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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 07/09/23, 12:17
I. Relatório
No âmbito do Processo Comum Singular supra identificado em epígrafe foi proferida
sentença onde foi decidido:
«Em face do exposto, decide-se:
a) condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de
um crime de ofensa à integridade física grave por negligência, previsto no artigo 33.º,
do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro, por referência ao artigo 144.º, n.º 1, al.
a), do Código Penal (contra BB), na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão;
b) condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de
um crime de ofensa à integridade física grave por negligência, previsto no artigo 33.º,
do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro, por referência ao artigo 144.º, n.º 1, al.
b), do Código Penal (contra CC), na pena de 9 (nove) meses de prisão;
c) condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de
um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto no artigo 148.º, do
Código Penal (contra DD), na pena de 4 (quatro) meses de prisão;
d) absolver o arguido AA da prática, em autoria material, de um crime de ofensa à
integridade física grave por negligência, previsto no artigo 33.º, do Decreto-Lei n.º
315/2009, de 29 de outubro, por referência ao artigo 144.º, n.º 1, al. a), do Código
Penal (contra EE);
e) Realizar o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido AA, nos termos do artigo
77.º, do CP, assim determinando a aplicação de uma pena única de 2 (dois) anos de
prisão;
f) Proceder ao desconto de um dia de detenção na pena aplicada, ao abrigo do artigo
80.º, do Código Penal;
g) Substituir a pena de prisão aplicada por 480 (quatrocentas e oitenta) horas de
trabalho a favor da comunidade, nos termos do disposto no artigo 58.º do Código
Penal;
h) Condenar o arguido AA em duas penas acessórias de privação do direito de
detenção de cães perigosos ou potencialmente perigosos, por um período de 6 (seis)
anos cada uma, ao abrigo do artigo 30.º-A, al. b), do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29
de outubro;
i) Realizar o cúmulo jurídico das penas acessórias aplicadas ao arguido, aplicando-lhe
uma pena acessória única de 8 (oito) anos de privação do direito de detenção de cães
perigosos ou potencialmente perigosos, ao abrigo dos artigos 77.º do Código Penal e
30.º-A, al. b), do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro;
j) Julgar parcialmente procedentes os pedidos de indemnização civil deduzidos e, em
consequência:
a. condenar solidariamente os demandados cíveis AA, FF e X..., Compañia de Seguros
y Reaseguros S.A. – Sucursal em Portugal a pagar à demandante BB, a quantia de €
26.202,73 (vinte e seis mil duzentos e dois euros e setenta e três cêntimos);
b. condenar solidariamente os demandados AA e FF a pagar à demandante BB a
quantia de € 36.350,53 (trinta e seis mil trezentos e cinquenta euros e cinquenta e três
cêntimos), e o montante que se vier a apurar em incidente de liquidação de sentença, a
título de danos futuros com tratamentos, cirurgias, exames, e demais despesas
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quantias essas acrescidas de juros de mora, à taxa supletiva legal em vigor, desde a
data da citação, quanto aos danos patrimoniais, e desde a data da notificação da
presente sentença, quanto aos danos não patrimoniais e corporais, sempre até efetivo
e integral pagamento – cf. o disposto nos artigos 566.º, n.º 2, e 805.º, n.º 3, ambos do
Código Civil e o acórdão de fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, de 09 de maio de
2002,
g. absolver os demandados cíveis do demais peticionado, tudo sem prejuízo do direito
de regresso da demandada X..., Compañia de Seguros y Reaseguros S.A. – Sucursal
em Portugal sobre a demandada FF.
k) Determinar a restituição da camisola/sweatshirt apreendida nos presentes autos (cf.
auto de busca e apreensão vertido a fls. 20 e 21) ao arguido AA após o trânsito em
julgado, porque não constituíram instrumento essencial da prática dos crimes, não se
justificando a respetiva declaração de perda a favor do Estado.
l) Condenar o arguido AA nas custas criminais do processo, fixando-se a taxa de
justiça em 5,5 UC – artigos 513.º, e 514.º, do CPP, e artigo 8.º, n.º 9, e Tabela III, do
RCP).
Custas na parte cível a dividir por todos os intervenientes, na proporção dos respetivos
decaimentos, que se fixam em da seguinte forma:
a. os demandados cíveis AA e FF, solidariamente na proporção de 83,78%, sendo a
demandada cível X..., Compañia de Seguros y Reaseguros S.A. – Sucursal em
Portugal, solidariamente com os demais demandados cíveis, mas apenas na proporção
de 24,73%;
b. a demandante cível BB, na proporção de 0,004%;
c. demandante/assistente CC, na proporção de 0,064%;
d. demandante/assistente EE, na proporção de 16,15%,
tudo nos termos conjugados dos artigos 446.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, e 523.º, do CPP,
527.º e 528.º, n.º 4 do Código de Processo Civil.
*
O TIR prestado pelo a fls. 50 permanece em vigor até à extinção da pena – artigo
214.º, n.º 1, e), do Código de Processo Penal.
*
Notifique.
Após o trânsito:
a) remeta boletins ao registo – artigo 374.º, n.º 3, d), CPP, e artigos 5.º, n.º 1, 2 e 3, 6.º,
al. a) e 7.º, n.º 1, al. a) e 2, da Lei n.º 37/2015, de 05 de maio.
b) Comunique à DGRSP para proceder à elaboração do plano de prestação de
trabalho a favor da comunidade nos termos supra determinados;
c) Comunique à Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), cumprindo o
disposto no artigo 41.º-A do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro.»
*
Inconformada, a chamada ao processo FF, interpôs recurso, solicitando a nulidade da
sentença proferida por extrapolação do pedido, improcedência do direito de regresso e
da ausência de responsabilidade por factos ilícitos e pelo risco e demais
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entender da recorrente, impõe a decisão diversa da matéria de facto dada como não
provada.
5. A presunção representa o juízo lógico pelo qual, argumentando segundo o vínculo
de causalidade que liga uns com outros os acontecimentos naturais e humanos,
podemos induzir a existência ou o modo de ser de um determinado facto que nos é
desconhecido em consequência de outro facto ou factos que nos são conhecidos, e
que que proporciona racionalmente o que se pretende provar.
6. É consagrada a classificação em presunções legais (praesumptiones juris), quando
a operação lógica de dedução a faz a própria lei e presunções judiciais
(praesumptiones hominis seu iudices), quando a dedução se realiza pelo órgão judicial.
7. As presunções funcionam como modo de ultrapassar as dificuldades de prova, por
se referirem, por exemplo, a factos que não se objetivam pela sua própria natureza,
seja também quando é mais difícil de produzir para quem teria normalmente que
suportar o ónus probatório (relevatio ab onere probandi).
8. Ora, revertendo para o caso dos autos, temos que ficou cabalmente demonstrado e
provado que o canídeo “...” era de raça “Rottweiller”, e que não se encontrava
esterilizado.
9. A respeito da esterilização de cães de raça perigosa, ou potencialmente perigosa,
constante da Portaria 422/2004, de 27/04, como é o caso da raça “Rottweiller”, dispõe
o artigo 19.º do DL n.º 315/2009, de 29 de outubro:
“1 - Os cães perigosos, ou que demonstrem comportamento agressivo, não podem ser
utilizados na criação ou reprodução.
2 - Os cães referidos no número anterior devem ser esterilizados, devendo os seus
detentores, sempre que solicitados pelas autoridades competentes, apresentar o
respetivo atestado emitido por médico veterinário.
3 - Os cães das raças constantes da portaria prevista na alínea c) do artigo 3.º que não
estejam inscritos em livro de origens oficialmente reconhecido, bem como os
resultantes dos cruzamentos daquelas raças entre si e destas com outras, devem ser
esterilizados entre os 4 e os 6 meses de idade.
(…)”
10. Reconhecendo o legislador a especial perigosidade, em concreto ou em abstrato,
dos cães de raça perigosa ou potencialmente perigosa, impõe que os mesmos devem
ser esterilizados entre os 4 e 6 meses de idade.
11. Bem se compreende esta solução, tanto mais que é do conhecimento generalizado
que a esterilização de canídeos tem o condão de lhes acalmar o temperamento.
12. É o que se reconhece, aliás, na douta sentença em crise, quando diz que “é
conhecido do cidadão mediano que a esterilização pode «acalmar» os animais”.
13. Estabelece a presunção de que a esterilização, como medida profilática obrigatória,
reduz a agressividade dos canídeos, por um lado, e a de que a falta de esterilização
potencia a agressividade e perigosidade do canídeo.
14. Opera-se, pois, uma verdadeira inversão do ónus da prova, que bem se
compreende, atenta a verdadeira impossibilidade de qualquer parte, que não o
detentor do concreto animal, que com o mesmo convive diariamente e o leva ao
veterinário, em fazer a prova de tal factualidade por outro meio.
15. E os recorridos, vimos já, sucumbiram nessa prova.
16. Sem prescindir, foi reconhecido na douta sentença em crise que a esterilização dos
animais tem a virtualidade de lhes acalmar o temperamento.
17. Tal é o que resulta, também, da lei, e da experiência comum.
18. Assim, por simples presunção judicial, o Tribunal a quo deveria ter concluído, em
sede de fixação da factualidade relevante, que a omissão da obrigação de esterilizar o
canídeo constituiu causa, ou, pelo menos, concausa do evento.
19. É esta, também, a única conclusão a que se chega pelo singelo uso das regras da
experiência comum.
20. Portanto, deverá este Alto Tribunal, fazendo uma apreciação crítica e conjugada
das provas, alterar a resposta (negativa) aos pontos l), m) e n) da matéria de facto
dada por não provada, dando esses factos por provados.
21. Procedendo-se às alterações das respostas à matéria factual nos moldes que atrás
se indicaram e consideradas as respostas não impugnadas à restante factualidade tida
por assente e apurada, é firme opinião da recorrente que não se acham verificados os
pressupostos em que se escora a douta decisão ora em crise.
22. Com efeito, em tal situação, encontra-se plenamente preenchida a cláusula de
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presentes autos; e
27. Por fim, no que concerne à indemnização arbitrada ao Assistente – EE, esta deve
pura e simplesmente ser anulada, já que, este foi responsável directo na produção do
evento que provocou os danos que lhe foram causados.»
Recurso de FF.
Ilegitimidade.
Violação do princípio do dispositivo por não lhe ter sido deduzido pedido e por ter sido
condenada no direito de regresso à seguradora.
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32. Com efeito, em face do quadro físico provocado na ofendida BB, do qual resultava
ferimento complicado de grandes dimensões do couro cabeludo, teve a mesma de ser
submetida a cirurgia para tratamento do esfacelo resultante da mordedura.
33. Após o que, teve de ser submetida a diversas outras cirurgias para limpeza e
desbridamento das feridas, com necessidade de realização de excertos cutâneos em
área de necrose do couro cabeludo provenientes da região reto-auricular.
