, causando “pós-escabiótica”.
paralisia;
Os pacientes devem ser informados de que isso não implica em
MONOSSULFETO DE TETRAETILTIURAM (MONOSSULFIRA M) : solução a 25% –
falência terapêutica, mas representa a resposta do organismo aos
diluir uma parte do medicamento em 2 a 3 de água, para adultos, e 3 ácaros mortos que posteriormente serão eliminados (cerca de 2
a 4 de água, para crianças; usar de maneira similar por 3 dias. Por ser semanas) junto com a descamação natural da epiderme.
estruturalmente correlato ao dissulfiram, pode causar efeito antabuse Nesses casos, corticoides tópicos e sistêmicos e anti-histamínicos são
quando há ingesta de álcool por até 10 dias após a aplicação da indicados até o desaparecimento do prurido, o que acontecerá de
substância (vasodilatação periférica, tontura, mal-estar, sensação de maneira gradual.
morte).
É importante evitar o tratamento repetido, responsável por dermatites
irritativas.
BENZOATO DE BENZILA : loção ou creme de 10-25% usado na escabiose
desde 1937 pelo seu baixo custo, porem vem atualmente em desuso É condenável o uso de sabonetes escabicidas que são inúteis para a
pelo potencial de eczematizar e agravar o prurido. É a substância ativa cura da parasitose, porém são responsáveis por dermatites
do bálsamo-do-peru. Usado em todo o corpo, deixando agir por 24h, eczematosas por irritação primária ou sensibilização.
durante 3 dias.

17
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

REFERÊNCIAS
MEDCURSO. 2019
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
BOLOGNIA. Dermatologia. 3 ed. 2015
WOLFF. Dermatologia de Fitzpatrick. 7 ed. 2014

18
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 3

URTICÁRIA Outro tipo de classificação se baseia no espectro de manifestações


clínicas dos diferentes subtipos de urticária:
A urticária é uma erupção caracterizada pelo súbito aparecimento de
Tipos de urticária
URTICAS, que são pápulas e placas edematosas na derme superficial,
de duração efêmera e extremamente pruriginosas, sendo lesões bem- Urticárias espontâneas:
demarcadas que podem ser acompanhadas por ANGIOEDEMA (área - Urticária aguda → < 6 semanas
edemaciada maior, mal definida) → a urticária e o angioedema - Urticária crônica → > 6 semanas
constituem o mesmo processo edematoso, mas que acometem - Urticária crônica contínua → diária ou quase diariamente durante a
diferentes níveis do plexo vascular cutâneo (papilar e profundo). semana
- são produzidas pela liberação de mediadores, especialmente - Urticária crônica recorrente → períodos livres de sintomas variando de
histamina de mastócitos, localizados em torno dos vasos da derme. dias a semanas
Urticárias físicas (existe um fator desencadeante):
A urticária e o angioedema não são doenças, mas sim padrões de
- Dermografismo → aplicação de forças mecânicas na pele (urticas
reação cutânea.
surgem em 1 a 5 min)
Características típicas da urticária: - Urticária de pressão tardia → pressão vertical (urticas surgem após 3-
1) Edema da derme superficial de tamanho variado, circundado por 8h de período de latência)
eritema reflexo; - Urticária de contato ao frio → ar, água ou vento frio
- Urticária de contato ao calor → calor localizado
2) Prurido associado;
- Urticária solar → ultravioleta e/ou luz visível
3) Natureza efêmera, em que a pele retorna ao aspecto normal - Urticária/angioedema vibratório → dispositivos pneumáticos
geralmente em 1 a 24h. Tipos especiais de urticárias:
Características típicas do angioedema: - Urticária colinérgica
1) Edema súbito e acentuado da derme profunda e do subcutâneo; - Urticária adrenérgica
- Urticária de contato (alérgica ou pseudoalérgica)
2) Maior frequência do sintoma de dor em relação ao prurido;
- Urticária aquagênica
3) Acometimento frequente de mucosas; Doenças distintas relacionadas com urticária por aspectos históricos:
4) Resolução do quadro em cerca de 72h, de modo mais lento em - Urticária pigmentosa (mastocitose)
relação às urticas. - Urticária vasculite
- Urticária ao frio familiar

EPIDEMIOLOGIA Outro fator importante nas urticárias é classificar a intensidade da


doença:
A urticária é uma doença mundial e que pode se apresentar em
qualquer faixa etária (mais comum em adultos jovens), sendo que o Escore Urticas Prurido
pico de incidência depende da etiologia., mas, de forma geral, 15% 0 Nenhuma Nenhum
da população apresentará pelo menos um episódio ao longo da vida. 1 Leve (< 20 urticas/24h) Leve
Na maioria das vezes, é mais comum nas mulheres (proporção de 2:1 2 Moderada (21 a 50 urticas/24h) Moderado
na urticária crônica). Associa-se ao angioedema em 50% dos casos, Grave (> 50 urticas/24h ou grandes
3 Intenso
sendo um fenômeno isolado em 40% e os 10% restantes áreas confluentes de urticas)
correspondem a casos de angioedema isolado.
Também é relevante analisar a cor da urtica:
- coloração mais clara e circundadas por eritema róseo secundário à
CLASSIFICAÇÃO dilatação dos vasos cutâneos → induzidas pela histamina;
Urticária e angioedema podem ser classificados sob o ponto de vista - eritema vermelho acentuado, purpúricas ou violáceas → indicam
dos mecanismos etiopatogênicos: dano vascular intenso e extravasamento de hemácias.
Idiopática imune Idiopática não imune
- IgE-dependente (reação de ETIOPATOGENIA
hipersensibilidade tipo I)
- Agentes liberadores diretos Existem diversas etiologias envolvidas no mecanismo da urticária:
- Autoimune (autoanticorpos contra
receptor de alta afinidade da IgE nos dos mediadores dos mastócitos - imunes: induzida por antígenos (fármacos, insetos, alimentos),
mastócitos ou contra a IgE) (por ex., opioides) mediada por imunoglobulina ou antígeno desconhecido (urticárias
- Imunocomplexos (urticária - Ácido acetilsalicílico, AINES e físicas) e autoimune (urticária crônica “idiopática” com autoanticorpos
vasculite) pseudoalergênios alimentares antirreceptor da IgE, anti-IgE, antitireoide, LES ou febre reumática);
- Dependente do complemento - Inibidores da ECA, contraste - infecções: virais (HAV ou HBV, CMV), bacterianas (H. pylori,
(deficiência do inibidor da C1- estreptococo), fúngicas ou parasitas;
esterase)

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

- pseudoalérgico: mediado pelo complemento (urticária ao calor, A estimulação dos mastócitos na pele humana pode ocorrer por
angioedema hereditário), desconhecido (AINES e alimentos); mecanismos imunológicos e não imunológicos:
- outros: químicos liberadores da histamina (codeína, polimixina B), (1) por estímulo antigênico da IgE ligada ao receptor de alta afinidade
doenças internas (LES, tumores, febre reumática, hipertireoidismo). para IgE;
(2) pela ativação do complemento (anafilotoxinas C3a e C5a);
O mecanismo básico de formação das urticas é explicado pela tríplice
reação de Lewis: eritema inicial pela dilatação capilar; resposta (3) por estímulos diretos como a acetilcolina (terminações nervosas
secundária produzida por dilatação arteriolar mediada por reflexos colinérgicas da pele);
nervosos axonais; e formação da urtica causada pelo extravasamento (4) liberadores diretos da histamina (químicos denominados
de fluido intravascular para o espaço extravascular, secundário ao secretagogos), os quais provocam mobilização do cálcio, tais como a
aumento da permeabilidade vascular. codeína, morfina, meperidina, succinilcolina, polimixina B, AAS,
- essas reações podem ser reproduzidas pela injeção intradérmica de quinina, tiamina, dextrana, meios de contraste iodados, composto
vários mediadores vasoativos, comuns aos mastócitos, que são 48/80, iontóforos do cálcio;
considerados os principais responsáveis pela maioria dos casos de (5) por outros compostos como os crustáceos, morangos e corantes;
urticária e angioedema.
(6) estímulos físicos (calor, frio, vibração, luz, pressão, água);
Os mastócitos produzem dois tipos de mediadores:
(7) neuropeptídios (substância P);
- mediadores pré-formados: ficam armazenados nos grânulos
citoplasmáticos → histamina, fatores quimiotáticos, heparina e fator (8) proteína básica principal (MBP) do eosinófilo;
de necrose tumoral; (9) citocinas (IL-1, IL-3, IL-8, GM-CSF, fator 4 plaquetário).
- mediadores neoformados: são formados no momento da atuação O estímulo imune mais bem caracterizado aos mastócitos é a ligação
dos mastócitos → derivados do ácido araquidônico e o fator ativador de antígenos divalentes específicos aos seus receptores para IgE
de plaquetas (PAF). (FcεRI) → todos os mastócitos teciduais expressam FcεRI em sua
superfície, onde ocorre a ligação com a porção Fc dos anticorpos IgE.

A histamina é o principal mediador envolvido nos fenômenos de Após o estímulo imune, os mastócitos atravessam um período
vasodilatação, exsudação plasmática e prurido, tendo a participação refratário, o que possibilita a regeneração dos mediadores associados
também de outros mediadores, como a bradicinina, serotonina, aos seus grânulos → após liberação de histamina, é necessário de
leucotrienos, prostaglandinas, acetilcolina e anafilatoxinas. um dia ou mais para os mastócitos acumulá-la novamente.
A sucessão de mediadores secretados pelos mastócitos ativados inicia O processo de degranulação pode ser inibido por epinefrina, teofilina
uma resposta imediata na urticária → esses mediadores podem ser e AMPc, os quais atuam nos nucleotídios cíclicos, bem como pela
capazes de desencadear um estado mais persistente de inflamação, citocalasina B e colchicina, as quais interferem no funcionamento dos
denominado de resposta de fase tardia da urticária. microtúbulos e na formação da proteína tubulina.
- a histamina liberada pode inibir uma futura degranulação por
mecanismo deretroalimentação negativa, envolvendo os receptores
H2 e elevando os níveis da AMPc;
- a acetilcolina, por sua vez, aumenta a liberação da histamina por
elevar os níveis do monofosfato de guanosina cíclico (GMPc).
Existem alguns fatores moduladores que favorecem a vasodilatação:
ingestão de álcool, calor, febre, exercícios, estresse emocional e
fatores hormonais (explicam as exacerbações pré-menstruais e pós-
menopausa às vezes observados nas urticárias).

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

AUTOIMUNIDADE NA URTICÁRIA As manifestações clínicas dependem da via de exposição: via cutânea


(urticária, dermatite e prurido), transportada pelo ar (rinite,
Recentemente foi demonstrado a existência de uma urticária crônica conjuntivite, asma) e via mucosa (anafilaxia, taquicardia, angioedema,
autoimune, pela presença de autoanticorpos antirreceptores de alta náuseas, vômitos, dor abdominal, hipotensão).
afinidade por IgE e anti-IgE → correspondem a cerca de 25-50% das
urticárias crônicas em geral e a cerca de 60% dos pacientes com - o látex também pode causar, menos frequentemente, dermatite de
urticária crônica grave, apresentam esses autoanticorpos. contato alérgica e por irritante primário → porém o eczema de contato
é provocado geralmente pelos aditivos empregados na fabricação da
borracha.
Após a exposição ao látex da borracha natural (LBN), ocorre a
sensibilização a uma das diversas proteínas que compõem o látex →
antígeno induz os plasmócitos a produzirem anticorpos IgE ou IgG4
específicos ao LBN, que se ligam aos receptores de superfície de alta
afinidade nos mastócitos.
- após uma reexposição, a resposta alérgica ocorre quando esses
anticorpos são ligados ao antígeno do LBN → mediadores, tais como
a histamina e metabólitos do ácido araquidônico, são liberados de
maneira imediata por mastócitos, determinando aumento da
permeabilidade vascular, vasodilatação e broncoconstrição, expressos
clinicamente como urticária, hipotensão e asma.

O diagnóstico clínico da urticária autoimune é inferido pelo teste OUTROS POSSÍVEIS MECANISMOS ETIOPATOGÊNICOS
cutâneo do soro autólogo, que é realizado por coleta de sangue do Sugere-se que a gastrina, liberada pelas células G do antro gástrico e
paciente, durante episódio de urticária, com separação do soro por duodeno proximal imediatamente após a alimentação, poderia estar
centrifugação → em seguida, injeta-se por via intradérmica, na pele envolvida nas reações anafiláticas e nas urticárias relatadas após a
clinicamente não envolvida pela urticária, um volume de 0,05 mL do ingestão de determinados alimentos → corrobora esta teoria a
soro; a reação na pele inoculada é submetida à leitura após 30 min. observação de que uma correlação direta entre os sintomas clínicos
- a formação de uma urtica com um diâmetro de pelo menos 1,5 mm com a detecção de IgE específica a um antígeno não é sempre possível
maior que o edema provocado pela injeção de solução salina estéril, nos casos suspeitos de alergia alimentar.
usada como controle, é considerada como teste positivo (grau de - sabe-se que a ingestão de proteínas provoca uma secreção
recomendação B). significativamente maior da gastrina, em comparação com
carboidratos e lipídios.
AUTOIMUNIDADE À TIREOIDE - especularam ainda que as síndromes pós-prandiais de
hipersensibilidade imediata-símile, tais como a anafilaxia induzida pelo
Demonstrou-se que em até 20% dos pacientes com urticária crônica
exercício apenas após a alimentação, a hipotensão pós-prandial nos
refratária ao tratamento podem ser encontrados títulos elevados de
idosos e a urticária inexplicada após a alimentação poderiam ter como
anticorpos antitireoide (antiperoxidase e antitireoglobulina), enquanto,
substrato a atuação da gastrina, influenciando a expressão clínica da
na população geral, espera-se encontrá-los em apenas cerca de 3-4%
liberação dos mediadores dos mastócitos nesses pacientes (grau de
dos indivíduos saudáveis.
recomendação C).
O encontro de autoanticorpos antitireoide e anticorpos anti-FcεRIα,
Nas urticárias recorrentes e crônicas postula-se que possa estar
simultaneamente, em alguns pacientes com urticária crônica parece
envolvida uma intolerância à histamina, determinada por uma
indicar a existência de um estado de doença secundário a um
sobrecarga de histamina contida na dieta e/ou metabolismo anormal
processo autoimune e/ou uma ruptura na regulação imune → esta
da histamina (deficiência da diamino-oxidase – principal enzima
ideia é reforçada por Rottem, que não correlacionou a direta
envolvida na degradação da histamina, com atividade predominante
participação dos autoanticorpos contra a tireoide na etiopatogenia da
na mucosa intestinal).
urticária crônica, postulando que provavelmente estariam relacionados
paralelamente, como eventos autoimunes (grau de recomendação C). - o álcool e alguns medicamentos (imipeném, dobutamina,
pancurônio, pentamidina, verapamil, isoniazida, ácido clavulânico,
cloroquina, metoclopramida, entre outros), podem diminuir a atividade
URTICÁRIA DE CONTATO AO LÁTEX dessa enzima e determinar maior sensibilidade a alimentos ricos em
A alergia ao látex da borracha natural afeta pessoas expostas histamina ou alimentos geradores de histamina, como peixes (atum,
rotineiramente aos produtos feitos com borracha natural, obtidos da sardinha, anchova), queijos (parmesão, emental, gouda), salame,
árvore Hevea brasiliensis, sendo os grupos de maior risco: linguiça, certos vegetais (tomate), vinhos e cervejas.
profissionais da área de saúde, trabalhadores da indústria da borracha,
pessoas submetidas a múltiplos procedimentos cirúrgicos e
HISTOPATOLOGIA
portadores de espinha bífida.
A alergia ao látex da borracha consiste em uma reação de O exame histopatológico da urtica clássica demonstra edema da
hipersensibilidade do tipo I de Gell e Coombs, mediada pela IgE, a epiderme e da derme superficial e média, com dilatação das vênulas
qual pode levar à anafilaxia e à morte → as reações ao látex da pós-capilares e vasos linfáticos da derme superficial; não é específico.
borracha ocorrem como síndrome da urticária de contato, tipicamente No angioedema, alterações similares ocorrem na derme profunda e no
dentro de 1h após a exposição a essa substância. subcutâneo.

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Dependendo da duração da urtica, há um infiltrado inflamatório misto Ainda existe outra subdivisão em:
perivascular de intensidade variável, constituído por neutrófilos e/ou - URTICÁRIA CRÔNICA INTERMITENTE: quando há surtos intermitentes
eosinófilos, macrófagos e linfócitos do tipo T auxiliares. com intervalos de tempo variáveis → causas mais frequentes são, em
geral, as mesmas dos processos agudos (drogas, alimentos e
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS inalantes);
- URTICÁRIA CRÔNICA CONTÍNUA: quando continuamente surgem
URTICÁRIA AGUDA lesões → os agentes etiológicos mais comuns, além de drogas,
Possui início agudo, duração < 6 semanas, com formação de placas alimentos e inalantes, são distúrbios gastrointestinais, infecções
erimatoedematosas grandes, pruriginosas e de duração efêmera, focais, infestações, alterações endócrinas, doenças internas,
acompanhadas, com frequência, de fenômenos gerais e angioedema autoimunidade e fatores psicogênicos.
→ o episódio de urticária aguda pode persistir por horas a dias,
inclusive geralmente com recidiva em menos de 30 dias.
As lesões urticadas são bem demarcadas, podendo ser pequenas a
grandes (< 1 cm a > 8 cm), eritematosas ou brancas com bordas
eritematosa, redondas, ovais, acriformes, anulares ou serpiginosas →
são pruriginosas e transitórias.
O angioedema é da cor da pele e atinge mais frequentemente
extremidades, pálpebras, lábios, língua e laringe (provoca asfixia)
causando o aumento transitório devido ao edema subcutâneo.
Não é difícil encontrar o fator desencadeante, sendo frequentemente
associado a alimentos (morango, frutos do mar, castanhas),
medicamentos (antibióticos, AAS, AINES, morfina e codeína),
hemoderivados, contrastes, infecções virais e doenças febris, picadas
de insetos (abelha e vespa).

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS EM ALGUNS TIPOS DE URTICÁRIA

URTICÁRIAS FÍSICAS
Formam um grupo heterogêneo de doenças devido à ampla
variabilidade de estímulos desencadeantes ou formas clínicas
variáveis, bem como sua associação a outros tipos de urticária.
Isso sugere que nas formas tradicionais participam mecanismos não
específicos, como menor limiar de ativação mastocitária ou maior
reatividade das células-alvo → isso tem sido observado em pacientes
com dermografismo, que também podem sofrer de hiper-reatividade
brônquica à histamina ou metacolina.
- por outro lado, mecanismos mais específicos podem ser relevantes
na urticária solar e na por calor.

DERMOGRAFISMO : ocorrem lesões urticariformes lineares após uma


pancada leve ou coçadura da pele, são pruriginosas e desaparecem
em 30 min → são acometidos 4,2% da população normal.
URTICÁRIA CRÔNICA (UC)
A urticária é considerada crônica quando persiste por > 6 semanas,
onde as lesões são menos intensas e extensas, mas são persistentes
→ atinge cerca de 30% dos pacientes e pode prolongar-se por anos,
geralmente acometendo mulheres adultas
- o tratamento é difícil e apenas sintomático.
A UC é dividida em dois subtipos:
- URTICÁRIA CRÔNICA IDIOPÁTICA OU ESPONTÂNEA: onde não há
nenhum desencadeador externo conhecido → em pelo menos 70%
dos casos não é possível identificar a causa;
- URTICÁRIA CRÔNICA INDUZÍVEL: existe um fator desencadeante
identificável, como nas urticárias físicas, colinérgicas e de contato.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

URTICÁRIA AO FRIO : habitualmente observada em crianças ou adultos ANGIOEDEMA


jovens, surgindo lesões urticariformes limitadas às áreas expostas ao
frio, que aparecem dentro de alguns minutos. É um quadro que se caracteriza pelo edema, em geral volumoso, que
acomete primordialmente a hipoderme → afeta geralmente lábios,
- as lesões podem ser
língua, pálpebras e genitália, sendo a laringe uma localização grave,
exclusivamente limitadas à área
pelo risco de asfixia.
de contato com o frio ou podem
ser generalizadas, com maior - as lesões aparecem abruptamente e desaparecem em horas,
risco de sintomas sistêmicos, podendo, entretanto, durar dias; em geral, não há prurido.
como cefaleia, calafrios, Acompanha cerca de 50% dos casos de urticária crônica idiopática e,
taquicardia e diarreia. quando isso é observado, o prognóstico é pior: 75% dos casos
apresentam episódios recorrentes por mais de 5 anos.
URTICÁRIA SOLAR : ocorre após exposição ao sol, onde as lesões
urticadas persistem por menos de 1h, podendo ser acompanhadas de A abordagem para os pacientes com angioedema inclui:
síncope. 1) anamnese cuidadosa sobre existência de história familiar e exame
físico minucioso;
URTICÁRIA COLINÉRGICA : a prática de exercício a ponto de transpirar
provoca pequenas lesões urticariformes papulosas e eritematosas, 2) analisar os níveis do quarto componente do complemento (C4)
características e altamente pruriginosas. - se forem normais → proceder à investigação orientada para as
urticárias;
3) se os níveis de C4 forem reduzidos, deve-se dosar a proteína
inibidora da C1-esterase

ANGIOEDEMA DE PRESSÃO : edema eritematoso induzido por pressão


duradoura (edema das nádegas quando o individuo permanece
sentado, edema das mãos após usar um martelo, edema dos pés após
caminhar) → tardio (30 min a 12h) e doloroso, podendo persistir por
vários dias.

ANGIOEDEMA VIBRATÓRIO : pode ser familiar (autossômico dominante) ou


esporádico, sendo raro → resulta da liberação de histamina por
mastócitos ocasionada por um estímulo “vibratório” (por ex., esfregar
uma toalha nas costas).

URTICÁRIA DE CONTATO
É a que ocorre em consequência do contato com determinada
substância específica (plantas, pelo de animais, leite, frutas, trigo etc.),
podendo ocorrer tanto por mecanismos não imunes como imunes →
aparece poucos minutos após o contato e desaparece no período de
1-4h.
Em geral, ocorre sob uma forma localizada na área do contato,
iniciando-se dentro de minutos a 1 h após a exposição ao agente O angioedema pode representar uma das manifestações clínicas da
causal → as reações, na maioria dos casos, são de intensidade leve. anafilaxia, que pode ser graduada em:
Grau Sinais e sintomas
URTICÁRIA-VASCULITE Leve (pele) Urticária, eritema generalizado ou angioedema
Moderado (envolvimento Dispneia, estridor, sibilos, náuseas, vômitos,
Doença multissistêmica caracterizada por lesões cutâneas respiratório, cardiovascular lipotimia, diaforese, desconforto torácico ou de
semelhantes à urticária, exceto por persistirem por > 24h (mais ou GI) laringe ou dor abdominal
duradouras), apresentam hiperpigmentação e descamação residuais
Grave (hipoxia, hipotensão Cianose, saturação de O2 < 92%, hipotensão,
e, em vez de prurido, despertam dor e ardor.
ou comprometimento confusão mental, colapso e perda de
Podem ser acompanhadas por neurológico) consciência ou incontinência fecal e urinária
artralgias, artrites ou outros
fenômenos sistêmicos (febre,
elevação da VHS, náusea e dor
abdominal).

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ANGIOEDEMA ADQUIRIDO ANGIOEDEMA POR INIBIDORES DA E CA


Pode ocorrer como entidade autônoma, habitualmente alérgica, ou A incidência de angioedema entre os usuários de inibidores da enzima
associada a qualquer outro tipo de urticária, doenças do colágeno ou conversora da angiotensina (IECA) é de 0,1 a 0,5%, e em cerca de
neoplasia interna, em especial linfomas. 20% pode ser grave, o que tende ocorrer nos IECA de metabolização
- angioedema alérgico é a apresentação mais frequente e é lenta como enalapril e lisinopril.
desencadeado por alimentos, medicamentos, picadas, calor/frio por - cerca de 50% dos casos ocorrem na primeira semana de tratamento,
serem capazes de provocar uma liberação de histamina, levando a embora possa surgir tardiamente; corresponde a cerca de 8% dos
urticária e/ou prurido. casos de todos os angioedemas.
A patogênese está relacionada com o acúmulo de bradicinina devido
ANGIOEDEMA HEREDI TÁRIO a sua degradação reduzida quando do uso de IECA. O inibidor da C1-
esterase costuma ser normal.
Distúrbio autossômico dominante grave → aparece mais comumente
na infância. Pode ocorrer após estresse e trauma (físico e emocional). Icatibanto é um decapeptídio, um antagonista competitivo seletivo do
receptor B2 da bradicinina e por isso indicado no tratamento das
O edema é não depressível, recorrente, episódico, assimétrico e crises do angioedema hereditário, assim como no induzido por IECA
autolimitado (dura de 12-72h), sendo que geralmente não há eritema → empregado na dose de 30 mg por via SC, preferencialmente
nem prurido → não responde aos anti-histamínicos. aplicado no abdome; raramente requer mais de uma dose nas crises
- podem ocorrer náuseas, vômitos, cólicas, urgência urinária e outras agudas cujos resultados são muito bons.
manifestações. - seu uso não é recomendável em pacientes com cardiopatia
Ocorre pela redução da atividade funcional do inibidor da C1-esterase, isquêmica nem em pacientes com AVC recente.
que também é o principal inibidor do fator de Hageman (fator XII) e - entre os efeitos colaterais mais comuns podem ser mencionados
da calicreína, duas enzimas necessárias para a formação de cininas náuseas, dor abdominal, astenia, aumento de CPK e enzimas
→ leva à produção de bradicinina, desencadeando o angioedema. hepáticas, cefaleia e reações cutâneas. No local frequentemente
O angioedema hereditário (AEH) é subdividido em: ocorrem eritema, edema, calor, dor e prurido.
- tipo I: corresponde a mais de 80% de todos os casos e que se
caracteriza por redução na produção da C1-esterase (quantitativo);
- tipo II: compreende cerca de 20% dos casos de AH e em que o nível
da enzima está normal ou mesmo elevado, mas esta não é funcionante
(qualitativo);
- tipo III, recentemente descrito e tem natureza familial, predominando
em mulheres.

DIAGNÓSTICO DAS URTICÁRIAS


Em geral, o aspecto papuloedematoso, o prurido e a duração fugaz História familiar e pessoal de urticária e atopia;
permitem facilmente o diagnóstico de urticária. História prévia ou concomitante de alergia, infecções, doenças
Excepcionalmente, é necessário o diagnóstico diferencial com internas ou outras causas possíveis;
algumas formas de eritema polimorfo → mais comum é a necessidade Indução por agentes físicos ou exercício;
de diferenciação das urticárias em relação às lesões urticariformes por Alimentos relacionados e hábitos alimentares;
picadas de inseto, escabiose, pediculose e às dermatites de contato Exposição a inalantes;
urticariformes. Uso de medicamentos (AINES, betabloqueadores, IECA,
imunizações, hormônios, laxantes, entre outros);
O diagnóstico etiológico pode ser extremamente difícil, exigindo, além Tabagismo;
da anamnese minuciosa, exame físico completo, observação Tipo de atividade profissional;
prolongada do doente e investigação laboratorial. Atividades recreativas;
Tempo do início da doença, frequência e duração das lesões, Ocorrência relacionada com fins de semana, férias ou viagens ao
variação durante o dia/noite; exterior;
Forma, tamanho e distribuição das lesões; Implantes cirúrgicos;
Angioedema associado; Reações a picadas de inseto;
Sintomas associados às lesões (prurido, queimação, dor); Relação com o ciclo menstrual;
Estresse e qualidade de vida em relação à urticária.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

A investigação laboratorial deve ser orientada para cada caso - são ainda importantes o teste do gelo nas urticárias ao frio e,
individualmente, mas pode incluir: hemograma, fatores antinucleares, eventualmente, o exame histopatológico para exclusão de outros
complementenemia, sorologia para sífilis, crioglobulinemias, diagnósticos.
dosagem de hormônios e anticorpos tireoidianos, exames
micológicos, exame parasitológico, exame de urina, raio X de seios
da face e dentes.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO
50% dos pacientes que apresentam apenas urticária ficam livres das
lesões em 1 ano, porém, 20% tem lesões durante mais de 20 anos.
O prognóstico é satisfatório na maioria das síndromes, com exceção
do angioedema hereditário, que pode ser fatal sem tratamento.

TRATAMENTO
As primeiras medidas terapêuticas na urticária são a descoberta e o
afastamento do agente causal, além disso, deve-se aliviar os sintomas
por meio do tratamento medicamentoso.

TRATAMENTO NA URTICÁRIA AGUDA Em casos que não respondem ao uso dos anti-H1, ou que a
apresentação da doença aguda é grave com angioedema associado, é
A abordagem terapêutica das urticárias agudas é fundamentada no uso indicado o uso de corticosteroide oral (Prednisolona) na dose de 50
dos anti-histamínicos de 2ª geração (não sedantes) como abordagem mg/dia VO para adultos e 1 mg/kg/dia para crianças, por 3 dias.
padrão → deve ser mantido até uma ou duas semanas após
desaparecimento das urticas. Se houver angioedema com sinais de evolução para anafilaxia (edema
de laringe, de glote, broncospasmo, náuseas e vômitos, hipotensão
Mecanismo de ação anti-histamínicos arterial), deve-se administrar epinefrina 1 mg/mL, por via SC ou IM
A histamina liberada em resposta a certos estímulos exerce seus (preferencial na coxa anterolateral). Dependendo da resposta à
efeitos ligando-se a vários tipos de receptores específicos (H1, H2, H3 epinefrina, podem ser necessárias outras medidas, como:
e H4) → os receptores H1 e H2 são amplamente expressados e são - elevar as extremidades inferiores → previne hipotensão ortostática
alvos de fármacos com utilidade clínica. e auxilia o desvio da circulação da periferia para a cabeça, o coração
A histamina tem um amplo espectro de efeitos farmacológicos e os rins;
mediados pelos receptores H1 e H2, por ex., os receptores H1 são - manter a permeabilidade das vias respiratórias → administrar
importantes na produção de contração da musculatura lisa e no oxigênio (se necessário) em fluxo de 6-8 L/min;
aumento da permeabilidade dos capilares, sendo assim, os receptores
H1 medeiam vários processos patológicos, incluindo rinite alérgica, - estabelecer acesso venoso → usar solução salina IV para reposição
dermatite atópica, conjuntivite, urticária, broncoconstrição, asma e de fluidos.
anafilaxia. A histamina ainda estimula as células parietais do estômago,
causando aumento na secreção ácida pela ativação de receptores H2.
Os ANTI-HISTAMÍNICOS H1 podem ser de 1ª ou 2ª geração → os de
primeira geração, são mais antigos, mas ainda são amplamente
utilizados, já que são eficazes e baratos, porém, a maioria deles entra
no SNC causando sedação e costumam interagir com outros
receptores, produzindo variedade de efeitos indesejados (exemplos:
bronfeniramina, clorfeniramina, prometazina). Já os de segunda
geração, são específicos para os receptores periféricos H1, não
atravessando a BHE, causando menos depressão do SNC (por ex.,
loratadina, desloratadina e fexofenadina).
- a ação desses fármacos consiste em bloquear a resposta mediada
pelo receptor no tecido alvo, por isso, são mais eficazes em prevenir
os sintomas do que em revertê-los depois de desencadeados → além
disso, também possuem efeitos adicionais não relacionados com o
bloqueio H1, ligando-se também a receptores colinérgicos,
adrenérgicos ou serotoninérgicos.
Os BLOQUEADORES DOS RECEPTORES HISTAMÍNICOS H2 apresentam
baixa ou nenhuma afinidade pelos receptores H1, sua utilidade clínica
principal é como inibidor da secreção do HCl no tratamento de úlceras
e pirose → exemplos: cimetidina, ranitidina, famotidina e nizatidina.
- a associação de um antagonista H2 aos anti-H1 convencionais pode
ser útil em alguns pacientes com urticária crônica, tendo respalto
teórico, embora evidências dos benefícios dessa associação ainda
sejam pobres e a eficácia discutida.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

TRATAMENTO NA URTICÁRIA CRÔNICA


Também deve ser individualizado para cada paciente, existindo várias
ANTILEUCOTRIENOS : também consistem no tratamento de segunda linha
intervenções farmacológicas e não farmacológicas possíveis.
após estudos em que foi observado boa resposta em cerca de 20-
50% dos pacientes que não respondiam à terapêutica apenas com
ANTI-HISTAMÍNICOS : consistem nos medicamentos de primeira linha e
anti-histamínicos → montelucaste 10 mg/dia para adultos.
fundamentais na urticária crônica, com preferência para os anti-
histamínicos de 2ª geração não sedantes ou pouco sedantes, como a
IMUNOSSUPRESSORES/IMUNOMODULADORES : consistem no tratamento de
cetirizina, fexofenadina, loratadina, mizolastina e, mais recentemente,
levocetirizina, desloratadina e ebastina todos por VO. terceira linha, usados em portadores de doença grave e persistente,
com falência terapêutica das outras medidas ou onde a investigação
Caso a resposta não seja satisfatória com os anti-H1 não sedantes, demonstrou ter a urticária de base autoimune.
pode-se introduzir um anti-H1 clássico à noite (propriedades
sedativas), sendo preferida a hidroxizina 25 mg. Quando há Para reduzir o uso de corticoesteroides sistêmicos, pode-se utilizar a
angioedema associado, também opta-se por uso do anti-H1 clássico ciclosporina, plasmaférese e imunoglobulina intravenosa (grau de
(hidroxizina 25 a 100 mg/dia VO, fracionado 25 mg a cada 6 ou 8h). recomendação C).

Pode-se ainda fazer uso da doxepina, um antidepressivo tricíclico, - outros imunomoduladores, como sulfassalazina, hidroxicloroquina,
com potente efeito anti-histamínico (bloqueiam receptores H1) → a metotrexato, varfarina e sulfona, não possuem estudos controlados e
dose usual é de 10 mg 3x/dia. a eficácia não está totalmente comprovada.
O omalizumabe tem sido indicado no tratamento da urticária idiopática
CORTICOESTEROIDES ORAIS : consistem no tratamento de segunda linha, crônica que permanece sintomática apesar do tratamento com anti-
podendo ser necessários em curtos períodos de uso (7 a 14 dias), histamínicos em pacientes > 12 anos → dose de 300 mg SC a cada
durante exacerbações importantes da urticária crônica que não 4 semanas.
responde completamente aos anti-histamínicos.

TRATAMENTO DO ANGIOEDEMA HEREDITÁRIO


As medicações de eleição para o tratamento do período intercrítico odontológicos, utilizando-se para isso o ácido tranexâmico 3 a 4 dias
são os androgênios com baixo potencial virilizante, tais como danazol, antes ou aumentando-se a dose dos esteroides anabólicos (danazol
estanazol e oximetolona. A dose diária de manutenção eficaz dos 600 mg/dia).
androgênios é de 2,5 mg para o estanazol e de 200 mg para o danazol.
No tratamento de emergência de crises graves de angioedema com
- uso em mulheres e crianças deve ser bem avaliado, pois há risco de deficiência do inibidor da C1-esterase, deve-se utilizar concentrado
virilização e fechamento precoce das epífises ósseas. do inibidor do C1, ou plasma fresco congelado, ou profilaxia antes de
uma cirurgia de urgência, especialmente quando se necessita de
No angioedema com deficiência do inibidor da C1-esterase, deve-se
conduzir profilaxia antes de uma cirurgia eletiva ou procedimentos intubação endotraqueal.

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

TERAPIA NÃO MEDICAMENTOSA (O RIENTAÇÕES GERAIS)


▪ Remover a causa identificada e explicar sobre a doença; ▪ Dietas de exclusão podem ser implementadas, apenas se a
▪ Reduzir o estresse emocional, sobreaquecimento do corpo e a anamnese sugerir nexo causal → excluir, quando possível,
ingestão alcoólica; aditivos alimentares, como conservantes, salicilatos naturais e
▪ Evitar o uso do AAS, AINES, codeína e morfina; corantes (metabissulfito de sódio, benzoato de sódio, glutamato
▪ Pacientes com angioedema devem evitar o uso dos IECA; monossódico, nitrato de sódio, tartrazina, eritrosina, ácido sórbico
e hidroxianisol butilado).

