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A partir dessa unidade você entenderá os conceitos

fundamentais da língua de sinais brasileira, suas principais


características, sua origem e conhecerá alguns sinais básicos
para a comunicação no primeiro contato com a pessoa surda.

Esperamos que essa unidade desperte em você o


desejo de aprender a se comunicar através dessa língua tão
fascinante.
3.1 Conceitos Fundamentais

A Língua de Sinais Brasileira (Libras) é a língua


materna dos surdos brasileiros. É uma língua viva, autôno-
ma, capaz de transmitir todo e qualquer conceito, dos mais
complexos até os mais abstratos. Os usuários da Libras, po-
dem discutir sobre todo e qualquer assunto, desde economia,
política, física, literatura, histórias de humor, etc.

É considerada como língua natural, uma vez que,


ela surge de forma espontânea no meio da comunidade surda,
em face da necessidade destes, em se comunicarem uns com
os outros. Diferencia-se da linguagem, por possuir todos os
requisitos que a conferem como língua, tais como: aspectos
fonológicos, morfológicos, sintaxe, semântica e pragmática.
As línguas faladas como o inglês, o espanhol e o francês, são
consideradas línguas orais-auditivas. As línguas sinalizadas
como a Libras, são de modalidade gestual-visual, também
conhecida com viso-espacial, onde o canal emissor da co-
municação são as mãos, através dos sinais, e o canal receptor
é a visão.

Línguas orais-auditivas: o canal emissor da comu-


nicação é a voz, através da fala e o canal receptor da
comunicação são os ouvidos, através da audição.
Línguas gestuais-visuais: o canal emissor da comu-
nicação são as mãos, através dos sinais e o canal re-
ceptor da comunicação são os olhos, através da visão.

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As línguas de sinais aumentam seus vocabulários
com novos sinais criados e introduzidos pelas comunidades
surdas espalhadas por todo o Brasil.

O léxico pode ser definido como o conjunto de pala-


vras de uma língua. “Ele se relaciona com o processo
de nomeação e com a cognição da realidade. Consti-
tui ainda uma forma de registrar o conhecimento do
universo. Quando o homem nomeia os seres e obje-
tos, ele está os classificando simultaneamente. O ato
de nomear gerou o léxico das línguas naturais.”
(BIDERMAN, 2006)

Dessa forma, as línguas de sinais, apresentam em


seu léxico, regionalismos. Os regionalismos, também conhe-
cidos como dialetos, são expressões características de uma
determinada localidade. Assim, podemos sinalizar a palavra
CIDADE, em São Paulo de uma forma e sinalizar no Ceará
de outra forma.

Sinal de CIDADE usado pelos surdos


na cidade de São Paulo.
Fonte: CAPOVILLA & RAPHAEL (2001, p. 408)
(Ilustração: Silvana Marques)

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Sinal de CIDADE usado pelos surdos
no estado do Ceará.
Fonte: CAPOVILLA & RAPHAEL (2001, p. 408)
(Ilustração: Silvana Marques)

3.2 Como a Libras chegou ao Brasil

A Língua de Sinais Brasileira teve sua origem atra-


vés do alfabeto manual francês. A convite de D. Pedro II,
um Padre surdo da França, chamado Ernest Huet, veio ao
Brasil por volta de 1857. Na cidade do Rio de Janeiro, ele
encontrou surdos cariocas mendigando e perambulando pe-
las ruas, sem saberem se comunicar. Foi através do “método
combinado”, utilização da língua de sinais como meio para o
ensino da fala, que Ernest Huet começou a trabalhar com os
surdos do Brasil.

Em 1857, foi fundada a primeira escola


para surdos no Brasil, O Instituto Nacional de Sur-
dos-Mudos. Hoje, Instituto Nacional de Educação

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de Surdos (INES). Foi a partir desse instituto que
surgiu, da mistura da Língua de Sinais Francesa,
trazida por Huet, com a língua de sinais brasilei-
ra antiga, já usada pelos surdos das várias regiões
do Brasil, a Língua Brasileira de Sinais. (FELIPE,
p.121, 2002).