34. Sendo que se manteve a ofendida BB internada ininterruptamente, decorrente
daqueles factos supra melhor descritos, de 25.04.2017 até 02.06.2017, num total de 39
(trinta e nove) dias, na Unidade de Cuidados Intermédios da Urgência Pediátrica do
Hospital 1....
35. Depois, uma vez tendo saído dessa unidade, a ofendida BB permaneceu internada
até agosto de 2017.
36. Após o que iniciou tratamento em regime de consultas vigiadas, diariamente, para
desbridamento das feridas, para o que carecia de ser sedada.
37. Com o que, apresentava, em 04.12.2017, epitelização completa, porém, má
cicatrização das cicatrizes retro-auriculares, com pele mais larga e ruborizada,
continuando, nesta data, a ser prescrita a toma medicamentosa e de produtos de
tratamento cutâneo.
38. Sendo que, ainda na sequência e por causa única e exclusiva das condutas supra
descritas, a ofendida BB teve de ser sujeita a diversas consultas de
otorrinolaringologia, tendo resultado perfuração bilateral da membrana do tímpano.
39. Para o efeito, foi a ofendida BB submetida a intervenção cirúrgica em janeiro de
2019 para colocar expansor na cabeça após o que iniciou o seu enchimento,
adenoidectomia e miringotomia esquerda em outubro de 2018, posteriormente a
timpanoplastia direita, em janeiro de 2020.
40. Ademais, teve, ainda, a ofendida BB de ser observada em diversas consultas de
otorrinolaringologia no Hospital 1..., no âmbito das quais careceu de ser submetida a
audiograma em 13.10.2018.
41. Foi, ainda, a referida ofendida BB sujeitada a adenoidectomia e miringotomia
esquerda, em 13 de outubro de 2018 e, posteriormente, a timpanoplastia direita, em
22.01.2020, por lhe haver sido detetada perfuração bilateral da membrana do tímpano,
o que reclamou, ainda, consultas em 27.05.2020 e 11.09.2020
42. Em face dos factos supra indicados a menina BB, ofendida, ficou a padecer, de
forma permanente, das seguintes sequelas:
a. No crânio:
i. área cicatricial de coloração esbranquiçada e áreas rosadas, situada na metade
direita da região frontal, com 12cm por 6cm de maiores dimensões, prolongando-se de
forma linear e de orientação de anterior para posterior e da direita para a esquerda,
com atingimento da região fronto-parietal esquerda, com 10cm por 1cm de maiores
dimensões, com hipossensibilidade à palpação, encontrando-se tal área cicatricial
aderente aos planos tecidulares profundos, com repuxamento tecidular, sem normal
implantação tecidular;
ii. cicatriz hipopigmentada e linear, de forma semi-circunferencial e de concavidade
anterior, situada na região mediana da região parietal, com atingimento
aproximadamente simétrico das metades esquerda e direita, com 20cm de
comprimento, com hipossensibilidade à palpação.
iii. área cicatricial nacarada, situada na região retro-auricular direita, com 8cm por 2cm
de maiores dimensões, com hiposssensibilidade à palpação, aderente a planos
profundos, sem repuxamento tecidular. Área cicatricial rosada, com áreas com
pontuado eritematoso, situada na região retro-auricular esquerda, com 8,5cm por
0,5cm de maiores dimensões, dolorosa à palpação, aderente a planos profundos, sem
repuxamento tecidular aparente;
b. No braço direito:
i. área cicatricial muito ténue, quase impercetível, situada na face postero-superior do
ombro direito, com 1cm por 0,2cm de maiores dimensões, não dolorosa à palpação,
sem reação queloide, com cicatriz hipopigmentada linear, de orientação oblíqua,
situada na face interna do polegar, com 1cm de comprimento, não dolorosa à
palpação, sem reação quelóide;
ii. área cicatricial hipopigmentada, situada sobre o bordo interno da omoplata direita,
com 2,4cm por 0,4cm de maiores dimensões, não dolorosa à palpação, sem reação
queloide;
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c. No ouvido direito:
i. hipoacusia à direita, de transmissão, de grau moderado, com sequela enquadrável no
anexo II, Cap IIB, alínea Sb0203 em 8 pontos, representando, no ouvido direito surdez
de transmissão com PMP de 53,5 dB na escala de Webber;
43. Ademais, por conta única e exclusiva da factualidade supra aduzida, a ofendida BB
apresenta, ainda, limitações várias no seu quotidiano e vida presente e futura,
concretamente apresentando dificuldade em adormecer, com insónias e queixas, ainda
que atualmente mais atenuadas, com pesadelos inicialmente constantes, mas agora
mais esporádicos.
44. Por outro lado, em face de tais factos supra descritos e das lesões daí decorrentes
a ofendida BB apresenta muita dificuldade em frequentar ambientes públicos,
nomeadamente sítios onde seja frequente encontrar animais (especialmente cães, mas
também outros animais).
45. Assim como apresenta a ofendida BB limitações na sua vida de formação, tendo
regressado ao infantário em janeiro de 2018, com recurso a lenços para encobrir a
área cicatricial de maiores dimensões.
46. Em face do que, atualmente a ofendida BB continua a carecer, ainda, de
acompanhamento psicológico sem previsão de cessação.
*
47. Na mesma circunstância e em face das supra descritas condutas, a ofendida CC
teve de ser assistida em episódio de urgência com o número ..., onde foi admitida
pelas 13h21m no Centro Hospitalar ..., apresentando duas feridas comunicantes em
membro superior esquerdo, tendo tido necessidade de se colocar um dreno com vista
a que não infecionassem atenta a elevada saída de tecido adiposo, iniciando, ato
contínuo, a toma de antibióticos durante quase três meses, e carecendo, à data, de
realização de pensos dia sim, dia não, o que ocorreu até 05.05.2017 junto daquele
Centro Hospitalar.
48. Em face das condutas supra descritas, por parte do ofendido e do animal, e por
causa e como consequência exclusiva delas, a ofendida CC sofreu diversas lesões,
das quais permanecem as seguintes sequelas:
a. No braço esquerdo, concretamente na face lateral de terço médio de braço,
complexo cicatricial que ocupa área quadrangular com 9 cm por 10 cm com pele de
tonalidade violácea e disposta da seguinte forma:
i. - área anterior (área cicatricial em "V" cada ramo com 3 cm por 0,5 cm) e área
cicatricial em posição superior à anterior (1 cm por 0,2 cm de área).
ii. - área posterior (duas cicatrizes com reação quelóide associada, duras na palpação,
forma quadrangular com 1 cm de lado (cada uma) distando entre si 5 cm (dolorosas na
palpação superficial)
iii. - em posição superior e posicionada entre as áreas cicatriciais descritas acima
compreende mancha cicatricial (disposta perpendicularmente ao eixo longo do
membro) com 3 cm por 0,2 cm.
49. Tais lesões causam e continuarão a causar dor à ofendida CC, especialmente
associada à mobilização do ombro esquerdo, após realização de movimento de 90º de
abdução, a qual irradia até ao bordo superior do músculo trapézio esquerdo e face
lateral esquerda da região cervical.
50. Tendo, pois, tais lesões resultado de traumatismo de natureza contundente e corto-
perfurante, as quais demandaram, para consolidação médico-legal, verificada a
08.02.2019, 654(seiscentos e cinquenta e quatro dias), dos quais 129 (cento e vinte e
nove) dias com afetação da capacidade de trabalho profissional (de 25.04.2017 até
31.08.2017) e, 525 (quinhentos e vinte e cinco) dias com afetação da capacidade de
trabalho geral (de 25.04.2017 até 31.08.2018).
51. O que demandou a ofendida CC à toma de medicação regular, não só pelas lesões
físicas, como para controlar o seu quadro emocional como ansiedade e perda de sono,
bem como pelo pânico que decorre quando confrontada com canídeos.
52. Ademais, em face dos atos supra descritos, e por causa única e exclusiva dos
mesmos, a ofendida CC apresenta as sequelas funcionais situacionais supra descritas
e, ainda, sequelas no seu quadro psicológico de stress pós trauma, tendo de beneficiar
de acompanhamento psicológico com periocidade mensal, o que poderá vir a ser
agravado em função das dificuldades que poderão advir do internamento da filha, a
menina BB para reconstrução e em face das sequelas que, na presente data ainda se
encontram, quanto àquela, por fixar na globalidade.
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53. Sendo, pois, tais sequelas psicológicas derivadas dos factos próprios (enquanto
vítima direta dos factos perpetrados contra si) e dos factos dirigidos contra a sua filha
BB (aqui como vítima indireta).
54. Factos que conduzem a reincidência de alguma da sintomatologia ansiosa da
ofendida CC, o que conduz e fundamenta a necessidade de continuidade do
acompanhamento, sem previsão de alta clínica.
*
55. Em face dos sobreditos atos e como resultado direto e necessário da conduta do
arguido e do animal, o ofendido EE padeceu de escoriação e traumatismo no cotovelo
e no punho esquerdos, os quais lhe causaram dores, e demandaram número de dias
não concretamente apurado para cura, sem que dos mesmos tenham resultado lesões
permanentes.
56. Acresce que, no seguimento e por causa única e exclusiva de tais factos, o
ofendido EE padece, como sequela permanente, de trauma direto (de acordo com a
sua própria circunstância) e indireto (por força dos factos perpetrados contra a sua
filha, a menina BB), de quadro psicológico de ansiedade pós trauma, do qual ainda
carece de acompanhamento psicológico.
57. Tais lesões apresentaram consolidação médico-legal em 08.02.2019, tendo
determinado, pois, 654(seiscentos e cinquenta e quatro) dias para consolidação, dos
quais 129 (cento e vinte e nove) dias com afetação da capacidade de trabalho geral e
profissional (de 25.04.2017 até 31.08.2017).
58. Ademais, os ofendidos BB, CC e EE continuam a carecer de apoio psicológico
continuado, sem previsibilidade de cessação do mesmo.
*
59. Como consequência direta e necessária da conduta do arguido e do animal, e no
seguimento de tais ferimentos, o ofendido ficou DD teve de ser assistido medicamente,
o que ocorreu pelo episódio de urgência n.º ..., na Unidade Local ..., E.P.E. – Hospital
..., com admissão pelas 10h01m01s, apresentando à admissão, lesões na face ântero-
lateral do antebraço direito, assim como lesões na coxa.
60. Em face do que, à avaliação do dano corporal, o ofendido DD apresentava:
a. No braço direito: cicatriz rosada com forma quadrangular com 2cm de lado e com
reação quelóide associada, localizada no bordo cubital de terço inferior de antebraço
(área anatómica de articulação de punho), com dor associada;
b. Na perna direita: na face ântero-medial de terço superior de coxa, três manchas
cicatriciais com tonalidade rosada e com forma circular, com 1 cm de diâmetro,
dispostas sobre linha arqueada com concavidade voltada medialmente;
61. Tais lesões causaram dores ao ofendido DD, tendo resultado de traumatismo de
natureza mista provocada pela mordedura do canídeo e das quais resultaram cicatrizes
e áreas cicatriciais.