REFERÊNCIAS
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
WOLFF. Dermatologia de Fitzpatrick. 7 ed. 2014
WHALEN, Karen. Farmacologia Ilustrada. 6 ed. 2016

10
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 4

HANSENÍASE - é um parasita intracelular obrigatório, com predileção pelas células


do sistema reticuloendotelial (macrófagos), especialmente do SNP
A hanseníase, também conhecida como Lepra ou mal de Hansen, é (células de Schwann), células da pele e mucosa nasal.
uma doença crônica, infectocontagiosa e granulomatosa, cujo agente
etiológico é o Mycobacterium leprae.
A doença acomete principalmente os nervos superficiais da pele e
troncos nervosos periféricos (localizados na face, pescoço, terço
médio do braço e abaixo do cotovelo e dos joelhos), mas também
pode afetar os olhos e órgãos internos (mucosas, testículos, ossos,
baço, fígado, etc.) → não atinge o SNC.
Se não tratada na forma inicial, a doença quase sempre evolui, torna- Os bacilos de Hansen podem estar isolados, agrupados ou em
se transmissível e pode atingir pessoas de qualquer sexo ou idade, aglomerados compactos bacilares, chamados “globias” (fortemente
inclusive crianças e idosos → essa evolução ocorre, em geral, de unidos por material gelatinoso).
forma lenta e progressiva, podendo levar a incapacidades físicas.
A doença surgiu na Índia e na China, mas sua disseminação pelo
Mediterrâneo levou a grande número de casos na Europa durante as
Cruzadas (final do século XI) → foi nesse período também que se
iniciou a perseguição aos “leprosos”.
- no Brasil, os doentes eram vítimas de internação compulsória, sendo
realizada a prática do isolamento até 1976 → há mais de 20 anos, a
doença tem tratamento capaz de curar a totalidade dos casos, porém,
seu diagnóstico continua causando grande impacto psicossocial
(preconceitos e estigmas) e o aspecto humanista em relação à doença
só passou a ter espaço recentemente.
O bacilo possui uma membrana plasmática mais interna, seguida da
parede celular que possui duas camadas:
EPIDEMIOLOGIA - camada interna eletrodensa → composta por peptideoglicanos e
arabinogalactanas;
A hanseníase é considerada doença tropical negligenciada por
persistir endêmica, quase exclusivamente em populações em - camada externa eletrotransparente → composta pela ligação dos
condição de pobreza nos países em desenvolvimento, mesmo após a ácidos micólicos (AM) com a porção terminal das arabianas → forma
introdução de tratamento eficaz e gratuito → especialmente na Ásia, a camada mais interna da pseudobicamada lipídica.
África e América Latina. A parte externa dessa pseudobicamada lipídica é constituída pela
Em relação à incidência, entre os anos de 2015 a 2019 foram ligação de ácidos micólicos, ácidos micocerosoicos e glicolipídios
diagnosticados no Brasil cerca de 137.385 novos casos de fenólicos.
hanseníase, sendo que 55% corresponderam ao sexo masculino, com Ainda mais externamente, recobrindo toda a micobactéria, existe uma
maior frequência na faixa etária entre 50 e 59 anos. cápsula constituída de PGL (glicolipídio fenólico), lipoglicanas e
A partir do levantamento da OMS, em 2016, de mais de 214 mil casos fosfolipídios.
de hanseníase no mundo, sendo que Brasil, Índia e Indonésia, juntos, - PGL-1 é especifico do M. leprae e é a chave para entrar na célula de
foram responsáveis por 81% desse total, observa-se ainda a Schwann, pois se une ao receptor alfadestroglicana e laminina alfa-2
necessidade de estratégias para diagnóstico e tratamento adequados. da membrana basal → a presença especifica do PGL-1 garante que o
- por isso, nos últimos anos, observou-se sucesso na implantação de BH seja a única micobactéria neutrotrópica.
programas de controle da hanseníase, apoiados pela OMS → o foco - PGL-1 ainda é responsável pela resistência à ação destruidora do
é a detecção precoce de casos novos, tratamento gratuito com macrófago e à ação moduladora do sistema imune.
poliquimioterapia e redução da carga da doença nas comunidades
endêmicas.
A prevalência da doença vem diminuindo em todo o mundo nos
últimos 20 anos, porém esse declínio desacelerou recentemente.

AGENTE ETIOLÓGICO
O Mycobacterium leprae foi identificado em 1973, sendo também
chamado de Bacilo de Hansen → é um bacilo álcool-ácido resistente
(BAAR), gram-positivo, ligeiramente encurvado e de extremidades
arredondadas.

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

O BH ainda não pode ser cultivado em meios de cultura (in vitro), - imunidade celular está preservada nas formas benigna e deprimida;
sendo um dos fatores que dificulta o estudo de suas propriedades, - exaltação da imunidade humoral nas apresentações bacilíferas.
apesar disso, sabe-se que ele apresenta multiplicação extremamente
lenta (justifica a apresentação insidiosa da doença e o período de Após a penetração do M. leprae no organismo, o bacilo se localiza na
incubação de anos) e também possui preferência para ambientes com célula de Schwann e na pele → sua disseminação para outros tecidos
temperatura mais baixa (< 36,5 ºC – pele, nervos periféricos, câmera (linfonodos, olhos, testículos, fígado) pode ocorrer nas formas mais
anterior do olho, vias respiratórias superiores e testículos). graves da doença, onde o agente etiológico não encontra resistência
contra sua multiplicação.
- na célula de Schwann, o bacilo permanece protegido dos
TRANSMISSÃO
mecanismos de defesa do hospedeiro e, como essa célula não tem
O homem é considerado o único reservatório natural do bacilo, apesar capacidade fagocítica profissional, é incapaz de destruir patógenos,
do relato de animais selvagens naturalmente infectados (tatus e permitindo que o bacilo se multiplique continuamente → além disso,
macacos). a própria barreira sanguínea do nervo limita o acesso de vários
medicamentos na célula de Schwann, fazendo com que ela seja a
A hanseníase é transmitida por meio de contato próximo e prolongado
hospedeira ideal, onde o bacilo pode permanecer no SNP e
de uma pessoa suscetível com um doente com hanseníase que não
desencadear a lesão neurológica.
está sendo tratado → normalmente, a fonte da doença é um parente
próximo que não sabe que está doente, como avós, pais, irmãos, A imunidade humoral (dependente de anticorpos) é ineficaz contra o
cônjuges, etc. M. leprae. A defesa é efetuada pela imunidade celular, capaz de
fagocitar e destruir os bacilos, mediada por citocinas (TNF-alfa, IFN-
A bactéria é transmitida principalmente pelas vias aéreas superiores
gama) e mediadores da oxidação, fundamentais na destruição bacilar
(pelas secreções nasais e da orofaringe), e não pelos objetos
no interior dos macrófagos.
utilizados pelo paciente.
Assim, com o início da luta entre o bacilo e as defesas do indivíduo,
- soluções de continuidade na pele eventualmente podem ser porta
origina-se o grau de patogenicidade, determinando algumas formas
de entrada da infecção e secreções orgânicas (leite, suor, esperma e
de evolução da infecção:
secreção vaginal) podem eliminar bacilos, mas não possuem
importância na disseminação da hanseníase. 1) resistência natural suficiente para destruir o bacilo → impede a
infecção;
Fatores socioeconômicos de risco: higiene precária, ausência de
saneamento básico, más condições de moradia e desnutrição. 2) em pacientes com sistema linfócito-macrofágico competente, a
infecção evolui para manifestação subclínica, que pode regredir
O bacilo de Hansen possui alta infectividade, mas baixa
espontaneamente ou evoluir para a forma de hanseníase
patogenicidade e virulência.
indeterminada (MHI), caso as defesas forem parcialmente deficientes;
Estima-se que a maioria da população possui defesa natural
3) hanseníase indeterminada também pode ser abortada
(imunidade) contra o M. leprae, portanto, a maior parte das pessoas
espontaneamente (pela contínua estimulação da imunidade celular –
que entrarem em contato com o bacilo não adoecerão. Além disso,
70% dos pacientes) ou evoluir para:
sabe-se que existe uma influência genética na susceptibilidade ao M.
leprae, através da observação que familiares de pessoas com - hanseníase tuberculoide polar (paucibacilar – polo benigno) →
hanseníase possuem maior chance de adoecer → marcadores quando o doente tem alto grau de resistência (reação de Mitsuda
imunológicos relacionados à capacidade dos macrófagos em destruir positiva), com boa resposta imunológica celular, sem multiplicação
o bacilo ou deixa-lo se multiplicar. dos bacilos (são eliminados na grande maioria) → surge granuloma
tuberculoide e a pesquisa anti-PGL1 mostra títulos baixos (semelhante
A resistência à infecção pode ser avaliada pela reação de Mitsuda, que
aos da população sem a doença);
consiste na injeção intradérmica de uma suspensão de bacilos mortos
pelo calor → a leitura do teste é tardia (após 4 semanas), se surgir - hanseníase virchowiana polar (multibacilar – polo maligno) →
um nódulo eritematoso, indica resistência ao bacilo (teste positivo) e quando o doente não tem resistência e os bacilos se multiplicam
representa o desenvolvimento de uma imunidade celular após livremente nos macrófagos e se disseminam pelos tecidos,
estimulo pelo próprio M. leprae ou outras micobactérias → polo caracterizando a forma grave e contagiante da doença → surgem
tuberculoide. granulomas macrofágicos e níveis elevados de anti-PGL1.
- a positividade a essa reação aumenta com a idade e ocorre em cerca - quando o grau de resistência celular for intermediário (entre os
de 80% da população adulta. polos), há evolução para o grupo dimorfo ou borderline (multibacilar),
que pode apresentar manifestações semelhantes à forma tuberculoide
(DT) ou à virchowiana (DV) ou equidistantes entre os dois polos (DD)
ETIOPATOGENIA → nesses doentes, a reação de Mitsuda pode ser fracamente positiva
ou negativa, e a imunidade celular será maior quanto mais próximo
O período de incubação é longo (meses a anos), em média de 2 a 5
estiver do polo tuberculoide.
anos → isso ocorre pelo M. leprae ser um microrganismo que se
multiplica lentamente, por divisão binária simples a cada 14 dias, 4) outra possibilidade é da doença se estabelecer, desde o princípio,
sendo necessários muitos anos para que o organismo possua uma de maneira definida, ou seja, no sentido do polo tuberculoide ou
carga bacilar capaz de se expressar clinicamente. virchowiano.
Existe uma correlação bem nítida entre as apresentações clínicas da
doença e o grau de imunidade inata específica do paciente.

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

A capacidade de resistência à infecção baseia-se na capacidade de o Entretanto, alguns pacientes não apresentam lesões facilmente visíveis
macrófago lisar ou não o M. leprae → é provável que essa capacidade na pele, e podem ter lesões apenas nos nervos (hanseníase
seja inata e que, após o primeiro processamento intracitoplasmático primariamente neural) ou as lesões podem se tornar visíveis só após
do bacilo, haja liberação de antígenos específicos capazes de iniciado o tratamento → assim, para melhor compreensão e facilidade
sensibilizar o linfócito T, que passaria a comandar, daí em diante, essa para o diagnóstico, o guia do MS utiliza a classificação de Madri
resistência pela ativação específica do macrófago. (1953) que considera critérios de ordem clínica, imunológica,
bacteriológica, histopatológica e evolutiva:
- a característica maior da HV é a incapacidade de os macrófagos
lisarem o M. leprae, decorrendo daí a transformação do macrófago em - dois tipos estáveis (imutáveis) → correspondem aos dois polos da
célula de Virchow, que nada mais é do que um macrófago com grande doença, hanseníase tuberculoide (PB) e hanseníase virchowiana (MB);
quantidade de M. leprae.
- dois tipos instáveis → hanseníase indeterminada (PB – pode evoluir
- por outro lado, os macrófagos dos indivíduos infectados sem para qualquer tipo polar, permanecer como tal ou curar) e hanseníase
doença, ou de pacientes com HT, são capazes de lisar o M. leprae. dimorfa (MB – espectro não polar da doença).
A resistência do indivíduo é específica e parece ter uma conotação
genética → Rotberg (1937) chamou de fator N (natural) um fator
relacionado com a imunidade natural à hanseníase e que existiria
congenitamente na maioria dos indivíduos (80 a 95%), onde os não
portadores do fator N estariam na margem anérgica (5% dos
indivíduos), sendo capazes de desenvolver as formas graves da
doença.
Na forma paucibacilar (lesões tuberculoides), há predomínio de
linfócitos Th1, produzindo IL-2 e IFN-gama que impedem a
proliferação bacilar, mas podem se tornar lesivas ao organismo,
causando lesões cutâneas e neurais, pela ausência de fatores
reguladores.
Enquanto na forma multibacilar (lesões virchowianas), o predomínio é
de linfócitos T supressoras e Th2, produzindo IL-4, IL- 5 e IL-10, e a MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS – LESÕES CUTÂNEAS
produção de substâncias pelo bacilo (ex. PGL-1), no interior do
macrófago, favorece seu escape à oxidação pois essas subst. HANSENÍASE INDETERMINADA (PAUCIBACILAR)
possuem função supressora da atividade do macrófago e favorecem
sua disseminação → por isso, as manifestações na HV são Geralmente todos os pacientes passam por essa fase no início da
decorrentes da existência do bacilo, necessitando de alta taxa de doença, podendo ser ou não ser perceptível.
multiplicação bacilar para que surjam. Normalmente afeta crianças abaixo de 10 anos, ou mais raramente
adolescentes e adultos que foram contatos de pacientes com
hanseníase.
CLASSIFICAÇÕES
- a fonte de infecção, normalmente um paciente com hanseníase
Classificação operacional da OMS (1985): para fins de tratamento, os multibacilar não diagnosticado, ainda convive com o doente, devido
doentes são classificados em: ao pouco tempo de doença.
- paucibacilares (PB) → presença de até 5 lesões de pele com A lesão geralmente é única, caracterizada por uma MANCHA
baciloscopia de raspado intradérmico negativo, quando disponível; HIPOCRÔMICA, sem alteração de relevo, com bordas mal delimitadas,
- multibacilares (MB) → presença de 6 ou mais lesões de pele OU ANIDRÓTICA e com HIPOESTESIA (térmica e/ou dolorosa, sendo que
baciloscopia de raspado intradérmico positiva. a tátil geralmente é preservada).
- podem se localizar em qualquer lugar da pele, sendo que, em
crianças, é comum a localização na face e membros inferiores.

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Ocorre COMPROMETIMENTO DE TRONCOS NERVOSOS, podendo


causar um quadro agudo de neurite, com dor, edema, fraqueza e
atrofia muscular → com a cronificação da lesão, o dano se torna mais
evidente pela anidrose e ressecamento cutâneo, alopecia, alteração
sensitiva (na ordem de perda: térmica, dolorosa e tátil) e motora
(dormência e perda da força muscular).
- se não tratado, o acometimento neural pode provocar incapacidades
e deformidades.
A perda da sensibilidade nas áreas afetadas pelas lesões (ou em outras
áreas inervadas pelos nervos periféricos) é mais frequente nos
pacientes paucibacilares, visto que a imunidade celular está
exacerbada e, com isso, ao englobar o bacilo, acaba atingindo o nervo.
Com menor frequência, pode ocorrer a FORMA NEURAL PURA, onde
não se encontram lesões cutâneas, apenas um único nervo espessado
com perda total de sensibilidade no seu território de inervação.
Na HT, pode-se encontrar o sinal da raquete → visualização do
espessamento neural emergindo da placa.

Não há comprometimento de troncos nervosos, só de ramúsculos


nervosos cutâneos.
A prova da histamina é incompleta na lesão, a biópsia de pele
frequentemente não confirma o diagnóstico e a baciloscopia é negativa
→ portanto, os exames laboratoriais negativos não afastam o
diagnóstico clínico.
- histopatologia revela um infiltrado perivascular e perineural (em Principais troncos nervosos periféricos acometidos
torno de filetes nervosos) → pode-se observar bacilos em pequeno Face: trigêmeo e facial → alterações na face, olhos e nariz;
número no interior desses filetes. Braços: radial, ulnar e mediano → alterações nos braços e mãos;
Atenção deve ser dada aos casos com manchas hipocrômicas grandes Pernas: fibular e tibial → alterações nas pernas e pés.
e dispersas, ocorrendo em mais de um membro, ou seja, lesões muito
A baciloscopia é negativa e a biópsia de pele quase sempre não
distantes, pois pode se tratar de um caso de HANSENÍASE DIMORFA
demonstra bacilos, e nem confirma sozinha o diagnóstico. O teste de
MACULAR (forma multibacilar) → nesses casos, é comum o paciente
Mitsuda é fortemente positivo e essa forma tende à cura espontânea
queixar-se de formigamentos nos pés e mãos, e/ou câimbras, e na
(porém a orientação é que os casos sejam tratados para reduzir o
palpação dos nervos frequentemente se observa espessamentos.
tempo de evolução e risco de dano neural).
Como na hanseníase indeterminada, a doença também pode acometer
HANSENÍASE TUBERCULOIDE (PAUCIBACILAR) crianças entre 1 a 4 anos (não descarta a possibilidade de se encontrar
Geralmente a HT surge a partir da HI não tratada, nos pacientes com adultos doentes) onde a lesão de pele é um nódulo único totalmente
boa resistência, visto que é a forma da doença em que o sistema anestésico na face ou membros (HANSENÍASE NODULAR DA
imune da pessoa consegue destruir os bacilos espontaneamente → INFÂNCIA) → característica importante é a involução espontânea,
por isso, é uma forma mais benigna e localizada. deixando cicatriz atrófica.
As lesões da HT são bem delimitadas, em número reduzido,
eritematosas, com PERDA TOTAL DA SENSIBILIDADE e de
distribuição assimétrica → inicialmente surgem MÁCULAS, que
evoluem para lesões em PLACAS COM BORDAS PAPULOSAS e áreas
de pele ERITEMATOSAS OU HIPOCRÔMICAS.
- o crescimento centrífugo lento leva à ATROFIA no centro da lesão
(forma de anel ou círculo), que pode ainda assumir aspecto
tricofitoide, com descamação das bordas.
HANSENÍASE DIMORFA OU BORDERLI NE (MULTIBACILAR)
Esse grupo é marcado pela instabilidade imunológica, o que faz com
que haja grande variação em suas manifestações clínicas, seja na pele,
nervos ou comprometimento sistêmico → a morfologia das lesões de
pele pode mesclar aspectos de HV e HT, com predominância de um
tipo ou de outro.
É a forma mais comum de apresentação da doença (mais de 70% dos
casos). Ocorre, normalmente, após um longo período de incubação
(cerca de 10 anos ou mais), devido à lenta multiplicação do bacilo.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

A infiltração assimétrica da face e pavilhões auriculares, bem como a Na pele, as lesões caracterizam-se por MÁCULAS, PÁPULAS,
presença de lesões no pescoço e nuca, são elementos sugestivos NÓDULOS (hansenomas) e TUBÉRCULOS, a pele torna-se infiltrada
dessa forma clínica. As lesões neurais são precoces, assimétricas e, (mais acentuada na face e membros), xerótica, tonalidade semelhante
com frequência, levam a incapacidades físicas. ao cobre e poros dilatados (em aspecto de “casca de laranja”) →
geralmente poupa o couro cabeludo, axilas e o meio da coluna lombar
Dependendo da morfologia, número de lesões e simetria, a
(áreas quentes).
hanseníase dimorfa é subclassificada em:
- há rarefação dos pelos nos membros, cílios e na cauda da
BORDERLINE TUBERCULOIDE (BT) : placas ou manchas eritematosas, por
sobrancelha, caracterizando a madarose.
vezes anulares, de maior extensão, distribuição assimétrica, pouco
numerosas ou com lesões satélite. Ocorre o comprometimento de
vários troncos nervosos, causando incapacidades.
- baciloscopia é negativa ou discretamente positiva, a histopatologia
exibe granulomas tuberculoides e o teste de Mitsuda é positivo.

BORDERLINE BORDERLINE (BB) : é a forma intermediária, que apresenta


lesões bizarras em alvo ou anulares, que podem confluir, formando
um aspecto esburacado “em queijo suíço” ou foveolar → a área
central é hipocrômica ou normal, a borda interna é bem delimitada
enquanto a borda externa é espessada, eritematosa e mal delimitada.
- o comprometimento neural é significativo;
- baciloscopia geralmente é moderadamente positiva, a histopatologia
mostra granuloma que não toca a epiderme, com macrófagos e células
epitelioides, eventuais células gigantes e raros linfócitos; e o teste de
Mitsuda é, na maioria das vezes, negativo.
Em alguns casos, o quadro reacional evolui com neurite, orquite,
epididimite, irite, iridociclite, artralgia ou artrite, linfadenopatia
generalizada, proteinúria e dano hepático → edema de membros
inferiores, pré-tibialgia e febre acompanham essa reação.

A infiltração da face e pavilhões auriculares, com madarose sem queda


BORDERLINE VIRCHOWIANA (BV) : múltiplas lesões elevadas eritematosas de cabelo, forma o quadro conhecido como FÁCIES LEONINA.
e infiltradas, algumas de aspecto anular, mas não são tão polimorfas
como as da HV.
- baciloscopia é positiva, a histopatologia mostra infiltrado
granulomatoso com macrófagos, linfócitos e raros grupos de células
epitelioides; e o teste de Mitsuda é negativo.

O comprometimento nervoso ocorre nos ramúsculos da pele, na


inervação vascular e nos troncos nervosos (apresentam deficiências
funcionais e sequelas tardias).
- sinais precoces de HV: obstrução nasal, rinorreia serossanguinolenta
e edema de membros inferiores.
A anestesia é mais tardia, “em luva” ou “em bota”, bilateral (polineurite
HANSENÍASE VIRCHOWIANA (MULTIBACILAR) simétrica).
É a forma mais contagiosa da doença, pela baixa resistência Pode haver comprometimento de outros órgãos:
imunológica ao bacilo.
- nariz: ocorre rinite específica e precoce, as vezes com lepromas,
Caracteriza-se pela infiltração progressiva e difusa da pele, mucosas podendo evoluir para ulceração, perfuração e desabamento do septo
das vias aéreas superiores, olhos, testículos, nervos; podendo afetar, nasal;
ainda, os linfonodos, o fígado e o baço (hepatoesplenomegalia) → o
microrganismo pode ser isolado em qualquer tecido ou órgão, exceto
pulmão e SNC.

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

- mucosa oral: ocorre infiltração difusa com ou sem lesões papulosas Os quadros reacionais, às vezes, antecedem o diagnóstico da
e/ou nodulares nos lábios, língua, palato mole, palato duro, úvula, hanseníase, aparecem durante o tratamento ou após alta
polpa dentária; medicamentosa.
- laringe: infiltração da epiglote, falsas pregas vocais e dobras
aritenoepiglóticas → pode ocorrer obstrução mecânica da fenda REAÇÃO TIPO 1 (REVERSA)
glótica com afonia, dispneia e asfixia;
Ocorre em pacientes com algum grau de imunidade celular, como os
- olhos: madarose, espessamento dos nervos corneanos, córnea, íris tuberculoides e dimorfos → tende a surgir mais precocemente no
e corpo ciliar → pode ocorrer glaucoma, catarata, queratite pontada, tratamento, entre o 2º e o 6º mês.
aumento da vascularização, nódulos;
Trata-se de uma reação de hipersensibilidade do tipo tardio (IV),
- linfonodos: linfoadenomegalia cervical, axilar, supratroclear; devido a antígenos liberados pela destruição bacilar, em que há um
- fígado, baço e suprarrenais: comprometimento das suprarrenais, aumento da imunidade celular, com resposta predominante Th1 (IL-
hepatomegalia, esplenomegalia, sem alterações funcionais 2, IL-12, IFN-gama e TNF-alfa.
significativas pois os granulomas são pouco destrutivos; Caracteriza-se pela exacerbação das lesões preexistentes, que se
- testículos: infiltração marginal no início (impotência sexual), depois tornam edemaciadas, eritematosas, brilhantes, semelhante à erisipela
medular (esterilidade e ginecomastia), causando a diminuição da → podem surgir novas lesões, embora pouco numerosas.
produção de testosterona e consequente aumento de FSH e LH, além - com a involução da reação, as lesões mostram descamação.
de poder ocorrer atrofia testicular tardiamente, sendo mais comum em
idosos; nos jovens, podem manifestar dor testicular devido a orquites;
- medula óssea: alterações na hematopoiese, com anemia;
- alterações ósseas: rarefações, atrofia e absorção, em especial nas
mãos e pés → pode ocorrer osteíte por trauma repetido, endarterite,
bacilos nos ossos, osteoporose generalizada por déficit de
testosterona e por desuso, osteomielite;
- músculos: amiotrofias de músculos interósseos no antebraço e loja
anterior da tíbia. Os sintomas sistêmicos normalmente não estão presentes, mas pode
ter uma febre baixa.
Variações da hanseníase virchowiana: Surgem lesões novas à distância e as neurites mostram-se frequentes
HISTIÓIDE: lesões nodulares múltiplas, consistentes e pardacentas, e graves, podendo ser a única manifestação clínica ou ainda
que se assemelham a dermatofibromas (caracterizado por histiócitos silenciosas (sem quadro clinico) → se não tratadas precocemente,
fusiformes). Baciloscopia é rica. deixam sequelas.
- os nervos mais comprometidos são os ulnares e medianos nos
membros superiores, fibular comum e tibial posterior nos membros
inferiores e facial e grande auricular no segmento cefálico.

REAÇÃO TIPO 2 (E RITEMA NODOSO HANSÊNICO)


Observada nas formas multibacilares (virchowianas ou dimorfas), em
geral, após 6 meses de tratamento.
HANSENÍASE DE LÚCIO (DIFUSA): espessamento e infiltração difusa,
O eritema nodoso hansênico é uma paniculite lobular (inflamação da
sem nódulos ou placas, que não deformam a fisionomia, sendo
hipoderme que predomina nos lóbulos), acompanhado de vasculite.
chamada de “hanseníase bonita”. Pode ocorrer alopecia difusa ou total
e o comprometimento visceral é acentuado. Baciloscopia é rica. É uma síndrome desencadeada por depósito de imunocomplexos nos
tecidos e vasos (destruição de bacilos com exposição de antígenos
- quando ocorre carga bacilar muito alta no endotélio vascular, há
leva ao estimulo da produção de anticorpos), mas a imunidade celular
desenvolvimento de vasculite leucócito-clástica de pequenos e
possui importância em etapas iniciais do processo → há aumento de
médios vasos, desencadeando extensas áreas de necrose e ulceração
citocinas séricas, como o TNF-alfa e o IFN-gama sem, contudo, haver
(fenômeno de Lúcio).
mudança definitiva da condição imunológica do paciente.
- os imunocomplexos fixam o complemento e estimulam a migração
HANSENÍASE REACIONAL de neutrófilos, cujas enzimas lesam os tecidos até a parede vascular,
produzindo trombos e vasculites secundárias.
Durante o curso crônico da hanseníase, podem ocorrer surtos
reacionais que são episódios inflamatórios → muitas vezes podem Na pele, a lesão típica é o eritema nodoso, caracterizado por lesões
chamar mais atenção do que as próprias lesões primárias da eritematosas, dolorosas, de tamanhos variados incluindo pápulas e
hanseníase, pela riqueza de sinais e sintomas. nódulos localizados em qualquer região da pele.
- ao contrário da apresentação esperada para uma hanseníase, - se os nódulos evoluem para ulceração, é chamado de eritema
possuem evolução aguda. nodoso necrotizante.
As reações seguem-se a fatores desencadeantes, tais como: infecções - o eritema poliforme também pode acompanhar a reação tipo 2.
intercorrentes, vacinação, gravidez e puerpério, medicamentos
iodados, estresse físico e emocional.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

FENÔMENO DE LÚCIO
Ocorre antes do tratamento em poucos pacientes com hanseníase de
Virchowiana ou de Lucio. Ainda se discute se pode ou não ser
considerada uma reação.
- após a terapia, o quadro se resolve e não há repetição (o que difere
dos quadros reacionais tipos 1 e 2).
Caracteriza-se por lesões maculares equimóticas (necróticas) que se
ulceram, são dolorosas e podem ocorrer em pequeno número ou por
uma área extensa da pele, sendo observada mais comumente em
Eritema nodoso necrotizante
extremidades inferiores.
Há comprometimento do estado geral e as manifestações sistêmicas
- no caso de lesões generalizadas, o paciente pode comportar-se
incluem:
como um grande queimado, e a infecção secundária das lesões por
- Febre (pode ser alta e prolongada), mal-estar, dores no corpo e Pseudomonas aeruginosa é uma complicação temida.
linfadenopatia;
- Neurite → nervo ulnar é o mais comumente acometido;
- Uveíte;
- Orquite;
- Glomerulonefrite.
Pode-se observar leucocitose (incluindo reação leucemoide) com
desvio para esquerda, anemia normocítica e normocrômica, VHS
bastante elevado e PCR aumentada.
- títulos altos de fator reumatoide e FAN podem ser encontrados,
confundindo o diagnóstico com o das colagenoses.
A histopatologia demonstra necrose isquêmica da epiderme e derme
superficial, parasitismo intenso de células endoteliais, proliferação de
células endoteliais e formação de trombos em grandes vasos das
porções profundas da derme.
O tratamento consiste na poliquimioterapia, medidas de suporte,
antibioticoterapia e transfusões de troca.
- glicocorticoides e a talidomida não são úteis.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS – LESÕES NEURAIS No exame neurológico, a identificação das lesões deve ser feita pelas
seguintes etapas no exame físico:
Geralmente as primeiras manifestações e lesões clínicas ocorrem no
(1) Inspeção dos olhos, nariz, mãos e pés;
SNP e antecedem os sinais cutâneos.
(2) Palpação dos troncos nervosos periféricos;
Os ramúsculos neurais (componentes mais distais do SNP) são os
primeiros a serem afetados, instalando-se a ramusculite periférica → (3) Avaliação da mobilidade articular;
progride na direção proximal aos ramos secundários e depois aos (4) Avaliação da força muscular; e
troncos neurais periféricos, que se tornam edemaciados, doloridos à
palpação ou percussão (sinal de Tinel positivo – percussão do trajeto (5) Avaliação de sensibilidade nos olhos, membros superiores e
do nervo gera sensação de choque que se irradia para o território membros inferiores.
correspondente). O exame dos nervos periféricos é fundamental, procurando-se déficit
- essa inflamação ocorre principalmente próxima às articulações e motores, sensitivos e espessamento dos troncos nervosos pela
provoca graves perturbações na circulação neural, agravando a palpação → o nervo deve ser palpado com as polpas digitais do
isquemia com consequente disestesia grave ou perda da função. segundo e terceiro dedos, deslizando-os sobre a superfície óssea,
acompanhando o trajeto do nervo, no sentido de cima para baixo.
Há comprometimento neural em todas as manifestações clínicas.
- deve-se verificar se há queixa de dor espontânea no trajeto do nervo;
DISTÚRBIOS SENSITIVOS : a primeira sensibilidade a ser alterada é a de choque ou de dor; se há espessamento do nervo palpado
térmica, seguida pela dolorosa e depois pela tátil. comparado com o nervo correspondente, no lado oposto; se há
DISTÚRBIOS MOTORES : levam a paresias ou paralisias que alteração na consistência do nervo (endurecimento, amolecimento);
correspondem à fraqueza muscular, amiotrofias, retrações tendíneas e se há alteração na forma do nervo (abscessos e nódulos); se o nervo
fixações articulares. apresenta aderências.
DISTÚRBIOS VASOMOTORES E SECRETÓRIOS : distúrbios vasculares e da
sudorese → perda de pelos nas lesões, diminuição ou abolição da
sudorese (anidrose) e do reflexo de vasodilatação (resposta
incompleta à pilocarpina e à histamina).

Nos tuberculoides, as lesões neurais são mais precoces, intensamente


agressivas e assimétricas e, muitas vezes, mononeurais.
As lesões neurais dos doentes virchowianos são extensas, simétricas Para avaliação da sensibilidade, deve-se explicar o teste que será
e pouco intensas nos primeiros anos da moléstia → cronicamente, as realizado e apresentá-lo numa área da pele com sensibilidade normal.
fibras nervosas vão sendo lentamente comprimidas pelo infiltrado Em seguida, a sensibilidade (térmica, tátil e dolorosa) deve ser testada
linfo-histiocitário com bacilos e é por isso que as lesões clínicas se com o paciente de olhos fechados.
manifestarão tardiamente.
- examina-se a sensibilidade térmica através de dois tubos de ensaio,
Nos doentes do grupo dimorfo, o comprometimento neurológico, em um aquecido e outro frio → pede-se para o paciente não olhar o
geral, é extenso e intenso, em razão da existência de algum grau de exame e encosta o tubo em uma área sadia e outra com lesão,
imunidade celular específica contra o M. leprae → há destruição de perguntando se ele acha que o tubo está quente ou frio → a
nervos pelos granulomas de uma maneira generalizada. hipoestesia térmica na hanseníase surge depois de vários meses de
Quando ocorrem inflamações agudas (reações tipo I ou II) o processo doença, instalando-se após a anestesia.
destrutivo é mais rápido. - para a sensibilidade dolorosa utiliza-se uma agulha e tocamos
suavemente na pele do paciente, o suficiente para sentir a sensação
álgica.
DIAGNÓSTICO
- a sensibilidade tátil é verificada através de um leve toque, utilizando
O diagnóstico é clínico e epidemiológico, realizado por meio da análise um tampão de algodão, cuja extremidade foi enrolada de forma a ficar
da história e condições de vida do paciente, além do exame afunilada (permite exercer sobre a pele uma pressão muito leve) →
dermatoneurológico para identificar lesões ou áreas de pele com não se deve mexer o algodão nem fazê-lo escorregar sobre a pele
alteração de sensibilidade e/ou comprometimento de nervos pois é mais fácil perceber a sensação de uma coisa que está em
periféricos, com alterações sensitivas, motoras e autonômicas. movimento.
- pode-se ainda realizar exames complementares.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Os nervos comumente avaliados são: nos membros superiores, o Graus de incapacidade física
nervo ulnar, o mediano e o radial; nos membros inferiores, o tibial Grau 0 Nenhum problema com os olhos, mãos e pés
posterior e o fibular comum; no segmento cefálico, o grande auricular Grau 1 Diminuição ou perda da sensibilidade dos olhos
e o nervo facial que é motor e não é palpável. Diminuição ou perda da sensibilidade de mãos e pés
Dá-se o nome de anestesia à perda total de sensibilidade e de (não sente 2g ou toque da caneta)
hipoestesia à sua diminuição. Grau 2 Olhos: lagoftalmo e/ou ectrópio, triquíase, opacidade
corneana central, acuidade visual menor que 0,1 ou
Para definir incapacidade, pode-se analisar: não conta dedos a 6 metros de distância
- sensibilidade protetora: o melhor é que sejam utilizados os Mãos e pés: lesões tróficas e/ou traumáticas, garras,
monofilamentos de Semmes-Weinstein ou estesiômetro reabsorção, mão caída, pé caído, contratura do
(monofilamentos de 0.05 g, 0.2 g, 2 g, 4 g, 10 g e 300 g) nos pontos tornozelo
de avaliação das mãos e pés → caso não haja monofilamentos, pode-
se utilizar a ponta de uma caneta esferográfica. A avaliação da força motora é feita com o teste manual da exploração
da força muscular, durante o movimento, capacidade de oposição à
- para os olhos, o fio dental (sem sabor) é indicado para avaliar a
força da gravidade e à resistência manual → avaliado como forte,
sensibilidade da córnea.
diminuída e paralisada, com pontuação de 0 a 5.

