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Neste trabalho propõe-se um estudo sobre políticas coloniais de terras, entendidas como
instrumentos de regulação do acesso e controlo sobre a terra, em Manica e Sofala entre 1892 e
1942. Pretende-se, ao mesmo tempo, analisar as relações de poder em meio rural nesta região
de Moçambique colonial. Procura-se compreender, em primeiro lugar, como é que, ao longo
de um período de meio século, foi sendo equacionada e resolvida a «questão da terra», ou
seja, como é que a terra foi distribuída entre os diferentes grupos que compunham a
população deste território sob dominação colonial, mas também como é que foi distribuída
para determinados fins, que interesses suscitou, que concepções político-ideológicas e
económicas nortearam essa distribuição e quais foram as suas consequências.
Por outro lado, pretende-se escrutinar o modo como, no quadro deste processo colonial, um
conjunto de forças e processos – relações comerciais, a presença de grupos de colonos e
empresas, por exemplo – independentemente dessas políticas de terras ou por causa delas,
foram condicionando e transformando as relações de poder em meio rural entre diversos
agentes.
«A escolha de uma política fundiária determina o projecto de sociedade que se entende pôr
em prática», afirma-se num estudo sobre a questão da terra em África.1 A instauração de
sistemas coloniais em África no final do século XIX, inclusive através de políticas de terras,
contribuiu para a criação de sociedades desiguais. Um estudo abrangente sobre políticas de
terras nestas sociedades deve ter em conta a forma como diferentes grupos foram afectados
pela distribuição de recursos, como as maiorias africanas, mas também as populações
oriundas do subcontinente indiano e da China e as populações de origem europeia, com
diferentes situações socioeconómicas, como aquelas que se fixaram em várias regiões de
Moçambique. Nesta dissertação procura-se em especial compreender em que medida essas
políticas de terras foram um instrumento de controlo sobre a organização social e produtiva
das populações africanas. O uso, acesso e controlo sobre a terra e outros recursos naturais
eram historicamente objecto de competição e de conflito nas sociedades locais,
principalmente dependentes dos frutos do trabalho agrícola e da pastorícia para a sua
subsistência, mas também já envolvidas em redes de trocas comerciais.
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A Política Laboral da Companhia de Moçambique
Para conduzir os camponeses, com terras e outros meios, a tornarem-se assalariados foi
necessária desde logo uma violência extra económica capaz de arrastar a força de trabalho do
campesinato do território para o trabalho assalariado e, também forçado.
O campesinato que tinha na produção doméstica uma fonte de rendimentos suficientes para as
suas necessidades, manifestava-se pouco receptivo às solicitações do mercado de trabalho.
Por esta razão o problema de mão-de-obra colocava-se no centro das preocupações das
autoridades da Companhia. Afigurava-se pois de importância capital assegurar o fornecimento
a baixos preços para garantir o desenvolvimento da economia colonial.
A primeira medida tomada para a compelir o campesinato para o trabalho assalariado foi a
institucionalização do imposto em dinheiro. E para centralizar o recrutamento e a distribuição
de mão-de-obra foi criada, 1895, a Inspecção-geral dos Negócios Indígenas, repartição central
responsável pela direcção superior de todos os assuntos relativos às relações com a população
africana, particularmente na cobrança de impostos, fornecimento de trabalhadores para os
serviços da Companhia e de particulares bem como a relação com os chefes tribais.
Os infractores podiam ser punidos com pesadas penas como o trabalho correccional
pago a 40% do salário normal.
A chamada emigração clandestina foi considerada crime e, como tal punida com severas
penas que iam até 20 meses de trabalho forçado sem remuneração. Um sistema de
policiamento foi organizado para impedir a fuga de trabalhadores para fora do território
nomeadamente Rodésia do Sul, Niassalândia África do Sul Ou outras partes de Moçambique.
Falta de mão-de-obra. Para minorar o efeito desse fenómeno a Companhia teve que recrutar
trabalhadores de Nampula Tete e Zambézia. Criou a associação do trabalho Indígena para a
angariação de trabalhadores para os serviços particulares. Recrutou menores para
trabalhadores de limpeza, abertura de caminhos-de-ferro e culturas para alimentação dos
trabalhadores.