62. Ademais as referidas lesões determinaram 20 (vinte) dias para a consolidação
médico-legal, que ocorreu a 15.05.2017, dos quais 10 (dez) dias com afetação da
capacidade de trabalho geral e 10 (dez) dias com afetação da capacidade de trabalho
profissional.
***
63. O arguido agiu com absoluto descuido e incúria, com plena consciência e
conhecimento das características do animal, como cão de raça potencialmente
perigosa que é, e como tal, suscetível de, com mais facilidade, sem qualquer
motivação ou provocação e por puro ímpeto, assumir comportamentos agressivos para
com pessoas, nomeadamente, agredindo-as e mordendo-as.
64. Ademais, sabia, ainda, o arguido que sobre si incidia a obrigação e especial dever
de vigiar o canídeo de forma a evitar que este pusesse em risco a vida ou a integridade
física de outras pessoas ou animais, mas, ainda assim, agiu com desrespeito por tal.
65. Não obstante, bem ciente de tal dever que sobre si impendia, o arguido circulava
com o animal à solta, na via pública, desprovido de qualquer açaime e/ou trela,
perdendo de vista o animal e permitindo que o mesmo andasse pela via pública,
desacompanhado.
66. O arguido, conhecendo as características do animal, sabia e tinha plena
consciência que ao exaltar-se com uma pessoa, no caso o ofendido EE, representando
atos de violência e exaltação, na presença do referido canídeo, estaria a atiçar os seus
comportamentos de ira e de atuação violenta, o que, não obstante, e mesmo
conhecedor de tal, ainda assim não se coibiu de assim agir, como agiu, como fez.
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que não será inferior ao valor mínimo que, em cada caso, a lei exija no âmbito dos
seguros obrigatórios, seja qual for o número de pessoas lesadas por um sinistro. São
ainda limites de indemnização:
a. Por sinistro: o limite de indemnização por sinistro previsto no contrato representa o
montante máximo pelo qual o Segurador responde no âmbito de todas as
indemnizações, exigidas ao Segurado;
b. Por anuidade: o limite de indemnização anual previsto no contrato representa o
montante total que o Segurador, dentro do âmbito referido em a), despenderá durante
um ano de seguro, qualquer que seja o número de sinistros.
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precedentes, concretamente:
i. € 342,34, para Inglês e praia.
ii. € 55,00 para frequência da creche.
89. Em consequência dos factos descritos em 1 a 23, a assistente CC despendeu a
quantia de € 195,47, para pagamento do seguinte:
a. € 50,81 com medicação para si;
b. € 6,75 com medicação para a sua filha BB;
c. pelo menos a quantia de € 20,00, com combustível para deslocações para visitar a
sua filha BB no período de internamento
d. € 85,91 com o episódio de urgência n.º ..., na Unidade Local de Saúde, EPE;
e. € 32,00 com uma ida à urgência em 25/04/2017 e 2 consultas externas, uma em
28/04/2017 e outra em 05/05/2017, junto do Centro Hospitalar ..., E.P.E.;
90. Em consequência dos factos descritos em 1 a 23, o assistente EE despendeu a
quantia global de € 198,30, de acordo com a discriminação seguinte:
a. € 19,00 com o episódio de urgência n.º ... e com o exame ao punho «2 incidências»;
b. € 30,00, € 20,00, € 31,00, € 30,00, € 31,00 com combustível;
c. € 37,30 com estacionamento,
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regulares.
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Foi considerado não provado, com relevo para a decisão da causa, que:
a) O cão encontrava-se desprovido de qualquer mecanismo de segurança,
designadamente coleira.
b) O canídeo estava enraivecido.
c) O arguido nada fez para que cessassem os ataques do canídeo.
d) O ofendido EE acabou por ser mordido no punho esquerdo, concretamente na face
cubital dorsal do punho esquerdo.
e) O arguido apressou-se a pegar no canídeo e colocar-se em fuga do local.
f) O arguido levou o canídeo para o deixar escondido na marquise.
g) O arguido trocou de roupa de forma a evitar ser identificado.
h) O sangue foi deixado na camisola do arguido pelo canídeo quando o agarrou para
conduzir para a sua habitação
i) Em resultado dos factos, o ofendido EE padeceu de escoriação na região mandibular
esquerda, de lesão de mordedura na face cubital dorsal do punho esquerdo.
j) As cicatrizes causadas ao ofendido DD, pese embora não sejam desfigurantes, são
permanentes.
k) Os ataques e as lesões teriam ocorrido, mesmo que o cão trouxesse açaimo e
viesse preso na trela.
l) O canídeo, por não ser esterilizado, encontrava-se especialmente tempestuoso,
imprevisível e mais facilmente violento.
m) A esterilização do canídeo é uma medida profilática que tem por objetivo reduzir a
agressividade do canídeo.
n) Tal falta de esterilização potenciou a agressividade e perigosidade do canídeo “...”,
tendo contribuído, de forma decisiva, para a verificação do ataque.
o) O arguido sabia que era proibida a presença de cães devidamente esterilizados na
via pública.
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factos, entre o momento em que foi à janela e o momento em que desceu as escadas
e chegou à rua.
Acresce que, em face das divergências que esta testemunha veio trazer relativamente
aos depoimentos e declarações que a precederam (supra), foi realizada uma
acareação entre esta, o assistente EE e a testemunha DD, no âmbito da qual, embora
mantendo todos a versão que haviam trazido a juízo, se tornou evidente que a
testemunha GG admite a possibilidade de a sua perceção não corresponder
exatamente ao que sucedeu.
Isto, concatenado com os elementos objetivos já elencados, conduziu o Tribunal a
desconsiderar o seu relato quanto à parte do segundo ataque do canídeo e, em rigor,
quanto à forma como o arguido retirou o canídeo do local e quanto ao facto de o ter
agarrado ou não.
*
Em jeito de conclusão, acrescenta-se que, como é do senso comum, não é raro que,
perante situações traumáticas, as vítimas, ou as testemunhas, se foquem num
pormenor do agressor ou dos factos, e obnubilem ou aniquilem, da sua memória, os
demais pormenores ou fatores, ficando convictos da sua inexistência ou de uma
realidade distinta. Mas tal não significa que as mesmas estejam a (e muito menos que
queiram) mentir.
Crê-se que foi o que aconteceu com os assistentes quanto à atitude do arguido para
fazer cessar os ataques, e que pode ter acontecido com a testemunha DD quanto ao
uso de dispositivo de segurança, quando afirmou, de forma até veemente, que o
canídeo dispunha de uma coleira, que poderia ter ou não. No que concerne a esta
testemunha, a mesma focou-se no olhar do canídeo, tendo inclusive referido no seu
relato que este fixou o olhar em si, pormenor que – crê-se – modelou a sua memória,
podendo ter prejudicado o rigor do seu depoimento acerca dos dispositivos de
segurança, mas sem que tal tenha toldado a sua perceção quanto à cadência de factos
ou quanto aos outros pormenores.
Naquele detalhe, incorreu o Tribunal numa dúvida insanável, sobre se o cão traria um
colete – conforme afirmou o arguido e consta do fotograma de fls. 16 (foto, contudo,
tirada após os factos, desconhecendo-se quanto tempo após, mas sabendo-se que foi
algum tempo) –, coleira (como indicou a testemunha DD), ou se não traria nenhum
deles, conforme atestaram de forma veemente os assistentes.
O que é um facto é que quer o arguido, quer a testemunha DD asseguraram (apenas
contrariados objetivamente pela testemunha GG) que aquele arrastou o cão até casa
com uma trela, pelo que esta haveria de estar presa a um daqueles dispositivos.
No entanto, e no que tange concretamente ao dispositivo de segurança ao qual a trela
poderia ter sido presa, não logrou o Tribunal concluir o que quer que fosse, atenta a
disparidade supra descrita.
Ora, perante um non liquet como o acabado de referir, não pode o julgador correr o
risco de praticar um erro judiciário, ao decidir contra o arguido sem a certeza
juridicamente exigível. Com efeito, o artigo 32.º, n.º 2, da Constituição da República
Portuguesa (doravante, CRP) determina, como uma das garantias elementares do
processo criminal, a presunção da inocência, a qual configura um direito fundamental e
é diretamente aplicada, ex ui o artigo 18.º, n.º 1, da CRP, decorrendo, aliás, do
princípio da dignidade humana (artigo 1.º, da CRP) e do Estado de Direito Democrático
(artigo 2.º, da CRP).
Tal garantia emana, ainda, dos artigos 11.º, n.º 1, da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, 6.º, n.º 2, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, 14.º, n.º 2, do
Pacto Internacional do Direitos Civis e Políticos, 48.º, n.º 1, da Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia, e 3.º, da Diretiva (UE) 2016/343 do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016 (Jornal Oficial da União Europeia n.º L
65/1, de 11 de março de 2016), todos diretamente aplicáveis na Ordem Jurídica
Portuguesa ex ui artigo 8.º, da CRP.
Uma das suas dimensões expressa-se no princípio in dubio, pro reo, que determina
que, em caso de dúvida racional quanto aos factos, haverá que valorar a prova a favor
do arguido. A dúvida razoável existirá quando não for possível, no momento da decisão
final, afastar a dúvida inicial típica do processo penal e asseverar, com a certeza
juridicamente aceitável, em determinado sentido.
A dúvida plantada no Tribunal quanto ao não uso de qualquer dispositivo de segurança
não é, de todo, ultrapassável, motivo pelo qual não se deu isso como demonstrado,
http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/08c8eff1b5233a9680258956003e8e0f?OpenDocument Página 23 de 51
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apenas se tendo dado como provado que este não trazia trela ou açaime no início e no
decorrer dos ataques, o que foi confirmado por todos, incluindo pelo arguido. Ademais,
tal facto é compatível com os demais elementos objetivos de prova nos autos.
*
No que concerne ao segundo ataque e ao arrastamento da ofendida BB, a versão do
arguido – que os nega – não prevaleceu, pois (crê-se) o arguido nem sequer se terá
apercebido da concreta dinâmica dessas partes do incidente.
Com efeito, os ataques do canídeo decorreram na sequência de um, e, em rigor,
durante um, desentendimento entre o assistente EE e o arguido, o que distribuiu a
atenção deste entre as duas circunstâncias. O arguido estaria preocupado com a
fotografia que o assistente lhe terá tirado, e tentou chegar ao respetivo telemóvel já
depois do primeiro ataque, tendo canalizado a sua atenção para tanto, não tendo, por
isso, assimilado a segunda parte dos factos. É esta a firme convicção do Tribunal.
Embora o arguido negue ter tentado tirar o telemóvel ao assistente, tal foi confirmado
por este último de forma credível e lógica, e é o mais compatível com a dinâmica dos
acontecimentos, nomeadamente com o largar inadvertido do cão, pelo assistente, após
ter finalmente conseguido segurá-lo.