BACILOSCOPIA DE PELE (ESFREGAÇO INTRADÉRMICO) Considera-se um caso de hanseníase a pessoa que apresenta um ou
mais dos seguintes sinais cardinais:
É o exame complementar mais útil no
diagnóstico, sendo de fácil execução e - Mancha e/ou área(s) da pele com alteração (perda) de sensibilidade,
baixo custo. característica da hanseníase;
Deve em pelo menos quatro locais - Acometimento de nervo(s) periférico(s), com ou sem espessamento,
(lóbulos das orelhas direita e esquerda, associado a alterações sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas; e
cotovelos direito e esquerdo) e em - Baciloscopia positiva de esfregaço intradérmico.
lesão cutânea suspeita → o exame consiste em isquemiar a lesão
(nódulo ou margem de uma mácula ou placa) comprimindo-se a pele
entre o polegar e o indicador e, com um bisturi, fazer uma incisão EXAME HISTOPATOLÓGICO
linear com uma profundidade que atinja a derme → em seguida,
É raramente necessário, apenas para elucidação diagnóstica e em
raspar, fazer o esfregaço em lâmina de vidro, fixar em chama e corar,
pesquisas. O local de amostra deve ser uma lesão sólida, pápula ou
pelo método de Ziehl-Neelsen.
nódulo, ou a borda de uma mancha ou placa, pois são locais mais
O resultado é apresentado sob a forma de Índice Baciloscópico (IB), ativos.
numa escala de 0 a 6.
HANSENÍASE INDETERMINADA: encontra-se um infiltrado inflamatório
- a baciloscopia mostra-se negativa (IB = 0) nas formas tuberculoide que não confirma o diagnóstico de hanseníase, com discretos focos
e indeterminada; fortemente positiva (IB ≠ 0) na forma virchowiana e de células mononucleares (linfócitos e monócitos) em torno de vasos,
revela resultado variável na forma dimorfa. nervos e anexos.

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

HANSENÍASE TUBERCULOIDE: encontra-se um granuloma do tipo TESTES SOROLÓGICOS


tuberculoide que destrói pequenos ramos neurais, agride a epiderme
e outros anexos da pele. O antígeno glicolípide fenólico-1 (PGL-1) é específico do M. leprae e
leva à formação de anticorpos das classes IgG e IgM → os títulos de
HANSENÍASE VIRCHOWIANA: encontra-se um infiltrado histiocitário IgM correlacionam-se com a forma clínica e a atividade da doença.
xantomizado ou macrofágico → presença de células de Virchow
(macrófagos com M. leprae e gotículas de gordura no citoplasma). - pode ser detectado por ELISA ou imunodifusão.

- a pesquisa de bacilos mostra incontáveis bacilos dispersos e Níveis aumentados do anti-PGL-1 têm sido descritos na hanseníase
organizados em grumos (globias). virchowiana e tendem a decrescer com o tratamento especifico. Por
outro lado, na hanseníase tuberculoide não há resposta desses
HANSENÍASE DIMORFA: há um infiltrado linfo-histiocitário que varia anticorpos.
desde inespecífico até com formação de granulomas tuberculoides
(associação de aspectos de infiltração virchowiana e de granuloma A identificação do Micobacterium leprae pela Reação em Cadeia da
tuberculoide). A baciloscopia é frequentemente positiva. Polimerase (PCR), que serve para detectar quantidades mínimas de
micobactérias, tem sido estudada em centros de pesquisa, mas não é
realizada rotineiramente.
PROVA DE HISTAMINA E TESTE DA PILOCARPINA
Também usados em casos de dúvida. TRATAMENTO
PROVA DE HISTAMINA EXÓGENA : avalia a resposta vasorreflexa à droga,
O objetivo do tratamento é a cura, o mais precoce possível, a fim de
indicando integridade e viabilidade do SN autonômico de dilatar os
interromper a cadeia epidemiológica da doença e evitar o
vasos cutâneos superficiais, o que resulta no eritema.
aparecimento das incapacidades → se o tratamento é realizado de
É feito colocando-se uma gota de solução de cloridrato de histamina forma completa e correta, a cura é garantida.
a 1:1.000 sob a pele normal e na mancha suspeita → com uma agulha
Toda pessoa afetada pela hanseníase deverá ter fácil acesso ao
fina faz-se uma escoriação embaixo do líquido, de modo que não haja
diagnóstico e ao tratamento gratuito e ambulatorial com os esquemas
sangramento.
terapêuticos padronizados (PQT) por meio da poliquimioterapia
O esperado normalmente é que ocorra a tríplice reação de Lewis: a) (rifampcina + dapsona + clofazimina).
eritema inicial no local da picada, no máximo com 10 mm, 20 a 40
O tratamento da hanseníase com a PQT vem apresentando um
segundos após a picada; b) eritema pseudopódico com 30 a 50 mm
sucesso contínuo; nem a questão da recidiva, nem resistência a
após aproximadamente 1 min, devido à vasodilatação arteriolar por ato
drogas têm sido problemas significativos e os esquemas são bem
reflexo axônico; e c) seropápula, 2-3 minutos após a escarificação.
tolerados. Relatos esporádicos de pacientes recidivantes com cepas
Se não ocorre eritema e o paciente não está utilizando antialérgicos, a de M. leprae resistentes às drogas anti-hansênicas foram divulgados
lesão é sugestiva de hanseníase. recentemente, ainda que não de forma alarmante até momento.
É um exame útil para auxiliar no diagnóstico de manchas hipocrômicas - o risco potencial de surgimento e transmissão de cepas resistentes
hansenianas iniciais, pois nestas falta o eritema pseudopódico. à rifampicina deve ser contido assegurando a maior regularidade do
tratamento e a rigorosa adesão aos esquemas da PQT.
TESTE DA PILOCARPINA (ANIDROSE) : utiliza-se injeção intradérmica de
cloridrato de pilocarpina a 1% na pele normal e na lesão suspeita → Características dos fármacos utilizados no tratamento
normalmente ocorre sudorese na área picada 2 minutos após, mas
DAPSONA (DIAMINO-DIFENIL-SULFONA) : é um fármaco antibiótico, da
nas lesões hansênicas ocorre anidrose.
classe das sulfonas, quase completamente absorvido por via oral, bem
tolerado e bem distribuído nos tecidos, tendo uma vida média de 28
REAÇÃO DE MITSUDA horas.
É utilizada para classificação da doença e definição do prognóstico, - é uma droga bacteriostática e seu modo de ação é competir com o
não possuindo valor para o diagnóstico, pois de um modo geral é ácido paraminobenzoico por uma enzima (di-hidropteroato sintetase),
encontrado de forma positiva na população sã, que já teve contato impedindo a formação de ácido fólico pela bactéria.
com o bacilo, porém não desenvolveu a doença por apresentar boa RIFAMPICINA : é um antibiótico, rapidamente absorvido, principalmente
imunidade. quando ingerido em jejum. Tem boa distribuição nos tecidos e sua
O teste consiste na aplicação intradérmica – na superfície extensora maior parte é eliminada pelo intestino.
do antebraço direito – de 0,1 ml de um preparado que contém 40 a - tem alto efeito bactericida contra o M. leprae e atua inibindo a sua
60 milhões de bacilos mortos por mililitro → após cerca de 48 a 72 RNA polimerase dependente de DNA.
horas da injeção, observa-se uma reação localizada (semelhante à
reação tuberculínica), denominada reação de Fernandez, de CLOFAZIMINA : é um antibacteriano corante rimino-fenazínico,
significado incerto. consistindo em uma suspensão microcristalina dissolvida em óleo da
qual 70% são absorvidos após a administração oral e o restante é
- depois de 28 a 30 dias pode eliminado com as fezes. Sua meia-vida é longa, cerca de 70 dias, e
ocorrer uma segunda reação tardia à sua excreção pela urina é muito pequena, sendo a maior parte
mitsudina ou lepromina que é a eliminada pelo suor, glândulas sebáceas e fezes.
reação de Mitsuda → consiste na
presença de uma pápula ou nódulo, - tem ação bacteriostática, ligando-se preferencialmente ao DNA da
que pode ou não ulcerar. micobactéria, inibindo seu crescimento; também atua na membrana
celular da micobactéria, interferindo na cadeia respiratória bacteriana
Segundo a OMS, reações até 5 mm são chamadas de mitsuda e transporte de íons, porém esse efeito bactericida é lento.
negativo, e acima de 5 mm chamadas de mitsuda positivo.

10
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ESQUEMAS TERAPÊUTICOS Gravidez e aleitamento não contraindicam o tratamento PQT padrão e


em mulheres na idade reprodutiva, deve-se atentar ao fato de que a
A definição do esquema antimicrobiano para hanseníase depende da rifampicina pode interagir com anticoncepcionais orais, diminuindo
classificação operacional do caso, baseada no número de lesões sua ação.
cutâneas:
As medicações diárias deverão ser tomadas 2 horas após o almoço
- paucibacilares (PB): casos com até 5 lesões de pele; para evitar intolerância gástrica e eventual abandono do tratamento por
- multibacilares (MB): casos com 6 ou mais lesões de pele OU esse motivo → se ainda assim houver dor epigástrica, introduzir
baciloscopia positiva. omeprazol, ranitidina ou cimetidina pela manhã.
Em 2018, a OMS publicou as “Diretrizes para o diagnóstico, No tratamento de crianças com hanseníase, deve-se considerar o peso
tratamento e prevenção da hanseníase”, onde recomendou o uso de corporal como fator mais importante do que a idade, seguindo as
3 medicamentos (rifampicina, clofazimina e dapsona) para todos os orientações a seguir:
pacientes com hanseníase, com 6 meses de tratamento para a - crianças com peso superior a 50 kg → deve-se utilizar o mesmo
paucibacilar e 12 meses para a forma multibacilar → essa tratamento prescrito para adultos;
recomendação simplifica o tratamento e previne a classificação
errônea da hanseníase multibacilar, pois todos os pacientes receberão - crianças com peso entre 30 e 50 kg → deve-se utilizar as cartelas
um regime de 3 medicamentos. infantis (marrom/azul);
A Conitec do MS, ainda em 2018, avaliou as evidências disponíveis e - crianças com menos de 30kg → deve-se fazer os ajustes de dose.
recomendou a ampliação do uso da Clofazimina para os pacientes
com a forma paucibacilar → a nota técnica emitida recomendava a
implantação do novo esquema em 2020, mas devido ao
desabastecimento de medicamentos ocasionados pela pandemia de
Covid-19, a nova nota técnica emitida implanta o novo esquema após
01 de julho de 2021.
- no novo esquema todos os PB devem utilizar o denominado PQT-U
durante 6 meses; Nos casos de hanseníase neural pura, o tratamento com PQT
- o tratamento dos pacientes MB permanece por 12 meses. dependerá da classificação (PB ou MB), conforme avaliação do centro
de referência; além disso, faz-se o tratamento adequado do dano
Apresentação das cartelas para poliquimioterapia única (PQT-U) –
neural.
esquema único de tratamento da hanseníase
Rifampicina: dose mensal de 600 mg (2 Os pacientes deverão ser orientados para retorno imediato à unidade
cápsulas de 300 mg) de saúde, em caso de aparecimento de lesões de pele e/ou de dores
nos trajetos dos nervos periféricos e/ou piora da função sensitiva e/
Clofazimina: dose mensal de 300 mg (3
ou motora, mesmo após a alta por cura.
cápsulas de 100 mg) e dose diária de 50
Adulto Quando disponíveis, os exames laboratoriais complementares, como
mg autoadministrada
Dapsona: dose mensal de 100 mg hemograma, TGO, TGP e creatinina, poderão ser solicitados no início
do tratamento, para acompanhamento dos pacientes → a análise dos
(1 comprimido de 100 mg) e dose diária
resultados desses exames não deverá retardar o início da PQT, exceto
de 100 mg autoadministrada
nos casos em que a avaliação clínica sugerir doenças que
Rifampicina: dose mensal de 450 mg (1 contraindiquem o início do tratamento
cápsula de 150 mg e 1 cápsula de 300
mg) EFEITOS ADVERSOS DO TRATAMENTO
Clofazimina: dose mensal de 150 mg (3
Os efeitos adversos não são frequentes e, em geral, são bem
Criança cápsulas de 50 mg) e dose diária de 50
tolerados.
mg autoadministrada em dias alternados
Dapsona: dose mensal de 50 mg Os efeitos colaterais mais frequentes são os relacionados à dapsona,
(1 comprimido de 50 mg) e dose diária como anemia hemolítica, hepatite medicamentosa, meta-
de 50 mg autoadministrada hemoglobinemia, gastrite, agranulocitose, síndrome da dapsona,
eritrodermia, dermatite esfoliativa e distúrbios renais.
Paucibacilar: 6 meses
Duração do tratamento - os efeitos mais graves estão relacionados à dapsona e em geral
Multibacilar: 12 meses
O seguimento dos casos é feito pelo comparecimento mensal para dose supervisionada. ocorrem nas primeiras 6 semanas de tratamento.
Em relação à rifampicina destacam-se a alteração da cor da urina,
distúrbios gastrointestinais, diminuição da eficácia dos ACO,
hepatotoxicidade (rara quando tomada de forma isolada), síndrome
pseudogripal e plaquetopenia.
Em relação à clofazimina, esta pode desencadear pigmentação
cutânea, ictiose e distúrbios gastrointestinais.

11
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ESQUEMAS TERAPÊUTICOS SUBSTITUTIVOS REAÇÃO TIPO 1


São utilizados em caso de intolerância grave ou contraindicação a uma - prednisona 1mg/kg/dia ou dexametasona 0,15 mg/kg/dia em casos
ou mais drogas do esquema padrão PQT. A substituição deverá de pacientes hipertensos ou cardiopatas.
acontecer sob orientação de serviços de saúde de maior
- manter a PQT, se o paciente ainda estiver em tratamento específico;
complexidade.
- imobilizar o membro afetado com tala gessada em caso de neurite
Intolerância à dapsona → rifampicima + clofazimina + ofloxacino (PB
associada.
e MB);
- reduzir a dose de corticoide conforme a resposta terapêutica.
Intolerância à rifampicina → dapsona + clofazimina + ofloxacino (PB
e MB) REAÇÃO TIPO 2
Intolerância à clofazimina → rifampicina + dapsona + ofloxacino (PB - talidomida 100 a 400 mg/dia, conforme intensidade do quadro →
e MB) na impossibilidade de uso, usar prednisona 1 mg/kg/dia ou
Intolerância à rifampicina e dapsona → clofazimina + ofloxacino + dexametasona na dose equivalente;
minociclina (primeiros 6 meses); clofazimina + ofloxacino OU - manter a PQT;
clofazimina + minociclina (nos 18 meses subsequentes).
- introduzir corticosteroide em caso de comprometimento neural;
CRITÉRIOS DE ALTA POR CURA - imobilizar o membro se neurite;
O encerramento da PQT se baseia no número de doses, tempo de - monitorar função neural sensitiva e motora;
tratamento, avaliação neurológica simplificada, avaliação do grau de
incapacidade física e orientação para os cuidados após a alta. - reduzir dose de talidomida e/ou corticoide conforme a resposta;

PB: o tratamento estará concluído com 6 doses supervisionadas em - se associação talidomida e corticoide, usar AAS 100 mg/dia como
até 9 meses → na 6ª dose, os pacientes deverão ser submetidos à profilaxia para tromboembolismo.
avaliação clínica; Talidomida somente pode ser prescrita para mulheres em idade fértil
MB: o tratamento estará concluído com 12 doses supervisionadas em após exclusão de gravidez e mediante comprovação da utilização de 2
até 18 meses → na 12ª dose, os pacientes deverão ser submetidos à métodos contraceptivos eficazes.
avaliação clínica.
Sempre que estive em uso de corticosteroides:
- se doentes MB sem melhora clínica ao final das 12 doses, a
indicação de um segundo ciclo de 12 doses deverá se basear na - registrar peso, PA e taxa de glicose no sangue;
associação de sinais de atividade da doença, mediante exame clínico - tratamento antiparasitário para Strongyloides stercoralis, prevenindo
e laboratorial (baciloscopia). disseminação sistêmica (tiabendazol 50 mg/kg/dia, 3x por 2 dias);
- pacientes MB que iniciam o tratamento com numerosas lesões ou - profilaxia da osteoporose com cálcio 1000 mg/dia, vitamina D 400-
extensas áreas de infiltração cutânea podem ter um risco maior de 800 UI/dia ou bifosfonatos (alendronato 10 mg/dia).
desenvolver reações, dano neural e insuficiência do tratamento com
12 doses para ocorrer total regressão.
RECIDIVAS
Correspondem a todos os casos de hanseníase, tratados
TRATAMENTO DE REAÇÕES HANSÊNICAS
regularmente, que receberam alta por cura e que voltaram a apresentar
É imprescindível: novos sinais e sintomas clínicos de doença infecciosa ativa →
- diferenciar o tipo de reação hansênica; geralmente ocorrem em período superior a 5 anos após a cura.

- avaliar a extensão do comprometimento de nervos periféricos, PAUCIBACILAR : novos nervos afetados, novas áreas com alterações de
órgãos e outros sistemas; sensibilidade, novas lesões e/ou exacerbação de lesões anteriores e
que não respondam ao tratamento com corticosteroide nas doses
- investigar e controlar fatores potencialmente capazes de desencadear recomendadas – por pelo menos 30 dias para lesões cutâneas de RR
os estados reacionais; (reação tipo 1) e por 90 dias para comprometimento neurológico
- conhecer as contraindicações e os efeitos adversos dos (neurite) –, além de pacientes com surtos reacionais tardios (5 anos
medicamentos utilizados no tratamento da hanseníase e em seus após a alta);
estados reacionais; MULTIBACILAR : novas lesões cutâneas e/ou evolução de lesões antigas,
- instituir, precocemente, a terapêutica medicamentosa e medidas novas alterações neurológicas que não respondam ao tratamento com
coadjuvantes adequadas visando à prevenção de incapacidades; talidomida e/ou corticosteroide nas doses e nos prazos
recomendados; baciloscopia positiva (índice baciloscópico) igual ou
- encaminhar os casos graves para internação hospitalar.
maior que a do momento da cura, coletado nos mesmos sítios;
A ocorrência de reações hansênicas não contraindica o início da PQT, pacientes com surtos reacionais tardios, geralmente após 5 anos da
não implica sua interrupção e não é indicação de reinício de PQT se alta, que podem ocorrer em período menor, além de, quando
o paciente já houver concluído seu tratamento. disponível, manutenção de altos níveis de ELISA anti-PGL1 e/ou com
bacilos íntegros bem definidos no raspado dérmico e/ou biópsia de
pele.

12
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Deve ser diferenciada de: - falência terapêutica: raro, quando o paciente não apresenta sinais de
- reação reversa (reação tipo 1): reagudização de lesões antigas e melhora clínica durante o tratamento regular e adequado (ex.: MB com
até 24 doses, com sinais de atividade clínica, bacilos íntegros e
surgimento de novas lesões eritematoplacares inflamatórias e agudas;
definidos no raspado dérmico ou histopatologia). Ocorre por
- insuficiência terapêutica: quando o paciente não recebeu tratamento resistência bacteriana aos medicamentos; alterações enzimático-
adequado e suficiente (ex.: irregularidade ao tratamento, casos MB metabólicas dos pacientes, com diminuição da eficácia dos
avançados que necessitarão de 12 doses adicionais); medicamentos.

PREVENÇÃO DE INCAPACIDADES
Medidas visando evitar a ocorrência de danos físicos, emocionais e As incapacidades físicas dificultam a rotina diária em casa, no trabalho
socioeconômicos. e na geração de renda, afetando a qualidade de vida das pessoas de
diversas maneiras → traz ainda problemas psicossociais, fruto da
Medidas gerais: educação em saúde, exercícios preventivos,
diminuição do status na comunidade, somado à discriminação e
adaptações de calçados, adaptações de instrumentos de trabalho e
exclusão social. Essas razões levam à ocultação da condição física,
cuidados com os olhos.
privação da vida social normal, das atividades de geração de renda e
O paciente com incapacidade instalada, apresentando mão em garra, das responsabilidades familiares.
pé caído e lagoftalmo, bem como outras incapacidades como
O autocuidado deve ser compreendido como ação essencial que
madarose superciliar, desabamento da pirâmide nasal, queda do
lóbulo da orelha ou atrofia cutânea da face, deve ser encaminhado perpassa por todas as atividades realizadas com o doente. O doente
devidamente orientado, pode realizar as práticas de autocuidado
para avaliação e indicação de cirurgia de reabilitação em centros de
regularmente no seu domicílio e/ou em outros ambientes.
atenção especializada hospitalar, de acordo com os seguintes critérios:
ter completado o tratamento PQT e não apresentar estado inflamatório O doente deve ser orientado a fazer a autoinspeção diária e, se
reacional e/ou uso de medicamentos antirreacionais há pelo menos necessário, estimulado a usar proteção, especialmente voltada para os
um ano. olhos, nariz, mãos e pés.

EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO
É doença crônica e de prognóstico bom com relação à vida; no O risco de incapacidade está relacionado com episódios reacionais,
entanto, apresenta grande potencial incapacitante (mão em garra, mal cujo diagnóstico e tratamento deverão ser os mais precoces possíveis.
perfurante plantar, cegueira).

13
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA
Considera-se um caso de hanseníase a pessoa que apresenta um ou Vacinação BCG (Bacilo de CalmetteGuërin): a vacina deverá ser
mais dos seguintes sinais cardinais: aplicada nos contatos intradomiciliares, sem presença de sinais e
- lesão(ões) e/ou área(s) da pele com alteração da sensibilidade sintomas de hanseníase, no momento da avaliação,
independentemente de serem contatos de casos PB ou MB → deve-
térmica e/ou dolorosa e/ou tátil; ou
se considerar a história vacinal anterior e a idade:
- comprometimento do nervo periférico, geralmente espessamento,
associado a alterações sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas; ou Menores de 1 ano de idade A partir de 1 ano de idade
- Não vacinados: administrar 1 dose
- presença de bacilos M. leprae, confirmada na baciloscopia de - Sem cicatriz vacinal: administrar 1
- Comprovadamente vacinados com
esfregaço intradérmico ou na biopsia de pele. dose
cicatriz vacinal: não administrar
- Vacinados com 1 dose: administrar
Notificação: a hanseníase é uma doença de notificação compulsória outra dose
outra dose de BCG
em todo o território nacional e investigação obrigatória. - Comprovadamente vacinados sem
- Vacinados com duas doses: não
cicatriz vacinal: administrar 1 dose
- cada caso diagnosticado deve ser notificado na semana administrar outra dose
de BCG 6 meses após a última dose
epidemiológica de ocorrência do diagnóstico, utilizando-se a Ficha de
Notificação/Investigação da Hanseníase do Sistema de Informação de
Agravos de Notificação (Sinan).
A investigação epidemiológica tem por finalidade a descoberta de
casos entre aqueles que convivem ou conviveram com o doente e
suas possíveis fontes de infecção. A partir do diagnóstico de um caso
de hanseníase, deve ser feita, de imediato, a investigação
epidemiológica. As pessoas que vivem com o doente correm maior
risco de ser infectadas e de adoecer do que a população geral, por
isso devem ser submetidas a uma anamnese dirigida, exame
dermatoneurologico e vacinação BCG.

REFERÊNCIAS
MEDCURSO. 2019
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Guia prático sobre a Hanseníase. 2017 | MINISTÉRIO DA SAÚDE. Guia de vigilância em saúde. 3 ed. 2019
SBD. Nota técnica: mudança de esquema de tratamento da hanseníase em pacientes paucibacilares em acordo as recomendações do MS. 2021

14
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 6

PELOS
Os pelos são estruturas filiformes, constituídas por células O folículo piloso compreende as seguintes porções:
queratinizadas produzidas pelos folículos pilosos. - infundíbulo: situado entre o óstio e o ponto de inserção da glândula
Existem três tipos de pelos: sebácea;
- LANUGO: pilosidade fina e clara que cobre boa parte do feto e - acrotríquio: porção intraepidérmica do folículo;
geralmente cai após o nascimento; - istmo: entre a abertura da glândula sebácea no folículo e o ponto de
- VELLUS: pelo fino e não pigmentado, cujo crescimento não é afetado inserção do músculo eretor do pelo;
por hormônios → encontrado nos adultos cobrindo a maior parte do - segmento inferior: porção restante situada abaixo do músculo eretor
corpo; → nessa porção mais inferior do folículo piloso, encontra-se uma
- PELOS TERMINAIS: pelos espessos e pigmentados que sofrem expansão, o bulbo piloso, que contém a matriz do pelo, onde se
influência dos hormônios andrógenos → compreende os cabelos, a introduz a papila, uma pequena estrutura conectiva, ricamente
barba, a pilosidade pubiana e axilar. vascularizada e inervada.
Os pelos são compostos por uma parte livre, a haste e a raiz (porção ao redor das células matrizes, encontram-se melanócitos
intradérmica). ativos e a maior parte da atividade mitótica do pelo se dá na metade
Anexam-se ao folículo piloso: a glândula sebácea, superiormente; o inferior do bulbo.
músculo eretor do pelo, inferiormente; e, em certas regiões corpóreas O componente principal do pelo é a queratina, além de participarem
(axilar, genital e periareolar), o ducto excretor da glândula sudorípara de sua estrutura cerca de 20 aminoácidos, sendo particularmente
apócrina que desemboca no folículo, acima da glândula sebácea. importantes a cisteína, arginina e citrulina.

Estima-se que o couro cabeludo possua cerca de 100.000 a 150.000 FASE CATÁGENA: os folículos regridem a 1/3 de suas dimensões
fios de cabelo, com crescimento em torno de 10 mm/mês. anteriores, ocorrendo a interrupção da melanogênese na matriz e a
Os pelos não crescem continuamente, havendo alternâncias de fases diminuição da proliferação celular até cessar → fase de apoptose
de crescimento e repouso, que constituem o CICLO DO PELO: entre a fase telógena e a anágena, durando poucas semanas.
- 1% dos pelos estão na fase catágena.
FASE ANÁGENA: é a fase de crescimento, caracterizada por intensa
atividade mitótica da matriz e onde o pelo se apresenta na máxima FASE TELÓGENA: é a fase de desprendimento do pelo que, no couro
expressão estrutural, determinando o comprimento final do cabelo no cabeludo, tem cerca de 3 meses de duração → os folículos mostram-
local → pelos anágenos possuem extremidades proximais se quiescentes, reduzidos à metade ou menos do tamanho normal e
pigmentadas e maleáveis. Duração de 2 a 5 anos, mas varia de acordo há desvinculação completa entre a papila dérmica e o pelo em
com o local do corpo e da idade. eliminação. Os pelos telógenos têm forma de clava e extremidade
- a matriz dos pelos na fase anágena apresenta células epiteliais em proximal redonda e despigmentada.
crescimento acelerado que são extremamente sensíveis a - 14% dos pelos estão na fase telógena.
medicamentos, fatores de crescimento, hormônios, estresse e FASE EXÓGENA: processo ativo de queda da haste capilar.
problemas imunológicos e físicos;
Os fatores reguladores do ciclo piloso são desconhecidos, admitindo-
- a destruição das células-tronco epiteliais resulta em perda se a influência de condições intrínsecas ao folículo e a fatores
permanente dos pelos. sistêmicos, nutricionais, emocionais e, especialmente, hormonais
- 85% dos pelos estão na fase anágena. (androgênios).

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ALOPECIAS ABORDAGEM DIAGNÓSTICA DAS ALOPECIAS


A queda de cabelo é denominada eflúvio ou deflúvio, sendo o quadro O diagnóstico das doenças das hastes e do couro cabeludo está cada
resultante a ALOPECIA, que significa a diminuição dos pelos ou vez mais apurado → além do exame clínico e laboratorial prévios, a
cabelos → as alopecias podem ser adquiridas ou congênitas (raras). tricoscopia (termo empregado à dermatoscopia do couro cabeludo e
das hastes) tornou-se uma ferramenta muito importante na rotina de
avaliação desses pacientes, tanto para o diagnóstico, quanto para
ALOPECIAS ADQUIRIDAS acompanhamento. Outras ferramentas, como microscopia polarizada,
As alopecias adquiridas são divididas em: microscopia de varredura, técnicas de fluorescência e de
imunofluorescência, testes genéticos e análise química da haste,
CICATRICIAIS : nesse grupo há ausência ou diminuição de pelos em podem auxiliar em casos específicos.
virtude da destruição de folículos pilosos, com evidências de
destruição tecidual, como inflamação, atrofia e fibrose. Geralmente o O exame físico de um paciente com alopecia é, sem dúvida, a etapa
diagnóstico não é difícil e o tratamento é com base na doença primária. mais importante da abordagem deste paciente → a avaliação dos
pelos de todo o couro cabeludo e do corpo deve ser sempre realizada,
- podem ser difusas: radiações ionizantes (doses elevadas), analisando cor, brilho, textura e comprimento.
queimaduras extensas, medicações quimioterápicas (bussulfano,
docetaxel, cisplatina/etoposídeo) e outras; - avaliação das unhas é fundamental, principalmente frente à frequente
associação de onicopatias e alopecias inflamatórias.
- ou circunscritas: esclerodermia, lúpus discoide tardio, colagenoses
localizadas, quérion, tinea por M. audouinii e T. schoenleinii, foliculite
decalvante, penfigoide cicatricial, neoplasias, foliculite dissecante e TESTE DE TRAÇÃO
outras.
É um teste simples para avaliar a atividade e gravidade da queda dos
cabelos.
NÃO CICATRICIAIS : resultam da perda de cabelos e/ou pelos, sem sinais
clínicos de inflamação do tecido, fibrose ou atrofia da pele. Para realização do teste, o paciente deve permanecer 5 dias sem lavar
ou pentear os cabelos → devido à dificuldade de adesão, padronizam-
- difusas: eflúvio telógeno, eflúvio associado a endocrinopatias (DM se 24 h sem enxágue em alguns ambulatórios. Com uma pega usando
descompensado, hipo ou hipertireoidismo, hipoparatireoidismo e o 1º, 2º e 3º quirodáctilos, deve-se fazer pequena tração de uma
hipopituitarismo), doenças metabólicas e nutricionais (desnutrição, mecha com aproximadamente 60 fios de cabelos.
deficiência de ferro e zinco, homocistinúria), colagenoses (LES),
medicamentosas (tálio, ácido valproico, antagonistas tireoidianos, - o teste deve ser realizado nas diferentes regiões do couro cabeludo:
anticoagulantes, hipervitaminose A, retinoides, ácido bórico, lítio, frontal, centroparietal, parietal direita e esquerda, vértex e occipital.
betabloqueadores, estatinas, sunitinibe etc.), tóxicas, androgenética, - o exame com o dermatoscópio ou microscópio óptico dos fios
congênitas e outras. desprendidos pode ser de útil, uma vez que se considera normal
- circunscritas: areata, traumática, sífilis secundária, lúpus discoide e somente o desprendimento de fios telógenos → tricograma.
outras colagenoses sistêmicas, herpes-zóster, foliculites, fármacos, Geralmente o teste é positivo quando mais de 10% dos fios
tração, desnutrição e outras. tracionados desprendem-se, ou mais de 6 fios, em cada tração.
Deve-se repetir o exame com a mesma metodologia a cada visita do
paciente, para não haver viés de contagem.

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Alopecia areata
TRICOGRAMA
É um método microscópico para avaliação das hastes e do ciclo
folicular, quantificando o percentual de folículos nas diferentes fases A alopecia areata (AA), pelada, acomete aproximadamente 2% da
de crescimento. população, caracterizada por áreas de alopecia localizada ou
O cabelo não deve ser lavado por 5 dias para a realização do exame. generalizada, por vezes com grave impacto psicossocial.
Utiliza-se uma pinça reta ou porta-agulha para coletar os fios e, em Apresenta distribuição universal, afetando ambos os sexos, ainda que
média, 40 a 60 fios devem ser tracionados e analisados no haja referências como mais frequente no sexo masculino. Surge em
microscópio ou dermatoscópio para estabelecimento dos percentuais. qualquer idade, com pico de incidência entre os 15 e os 29 anos.
- o exame deve ser realizado nas regiões parietal e occipital para A perda de cabelos ou pelos ocorre em áreas caracteristicamente
efeitos de comparação. redondas ou ovais, donde a denominação, sem sinais inflamatórios ou
Está indicado no diagnóstico diferencial e acompanhamento das de atrofia da pele → ocorre quase sempre no couro cabeludo ou,
alopecias difusas não cicatriciais, principalmente eflúvio telógeno ocasionalmente, em outras regiões pilosas (barba, supercilio, púbis,
agudo e alopecia androgenética (AAG). etc.).
Considera-se alterado quando mais de 25% dos fios são telógenos.
Tipicamente, o fio telógeno caracteriza-se pelo bulbo globoso com ETIOPATOGENIA
pouca ou nenhuma melanina em seu interior, caracterizando a
É uma doença autoimune crônica órgão-específica mediada por
chamada clava (ou formato de cotonete). Os fios catágenos são
linfócitos T que afeta os folículos pilosos e unhas.
raramente observados, por isso no tricograma costumam-se incluir os
catágenos na contagem dos fios telógenos. Os seguintes fatores têm sido implicados na sua etiopatogenia:
O fio anágeno caracteriza-se pelo formato de taca ou em tip de golfe, - GENÉTICOS: a participação genética é apoiada pela existência de
com coloração escura pela alta concentração de melanócitos no seu casos familiares em até 20% dos indivíduos afetados e pela associação
interior e a bainha radicular interna é visível desde a matriz até sua com doenças congênitas, como a síndrome de Down e de Addison.
parte mais distal com a ajuda do pigmento que cora essa bainha - IMUNOLÓGICOS: uma série de evidências apoia a definição da AA
(anagen dye). como doença de participação imunológica → há um infiltrado
linfocitário de linfócitos T em torno dos folículos pilosos na área
afetada. Encontra-se associação de AA com atopia, urticária e doenças
autoimunes, como tireoidites e vitiligo.
O dano folicular ocorre na fase anágena e é seguido por transformação
rápida para a fase catágena e para a fase telógena → segue-se o
estado de fase anágena distrófica, onde enquanto a doença está em
atividade, os folículos não conseguem ultrapassar a fase anágena
inicial e não formam pelos normais.
- a célula-tronco folicular é poupada e os folículos pilosos não são
destruídos (não há fibrose) → o cabelo pode renascer.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O início é brusco, com perda de cabelos ou pelos em áreas circulares
ou ovais, únicas ou múltiplas, sem qualquer outra alteração → ocorre
de forma rápida e completa.
A placa da área pelada é lisa e brilhante e, na borda, podem ser
retirados pelos que são afilados e descorados para o lado da raiz, que
apresenta dilatação → são os cabelos peládicos, em ponto de
exclamação.
- a placa cresce em tamanho, atingindo dimensões variáveis.
Prurido e tricodinia (hipersensibilidade do couro cabeludo) podem
acompanhar o quadro. Já o eritema, coloração amarelada ou leve
HISTOPATOLOGIA descamação são raros.

De extrema importância para confirmação diagnóstica das alopecias


cicatriciais e é usada em casos complexos de alopecias não
cicatriciais, onde o exame clínico e a tricoscopia não foram suficientes
para o estabelecimento do diagnóstico.
Preconiza-se realizar biópsia do couro cabeludo com punch 4 mm e
enviar o material para corte horizontal (transversal - padrão-ouro).
- se possível, remover dois fragmentos e enviar um para corte
transversal e outro, longitudinal.

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Embora, na maioria dos casos, haja repilação espontânea em alguns Depressões puntiformes (pittings) das lâminas ungueais podem
meses (geralmente os pelos nascem despigmentados – poliose), acompanhar o quadro, sendo encontradas com maior frequência nos
outras vezes o processo progride com surgimento de novas lesões, casos mais graves.
que, por confluência, podem atingir todo o couro cabeludo (alopecia
- traquioníquia (superfície rugosa, áspera e acinzentada), onicorrexe
total) ou todo o corpo (alopecia universal).
(estriações longitudinais) espessamento ou afinamento das unhas,
onicomadese (destacamento espontâneo e indolor da unha) e
leuconiquia puntada ou transversa (mancha branca na unha) podem
ocorrer.
Embora o índice de recorrência seja alto, o prognóstico é variável,
tendo como fatores agravantes o início antes da puberdade, atopia,
distrofias ungueais, história familial de alopecia areata, concomitância
com outras doenças autoimunes, variante ofiásica e desenvolvimento
de alopecia total ou universal.
Diagnósticos diferenciais: tinhas (ocorrem na infância e caracterizam-
se pela tonsura dos cabelos), alopecias cicatriciais (pele perde o
brilho, cor e consistência, com desaparecimento dos folículos pilosos)
e tricotilomania.