As Fronteiras de Moçambique
1823- Inglaterra reclama senhorio dos rios e territórios Tembe, Maputo Inhaca e ilhas
1828 deste nome a sul da baía de Lourenço Marques.
1852 Formada a República do Transvaal.
1854 Formado o Estado Livre de Orange.
1858 Livingstone inicia exploração do Lago Niassa e do rio Shire.
1861 Bandeira inglesa é içada na Inhaca.
- Pretorius, presidente do Transvaal, declara pertencer à sua República o território
1869 confinante com a Baía de Maputo - 29 de Julho. Tratado de paz amizade e
comércio entre Portugal e o Transvaal pelo qual foi reconhecida a soberania de
Portugal em todas as terras à volta da Baía de Maputo até a latitude 26º30’S.
1872 Portugal e Inglaterra concordaram em enviar à arbitragem do presidente francês a
questão de Lourenço Marques.
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1875 24 de Julho. Arbitragem internacional de Mac Mahon, presidente francês, sobre os
limites a Sul de Moçambique feita a favor de Portugal.
1877– Anexação britânica do Transvaal
1881
1888 Bandeira portuguesa é içada na Catembe.
1884- Conferência de Berlim
1885
1885 12 de Outubro. Tratado entre Portugal e Ngungunhane em que este reconhece a
soberania portuguesa e se reconhece vassalo de Portugal.
1886 Maio. Convenção de limites entre França e Portugal em que o primeiro reconhecia
a soberania portuguesa nos territórios entre Angola e Moçambique. Dezembro.
Tratado entre Portugal e Alemanha reconhecendo o direito de Portugal exercer a
sua influência entre Angola e Moçambique.
1887 Publicação do Mapa Cor-de-Rosa.
1888 30 de Junho. Delimitação da fronteira entre Moçambique e Swazilândia. Outubro-
Dezembro. Expedição de Paiva de Andrade a Gaza.
1888- Expedições portuguesas para a ocupação de territórios em disputa com a Inglaterra
1889 no Lago Niassa, Chire e Manica
1889 Fundada a British South Africa Company (BSAC) por Cecil Rhodes. Fev/Nov.
Expedição de Paiva de Andrade a Manica e Rodésia (planalto do Zimbabwe).
1889- Nov./Jan. Conflito Luso – Makololo.
1890
1890 11.de Janeiro. Ultimato britânico a Portugal. 20 de Agosto. Primeiro tratado de
fronteiras luso-britânico sobre os limites e áreas de influência. Não é rectificado
por Portugal. 14 de Novembro. Assinatura de um Modus-Vivendi entre Portugal e
Inglaterra a vigorar até à assinatura de acordo de fronteiras. 15 de Novembro.
Prisão de Paiva de Andrade e Manuel de Sousa em Macequece 19 de Novembro.
Ocupação Britânica de Manica
1991 11 de Junho. Tratado de fronteiras entre Portugal e Inglaterra.
1893 Modus-Vivendi enquanto o acordo de 11 de Junho não é aplicado.
1895 Acordo fixa definitivamente a linha de fronteira na região dos Amatongas.
1898 Acordo secreto entre Inglaterra e Alemanha sobre a partilha de Angola e
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Moçambique.
1899 Acordo entre Portugal e Inglaterra sobre a neutralidade portuguesa na guerra
Anglo-Boer em troca da protecção inglesa aos territórios ultramarinos portugueses
As Companhias
1877 Paiva Raposo obteve uma concessão para o desenvolvimento de uma companhia
de ópio, com produção de papoilas.
1878 Paiva de Andrade organizou a “Societé des Fondateurs de la Compagnie Gènérale
du Zambeze” que teve concessões no vale do Zambeze. Faliu pouco depois.
1884 Companhia de Ophir novamente por Paiva de Andrade e com concessões em
Manica e Sofala. Também faliu
1888 Fundação da Companhia de Moçambique (Não Majestática).
1889 A Companhia de Moçambique faz acordo com Ngungunhane pelo qual obtém
direitos mineiros em Manica.
