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Macroeconomia I

por

Ricardo Brito
FEA/USP
O Modelo IS-LM
Ampliado
Pergunta
• Quais as implicações macroeconômicas de choques financeiros?

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Leitura para esta aula
• Blanchard, O. (2018), capítulo 6

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Prêmio de risco e risco
♦ Até aqui assumimos que há apenas um tipo de título. No entanto, existem
diversos tipos.

♦ Eles diferem em vencimento, isto é, o período no qual prometem efetuar


pagamentos.

♦ Também diferem quanto ao risco. Para compensar o risco, os portadores de


títulos exigem um prêmio de risco.

♦ O que determina esse prêmio de risco?

♦ O primeiro fator é a probabilidade de inadimplência.


Prêmio de risco e risco
♦ O segundo fator é o grau de aversão ao risco dos portadores de títulos.

♦ Para mostrar por que isso importa, a figura a seguir representa as taxas de juros
de três tipos de título desde 2000.

♦ Em termos do modelo IS-LM, isso demonstra porque temos de relaxar nossa


suposição de que é a taxa básica que entra na relação IS.

♦ A taxa a que muitos devedores podem contrair empréstimos pode ser muito
mais elevada do que a taxa básica.
Prêmio de risco e risco
♦ Rendimentos de títulos corporativos AAA e BBB e do Tesouro dos EUA com
vencimento em 10 anos, desde 2000:
O papel dos intermediários financeiros
♦ Os intermediários financeiros desenvolvem expertise sobre os clientes e adaptam
os empréstimos às suas necessidades específicas.

♦ Tomam e concedem empréstimos, cobrando uma taxa de juros ligeiramente mais


alta que aquela à qual captaram o recurso, para obter lucro.

♦ Em condições normais, atuam sem problemas.

♦ De vez em quando, no entanto, eles se veem em apuros, e foi isso o que


aconteceu na recente crise.
A escolha da alavancagem
♦ A razão de capital de um banco é definida como a razão entre seu capital e seus
ativos.

♦ A razão de alavancagem de um banco é definida como a razão entre ativos e


capital, então o inverso da razão de capital.

♦ Ao pensar em qual razão de alavancagem escolher, o banco deve equilibrar dois


fatores.
- Uma razão de alavancagem mais alta implica uma taxa de retorno esperado
maior.
- Mas também implica um risco de falência maior.
A escolha da alavancagem
♦ Suponhamos que um banco tenha escolhido sua alavancagem preferida e que o
valor de seus ativos esteja em declínio.

♦ O que ele deverá fazer?

- Pode aumentar o capital, por exemplo, pedindo a outros investidores que


forneçam fundos.
- Ou pode diminuir o tamanho de seu balanço.

♦ No caso em que o ativo bancário é reduzido, o banco reduz seus empréstimos,


ou encerrando-os ou vendendo parte da sua carteira.
A escolha da alavancagem
♦ Agora, consideremos o caso em que os investidores não têm certeza do valor dos
ativos do banco e suspeitem que o valor desses ativos caiu.

♦ Então, a alavancagem pode ter efeitos desastrosos.

♦ Se os investidores tiverem dúvidas sobre o valor dos ativos bancários, o mais


seguro para eles será sacar seus recursos do banco.

♦ Mas isso cria sérios problemas para a instituição, que precisa encontrar fundos
para pagar os investidores.
A escolha da alavancagem
♦ Vender os empréstimos para outro banco provavelmente será difícil também.

♦ O excesso de bancos vendedores causa queda do valor dos ativos dos bancos, e o
banco pode muito bem tornar-se insolvente e ir à falência.

♦ À medida que os investidores percebem que isso pode acontecer, isso lhes dá
ainda mais razão para querer sacar seus fundos, forçando mais vendas
apressadas e piorando o problema.
Queima de estoque
♦ Quanto menor a liquidez dos ativos (ou seja, quanto mais difícil for vendê-los),
maior o risco de queimas de estoque, e maior o risco de que o banco se torne
insolvente e vá à falência.

♦ Quanto maior a liquidez dos passivos (ou seja, quanto mais fácil for para os
investidores resgatarem seus recurso em curto prazo), maior o risco de queimas
de estoque, e maior o risco de que o banco se torne insolvente e vá à falência.

♦ Repetindo: isso é macroeconomicamente relevante porque tais falências podem


ter graves consequências macroeconômicas.
Estendendo o IS-LM
♦ Em suma, devemos distinguir entre:

- Taxa de juros nominal e taxa de juros real.