TRATAMENTO
A alopecia areata não tem repercussões sistêmicas, mas está sujeita a
recorrências para as quais não há, até o momento, recursos para
evitar.
A conduta terapêutica deve ser individualizada, considerando-se a
faixa etária e extensão da doença → o tratamento pode ser tópico,
intralesional ou sistêmico.

FORMAS LOCALIZADAS
A primeira opção de tratamento é com corticoide tópico em loção ou
creme, aplicado 2x/dia → são usados os de alta a altíssima potência,
como a betametasona e o clobetasol.
- eventualmente, pode-se fazer aplicações de neve carbônica
(crioterapia).
Em casos resistentes, infiltração com triamcinolona, 3 a 4 mg/mL de
soro fisiológico, pode ser indicada.

Existem ainda três variantes clínicas menos frequentes: Atrofia temporária pode ocorrer. O tratamento com tópicos
rubefacientes não é mais usado.
- pelada em coroa ou ofíase: encontrado nas crianças e apresenta
evolução desfavorável, onde a perda de cabelo se inicia na nuca e
progride para a frente pela orla do couro cabeludo, atingindo FORMAS DISSEMINADAS
bilateralmente as regiões parietais; Infiltração com corticoide: é o recurso mais efetivo → emprega-se a
triancinolona, na diluição de 3 a 4 mg/mL, dose total de 10 a 20 mg,
por aplicação semanal ou quinzenal, posteriormente mais espaçada,
consoante à resposta clínica.
Antralina: atua pela ação irritativa sendo empregada em creme (uso
tópico) de concentrações que variam de 0,5-1% → é feita como
terapia de curto contato, iniciando o tempo de exposição com 5 min,
aumentando gradualmente 5 a 10 min/semana, até atingir 1h ou até
que apareça uma leve irritação (necessária para que seja efetiva).
- se não houver resposta em até 3 meses, deve ser descontinuado.
- reações adversas: irritação intensa, foliculite, linfadenopatia regional,
- ofíase inversa: tipo muito raro com acometimento da área manchas na pele e cabelos.
frontoparietotemporal;
Minoxidil: geralmente utilizado em associação a outras terapias tópicas
- difusa: não há formação de placas alopécicas, mas encontram-se ou sistêmicas, sendo usado em solução hidroalcóolica a 5% (2x/dia).
pelos em pontos de exclamação entre os cabelos normais. O mecanismo de ação parece ser na síntese do DNA folicular,
estimulando o crescimento de pelos pelo prolongamento da fase
anágena, além de promover vasodilatação e aumento da espessura do
bulbo capilar, angiogênese e algum efeito imunossupressor.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Imunoterapia tópica: é o tratamento de escolha para os casos crônicos É considerado agudo quando a queda persiste por < 6 meses, tendo
de alopecia areata com mais de 50% do couro cabeludo acometido. bom prognóstico, com recuperação espontânea em 95% dos casos
Atualmente, usa-se o dibutilester do ácido esquálico (SADBE) e a em até 1 ano.
difenciprona (DPCP). Repilação ocorre em 50 a 60% dos doentes,
Já o eflúvio telógeno crônico ocorre quando a queda persiste por > 6
porém recidivas são frequentes.
meses, ocorrendo de forma contínua ou em ciclos.
- reações adversas: urticária, eritema multiforme, dermatite de contato
- pode ser primário (idiopática e costuma aparecer em mulheres entre
e vitiligo.
30-60 anos, de forma insidiosa e curso flutuante, gatilho é o estresse
- técnica: sensibilização inicial em área de 4 cm² com a solução a 2% emocional) ou secundário (associa-se a uma doença crônica).
de SADBE ou difenciprona → após uma semana, usar, em parte do
couro cabeludo, solução a 0,001% e, consoante à reação, aumentar
semanalmente a área e a concentração da solução até 2%. Localmente, MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E DIAGNÓSTICO
ocorre eritema ou erupção eczematosa e, eventualmente, áreas
acrômicas. A manifestação é a queixa de perda excessiva de cabelos →
eventualmente o paciente até traz uma porção de cabelos que caíram.
Fotoquimioterapia: exposição ao ultravioleta A após uso de
psoralênico tópico ou sistêmico (PUVA) → resultados são variáveis e O exame do couro cabeludo nada revela ou mostra apenas discreta
índice de recidivas é extremamente alto com a interrupção do dermatite seborreica e/ou prurido.
tratamento.
- preconizam-se de 20 a 40 sessões até se obter resultado favorável.
Corticosteroides sistêmicos: tem indicação limitada pela grande
recorrência após sua interrupção, além dos potenciais efeitos
colaterais da corticoterapia sistêmica prolongada.
- um método alternativo seria o uso da corticoterapia intramuscular
(associação de dipropionato/acetato de betametasona e fosfato
dissódico de betametasona ou mesmo a triancinolona 40 mg/dose) a
cada 4 semanas → parece diminuir os efeitos colaterais dos
corticosteroides, porém a recorrência também é alta com interrupção
da terapia.
- pulsoterapia, utilizando-se prednisona ou prednisolona 1 mg/kg/dia,
2 dias seguidos/semana, pode ser utilizada em casos extensos ou de
evolução rápida.

O diagnóstico pode ser feito pela observação da acentuação dos


ALOPECIA TOTAL/UNIVERSAL recessos bitemporais, associado ao teste de tração positivo ou ainda
O tratamento efetivo se faz com infiltração de triancinolona, a cada 7 pelo tricograma que apresenta mais de 25% de pelos telógenos.
ou 15 dias, máxima dosagem de 12 mg/sessão, devendo ser - histologicamente, não existem alterações relevantes, salvo um
complementado por uso tópico de corticoide para a alopecia total do aumento na contagem de folículos telógenos.
couro cabeludo.
Nas formas de alopecia total ou universal resistentes à terapia, muitos
pacientes masculinos têm vida normal, aceitando a afecção, sem usar
MECANISMOS
qualquer recurso. Em mulheres, recursos como perucas possibilitam Existem cinco mecanismos descritos para o eflúvio telógeno:
bons resultados estéticos.
1) Liberação anágena imediata: evento agudo que gera conversão
prematura do anágeno em telógeno, a queda é observada 2 a 3 meses

Efluvio telogeno
após (correspondendo à duração da fase telógena).
- ocorre após doença consumptiva, doenças tireoidianas, febre alta,
Caracteriza-se por aumento transitório da queda de pelos normais dietas radicais para emagrecer, cirurgias, hemorragias, anemias,
claviformes (telógeno), como consequência da reentrada em uma deficiência de ferro, zinco ou vitamina D, após infecções, ou em
nova fase anágena de grande número de folículos provocado por doenças sistêmicas graves.
estresse físico ou psíquico. - é típico do uso de certos fármacos como heparina, cumarínicos, lítio,
- a queda de fios telógenos pode subir de 120 a 400 por dia. estatinas, clofibrato, início ou término de medicamentos
contraceptivos orais ou da reposição hormonal, agentes citostáticos,
Pode ocorrer por várias causas: pós-parto, uso de ACO (durante a hipervitaminose A e retinoides, em especial acitretina, colchicina,
ingestão das pílulas pelo potencial androgênico dos progestogênios betabloqueadores e outros.
ou algumas semanas após a suspensão), regime de emagrecimento,
deficiência proteica, de ferro ou zinco, estados estressantes 2) Liberação anágena tardia: mecanismo do eflúvio pós-parto →
prolongados e doenças sistêmicas (LES, dermatomiosite, caquexia, durante a gestação, observa-se prolongamento da fase anágena, e se
anemias graves, DM descompensado, hiper ou hipotireoidismo, muitos fios são envolvidos, a conversão para fase telógena será
hepatites, entre outras). seguida de aumento da queda 2 a 3 meses após o parto.
3) Síndrome do anágeno curto: encurtamento idiopático da fase
anágena, o que pode causar queda persistente em alguns casos.

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

4) Liberação telógena imediata: ocorre encurtamento da fase telógena, EVOLUÇÃO E TRATAMENTO


com consequente expulsão desses fios e conversão para anágena →
por ex., no início do tratamento com minoxidil. A repilação geralmente é rápida após a suspensão da quimioterapia,
5) Liberação telógena tardia: prolongamento e sincronização de - recentemente, alopecia permanente foi descrita após uso de
muitos fios na fase telógena e queda na transição para a fase anágena quimioterápicos como bussulfano, docetaxel, paclitaxel e o esquema
→ fenômeno provavelmente responsável pela queda sazonal cisplatina/etoposídeo.
experimentada por alguns pacientes; trata-se de evento biológico Já a repilação após a radioterapia depende do tipo, profundidade e
normal similar ao fenômeno de muda que ocorre em muitos animais. fracionamento da dose (é possível ocorrer lesão irreversível das
células-tronco foliculares).
TRATAMENTO Excluída a causa, o tratamento se dá pela indicação de alimentação
rica em proteínas e administração de preparações com vitaminas e
O tratamento também deve ser individualizado, podendo-se utilizar: sais minerais. Pode-se usar um corticoide tópico.
- medicamentos eletivos para a causa, quando identificada;
- prescrição de dieta rica em proteínas, minerais (ferro e zinco) e
vitaminas; Alopecia androgenetica
- procurar controlar o estado de estresse, quando existente;
É a mais frequente das alopecias, acometendo até 50% dos homens e
- xampus ou loções de corticoide para a dermatite seborreica, se 40% das mulheres em torno dos 50 anos.
presente;
- nos homens, pode iniciar a qualquer momento após a puberdade até
- minoxidil de 2 a 5% diariamente. a segunda década de vida, sendo totalmente expressa aos 40 anos.
Deve-se esclarecer ao paciente que a perda de até 100 cabelos por
dia está dentro da normalidade e que, a resposta terapêutica somente
ETIOPATOGENIA
ocorre após alguns meses (pelo crescimento dos cabelos ser de cerca
de 1 cm/mês). Como o próprio nome sugere, tem sua fisiopatogenia apoiada na
interação entre fatores hormonais e genéticos → o desenvolvimento
da AAG depende de vários fatores, incluindo predisposição genética,
Efluvio anageno presença adequada de androgênios, de receptores de androgênio e
de coativadores dos receptores de androgênio.
A perda de cabelos tem início rápido e extensivo, geralmente após - embora a herança genética da AAG seja objeto de muitos estudos,
realização de quimioterapias antineoplásicas, visto que os citostáticos, os genes envolvidos ainda não foram completamente elucidados →
antimetabólitos e alquilantes agem de forma inibitória sobre a fase trata-se de uma doença autossômica dominante e/ou poligênica,
anagênica → é mais comum e intensa em pacientes submetidos à sendo herdade de um ou ambos os pais.
quimioterapia combinada.
Do ponto de vista hormonal, postula-se que os androgênios
Outras causas incluem: intoxicação com sais de tálio, mercúrio ou promovam, em folículos geneticamente determinados, a
ácido bórico, desnutrição proteica grave, doenças infecciosas agudas transformação de folículos terminais em folículos miniaturizados → o
febris, radioterapia, intervenções cirúrgicas prolongadas e sífilis folículo é um tecido-alvo para andrógenos e é também considerado
secundária (perda de cabelos em clareiras). um órgão periférico, capaz de sintetizar quantidades significativas de
androgênios, que podem afetar o seu próprio crescimento fisiológico
do folículo piloso (couro cabeludo e corpo).
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Na AAG ocorre redução gradual da duração média da fase anágena
Ocorre perda difusa e extensa do cabelo, sendo que os fios se em cada ciclo folicular como resultado da ação hormonal da di-
quebram em nível do couro cabeludo. Também podem cair os pelos hidrotestosterona (DHT) nas células da papila dérmica → a DHT é
de sobrancelhas, cílios, barba e tronco. metabolicamente mais potente e tem afinidade pelo menos 5x maior
As unhas podem apresentar estrias ou sulcos transversais. aos receptores se comparado à testosterona.
- uma vez que a duração da fase anágena é o principal fator na
determinação do comprimento do cabelo, o comprimento máximo do
novo cabelo anágeno é sempre mais curto do que o seu antecessor.
Na AAG, a duração do cabelo telógeno não é alterada, mas o tempo
em que o folículo fica vazio, referido como o período de latência, ou
fase quenógena, torna-se mais longo → assim, os folículos capilares
tornam-se progressivamente miniaturizados.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ALOPECIA ANDROGENÉTICA MASCULINA É importante ressaltar, no entanto, que a maioria dos casos de AAG
na mulher tem avaliação hormonal normal e que esta deve ser
O aspecto clínico da perda de cabelo no homem é uma rarefação de reservada aos casos em que um estado hiperandrogênico é fortemente
fios em graus variáveis nas regiões frontoparietal, bitemporal e vértice suspeitado por outros sintomas e sinais clínicos.
(áreas androgênio-dependentes).
Associadas à alopecia, ocorrem, com certa frequência, seborreia e
- alguns pacientes podem apresentar sintomas locais associados hiperidrose (muitos autores usam inadequadamente a designação
como dor, prurido e alteração da sensibilidade. alopecia seborreica).
A progressão pode ser lenta ou rápida, geralmente mais intensa É uma queda mais difusa que no padrão masculino, está classificada
quanto mais cedo se iniciar. em três graus segundo a escala de Ludwig:
Há diminuição dos cabelos anágenos e aumento dos telógenos. Os
cabelos eliminados são finos e descorados, com bulbo terminal em
clava → progressivamente, os cabelos se tornam mais finos,
desaparecem os cabelos terminais e, na fase final, permanecem pelos
do tipo velo.
A alopecia ocorre ao longo dos anos e segue um padrão segundo as
classificações propostas por Hamilton-Norwood:
Tipo I: perda de cabelo ao longo da margem frontal;
Tipo II: aumento da perda dos cabelos na região frontal e início da
perda na região occipital (vértice ou coroa);
Tipos III, IV e V: perda crescente em ambas as regiões, finalizando
com confluência e calvície total da região superior do couro cabeludo,
poupando as regiões laterais.

(tipo II)
O diagnóstico é feito com base na história clínica e no exame físico.
- a avaliação da perda de cabelo é feita por meio da aplicação de
diferentes técnicas: tricoscopia manual, para a verificação da
miniaturização dos fios do cabelo pela redução do diâmetro, do
comprimento e da pigmentação dos fios, entre outros achados
característicos; teste da tração pode ser positivo principalmente nas
áreas afetadas pela AAG.
- o tricograma é considerado um exame muito útil na diferenciação de
condições como eflúvio telogênico e AA.
(tipos IV e V)
Não há associação com doença sistêmica → porém, há estudos TRATAMENTO
limitados que referem maior risco de doença coronariana e aumento
significativo do colesterol e triglicerídeos nos calvos em comparação Tanto no homem como na mulher, a AAG pode ser tratada de maneira
com os não calvos. tópica, sistêmica e/ou cirúrgica.

ALOPECIA ANDROGENÉTICA FEMININA TÓPICOS


Minoxidil (2% - homem ou 5% - mulher), 2 x/dia → deve ser aplicado
Nota-se uma rarefação na região frontoparietal e no vértice, sendo
com os cabelos secos e os resultados terapêuticos se fazem a partir
mantida a linha de implantação frontal, possivelmente em decorrência
do 3º mês, sendo mantidos enquanto for aplicada a medicação.
da maior expressão de aromatase nos folículos dessa região.
- não atua em todos os casos, admitindo-se haver melhor resultado,
Pode ter início desde a puberdade em indivíduos fortemente
consoante a regra, menos 40-10-10, isto é, menos de 40 anos de
predispostos geneticamente, até na menopausa, fase em que são
idade, de 10 anos de duração e de 10 cm de área.
comuns alterações do metabolismo androgênico.
- uma vez interrompido o tratamento, os cabelos voltam a cair, por
Em casos de início mais precoce e/ou com outros sinais de
isso, o medicamento deve ser mantido de forma indefinida.
hiperandrogenismo (acne, hirsutismo, alterações menstruais), pode-
se realizar investigação endocrinológica, visando, especialmente, a - resultados mais efetivos são observados quando aplicado,
SOP e outras síndromes virilizantes, como a hiperplasia suprarrenal previamente ao Minoxidil, uma solução de Tretinoína a 0,05% em
congênita relação. aplicação diária, de preferência à noite → o retinoide atua no
crescimento, diferenciação e regeneração capilar, além de facilitar a
- exames complementares mais úteis incluem a relação LH/FSH,
penetração do Minoxidil.
níveis de testosterona total e livre, androstenediona, 17-
hidroxiprogesterona e sulfato de deidroepiandros-terona (S-DHEA).

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Outros tipos de alopecia


17α-estradiol: possui poucas evidências cientificas quanto ao
mecanismo de ação e eficácia, mas parece agir estimulando a
aromatase e inibindo a enzima 5α-redutase no folículo piloso, sendo
utilizado em aplicações locais diárias. ALOPECIA INFANTIL : é encontrada em lactentes, nas primeiras semanas
de vida, sendo observada particularmente na região occipital, onde há
Progesterona (solução alcoólica de 2 a 4%): é utilizada topicamente
pressão de contato → a alopecia é gradual, porém, às vezes, é rápida,
na AAGF, em aplicação diária, por 4 a 12 meses, com alguns
chamando a atenção dos pais.
resultados favoráveis.
- não necessita de tratamento, bastando esclarecer que se trata de
alopecia transitória.
SISTÊMICOS
ALOPECIA FISIOLÓGICA DO ADOLESCENTE : perda de cabelos na região
Finasterida (1 mg/dia): é um inibidor especifico da 5α-redutase tipo frontoparietal no homem ocorre na adolescência por fatores genéticos,
2, sendo utilizado em homens. Há crescimento de cabelos no primeiro raciais e pela presença de hormônios androgênicos. Ocasionalmente,
e segundo ano de tratamento entre 48-66% dos casos. pode ser observada na mulher.
Dutasterida: é um antiandrogênico com capacidade de inibição da 5α- ALOPECIA DAS PERNAS : alopecia na superfície lateral das pernas, acima
redutase tipos 1 e 2 e está aprovada para o tratamento da hiperplasia dos tornozelos, é mais comum nos homens, causada por pressão ou
prostática benigna (HPB) na dose de 0,5 mg, equivalente a 5 mg de atrito do vestuário.
finasterida.
ALOPECIA DE PRESSÃO : mulheres que fazem tração dos cabelos, é
Antiandrogênios sistêmicos (espironolactona, acetato de ciproterona): encontrada nas regiões temporais ou na orla do couro cabeludo
têm tido bons resultados nas mulheres, principalmente nos casos de (alopecia marginal). É muito observada em negras, após o alisamento
produção aumentada de andrógenos. dos cabelos.
* o FDA não aprova o uso de finasterida ou dutasterida em mulheres - outra forma de alopecia de pressão é vista em indivíduos que usam
→ preferência para a terapêutica tópica. quepes ou chapéus apertados, curativos contensivos no couro
* todos os antiandrogênios têm como efeitos colaterais: depressão, cabeludo ou em enfermos que permanecem longo tempo com a
redução da libido, disfunção da ereção, mastodinia etc. → porém são cabeça imobilizada.
raros e cessam com a interrupção da droga.

CIRÚRGICO
Em casos mais avançados e resistentes à terapêutica clínica, a técnica
de microimplantes capilares é de extrema utilidade na melhora
cosmética dos pacientes.
- o controle do tratamento é comumente acompanhado de registros
fotográficos periódicos e por imagens digitais de tricoscopia para
avaliar o volume e a quantidade de pelos.

Tricotilomania
ALOPECIA MUCINOSA : caracteriza-se por áreas de alopecia com pápulas
É um estado neurótico que leva pessoas (em geral meninas com
foliculares, placas papulosas ou infiltração nodular → ocorre no couro
menos de 10 anos de idade) a arrancar os cabelos.
cabeludo, na nuca e na face. Geralmente é temporária, exceto se
O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-IV), houver destruição do folículo piloso pela mucina.
tem critérios definidos para o diagnóstico dessa afecção, que são:
Há 2 tipos de alopecia mucinosa:
- arrancamento recorrente de cabelos com perda visível;
- o 1º é encontrado mais em crianças e jovens, não é associado a
- sentimento progressivo de tensão imediatamente antes do linfoma e, em geral, evolui espontaneamente para a cura, sem deixar
arrancamento do pelo ou ao tentar resistir ao ato; cicatriz → pode ser tratada com glicocorticoides tópicos ou
- sentimento de prazer, gratificação ou alívio após o arrancamento; intralesionais.

- distúrbio não é justificado por outra doença psiquiátrica ou médica; - o 2º é mais observado em adultos, pode estar associado a linfoma
→ o tratamento é o mesmo da neoplasia maligna.
- distúrbio provoca marcado prejuízo clínico e/ou ocupacional e social
para o paciente.
Não existe um tratamento efetivo, porém métodos como psicoterapia,
hipnose, terapia comportamental ou uso de fármacos (clomipramina,
fluoxetina, sertralina e citalopram) têm sido tentados.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

REFERÊNCIAS
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
WOLFF. Dermatologia de Fitzpatrick. 7 ed. 2014

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 7

LEISHMANIOSE TEGUMENTAR (LT) - ocupacional ou lazer: em que a transmissão está associada à


exploração desordenada da floresta e derrubada de matas → o ciclo
A LT é uma doença infecciosa, não contagiosa, com evolução passa a ser: animal silvestre reservatório → flebótomo fêmea infectada
eminentemente crônica, que atinge a pele e, às vezes, mucosas (tipo → homem (antropozoonose);
mucocutânea).
- periurbana ou rural: a adaptação do vetor ao peridomicílio estabelece
- formas de leishmanioses tegumentares: LT oriental, LT americana o ciclo biológico com participação do animal doméstico (cão) e, até
(mais prevalente no Brasil) e LT difusa. mesmo, do homem como reservatório → homem ou cão doente →
É causada por protozoário do gênero Leishmania e transmitida ao flebótomo fêmea infectado → homem suscetível (antropozoonose).
homem pela picada de flebótomos fêmeas infectadas que são o vetor
da doença. AGENTE ETIOLÓGICO E CICLO EVOLUTIVO
No Brasil, existem atualmente 7 espécies de Leishmania responsáveis
A Leishmania é um protozoário que possui duas formas evolutivas:
pela doença humana, sendo que as 3 primeiras são as principais:
PROMASTIGOTA : forma flagelada, móvel e de vida extracelular →
- Leishmania (Viannia) braziliensis → espécie mais prevalente no
homem e pode causar lesões cutâneas e mucosas; é encontrada em encontrada no vetor transmissor e nos meios de cultura utilizados para
todas as zonas endêmicas do país; diagnóstico da doença.
AMASTIGOTA : forma aflagelada, arredondada e encontrada dentro das
- Leishmania (Viannia) guyanensis → causa especialmente lesões
cutâneas; ocorre na margem norte do Rio Amazonas, em áreas de células do hospedeiro definitivo (especialmente leucócitos
colonização recente; mononucleares – monócitos e macrófagos).

- Leishmania (Leishmania) amazonensis → é o agente etiológico da


LTA, incluindo a forma anérgica ou leishmaniose cutânea difusa;
- Leishmania (V) lainsoni → registrada apenas na Amazônia;
- Leishmania (V) naiffi → causa LTA de evolução benigna, ocorrendo
na Amazônia, Pará e Amazonas;
- Leishmania (V) shawi → responsável por casos esporádicos no
O principal reservatório desse protozoário na zona urbana é o cachorro
Amazonas e Pará.
(Canis familiaris), enquanto no ambiente rural normalmente os
reservatórios são animais silvestres, como raposas e marsupiais.
EPIDEMIOLOGIA Os vetores da doença são mosquitos fêmeas hematófagos,
conhecidos como flebotomíneos, popularmente chamados de
As leishmanioses são antropozoonoses, consideradas um problema
mosquito-palha, tatuquiras, birigui, entre outros → podem ser do
de saúde pública → a OMS estima que cerca de 350 milhões de
gênero Phlebotomus (velho mundo) ou do gênero Lutxomyia (novo
pessoas estejam susceptíveis à infecção, com aproximadamente 2
mundo), como é o caso do Brasil, onde as principais espécies de
milhões de casos novos a cada ano e 12 milhões de pessoas
vetores são o Lutzomiyia longipalpis e o Lutzomyia cruzi (em áreas
infectadas no mundo.
específicas dos estados do MT e Mato Grosso do Sul).
- nas Américas, as leishmanioses estão presentes em 18 países e a
forma clínica mais comum é a leishmaniose tegumentar (LT) na forma A infecção do vetor ocorre quando as fêmeas, ao sugarem o sangue
cutânea. de mamíferos infectados (homem ou outro reservatório), ingerem
macrófagos parasitados por formas amastigotas da Leishmania.
É considerada uma doença negligenciada, especialmente por afetar
populações vulneráveis do ponto de vista socioeconômico → por No trato digestivo anterior do vetor ocorre o rompimento dos
isso, alguns dos principais fatores relacionados à LT são as más macrófagos liberando essas formas que se reproduzem e diferenciam-
condições de moradia, analfabetismo, deficiência no sistema se em formas flageladas promastigotas, que também se reproduzem
imunológico e desnutrição. e colonizam o esôfago e a faringe do vetor, onde permanecem
aderidas ao epitélio pelo flagelo, quando se diferenciam em formas
Em 2019, foram confirmados 15.484 casos novos de LT no Brasil, infectantes, as promastigotas metacíclicas. O ciclo do parasito no
com distribuição em todo o território brasileiro, mas com os maiores inseto se completa em torno de 72 horas.
percentuais de casos registrados na região Norte → acomete
principalmente adultos jovens, na faixa etária de 20 a 49 anos, sendo Após este período, as fêmeas infectantes ao realizarem um novo
a maioria do sexo masculino (75,2%). repasto sanguíneo liberam, na pele do hospedeiro, as formas
promastigotas metacíclicas juntamente com a saliva do inseto →
Assim como a leishmaniose visceral, a LT é uma doença de notificação essas formas então são fagocitadas por células do sistema
compulsória. mononuclear fagocitário (macrófagos e monócitos) da derme e
Há três perfis epidemiológicos fundamentais de transmissão: hipoderme, onde diferenciam-se em amastigotas e multiplicam-se
intensamente até o rompimento dos mesmos, liberando grande
- silvestre: em que ocorre a transmissão em áreas de vegetação número de parasitos para infectar outras células. Os monócitos
primária → zoonose de animais silvestres; carreiam a Leishmania pela corrente sanguínea, disseminando a
infecção para outros tecidos (como as mucosas).

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ETIOPATOGENIA
A espécie de Leishmania e sua quantidade no organismo associam- Assim, alguns pacientes curam as lesões precocemente, às vezes sem
se com a gravidade da doença → a maior ou menor quantidade de procurar atendimento médico, enquanto outros permanecem meses
parasitas em determinada lesão vai depender, em última análise, do com a lesão em atividade e o processo de cicatrização mostra-se lento
estado imunitário do hospedeiro. → isso pode ser explicado pelo estabelecimento rápido ou tardio de
Após a inoculação na pele, o parasita é fagocitado por macrófagos do uma resposta imune específica e eficiente na eliminação do parasito.
hospedeiro e assume sua forma amastigota → por se tratar de um De acordo com a interação parasito-hospedeiro, o espectro clinico da
parasita intracelular obrigatório, a imunidade celular, com perfil de LT é variável, podendo-se classificá-la em polos:
resposta Th1, tem papel central no controle da infecção. POLO ANÉRGICO (POLO NEGATIVO) : caracterizada pela forma cutânea
- nos pacientes com resposta Th1 adequada, há produção de difusa (LCD) pela ausência de resposta celular específica, associada à
interferon-α e IL-2, e tendência a formas clínicas limitadas e melhor acentuada proliferação de parasitos → teste de Montenegro negativo;
evolução da doença; POLO HIPERÉRGICO (POLO POSITIVO) : caracterizada pela forma mucosa
-já uma deficiência na resposta Th1 ou o desenvolvimento de um (LM) devido ao exagero das respostas celulares antileishmania,
padrão de resposta Th2, com produção de IL-4 e IL-10, estão associada à escassez de parasitos → IDRM muito positiva (bolhas).
relacionados com formas mais graves da doença. FORMA CUTÂNEA (LC) : está no meio do espectro, sendo a manifestação
Além disso, existem moléculas presentes na superfície do parasito que mais frequente, com lesões exclusivamente cutâneas, localizadas e
também interferem na atividade do macrófago e, consequentemente, que tendem à cicatrização → a resposta celular está preservada, por
na resposta imune → a gp63 e o LPG degradam enzimas lisossômicas isso o IDRM é positiva.
e a fosfatase ácida bloqueia a produção de metabólitos oxidativos. * um mesmo paciente pode evoluir dentro desse espectro ao longo
do tempo.
ACHADOS LT CUTÂNEA DIFUSA (LCD) LT CUTÂNEA (LC) LT MUCOSA (LM)
Placas infiltradas e nódulos não Lesão destrutiva no septo nasal ou
Clínicos Úlcera(s) limitada(s)
ulcerados disseminados palato
Resposta celular Ausência Preservada Exagerada
IDRM (-) (+) (++)
Linfoproliferação Negativa Positiva Positiva
Presente (geralmente títulos
Resposta humoral (sorologia) Presente Presente
maiores de anticorpos específicos)
Esfregaço Riqueza parasitaria Escassez parasitaria Escassez/ausência de parasitos
Sem formação de granuloma,
Com formação de granuloma e Escassa formação de granuloma e
Histopatológico poucos linfócitos e muitos
infiltração de linfócitos infiltração de mononcleares
macrófagos infectados
L. (L) amazonenses ou
Espécie de Leishmania L. (L) amazonensis L. (V) braziliensis
L. (V) braziliensis
Cura espontânea Não Possível Não
Adequada (em geral após dois
Resposta à terapêutica Resistência
esquemas)

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS FORMA CUTÂNEA DISSEMINADA (CUTÂNEO-MUCOSA)

O período de incubação varia de poucos dias a meses → média de 2 Ocorre em cerca de 2% dos pacientes, sendo caracterizada por lesões
meses, mas pode apresentar períodos mais curtos (2 semanas) ou em diferentes estágios de evolução, sugerindo disseminação do
mais longos (2 anos). parasita por via sanguínea ou linfática, que aparecem algumas
semanas após a lesão inicial ulcerada característica → são papulares
A lesão inicial aparece apenas no ponto de inoculação e geralmente e de aparência acneiforme, acometendo vários segmentos corporais,
ocorre em áreas expostas da pele (face, membros, mãos e pés) → especialmente a face e o tronco.
normalmente é uma lesão única, mas pode ser múltipla.
- a disseminação pode ocorrer após início do tratamento para a forma
- caracterizada pela formação de uma pápula eritematosa que se cutânea localizada.
transforma em uma lesão papulocrostosa, papulovesiculosa ou
papulopustulosa. O comprometimento das mucosas ocorre em 30% dos pacientes.
Além disso, pode ser acompanhada de sintomas gerais, como
- pode ocorrer adenopatia regional e linfangite. calafrios, febre e mialgia durante o período de disseminação.

FORMA CUTÂNEA
Alguns dias ou semanas depois, a lesão adquire aspecto ulceroso bem
característico (85% dos pacientes), com bordas elevadas e bem
definidas (“úlcera em moldura de quadro”), indolor, com centro
granulado, coloração vermelho-viva e recoberta por exsudato discreto,
seroso ou seropurulento. FORMA CUTÂNEA DIFUSA (LCD)
- pode estar coberta por crosta, cuja remoção expõe o aspecto Também chamada de forma hansenoide, causada no Brasil apenas
ulcerado típico. pela L. (L) amazonensis → é rara e grave, ocorrendo em pacientes
com anergia e deficiência específica na resposta imune celular a
antígenos de Leishmania.
Caracteriza-se pela presença de nódulos isolados ou agrupados,
máculas, pápulas e placas infiltradas → inicialmente são localizadas,
mas depois se espalham pelo corpo, mostrando limites imprecisos (se
confundem com a pele normal).
- lembra bastante a hanseníase virchowiana.
As lesões predominam nas extremidades e no segmento cefálico,
geralmente se limitando à pele → o comprometimento das mucosas
ocorre tardiamente (lesão laringofaringiana).
- não há comprometimento visceral.
A lesão pode evoluir (após 6 a 15 meses) para cicatrização espontânea
(deixando cicatriz atrófica e apergaminhada) ou originar placas
vegetantes-verrucosas (que cronificam e crescem lentamente).

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

FORMA MUCOSA (LM) COINFECÇÃO LEISHMANIA-HIV


As lesões mucosas podem aparecer precocemente, mas geralmente A LTA pode modificar a progressão da doença pelo HIV e a
surgem 1-2 anos após a lesão inicial e decorrem, quase sempre, da imunodepressão causada por esse vírus facilita a progressão da LTA.
disseminação hematogênica. Não há um perfil clínico definido associado à coinfecção em pacientes
Clinicamente, a LM é expressa por lesões destrutivas localizadas nas portadores de HIV → achados não usuais podem ser observados nos
mucosas das vias aéreas superiores → acometem especialmente o pacientes coinfectados, como, o encontro de Leishmania em pele
nariz, começando com eritema e discreta infiltração no septo nasal; íntegra, sobrepondo lesão de sarcoma de Kaposi ou em lesões de
depois, ocorre o processo ulcerativo, que acomete a mucosa das faces Herpes simplex e Herpes-zóster.
laterais do nariz e causa edema e eritema nas áreas adjacentes (lábios
- geralmente, em pacientes coinfectados com imunossupressão grave,
superiores e inferiores).
as lesões são encontradas em áreas não expostas (ex.: região genital).
- ocorrendo destruição do septo, ocorre o desabamento do nariz,
- pode, ainda, haver acometimento do trato gastrointestinal e do trato
constituindo o “nariz de anta” ou tapir.
respiratório para a coinfecção Leishmania-HIV.
Recomenda-se oferecer a sorologia para HIV para todos os pacientes
com LTA, independentemente da idade.

DIAGNÓSTICO
As bases para o diagnóstico são: procedência do doente, aspectos
clínicos das lesões cutâneas e das lesões mucocutâneas indolores
com mínimos sinais de inflamação (ausência de exsudato purulento),
ou da cicatriz atrófica, ovalar ou circular, lisa e brilhante, com
pigmentação salpicada no seu interior.