Acresce que, da concatenação das declarações dos assistentes com o depoimento da
testemunha DD, extrai-se com segurança a existência do segundo ataque, até porque
tal converge (rectius: é a única versão que converge) com as fotografias de fls. 15 –
onde se visualiza o sangue na parede da esquina onde este sucedeu (tal como
explicaram a assistente CC e as testemunhas DD e GG) – e com as lesões sofridas
pela assistente e pelo ofendido DD, que os próprios atestaram, e que estão
documentadas a fls. 222 a 224, 229, 246 a 250, 312, 329 a 330 (quanto à assistente) e
a fls. 282 e 282 verso, de fls. 297 a 299, e nas perícias de fls. 269 a 271, de fls. 315 e
seguintes (quanto ao ofendido DD), assim conferindo lógica à sua verificação.
Na verdade, se não tivesse havido a segunda parte do ataque conforme relatada,
nenhuma explicação haveria para as lesões que a assistente e a testemunha/ofendido
DD sofreram na mesma data, hora e local e com a mesma origem (mordedura de cão).
**
Já no que tange às consequências dos ataques, foram essenciais os esclarecimentos
de II, médica especialista em otorrinolaringologia, perita subscritora do relatório pericial
de fls. 515 a 519, e os depoimentos das testemunhas JJ, psicóloga e terapeuta do
assistente EE.
Com efeito, II esclareceu o Tribunal, de forma perfeitamente circunstanciada, e
sustentada em conhecimento clínico e direto do estado clínico da ofendida BB, tendo
sido absolutamente isenta e desinteressada. Atestou, com segurança e clareza, por
referência a 24/10/2020, as consequências dos factos ao nível da audição da ofendida
BB, bem assim como os procedimentos que a esperam para eventualmente a
recuperar em pleno.
Tudo também perfeita e amplamente descrito em todos os elementos clínicos dos
autos referentes à ofendida BB e muito especialmente nas perícias do INML.
*
JJ prestou um depoimento de forma isenta, credível, profissional e sustentada, embora
referenciada à fase anterior ao início da pandemia, pois desde então que não tem
acompanhado o assistente (em virtude de encerramento temporário da clínica onde o
fazia), reconhecendo contudo a necessidade de continuar o acompanhamento.
Explicou a profundidade do choque e do trauma sofrido pelo assistente EE, que, sendo
embora próximo de um stress pós-traumático, não poderá ser assim diagnosticado,
para já, com segurança, o que levou o Tribunal a afastar a prova desse facto, apenas
se tendo dado como provada a existência de ansiedade pós-trauma, na sequência do
que esta assegurou.
Mais atestou o sofrimento que o assistente EE tem tido, bem assim como a
necessidade de medicação.
*
As condições socioeconómicas do arguido resultaram do relatório social com a ref.
citius 30566368 e do seu contributo, que atualizou as informações dali constantes, e os
antecedentes criminais, do teor do respetivo certificado de registo criminal, com a ref.
citius 31986453.
*
Assim:
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que nunca o levou ao colo, de maneira que a que a camisola tivesse ficado com
sangue. Disso tem o arguido a certeza.
De resto, aqui, uma vez mais a testemunha GG perdeu credibilidade, porque afirmou –
contra as declarações do arguido e da testemunha DD – que o cão foi agarrado pelo
arguido.
O facto provado n.º 24 é fruto, ainda, do auto de detenção de fls. 5 a 7 e do auto de
busca e apreensão de fls. 20.
Os factos provados n.º 26 a 28 espelham a auto de reportagem fotográfica de fls. 12 e
seguintes, o auto de busca e apreensão de fls. 20, a autorização de fls. 10 e o auto de
notícia por detenção de fls. 5 a 7.
O facto 28 resulta, ainda, do relatório de inspeção judiciária de fls. 67 e seguintes.
O facto provado n.º 29 resulta da ficha de urgência de fls. 76, exceto quanto à
intervenção cirúrgica e sua relação com os factos (nexo causal), sendo que estas
espelham as fls. 111 e 112. 124 e s. (cirurgia e nexo).
Os factos provados n.º 30 a 33 vertem fls. 111 e 124 e s., o facto provado n.º 34 fls.
169, e cálculo aritmético (quanto ao n.º de dias); o facto provado n.º 35 espelha a
perícia com a ref. citius 30372698, perícia de fls. 438 verso e seguintes, o facto 36, a
perícia de fls. 428 verso e seguintes e de fls. 447, as declarações dos assistentes e,
em geral os documentos clínicos dos autos.
O facto provado n.º 37 resulta de fls. 252 (documento emitido pelo Hospital 1...). O
facto provado n.º 38 é fruto da perícia de fls. 447, e documentos clínicos de fls. 451. O
facto provado n.º 39 perícia de fls. 447; nota de alta de fls. 470, relato cirúrgico de fls.
474.
O facto provado n.º 40 obteve-se com base nas consultas: fls. 379 e seguintes e ofício
de 389; no audiograma: prescrição de fls. 377, na folha clínica de admissão e alta, na
fls. 468 (donde consta a data correta) e na nota de alta de fls. 470.
O facto provado n.º 41 é fruto de fls. 426 (relatório médico donde se retira a
identificação da ofendida BB e a submissão a adenoidectomia, em outubro de 2018),
fls. 458 a 500, com especial destaque no relato cirúrgico de fls. 474 e no boletim de
enfermagem de fls. 475 e s., história clínica de fls. 479, ficha de internamento de fls.
480 (quanto à cirurgia de outubro de 2018), declaração de fls. 481 (atestado, onde
consta a data correta como sendo 13/10/2018 e todos os dados clínicos de fls.
seguintes, datam de 2018, logo, os mencionados tratamentos teriam de ter sido
realizados a 2018), registo de fármacos prescritos de fls. 483, fls. 484 e 484 verso. fls.
485 (folha clínica de admissão e alta), 486 (nota de alta), fls. 489 e s. (relatório do
bloco), fls. 491 (relatório geral), relato cirúrgico de fls. 492, registo de recobro de fls.
493, registo do bloco de otorrino de fls. 494, história clínica de fls. 495, ficha de
internamento de fls. 496, atestado de fls. 497, registo de fármacos de fls. 499, folha de
vigilância de fls. 500, quanto à cirurgia de 22/01/2020; Perícia de fls. 504 e seguintes e
ref. citius 30372739.
O facto provado n.º 42 é fruto da ficha de consulta externa de fls. 379 e seguintes, das
perícias de fls. 438 verso e seguintes, com a ref. citius 30372739. Os pontos a. e b. do
facto n.º 42 retiraram-se da perícia com a ref. citius 30372739, e o ponto c., além
desta, também da perícia de fls. 515 e seguintes.
O facto provado n.º 43 resulta do relatório de acompanhamento psicológico de fls. 430
verso, do relatório de fls. 428, das declarações dos assistentes, da perícia com a ref.
citius 30372739, CC, refere que inicialmente eram, sendo agora mais esporádicos.
O facto n.º 44 reflete o relatório de acompanhamento psicológico de fls. 430 verso, o
relatório de fls. 428 e as declarações da assistente.
O facto n.º 45 espelha as declarações da assistente, o relatório médico de fls. 460 e a
perícia e fls. 321 e seguintes.
O facto n.º 46 verte as declarações da assistente, concatenadas com (pois confirmam
e atualizam) a informação vertida no relatório de fls. 428.
O facto provado n.º 47 espelha o relatório de urgência fls. 248 e s., 250, as
declarações dos assistentes e o depoimento de DD, bem assim como a perícia com a
ref. citius 30372698 e respetivos esclarecimentos oferecidos pelo INML (ref. citius
31567464), donde também se extraiu os factos provados n.º 48 a 53.
Os factos provados n.º 49 e 50 (aqui, quanto ao nexo causal) refletem, também, as
declarações da assistente.
O facto provado n.º 52 obteve-se com base em fls. 312 (acompanhamento
psicológico); fls. 330 (relatório clínico); perícia com a ref. citius 30372698, donde
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Os factos provados n.º 107 a 120 refletem o relatório social com a ref. citius 30566368,
sendo que o facto 121 verte as declarações do arguido e o facto 123 o certificado do
registo criminal com a ref. citius 31986453.
*
No que aos factos não provados respeita, o facto a) foi assim qualificado, conforme
supra se explanou, por força do princípio da presunção de inocência, pois, não
havendo uniformidade entre os depoimentos das testemunhas, as declarações dos
assistentes e as do arguido, e tendo em conta a existência do fotograma de fls. 16,
cujo contexto o Tribunal desconhece, forçoso foi não levar aos factos provados que o
cão não trouxesse qualquer dispositivo de segurança. Na verdade, certezas nessa
matéria, apenas existem as de que, antes dos, e durante os, ataques, o cão não trazia
trela nem açaime. Quanto ao mais, não pôde o Tribunal ultrapassar a dúvida razoável.
O facto não provado b) resulta de não haver prova nesse sentido, apenas existindo –
isso sim – no sentido de que o mesmo se encontraria agitado (o que foi dado como
provado).
O facto não provado c) resulta da prova do contrário, o que foi atestado pelo arguido e
pelas testemunhas DD e GG, na medida do que foi levado aos factos provados.
O facto não provado d) emerge das declarações do próprio assistente EE, que admitiu
não ter sido vítima de qualquer mordedura – o que, como se explicou supra, se
sobrepôs à informação de fls. 212.
Os factos não provados e) a g) foram assim entendidos pelo Tribunal, pois acreditou
nas declarações do arguido, que, de resto, fazem sentido. Na verdade, este afirmou ter
saído do local com o canídeo para o resguardar – melhor dizendo: proteger as pessoas
daquele –, já que claramente não estava a conseguir controlá-lo. De resto, as próprias
circunstâncias ditavam precisamente uma retirada emergente e rápida, pois que, se o
canídeo não fosse retirado, agitado e com o sabor do sangue, como estava,
representava um perigo ainda maior.
Não se demonstrou que o arguido tivesse querido fugir, nem tão-pouco esconder o
cão, não podendo o Tribunal concluí-lo sem mais. Acresce que o arguido afirmou ter
tirado a roupa por estar suja, o que se crê fazer sentido e ser credível, natural e
razoável, tendo, uma vez mais, o Tribunal acreditado no arguido.
O facto não provado h) foi assim qualificado por não ter sido possível apurar donde
proveio o sangue. Na verdade, os depoimentos e declarações sobre o assunto são
confusos nessa parte. Por um lado, apenas se demonstrou que o arguido tenha
tentado cessar os ataques com base em palmadas e comandos de voz – não a agarrar
o canídeo (o que o próprio referiu) –, mas, por outro, a saída do local deu-se com o cão
pela trela, o que não permitiu ao Tribunal compreender em que momento o sangue ali
foi parar. Pode tê-lo sido a partir das próprias mãos do arguido, ou das vítimas.
Ademais, o próprio arguido diz que nunca agarrou o cão e que não pode ter ficado com
sangue na camisola por esse motivo.
