Você está na página 1de 7

Governo busca contornar impasses

entre trabalhadores e empresas na


regulação de trabalho por
aplicativo; veja o que pode mudar
Proposta deve ser finalizada nos próximos
dias, para envio ao Congresso. No entanto,
partes não entraram em acordo sobre vínculo
entre aplicativos e trabalhadores, além de
outros temas.
Por Guilherme Balza, GloboNews

24/09/2023 04h31 Atualizado há 2 horas



Governo vem discutindo regulamentação dos trabalhadores por


aplicativos — Foto: Reprodução EPTV
O governo federal deve concluir nos próximos dias um projeto
para regulamentar a situação dos trabalhadores por aplicativos. O
tema está sendo tratado há quase cinco meses em um grupo criado no
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

 ✅ Clique aqui para seguir o novo canal do g1 no WhatsApp.


A regulamentação da atividade deve se estruturar em quatro eixos:
1. remuneração mínima;
2. seguridade social;
3. segurança no trabalho;
4. transparência nos pagamentos e critérios dos algoritmos.
No entanto, ainda existe impasse em torno de questões como a
remuneração por hora trabalhada, a alíquota de contribuição para
a Previdência Social, a natureza jurídica dos aplicativos e qual deve
ser o vínculo entre essas empresas e os trabalhadores (veja mais
abaixo).

Reproduzir vídeo
Reproduzir
00:00/04:31
Silenciar som
Minimizar vídeoTela cheia

Lula e Biden lançam programa conjunto de proteção aos direitos


trabalhistas

A definição da proposta ocorre em um momento estratégico. Nesta


semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lançou uma
iniciativa com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, para
proteger direitos trabalhistas, com atenção especial aos que atuam por
aplicativos.
O governo Lula queria concluir a proposta antes da Assembleia
Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) e do encontro com
Biden. No entanto, devido aos impasses entre trabalhadores e
empresas sobre o texto, o prazo foi estendido até o fim deste mês.
Se não houver acordo entre os envolvidos, o governo pretende
elaborar a proposta e encaminhar ao Congresso.
LEIA TAMBÉM:
 Brasil tem 1,6 milhão de pessoas trabalhando como entregadores ou
motoristas de aplicativos
Grupo de trabalho