EXAMES PARASITOLÓGICOS
A borda de uma úlcera relativamente nova é o local preferencial para
a obtenção de raspados dérmicos, uma amostra de biópsia ou um
fácies tapiroide
aspirado de agulha → os últimos dois tipos de amostras podem ser
A orofaringe também pode ser acometida com lesões no palato, utilizados para cultura e ensaios com base na PCR.
gengiva, laringe e faringe. Raramente, o pavilhão auricular também é
acometido de forma assimétrica. EXAME DIRETO : o diagnóstico da leishmaniose cutânea pode ser
confirmado pelo exame direto do raspado da lesão, corado pelo
- especialmente no palato, as lesões são ulcerovegetantes com
Giemsa, onde revela a presença de amastigotas em macrófagos
granulações grosseiras.
dérmicos → o raspado pode ser obtido da biópsia da pele, esfregaços
Grupos de risco: de impressão de tecidos ou esfregaços de raspados cutâneos.
- sexo masculino;
ISOLAMENTO EM MEIOS DE CULTURA : feita no meio NNN (Novy-McNeal-
- pacientes com história de LC de evolução crônica e curada sem
Nicolle), sendo positiva em apenas 40% dos casos → permite
tratamento ou com tratamento inadequado;
identificar a espécie de Leishmania envolvida.
- pacientes com lesões cutâneas múltiplas, extensas e com > 1 ano
de evolução, localizadas acima da cintura. REAÇÃO EM CADEIA DE POLIMERASE (PCR) : pode ser extremamente útil,
sobretudo nos casos mucosos. É indicada especialmente em
FORMA RECIDIVANTE pacientes suspeitos de LTA, mas que apresentam resultados negativos
nos testes convencionais para diagnóstico etiológico.
Caracteriza-se por ativação da lesão nas bordas de uma úlcera
original, após cicatrização da lesão, mantendo-se o fundo com aspecto
cicatricial → é causada pelos parasitas que ficam confinados pelo INTRADERMORREAÇÃO DE MONTENEGRO
processo cicatricial. Nas lesões mais antigas de leishmaniose, o parasita pode não
A resposta terapêutica costuma ser inferior à da lesão primária. aparecer → nesse contexto, o teste de reação cutâneo tardio (teste
cutâneo de Montenegro), que utiliza antígenos de leishmanias para
induzir uma resposta celularmente mediada. Uma suspensão fenolada
de promastigotos mortos é injetada intradermicamente, em geral na
face anterior do antebraço → o teste é considerado positivo se uma
pápula com > 5 mm de diâmetro se forma no local da inoculação, após
48-72 horas.
Entretanto, o teste não consegue distinguir entre infecções prévias e
presentes → a positividade aparece enquanto as lesões cutâneas
ainda estão ativas e o teste permanece positivo por muito tempo após
a cura espontânea. É um teste prognóstico.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

EXAME HISTOPATOLÓGICO Doses e esquemas terapêuticos (IV ou IM):


Demonstra um granuloma linfo-histiocitário, com áreas ou faixas de - forma cutânea localizada: 15 mg/kg/dia durante 20 dias;
células epitelioides, que são os centros claros ou clareiras → o grande - forma mucosa ou difusa: 20 mg/kg/dia durante 20 (difusa) ou 30
número de plasmócitos constituem uma pista para o diagnóstico (mucosa) dias.
histológico.
O Glucantime é comercializado em ampolas de 5 mL, sendo que cada
Nas lesões recentes, é comum se observar o parasito intracelular → mL contém 81 mg de antimônio → o máximo é de 3 ampolas ou 15
quanto menos recente, mais difícil se torna observar o agente. mL/dia, por isso, o cálculo da dose só deve ser feito para até 60 kg.
Em relação ao monitoramento durante o tratamento: se o paciente tem
< 50 anos, o acompanhamento é semanal; já aqueles com ≥ 50 anos,
o acompanhamento eletrocardiográfico é feito 2x/semana e os demais
exames semanalmente.
Contraindicações: gestantes, < 1 ano, comorbidades (hepato, nefro ou
cardiopatas), uso de β-bloqueadores ou antiarrítmicos e
imunossuprimidos.

Atualmente, tem-se realizado a aplicação de GLUCANTIME


INTRALESIONAL, que está restrita para a forma cutânea localizada e
EXAME SOROLÓGICO recidivas e apresenta algumas condições:
Os métodos mais usados são a imunofluorescência indireta e o ELISA. - não pode ser feita em áreas de articulações ou na cabeça;
A sensibilidade oscila em torno de 75% e o teste pode ter reação - lesão deve ser < 3 cm;
cruzada com outras leishmanioses e com a doença de Chagas.
- não se deve injetar mais de 5 mL na ferida.
Os títulos são positivos a partir de 1/80 e não apresentam correlação
Realiza-se de 1 a 3 aplicações com intervalos de 15 dias.
com a positividade parasitológica, mas parecem correlacionar-se com
o número de lesões e podem servir como controle de cura.
Efeitos adversos Glucantime: são essencialmente dose e tempo-
dependentes, mas deve-se ter vigilância maior em pacientes > 50
TRATAMENTO anos, portadores de cardiopatias, nefropatias, hepatopatias e doença
de Chagas; crianças toleram melhor doses mais elevadas.
A doença cutânea é tratada a fim de acelerar a cura, diminuir a cicatriz
(especialmente importante para as lesões em sítios cosmeticamente Artralgias e mialgias são frequentes, mas reagem bem aos
sensíveis) e impedir a difusão ou a recaída. analgésicos. Anorexia e astenia são também frequentes assim como
náuseas, vômitos e dor abdominal (podem estar associadas à elevação
A droga de 1ª escolha é o antimonial pentavalente, com exceção dos de amilase e lipase, por vezes desencadeando pancreatite).
pacientes coinfectados com HIV e gestantes. Não havendo resposta
satisfatória com o tratamento pelo antimonial pentavalente, as drogas A cardiotoxicidade é a alteração mais temida → as alterações
de segunda escolha são a anfotericina B e o isotionato de pentamidina. eletrocardiográficas mais frequentes são distúrbios de repolarização,
inversão da onda T, alargamento do intervalo QT e bradicardia sinusal.
É recomendável o repouso físico relativo e a abstinência de bebidas
alcoólicas durante o período de tratamento, devido às possíveis - progressivo aumento do interalo QT é indicação para interrupção
alterações hepáticas. imediata do medicamento devido ao risco de arritmias graves e
mesmo morte súbita.
Em pacientes com idade acima dos 50 anos, portadores de
cardiopatias, nefropatias, hepatopatias ou doença de Chagas, deverá
ser feita rigorosa avaliação clínica antes e durante o tratamento, com ANFOTERICINA B
acompanhamento eletrocardiográfico 2x/semana, hemograma, É alternativa extremamente eficaz, porém tóxica e, inclusive, indicada
avaliação das funções renal (ureia e creatinina), pancreática (amilase para as formas resistentes aos antimoniais. Dose: 1 mg/kg/dia (dose
e lipase) e hepática (transaminases, bilirrubinas e fosfatase alcalina). máxima diária de 50 mg) diariamente ou em dias alternados → deve
- tais exames deverão ser monitorizados semanalmente, para orientar ser administrada até atingir as seguintes doses totais:
a redução da dose ou suspensão da droga, bem como a indicação de - forma cutânea: 1 a 1,5 g;
terapêutica alternativa.
- forma mucosa: 2,5 a 3 g.

ANTIMONIAL PENTAVALENTE
ANFOTERICINA B LIPOSSOMAL
Os antimoniais pentavalentes constituem a medicação preferencial
para o tratamento das diferentes formas da leishmaniose → aqui no As formulações lipídicas constituem alternativa menos tóxica, com
Brasil está disponível apenas a N-metilglucamina, comercializada com poucos efeitos colaterais, mas é mais caro.
o nome de Glucantime. É utilizada especialmente em pacientes com > 50 anos, gestantes e
Os antimoniais são leishmanicidas que atuam na bioenergética das portadores de insuficiência renal, cardíaca e/ou hepática.
formas amastigotas de Leishmania → tanto a glicólise quanto a A dose é de 1 a 4 mg/kg/dia, endovenosa, até completar 1 a 1,5 g de
oxidação dos ácidos graxos, processos que ocorrem em organelas dose total.
específicas, são inibidos, e há redução na produção de ATP e GTP.

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ISOTIONATO DE PENTAMIDINA Contraindicações absolutas:


Usado como alternativa entre o Glucantime e a anfotericina B, sendo - gestação → 30 dias antes do início do tratamento deve ser solicitado
mais efetivo contra a Leishmania guyanensis. o beta-hCG e comprovar o uso de no mínimo 2 métodos
contraceptivos;
Administrada na dose de 4 mg/kg/dia, EV ou IM, em dias alternados
→ é feito de 3 a 10 aplicações. - amamentação;
É contraindicada em caso de gestação, DM, insuficiência renal e - lesão renal ou hepática prévia grave;
hepática, doenças cardíacas e em crianças com < 8kg. - < 12 anos;
- peso < 30 kg.
MILTEFOSINA
Foi regulamentada em 2020 e passou a ser utilizada em 2021 para o CONTROLE DE CURA
tratamento da LTA → existem ainda poucas evidências para a forma
mucosa e em imunossuprimidos. O critério de cura é clínico, sendo indicado o acompanhamento regular
por 12 meses → 90-120-360 dias.
A dose é de 2,5 mg/kg/dia, por VO, dividida em 2 a 3 doses/dia, até
o limite de 150 mg/dia (3 cápsulas de 50 mg) → devem ser Forma cutânea localizada: epitelização das lesões ulceradas, com
administradas preferencialmente após as refeições, para minimizar os regressão total da infiltração e do eritema, em até 3 meses após a
efeitos gastrointestinais. conclusão do esquema terapêutico.
- no paciente entre 30-45kg, a dose máxima diária é de 100 mg. Forma mucosa: regressão de todos os sinais comprovado pelo exame
otorrinolaringológico, em até 6 meses após a conclusão do esquema
O tratamento deve ocorrer em duas etapas de 14 dias cada, totalizando
terapêutico.
28 dias → entre uma etapa e outra, o paciente deve retornar ao serviço
de saúde para avaliação médica e orientações.

REFERÊNCIAS
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
VERONESI-FOCACCIA. Tratado de infectologia. 5 ed. 2015
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Manual de vigilância da Leishmaniose Tegumentar. 2017
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Guia de vigilância em saúde. 3 ed. 2019
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Nota informativa nº 13/2020 – orientações sobre o uso da miltefosina. 2020

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 8

FARMACODERMIAS Há fatores que predispõem ao aparecimento de RMA: substâncias


indutoras de LES, deficiência genética da enzima G6PD (leva à
São doenças tegumentares (pele e/ou mucosa) e/ou sistêmicas instalação de anemia hemolítica com o uso de determinados fármacos)
desencadeadas, direta ou indiretamente, pelo uso de medicamentos. e alelos HLA de classe I e II (por ex., HLA-B*1502 como fator de
A OMS define RMA (reações medicamentosas adversas) como uma predisposição para desenvolvimento da SJS com o uso de
reação não intencional causada por medicamentos utilizados em carbamazepina).
doses usuais para o homem, sendo que a maioria dessas reações é
evitável e dose-dependente. MECANISMOS FISIOPATOLÓGICOS
As RMA podem, ainda, ser subclassificadas em dois tipos:
RMA são desencadeadas por MECANISMOS IMUNOLÓGICOS
- TIPO A : representam 80% dos casos, são consideradas previsíveis e (alergia medicamentosa) e NÃO IMUNOLÓGICOS (muito mais
dose-dependentes; frequentes e incluem as interações medicamentosas).
- TIPO B : são imprevisíveis e não dependem da dose de medicação - geralmente, a utilização de fármacos costuma desencadear a
administrada → compreendem as reações de hipersensibilidade e as produção de anticorpos, embora sem expressão clínica.
idiossincrásicas não imunes.
O teste laboratorial mais empregado na demonstração de causa
As RMA de potencial gravidade (podem resultar em morte, em medicamentosa para determinada dermatose é o que se baseia na
hospitalização ou em incapacidade persistente) são reunidas por meio quantidade de liberação do interferon-γ por linfócitos expostos (no
do acrônimo SCAR (severe cutaneous adverse reactions), sendo sobrenadante da cultura após incubação com o possível agente)
incluídas nesse grupo a síndrome de Stevens-Johnson (SJS), a comparados a não expostos → a sensibilidade desse teste varia em
necrólise epidérmica tóxica (NET) e a síndrome de hipersensibilidade função do fármaco. Outras provas podem ser úteis em determinadas
a fármacos (SHF) ou erupção a fármacos com eosinofilia e sintomas situações, como o teste de contato (patch test) nos casos de eritema
sistêmicos (acrônimo DRESS – drug rash with eosinophilia and pigmentar fixo.
systemic symptoms).
Apesar dessa disponibilidade, a maioria dos casos de RMA, inclusive
- alguns autores incluem ainda neste grupo a pustulose exantemática os graves, são manejados apenas com anamnese e exame clínico, seja
generalizada aguda (AGEP – acute generalized exanthematous pela indisponibilidade dos testes citados, seja pela rápida evolução do
pustulosis). quadro clínico.
Qualquer fármaco pode causar reações cutâneas, porém os mais Normalmente, a via de administração dos medicamentos se relaciona,
frequentemente implicados são: penicilinas (especialmente as de certo modo, com a forma de RMA → por ex., desenvolvimento de
aminopenicilinas), sulfonamidas, anticonvulsivantes aromáticos anafilaxia após utilização de medicamentos injetáveis, ou surgimento
(fenitoína, carbamazepina, fenobarbital), AINES do grupo dos oxicams de eczema de contato após aplicação de medicamento de uso tópico.
(piroxicam, tenoxicam) e das butazonas, inibidores da ECA,
hidralazina e alopurinol.
REAÇÕES IMUNOLÓGICAS
Deve-se suspeitar de uma RMA sempre que nos depararmos com
casos em que a clínica, a correlação clinicopatológica, a evolução ou As reações imunológicas podem ser alérgicas ou apresentarem
a resposta terapêutica saírem dos parâmetros habituais para aquela reações cruzadas.
suposta doença.
REAÇÕES ALÉRGICAS
Todos os 4 tipos de hipersensibilidade descritos por Gell-Coombs
EPIDEMIOLOGIA estão representados nas farmacodermias:
É difícil dizer com precisão a verdadeira incidência das RMA, mas - REAÇÃO TIPO I (ANAFILÁTICA): é uma reação de hipersensibilidade
estudos estimam que as RMA representem de 3 a 6% de todas as imediata (após 30-60 min), mediada por IgE, provocando
admissões hospitalares. Dos doentes hospitalizados, 5 a 30% vêm a degranulação de mastócitos e basófilos, liberando histamina,
apresentar farmacodermias; por outro lado, os hospitalizados em prostaglandinas e leucotrienos → representada por urticária,
consequência de farmacodermias adquirem outra em 30% dos casos. angioedema e reação anafilática e pode ser produzida por analgésicos,
RMA são menos frequentes em crianças (imaturidade imunológica e aminopirina, penicilinas, soros, etc.;
ausência de exposição prévia), com uma incidência estimada em torno - REAÇÃO TIPO II (CITOTÓXICA): citotoxicidade mediada por anticorpos
de 1,5%, que aumenta com a idade. (IgG e IgM) → tem sido encontrada nos casos de púrpura
Apesar da falência imunológica relativa, as RMA prevalecem no idoso trombocitopênica pelo sedormide;
em função das alterações relacionadas com a farmacocinética dos - REAÇÃO TIPO III: mediada por imunocomplexos → tem sido
medicamentos e com o uso de múltiplos fármacos. Mulheres são mais relativamente frequente, como no caso da doença do soro pela
frequentemente acometidas. penicilina;
O clima e o ambiente têm importância no desencadeamento de - REAÇÃO TIPO IV: é uma reação de hipersensibilidade tardia, sendo
determinadas farmacodermias (como fotossensibilização). uma das mais frequentes, mediada pela imunidade celular (linfócitos
T helper) → é o mecanismo que ocorre em todos os casos de
dermatite de contato, síndrome de Stevens-Johnson e NET.

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

REAÇÕES CRUZADAS Esta reação adversa pode ser desencadeada por dois mecanismos
Ocorrem quando medicamentos diferentes compartilham um mesmo distintos: fototóxico e fotoalérgico → alguns fármacos podem
radical → por ex., pacientes com alergia à penicilina apresentam desencadear tanto fototoxicidade quanto fotoalergia.
reação cruzada com cefalosporina em 10% dos casos, eczema de - fototóxico: certas substâncias têm a capacidade de absorver
contato a timerosal (antiga substância do mertiolate) e piroxicam. radiações, produzindo lesões cutâneas diretas somente nas áreas
expostas, semelhantes à queimadura solar → é dose-dependente,
não requer sensibilização prévia e ocorre poucas horas após a
REAÇÕES NÃO IMUNOLÓGICAS
exposição. São exemplos as tetraciclinas, as quinolonas, os tiazídicos,
EFEITO COLATERAL OU SECUNDÁRIO as sulfas, etc.
É decorrente da ação secundária e não terapêutica do medicamento, - fotoalérgico: é desencadeado por mecanismo imunológico (tipo IV),
por ex., eflúvio anágeno e alopecia secundários ao uso de citostáticos ocorrendo 24 a 48h após a reexposição ao fotoalérgeno e acomete
e sonolência pelo uso de anti-histamínicos. também áreas não expostas → não é dose-dependente e pode
apresentar reações cruzadas com outros agentes. São exemplos a
ALTERAÇÕES METABÓLICAS clorpromazina, as sulfas, as salicilamidas, etc.
Fármacos podem alterar o status nutricional ou metabólico por vários
mecanismos, como retinoides sistêmicos, levando ao aparecimento de EFEITO TÓXICO
xantomas, e hidantoína, interferindo na absorção de folato e Trata-se de um termo abrangente, inespecífico, utilizado de modo
desencadeando estomatite aftosa. heterogêneo. A toxicidade ocorre quando o contato com determinado
composto desencadeia resposta do organismo, seja por dosagem
INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS excessiva (aparecimento de zumbido com o uso de ácido
Existem 3 mecanismos pelos quais os medicamentos podem interagir acetilsalicílico), falhas de metabolismo ou mecanismo alérgico (aplasia
e causar RMA: de medula pelo cloranfenicol).
- uma substância interferir na excreção de outra: probenecida
SUPERDOSAGEM
reduzindo a excreção de penicilina pelos rins;
Ocorre após ter sido ultrapassado, a curto prazo ou após uso
- uma substância inibir ou estimular enzimas importantes na prolongado (efeito cumulativo), o limite de tolerância do organismo.
degradação de outra: rifampicina ou griseofulvina diminuindo a
eficácia de pílula anticoncepcional; fluconazol potencializando a ação É o que ocorre na ingestão acidental ou não de barbitúricos, levando
de hidantoína e da clorpropamida; ao coma ou quando a clofazimina causa hipercromia.
- medicamentos competindo pelo mesmo local (pode ser o da Exemplo clássico de efeito cumulativo tardio, embora raro, é o
proteína plasmática transportadora) e, portanto, diminuindo a ação do aparecimento da doença de Bowen muitos anos após a ingestão de
fármaco deslocado: fenilbutazona ou ácido acetilsalicílico deslocando arsênico inorgânico.
cumarínicos, causando sangramento; administração de folato
concomitantemente ao metotrexato reduz a ação deste, por deslocá- IDIOSSINCRASIA
lo do receptor. É uma resposta individual peculiar e, às vezes, até paradoxal
(contrário) a uma substância, como sedativos provocando euforia.
EXACERBAÇÃO DE DOENÇA PREEXISTENTE
Um medicamento pode causar a exacerbação de uma doença prévia, INTOLERÂNCIA
como a griseofulvina, os barbitúricos e a cloroquina na porfiria latente É uma resposta individual exagerada às doses normais da medicação,
por ativação enzimática; lítio e agentes betabloqueadores podem como ocorre quando a eritromicina causa intolerância gástrica em
desencadear psoríase. adultos.

ALTERAÇÕES DE EQUILÍBRIO ECOLÓGICO TERATOGENICIDADE


Aparecimento de candidíase e diarreia decorrentes de alteração da Malformações podem ser desencadeadas por fármacos, sobretudo
flora intestinal ou vaginal por uso prolongado de antibiótico. quando administrados no período de organogênese (entre a 4ª e a 8ª
- clindamicina desencadeando quadro de colite pseudomembranosa semana de gestação).
causada por Clostridium dificile. Retinoides, talidomida e substâncias citotóxicas e vismodegibe são
reconhecidamente teratogênicas. É possível a ocorrência de
MECANISMOS FARMACOLÓGICOS teratogenicidade com o uso de lítio, quinina, cumarínicos e hidantoína.
Decorrem de ação farmacológica direta de determinada substância; Fármacos só devem ser administrados na gravidez quando
um exemplo é a urticária não alérgica provocada pela degranulação estritamente necessário e, além de não terem potencial teratogênico
dos mastócitos, liberando histamina em decorrência do uso de comprovado, não desencadearem efeitos colaterais importantes no
opiáceos, atropina, ácido acetilsalicílico, contrastes iodados e outros. concepto ou a relação risco/benefício seja justificável.

FOTOSSENSIBILIDADE
Como o nome indica, é necessário um componente lumínico →
substâncias fotossensibilizantes podem afetar a pele tanto pela via
tópica quanto sistêmica.
- a quase totalidade das reações fotoquímicas mediadas por fatores
exógenos é induzida pelo raio ultravioleta A.

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Manifestacoes clinicas
O tratamento da urticária/angioedema medicamentoso é a suspensão
da droga implicada e o início de anti-histamínicos (antagonistas H1).
Anafilaxia
EXANTEMA INDUZIDO POR DROGAS
Trata-se de uma grave reação multissistêmica, potencialmente fatal e
É a farmacodermia mais comum, presente em até 75% dos casos. de início rápido, cujo mecanismo principal está relacionado à liberação
abrupta de mediadores sistêmicos por mastócitos → como resultado,
Ocorre principalmente pelo uso de antibióticos (penicilinas,
tem-se o surgimento de alterações cutâneo-mucosas, respiratórias,
sulfonamidas, eritromicina, gentamicina) e anticonvulsivantes.
cardiovasculares e gastrointestinais (edema de laringe e de glote,
O rash cutâneo aparece geralmente dentro de 2 semanas após início broncoespasmo, náuseas, vômitos, hipotensão arterial).
da droga (podendo também ocorrer até 2 semanas após a sua
Além da manutenção de vias aéreas pérvias, a primeira medida
suspensão). O mecanismo é desconhecido.
farmacológica a ser adotada é a administração de adrenalina
- um tipo clássico é o rash induzido pela ampicilina em 85% dos intramuscular (1ª linha, na coxa anterolateral) ou intravenosa.
pacientes com mononucleose infecciosa (vírus Epstein-Barr).
As demais medidas incluem: reposição volêmica (pelo choque
O exantema é caracterizado por uma distributivo), anti-histamínicos (angioedema e prurido), corticoides
erupção eritematosa maculopapular (visando sintomas tardios, porém de ação questionável) e
de distribuição simétrica, geralmente broncodilatadores (sibilância refratária). A posição supina com
pruriginosa, que desaparece à digito- membros inferiores elevados também está indicada.
pressão e surge principalmente no
tronco e nas áreas de pressão em
pacientes acamados. ERITEMA PIGMENTAR FIXO
- pode ser do tipo morbiliforme (com Está presente em 10% dos casos de farmacodermias, surgindo até 24
lesões eritematosas confluentes, horas após a exposição e persistindo por dias a semanas → acomete
semelhantes ao sarampo). uma localização especifica após a exposição ao agente causal.
O curso dessa farmacodermia é benigno, cujo tratamento é feito Está associado principalmente ao uso de antibióticos (tetraciclinas,
apenas com a suspensão da medicação que estava em uso, com sulfonamidas, penicilinas), AINES, analgésicos, anticonvulsivantes,
regressão das lesões em 1 a 2 semanas. Em situações mais graves, barbitúricos e laxantes (fenoftaleína).
pode-se utilizar anti-histamínicos e corticosteroides.
Seu mecanismo é alérgico, mas ainda não totalmente esclarecido;
trata-se, provavelmente, de vasculite.
URTICÁRIA E ANGIOEDEMA Caracterizado pelo surgimento de uma ou múltiplas lesões, que
A urticária e o angioedema estão presentes em até 25% dos casos de começam com uma característica eritematoedematosa, e que evolui
farmacodermias, também ocorrendo principalmente em associação ao para hipercromia de natureza melânica (acastanhadas), bordas bem
uso de antibióticos (penicilinas, cefalosporinas, sulfonamidas), AINES, definidas, arredondada, não pruriginosa (pode ter sensação de
anestésicos, contraste iodado, plasma, látex, IECA (captopril), queimação), predominando na face, pescoço, extremidades e
analgésicos (morfina, codeína), entre outros. genitália, de distribuição assimétrica. Em casos muito intensos, podem
ocorrer bolhas.
Geralmente surgem de forma imediata, ou seja, nos primeiros 30
minutos após a exposição à medicação, mas também podem aparecer
dias após a administração (tardia).
A erupção urticariforme é caracterizada pelo aparecimento de pápulas
e placas eritematosas, com bordas irregulares e centro pálido,
associadas a prurido intenso → o caráter transitório é característico e
as lesões individuais tendem a desaparecer em menos de 24h.
- predominam no tronco e extremidades proximais. O diagnóstico é confirmado quando surge a mesma lesão, exatamente
nos mesmos locais das lesões prévias, após nova exposição à droga.
O prognóstico da reação é excelente e o quadro tende a se resolver
dias após descontinuação da substância causadora.
As lesões recorrentes podem deixar hiperpigmentação residual.

Em 50% dos casos, a urticária evolui para um angioedema,


caracterizado por edema da
mucosa labial, língua e região
periocular, podendo progredir O tratamento consiste em afastamento do agente causal e,
até o edema de glote (causando eventualmente, aplicação de corticoides tópicos em casos mais
insuficiência respiratória e graves.
choque anafilático que pode
matar o paciente se não tratado
de imediato).

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

VASCULITE POR HIPERSENSIBILIDADE As lesões mucosas são vistas em 70% dos casos, apresentando-se
nos lábios, cavidade bucal, palato, gengiva e genital.
Tem como mecanismo proposto a reação de hipersensibilidade tipo
Não há fase prodrômica e tipicamente não ocorrem sintomas
III, ou seja, uma doença por imunocomplexos, causando vasculite
constitucionais → paciente apresenta-se com estado geral bom.
leucocitoclástica de predomínio nos membros inferiores.
Uma vez estabelecida, o rash cutâneo é estável e desaparece
O paciente apresenta uma erupção eritematosa maculopapular que se
espontaneamente após 1 a 3 semanas, com um curso extremamente
transforma num rash purpúrico, com petéquias e púrpuras
benigno → exceto nos 20% dos casos que evoluem para SSJ.
confluentes, de distribuição simétrica pelos membros inferiores.
O tratamento na grande maioria dos casos consiste apenas na
- a presença da púrpura palpável (elevada) e a ausência de
suspensão do fármaco ou resolução da infecção herpética.
plaquetopenia são bastante sugestivos do diagnóstico.
Lesões urticariformes, bolhas e necrose podem ocorrer.
SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON E NECRÓLISE EPIDÉRMICA
TÓXICA (NET – SÍNDROME DE LYELL)
Considera-se que a síndrome de Stevens-Johnson (SSJ) e a Necrólise
Epidérmica Tóxica (NET) provavelmente constituem espectros de uma
mesma doença (necrólise epidérmica), sendo a NET uma forma mais
grave do que a SSJ.
São doenças cutâneas que possuem um potencial de evolução grave,
com letalidade de 5% para a SSJ e de 30 a 50% para a NET. A causa
A erupção pode ser assintomática ou associada a um conjunto de mais comum de morte é a septicemia secundária.
sinais e sintomas que recebem a denominação de doença do soro →
Segundo consensos atuais, a diferença entre as duas entidades é
pode se apresentar com ou sem a vasculite cutânea leucocitoclástica
apenas quantitativa → ambas são definidas pelo acometimento de
e/ou lesão urticariforme e caracteriza-se pela ocorrência, 7 a 10 dias
duas ou mais áreas de mucosa (oral, ocular, genital), exantema
após a administração da droga, de febre alta, mialgias, artralgias e
eritematoso disseminado contendo lesões em alvo atípicas e lesões
linfadenopatia.
bolhosas que geram desnudamento cutâneo (escaldamento).
- por ser uma doença mediada por imunocomplexos, há queda do
O termo SSJ é reservado para os casos com menos de 10% de pele
complemento plasmático.
desnudada e o termo NET, para os casos mais graves, com mais de
- suspendendo-se o medicamento, os sintomas desaparecem em dias 30% de pele desnudada.
ou poucas semanas.
- os pacientes intermediários com 10 a 30% de pele desnudada são
referidos como sobreposição SSJ-NET.
ERITEMA POLIMORFO (ERITEMA MULTIFORME MINOR) Pela estatística americana, a SSJ é duas vezes mais comum que a NET
e a proporção de casos entre as três entidades (SSJ, overlap, NET) é
Está presente em cerca de 5% dos casos de farmacodermia, sendo
de aproximadamente 3:2:1,7. Todas elas são cerca de duas vezes mais
que em 20% desses casos pode haver a evolução para o eritema
comuns em mulheres. Predominam nos adultos, embora possam
multiforme major (Síndrome de Stevens-Johnson).
ocorrer em crianças, especialmente a SSJ.
As drogas mais comumente envolvidas são os antibióticos
(sulfonamidas, penicilinas, quinolonas, cefalosporinas), AINES,
anticonvulsivantes e alopurinol. Apesar dessa associação com
algumas drogas, a maior parte dos casos de eritema multiforme minor
estão relacionados à infecção pelo vírus herpes-simplex (eritema
multiforme herpético).
Trata-se de uma erupção eritematosa polimorfa (com diversas
morfologias), de início súbito, distribuição simétrica, raramente
pruriginosa, predominando na porção extensora dos membros, mãos
e pés (embora possa ocorrer na região palmar), face e eventualmente
mucosa oral → em alguns casos, o rash progride centripetamente
para o tronco.
- a lesão em alvo típica, contêm pelo menos 3 anéis concêntricos, de
diferentes colorações, com as bordas elevadas, já a lesão em alvo
atípica normalmente possui 2 anéis e são planas.

Lesão em alvo típica Lesão em alvo atípica

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

FISIOPATOLOGIA (SSJ E NET) - além das localizações mucosas, pode-se ter comprometimento grave
de outros órgãos (pneumonites, necrose tubular aguda etc.), levando
A patogênese e a fisiopatologia são parcialmente conhecidas. à morte.
O mecanismo desencadeador inicial parece ser mediado por pelo O histopatológico revela um discreto infiltrado inflamatório
poder citotóxico direto dos linfócitos T CD8 sobre os queratinócitos mononuclear subepidérmico, com degeneração hidrópica da camada
da epiderme, modulados pelos linfócitos T CD4. Aparentemente, a basal e extensa necrose eosinofílica da epiderme.
droga, ou mais comumente um metabólito da droga, é incorporado na
membrana dos queratinócitos, servindo de hapteno ao ligar-se no - nas áreas bolhosas ou desnudas, há caracteristicamente necrose de
complexo de histocompatibilidade classe I → assim, a ativação dos toda a espessura da epiderme e descolamento subepidérmico.
linfócitos citotóxicos gera liberação de IL-6, IL-10 e TNF-α, que - na NET o infiltrado inflamatório é menos proeminente e ocorre maior
induzem à apoptose maciça pela ativação dos receptores Fas (receptor destruição epidérmica.
de apoptose).
Existe um aumento importante da incidência de SSJ/NET em pacientes
- além disso, o TNF-α e o interferon-α também estimulam o aumento portadores de HIV, especialmente os casos provocados pelas
da quantidade de óxido nítrico e da enzima óxido nítrico-sintetase, sulfonamidas. Há também uma relação genética com o HLA A29 e B12
produzidos nos queratinócitos. (predisposição genética por aumentar a chance dessa interação).
- o envolvimento de uma proteína encontrada nas células T citotóxicas Um defeito da detoxicação hepática e cutânea de metabólitos
e NK, a granulisina, está sendo aceita como parte da patogênese. medicamentosos pode ser observado em alguns pacientes propensos
- não há participação importante dos anticorpos. → ocorre maior acúmulo das hidroxilaminas reativas do metabolismo
das sulfonamidas e óxidos de areno do metabolismo dos
O resultado final é a necrose dos queratinócitos, que gera o anticonvulsivantes aromáticos, sendo que esses metabólitos estão
descolamento da epiderme, acometimento mucoso (uretrite, envolvidos na gênese da síndrome.
estomatite, balanite, vulvovaginites, conjuntivite, uveíte e panoftalmia)
e sintomas gerais (febre, mialgia, artralgias).

SinDrome De Stevens - johnson MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS


É uma afecção inflamatória aguda, febril e autolimitada, com duração Em cerca de 50% dos pacientes, ocorre um estágio prodrômico que
de aproximadamente 2 a 4 semanas → afeta pele e membrana dura até 15 dias, caracterizado por febre (39-40 ºC), mal-estar,
mucosa. A mortalidade varia de 5-15%, dependendo da gravidade dos cefaleia, coriza, angina, mialgias, artralgias (síndrome gripal) e
sintomas e terapêutica adotada. eventualmente vômitos e diarreia.
Os principais medicamentos associados são: antibióticos (sulfas, O quadro cutâneo começa com uma erupção eritematosa
betalactâmicos), alopurinol, anticonvulsivantes (difenil-hidantoína, maculopapular, por vezes morbiliforme, dolorosa, aparecendo no
barbitúricos) e AINES → a relação com medicamentos é encontrada tronco e na face e progredindo centrifugamente para as extremidades.
em mais de 50% dos casos de SSJ. - essas lesões tendem à confluência, especialmente na face, pescoço
Pode ser desencadeada por agentes infecciosos, especialmente o e tórax anterior, evoluindo com bolhas hemorrágicas.
Mycoplasma pneumoniae → essa infecção está presente em 15% dos - algumas lesões individuais são lesões em alvo atípicas, achatadas,
casos de SSJ, em pacientes entre 5 e 20 anos de idade. com centro violáceo ou pigmentado e halo eritematoso.
- porém, como frequentemente existe uma infecção prévia
precedendo o quadro, há uma dificuldade em determinar a provável
causa (se foi a infecção ou as drogas usadas para tratamento da
infecção, ou um sinergismo entre infecção e drogas).

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

LESÕES OCULARES : são potencialmente graves e podem deixar


sequelas. Ocorre conjuntivite e queimação ocular, evoluindo para
vesiculação, erosões dolorosas e lacrimejamento bilateral.
- em casos mais graves, surgem conjuntivite purulenta,
pseudomembranas, úlceras da córnea, uveíte anterior e panoftalmite
(inflamação generalizada do olho).
- as sequelas oculares podem levar à cegueira, além de simbléfaro
(aderência da conjuntiva palpebral à córnea), sinéquia, entrópio
(inversão palpebral), ectrópio (eversão palpebral), triquíase (inversão
ciliar), opacidades corneanas e cicatrizes.

A pele do paciente exibe o sinal de Nikolsky positivo: descolamento


da epiderme após tração manual → é um sinal precoce que aparece
antes de surgirem as áreas de desnudamento espontâneo, apenas
onde há lesões bolhosas.

LESÃO GENITAL : inclui lesões erosivas (após rotura de bolhas


hemorrágicas) ou purulentas, que acometem a vulva, vagina, glande
ou fossa navicular, podendo levar à retenção urinária e parafimose.

As áreas de eritema confluente podem originar áreas desnudas,


desprendendo epiderme necrótica, com aspecto de escaldadura → na
SSJ estas áreas somam no máximo 10% da pele total.
O acometimento orgânico é raro na SSJ, sendo mais comum na NET.
As lesões mucosas são obrigatórias para o diagnóstico dessa doença,
sendo que pelo menos 2 mucosas devem estar acometidas, entre as
mucosas oral, ocular ou genital → essas lesões costumam ser
extensas e muito sintomáticas.
LESÃO ORAL : é a área mais acometida, com lesões nos lábios, língua,
palato e cavidade bucal → o quadro começa com queimação labial e
oral, evoluindo com edema, eritema e bolhas que logo se rompem, DIAGNÓSTICO
deixando erosões vermelho-hemorrágicas, cobertas por É empírico, sendo que os testes de provocação não são indicados
pseudomembranas branco acinzentadas e úlceras rasas aftosas. considerando que a exposição ao agente pode desencadear novo
- os lábios são recobertos por crostas hemorrágicas características. episódio grave de SSJ/NET.