- Taxa de juros básica fixada pelo Banco Central e as taxas de empréstimos


cobradas dos devedores.
- quanto maior o prêmio de risco , maior será a taxa de empréstimo
para financiar o investimento (ou, financiar os gastos com bens em geral).
Estendendo o IS-LM
♦ Capturamos esses dois aspectos reescrevendo o IS-LM da seguinte maneira:

♦ A relação LM permanece a mesma.

♦ As duas equações evidenciam que a taxa de juros que entra na LM , 𝑖 , não é


mais a mesma taxa de juros que entra na IS , 𝑖 − 𝜋 ! + 𝑥 = 𝑟 + 𝑥 .

♦ Na LM é taxa básica (nominal) (que é determinada pela política monetária), e


♦ Na IS de taxa de empréstimo (real).
Estendendo o IS-LM
♦ Simplificando por ora, assuma 𝜋 ! = 0 . Então, as duas equações ficam:

♦ Então, o BC escolhe a taxa de juros básica real, 𝑟 , diretamente;


♦ mas o juro relevante para as decisões de gastos é a taxa de empréstimo, 𝑟 + 𝑥 ,
que depende adicionalmente do prêmio de risco.

♦ Ambas as equações estão representadas na figura a seguir.


Estendendo o IS-LM
♦ Choques financeiros (𝑥 ↑) e o produto:
Choques financeiros e políticas
♦ Considerando-se que a causa do produto baixo é que a taxa de juros para os
devedores é demasiado elevada, a política monetária parece ser uma ferramenta
melhor.

♦ Em face do aumento de x , o Banco Central deve diminuir r de modo a manter


inalterada r + x , a taxa relevante para as decisões de gastos.

♦ Uma redução suficiente na taxa básica pode, em princípio, bastar para devolver o
produto a seu nível inicial.
... o juro nominal não pode ser
negativo
♦ Para determinar a taxa de juros real 𝑟 de sua escolha, o BC deve levar em conta
a inflação esperada 𝜋 ! :
𝑟 = 𝑖 − 𝜋!

♦ Há um limite inferior zero para a taxa de juros nominal 𝑖 , pois não pode ser
negativa: 𝑖 ≥ 0 .

♦ Isso implica que a taxa de juros real não pode ser inferior à inflação multiplicada
por menos um: 𝑟 ≥ −𝜋 ! .
Choques financeiros e políticas
♦ Choques financeiros, política monetária e produto:
Choques financeiros e políticas
♦ Para simplificar, analisamos um aumento exógeno de x . Mas x pode muito bem
depender do produto.

♦ Uma diminuição no produto aumenta a probabilidade dos devedores não serem


capazes de quitar suas dívidas:
- Empresas que perdem vendas podem ir à falência.
- Trabalhadores que perdem emprego têm dificuldades de pagar
empréstimos.

♦ O aumento do risco acarreta um aumento adicional do prêmio de risco e,


portanto, um aumento adicional da taxa de empréstimo que diminui ainda mais
o produto.
De um problema imobiliário a uma
crise financeira
♦ Os anos 2000 foram um período de taxas de juros inusitadamente baixas.

♦ Os credores hipotecários pareciam cada vez mais dispostos a conceder


empréstimos a mutuários de maior risco.

♦ Em retrospectiva, esses desenvolvimentos eram menos favoráveis do que a


maioria dos economistas imaginava.
♦ Primeiro, os preços dos imóveis poderiam cair em geral, como ficou evidente a
partir de 2006.
De um problema imobiliário a uma
crise financeira
♦ Preços de imóveis residenciais nos EUA desde 2000:
De um problema imobiliário a uma
crise financeira
♦ Segundo, as hipotecas eram muito mais arriscadas do que o credor supunha que
fossem, ou do que o devedor compreendia.

♦ Assim, à medida que os preços dos imóveis residenciais sofreram uma reviravolta
(risco agregado) e muitos devedores ficaram inadimplentes, os credores se
viram diante de grandes perdas.

♦ Em meados de 2008, as perdas em hipotecas foram estimadas em cerca de US$


300 bilhões.
De um problema imobiliário a uma
crise financeira
♦ Poderíamos imaginar que o sistema financeiro absorveria o choque e que o
efeito adverso sobre a produção seria limitado.

♦ Não foi o que aconteceu.

♦ Embora o gatilho da crise tenha sido o declínio dos preços dos imóveis
residenciais, seus efeitos foram imensamente amplificados.
O papel dos intermediários financeiros
♦ Os bancos estavam altamente alavancados. Por quê?