1890 Criada a Companhia de Açúcar de Moçambique (Mopeia).
1891 Reestruturação da C. de Moçambique e elevação à condição de Companhia
majestática. Fundada a Companhia do Niassa.
1894 A Companhia do Niassa toma posse dos territórios do Niassa e Cabo Delgado.
1897 Grupo financeiro “Ibo Sindicate” controla maior parte dos interesses da
companhia.
1899 A “Ibo Investiment Trust” passa a controlar a Companhia do Niassa.
1900 Fundada a Soc. Açucareira da África Oriental, que construiu a fábrica de
Marromeu
1902 A companhia da Zambézia ocupa militarmente a área entre Tete e Niassalândia.
1904
1908 A “Nyassa Consolidated” assume o controlo da Companhia do Niassa.
1910 Fundada a Sena Sugar Factory por Hornung- fundou a fábrica de Caia.
1913-14 Consórcio Alemão obtém maioria das acções da Companhia do Niassa.
1920 Todas as companhias do açúcar do Zambeze foram integradas na Sena Sugar
Estates.
1929 Extinta a Companhia do Niassa.
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1942 Companhia de Moçambique perde direitos majestáticos.
Trabalho Migratório
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1909 Convenção de 1909 entre Moçambique e o Transvaal.
1910 Criada a Intendência dos Negócios Indígenas e Emigração em Lourenço
Marques.
1913 Proibido o recrutamento de trabalhadores para o Transvaal a Norte do
paralelo 22º S.
1914 4 de Julho. Acordo suplementar ao de 1913.
1921 Brito Camacho, Alto-comissário em Moçambique denuncia a Convecção de
1909.
1923 Modus-Vivendi com base na convenção de 1909.
1928 Convenção entre Portugal e África do Sul sobre o trabalho migratório que
propôs restrições ao recrutamento.
Política Laboral
A Agricultura
A nível da agricultura a Companhia cedeu terras a algumas companhias, aos colonos bem,
como manteve algumas terras nas mãos dos camponeses africanos. Deste modo a agricultura
nos territórios da companhia de Moçambique desenvolveu-se a três níveis: a nível das
companhias arrendatárias (Companhia de Gorongosa, Companhia de Luabo, Sociedade
açucareira da África oriental, Companhia colonial do Búzi, etc), que receberam terras da
Companhia; a nível da população colona; e ainda a nível da pequena produção familiar
camponesa.
A Agricultura de Plantação
As Plantações
Viradas para a produção de matérias-primas para o mercado externo como a borracha, o chá,
o algodão a cana-de-açúcar, etc. Grandes extensões de propriedades monoculturais e,
portanto, com grandes exigências em mão-de-obra, as plantações foram desenvolvidas pela
própria Companhia, por algumas companhias subarrendatárias e também por colonos nas
margens dos rios Zambeze, Buzi, Save e no litoral.
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Embora as concessões tivessem sido realizadas a partir da implantação da Companhia só por
volta de 1900 é que começaram a aparecer os primeiros resultados, o que não de estranhar
tendo em conta o facto de ser a plantação um investimento de longo prazo.
Entretanto nas terras da Companhia foram sem dúvida as plantações de cana-de-açúcar que
mais se notabilizaram tanto pelo volume dos investimentos envolvidos, como pela quantidade
de mão-de-obra que mobilizavam, em detrimento da produção familiar de subsistência.
Em 1910 foi fundada por Hornung a Companhia açucareira The Sena Sugar Factory Ltd que
fundou a fábrica da Caia. As dificuldades das diferentes companhias decorrentes da
exiguidade de capitais e das constantes calamidades naturais levaram a integração de todas
elas na Sena Sugar Factory Ltd. Em 1920 passaram a integrar a Sena Sugar Estates de
Hornung, também com propriedades em Mopeia e Luabo.