- as lesões orais são bastante dolorosas. A biópsia da pele é exame complementar definitivo → demonstra
derme com mínimo infiltrado de células inflamatórias, predomínio de
Pode ocorrer acometimento da gengiva, faringe, laringe e até esôfago linfócitos T CD4+, necrose da epiderme e a junção derme-epiderme
e traqueia. mostra alteração vacuolar a bolhas subepidérmicas.
- o infiltrado dérmico é superficial e na maior parte perivascular e, na
microscopia eletrônica, a conjuntiva revela metaplasia epitelial
escamosa, rompimento vascular e reduplicação.
Fatores prognósticos devem ser sempre avaliados, o que facilita a
adoção das medidas necessárias → escore de gravidade SCORTEN
(SCORe of Toxic Epidermal Necrosis) considera:

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

TRATAMENTO (SSJ E NET) Causas apontadas como predisponentes ou desencadeantes são


infecções virais, vacinações, radioterapia, linfomas, doença enxerto
Os pacientes com SSJ/NET devem ser internados no hospital e versus hospedeiro e infecção por HIV.
tratados numa enfermaria com cuidados especializados, com
isolamento para prevenção de infecções → a condição idela é a
internação em UTI. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O principal tratamento é o de suporte, incluindo as seguintes medidas: Também é comum a fase prodrômica, tal como na SSJ → mal-estar
1) Reposição hidroeletrolítica, guiada pelos sinais vitais, hematócrito geral, febrícula, hipersensibilidade cutânea acompanhada de
inflamação superficial de conjuntivas, pálpebras, orofaringe e genitais,
e eletrólitos séricos;
às vezes com distúrbios gastrointestinais.
2) Nutrição enteral (a maioria dos pacientes não tolera ingestão oral);
O início do quadro cutâneo surge com um rash cutâneo eritematoso
3) Medidas oftalmológicas preventivas (lubrificantes oculares, limpeza morbiliforme, com ou sem lesões-alvo atípicas, predominando na face
e remoção de adesões); e no tronco e evoluindo para confluência.
4) Debridamento da pele necrótica apenas quando terminar a - a pele já nesta fase apresenta sinal de Nikolski positivo.
progressão da doença (fase estável), recobrindo-se as lesões com
gaze embebida em soro fisiológico ou curativos hidrocoloides →
deve-se evitar a sulfadiazina de prata, pelo risco de agravamento do
mecanismo de destruição imunológica.
O uso de corticoides em dose alta (1 mg/kg/dia de prednisolona) é
bastante controverso:
- alguns autores preconizam o seu uso quando o paciente está na fase Ao longo de 4 a 5 dias, ocorre necrose explosiva e as lesões cutâneas
precoce da doença, enquanto ainda há progressão das lesões → o transformam-se em grandes bolhas flácidas que deixam grandes áreas
tratamento é por período curto (1 a 2 semanas) e desmame rápido. cutâneas desnudas, que aparecem como erosões gotejantes serosas
intensamente eritematosas.
- outros autores contraindicam os corticoides por alegarem a piora do
prognóstico, por agravarem as infecções.
O uso de antibioticoterapia sistêmica profilática não é preconizado,
entretanto, qualquer sinal focal ou sistêmico de infecção deve
imediatamente indicar coleta de material para cultura e início de
antibióticos → na fase inicial, predominam os Gram-positivos,
especialmente o S. aureus; na fase tardia, devemos cobrir também P.
aeruginosa.
A imunoglobulina humana, por conter naturalmente anticorpos contra
o receptor Fas, mostrou-se eficaz na dose de 0,75 a 1 mg/kg/dia IV,
por 4 dias ou mais, em alguns estudos.
A ciclosporina é um inibidor da produção de IL-2 e tem sido usada na
dose de 3 mg/kg/dia, IV, durante 7 a 10 dias, com redução da taxa de
mortalidade e resultados superiores ao uso dos corticoides.
Deve-se restringir ao máximo o uso de medicamentos, principalmente
analgésicos e antitérmicos, além de não administrar os medicamentos
previamente utilizados.

PROGNÓSTICO
As lesões de pele geralmente não deixam cicatrizes, mas lesões de
mucosa podem ser uma complicação tardia, podendo causar
sangramentos e estreitamentos dos locais afetados.

Necrolise epidermica toxica O desnudamento atinge 30 a 90% da superfície corporal e assemelha-


se a um grande queimado por escaldadura.
A necrólise epidérmica tóxica ou síndrome de Lyell (introduzida em
O acometimento das mucosas é extenso e o estado geral é grave.
1956) é afecção bolhosa extremamente grave, frequentemente fatal,
desencadeada por drogas, infecções e outros fatores não Paralelamente, ocorre aumento da febre e acometimento sistêmico,
determinados. principalmente do trato respiratório, gastrointestinal e hepático →
pode cursar com quadro de tosse, dispneia, diarreia, hemorragia
As principais drogas relacionadas são: antibióticos (penicilinas,
digestiva e hepatite.
sulfonamidas, cefalosporinas), AINES (dipirona, fenilbutazona),
alopurinol, anticonvulsivantes, corticoides e antineoplásicos A morte geralmente é decorrente de septicemias ou por coagulação
(asparaginase, bleomicina, clorambucil, procarbazina e suramina) → intravascular disseminada.
relação com medicamentos é encontrada em até 95% dos casos.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

As sequelas mais comuns da NET são lesões oculares, incluindo a Outras complicações correspondem a cicatrizes cutâneas, nevos
síndrome do olho seco, fotofobia e sensação de corpo estranho no melanocíticos eruptivos, estenose vulvovaginal com subsequente
olho. dispareunia, fimose, despigmentação ou hiperpigmentação cutânea,
xerostomia, bronquiectasia, bronquite e bronquiolite obliterante.

SÍNDROME DRESS (SÍNDROME DA ERUPÇÃO CUTÂNEA COM EOSINOFILIA)


É uma síndrome rara, potencialmente grave, sendo uma reação de - assim, a droga pode ativar uma resposta imune celular e humoral
hipersensibilidade caracterizada por um envolvimento sistêmico e específica ao herpesvírus → isso poderia explicar por que diferentes
eosinofilia. herpesvírus são ativados.
Pode ser desencadeada por um medicamento (entre 2 a 6 semanas 2) A reativação viral pode ocorrer, mas inicialmente é clinicamente
após exposição à droga) ou por reativação viral (herpes) → os inaparente, no entanto, as células T estimuladas por vírus apresentam
medicamentos mais associados são as sulfas e os anticonvulsivantes uma reatividade cruzada significativa com certos fármacos e a
aromáticos (fenitoína e alopurinol). exposição a essas drogas leva a uma expansão de células T
específicas para o fármaco (e vírus), que persiste mesmo após a
É mais frequente em afrodescendentes e os adultos são mais afetados
que as crianças. Embora a incidência exata da reação à droga ainda retirada da droga devido à persistência de antígenos virais → assim,
não tenha sido determinada, ela é muito mais comum que a SSJ. se os sintomas de DRESS forem mediados pelos vários produtos
gênicos e pelas respostas imunes do herpesvírus à replicação viral, a
O reconhecimento desta síndrome é muito importante, pois a taxa de deterioração frequente ou as várias exacerbações que ocorrem apesar
mortalidade é de 10-20% e uma terapia específica pode ser da retirada do medicamento, poderiam ser, pelo menos em parte,
necessária. explicadas.
A ativação de linfócitos T e secreção de IL-5 leva à eosinofilia.
PATOGÊNESE
A patogenia da síndrome DRESS ainda é desconhecida,
provavelmente multifatorial → envolve elementos como exposição a
drogas, predisposição genética, alterações nas vias metabólicas de
detoxificação da droga, formação de linfócitos T sensibilizados à
droga, hipogamaglobulinemia transitória e ativação de infecção viral
latente.
É caracteristicamente causada por anticonvulsivantes (1/3 dos casos)
→ a metabolização desses medicamentos é feita por oxidação, que
os transforma em aromáticos reativos (óxidos arenos) que devem ser
metabolizados em metabólitos não tóxicos pelas enzimas hidroxilase
epoxide ou transferase glutationa → quando a ação dessas enzimas
está deficiente, ocorre acúmulo dos óxidos arenos, que se ligam a
macromoléculas proteicas dos tecidos, desencadeando apoptose,
necrose celular tóxica ou respostas imunes, inclusive com ativação de
alguns tipos de herpes-vírus.
Ainda não está claro o papel do herpesvírus no início do DRESS, mas
existem 2 possibilidades:
1) DRESS começa como uma reação imune "alérgica" a um
medicamento em particular, que parece possuir uma capacidade inata
de estimular os linfócitos T → nesse contexto, há uma ativação maciça
de herpesvírus alojado nessas células, pois a estimulação de LT pela
droga pode reativar o genoma viral.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E DIAGNÓSTICO


O paciente apresenta-se inicialmente com febre, mal-estar, Envolvimento de órgão interno é esperado, com acometimento
linfadenopatia e erupção cutânea morbiliforme (macular ou papulosa) hepático em 60-80% dos pacientes, causando hepatomegalia. Outros
e pruriginosa, que pode se tornar confluente e progredir para uma achados seriam nefrite e pneumonite intersticiais.
dermatite esfoliativa. Critérios para o diagnóstico da DRESS (pelo menos 3 critérios
As manifestações hematológicas típicas são eosinofilia e linfocitose presentes):
atípica.
1) Erupção cutânea à droga;
O edema de face, com acentuação periorbitária constitui um alerta ao
2) Anormalidades hematológicas: eosinofilia > 1.500/mm³ e/ou
diagnóstico e pode ser muito intenso.
presença de linfócitos atípicos;
3) Acometimento sistêmico: adenopatias (> 2 cm de diâmetro) e/ou
hepatite (elevação das transaminases em pelo menos 2x os valores
normais) e/ou nefrite intersticial e/ou pneumonite intersticial e/ou
cardite.

TRATAMENTO
Após a suspensão do medicamento envolvido, que é a principal Pode-se fazer uso de glicocorticoides sistêmicos (1 a 1,5 mg de
medida terapêutica a ser estabelecida, a melhora ocorre gradualmente prednisona), que deve ser mantido até controle absoluto da doença (4
dentro de 6 a 9 semanas. a 6 semanas). Em caso de piora do quadro, deve-se considerar o
pulso de corticoide ou uso de imunoglobulina.

REFERÊNCIAS
MEDCURSO. 2019
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 9

PSORÍASE A participação do infiltrado inflamatório de células T e células


dendríticas já está bem estabelecido, com predomínio da resposta
A psoríase é uma doença crônica hiperproliferativa inflamatória da Th1, mas recentemente foi constatada a participação também de
pele, relativamente comum, caracterizada pelo surgimento de pápulas células Th17 na patogênese da doença.
eritematoescamosas que confluem formando placas, de aspecto tão
A derme e a membrana sinovial contêm grande número de linfócitos
característico que geralmente não causa problemas para o diagnóstico
T CD4 ativados que secretam interferon-γ, TNF-α, fator transformador
→ em alguns casos, está associada a uma doença articular
de crescimento alfa (TGF-α) e IL-8 → o TGF-α promove a
soronegativa, a artrite psoriásica.
angiogênese e estimula a proliferação de queratinócitos e sinoviócitos,
- o eritema é a lesão primária e a escama é a lesão secundária, ambos aumentados na psoríase.
resultante da multiplicação acelerada de queratinócitos que se
- a interação entre queratinócitos, células de Langerhans e linfócitos
acumulam na superfície da pele.
T é fundamental para o desenvolvimento da doença, com liberação de
É caracterizada por hiperplasia epidérmica, ciclo evolutivo acelerado vários mediadores inflamatórios e fatores quimiotáticos para
dos queratinócitos e ativação imune inapropriada. recrutamento de neutrófilos e monócitos → entre eles, destacam-se
A prevalência da psoríase varia em torno de 2% da população. A os leucotrienos (explicando a exacerbação pelo uso de indometacina,
doença acomete igualmente ambos os sexos e aparece em qualquer um inibidor da COX-1 que levaria ao aumento da via da lipoxigenase).
idade (inclusive crianças), embora apresente dois picos de incidência: Outros eventos imunológicos são depósitos de imunoglobulinas e
entre 20-30 anos e após os 50 anos. frações do complemento na epiderme comprometida e a existência de
- quando ocorre antes dos 30 anos, tem pior prognóstico, estando anticorpos contra a camada córnea.
mais frequentemente associada ao HLA-Cw6 e a uma história familiar Na epiderme, o ciclo celular dos queratinócitos é mais rápido na
positiva para a doença. psoríase do que na pele normal, assim, há grande produção de
Existem fatores desencadeantes que podem exacerbar a psoríase: escamas (paraceratose) devido à presença de células epidérmicas
imaturas.
1) estresse emocional;
- estudos mostram que a velocidade de trânsito na psoríase é de 5
2) uso de álcool ou tabagismo; dias e de mitose de 100 horas, enquanto na pele normal,
3) alguns medicamentos, como betabloqueadores, antimaláricos, sais correspondem a 13 dias e 200 horas, respectivamente.
de lítio, indometacina e inibidores da ECA; A histopatologia é característica, tendo os seguintes achados:
4) infecções, como a infecção por S. pyogenes (psoríase gutata) e a 1) paraceratose (aparecimento de núcleo nas células da camada
infecção pelo HIV (forma generalizada de psoríase); córnea);
5) alterações metabólicas e endócrinas, como DM, tireoidopatias e 2) ausência da camada granulosa;
hipocalcemia);
3) acantose (espessamento da camada espinhosa);
6) fatores físicos, como trauma cutâneo (de qualquer tipo) e outras
dermatites, provocando o fenômeno de Koebner (ou fenômeno 4) atrofia das áreas suprapapilares;
isomórfico, onde um trauma em uma região de pele normal 5) papilomatose (projeção das papilas dérmicas sobre a epiderme);
desencadeia o surgimento de lesões do mesmo tipo das encontradas
(6) infiltrado inflamatório misto na derme papilar;
em outro local do corpo), e também o frio (regiões de maior latitude).
(7) acúmulo de neutrófilos dentro do estrato córneo (microabscesso
Por outro lado, a exposição solar parece ter efeito de melhora das
de Munro) e formando coleções na epiderme (pústula espongiforme
lesões, um benefício que pode ser explorado na terapia da doença.
de Kogoj), esta última envolvida na psoríase pustulosa.

PATOGENIA E HISTOPATOLOGIA
A etiopatogenia ainda não é completamente conhecida, mas aceita-se
uma predisposição genética, com herança multigênica, mas que
requer fatores ambientais para sua expressão → se um dos
progenitores tem psoríase, a chance de aparecer a doença no
descendente é de 8%; se os dois pais têm psoríase, a chance eleva-
se para 40%.
Existe uma correlação da forma cutânea vulgar (mais comum) com os
antígenos HLA-Cw6, B13 e B17, enquanto as formas artropática e
pustulosa estão mais relacionadas ao HLA-B27 (importante marcador
genético das espondiloartropatias soronegativas).
A psoríase é uma doença que cursa com atividade inflamatória da
derme papilar (justificando o eritema) e hiperproliferação da epiderme
(justificando espessamento e descamação).

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A evolução é crônica, com períodos de exacerbação e remissão,


quando podem ser observadas lesões anulares, característica da
As lesões típicas são placas eritematoescamosas, bem delimitadas remissão do quadro clínico.
(envoltas por pele normal), de tamanhos variados e, geralmente,
A psoríase se apresenta em várias formas clínicas, podendo ser
simétricas (podem existir casos de lesão única e isolada) → as
distinguidas em: forma vulgar, forma invertida, forma gutata, forma
escamas são grandes e de tonalidade prateada (escamas
eritrodérmica, forma pustulosa, forma ungueal, entre outras.
psoriasiformes).
- algumas lesões de psoríase apresentam um halo hipocrômico ao
redor das lesões conhecido como halo de Woronoff. PSORÍASE VULGAR (OU EM PLACAS)
É a forma mais comum e uma das mais benignas.
Caracteriza-se pelas lesões típicas da psoríase, com placas
eritematoinfiltradas bem delimitadas, com escamas secas, branco-
prateadas e aderentes → as lesões tendem a ser simetricamente
distribuídas.

Na maioria das vezes, as lesões são assintomáticas, embora uma


minoria de pacientes refira prurido e sensação de queimação,
especialmente nas lesões palmoplantares e intertriginosas,
relacionados com o estado emocional.
Em relação à distribuição, tamanho e morfologia das lesões, podemos
encontrar: psoríase vulgar (forma mais comum, com as lesões típicas)
e as formas variantes de psoríase numular (forma de moeda), girata
(circinada), anular, entre outras.
Os locais mais frequentes são: face extensora dos membros
(sobretudo cotovelos e joelhos), tronco, região sacra e couro
cabeludo; há casos com localização nas áreas de flexão (psoríase
invertida).
O sinal de Auspitz (sinal do orvalho sanguíneo) é característico e
utilizado como auxílio no diagnóstico clínico da psoríase: após
curetagem e remoção mecânica das escamas,
brotam depois de alguns segundos gotas de
sangue da lesão → este processo é
denominado curetagem metódica de Brocq;
num a primeira etapa há o destacamento das Os locais mais frequentes são, por ordem decrescente: couro
escamas esbranquiçadas (sinal da vela) e cabeludo, com placas bem delimitadas e seus bordos aparecem nos
posteriormente observa-se o aparecimento de limites do escalpo e na região retroauricular, face extensora dos
uma membrana opaca translúcida chamada cotovelos e flexora dos joelhos, região lombossacral, periumbilical no
(membrana de Duncan). tronco, pavilhão auricular e dorso das mãos.
O fenômeno de Koebner é característico da psoríase e do líquen plano Uma vez instaladas, as lesões tendem a seguir um curso crônico e
→ é caracterizado pelo surgimento de uma lesão típica da doença em flutuante, ocorrendo períodos de remissão em cerca de 30% dos
áreas de trauma cutâneo (abrasões, incisões, queimaduras, casos, seguidos por períodos de exacerbação, de intervalo variável e
contusões, escoriações, raspagem, depilação, tatuagens, fricção, fita imprevisível.
adesiva etc.), irritantes químicos e outras dermatites.
PSORÍASE VULGAR GENERALIZADA : as placas são de tamanho maior e
acometem diversas áreas do corpo, incluindo couro cabeludo, tronco
e membros.
PSORÍASE GIRATA E ANULAR : na psoríase girata, as placas são
confluentes e circinadas; na psoríase anular, as placas apresentam
clareamento central e parecem mapas geográficos.

Fenômeno de Koebner (após retirada de um adesivo)

Lesões de mucosas são raras, mas podem ocorrer queilite, glossite,


língua geográfica e fissurada que, inclusive, se associam
frequentemente, blefarite, conjuntivite e ceratite.

Psoríase vulgar generalizada Psoríase anular

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

PSORÍASE INVERTIDA Faz diagnóstico diferencial com outras causas de eritrodermia difusa,
como farmacodermias, dermatite atópica e micose fungoide com
Placas eritematosas crônicas com pouca ou nenhuma descamação, síndrome de Sézary.
localizadas nas regiões intertriginosas/de flexura (axilas, região
inguinal, genitália, pescoço). Costumam ser pruriginosas.
Ocorre com frequência em pacientes infectados pelo HIV e
melanodérmicos.

PSORÍASE PUSTULOSA GENERALIZADA


Também chamada de psoríase pustulosa de von Zumbusch, é uma
PSORÍASE GUTATA ( OU EM GOTAS, ERUPTIVA) forma de evolução hiperaguda e episódica, associada a sinais e
É uma forma benigna de início abrupto, com lesões arredondadas sintomas sistêmicos.
pequenas (0,5 a 1 cm) esparsas, predominando no tronco superior e - o principal fator desencadeante é a
extremidades proximais. suspensão abrupta de corticosteroides
Frequentemente acomete crianças ou adultos jovens semanas após sistêmicos, usados (erradamente) para
uma infecção estreptocóccica do trato respiratório superior. tratar outras formas de psoríase ou
qualquer outra doença; pode também
Em alguns casos, a infecção pode resolver espontaneamente após ocorrer seguindo uma farmacodermia
meses de evolução, porém, em outros casos as lesões podem exantematosa.
persistir, aumentar de tamanho, tomando as características de
psoríase em placas. Tem o início súbito, com febre alta, mal-
estar, fraqueza, leucocitose neutrofílica,
aumento do VHS e hipocalcemia.
A erupção pustulosa generalizada aparece
logo após a febre e vem em surtos que
duram vários dias.
- as pústulas são múltiplas, pequenas (2-
3 mm), com halo eritematoso e se distribuem simetricamente pelo
tronco e extremidades proximais → as placas eritematosas tendem à
confluência, gerando grandes áreas de eritema contendo as pústulas.
PSORÍASE ERITRODÉRMICA Essa forma clínica demanda pronta intervenção e internação hospitalar
devido aos altos índices de complicações → há casos registrados de
É uma forma generalizada de psoríase que se manifesta com eritema
fatalidade.
intenso e descamação discreta por quase todo o tegumento corporal
(> 80%), com alterações na termorregulação (hipotermia pela A psoríase pustulosa disseminada na gravidez é conhecida como
vasodilatação generalizada que leva à perda de calor), hemodinâmica impetigo herpetiforme → provoca febre, comprometimento geral
e no equilíbrio hidroeletrolítico e proteico. intenso e hipocalcemia, podendo causar abortamento.
- nessa forma clínica, a atividade do processo psoriático é intensa,
com proliferação aumentada e perda da manutenção das células
epidérmicas, levando à produção de queratinas anormais → assim, a
descamação é discreta e predomina o eritema.
- a função de barreira da pele está comprometida, podendo ocorrer
bacteremia e septicemia, além do aumento de perda de água
transepidérmica.
Em geral, a forma eritrodérmica é secundária (ocorre no curso
evolutivo da doença) e costuma ser desencadeada por tratamentos
impróprios ou pela retirada do corticosteroide (efeito rebote).

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

PSORÍASE PUSTULOSA LOCALIZADA ARTRITE PSORIÁSICA


Compreende três formas: A lesão articular ocorre em 5-20% dos pacientes com psoríase
(geralmente naqueles com lesões cutâneas disseminadas), sendo
- uma com lesão única ou algumas lesões com pústulas que, em geral,
caracterizada por uma artropatia crônica inflamatória soronegativa
não evolui para a forma generalizada;
(fator reumatoide negativo), relacionada ao HLA-B27 (espondilite e
- outra subforma com lesões nas extremidades dos dedos das mãos sacroileíte) e HLA-B37 e B38 (artrite periférica).
e/ou tornozelos conhecida como acrodermatite supurativa de
- afeta igualmente ambos os sexos, com pico de incidência entre os
Hallopeau;
20-40 anos.
- uma terceira subforma pustulosa palmoplantar ou pustulosa
As lesões de pele antecedem em 70% das vezes o acometimento
abacteriana.
articular, em 20% dos casos são concomitantes e raramente (10%) o
Manifesta-se por áreas bem definidas de eritema, descamação e acometimento articular pode preceder as lesões cutâneas por tempo
pústulas, geralmente bilaterais e simétricas nas palmas e/ou cavos variado.
plantares.
Os pacientes podem apresentar, no início, apenas queixas dolorosas
articulares, difusas, mal caracterizadas e com caráter migratório,
acometendo principalmente mãos, pés e joelhos; outras vezes, as
queixas são talalgias (dores no calcanhar), algias vertebrais ou da
articulação escapuloumeral. Existem ainda mialgias, radiculalgias e
parestesias precedendo o quadro articular característico.
Sinais de inflamação podem ser detectados, como: rigidez matinal,
febre, perda de peso, fadiga e anemia.
PSORÍASE UNGUEAL O acometimento articular pode ser agudo ou insidioso, mono, oligo
As unhas estão comprometidas em 35-50% dos casos, sendo uma ou poliarticular.
importante característica da doença → geralmente, o paciente também A artrite foi classificada por Moll e Wright em 5 subtipos:
possui lesões cutâneas da psoríase, embora existam casos de
envolvimento ungueal isolado. - comprometimento das articulações interfalangianas (especialmente
da interfalangiana distal) representa a manifestação mais típica da
O comprometimento pode ser de uma, poucas ou todas as unhas. As doença, mas ocorre em apenas 5% dos casos;
principais alterações ungueais da psoríase são:
- forma oligo/poliarticular assimétrica é observada em 70% dos casos,
1) depressões puntiformes (pittings ungueais); acometendo joelhos, tornozelos, punhos e pequenas articulações das
2) manchas amarelas abaixo da lâmina ungueal; mãos e dos pés;
3) descolamento da lâmina ungueal; - a apresentação axial ou espondilite (5%), acompanhada ou não de
artrite periférica, acomete a coluna vertebral com
4) fissuras longitudinais;
pseudossindesmófitos grandes e assimétricos, que são as
5) ceratose subungueal; calcificações paravertebrais;
6) onicodistrofia grave. - alguns pacientes (15%) apresentam quadro de poliartrite simétrica
Há casos também de perda ungueal (anoníquia), especialmente nas indistinguível da AR, com deformidades similares àquelas da não
formas pustulosas. reumatoide;
- a artrite erosiva/mutilante, observada em apenas 5% dos casos,
apresenta lesões osteolíticas e anquilose, que podem ser
acompanhadas de espondilite e sacroileíte → homens são os mais
afetados e a progressão é rápida, com aparecimento de deformidades
em poucos meses.
Pode ocorrer comprometimento extra-articular como entesopatia
caracterizada pelo acúmulo de linfócitos e monócitos no local de
Pitting e coloração amarelada inserção do tendão ou do ligamento, com consequente erosão e
formação de osso novo reativo que resulta em esporões e periostite.
PSORÍASE CERATODÉRMICA (CERATODERMA PALMOPLANTAR - o dedo “em salsicha” é resultado da inflamação das estruturas
PSORIÁSICO) periarticulares de um ou mais dígitos, mais frequente nas mãos e que
pode ser doloroso ou não.
O queratoderma palmar e/ou
plantar que surge em adultos é, em
geral, uma forma de psoríase
(pode ser a única manifestação da
doença ou fazer parte do quadro
clÍnico).
- pode atingir parcial ou
integralmente a palma e/ou planta
e tem nítida delimitação.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Em 2006, componentes do GRAPPA (Group of Research and O lúpus eritematoso cutâneo subagudo pode apresentar lesões
Assessment of Psoriasis and Psoriatic Arthritis) desenvolveram e psoriasiformes em áreas fotoexpostas e o exame histopatológico pode
validaram o CASPAR (Criteria Classification of Psoriatic Arthritis) que definir o diagnóstico.
tem sido amplamente usado, não diagnosticando apenas a artrite
A psoríase no couro cabeludo costuma se manifestar por placas bem
inicial:
delimitadas, o que as diferencia das lesões de dermatite seborreica →
Doença articular inflamatória e, pelo menos, 3 pontos nos critérios: a delimitação das lesões é também critério para diferenciar a dermatite
Psoríase cutânea atual 2 pontos seborreica da psoríase invertida.
História de psoríase 1 ponto A curetagem de Brocq geralmente permite diferenciar a psoríase em
História familiar de psoríase 1 ponto gotas da pitiríase liquenoide em que a descamação não é estratificada.
Dactilite 1 ponto
A psoríase eritrodérmica deve ser diferenciada das eritrodermias
Neoformação óssea justarticular 1 ponto
encontradas em pacientes atópicos, nas erupções medicamentosas e
Fator reumatoide negativo 1 ponto
nos linfomas → histopatologia pode ser necessária.
Distrofia ungueal 1 ponto

ESCORES
COMORBIDADES ASSOCIADAS À PSORÍASE
Com o intuito de escolher e avaliar protocolos de tratamento, foi criado
A inflamação crônica presente nas placas de psoríase está associada um instrumento para medir a gravidade e a extensão do
a aterosclerose, a maior ativação de plaquetas e a resistência periférica comprometimento cutâneo, o PASI (Psoriasis Area Severity lndex),
elevada à insulina. Tais fatos explicam a maior incidência de que avalia o grau de eritema, espessura e descamação com escores
obesidade, hipertensão, dislipidemia aterogênica e hiper- de rigor que variam de 0 a 4 e de extensão de 1 a 6.
homocisteinemia observada nos pacientes psoriásicos, que também
apresentam aumento do risco cardiovascular.
Por outro lado, do ponto de vista psicológico, pode-se interpretar a
associação da psoríase às comorbidades descritas como sendo tudo
fruto de um mesmo processo em que, com níveis variados, observa-
se depressão, perda da autoestima e “necessidade” de estar e/ou se
sentir adoentado.

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é baseado na clínica, pelo aspecto e distribuição das
lesões e, em geral, não requer complementação laboratorial.
- a curetagem metódica de Brocq possui grande valor semiológico.
O laboratório é inespecífico, com eventuais aumentos de ácido úrico
nas apresentações extensas e ativas e de VHS, α2-globulina e proteína
C reativa nas formas artropáticas.
- a leucocitose ocorre nas apresentações pustulosas extensas e,
sobretudo, agudas;
- a hipocalcemia é encontrada no impetigo herpetiforme.
Em casos de dúvidas, pode-se solicitar biópsia:
- no histopatológico, encontra-se alongamento das cristas epiteliais,
com afinamento na porção suprapapilar, papilas estão alargadas e TRATAMENTO
edemaciadas; na epiderme, ocorrem paraqueratose, desaparecimento
da camada granulosa e presença de agrupamentos de neutrófilos Não existe um tratamento definitivo da psoríase, sendo o seu objetivo
(microabscessos de Munro); podem ocorrer, particularmente na o controle clínico da doença, utilizando fármacos tópicos e/ou
psoríase pustulosa, cavidades contendo neutrófilos (pústulas sistêmicos com propriedades antiproliferativas e anti-inflamatórias
espongiformes de Kogoj). (para bloquear a proliferação exagerada dos queratinócitos e a ativação
linfocitária) → na maioria das vezes é necessário a associação de mais
de uma substância tópica e/ou sistêmica.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Como a psoríase é uma doença crônica, que pode durar muitos anos,
Algumas formas de eczema podem apresentar aspecto numular,
é importante avaliar o paciente de forma cuidadosa para fazer um bom
principalmente o eczema numular.
planejamento de tratamento, sendo que os esquemas terapêuticos
A pitiríase rósea de Gilbert, em regra, pode ser excluída pelos dois atuais incorporam regimes rotatórios de medicamentos, visando
tipos de lesões e pela evolução para a cura em 8 semanas. minimizar os riscos dos efeitos colaterais cumulativos → esse
A sífilis pode apresentar lesões psoriasiformes, porém a presença de planejamento irá depender não só do tipo da psoríase como também
outros achados, como adenopatia, placas mucosas e sorologia da extensão da doença cutânea e articular.
específica, confirmam a infecção sifilítica.

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Tomando como base a porcentagem de extensão (BSA – body surface - a principal indicação é na psoríase pustulosa generalizada, na qual
area), consideramos psoríase leve abaixo de 10% e grave acima de age rapidamente.
10% de área corporal acometida. Quando o parâmetro utilizado é o
- pode ser usado em combinação com PUVA (RePUVA);
PASI, os escores maiores que 10 classificam a psoríase em moderada
a grave. b) Metotrexato: trata-se de um agente citotóxico inibidor da síntese de
DNA por antagonismo da diidrofolato redutase. É feito na dose de 15
- a terapêutica será diferente também no caso de envolvimento
mg/semana (5 mg 12/12h por três tomadas).
sistêmico e/ou ocorrência de artrite nas suas diversas modalidades.
- a dose cumulativa do metotrexato deverá ser sempre calculada, já
que, a partir de 1,5 g, deverá ser considerada a realização de biópsia
TRATAMENTO TÓPICO hepática para prevenir a grave hepatotoxicidade (cirrose hepática).
É usado para as formas localizadas (psoríase leve a moderada). - outros efeitos adversos são: leucopenia, mucosite, intolerância
Várias são as opções (sob a forma de creme, pomada e xampu): gastrointestinal;
- corticoides tópicos (ex.: betametasona 0,05%) → deve-se prevenir c) Ciclosporina: imunossupressor que inibe a produção de IL-2 pelos
o uso exagerado, pois a longo prazo pode determinar atrofia da pele; linfócitos T. A dose inicial é de 2,5-3 mg/kg/dia.
- coaltar (alcatrão), em preparações 2-5% em vaselina ou óxido de - sua ação é mais rápida e efetiva em situações de eritrodermia, e
zinco 20%; pustulose.
- antralina (ditranol) 0,1-0,5% + ácido salicílico 1-2%, aplicado 1x/dia - pode ser usado no lugar do metotrexato em casos selecionados.
ou 1-3% em veículo aquoso, aplicar por 20-30min e retirar, 1x/dia - a função renal deve ser monitorizada e a droga suspensa se houver
(terapia de contato curto); aumento de mais de 50% da creatinina;
- calcipotriol (análogo da vitamina D) a 0,005% 1x/dia, devem ser d) Imunobiológicos: proteínas ligantes derivadas de células vivas que
evitados na face → atua diminuindo a proliferação e induzindo a objetivam bloquear moléculas/citocinas (TNF-alfa) da ativação
diferenciação terminal dos queratinócitos, além de modificarem a inflamatória mediadoras da resposta Th1, no caso da psoríase → são
resposta imune pela ligação aos receptores de vitamina D; utilizados nos casos resistentes ao tratamento convencional.
- tazaroteno (retinoide) em gel 0,1%. Os mais utilizados são os agentes biológicos inibidores do TNF-α:
No tratamento facial, podemos utilizar ainda tacrolimus ou etanercepte, infliximabe, adalimumabe, golimumabe e certolizumabe.
pimecrolimus como alternativa ou para poupar os corticoides. e) Apremilast: agente oral inibidor de fosfodiesterase tipo 4, capaz de
reduzir algumas citocinas envolvidas na patogênese da psoríase.
FOTOTERAPIA Devido ao fenômeno de rebote, os corticosteroides sistêmicos
raramente são usados → no entanto, apenas em situações de
É uma opção para a terapia da doença moderada a grave ou refratária
às medidas tópicas. A terapia tópica geralmente é necessária de forma emergência, em que não se tenha outro recurso, pode ser usada
adjuvante e para alívio sintomático. corticoterapia por tempo limitado, com o cuidado de, a seguir,
introduzir outro medicamento que possa sustentar a melhora obtida.
A fototerapia utiliza a aplicação da radiação ultravioleta nas lesões
psoriásicas. Existem dois métodos:
DERMATOVIROSES
1) PUVA (Psoraleno + UVA): consiste na aplicação de doses
progressivas (2-3x/semana) de radiação UVA, aplicadas após 2h da Os vírus são organismos intracelulares obrigatórios caracterizados por
ingestão do Metoxipsoraleno (MOP), substância fotossensibilizante. A apresentarem um só tipo de ácido nucleico (DNA ou RNA), sendo que
combinação do psoraleno com os raios UVA inibe a síntese do DNA os vírus de maior interesse para a dermatologia são os do grupo DNA.
da lesão, determinando progressiva regressão. Após cada aplicação,
Os vírus agem de maneira direta, alterando o metabolismo das células
é fundamental a proteção contra a luz solar por 24h, sendo necessário
parasitadas, sendo assim as infecções virais podem ser de três tipos:
também o uso de óculos escuros neste período.
- citolítica: vírus penetra na célula, se replica e provoca a morte celular
- além dos efeitos colaterais imediatos, geralmente leves, múltiplas
precoce, com liberação do vírus no fluido extracelular → por ex.,
sessões de PUVA podem aumentar o risco de envelhecimento cutâneo
herpes, varíola;
e carcinoma espinocelular da pele.
- infecção permanente: vírus quase não altera o metabolismo e
2) Método de Goeckerman (coaltar + UVB): uma pomada de coaltar é
multiplicação da célula, podendo ser lento ou rápido seu processo de
aplicada em todas as lesões e o paciente é submetido a doses diárias
replicação, sendo eliminado por brotamento da superfície da célula,
de UVB. Possui eficácia semelhante à PUVA.
podendo então penetrar em outra célula → por ex., HPV (verrugas);
- infecção integrada: o vírus, ou parte dele, se integra ao DNA celular,
TRATAMENTO SISTÊMICO mudando as características da célula infectada ou induzindo a
Indicada nos pacientes refratários ou com contraindicação à transformação neoplásica → por ex., vírus Epstein-Barr.
fototerapia e nos casos graves e extensos de psoríase (especialmente As infecções virais podem ser localizadas (verrugas, moluscos),
a psoríase eritrodérmica e forma pustulosa generalizada, bem como generalizadas (rubéola) ou inaparentes (herpes simples).
na forma artropática).
a) Acitretina: é um derivado do ácido transretinoico que substituiu o
etretinato na terapia da psoríase, por ter meia-vida mais curta e,
portanto, melhor risco de teratogenia em mulheres. A dose é de 0,5-
1,0 mg/kg/dia por 3-4 meses.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

papilomavirus humano
Predomina no dorso das mãos, dedos (região periungueal), pés e
joelhos de crianças.
Os “pontos vermelhos ou castanhos” são patognomônicos da verruga
O papilomavírus humano (HPV) é um vírus DNA medindo 45-55 nm,
vulgar, sendo mais facilmente visualizados pelo dermatoscópio →
da família dos papovavírus, que infecta células epiteliais da pele ou
representam alças capilares trombosadas das papilas dérmicas.
mucosas, constituindo o agente etiológico das verrugas.
Existem mais de 100 tipos de HPV, um grupo infectando a pele
(causando as verrugas) e o outro grupo a genitália (causando o
condiloma acuminado, neoplasia intraepitelial e carcinoma de colo
uterino, vulva, pênis e ânus).
As VERRUGAS são proliferações epiteliais na pele e mucosas,
causadas por diversos tipos de HPV.
As verrugas periungueais podem envolver o hiponíquio e o leito
A prevalência de verrugas é maior em crianças e adolescentes, com ungueal, levando à distrofia local da lâmina ungueal, constituindo
pico entre 12 e 16 anos de idade, sendo 70% verrugas vulgares, 24% problema de difícil terapêutica.
plantares e 3,5% planas, e, atualmente, existe uma incidência
ascendente das lesões genitais.
- estima-se que 30-50% dos adultos sexualmente ativos (20-40 anos)
estão infectados com o HPV → a maioria das displasias de colo de
útero e de cânceres está relacionada com o HPV oncogênico.
Há alta incidência de infecção por HPV em pessoas com depressão da
imunidade celular.
A transmissão ocorre por contato direto (interpessoal, sexual, parto)
ou indireto, especialmente em locais públicos, ou por autoinoculação
→ geralmente pequenos traumas são necessários para que ocorra a As verrugas dos açougueiros, causadas pelo HPV-7, bem como pelos
inoculação do HPV. O período de incubação é v ariável, sendo em HPV tipos 1 e 4 das verrugas vulgares, são encontradas nas mãos e
média de 3 meses. nos dedos de manipuladores de carne.
Dependendo do estado imune, as verrugas podem involuir
espontaneamente ou aumentar em número e tamanho. VERRUGA PLANTAR
Pelo efeito de pressão do corpo, as verrugas plantares têm
ETIOPATOGENIA crescimento endofítico, sendo pouco salientes → apresentam-se
como lesões planas com halo hiperceratórico, sendo conhecidas
O gênero do HPV de maior significado clínico é dividido em: popularmente como “olho de peixe”.
- tipos cutâneos → verrugas vulgar, plantar e palmar (tipos
1,2,27,57), verruga plana (3, 10), verruga do açougueiro (7).
- tipos mucosos, estes subdivididos em termos de evolução em baixo
risco oncogênico (tipos 6 e 11) e alto risco oncogênico (16 e 18).
No caso do acometimento cutâneo, a infecção ocorre nas camadas
mais superficiais da pele, ativando o crescimento anormal das células
da epiderme, de forma localizada, causando o surgimento da verruga,
Por causa da pressão, a proliferação epitelial penetra na derme,
que é uma pápula hiperceratósica.
tornando a lesão muito dolorosa, dificultando a deambulação, sendo
então denominada mirmécia (verruga plantar profunda).
FORMAS CLÍNICAS Frequentemente, as verrugas plantares desenvolvem-se mais em
superfície, formando placas hiperqueratóticas → são as verrugas em
As lesões clínicas resultantes das infecções por HPV podem ser
mosaico, menos dolorosas para a deambulação.
divididas em duas categorias:
1) Cutâneas: verrugas vulgares, filiformes, planas, plantares (tipos
mirmécia e mosaico), anogenital e papulose bowenoide;
2) Extracutâneas: ocorrem nas membranas mucosas e incluem
verruga vulgar oral, condiloma acuminado oral, hiperplasia epitelial
focal, papilomatose oral florida, papiloma nasal, papiloma conjuntival,
papilomatose laríngea e verrugas da cérvice.