O facto não provado i) foi contrariado pelas declarações do assistente, que afirma
perentoriamente não ter sido mordido e não referiu qualquer lesão na região
mandibular. Os factos não provados j) e k) resultam da absoluta ausência de prova
sobre os mesmos. Quanto ao j), a natureza permanente das cicatrizes não consta das
perícias, nem foi referida pelo próprio. Quanto ao k), além de não ter havido prova,
sempre as regras da experiência comum ditariam em sentido contrário, pois a verdade
é que a probabilidade de suceder um ataque e um ataque desta envergadura se o cão
tivesse os dispositivos de segurança colocados (concretamente o açaime e a trela), é
diminuta, se não mesmo nula.
Os factos não provados l) a n) são fruto de uma absoluta ausência de prova dos
mesmos. Inexiste nos autos um único elemento de prova sobre tais factos, não sendo
as regras de experiência (ou sequer a presunção judicial) suficientes para os extrair.
O facto não provado o) baseou-se nas declarações do arguido, que o atestou. De
resto, também não se provaram os factos subjacentes, donde, sem tais premissas,
jamais aquele facto poderia ter sido dado como provado.
O facto não provado p) é fruto da prova do contrário (emergente dos depoimentos de
DD e de GG e das declarações do arguido).
O facto não provado q) emerge das declarações do próprio assistente, que o nega
perentoriamente.
O facto não provado r) é fruto de ausência de prova. Na verdade, apenas o que consta
dos factos provados n.º 101 a 103 se pôde dar como provado, pois só isso resultou dos
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 07/09/23, 12:17
exame crítico que se impõe ao Tribunal na fundamentação das suas decisões, com
respeito pelos princípios da imediação e da livre apreciação da prova.
E esta posição está igualmente associada à ideia – que é preciso não perder de vista –
de que o reexame da matéria de facto não de destina a realizar um segundo
julgamento pelo Tribunal da Relação, mas tão-somente a corrigir erros de julgamento
em que possa ter incorrido a 1.ª Instância.
Neste sentido, que é pacífico, decidiu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
de 20-09-2017[3]:
«I - O reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso não constitui, salvo os
casos de renovação da prova, uma nova ou uma suplementar audiência, de e para
produção e apreciação de prova, sendo antes uma actividade de fiscalização e de
controlo da decisão proferida sobre a matéria de facto, rigorosamente delimitada pela
lei aos pontos de facto que o recorrente entende erradamente julgados e ao reexame
das provas que sustentam esse entendimento – art. 412.º, n.º 2, als. a) e b), do CPP.
II - O recurso da matéria de facto não visa a prolação de uma segunda decisão de
facto, antes e tão só a sindicação da já proferida.»
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 07/09/23, 12:17
(a mesma já tinha medo de cães) já se tinha e vinha e estava mais focado nela.
Relativamente ao demais, pretende o recorrente que se esmiúce melhor a matéria
fáctica apurada no sentido proposto, ou seja:
A) Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o referido canídeo com o nome “...” que se
encontrava solto e fora do campo de visão do Arguido, aproximou-se (ainda sem que o
Arguido tivesse chegado ao local) do Assistente EE e da sua filha, a BB, o que causou
medo nesta última.
B) Com o que, acto contínuo, o referido canídeo acabou por se aproximar ainda mais
do Assistente EE e da sua filha, o que terá levado o Assistente a colocá-la nas suas
costas, entre si e a parede.
C) Nesse momento, e porque o animal se tentava aproximar da sua filha, o Assistente
manteve-a atrás de si (fora do alcance do animal) e foi tentando enxotá-lo com as
pernas e com as mãos, tendo chegado a socá-lo no focinho.
D) Após ter desferido um soco no focinho do animal, o canídeo afastou-se do local
onde o Assistente se encontrava com a sua filha.
E) Entretanto, após ter aparecido o Arguido, perante a abordagem do Assistente EE
que lhe solicitou que prendesse o referido canídeo e o segurasse, aquele ripostou
dizendo que o Assistente não era qualquer autoridade para o obrigar a nada e voltou
ao seu percurso.
Ouvida a prova, este tribunal nada tem a opor, uma vez que tal como vem ora descrita
a dinâmica dos acontecimentos ela é melhor retratada, atendendo ao depoimento do
assistente e arguido na parte que convenceram o tribunal ad quo e ad quem, não
sendo propriamente um erro de julgamento, mas mais uma pormenorização do
acontecido salvo no que diz respeito à tentativa de morder e ao ponto 9 fixado pelo
tribunal e parte do ponto 10 pelo que altera-se a matéria fáctica nos seguintes termos:
6) Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o referido canídeo com o nome “...” que se
encontrava solto e fora do campo de visão do Arguido, aproximou-se (ainda sem que o
Arguido tivesse chegado ao local) do Assistente EE e da sua filha, a BB, o que causou
medo nesta última.
7) Com o que, ato contínuo, o referido canídeo acabou por se aproximar ainda mais do
Assistente EE e da sua filha, e, assim, tentou mordê-la, o que apenas não conseguiu
porquanto o assistente a colocou nas suas costas, entre si e a parede a fim de a
proteger.
7.A) Nesse momento, e porque o animal se tentava aproximar da sua filha, o
Assistente manteve-a atrás de si (fora do alcance do animal) e foi tentando enxotá-lo
com as pernas e com as mãos, tendo chegado a socá-lo no focinho.
7.B) Após ter desferido um soco no focinho do animal, o canídeo afastou-se do local
onde o Assistente se encontrava com a sua filha.
8) Entretanto, após ter aparecido o Arguido, perante a abordagem do Assistente EE
que lhe solicitou que prendesse o referido canídeo e o segurasse, aquele ripostou
dizendo que o Assistente não era qualquer autoridade para o obrigar a nada.
9. Mantém-se.
9.A.) Em ato contínuo, isto é, logo após o canídeo se ter afastado daquele local, o
Assistente resolveu tirar uma fotografia.
10) Mantém-se parte da redação encontrada pelo tribunal acrescentando outra ficando
redação definitiva a seguinte: Ao aperceber-se o arguido AA de que o ofendido EE
poderia estar a tirar-lhes uma fotografia, exaltou-se e dirigiu-se a este último com o
propósito de lhe retirar o telemóvel, elevando o tom de voz nas expressões que lhe
dirigia e abeirando-se sobre o corpo do ofendido EE passando ambos a discutir
verbalmente em tom de voz elevado.
Relativamente à discussão em tom elevado ela sustenta-se de facto nos depoimentos
quer do arguido quer do assistente EE, quer nos depoimentos de DD e CC que
estavam na capela mortuária e aí ouviram a discussão e os gritos da criança.
Impugna ainda o arguido o ponto 11), sustentando-se nos depoimentos do arguido, do
assistente EE, de DD e CC.
Ora, cumpre desde já dizer que tanto DD como CC só surgem depois. Não
presenciaram os momentos que antecederam o ataque à criança após o início da
discussão. Quando surgem já a criança se encontra a ser mordida. Por sua vez GG
surge já depois duma primeira retirada da criança de junto do primeiro ataque do cão.
Relativamente aos gritos da criança de facto tanto o arguido como o assistente EE e
ainda a testemunha DD e a assistente CC dão conta que a criança gritou. Assistindo à
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 07/09/23, 12:17
discussão do pai com o arguido é curial que a criança se tenha assustado ainda mais,
gritado, como aliás pai e arguido deram a entender.
Inexiste prova produzida que sustente ou imponha versão contrária à encontrada para
o ponto 11. com exceção dos gritos da menina. Tendo presente a versão em que o
tribunal se sustentou, a do assistente EE e ainda mais à frente na da testemunha DD, o
arguido não chegou a prender o cão e irritado com as fotografias que o assistente EE
tirou focou-se em confrontá-lo e em retirar-lhe o telemóvel, mesmo na presença de
uma criança, descurando completamente o cão. Não só se abeirou do assistente como
tentou tirar-lhe o telemóvel, o cão ficou em rédea solta. Ora o confronto assustou ainda
mais a criança que por força da atitude do arguido que veio confrontar o assistente,
gritou. Centrado na retirada do telemóvel, numa situação conflituosa, agitou e enervou
ainda mais o animal potencialmente perigoso, não cuidando dele assegurando que
estivesse bem preso, pelo contrário, o animal estava solto e agitado assistindo ao
“dono” em confrontação. Dono esse que estava focado no assunto do telemóvel. E foi
por esta atitude que o ataque ocorreu. A discussão e o confronto após a tirada de
fotografias foi da iniciativa do arguido. Quem procurou invadir o espaço físico do
assistente foi o arguido, que veio até ele, o qual descurou completamente o cão,
sabendo inclusive que já tinha sido advertido previamente pelo próprio assistente que o
seu cão não podia andar solto a assustar as pessoas. Foi este o rastilho. E que culpa
tem um pai que vê um cão a abeirar-se da sua filha de tenra idade procurando chegar
a ela para a morder (ainda que não fosse) em chamar a atenção do responsável do
cão e que recebe uma resposta como a que deu o arguido. E que culpa tem um pai
que tirando fotografias para identificar o cão que não cumpria a lei (sem açaime e sem
trela) vê o responsável com atitude agressiva e irritada voltar para trás com cão
potencialmente perigoso não seguro ou mal seguro e sem açaime, em direção ao
assistente iniciando uma discussão com ele na presença de uma criança, procurando
retirar-lhe o telemóvel. E ainda que o assistente também tivesse elevado a voz na
discussão na sequência da atitude do arguido, o ataque do animal não lhe pode ser
minimamente imputável. Foi a situação criada pelo arguido que ali deambulava com
um cão potencialmente perigoso sem trela e sem açaime e que ainda por cima
procurou um confronto com o assistente que se encontrava com uma criança e que
não prendeu e segurou devidamente o animal que estava sem açaime a origem dos
terríveis acontecimentos ocorridos. Se o animal tivesse este dispositivo nada de grave
tinha acontecido, o ataque não teria tido quaisquer consequências graves.
E ainda que se admitisse que o arguido segurava o cão pelo colete, como ele próprio o
refere, pergunta-se como poderia ele em simultâneo garantir a contenção de um cão
agitado com um peso de 80 kgs e de raça potencialmente perigosa e simultaneamente
abeirar-se do assistente tentando tirar-lhe o telemóvel numa situação de discussão?
Não o garantiu, afirmando ter ficado surpreendido com a reação do cão que se soltou.
Mas não era de prever o perigo da situação?