Em contato com D. Pedro II, Ernest Huet propõe


a criação da primeira escola de surdos da época, o Institu-
to Nacional de Educação de Surdos (INES), estabelecido na
cidade do Rio de Janeiro, que antigamente funcionava em
regime de internato, onde apenas os surdos masculinos de
várias partes do país, mudavam para o Rio de Janeiro para
estudar e nas férias eles voltavam para junto de suas famílias.
Apenas em 1931, é que fora criado um externato com oficina
de costura e bordado para as mulheres surdas. Dessa forma,
os sinais que os surdos aprendiam nos períodos em que fica-
vam no INES, eram facilmente difundidos para várias locali-
dades do Brasil quando estes voltavam para os seus estados.

Prédio onde funciona o INES, desde 1915 – Rio de Janeiro

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Aos poucos, essa língua foi sendo construída com
novos sinais criados e incorporados ao léxico pela comunida-
de surda brasileira. Apesar de ter uma origem francesa, a Lín-
gua de Sinais Brasileira, já possui hoje sua própria estrutura.

Aqui no Brasil, até pouco tempo foi considerada


como linguagem, mas como vimos na unidade 01, graças
aos trabalhos de linguistas e pesquisadores comprovando a
autenticidade da Libras como língua, ela foi reconhecida ofi-
cialmente pela lei 10.436 de 24 de abril de 2002, como meio
de comunicação legal da comunidade surda brasileira.

A Língua de Sinais Brasileira não é universal, cada


país possui a sua. Assim como em diferentes países os ouvin-
tes falam línguas diferentes, também ocorre com as línguas
de sinais, cada comunidade surda espalhada pelos mais va-
riados países possuem a sua própria língua de sinais. Dessa
forma temos aqui no Brasil (Libras), nos Estados Unidos
(American Sign Language – ASL) e na França (Langue de
Signes Française - LSF).

LIBRAS foi a sigla aceita e aprovada em


1993 pela FENEIS. Brito e Felipe (1989) utiliza-
vam a sigla LSCB – Língua de Sinais dos Centros
Urbanos. Há, no entanto, um movimento, liderado
pelo pesquisador surdo Nelson Pimenta, que defen-
de o uso da sigla LSB – Língua de Sinais Brasilei-
ra. A linguista R. Quadros (2002) também utiliza,
em seus trabalhos, LSB, sigla que segue os padrões
internacionais de denominações das línguas de si-
nais. No entanto, conforme declaração da Profª.

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Myrna S. Monteiro, da UFRJ, a sigla LSB já era
usada pela COPADIS – Comissão Paulista de De-
fesa dos Direitos dos Surdos, desde 1996 (LEITE,
2004, p. 9).

A sigla Libras é comumente usada aqui no Brasil,


contudo, outras siglas têm sido usadas como LSB (Língua
de sinais Brasileira) seguindo o padrão internacional de L
(Língua) + S (Sinais) + a inicial do país.

3.3 Principais Características da Libras

Segundo TEMÓTEO (2008), ao invés de palavra,


na Língua Portuguesa, tem-se o sinal na Libras. A respeito
de sinal, diz que é um gesto que possui significado. O sinal é
o fio condutor capaz de transmitir, propagar e difundir a “pa-
lavra” em suas diferentes realizações através das mãos, ele
tem vida própria e, no geral, leva consigo uma semelhança
que remete a forma ou coisa representada, tem a propriedade
de reproduzir por semelhança o mundo real, como também,
comunicar signos abstratos, independentemente de seu grau
de subjetividade.

Conforme FELIPE (1998, p.83), “O que é denomi-


nado de palavra ou item lexical, nas línguas orais-auditivas,
é denominado sinal nas línguas de sinais”. Conforme o
exemplo:

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Apito: Palavra ou item lexical.
Ilustração do
Ilustração modo como
referente a o sinal é
palavra-sinal. realizado.
Fonte: CAPOVILLA & RAPHAEL (2001, p. 212)
(Ilustração: Silvana Marques)

O léxico de uma língua são as palavras que servem


para nomear os seres, os objetos e a classificá-los simultane-
amente. Assim, os sinais nas línguas sinalizadas, represen-
tam o léxico das línguas de sinais, uma vez que, representam
um determinado ser ou objeto.

Os sinais da Libras são classificados em icônicos


e arbitrários. Os sinais icônicos são aqueles que se asseme-
lham ao seu referente. Na maioria das vezes esta relação de
iconicidade é estabelecida quando um sinal é criado na co-
munidade Surda, onde se busca resgatar uma imagem que
torne o sinal mais concreto.