VERRUGA VULGAR (OU COMUM)


É o tipo mais comum e mais clássico, constituindo uma lesão
papulovegetante hiperceratórica de tamanho variável, consistência
firme e superfície grosseira, podendo ser única ou múltipla.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

VERRUGA PLANA A aplicação de ácido acético (3 a 5%) nas mucosas vaginal e cervical
e no pênis revela lesões inaparentes por ganharem coloração
São pápulas planas de 1-5 mm, ligeiramente salientes (liquenoides), esbranquiçada.
de cor levemente amarelada (cor clara a castanho-escura), sendo
numerosas e predominando no dorso das mãos, no antebraço,
pescoço e na face.
- muitas vezes mostram-se em arranjo linear, pelo fenômeno
isomórfico.
Ocorrem principalmente em crianças e adolescentes, por isso a
denominação verruga plana juvenil.

CONDILOMA ACUMINADO GIGANTE (BUSCHKE-LOWENSTEIN)


É um condiloma de grandes dimensões, que pode obstruir a vulva ou
o ânus, causado geralmente pelos tipos 6 e 11 de HPV → ocorre pelo
crescimento exuberante das lesões, que formam massas vegetantes.
A gestação é um importante fator de risco, pois há estimulo ao
crescimento de verrugas e condilomas.
As verrugas planas em regressão mostram sinais clínicos de
O tratamento é feito com eletrocoagulação ou laser ablativo. Nos casos
inflamação e tornam-se pruriginosas, eritematosas e edematosas. Ao
mais extensos, o etretinato via oral pode ser benéfico, associado à
involuírem, halos despigmentados podem surgir ao redor das lesões.
terapia local.

VERRUGA FILIFORME
São elementos filiformes (semelhante a espículas) muito ceratósicos,
em geral isolados e pouco numerosos, saindo de forma perpendicular
ou oblíqua à pele.
Predominam na face (pálpebra, comissuras da boca) e pescoço.

PAPULOSE BOWENOIDE
A etiologia está relacionada com o HPV, sobretudo do tipo 16.
Caracteriza-se por múltiplas pápulas ou placas verrucosas,
hipercrômicas ou eritematoacastanhadas, em média com 4 mm de
diâmetro.
Localização preferencial na genitália externa, como pênis, vulva, região
VERRUGA GENI TAL (CONDILOMA ACUMINADO) perianal, períneo e, eventualmente, região inguinal de adultos jovens
A transmissão é sexual, sendo causada na maioria das vezes pelos sexualmente ativos.
tipos 6 e 11, de baixo risco oncogênico. Aproximadamente 80% das
pessoas sexualmente ativas serão portadoras do vírus em algum
momento de suas vidas.
A maioria dos indivíduos infectados e que elimina o vírus do
condiloma nas secreções genitais não apresenta lesões e não sabe
que está infectado. O vírus é altamente transmissível, passando para
2/3 dos contactantes e a melhor maneira de prevenir é reduzindo o
número de parceiros sexuais (que é o principal fator de risco).
O condiloma acuminado manifesta-se como lesões verrucosas
vegetantes, com aspecto de couve-flor, úmidas e róseas, com À patologia, observam-se alterações citológicas típicas da doença de
superfície aveludada, de tamanho variado, podendo ser isoladas ou Bowen (carcinoma espinocelular in situ, fase precoce e localizada),
agrupadas. com atipias celulares na epiderme, em arquitetura que lembra a do
condiloma acuminado.
- ocorrem na mucosa da glande, vulva, ânus e vagina, e ainda podem
acometer o ânus e região perianal. Evolutivamente, as lesões podem involuir espontaneamente, persistir
indefinidamente ou evoluir para doença de Bowen ou espinalioma.
Em geral são assintomáticas, mas podem ser pruriginosas, dolorosas,
friáveis ou sangrantes. Prevenção é feita, assim como nas demais ISTs, com o uso de
preservativo. Recorrências são frequentes.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

HIPERPLASIA EPITELIAL FOCAL (DOENÇA DE HECK) TRATAMENTO


Papilomas verrucosos, na mucosa oral e na orofaringe, são também Não há um fármaco antiviral específico para os HPV → existem
causados pelo HPV-13 e 32. diversas modalidades terapêuticas, em especial as que levam à
Apresentam-se como pápulas múltiplas, pequenas e confluentes nas destruição ou à remoção das lesões visíveis, ou à indução de
mucosas labial, bucal, gengival e lingual. citotoxicidade contra as células infectadas.
- a maioria das lesões tem a mesma cor da mucosa adjacente. Dentre os tratamentos tópicos para verruga vulgar, os fármacos mais
efetivos são as fórmulas contendo ácido salicílico e alguma eficácia do
dinitroclorobenzeno. Na avaliação dos tratamentos das verrugas
genitais, alguns são mais ou menos satisfatórios, com índices de
recorrência de 30 a 70% em 6 meses.
Tanto a imunidade humoral como a celular estão envolvidas na reação
aos HPV, e os vírus encontram-se protegidos das reações imunes no
interior das células epiteliais; a infecção, por sua vez, não lisa a célula
epitelial, tornando-se imperativo despertar essas reações. Assim, o
tratamento deve fundamentar-se em provocar uma reação inflamatória
local que induziria a uma resposta imune específica ao vírus por meio
EPIDERMODISPLASIA VERRUCIFORME (LUTZ-LEWANDOWSKI) da produção de citocinas.
Clinicamente, a epidermodisplasia verruciforme (EV) lembra a verruga
plana e, por vezes, a pitiríase versicolor, mas as lesões são em maior PODOFILINA
número, têm início na infância ou na 2ª ou 3ª décadas de vida, e são Trata-se de uma resina vegetal extremamente eficaz em lesões
de ocorrência familial → é causada por alguns tipos de HPV em recentes e localizadas em mucosa ou semimucosa (condiloma), não
indivíduos com deficiência na imunidade celular. tendo efeito sobre lesões da pele (verruga).
Pode apresentar-se como máculas hipocrômicas, hiperpigmentadas Aplica-se na lesão, removendo-se 4h após, com intervalo de, pelo
ou eritematosas, em geral planas → as lesões tendem a ser menos, 5 dias entre cada aplicação. Mesmo após o desaparecimento
persistentes, refratárias e disseminadas. das lesões, convém repetir a aplicação pelo menos mais uma vez. É
- poupam o couro cabeludo, palmas, plantas e mucosas. empregada a 10 a 30% em solução.
É contraindicada a aplicação em gestantes por possibilitar
abortamento, prematuridade e morte fetal.

PODOFILOTOXINA
Em solução alcoólica ou creme a 0,5%, aplicada 2 vezes/dia durante
3 dias na semana, por até 4 semanas. Por ser menos irritante que a
podofilina, pode ser utilizada pelo paciente em casa. Não contém
quarcetin, motivo pelo qual não provoca alterações displásicas.
Não está estabelecida sua segurança na gravidez. Apresenta índices
de clareamento de 80%.

IMIQUIMODE

Acredita-se ser uma doença multifatorial em que o agente viral, em Promove ação imunomoduladora, ativando a imunidade inata e a
especial o HPV-5, soma-se à predisposição genética e imunológica e celular (Th1) pela indução das citocinas pró-inflamatórias, como INF-
a fatores ambientais, como o sol, levando à expressão clínica da α, TNF-α e as IL-1, IL-6, IL-8 e IL-12. Além disso, induz a apoptose
doença. e ativa os linfócitos B, potencializando a resposta imunológica contra
as células alteradas pelo HPV. Desta forma, o imiquimode não destrói
Especialmente nas lesões das áreas expostas, pode-se processar a as lesões, mas induz a secreção local de citocinas, que contribuem
transformação maligna, como o carcinoma in situ, quando causada para a eliminação das lesões.
pelo HPV-5, pois este apresenta elevado potencial oncogênico.
- ao mesmo tempo, mantendo a imunidade favorável, as taxas de
Os cânceres são múltiplos, e surgem a partir da 3ª à 4ª década da recorrência com este medicamento são menores do que com a
vida. podofilotoxina.
- nos pacientes com a imunidade preservada, raramente ocorrem Na apresentação em creme a 5%, pode ser aplicado 3 vezes/semana
metástases, a menos que sejam tratados com irradiação, o que torna até o máximo de 16 semanas. É removido com água após 6 a 10 h.
as lesões bem mais agressivas.
Efeitos colaterais: eritema, prurido e queimação, na maioria das vezes
Com a maior sobrevida de pacientes imunodeprimidos, em especial suportáveis.
com AIDS, tem sido descrita uma forma da doença denominada
epidermodisplasia verruciforme adquirida (epidermodisplasia Não está estabelecida a sua segurança na gravidez. O seu preço é fator
verruciforme-like) de comportamento similar à doença genética, limitante de uso.
porém os pacientes apresentam maior susceptibilidade a desenvolver Usado em: verrugas vulgares, plantares (lesões resistentes), e nos
carcinoma espinocelular (CEC). condilomas acuminados.

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

ÁCIDO TRICLOROACÉTICO
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Por ser extremamente cáustico, o ácido tricloroacético (TCA) deve ser
empregado com muito cuidado, em concentrações que variam de 30 As lesões dermatológicas encontradas são pápulas semiesféricas com
a 70%, a cada 5 a 7 dias. umbilicação central (leve depressão), medindo aproximadamente 0,5
cm, geralmente agrupadas e sem base eritematosa, com cor de cera.
É aplicado diretamente nas lesões e está indicado nos casos não Na maioria dos casos, é assintomática, exceto se infectada, quando
responsivos à podofilina, sendo empregado principalmente para pode ser dolorosa.
verrugas do pênis.
- geralmente se localizam na face, tronco, membros e genitália (mais
Não é contraindicado na gravidez. Nas lesões ceratóticas não comum nos adultos).
responsivas à podofilina, pode-se aplicar TCA para então utilizá-la.
Elas disseminam-se pelo toque, por autoinoculação, e pelo ato de
CRIOTERAPIA COM NITROGÊNIO LÍQUIDO coçar, ou após o barbear/depilação, e podem resultar em uma
distribuição linear das lesões.
É indicada para lesões genitais maiores, em especial nas lesões da
uretra, vaginais e perineais, tanto em adultos como em crianças.
Trata-se de um método eficaz que consiste na destruição das lesões
por meio de congelamento → é bastante doloroso.
Mostra índice de clareamento de 50 a 80% e recorrência de 20 a 30%
e, após 6 meses de seguimento, 70%.
Pode ser usado em todos os tipos de lesões.

CIRURGIA E ELETROCIRURGIA
Em pacientes imunodeprimidos (Aids), pode-se encontrar lesões
Está indicada apenas nos casos de lesões gigantes não responsivas a
maiores e mais numerosas.
terapêuticas prévias, ou quando houver suspeita de transformação
maligna. As lesões persistem por meses ou anos e acabam por desaparecer;
podem involuir precocemente pela instalação de hipersensibilidade
Nunca fazer cirurgia com exérese e sutura nas verrugas vulgar e
celular, o que se expressa clinicamente por eritema, descamação,
plantar (causa disseminação local do vírus).
infiltração e, por vezes, prurido.
A exérese está indicada nas verrugas filiformes.
Existem duas micoses profundas, histoplasmose e criptococose, que
A eletrocoagulação com curetagem pode ser feita nas verrugas podem se expressar clinicamente com lesões semelhantes ao
vulgares (tratamento eletivo), periungueais, planas e no condiloma molusco nos pacientes com Aids.
acuminado gigante (indicação eletiva).

DIAGNÓSTICO
VACINAÇÃO
O diagnóstico é clinico, mas pode-se realizar a avaliação histológica
Indicada para prevenção de infecção e, consequentemente, dos que revela a inclusão de grandes corpos intracitoplasmáticos nos
cânceres cervical, vulvar e anal. queratinócitos epidérmicos (corpos de Henderson-Patterson –
Uma das vacinas, é uma vacina recombinante quadrivalente (HPV-6, material viral eosinofílico ocupando o citoplasma e deslocando o
11 – cepas mais frequentes; 16 e 18 – cepas mais oncogênicas), para núcleo dos queratinócitos para a periferia).
uso intramuscular em duas doses (0 e 6 meses).
A indicação atual é para meninas de 9 a 14 anos e meninos de 11 a TRATAMENTO
14 anos. Para os infectados por HIV, a faixa etária é de 9 a 26 anos,
CURETAGEM : é o melhor método, onde as pequenas pápulas podem ser
em três doses (0, 2 e 6 meses).
rapidamente removidas com uma cureta, com ou sem anestesia local
De acordo com a Anvisa, a vacina quadrivalente é aprovada para → o sangramento é controlado com pressão com gaze ou uma
mulheres entre 9 a 45 anos e homens entre 9 a 26 anos; enquanto a solução de Monsel.
bivalente é aprovada para mulheres entre 10 a 25 anos.
A curetagem é útil quando há poucas lesões, pois fornece o tratamento
mais rápido. A lidocaína/prilocaína creme (EMLA) aplicada 30-60min

Molusco contagioso
antes do tratamento ajuda a evitar a dor de curetagem.
É necessário o retorno a cada 2 semanas para tratar possíveis lesões
Causado pelo maior vírus já encontrado, mede cerca de 300 nm → que apareçam posteriormente.
este vírus é do tipo DNA que pertence ao grupo Poxvírus, em especial
ao subgrupo Parapoxvírus. O vírus do molusco contagioso (MCV) CRIOCIRURGIA : é o tratamento de escolha para os pacientes que não se
apresenta 4 subtipos distintos, sendo o MCV1 o mais prevalente e o opõem à dor. A pápula é pulverizada ou tocada levemente com um
MCV2 o mais frequente em adultos. cotonete molhado em nitrogênio até que a borda congelada, branca,
que está avançando, progrida até o lado da pápula, formando um halo
Acomete a pele humana e é transmitido pelo contato próximo de 1 mm na pele normal, circundando a lesão. Isso deve levar 5
interpessoal, sendo mais comum em crianças e adolescentes. segundos.
Também ocorre em adultos, normalmente transmitido por via sexual, Uma abordagem conservadora é necessária, porque o congelamento
especialmente em pacientes imunocomprometidos. excessivo produz hipopigmentação ou hiperpigmentação.

10
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

HIDRÓXIDO DE POTÁSSIO : empregado a 5 ou 10%. Aplicar nas lesões IMIQUIMODE : uso eventual em casos resistentes e recidivantes,
diariamente, suspendendo quando surgir irritação. Eficiente, simples particularmente em imunodeprimidos. Aplicação por várias semanas.
e econômico, indicado em lesões numerosas e recidivantes.

REFERÊNCIAS
MEDCURSO. 2019
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
WOLFF. Dermatologia de Fitzpatrick. 7 ed. 2014

11
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

problema 10

CARCINOGÊNESE Os raios UV são do tipo A (320 a 400 nm – penetra até a derme e é


constante durante o dia, sendo responsável pelas lesões de
Os principais fatores carcinogênicos são: fotoenvelhecimento), B (290 a 320 nm – mais carcinogênico, presente
- físicos: raios ultravioletas (especialmente na faixa de 290 a 320 nm principalmente entre 10-16h, acomete camadas mais superficiais da
– RUV-B), radiação ionizante, calor e traumatismo; pele e causa as queimaduras solares) e C (200 a 290 nm); os últimos
não atravessam a ionosfera, de modo que apenas o A e o B atingem
- químicos: alcatrão e seus derivados, arsênico, entre outros; a pele do homem, provocando alterações benéficas e maléficas.
- biológicos: vírus e hormônios. O tipo de alteração desencadeada pela RUV depende de 2 fatores:
De forma isolada ou concomitantemente, esses fatores agem sobre a - a intensidade da radiação é dada pela região geográfica (depende da
epiderme e/ou a derme, provocando alterações iniciais (bioquímicas latitude – quanto menor a latitude, maior a incidência de câncer
e ultraestruturais) que podem regredir ou prosseguir para a fase cutâneo); pela exposição de áreas do corpo, de acordo com os hábitos
proliferativa/neoplásica. culturais e de vestimenta; e pela profissão (marinheiros, lavradores).
Alguns conceitos fundamentais: - em relação à cor da pele, de acordo com sua sensibilidade e resposta
INICIAÇÃO : é o primeiro estágio da indução ao câncer, ocorre quando quando exposta à radiação solar, a pele pode ser classificada em 6
determinado agente é capaz de gerar alterações permanentes no fototipos de Fitzpatrick:
genoma da célula e de sua progênie → exemplos: hidrocarbonetos Fototipos Características
aromáticos policíclicos, agentes alquilantes, aminas aromáticas,
Pele branca que sempre queima, nunca bronzeia e é
ultravioleta (UV) etc. Fototipo I
muito sensível ao sol
PROMOÇÃO : deve ocorrer após a iniciação e o agente deve ser aplicado Pele branca que sempre queima, bronzeia muito
repetidas vezes, causando alterações reversíveis como inflamação, Fototipo II
pouco e é sensível ao sol
irritação, hiperplasia → exemplos: óleo de cróton, antralina, UV etc.
Pele morena clara que queima e bronzeia
PROGRESSÃO : é quando um câncer sofre modificações que podem
Fototipo III
moderadamente e possui sensibilidade normal ao sol
torna-lo cada vez mais agressivo e maligno, dependendo das Pele morena moderada que queima pouco, sempre
mutações sucessivas nas células. Fototipo IV
bronzeia e possui sensibilidade normal ao sol
- o câncer é formado por células heterogêneas e, com o tempo, Pele morena escura que queima raramente, sempre
surgem novas populações celulares diferentes dentro da mesma Fototipo V
bronzeia e é pouco sensível ao sol
massa neoplásica → as células que adquirem propriedades mais Pele negra que nunca queima e nunca bronzeia,
vantajosas se expandem e passam a ser a população predominante. Fototipo VI
porque é totalmente pigmentada e é insensível ao sol
CARCINÓGENO COMPLETO : seria o agente capaz de iniciar e promover
desenvolvimento do tumor → por ex., a radiação ultravioleta (RUV).
COCARCINOGÊNESE : quando houver efeito aditivo e, às vezes, sinérgico
entre dois agentes, sendo pelo menos um deles necessariamente
carcinógeno, o outro poderia atuar aumentando a suscetibilidade da
As lesões pré-cancerosas mais frequentes são as ceratoses (actínica,
célula-alvo ou modificando a cinética do carcinógeno → exemplo é a
alcatrão, arsênico) → as ceratoses actínicas, assim como os
combinação de UV e mostarda nitrogenada no tratamento da micose
carcinomas e melanomas, localizam-se preferencialmente nas áreas
fungoide.
expostas ao sol (face, pescoço, mãos e brancos).
PROTONCOGENES : são os genes normais relacionados ao crescimento e
- em locais de baixa latitude (Austrália, África do Sul), a incidência de
diferenciação celular → quando sofrem algum tipo de mutação,
câncer cutâneo é elevada, já em relação à cor da pele,
tornam-se tumorigênicos, sendo chamados de oncogenes
independentemente da latitude, sabe-se que, no negro, a incidência
(contribuem para o desenvolvimento do câncer).
de ceratose actínica, carcinomas e melanomas é muito menor do que
GENES SUPRESSORES : atuam modulando o crescimento celular com nos indivíduos de pele branca.
mecanismos que regulam a proliferação e diferenciação celulares, a
A frequência de carcinoma geralmente é maior entre os homens pela
estabilidade genômica e a apoptose → o gene supressor mais
duração da exposição solar (associado à profissão), mas em regiões
conhecido é o p53 que, caso sofra mutação, possibilita o crescimento
onde ambos os sexos se expõem igualmente ao sol,a diferença é nula.
celular desordenado.
O efeito cancerígeno da radiação solar sobre a pele é cumulativo, ou
seja, vai ocorrendo de forma progressiva ao longo do tempo, o que
MECANISMOS DESENCADEADORES DA CARCINOGÊNESE justifica (em partes) a maior frequência de carcinomas nas últimas
décadas de vida.
A RUV é o principal carcinógeno para a pele e age de duas maneiras:
Os vírus ou suas partículas, ao se integrarem ao DNA da célula,
1) gerando dímeros de timina (iniciação);
ajudam a causar alterações cromossômicas (deleções, translocações,
2) causa imunodepressão ao depletar células de Langerhans da etc.), fazendo com que as células sofram transformação neoplásica de
epiderme e estimula o aparecimento de clones de linfócitos maneira mais rápida e intensa → está bem estabelecido o potencial
supressores (promoção), facilitando o crescimento tumoral. oncogênico do HPV na gênese do CEC.

1
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

CAMPOS DE CANCERIZAÇÃO : situação em que paciente que apresenta


neoplasia tem maior probabilidade de desenvolver outra neoplasia
primária ou recorrência da mesma devido ao comprometimento do
tecido peritumoral. A explicação seria que as células contíguas ou
próximas apresentariam alterações genéticas (mutações) ou displasias
semelhantes, porém menos intensas, do que as do próprio tumor, já
que goram submetidas às mesmas agressões → por ex., é o que
ocorre em idosos calvos de longa duração.

DERMATOSES PRÉ-CANCEROSAS
As dermatoses pré-cancerosas são aquelas que, adquiridas ou
genéticas, podem evoluir para um verdadeiro câncer cutâneo (mais de
10-20% sofrem transformação) ou já constituírem um câncer de pele
em estágio inicial → os limites entre dermatose pré-cancerosa e
câncer cutâneo nem sempre são precisos.
Não existe um quadro clínico peculiar, os achados clinicopatológicos
são extremamente variados e polimorfos.
Existe uma gama de cancerização, que varia de:
- afecções cancerizáveis, como as cicatrizes, especialmente as
decorrentes de úlceras onde a evolução maligna é relativamente pouco
comum e no seu aspecto histopatológico há ausência de atipias
celulares;
- estados cancerígenos, correspondem ao meio do espectro, já que
apresentam certo grau de anaplasia celular e frequentemente se
transformam em verdadeiros cânceres, desde que sejam mantidos os A histopatologia da lesão mostra hiperqueratose e paraqueratose, com
estímulos cancerígenos → por ex., ceratoses actínicas e tóxica áreas de atrofia e acantose na camada malpighiana → as células
(coaltar e arsênico); malpighianas mais profundas apresentam atipias com disposição
desordenada, porém com a camada basal intacta.
- dermatoses blastoides, constituem o outro extremo do espectro,
com características histopatológicas da malignidade e que terminam, Na ceratose actínica que há exagerada produção de camada córnea,
quase sempre, em quadros invasivos e metastizantes → ex.: doenças aparece clinicamente o corno cutâneo → não é especifico, pois outras
de Bowen (carcinoma in situ), onde as células neoplásicas não patologias também se expressam clinicamente dessa forma, como
ultrapassam o epitélio. nevos verrucosos, verruga viral, ceratose seborreica e carcinoma
espinocelular → deve-se realizar a retirada e exame histopatológico.

Ceratose actinica
É a lesão pré-maligna mais comum, também conhecida como ceratose
solar ou inadequadamente, ceratose senil, visto que não é um sinal de
velhice, mas sim uma manifestação da irradiação solar cumulativa,
progressiva, persistente e duradoura que leva à proliferação de
queratinócitos aberrantes, por isso, sua localização preferencial é nas
áreas expostas (face, lábio inferior, pescoço e membros superiores ou
couro cabeludo em indivíduos calvos).

TRATAMENTO
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O tratamento é feito preferencialmente por destruição mecânica quer
São lesões maculopapulosas, múltiplas e pequenas, discretamente seja pela eletrodessecação, pelo nitrogênio líquido ou pela aplicação
salientes, de coloração acastanhada e superfície rugosa/áspera, de ácido (ácido tricloroacético 50 a 90%).
podendo ser recoberta por escamas secas e aderentes (ao serem
Quando em grande quantidade de lesões, o uso de substâncias
destacadas, podem ocasionar pequenas hemorragias) e crostas →
químicas fica melhor indicado, como o masoprocol a 10% em creme,
essas lesões podem confluir, formando placas.
embora cause eczema de contato em cerca de 10% dos pacientes,
O curso da lesão é crônico e o aparecimento de halo eritematoso, parece ter melhor tolerabilidade do que a 5-fluorouracila.
mesmo nas lesões pequenas, e a infiltração na base podem indicar
transformação carcinomatosa → esse tipo de lesão tem potencial O uso de 5-fluorouracila tópico serve tanto para o tratamento como
risco de transformação em carcinoma espinocelular (CEC), com baixo para revelar o início de algumas ceratoses ainda não clinicamente
risco de metástase. visíveis → isso ocorre pela substância ter predileção por células em
mitose, originando, nessas áreas, certo grau de eritema inflamatório,
As lesões iniciais da ceratose actínica podem estar associadas a lesões geralmente intenso, sendo justamente esse quadro inflamatoiro que
pigmentares também frequentes nas áreas expostas da pele de muitas vezes inviabiliza seu uso.
pessoas idosas, a melanose solar/actínica.

2
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Um tratamento bastante eficaz é a terapia fotodinâmica, que emprega Recentemente, a aplicação do gel de mebutato de ingenol (Picato®),
o ácido metilaminolevulínico 160 mg/g em creme e luz vermelha um indutor de morte celular, nas concentrações de 0,015% para
(comprimento entre 570 e 670 nm) → a aplicação é feita com uma lesões na face ou no couro cabeludo e 0,05% para
espessa camada e até por 5 mm da lesão, que deve ser coberta por tronco/extremidades, por 3 e 2 dias respectivamente, mostrou-se
material opaco. Aguarda-se por 3 h e a exposição dura cerca de 8 a 9 igualmente eficaz. Irritação local ocorre em mais de 90% dos casos,
min; as lesões muito ceratósicas devem ser curetadas previamente. incluindo em ordem decrescente eritema, descamação, formação de
Deve-se repetir, se necessário, em 3 meses. crosta, edema, vesiculação/pustulização, erosão, prurido e dor que
tem seus picos com 7 dias após o tratamento e podem persistir por
O diclofenaco de sódio a 3% em gel, 2 vezes/dia, por 60 a 90 dias,
cerca de 2 semanas.
também é uma alternativa válida.

Ceratoses toxicas
Têm praticamente as mesmas características das anteriores, com Surgem várias décadas após a ingestão crônica de arsênico → podem
diferenças de localização → as produzidas pelos hidrocarbonetos ser decorrentes de ingestão de água contaminada (certas regiões),
aromáticos localizam-se, sobretudo, nas áreas de contato da ingestão voluntária de solução de Fowler (remédio antigo para
substância, quer como medicamento (coaltar, antralina e outros), quer psoríase e tônico fortificante) ou outros preparados que contenham
como produto de manipulação industrial (derivados do petróleo). arsênico inorgânico e, mesmo, inalação (inseticida).
- são muito menos frequentes atualmente devido à prática responsável As ceratoses arsenicais têm o potencial de transformação em CEC in
de utilização dos EPI. situ ou invasivo.
As ceratoses arsenicais são múltiplas e puntiformes, com localização Polineuropatia simétrica, anemia, leucopenia, trombocitopenia,
preferencialmente palmoplantar. Outras manifestações clínicas são alopecia e alterações tipo acrodermatite e tromboangiite nas pernas
hipercromias com pequenas despigmentações em gota, podem ocorrer.
predominantemente em axilas, virilhas e mamilos.
O tratamento é o mesmo da ceratose actínica.
- pode estar associada a múltiplas lesões de CBC do tipo superficial e
da doença de Bowen.

3
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Radiodermite Leucoplasia
Decorre de aplicações de radioterapia com fins terapêuticos, de Caracteriza-se por placas brancas em mucosas, sobretudo na mucosa
exposição acidental ou mesmo de exposição profissional → em geral, oral → essas placas variam em número, são discretamente elevadas
é decorrente de múltiplas aplicações, e a lesão surge meses ou anos e não removíveis mecanicamente; outras vezes, o aspecto é salpicado
após as exposições (radiodermite crônica). e, até mesmo, variegado.
Clinicamente, a pele é xerótica e a área acometida apresenta-se - em alguns casos, tornam-se discretamente vegetantes, enquanto em
poiquilodérmica (atrófica com telangiectasias, hipo-hiperpigmentada), outros, tornam-se erosivas e/ou ulceradas (sinal de possível
podendo ter alguns pontos de ceratose e mesmo ulceração. malignização).
Não é infrequente o aparecimento de CEC, que tende a metastatizar Podem ser idiopáticas ou decorrentes de processos irritativos ou
precocemente. Quando a pele não está muito alterada, ou seja, traumáticos (dentaduras, corrente galvânica por metais diferentes em
aparentemente normal, em geral surge o CBC predominantemente do prótese dentária, fumo).
tipo superficial. É rara a transformação sarcomatosa. Em cerca de 10 a 30% dos casos, há transformação para CEC.
A retirada do agente causal quase sempre faz regredir a lesão; a
exérese cirúrgica é um bom recurso.
No diagnóstico diferencial, devem ser considerados líquen plano,
disceratose congênita, sífilis secundária, LES e candidíase.

ulceras cronicas e cicatriZes


Qualquer que seja a sua natureza (leishmaniose, queimadura, LES, Doenca de bowen
tuberculose luposa, úlcera angiodérmica), úlceras e cicatrizes antigas
podem, eventualmente, sofrer transformação para o CEC, o que É considerado um carcinoma espinocelular in situ (intraepidérmico),
constitui a chamada úlcera de Marjolin → reconhece-se essa que pode evoluir para a forma invasiva em 5% dos casos, sendo
transformação quando, na borda da úlcera ou em uma brida da cicatriz, geralmente mais agressivos do que os que surgem da ceratose
começa a surgir lesão vegetante, muitas vezes hemorrágica. actínica.
- nessa fase, deve-se considerar no diagnóstico diferencial, Caracteriza-se por lesão eritematoescamosa, geralmente única e
histologicamente, a hiperplasia pseudocarcinomatosa. achatada, com bordas bem delimitadas, porém irregulares, superfície
por vezes velvética ou exsudativa, pouco infiltrada, com crescimento
centrífugo lento.
- em cerca de 20% dos pacientes, as lesões são múltiplas.
- pode ter localização mucosa.

e
Em geral, são tumores com poucas atipias e bem diferenciados que
podem requerer múltiplas biópsias para um diagnóstico de certeza.
Ocorre mais em áreas fotoexpostas (cabeça, pescoço e pernas),
- a luz de Wood pode auxiliar no local a ser escolhido para biopsia, mostrando o papel da RUV, mas também pode ocorrer em áreas não
pois, eventualmente, gera fluorescência que lembra brasa no local da fotoexpostas, preferencialmente em pacientes acima dos 60 anos.
transformação.
- atualmente, em certos casos têm sido incriminados alguns tipos de
Nos casos advindos de queimadura, tem comportamento mais HPV.
agressivo.

4
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Por ser um CEC in situ, os achados na histopatologia incluem: CÂNCER DE PELE


hiperplasia epidérmica com paraceratose, células completamente
desordenadas com núcleos grandes e hipercromáticos (por vezes As neoplasias malignas da epiderme e seus anexos são subdivididas
multinucleadas), disceratose individual de queratinócitos atípicos, em: câncer de pele não melanoma (principalmente CBC e CEC) e
ocasionalmente ocorre vacuolização das células e denso infiltrado câncer de pele melanoma.
inflamatório mononuclear na derme.