Entre as culturas das plantações lugar de relevo teve também a produção de algodão. As
principais empresas algodoeiras no território da companhia foram a Mac Callum, The
Rodesian Cotton, Companhia agrícola de Moribane, etc. Entretanto o maior contributo em
algodão, tal como em borracha, teve origem na produção familiar.
As Farmas
A Agricultura Colona
A cedência, para exploração das terras de Manica e Sofala a companhia de Moçambique não
foi, como vimos, uma imposição da realidade económica portuguesa pelo que não significava
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que Portugal abdicava daquelas terras, muito pelo contrário. Como tal as autoridades
portuguesas procuravam sempre que a exploração da região e na companhia estivesse sempre
representado Portugal.
Deste quadro surgiu que uma das obrigações da companhia no âmbito da exploração das
terras de Manica e Sofala fosse a de instalar e apoiar na prática da agricultura, durante os
primeiros cinco anos de actividade, mil famílias de colonos portugueses.
O resultado desastroso deste plano foi o corolário de várias situações conjugadas. Entre esses
factores registe-se que os colonos enviados a Manica e Sofala não possuíam nem os capitais
nem a preparação técnica e a experiência prática necessários para o sucesso da actividade que
lhes era proposto desenvolver. Envoltos neste colecte de forças os colonos mantiveram-se
totalmente dependentes da Companhia quanto a investimentos em infraestruturas, assistência
técnica e fornecimento de mão-de-obra.
A experiência viria a ser relançada a partir de 1910 com a subida de João Pery de Lind a
governador da região e que se mostrou um firme defensor dos interesses dos colonos. Durante
o governo de Pery de Lind a companhia começou a ganhar confiança na agricultura colona o
que levou a que esta intensificasse a política de atracção de colonos que iam se fixar na região
com consideráveis vantagens. Nesta altura os colonos passaram a beneficiar de crédito
agrícola (aluguer de máquinas, fornecimento de fertilizantes, distribuição de sementes e
sacos), assistência técnica, cedência de terras férteis, facilidades na aquisição de mão-de-obra
assim como facilidades de pagamentos das dívidas contraídas.
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Agrícola, criada em 1928 e que permitiu a racionalização da política de assistência financeira
à agricultura colona e a Associação dos agricultores de Manica e Sofala que melhorou os
mecanismos de defesa dos interesses dos colonos, principalmente ao nível da Repartição do
trabalho Indígena, onde faziam-se representar por dois delegados.
A completar os esforços das autoridades da Companhia para dar força a agricultura colona, a
Direcção de Agricultura foi transferida para Vila Pery, centro da agricultura colona, em 1928.
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estrangeira. Na fase em que estamos a estudar os africanos cultivavam com notoriedade o
algodão, o milho, o arroz, a mandioca a mapira, a mexoeira, o feijão, as oleaginosas, etc.
Pela sua importância como fonte de receitas bastante rentável, devido aos baixos custos de
produção, a companhia estabeleceu em 1937 o monopólio da colheita e comercialização da
borracha, reservando para si locais e florestas exclusivas. Muitos camponeses que até ai
beneficiavam de dos preços mais remuneradores oferecidos pelos comerciantes indianos
espalhados no interior abandonaram a extracção.
Além disso o campesinato abastecia o mercado interno com produtos como o milho, a mapira,
etc., produtos destinados à alimentação dos trabalhadores nas empresas e outros sectores.
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Conclusão
Como eixo de estruturação de poder e de distribuição de recursos, a terra foi objecto de lutas
em Manica e Sofala desde as primeiras décadas do século XX, o que confirma a pertinência
do estudo das políticas de terras da Companhia em todo o Território de Manica e Sofala, não
apenas em Manica, e ao longo da sua administração, entre 1892 e 1942. Confirma-se ainda a
pertinência do estudo das autonomias destas políticas, mas também da forma como são
elementos essenciais para interpretar a lógica de políticas laborais, agrícolas e até fiscais. Se
esta abordagem sacrifica, em certa medida, o grau de pormenor exigido em explicações mais
situadas, contribui, em contrapartida, para uma visão de conjunto, pautada por diferentes
factores explicativos, hierarquizados entre si.
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Bibliografia
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