Aliás, é por causa da fixação no telemóvel e o desejo de se apossar do mesmo
retirando-o ao assistente que o arguido nega ao existência do último ataque junto à
capela onde a criança volta novamente a ser abocanhada, a mãe e o Sr. DD mordidos,
mesmo perante a evidência da prova documental e testemunhal. Pois se estivesse
centrado no animal, tinha-o prendido de imediato e retirado do local, quando o
conseguiram separar da criança no ataque após a discussão. Mas não, tal como o
assistente EE o referiu e a testemunha DD o disse, o arguido numa situação grave
como a que estava a ocorrer, onde se procurava proteger uma criança segurando o
animal como estava a fazer o pai assistente EE, aproveitando-se do mesmo se
encontrar no chão a agarrar um cão possante como é um Rottweiler, em vez de o
prender e se centrar no mesmo, ainda se debruça sobre o assistente para tentar tirar-
lhe o telemóvel, veja-se a sua prioridade!. Com o seu comportamento dificultou ainda
mais que o assistente conseguisse reter o animal e distraiu a testemunha DD, que
poderia ter ajudado a conter o animal, que teve de intervir afastando o arguido do
assistente EE. Esta segunda fase do comportamento, poderia eventualmente até
enquadrar-se numa atitude dolosa, que agravaria a sua situação jurídica.
A prova produzida não impõe outra versão a este respeito e como tal manter-se-á o
ponto 17. A versão apresentada pelo recorrente não tem qualquer suporte a não ser
nas declarações do arguido, que o tribunal não aceitou, apreciando devidamente dos
depoimentos quer do assistente EE, quer da testemunha DD cfr. resulta da sua
motivação e das descrições respetivas dos eventos.
http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/08c8eff1b5233a9680258956003e8e0f?OpenDocument Página 33 de 51
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provada e não provada, concretamente que ficou na dúvida se devia ter dado como
provados ou como não provados os factos enunciados sob os pontos impugnados,
nem igualmente se reconhece que a prova produzida nos termos em que vem descrita
na sentença recorrida só podia ter conduzido a tal estado de dúvida. Pelo contrário,
considerando todas as razões indicadas na sentença recorrida para sustentar que o
arguido foi o autor dos factos ilícitos apreciados nestes autos, a decisão tomada
mostra-se conforme às regras da experiência e está apoiada em juízos lógicos sólidos,
adequados e suficientes, pelo que nenhuma censura merece por parte deste Tribunal
de recurso.
Acolhendo esta perspetiva, decidiu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de
08-01-2014[4] que:
«XVI - O princípio in dubio pro reo, baseado no princípio constitucional da presunção
de inocência (art. 32.º, n.º 2, da CRP), constitui um limite normativo da livre convicção
probatória, assumindo uma vertente de direito, passível de controle pelo STJ, quando,
ao debruçar-se sobre o conjunto dos factos, procura detectar se se decidiu contra o
arguido, não declarando a dúvida evidente, já porque esta resultava de uma valoração
emergente do simples texto da decisão recorrida por si ou de acordo com as regras da
experiência comum, de acordo com aquilo que é usual acontecer, já por incurso em
erro notório na apreciação da prova.
XVII - Se a decisão recorrida não manifestou qualquer incerteza, nem qualquer dúvida
acerca das condenações impostas aos arguidos, o tribunal não decidiu «in malam
partem», não se verificando violação do dito princípio.»
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culpas.
Relativamente à medida da pena.
No que diz respeito à participação do arguido para que o ataque cessasse, o tribunal a
quo considerou o seguinte : O arguido viu a menina BB agitada, viu o pai, que lhe
pediu para prender o cão, viu, depois, o ofendido DD a procurar acudir, viu outras
pessoas nas imediações da igreja, viu a mãe/ofendida CC, a segurar a criança ao colo.
Houve, inclusivamente, dois momentos distintos do ataque, sem que, entre ambos, o
arguido haja colocado o açaime ou, pelo menos, a trela ao cão. Trata-se, é certo, de
momentos de aflição, e que passam rapidamente. Mas nestes autos ficou clara a
divisão temporal dos ataques (ainda que sejam sequenciais), diversas oportunidades
de reverter a sua atuação e, por conseguinte, diversas condutas (censuráveis) do
arguido.(…) O arguido não tem antecedentes criminais por crimes idênticos aos dos
autos, nem mesmo por crimes que protejam o mesmo bem jurídico, que o aqui afetado.
Por outro lado, o arguido está socio profissionalmente inserido.
Não obstante, o Tribunal não pôde descurar a evidente falta de cabal interiorização do
desvalor da conduta, e do respetivo resultado, pelo arguido, sendo que, apesar de
reconhecer a sua culpa e que deveria ter chamado o INEM, na verdade, justifica de
forma quase leviana a não aplicação de açaime ao cão e insiste em partilhar
responsabilidade com o assistente. Acresce que, embora não o pondere no
curto/médio prazo, o arguido não descarta a possibilidade de, no futuro, vir a ter um
outro cão de raça potencialmente perigosa.
Na verdade, pese embora os antecedentes criminais do arguido não apontem nesse
sentido, entende o Tribunal que as necessidades de prevenção especial são elevadas,
atenta a postura do arguido de relativização do sucedido e do incumprimento das
normas e deveres a que estaria sujeito, por um lado, e a ponderação de voltar a ter um
canídeo de raça potencialmente perigosa. A sua postura de auto desresponsabilização
– malgrado assuma os factos, que devia ter cumprido os deveres e que deveria ter
chamado o INEM – não anuncia a suficiência de uma pena de multa para a adequação
da sua conduta futura, antes pressagiando a necessidade de uma pena não privativa
de liberdade para que esse desiderato preventivo seja logrado.(…) Dito isto, no
presente caso, o Tribunal sopesou para todos as penas, ainda, os seguintes
fatores:
- as elevadas necessidades de prevenção geral, atendendo à frequência com que
estes cães são avistados na via pública sem dispositivos de segurança (que vieram
vertidas no Projeto do Decreto-Lei que criminaliza a conduta, conforme supra se citou,
e que ainda hoje se mantêm);
- o elevadíssimo grau de ilicitude, manifestado no grau de violação dos deveres, ou
seja, no incumprimento de todos os sistemas de segurança vertidos no artigo 13.º, n.º
2, do Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro, omitindo o uso de caixa de
contenção, açaimo funcional e trela com menos de 1 metro de comprimento. De resto,
trata-se de deveres não meramente sociais ou morais – que existiam –, mas também
legais, assim agravando a ilicitude da conduta. Com efeito, o arguido deslocou-se com
o canídeo, desprotegido, a um local habitualmente frequentado por várias pessoas,
nomeadamente por diversas crianças, deixando-o correr livremente, muito embora
advertido para prender o cão;
- a exponenciação dessa mesma ilicitude pelo facto de, mesmo depois de o cão ter
atacado a criança, o arguido continuar focado noutros assuntos e distraído, não tendo
retirado imediatamente o canídeo do local, que, inclusivamente, se voltou a soltar
repetindo os ataques. E tal distração assenta em motivos censuráveis, desde logo
porque relacionados com a divergência com o assistente (referente à fotografia);
- a conduta do arguido para fazer cessar os ataques, pois, embora se haja dirigido ao
canídeo, ordenando-lhe que parasse, e dando-lhe palmadas, nada mais fez, não tendo
adotado um comportamento suficientemente ativo e eficiente para reverter aqueles
ataques: não o segurou, não se agarrou a ele, não o prendeu, nem mesmo quando
teve oportunidade (quando o assistente o imobilizou). Depois, o arguido, embora enfim
tenha retirado o cão do local para o prender em casa, não chamou ajuda (INEM,
ambulância).
- a evidente não assimilação, por parte do arguido, do desvalor da sua conduta e do
resultado, pois, malgrado reconheça o que fez, reclamou em juízo a partilha da
responsabilidade da sua conduta com o pai da criança, o assistente EE, e ainda
pondera vir a ter outro cão de raça perigosa ou potencialmente perigosa.
http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/08c8eff1b5233a9680258956003e8e0f?OpenDocument Página 36 de 51
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Tendo o Tribunal a quo referido que o arguido nada mais fez do que dar ordens para
que parasse, dando-lhe palmadas, resulta da prova que, se é certo que assim foi no
primeiro ataque feito à menina, já no segundo ataque junto da parede da Capela,
acrescenta-se o facto de ainda o ter puxado.
Contudo, como se pode ver do manancial fáctico para quem se considerava dono do
animal e seu responsável no momento, o seu comportamento foi pouco interventivo e
muito menos ativo do que o dos restantes intervenientes. E de facto não o segurou,
não se agarrou a ele, (como fez o assistente, limitando-se no último ataque a puxar)
não o prendeu, nem mesmo quando teve oportunidade (quando o assistente o
imobilizou). Depois, o arguido, embora enfim tenha retirado o cão do local para o
prender em casa, não chamou ajuda (INEM, ambulância), pelo que o desvalor da sua
conduta não se mostra atenuado para justificar que se mexa na pena concreta
encontrada, a qual se mostra devidamente ponderada, justa e equilibrada.
Improcede nesta parte o recurso.
Recurso de FF.
Afirma a recorrente que a sentença é nula por condenação superior ao pedido nos
termos do art. 615º, n º 1, al.e ) do CPC, uma vez que o pedido foi apenas formulado
contra a seguradora e o arguido AA, não tendo a seguradora deduzido pedido de
reconhecimento e de condenação no direito de regresso a quando da contestação.
Logo conclui que é parte ilegítima, art. 30º do CPC o que constituiu uma exceção
dilatória, pelo que deve ser absolvida nos termos do disposto no art. 576º e 577º do
CPC.
Mais refere que tendo sido chamada através do incidente de intervenção principal
provocada, apenas podia ter sido, se tivesse havido pedido, ser reconhecido e
condenada na satisfação do direito de regresso e não podia ter sido condenada
solidariamente nas indemnizações concretamente fixadas.
Mais refere que não poderá ser responsável por atos ilícitos.
E também não poderia ser responsabilizada pelo risco, por não ter ficado demonstrado
que o arguido tivesse utilizado o canídeo no interesse da chamada recorrente.
Vejamos
Primeiramente para afirmar que o tribunal a quo não considerou que a chamada
tivesse qualquer tipo de responsabilidades a nível da prática de factos ilícitos pelo que
não se coloca qualquer questão associada à responsabilidade por factos ilícitos,
porque a esse respeito o tribunal a quo afastou a imputação de tal responsabilidade à
recorrente FF.
http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/08c8eff1b5233a9680258956003e8e0f?OpenDocument Página 37 de 51
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 07/09/23, 12:17
Da nulidade da sentença.
Como sabemos a nulidade de qualquer decisão penal tem a sua própria base no
processo penal e ela sustenta-se na ocorrência dos vícios do art. 410º do CPP ou
então com a ocorrência de alguma das situações previstas no art. 379º do CPP ou em
outras situações previstas no processo penal, como seja. vg. o uso de métodos
proibidos de prova.
No âmbito da responsabilidade civil, pode ainda recorrer-se, se for o caso, ao disposto
no art. 615º do CPC onde estão também enquadradas situações de nulidade da
sentença em matéria cível.
Estriba-se a recorrente no facto de ter sido condenada em quantidade superior ou em
objeto diverso do pedido, art. 615º, al. e) do CPC.