Para BRITO (1998, p. 19,20), os sinais icônicos são


“formas linguísticas que tentam copiar o referente real e suas
características visuais”. São exemplos de sinais icônicos: sal,
abraço e banana, que estabelecem uma relação com a forma
e/ou o significado:

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Sinais Icônicos

Sal

Abraço O sinal de
“banana”é
icônico por se
assemelhar
ao ato de
descascar
uma banana
Fonte: CAPOVILLA & RAPHAEL (2001, p. 139, 268,1161)
(Ilustração: Silvana Marques

COUTINHO (2000:19) define os sinais icônicos


como “aqueles que apresentam semelhanças físicas e geo-
métricas com os seres representados”. Quanto aos sinais ar-
bitrários a autora diz que “são aqueles não apresentam tais
semelhanças, que não dependem de regras”.

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Os sinais arbitrários, assim como as palavras das
Línguas em geral, não estabelecem qualquer ligação com a
forma ou significado do sinal, eles estão, na maioria dos ca-
sos, relacionados a conceitos abstratos, como é o caso dos
sinais vontade e saúde, conforme o quadro abaixo:

Sinais Arbitrários

Vontade

Saúde
Fonte: CAPOVILLA & RAPHAEL (2001, p. 1329, 1170)
(Ilustração: Silvana Marques

A área da linguística que estuda os constituintes bá-


sicos que formam os sinais é a fonologia, esta área se propõe
a analisar como as unidades mínimas se combinam e quais as
variações que podem existir.

Como sabemos as línguas de sinais e as línguas fa-


ladas, se articulam em modalidades diferenciadas, a primeira
é oral-auditiva e a segunda gestual-visual. Mesmo com estas

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diferenças, a fonologia também tem sido utilizada para des-
crever e estudar os elementos básicos que formam os sinais,
ou seja, os fonemas.

Historicamente, entretanto, para marcar


a diferença entre esses dois sistemas linguísticos,
Stokoe (1960) propôs o termo quirema para deno-
minar as unidades formacionais dos sinais (Confi-
guração de mão, locação e movimento) e, ao estu-
do de suas combinações propôs o termo quirologia
(do grego mão). O dicionário Aurélio Buarque de
Holanda apud Quadros (2004) define quirologia
como a arte de conversar com as mãos por meio
de sinais feitos com os dedos; dactilologia (QUA-
DROS, p. 49, 2004).

Posteriormente, um grupo de pesquisadores, in-


cluindo Stokoe em outras edições (1978), adotou os termos
fonema e fonologia, tendo em vista que estes agregam os
princípios linguísticos para a modalidade gestual-visual.

Estudando a composição dos sinais, Stokoe os dis-


secou e observou que eles eram formados por três unidades
mínimas a qual ele chamou de parâmetros: Configuração de
Mão (CM), Locação (L) e Movimento (M), analogamente,
estas três unidades seriam os fonemas nas línguas de sinais
que se combinam para forma os morfemas.

Análises das unidades formacionais dos sinais, pos-

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teriores à de Stokoe, sugeriram a adição de informações refe-
rentes à orientação da mão (Or) e aos aspectos não-manuais
(NM) – expressões faciais e corporais (BATTISON, 1974,
1978 apud QUADROS, 2004).

Dessa forma, as unidades mínimas de formação dos


sinais, os fonemas ou ainda, parâmetros da Língua de Sinais
são: Configuração de mão (CM), Locação (L), Movimento
(M), Orientação (Or) e Expressões Não-Manuais (NM).

Estudaremos mais sobre as unidades mínimas ou


parâmetros com mais detalhes na unidade 4.

Fique atento!

Alfabeto Manual da
3.4 Língua de Sinais Brasileira

O alfabeto manual também é um recurso


usado quando não há um sinal próprio da Língua
Brasileira de Sinais, ou seja, é feita uma soletração
do português no espaço. Esse movimento envolve
uma sequência de configurações de mão que tem
correspondência com a sequência de letras escritas
do português. A soletração manual é linear, sendo
utilizada para “escrever no ar” palavras empresta-
das das línguas auditivo-orais (GUARINELLO, p.
52, 2007).

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