Carcinoma Basocelular
Também chamado de epitelioma basocelular ou basalioma, é o mais
benigno dos tumores malignos de pele, pois constitui-se por células
que se assemelham às células não queratinizadas da camada basal da
epiderme → o crescimento é muito lento.
Pode ser considerado incapaz de originar metástases (melhor
prognóstico), sendo que os casos onde estas foram descritas são
exceções (< 1%), porém, possui malignidade local, sendo capaz de
invadir e destruir tecidos adjacentes, inclusive ossos.
É o câncer mais comum, correspondendo a cerca de 75% de todos
os tipos de câncer da pele, ocorrendo geralmente em indivíduos acima
O tratamento consiste na terapia tópica que deve ser guiada pelo dos 40 anos (especialmente idosos), com fatores predisponentes de
tamanho, localização da lesão e idade do paciente. exposição à luz solar e pele clara (é raro em pessoas negras).
- opções são semelhantes às para a ceratose actínica, como: excisão - a maior ocorrência em determinado sexo depende da população de
e sutura (preferencialmente), terapia fotodinâmica, imiquimod, 5- estudo;
fluorouracil, criocirurgia ou eletrocoagulação.
- outros fatores desencadeantes incluem irradiações radioterápicas
prévias, absorção de compostos de arsênico e cicatrizes antigas (raro
ERITROPLASIA DE QUEYRAT quando comparado ao CEC).
Atualmente, está sendo questionada a exposição solar continuada,
É a denominação dada à lesão em placa bem delimitada, com
visto que o CBC não é reproduzível em animais de laboratório em
superfície aveludada e brilhante, eritematosa, localizada no pênis, em
exposição constante à luz e, sim, o carcinoma espinocelular (CEC) →
geral de homens não circuncidados (> 40 anos), cuja patologia é
acredita-se na importância da exposição solar de maneira intermitente.
semelhante à da doença de Bowen, sendo então sua equivalência de
localização na mucosa (glande, prepúcio, uretra, bucal ou mucosa Algumas síndromes genéticas apresentam elevada frequência do
genital feminina). tumor, como a síndrome do nervo basocelular (SNBC), associadas a
mutações no gene patched (PTCH).
O traumatismo constante, higiene ruim, herpes simples genital, HPV
16 e 18 têm sido identificados como fatores de risco.
A doença de Bowen é considerada paraneoplásica, sobretudo, quando HISTOPATOLOGIA
de localização anogenital (câncer do trato geniturinário ou da cérvice
Existem vários padrões histológicos no CBC, mas a característica
uterina).
fundamental é a presença de massas de células basaloides que se
Tem chance de transformar-se em CEC invasor em 33% dos casos, dispõem perifericamente, em paliçada. Em geral, os núcleos são
sendo que ulceração, sangramento e vegetação são sinais de grandes, uniformes, pouco anaplásicos e com raras mitoses; as
transformação maligna. células não apresentam pontes intercelulares.
São características e frequentes as lacunas contíguas às massas
tumorais (retração justatumoral) → uma teoria mais recente relaciona
a existência de actina no estroma tumoral, que é um marcador de
miofibroblastos que secretam estromalisina-3, uma metaloproteinase
capaz de degradar a matriz tumoral.
O tumor pode apresentar diferenciação ou não → quando é
indiferenciado, é dito sólido e é a apresentação mais frequente, sem
relação com a agressividade do tumor; a diferenciação ocorre no
sentido dos anexos: pelo (ceratótico), glândulas sudoríparas
(adenoide) e glândula sebácea (cístico).
É interessante notar que a neoplasia é estroma-dependente, ou seja,
necessita de tecido conjuntivo para seu crescimento → a cultura de
células tumorais, na ausência do tecido conjuntivo, mostra a
Tratamento: pode ser realizado com terapia fotodinâmica, 5- conversão dessas células em células basais normais, inclusive com
fluorouracil, excisão cirúrgica, laser de Erbium ou laser de CO2. capacidade de ceratinização. Tal fato talvez explique a raridade de
metástase e, quando esta ocorre, é provável que o estroma tenha
migrado com as células tumorais.

5
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

A velocidade de crescimento do tumor é lenta, mas a multiplicação O CBC PIGMENTADO tem forma nódulo-ulcerativa com variável
das células neoplásicas é rápida, bem como é elevada a velocidade de pigmentação melânica (de marrom a azulado ou preto) e assemelha-
morte dessas células, o que explicaria o achado frequente de amiloide se ao melanoma maligno, do qual deve ser diferenciado
intratumoral e/ou no estroma.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A localização preferencial das lesões é nos dois terços superiores da
face, acima de uma linha passando pelos lóbulos das orelhas e
comissuras labiais, com 30% das lesões localizando-se no nariz → é
menos comum em outras áreas do rosto, tronco e extremidades; não
ocorre nas palmas, nas plantas e nas mucosas.
O tipo clínico mais comum é o chamado CBC NÓDULO-ULCERATIVO,
que se inicia com uma pápula rósea, perolada, que evolui
progressivamente a nódulo, com posterior ulceração central,
recoberta por crosta que, quando retirada, determina sangramento.
- apresenta bordas cilíndricas, translúcidas, mostrando formações
peroláceas e, às vezes, finas telangiectasias.

Com a progressão do quadro, pode haver:


A SÍNDROME DO NEVO BASOCELULAR (SÍNDROME DE GORLIN-GOLTZ) é
- extensão em superfície, às vezes, com cicatrização central, uma doença autossômica dominante com mutação no receptor PTCH,
caracterizando o CBC PLANO-CICATRICIAL → forma relativamente caracterizada pelo aparecimento, já na infância, de tumores que, com
superficial com crescimento centrifugo, fazendo com que a borda seja a idade, aumentam consideravelmente em número e tamanho →
perolada e o centro cicatricial; podem lembrar nevos ou fibromas.
- ou extensão em profundidade, com invasão e destruição de - as manifestações clínicas incluem: depressões puntiformes na região
músculo, cartilagem, osso ou outras estruturas, caracterizando o CBC palmoplantar, cistos odontogênicos na mandíbula, anormalidades nas
TEREBRANTE (úlcera roedora); costelas, espinha bífida, calcificação da foice do cérebro e eventual
- ou ainda pode ocorrer a proliferação central observada na FORMA retardo mental.
VEGETANTE (rara).
Outra forma clínica é a CBC ESCLEROSANTE, caracterizada por placa
branco-amarelada, escleroatrófica, dura, lisa, às vezes com
telangiectasias, bordas mal definidas, lembrando esclerodermia → a
evolução é muito lenta e raramente se ulcera.
O CBC SUPERFICIAL OU PAGETOIDE é formado por lesões múltiplas,
eritematoescamosas, discretamente infiltradas, emolduradas por
bordas irregulares e ligeiramente elevadas → o aspecto lembra
psoríase, eczema seborreico, LES, doença de Bowen ou de Paget, e a
localização é geralmente no tronco.

6
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

DIAGNÓSTICO PROFILAXIA
É realizado com base na idade adulta do paciente e na morfologia da É necessário educar a população no sentido de evitar superexposição
lesão, que é de crescimento lento, em geral na face e com aspecto solar desde o início da vida; o uso de protetores solares adequados é
perolado. útil, sobretudo nas pessoas que frequentam praia, mas elas não devem
entender esse uso como um passaporte para a exposição ao sol. Evitar
- devemos suspeitar quando qualquer lesão passa a sangrar
o uso de arsênico e alcatrão.
espontaneamente ou por mínimos traumas, crescimento súbito ou
sintomatologia local. Quem já apresentou uma vez este tumor tem maior chance de
A biópsia com exame histopatologico confirma o diagnóstico. apresentar um segundo, sendo necessário acompanhamento anual.

DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS Carcinoma espinocelular


No CBC nódulo-ulcerado, deve-se considerar o queratoacantoma e o Também chamado de carcinoma epidermoide ou carcinoma de células
carcinoma espinocelular. As formas superficiais devem ser escamosas, é um tumor maligno constituído pela proliferação atípica
diferenciadas das queratoses actínicas e da disqueratose de Bowen. de queratinócitos suprabasais (camada espinhosa), de caráter invasor,
sendo capaz de originar metástases.
A forma esclerosante, da esclerodermia em placas. A forma pigmentar,
da queratose seborreica e do melanoma maligno, e as formas Corresponde a 15% das neoplasias malignas de pele, com incidência
nodulares, de tumores benignos de anexos, de tricoepitelioma, de maior acima dos 50 anos de idade, sendo duas vezes mais comum
cilindroma e de cistos epidérmicos. em homens de pele clara.
Os principais fatores de risco são: fotoexposição (radiação UV),
TRATAMENTO exposição ao arsênico ou hidrocarbonetos aromáticos, lesões
precursoras (ceratose actínica, doença de Bowen, eitroplasia de
A escolha do procedimento terapêutico depende da localização, do Queyrat, cicatrizes de queimaduras-úlcera de Marjolin, úlceras e
tamanho e da profundidade do tumor, além da idade e comorbidades fistulas crônicas), HPV-16 e 18 (carcinomas genitais),
do paciente → é altamente individualizado. imunossupressão (especialmente transplantados), genodermatoses
(albinismo ou xeroderma pigmentoso), doenças crônicas (lúpus
Para lesões < 1 cm: curetagem simples, eletrodessecação e curetagem
discoide) e tabagismo (associado ao desenvolvimento de CEC da
ou crioterapia. Em lesões nos membros, particularmente do dorso das
cavidade oral).
mãos, e nas lesões > 1 cm, é mais indicado fazer a excisão e sutura.
Na CBC superficial: imiquimode a 5%, 5-fluorouracila ou terapia
fotodinâmica. HISTOPATOLOGIA
A cirurgia micrográfica de Mohs (remoção da porção visível do tumor, O aspecto histopatológico do CEC é o de uma hiperplasia, em ninhos
seguida de retirada de uma camada fina de tecido abaixo dele para ou cordões, de células epiteliais com certa tendência à ceratinização e
análise microscópica, caso revele a presença de tumor, reaplica-se a com anaplasia celular, invadindo a derme; as pérolas córneas são
técnica até que ocorre remoção completa do tecido neoplásico) está muito expressivas.
indicada principalmente nas lesões maiores, casos recidivantes,
Quanto mais desdiferenciada a neoplasia, maior a sua malignidade;
próximos aos olhos e no CBC esclerodermiforme.
daí a classificação de Broders em quatro graus:
A radioterapia é atualmente pouco empregada, mas sua indicação
- GRAU I : a diferenciação é expressiva (> 75%), vendo-se inúmeros
ocorre em pacientes muito idosos, debilitados ou com alto risco
aspectos da ceratinização;
cirúrgico.
- GRAU II : diferenciação > 50%;
Recentemente, introduziram-se drogas para o CBC metastático,
recorrente localmente, inoperável ou na síndrome do nevo - GRAU III : diferenciação > 25%;
basocelular, como o vismodegibe, que atua inibindo a proteína SMO, - GRAU IV : as células são totalmente indiferenciadas (< 25% de
da via dos receptores Hedgehog (para PTCH). diferenciação) e, portanto, não há qualquer aspecto de ceratinização
→ é um tumor inteiramente anaplásico.
EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO Essa é uma classificação, até certo ponto, pouco precisa, pois só
considera o grau de diferenciação, desprezando a profundidade da
A evolução é extremamente lenta (até vários anos). O prognóstico só invasão e o número de mitoses.
passa a ser ruim dependendo da localização e da manifestação clínica
(destruição da órbita ou do maciço central da face nas formas
terebrantes).
Na síndrome do nevo basocelular, temos recorrências frequentes,
assim como novas lesões. T
umores localizados nos planos de fusão da pele (sulco nasogeniano,
nasolabial e prega pré-auricular – “H da face”) têm maior chance de
recidivar, assim como tumores > 2 cm, CBC esclerodermiformes, com
invasão perineural ou vascular e em pacientes imunodeprimidos.

7
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As metástases (especialmente em linfonodos regionais) acontecem


em até 6% dos casos, podendo ocorrer após meses ou anos e são
As localizações mais comuns são lábio mais frequentes e precoces nos carcinomas das mucosas, do dorso
inferior, orelhas, face, dorso das mãos, das mãos e das cicatrizes das queimaduras (chance de metastatizar de
mucosa bucal e genitália externa. até 40%) → raramente ocorrem nos carcinomas da face que começam
Pode surgir em pele sã, embora mais com queratose solar.
frequentemente seja originada em pele
alterada por um processo anterior DIAGNÓSTICO
(ceratose actínica e tóxica,
leucoplasias, radiodermites, úlceras A clínica de lesão ceratósica de crescimento progressivo, que se
crônicas, entre outras). instala em pele sã e/ou, preferencialmente, em pele já comprometida,
Na pele, há, inicialmente, uma placa em pessoas adultas, leva à suspeita de CEC, sendo necessário a
eritematosa queratósica infiltrada e realização de biópsia e comprovação histopatológica o mais rápido
dura ou nódulo, a lesão aumenta possível.
gradualmente e ulcera-se. No diagnóstico diferencial é necessário que sejam considerados
- durante a evolução, pode adquirir aspecto de ulceração com queratoses actínicas, queratoacantoma, epitelioma basocelular,
disqueratose de Bowen, queratoses seborreicas, melanoma
infiltração na borda ou tornar-se vegetante ou corno cutâneo.
amelanótico e tumores de células de Merkel, além de tumores
malignos de anexos.

TRATAMENTO
A escolha terapêutica deve ser baseada no tamanho, tempo de
evolução e localização da lesão, assim como na idade e estado
imunológico do paciente.
O CEC localizado na mucosa, pode iniciar-se em placa de leucoplasia, Nas lesões de pele recentes e < 1 cm, pode-se tratar com
por área de infiltração ou lesão vegetante. eletrocoagulação e curetagem, enquanto as lesões maiores (> 1 cm)
devem ser excisadas com suficiente margem de garantia em superfície
- no lábio inferior, ocorre em área de leucoplasia que se infiltra ou é
e profundidade. Também pode-se utilizar a criocirurgia por nitrogênio
lesão nodular;
líquido.
- nos genitais, pode surgir sobre área de eritroplasia.
Nas lesões extensas ou de longa duração, com ou sem invasão
ganglionar, é indicada a exérese ampla.
No caso de tumores recidivantes pré-tratados, tumores de limites mal
definidos ou quando há invasão de osso ou cartilagem, a melhor
terapêutica é a cirurgia micrográfica de Mohs.
A radioterapia está indicada para áreas de difícil acesso cirúrgico ou
como adjuvante no caso de metástases em linfonodos (além de
linfadenectomia).
Outra característica importante das lesões do CEC é o sangramento Em carcinomas espinocelulares muito avançados, não passíveis de
discreto, porém frequente. tratamento cirúrgico ou radioterápico, utiliza-se a quimioterapia, e,
Variante particular do carcinoma espinocelular é o carcinoma eventualmente, de acordo com a topografia do tumor, particularmente
verrucoso, de evolução lenta, aspecto anatomopatológico em tumores de cabeça, pescoço e língua, poderá ser usada a
relativamente benigno e comportamento biológico menos agressivo, quimioterapia regional intra-arterial, que permite grandes
sendo difícil de diferenciar-se de hiperplasias pseudoepiteliomatosas, concentrações dos quimioterápicos na área tumoral, minimizando-se
exigindo, às vezes, várias biópsias para esclarecimento diagnóstico os efeitos colaterais decorrentes de concentrações elevadas das
definitivo → se apresenta drogas no sangue.
clinicamente como uma - os quimioterápicos mais empregados são: cisplatina, metotrexato,
tumoração exofítica verrucosa. ciclofosfamida, 5-fluorouracila e bleomicina.
- quando localiza-se na região
plantar, corresponde ao
epitelioma cuniculatum; na região PROGNÓSTICO
genital, constitui o condiloma A evolução do CEC é lenta, no entanto, bem mais rápida que a do
acuminado gigante de Buschke- CBC. Seu prognóstico é mais grave que o do CBC, em virtude de
Löwenstein; e, na cavidade bucal, possibilidade, mais cedo ou mais tarde, de metastatização.
é representado pela chamada
papilomatose oral florida. Entretanto, o prognóstico é favorável em casos recentes e
adequadamente tratados.

8
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Melanoma
Mais recentemente, a associação do melanoma com a infecção pelo
vírus da imunodeficiência humana (HIV) tem sido relatada, sendo as
É originado nos melanócitos e geralmente tem a pele como local lesões frequentemente descritas como atípicas, múltiplas ou
primário (apesar de poder acometer outros tecidos), sendo metastáticas.
considerado o mais maligno e agressivo dos tumores cutâneos devido - nessa situação, torna-se razoável supor que as alterações
ao seu alto potencial de produzir metástases. provocadas tanto no braço celular como no humoral do sistema
Sua incidência é relativamente baixa (representa apenas 4% das imunológico propiciem o surgimento de lesões neoplásicas, em
neoplasias cutâneas), apesar da alta letalidade. Acomete geralmente decorrência da falta de um sistema de supervisão específico, mediado
adultos entre 30 e 60 anos, sendo ligeiramente mais frequente no sexo por linfócitos T, no controle da proliferação de clones de células
masculino e na raça branca. malignas.

- localiza-se predominantemente no tronco, em homens, já nas O xeroderma pigmentoso,doença autossômica recessiva caracterizada
mulheres ocorre mais nas pernas e quadril. pela deficiência no mecanismo de reparo do DNA, apresenta risco até
2.000 vezes maior que a população normal. O albinismo também
Pode originar-se de um nevo melanocítico (1/4 dos casos) ainda que, aumenta a chance de desenvolvimento da neoplasia.
em cerca de 70% dos casos, não seja relatada a existência prévia da
lesão. A história pessoal de melanoma, por sua vez, aumenta a chance de ter
outro melanoma em até 9x e o paciente deve ser mantido sob
- a síndrome do nevo displásico representa um fator de risco de 10x vigilância ao longo de toda a vida. Outro fator, a história familiar, tem
para melanoma, geralmente mais precoces e menos espessos. um risco 5x maior, ainda que apenas 5-10% destas neoplasias sejam
verdadeiramente familiares.
ETIOPATOGENIA
O risco de desenvolvimento do melanoma está associado a fatores
HISTOPATOLOGIA
genéticos, ambientais e individuais → entre os fatores, a exposição Nem sempre é fácil fazer o diagnóstico diferencial histopatológico
solar é um dos principais. entre nevo e melanoma; há casos borderline que dificultam uma
Um dado para auxiliar o paciente com os cuidados com o sol é o decisão. Tal fato tem sido ainda mais observado a partir do advento
Índice Ultravioleta (IUV) que mede o nível de radiação solar na da dermatoscopia, tendo-se em vista que as biopsias das lesões são
superfície da Terra → quanto mais alto, maior o risco de danos à pele feitas em momentos cada vez mais precoces de sua evolução. Alguns
e de aparecimento de câncer. autores têm demonstrado que o aumento da incidência do melanoma
pode estar representado, em parte, por uma mudança nos critérios de
- o índice UV é calculado com base em vários fatores: a espessura da diagnóstico. Eles reavaliaram casos que há 20 anos foram
camada de ozônio; a cobertura de nuvens; a época do ano e a altitude diagnosticados como lesões com atipia grave, e o diagnóstico foi
da cidade. mudado para melanoma em 15% dos casos.
Categoria Índice Ultravioleta No melanoma, as principais características histopatológicas são
Baixo <2 assimetria da arquitetura, margens mal definidas e perda da
Moderado 3a5 arquitetura névica, com variação no tamanho e na forma dos ninhos;
Alto 6a7 alguns tornam-se confluentes e as células no interior dos ninhos
Muito alto 8 a 10 mostram-se menos coesas.
Extremo > 11
Há também migração de melanócitos atípicos para as camadas
A idade na qual o indivíduo inicia o hábito de se expor ao sol parece superiores da epiderme → essas células são DOPA-positivas e
ser fundamental na determinação da chance de se desenvolver a apresentam abundante atividade tirosinásica.
doença → exposição desde a infância, de forma intermitente ou com
Em uma fase inicial, limitam-se à epiderme e, eventualmente, a seus
aparecimento de queimaduras, causa maior risco de melanoma na
anexos, a não ser nos casos metastáticos ou que tenham origem em
idade adulta.
NMC, ou no nevo azul (origem dérmica). Em uma fase posterior,
Acredita-se que a transformação maligna do melanócito ocorra por ocorre perda de maturação dos melanócitos quando estes penetram
acúmulo sequencial de alterações genéticas e moleculares, algumas na derme.
vezes induzidas pelo UV.
As células são volumosas, com núcleos atípicos, hipercromáticos e
Apesar dos mecanismos patogênicos envolvidos no desenvolvimento nucléolos proeminentes → dependendo da forma e da fase, as células
do melanoma ainda não serem completamente conhecidos, vários são chamadas de pagetoides, pois lembram as células da doença de
genes e vias de sinalização já foram identificados como locais de Paget. Um infiltrado inflamatório composto por linfócitos costuma
alterações. estar presente.
- as alterações mais frequentes estão no locus CDKN2A (relacionado Na fase de crescimento
a dois genes de supressão tumoral, p16 e p14ARF), locus CSK4, via vertical, as alterações
RAS e gene MITF. citológicas são mais intensas,
O sistema imunológico também influencia a patogênese do melanoma, diminuindo inclusive a síntese
principalmente por meio da nevogênese e da modificação do do pigmento melânico que
comportamento biológico das lesões malignas → dessa forma, pode estar ausente (melanoma
imunodeficiências congênitas, adquiridas e imunossupressão em amelanótico) → nesse caso, a
transplantados ou por quimioterapia para outras neoplasias confirmação é feita por imuno-
constituem fatores facilitadores e agravantes do melanoma. histoquímica.

9
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS MELANOMA NODULAR (MN)

As lesões do melanoma costumam ser únicas e predominam em áreas Representa de 15 a 30% dos melanomas mais comuns, acometendo
fotoexpostas, especialmente aquelas com exposição intermitente (ex.: a faixa etária de 45 anos.
dorso nos homens, porção inferior dos membros inferiores nas Esse tipo de melanoma origina-se na junção dermoepidérmica e
mulheres). estende-se verticalmente na derme (fase de crescimento vertical).
É importante o relato do paciente se o nevo cresceu, se tem prurido e
se sangra → modificações indicadoras de malignização.
De acordo com as características clínicas e histológicas e com o modo
de progressão tumoral, os melanomas são classificados em quatro
tipos: melanoma extensivo superficial, nodular, lentiginoso acral e
lentigo maligno-melanoma.
Há ainda as formas mais raras de melanoma: melanomas primários de
mucosa, amelanóticos, melanoma de órgãos internos (raríssimos), e
os excepcionais congênitos.
Qualquer uma das formas clínicas pode se transformar em
amelanótico. É uma lesão nodular ou em placa ou até polipoide, de coloração
negro-azulada ou amelanótico, de evolução rápida (meses) →
localizações preferenciais incluem dorso, cabeça e pescoço.
MELANOMA EXTE NSIVO SUPERFICIAL (MES)
O prognóstico é ruim.
É o tipo mais comum de melanoma (70%), surgindo mais
frequentemente na parte superior do dorso (homens) ou nos
membros inferiores (mulheres) como uma lesão de crescimento
moderadamente lento, no decorrer de um período de até 2 anos → é
a lesão que mais frequentemente está associada a lesões névicas
precursoras.
Surge com maior frequência entre a 4ª e 5ª décadas de vida.

MELANOMA LENTIGINOSO ACRAL


É uma apresentação especial do melanoma cutâneo que se desenvolve
na planta dos pés, palma das mãos e no leito ungueal das mãos ou
pés, correspondendo a cerca de 10%.
Caracterizado por uma mácula pigmentada ou placa levemente É a forma mais comum em negros e asiáticos (raro nos indivíduos de
elevada, com margens denteadas e irregulares, cuja coloração varia pele branca), ocorrendo mais frequentemente em idosos entre 50 e
bastante (desde acastanhada a negra, com áreas azuladas, 60 anos → o crescimento é lento, ao longo de vários anos.
esbranquiçadas, acizentadas ou até vermelhas).
Caracterizado inicialmente por uma lesão plana, que varia de marrom
O prognóstico é moderado. a negra, com bordas irregulares, que pode evoluir para um nódulo ou
ulceração (na fase de crescimento vertical).

10
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

LENTIGO MALIGNO-MELANOMA MELANOMA AMELANÓTICO


Corresponde a 5% dos casos, acometendo pacientes com média de Sua característica principal ocorre pela concentração muito baixa de
70 anos de idade (idosos com dano actínico na pele) e mais frequente pigmento melânico → a lesão é rósea ou vermelha, podendo simular
no sexo feminino. um CEC.
Todos os tipos de melanoma podem ser amelanótico e, como o
diagnóstico clinico é particularmente difícil e tardio, o prognóstico é
pior.

MELANOMA METASTÁTICO
É caracterizado por uma lesão maculosa de bordas irregulares de
crescimento radial prolongado e grandes diâmetros → as principais Ocorre em 15-26% dos melanomas em estágios I e II, sendo que a
localizações incluem cabeça, pescoço, dorso e mãos. disseminação da doença ocorre normalmente de acordo com uma
sequência progressiva: melanoma primário → metástase regional →
- as lesões iniciais são castanhas, enquanto as lesões avançadas metástase à distância, porém, em 20% dos casos as primeiras
exibem variações notáveis de tonalidades marrom e preto (salpicado) metástases são sistêmicas.
e aparecem como uma “mancha”.
A primeiras metástases (locais) surgem até 2 cm da cicatriz excisional
Não é uma lesão precursora, mas sim evolutiva do lentigo maligno, (satelitose) e não devem ser confundidas com recidiva local ou
uma lesão causada pela ação da luz solar sobre os melanócitos recorrência por ressecção insuficiente.
epidérmicos de idosos, com surgimento da melanose solar que evolui
para a melanose maligna (lentigo maligno), que pode ser considerada As metástases em trânsito aparecem além de 2 cm do local da lesão
um melanoma in situ. primaria, em direção aos linfonodos regionais, que são a sede das
metástases regionais.
As metástases à distancia (sistêmicas) ocorrem por disseminação
hematogênica e atingem a própria pele, subcutâneo ou vísceras
(pulmão, SNC, fígado e ossos, em ordem decrescente de frequência).

DIAGNÓSTICO
No diagnóstico clínico é importante lembrar a regra do ABCDE, para
lesões pigmentadas nas quais as variáveis a serem analisadas são:
Assimetria: perda da simetria;
Bordas irregulares: presença de reentrâncias e saliências;
Coloração heterogênea: maior ou igual a duas cores (preto, azul,
marrom, cinza, vermelho, branco) na mesma lesão;
Diâmetro: maior que 6 mm;
Evolução: qualquer alteração que tenha ocorrido na lesão – tamanho,
formato, novos sintomas (prurido, sinais inflamatórios, secreção,
sangramento).
A dermatoscopia têm sido de grande ajuda nos últimos anos, para
MELANOMA DE MUCOSA observação de determinados padrões de pigmentação e morfologia,
aumentando a acuidade diagnóstica, porém o diagnóstico de certeza
Representa cerca de 5% dos melanomas, podendo ocorrer na mucosa
é feito pelo exame histopatológico.
bucal, nasal, genital ou retal.
- é mais indicado realizar a exérese total da lesão suspeita (geralmente
O processo pode ter crescimento
com margens de 1 a 2 mm), incluindo tecido celular subcutâneo; a
lentiginoso ou nodular.
biópsia parcial deve ser limitada aos casos de lesões muito grandes;
Os melanomas da cavidade oral
O melanoma possui dois tipos de crescimento: radial (cresce para os
geralmente ocorrem de forma
lados, portanto tem melhor prognóstico) e vertical (cresce para baixo,
bilateral nas mucosas da boca e
tendo pior prognóstico, maior chance de enviar metástase, temos
gengiva. Na genitália, desenvolvem-
como ex. o melanoma nodular) → por isso, é fundamental que a
se principalmente na glande,
amostra de pele seja retirada até o tecido celular subcutâneo, já que a
prepúcio ou lábios menores do
espessura vertical do tumor é o valor preditivo mais importante para
pudendo.
o prognóstico, tratamento e seguimento.

11
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Segundo as recomendações do GBM (Grupo Brasileiro de Melanoma), Em geral, há uma certa concordância entre os níveis de Breslow e
o laudo deve conter: tipo histológico do melanoma, fase de Clark, porém há possibilidade de melanomas com níveis II ou III de
crescimento (radial ou vertical), níveis de invasão (Classificação de Clark terem, conforme localização, espessura de 0,75 mm ou menor,
Clark), profundidade (Índice de Breslow), número de mitoses por nesses casos deve-se considerar em primeiro lugar a espessura do
milímetro quadrado, infiltrado inflamatório linfocitário peritumoral ou tumor.
intratumoral, invasão vascular (linfática e sanguínea), invasão
Classificação da espessura do melanoma maligno primário
perineural, ulceração, regressão, satelitose microscópica e margens
cutâneo (Breslow)
cirúrgicas.
≤ 1 mm
> 1-2 mm
EVOLUÇÃO > 2-4 mm
> 4 mm
Os melanomas são tumores com grande potencial de metastatização,
em função direta da fase evolutiva, da espessura, do nível de invasão
Classificação da localização do tumor (Clark)
e da presença ou não de ulceração → a espessura do tumor,
determinada pelo método de Breslow, é o fator mais importante para Nível I In situ (intraepidérmico)
a classificação do MM, a conduta terapêutica, o risco de recidiva e a Nível II Invasão da derme papilar superior
prognose. Nível III Invasão da derme papilar
Nível IV Invasão da derme reticular
Na classificação de Clark, a avaliação é feita de acordo com a Nível V Invasão da hipoderme
localização do tumor, tendo valor prognóstico menor que os índices
de Breslow.

ESTADIAMENTO
A principal forma de estadiamento se dá pelo sistema TNM (tamanho do tumor, número de linfonodos metastáticos e metástase à distância).

Estágios do melanoma
Estágio 0 (melanoma in situ) Tumor está contido na epiderme (Tis), não se espalhou para linfonodos próximos (N0) ou outro órgão (M0)
Tumor não tem mais do que 2 mm de espessura e pode (ou não) ter ulceração (T1 ou T2a), não se espalhou para
Estágio I
linfonodos próximos (N0) ou outros órgãos (M0)
Tumor tem entre 1 e 4 mm de espessura (T2b, T3 e T4) e pode (ou não) ter ulceração, não se espalhou para
Estágio II
linfonodos próximos (N0) ou outros órgãos (M0)
Tumor tem até 2 mm de espessura e pode (ou não) ter ulceração (T1 ou T2a), se espalhou para 3 ou menos
Estágio IIIa
linfonodos (só é visto sob o microscópio – N1a ou N2a) e não se espalhou para outros órgãos
Não existe sinal do tumor primário (T0) e está disseminado para apenas um linfonodo (N1b) ou para áreas muito
pequenas da pele próxima (tumores satélites) ou para os canais linfáticos ao redor do tumor (N1c) e não se
espalhou para outros órgãos; OU
Estágio IIIb Tumor tem até 4 mm de espessura e pode (ou não) ter ulceração (T1, T2 ou T3a), se espalhou para apenas um
linfonodo (N1a/b) ou para áreas muito pequenas da pele próxima (tumores satélites) ou para os canais linfáticos
ao redor do tumor (N1c) ou se espalhou para 2 ou 3 nódulos linfáticos (N2a ou N2b) e não se espalhou para
outros órgãos (M0)

12
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Não existe sinal do tumor primário (T0) e está disseminado para 2 ou mais linfonodos (N2b ou N3b) ou se espalhou
para áreas muito pequenas da pele próxima (tumores satélites) ou para os canais linfáticos da pele ao redor do
tumor e atingiu os gânglios linfáticos próximos (N2c ou N3c) ou se espalhou para os linfonodos do grupo (N3b
ou N3c) e não se espalhou para outros órgãos (M0); OU
Tumor tem até 4 mm de espessura e pode (ou não) ter ulceração (T1, T2 ou T3a), se espalhou para os para áreas
muito pequenas da pele próxima (tumores satélites) ou para os canais linfáticos da pele ao redor do tumor e atingiu
os linfonodos próximos (N2c ou N3c) ou se espalhou para 4 ou mais linfonodos próximos (N3a ou N3b) ou se
espalhou para os linfonodos do grupo (N3b ou N3c) e não de espalhou para outros órgãos (M0); OU
Estágio IIIc
Tumor tem entre 2 e 4 mm de espessura ou pode ser mais espesso que 4,0 mm e tem ulceração (T3b) ou não
(T4a), se espalhou para um ou mais linfonodos ou se espalhou para áreas muito pequenas da pele próxima
(tumores satélites) ou para os canais linfáticos da pele ao redor do tumor (N1 ou superior) e não se espalhou para
outros órgãos; OU
Tumor tem mais do que 4 mm de espessura e tem ulceração (T4b), se espalhou para até 3 linfonodos (N1a/b ou
N2a/b) ou para áreas muito pequenas da pele próxima (tumores satélites) ou para os canais linfáticos da pele ao
redor do tumor e pode (N2c) ou não (N1c) ter atingido os linfonodos próximos e não se espalhou para outros
órgãos (M0)
Tumor tem mais do que 4 mm de espessura e tem ulceração (T4b), se espalhou para 4 ou mais linfonodos (N3a
ou N3b) ou se espalhou para áreas muito pequenas da pele próxima (tumores satélites) ou para os canais linfáticos
Estágio IIId
da pele ao redor do tumor (sem atingir os nódulos linfáticos) ou se espalhou para os linfonodos do grupo (N3c)
e não se espalhou para outros órgãos (M0)
Tumor pode ser de qualquer espessura e pode (ou não) ter ulceração (qualquer T), pode (ou não) ter se espalhado
Estágio IV para os linfonodos próximos (qualquer N) e se espalhou para os linfonodos distantes ou outros órgãos, como
pulmões, fígado ou cérebro (M1)

TRATAMENTO
A terapia do melanoma está baseada na ressecção da lesão com - até pouco tempo, a única possibilidade disponível era o interferon
margem de segurança adequada à espessura da lesão → assim, alfa em altas doses, mas seu uso tem sido desencorajada em prol do
depois de diagnosticado e estadiado pela biópsia, se o tumor não for uso de opções melhores, como a imunoterapia com os inibidores de
metastático, é realizada a excisão local para ampliação das margens. checkpoints imunológicos, representados pela classe dos inibidores
da PD1 (nivolumabe e pembrolizumabe); outra opção é o anticorpo
Espessura da lesão Margens recomendadas
monoclonal contra o receptor CTLA4 do linfócito (ipilimumabe) e a
In situ 0,5 a 1,0 cm
terapia direcionada contra a proteína quinase ativadora mitogênica
≤ 1,0 mm 1,0 cm
(MAPK) com uso do daprafenibe, trametinibe e vemurafenibe.
> 1-2 mm 1,0 a 2,0 cm
> 2,0 mm 2,0 cm Nos pacientes com melanoma metastático (estágio IV), o tempo
mediano de sobrevida estimado é em torno de 8 meses → a
A maioria dos pacientes apresenta-se em estágios iniciais I e IIA no quimioterapia não mostrou, até o momento, aumentar a sobrevida
momento do diagnóstico, quando a cirurgia é curativa em 70-90% dos global, mas se justifica pela paliação de sintomas nos pacientes que
casos. não obtiveram resposta com a terapia adjuvante com as opções
A cirurgia é o tratamento mais efetivo, sendo que, de acordo com o anteriores.
estadiamento, poderá ser acompanhada de algum procedimento - a dacarbazina, temozolomida e carboplatina/paclitaxel são exemplos
adjuvante, como linfadenectomia, quimioterapia, radioterapia ou de esquemas já avaliados.
imunoterapia.
A radioterapia fica indicada para os casos de metástases ósseas e
A investigação de envolvimento linfonodal regional deve ser feita com cerebrais.
linfocintilografia pré-operatória e biópsia do primeiro linfonodo de
drenagem (Linfonodo Sentinela – LS ou LNS) que quase sempre
corresponde ao primeiro local de implantação tumoral, pois a ACOMPANHAMENTO
disseminação ocorre tipicamente de forma ordenada e sequencial.
O acompanhamento deve incluir a história clínica e exame físico,
- a pesquisa do LS está indicada principalmente para pacientes sem principalmente no local primário, linfonodos regionais, fígado, baço,
acometimento linfonodal clinicamente detectado com espessura pulmão, cérebro (o melanoma é a 3ª causa de metástase cerebral).
tumoral > 0,8 mm ou < 0,8 mm e ulceração.
Nos pacientes sem metástases, o seguimento é feito a cada 3 meses
Pacientes com linfonodos palpáveis ou com biópsia (+) para LS devem por 1 ano e depois a cada 6 a 12 meses nos casos de melanoma com
ser submetidos à dissecção de todos os linfonodos da respectiva espessura menor de 1 mm.
cadeia de drenagens, não exatamente por aumentar a sobrevida (este
benefício ainda não está esclarecido), mas pelo fato de melhorar a - para os mais profundos, a cada 3 meses por 2 anos, a cada 6 meses
qualidade de vida do paciente. por 3 anos e depois anualmente.

O tratamento adjuvante, por sua vez, fica indicado para os tumores em


estágio IIB, IIC e III, quando se tem um risco elevado de recorrência
e óbito → é atualmente um campo vasto e em pleno crescimento.

13
Gabriela M. N. Feitosa | Turma 73 – Pele e tecidos moles

Localização Estágio Sobrevida aproximada em 5 anos


Ia 95%
Ib 90%
Pele
IIa 78%
IIb 65%
IIIa (micrometástase) 65%
Linfonodos IIIb (micrometástase ou tumor primário ulcerado) 50%
IIIc 25%
IVa (pele e linfonodo distantes) 18,8%
Metástase à distância IVb (pulmão) 6,7%
IVc (outras vísceras, LDH) 9,5%

REFERÊNCIAS
MEDCURSO. 2019
AZULAY. Dermatologia. 7 ed. 2017
RIVITTI. Manual de dermatologia clínica de Sampaio e Rivitti. 2014
WOLFF. Dermatologia de Fitzpatrick. 7 ed. 2014

14

Você também pode gostar