O que consta da contestação que solicitou a intervenção provocada da recorrente é o
seguinte:
“CONTESTAÇÃO:
Questão Prévia:
1.
Por escritura de fusão, ocorrida em 19/12/2018, a demandada foi incorporada na
sociedade comercial X..., Compañia de Seguros y Reaseguros, passando a ter a
designação social de X..., Compañia de Seguros y Reaseguros, COMPAÑIA DE
SEGUROS E REASEGUROS, S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL, sucedendo nos
direitos e nas obrigações da anterior X..., Compañia de Seguros y Reaseguros S.A.
Quanto à Douta Acusação do Ministério Público:
2.
A demandada cível X… aguarda a prova que vier a ser produzida em audiência de
discussão e julgamento, quer quanto à dinâmica do sinistro, quer quanto às
consequências que dele advieram.
Quanto ao Douto Pedido de Indemnização Cível:
3.
A demandada cível X… declara desconhecer a veracidade dos factos alegados no
douto requerimento dos pedidos de indemnização cível.
4.
Designadamente os factos alegados nos artºs 7º a 31º, inclusive, todos do douto
pedido cível.
5.
O que equivale a impugnação, nos termos e para os efeitos do nº 3 do artº 574º do
Código de Processo Civil.
6.
É certa a existência de um Contrato de Seguro do Ramo X1..., titulado pela Apólice nº
..., que garantia a responsabilidade civil emergente da detenção do canídeo “...”, da
raça Rottweiler, raça esta potencialmente perigosa, nos termos, quer do DL 315/2009,
de 29/10, quer das Condições Gerais e Especiais da Apólice em causa nos presentes
autos.
7.
Conforme se comprova pelas Condições Gerais da Apólice que aqui se junta como
documento nº 1, o Capital previsto para a cobertura Responsabilidade Civil é de
50.000,00 €, pelo que, em face dos diversos pedidos cíveis, terá que ser efectuado o
rateio entre esses mesmos pedidos cíveis.
8.
Estando contratualmente prevista uma franquia de 10% do valor do sinistro, no mínimo
de 125,00 €, franquia essa cujo pagamento caberá sempre à segurada.
9.
Sucede, porém, que, tendo em linha de conta os factos descritos na Douta Acusação,
o sinistro dos autos encontra-se excluído das coberturas da Apólice, e por motivos e
causas diversos.
10.
É absolutamente inquestionável que, na altura do sinistro, ou do ataque, o canídeo “...”
encontrava-se à guarda de um terceiro, que não a sua proprietária e segurada.
11.
Ora, nos termos e para os efeitos das Condições Gerais da Apólice que aqui se junta
como documento nº 2:
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Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 07/09/23, 12:17
12.
Cláusula 3.ª
EXCLUSÕES - 1. Para além das exclusões previstas nas Condições Gerais, fica
excluída do presente contrato a indemnização decorrente de:
a) Danos sofridos pelos próprios animais;
b) Danos sofridos pelo Segurado, empregados do Segurado e seu agregado familiar;
c) Danos causados aos bens de que o Segurado seja proprietário ou usufrutuário;
d) Danos ocorridos quando os animais se encontrem sob o domínio de Terceiros, que
não sejam empregados do Segurado, a qualquer título;
e) Danos ocasionados em consequência de furto, roubo ou desaparecimento dos
animais seguros;
f) Danos causados a veículos transportadores dos animais seguros.
13.
Ou seja, sendo o arguido namorado da segurada, portanto, um terceiro, e não sendo,
como não é, empregado da segurada, está o sinistro dos autos excluído das
coberturas da Apólice em causa.
14.
E tal exclusão tem uma lógica: é que, como estamos perante uma raça potencialmente
perigosa, só mesmo quando o canídeo está à guarda da segurada é que se poderá ter
a garantia que o seu temperamento potencialmente perigoso estará mais controlado.
15.
Precisamente pela questão da habitualidade de tratamento (lembre-se, a este título, a
célebre experiência de Pavlov).
16.
O mesmo se diga a um empregado da segurada, precisamente pelos mesmos motivos:
é quem cuida e trata do canídeo.
17.
Não é o caso dos presentes autos.
18.
Mas há mais uma exclusão.
19.
Atente-se no seguinte artigo das Condições Gerais da Apólice:
20.
Cláusula 5.ª
EXCLUSÕES - Salvo disposição em contrário, expressa nas Condições Gerais, ficam
excluídos do âmbito de cobertura desta garantia os:
a) Acidentes ou danos devidos a actos de guerra, insurreição e terrorismo;
b) Pagamentos devidos a título de responsabilidade criminal, contraordenacional ou
disciplinar;
c) Danos causados aos empregados, assalariados ou mandatários do Segurado,
quando ao serviço deste, desde que tais danos resultem de acidente enquadrável na
legislação de acidentes de trabalho;
d) Danos causados aos sócios, gerentes e legais representantes ou agentes da pessoa
cuja responsabilidade se garante;
e) Danos causados a quaisquer pessoas cuja responsabilidade esteja garantida por
este contrato, bem como ao seu cônjuge, ascendentes e descendentes ou pessoas
que com eles coabitem ou vivam a seu cargo;
f) Danos causados ao detentor, vigilante tratador ou pessoa que habitual ou
esporadicamente tenha a guarda do animal;
g) Danos causados por animais quando na prática da caça e, que, nos termos da lei,
devam estar abrangidos por seguro obrigatório de responsabilidade civil de caçador;
h) Danos decorrentes de acidentes de viação, provocados por veículos que, nos
termos da legislação em vigor sejam obrigados a seguro de responsabilidade civil;
i) Danos decorrentes de custas e quaisquer outras despesas provenientes de
procedimento criminal, fiança, coimas, multas, taxas ou outros encargos de idêntica
natureza;
j) Danos causados pela inobservância das disposições legais em vigor que
regulamentem a detenção de animais de companhia, entendendo-se como tal todos
aqueles que não são considerados como perigosos ou potencialmente perigosos nos
termos da lei;
k) Danos causados pelo transporte de animais em veículos não apropriados para o
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cães de guarda.
34.
O arguido tinha pleno conhecimento que o seu comportamento agressivo e
provocatório iria fazer aumentar, em muito o nível de agressividade e perigosidade do
canídeo “...”.
35.
Repare-se que o arguido, depois do ataque, ausentou-se do local com o canídeo, no
intuito de não ser identificado, tal era a consciência do seu comportamento e conduta.
36.
Tal comportamento integra o direito de regresso previsto na alínea a) da supra
transcrita cláusula.
37.
Justifica-se, assim, a intervenção da segurada da demandada cível, assim como do
arguido, que já tem a qualidade de demandado cível.
38.
Mas também se justifica a intervenção da segurada da demandada cível, e proprietária
do canídeo “...”, por duas ordens de razões, além das que já foram elencadas.
39.
A primeira prende-se com o limite de capital ao montante máximo de 50.000,00 €,
sendo certo que os pedidos cíveis ascendem a 127.408,03 €.
40.
A segunda, prende-se com a franquia contratual já invocada, pela qual responde a
segurada.
Dos documentos juntos pelos demandantes cíveis:
41.
Por terem natureza meramente particular, e sem qualquer obrigação do contrário, a
demandada cível X… declara desconhecer se corresponde à verdade o que está
contido em todos os documentos juntos com os dois pedidos cíveis, que não tenham
sido por si emitidos.
42.
O que declara, nos termos e para os efeitos do nº 2 do artº 374º do Código Civil.
43.
Bem como nos termos e para os efeitos do nº 1 do artº 444º do Código de Processo
Civil.
NESTES TERMOS,
A) deve o pedido cível ser julgado improcedente por não provado, absolvendo-se, por
conseguinte, a demandada cível do pedido;
B) deve ser admitida a intervenção principal provocada de FF, com domicílio na Rua ...
/ ... ....
PROVA TESTEMUNHAL(…)”
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539.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas
Processuais).
Notifique”
Importa saber se a chamada é parte legítima na presente ação, pois que, caso se
considere parte ilegítima, o incidente em apreço tal como foi admitido não o podia ser.
Sabendo que a legitimidade processual, requisito da procedência do pedido, afere-se
pelo pedido e causa de pedir tal como são apresentados pelo autor, o incidente de
intervenção principal provocada supõe uma cotitularidade da relação material
controvertida, com participação do chamado à intervenção.
Verificado este pressuposto, admitido o primeiro modo de chamamento, tal implicará
um alargamento do objeto do processo, que passa a reportar-se não só à relação
jurídica controvertida, como também ao “direito próprio” do interveniente, e à situação
jurídica de que este é titular, uma vez que a pretensão da Autora é deduzida com base
em responsabilidade civil extracontratual da demandada.
Ora, em momento algum da petição inicial os demandantes atribuem qualquer
responsabilidade à chamada na verificação dos eventos. Por sua vez, em sede de
contestação também a demandada seguradora invoca a chamada, mas apenas para
efeitos de direito de regresso, alegando argumentos completamente opostos e
contrários aos da chamada, pelo que não estamos na presença de qualquer situação
de litisconsórcio necessário e voluntário nos termos do disposto no artigo 316.º, n.º 1,
n.º 3 do CPC, nem estamos na presença de uma situação onde existam vários
codevedores solidários, nos termos do disposto no artigo 317.º, n.º1 do CPC, na
medida em que a chamada transferiu por força do contrato de seguro a
responsabilidade para a seguradora e portanto dentro do capital assegurada ela não se
apresenta como codevedora. O contrato de seguro celebrado entre a demandada
companhia seguradora e a chamada FF traduziu-se na criação de uma
responsabilidade conjunta e não solidária, pelo que a obrigação resultado da
celebração de tal contrato não é uma obrigação solidária passiva e não o sendo não
pode ser aplicado o disposto no art. 317º do CPC.
Na intervenção principal, o terceiro é chamado a ocupar na lide a posição de parte
principal, ou seja a mesma posição da parte principal primitiva a que se associa,
fazendo valer um direito próprio (art.º 312º do CPC), podendo apresentar articulados
próprios (art.º 314º do CPC) e sendo a final condenado ou absolvido na sequência da
apreciação da relação jurídica de que é titular efetuada na sentença, a qual forma
quanto a ele caso julgado, resolvendo em definitivo o litígio em cuja discussão (art.º
320º do CPC).
Por sua vez, na intervenção acessória o terceiro é chamado a assumir na lide uma
posição com estatuto de assistente (art.º 323º, nº 1 do CPC) e por isso a sua
intervenção circunscreve-se à discussão das questões que tenham repercussão na
ação de regresso invocada como fundamento do chamamento (art.º 321º, nº 2 do CPC
e a sentença final não aprecia a ação de regresso mas constitui caso julgado às
questões de que dependa o direito de regresso do autor do chamamento, com as
limitações do art.º 323º, nº 3 do CPC).
Em função destas consequências jurídicas da intervenção é fácil de antever que a
faculdade de requerer o chamamento depende obviamente da verificação das
situações em que a lei processual o permite.