1. As instituições bancárias subestimaram o risco que estavam assumindo.

2. O sistema de compensações e bônus incentivou gerentes a buscarem altos


retornos esperados sem levar em conta o risco de falência.

3. Embora a regulamentação financeira exigisse que os bancos mantivessem sua


razão de capital acima de um mínimo, eles encontraram formas de contornar as
leis.
Securitização
♦ Um importante desenvolvimento financeiro dos anos 1990 e 2000 foi o
crescimento da securitização.

♦ Trata-se da criação de títulos com base em uma cesta de ativos (por exemplo,
uma cesta de empréstimos ou uma cesta de hipotecas).

♦ A securitização é uma forma de diversificar os riscos e envolver um grupo maior


de devedores e investidores em empréstimos.

♦ Mas ela também veio com dois grandes problemas, o que ficou claro durante a
crise.
Securitização
1. Se o banco vendesse a hipoteca que oferecera como parte de uma cesta de
securitização, e, portanto, não a mantivesse em seu balanço, ele teria menos
incentivos para garantir a sua qualidade.

2. Se a agência de rating — empresa que classifica o risco do título — fosse


contratada pelo emissor do título, elas teria mais incentivos para superavaliar sua
qualidade.

♦ Cada vez mais, os bancos dependiam de empréstimos de curto prazo de outros


bancos e outros investidores, ao invés de depósitos à vista, para financiar a
compra de seus ativos, um processo conhecido como financiamento no atacado.
Financiamento no atacado
♦ O resultado dessa combinação de risco subestimado, alta alavancagem, ativos
ilíquidos e passivos líquidos foi uma grave crise financeira.

♦ A complexidade dos títulos detidos pelos bancos dificultava a avaliação de sua


solvência.

♦ Em meados de setembro de 2008, o sistema financeiro estava paralisado.

♦ Os bancos pararam de fazer empréstimos entre si, ou a quem quer que fosse.
Implicações macroeconômicas
♦ Os efeitos imediatos da crise financeira sobre a macroeconomia foram dois:

1. um considerável aumento nas taxas de empréstimo, se conseguissem obtê-los;

2. uma queda acentuada na confiança.

- os acontecimentos disseminaram angústia entre consumidores e empresas.

♦ A evolução dos índices de confiança dos consumidores e das empresas nos


Estados Unidos é mostrada a seguir.
Implicações macroeconômicas
♦ Confiança dos consumidores e das empresas nos EUA, 2007-2011:
Respostas políticas
♦ O alto custo de contrair empréstimos, os preços mais baixos das ações e o menor
nível de confiança, juntos, reduziram a demanda por bens.

♦ Para permitir que os bancos continuassem a usar o financiamento no atacado, o


governo ofereceu um programa de garantia a novas emissões pelos bancos.

♦ O Federal Reserve ofereceu ampla liquidez ao sistema financeiro.

♦ Essas facilidades possibilitavam que os bancos pagassem os investidores sem


vender seus ativos.
Políticas financeiras
♦ O governo introduziu um programa denominado Troubled Asset Relief Program
(TARP) [Programa de Resgate de Ativos Problemáticos], que visava sanear os
bancos.

♦ O novo objetivo passou a ser o aumento do capital dos bancos.

♦ Ao diminuir sua alavancagem, o objetivo do programa consistia em permitir que


os bancos evitassem a falência e, no decorrer do tempo, voltassem ao normal.
Política monetária
♦ Em dezembro de 2008, a taxa baixara a zero.

♦ Como a taxa básica não pode cair abaixo do limite inferior zero, a política
monetária convencional ficou restringida.

♦ O Fed voltou-se, então, para o que ficou conhecido como política monetária não-
convencional.
Política fiscal
♦ Quando o tamanho do choque adverso ficou claro, o governo dos Estados Unidos
recorreu à política fiscal.

♦ O déficit orçamentário do país aumentou de 1,7% do PIB em 2007 para 9,0% em


2010.

♦ A partir de 2011, o déficit foi reduzido e é atualmente muito menor.

♦ A crise financeira levou a um acentuado deslocamento da curva IS para a


esquerda, de IS para IS’.

♦ O resultado foi uma diminuição do produto de Y para Y’.


Política fiscal
♦ A crise financeira e o uso das políticas financeira, fiscal e monetária:
Conceitos e habilidades
• Compreender o diferencial de risco e o papel dos intermediários
financeiros na transmissão dos choques financeiros para a economia
real.

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RicardoBrito@usp.br

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