Reproduzir vídeo
Reproduzir
00:00/02:40
Silenciar som
Minimizar vídeoTela cheia

Trabalho por aplicativos será regulamentado

O grupo que elabora a proposta no Ministério do Trabalho e


Emprego é formado por 45 integrantes. São 15 representantes das
empresas de aplicativos, 15 dos trabalhadores (entregadores e
motoristas) e 15 do governo.
As reuniões são coordenadas por Gilberto Carvalho, petista que
hoje exerce o cargo de secretário Nacional de Economia Solidária
no MTE.
Embora as partes reconheçam que a iniciativa do governo é
fundamental para regular o setor, integrantes do grupo de
trabalho ouvidos pela reportagem afirmam que, até o momento,
houve poucos avanços.
Como condições para fechar o acordo, as empresas querem que o
grupo defina que a natureza jurídica delas é de intermediação do
serviço, e não de transporte. Também querem estabelecer que não
há vínculo trabalhista dos profissionais com as plataformas – os
trabalhadores resistem a esses pontos.
O jornalista e professor Jonas Valente participa do grupo. Ele é
pesquisador do projeto Fairwork, iniciativa baseada na
Universidade de Oxford, no Reino Unido, que analisa condições de
trabalho em plataformas digitais e também acompanha propostas
de regulação dos aplicativos pelo mundo.
Valente afirma que o vínculo dos trabalhadores de aplicativos com
as empresas é um tema central, ainda não enfrentado pelo grupo
de trabalho.
"A criação do GT foi uma iniciativa muito importante. Até o
momento, os debates ficaram mais focados no tema da
remuneração e de possíveis acordos acerca de valores mínimos.
Ainda é preciso ir além e discutir iniciativas regulatórias que
respeitem os direitos já conquistados na legislação e que ataquem
problemas novos e específicos desses trabalhadores. O governo
tem papel fundamental em apoiar uma agenda nesta direção", diz.
A decisão de não tratar da natureza das empresas e dos vínculos
de trabalho foi tomada após as primeiras reuniões. A avaliação dos
representantes do MTE e das partes foi que seria inviável chegar a
um acordo nesse item, cabendo à Justiça do Trabalho, Supremo
Tribunal Federal (STF) ou ao Congresso enfrentar o tema.
"Autônomos não somos. Não definimos o preço das entregas e
corridas. Temos vínculo, carga horária, regularidade e
subordinação. Esse é o ponto mais espinhoso de todos", afirma o
entregador Nicolas Souza Santos, que representa a Aliança
Nacional dos Entregadores de Aplicativos (Anea) no grupo.
"Precisamos discutir o enquadramento econômico das empresas,
demonstrar que elas não são empresas só de intermediação
tecnológica. Queríamos colocar alguns 'pingos nos is', mas não
passamos da discussão da remuneração. E nem esse ponto
conseguimos fechar", continua.
O motorista Leandro da Cruz Medeiros, presidente do Sindicato
dos Trabalhadores com Aplicativos de Transporte Terrestre de São
Paulo, também integra o GT e defende que o debate sobre o
vínculo trabalhista seja feito pelo Judiciário.
"Vínculo a gente não discute porque não é discussão de sindicato
na mesa de negociação, é da Justiça. Este governo colocou as
plataformas na mesa, o único governo que colocou. Conseguimos
avanços importantes em alguns pontos, como em seguridade
social."
As plataformas estão representadas no GT por dois grupos
principais: a Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e
Tecnologia) e o MID (Movimento Inovação Digital).
A Amobitec congrega plataformas como Uber, iFood, Amazon e 99.
Já o MID representa 150 startups com perfis variados, entre elas a
Rappi, OLX e Mercado Livre.
Remuneração
Há duas categorias principais de trabalhadores representadas no
GT: os entregadores e os motoristas de aplicativo.
Os entregadores propuseram às empresas um piso de
remuneração de R$ 35,63 para motociclistas, e de R$ 29,63 para
ciclistas, por hora logada. Ou seja, a partir do momento em que o
aplicativo é ligado e o profissional fica à disposição para as
entregas.
Já as empresas propuseram piso de R$ 12 para motociclistas e
de R$ 7 para os ciclistas por hora rodada. Na proposta das
empresas, o profissional não recebe remuneração enquanto não
estiver em deslocamento para fazer a entrega.
O argumento dos aplicativos é que os entregadores entram em
vários apps ao mesmo tempo, o que gera uma sobreposição que
inviabiliza a remuneração.
Já os trabalhadores argumentam que a demanda por entregas é
controlada pelo aplicativo, e não por eles próprios, então não
consideram justo que só recebam pela hora rodada.
O governo quer fechar questão em torno de um piso de R$ 17 por
hora rodada, mas as negociações ainda não estão concluídas.
Em relação aos motoristas, o pedido da categoria é que seja pago
um piso de R$ 71 por hora rodada, mas as empresas oferecem R$
25. O governo deve propor um mínimo em torno de R$ 35. Há,
ainda, uma discussão sobre levar em consideração a
quilometragem percorrida na definição do piso salarial.
Para o pesquisador Jonas Valente, o desafio é conseguir
contemplar a diversidade dentro dessas categorias de
trabalhadores.
"O GT do governo está focado em entregadores e motoristas, mas
o problema atinge muitas outras categorias de trabalhadores em
plataforma, que também devem ser considerados nessa
discussão", afirma.
Previdência
A alíquota de contribuição ao INSS proposta pelo governo é de
27,5% sobre uma base de cálculo de 50% da remuneração bruta no
caso dos entregadores, e de 25% para os motoristas.
As empresas arcariam com 20% da contribuição e os trabalhadores
com 7,5%. Os motoristas e entregadores, no entanto, defendem
uma redução da parte de contribuição dos trabalhadores.
Segurança e transparência
Os outros dois eixos discutidos são segurança no trabalho e
transparência nas regras dos aplicativos. O governo vai determinar
que as empresas disponibilizem ou exijam itens de segurança aos
entregadores.
Os aplicativos também terão que fazer treinamentos preparatórios
com os trabalhadores, assim que eles assinarem o contrato de
adesão com as empresas.
No eixo transparência, haverá uma obrigação dos aplicativos em
entregar, ao fim do mês, uma espécie de contracheque aos
profissionais, com informações detalhadas sobre o valor pago, os
critérios do algoritmo, além das justificativas sobre eventuais
punições e desligamentos.
O que dizem as empresas
Procurada pela reportagem, a Associação Brasileira de Mobilidade
e Tecnologia (Amobitec) afirmou que tem "interesse em colaborar
para a construção de um modelo regulatório que busque ampliar a
proteção social dos profissionais e garanta um ecossistema
equilibrado para motoristas, passageiros e apps".
"Um dos pressupostos apresentados pela entidade, desde o início
dos debates, refere-se ao reconhecimento de que se trata de uma
nova modalidade de atividade profissional que não se enquadra na
legislação atual que rege as relações trabalhistas tradicionais",
completou.

Você também pode gostar