No caso dos autos os demandantes nada requereram contra a chamada e a causa de
pedir centra-se no ataque do cão imputando responsabilidades ao comportamento do
arguido AA. Por sua vez a demandada seguradora centra-se apenas no direito de
regresso e com este fundamento que suscita a intervenção da recorrente.
Como resulta da própria epígrafe do preceito, “intervenção de litisconsorte”, o campo
de aplicação da intervenção principal, com exceção da situação prevista no art. 317º
do CPC, passou a estar confinado às situações de litisconsórcio: só pode intervir na
ação, assumindo a posição de parte principal, um terceiro que, por referência ao objeto
da lide, esteja em relação à parte a que se vai associar numa situação de
litisconsórcio, não sendo suficiente para o efeito uma situação de coligação e, muito
menos, uma situação que não preencha sequer os pressupostos da coligação. E isto é
assim quer no tocante à intervenção espontânea quer no tocante à intervenção
provocada, conforme resulta do disposto no art.º 316º do CPC que define os casos em
que o terceiro pode ser chamado pelas partes primitivas.
A figura do litisconsórcio refere-se à situação em que a mesma e única relação material
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Acresce ainda que o tribunal a quo extravasou o que lhe foi pedido, violando o princípio
do dispositivo, princípio basilar do processo civil, o que configura uma nulidade que
afeta a sentença alvo de recurso. E isto porque nenhum pedido foi feito contra a
recorrente por parte dos demandantes, nem estes posteriormente na sequência da
informação chegada aos autos acerca dos limites do capital garantido pela seguradora,
solicitaram a sua ampliação.
É que não obstante o despacho do tribunal a quo ter transitado em julgado, uma coisa
é a admissão e outra é a discussão substantiva das questões subjacentes à ação de
regresso, tendo em atenção que a sentença produz caso julgado em relação ao
chamado relativamente a essas questões.
Por sua vez, não podia o tribunal a quo no despacho que admitiu a intervenção
justificar o seu deferimento dizendo, para além do mais Contudo, no caso dos autos,
constata-se que o valor global dos pedidos cíveis formulados ascende a € 127.408,03,
o que significa que o quantum indemnizatório não se contém no montante do capital
seguro, pelo que existe uma pluralidade de sujeitos da relação obrigacional que
fundamenta a intervenção como parte principal de FF, substituindo-se aos
demandantes. E também não o podia ter feito porque o fundamento suscitado pela
companhia seguradora para suscitar o incidente foi apenas o do direito de regresso.
Violou assim o princípio do dispositivo, art. 3º do CPC o que acarreta a nulidade
daquele despacho com as consequências inerentes na sentença ora em apreciação,
art, 615º, n º 1 al. e) do CPC. pelo que a mesma não pode ser condenada em qualquer
pedido, sem prejuízo dos efeitos decorrentes do chamamento previsto no art. 321º do
CPC para efeitos de regresso.
Tendo ainda presente que se mostra implícito pela alegação da ilegitimidade por parte
da chamada, que a mesma quis neste recurso questionar o incidente de intervenção
provocada, que pressupõe legitimidade, e que ao tribunal não está vedado determinar
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o instituto de intervenção que se mostre mais adequado desde que estejam presentes
os respetivos requisitos, coloca-se a questão de saber se é possível a sua convolação
para a intervenção acessória em sede de recurso.
Pois que neste vigora, entre o mais, a regra de que são as conclusões do recurso que
delimitam o objeto do recurso, o que é um outro modo de dizer que o tribunal de
recurso só decide as questões que lhe forem colocadas e que tenham a ver com as
decisões tomadas pelos tribunais recorridos.
A maioria da jurisprudência vai no sentido de ser admissível o tribunal convolar o
incidente de intervenção principal para o de intervenção acessória, desde que se
encontrem observados os elementos exigidos no incidente de intervenção acessória e
que o chamante os invoque.
A respeito veja-se:
Ac. da Rel. de Lisboa de 8/5/2003, relatado pela Desembargadora FERNANDA ISABEL
PEREIRA e proferido no Proc. nº 10688/2002-6 onde se refere “é legítimo ao tribunal
proceder à correcção oficiosa da forma de incidente de intervenção de terceiros, desde
que o respectivo requerimento comporte os elementos fundamentais da forma
incidental adequada ao caso». Ac. da mesma Relação de 22/4/2004, relatado pela
Desembargadora FÁTIMA GALANTE e proferido no Proc. nº 745/2004-6, onde se
refere “é legítima a correcção oficiosa da forma de incidente de intervenção de
terceiros, desde que o respectivo requerimento comporte os elementos fundamentais
da forma incidental adequada ao caso». Ac. da mesma relação de 31/10/2007, relatado
pela Desembargadora ISABEL TAPADINHAS e proferido no Proc. nº 7889/2007-4,
onde se refere “embora a parte tenha deduzido incidente de intervenção principal
provocada, nada obsta a que o tribunal proceda à correcção oficiosa da forma
incidental desde que o requerimento comporte os elementos fundamentais da forma
incidental adequada ao caso». Ainda no mesmo sentido o Ac. da Rel. do Porto de
15/10/2007, relatado pelo Desembargador ATÁIDE DAS NEVES e proferido no Proc. nº
0733398 onde se refere “apontando a correspondente factualidade alegada para a
existência de um direito de regresso do chamante, nada impede o juiz de, perante tal
factualidade, admitir o chamamento sob a veste adequada de intervenção acessória,
apesar de requerido a título de intervenção principal”. Ac. da mesma Relação de
29/1/2008, relatado pelo Desembargador MARQUES DE CASTILHO e proferido no
Proc. nº 0723574, onde se refere “se os factos alegados pelo réu o permitirem, o
tribunal, ao abrigo do disposto nos arts. 264º, 265º e 664º do CPC, deve qualificar o
incidente como de intervenção acessória provocada, apesar de o réu ter qualificado
indevidamente o incidente como de intervenção principal” e de 24/5/2004, relatado pelo
Desembargador FONSECA RAMOS proferido no Proc. nº 0452695.
Concordamos que é a solução que mais se adapta á lei é a que entende ser possível
ao tribunal convolar oficiosamente para o incidente de intervenção provocada, desde
que a parte alegue os requisitos exigidos pela norma (vg. direito de regresso ou sub
rogação). Porquanto com a reforma do processo civil veio claramente permitir-se a
opção por soluções que privilegiam aspetos de ordem substancial, em detrimento das
questões de natureza meramente formal.
Ao que acresce o princípio da cooperação, previsto no art.º 7. n.º 1, do C.P.C. vigente,
art.º 266º, nº 1 do CPC revogado, que tem por finalidade a obtenção, com brevidade e
eficácia, da justa composição do litígio, visando, por um lado, o apuramento da
verdade sobre a matéria de facto e, com base nela, a obtenção da adequada decisão
de direito; e, por outro o da cooperação em sentido formal, com vista à obtenção, sem
dilações inúteis, das condições para que essa decisão seja proferida no menor período
de tempo compatível com as exigências do processo.
Posto isto, inexistem quaisquer razões que obstem à convolação nesta instância e
assim quer por via de se estar perante um uma intervenção acessória quer pelo facto
de haver violação do princípio do dispositivo, a chamada FF não é sujeito da relação
jurídica material controvertida no processo, já que não foi contra ela, mas contra o
arguido e a ré seguradora, requerente do chamamento, que foi formulado o pedido da
ação, razão porque, a proceder, é a ré e não a chamada, que deve ser condenada. A
recorrente não influência a relação jurídica processual desenvolvida entre os autores e
a chamante e daí que não pode haver condenação quanto a ela não se podendo
sequer fazer constar na parte dispositiva o reconhecimento do direito de regresso
quanto às quantias que vierem a ser pagas ao autor. Ver Ac RLx de 26.05.11.
Posto que a ré seguradora chamou a recorrente para efeitos de direito de regresso,
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A este respeito importa referir que o seu chamamento, ainda que acessório como
acima se expôs mantém relevância no que concerne às questões respeitantes ao
pedido e causa de pedir que tenham repercussão de caso julgado na existência e no
conteúdo do direito de regresso, nomeadamente no direito da seguradora de
restituição ou de indemnização da mesma contra FF pelo montante em que venha a
ser condenada a pagar aos demandantes pela procedência do pedido cível, a qual
emerge do negócio jurídico, contrato de seguro que realizaram e nessa medida não
pode a recorrente pretender ver improcedente o direito de regresso da seguradora,
sobre o qual nem sequer este Tribunal ou o quo podem dispor.
Contudo tem razão quando afirma que o tribunal a quo não deveria fazer menção ao
direito de regresso na parte do dispositivo, pelo que dali deve ser eliminada tal
menção, embora frise-se não tenha havido qualquer condenação a este respeito.
Procede parte do recurso.
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se fosse seu dono não repele a responsabilidade pelo risco que pode impender sobre
outrem nas condições descritas no art. 502º do CPC. Nesta parte improcede o recurso.
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Sucede, no entanto, que a clausula em questão tem por objeto, um conjunto de ações
de profilaxia médica e sanitária destinadas a impedir o desenvolvimento de doenças
entre os animais relativamente v.g à raiva, mas sempre dentro do domínio das doenças
infetocontagiosas ou parasitárias, pretendendo no fundo penalizar quem não
desenvolva de ações de higiene, profilaxia e terapia sanitárias.
O sentido da cláusula é tão só o de evitar o contacto entre animais e a propagação de
doenças de que eles sejam agentes ou veículos e não propriamente o de criar
condições para evitar que os animais possam atacar pessoas, que é a situação que
nos ocupa nos autos.
Para respeitar tal sentido parece, assim, dever entender-se que só estarão excluídos
da cobertura do seguro os danos causados pelo cão por razões sanitárias ou médicas,
como por exemplo os danos decorrentes de doença (v.g. raiva) transmitida pela
mordedura do cão.
O contrato de seguro é um contrato de transferência da responsabilidade civil dos
donos do cão, pelo que as cláusulas do contrato que definem os comportamentos
contratualmente relevantes a observar pelos contraentes se reportam naturalmente à
atuação dos donos do cão e não do próprio cão.
Decisão:
Face ao exposto, acordam os Juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação
do Porto em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, não obstante as
alterações feitas na matéria fáctica supra descritas as quais não tiveram qualquer
relevância para alterar o dispositivo fixado na sentença a quo.
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Conceder parcial provimento ao recurso interposto pela chamada FF, declarando nula
a sentença no que lhe diz respeito, absolvendo-a da condenação solidária no pedido
cível e custas processuais cíveis e eliminado do dispositivo a quo a expressão “ tudo
sem prejuízo do direito de regresso da demandada X..., Compañia de Seguros y
Reaseguros S.A.,.-Sucursal em Portugal sobre a demandada FF.”, assumindo a
chamada a posição acessória no processo.
Custas criminais pelo recorrente AA, fixando-se em 5 UC a taxa de justiça (arts. 513.º,
e 514º do CPP).
Sumário.
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