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PSICOLÓGICOS
BÁSICOS
Psicofísica da
sensação e percepção
Bruno Stramandinoli Moreno
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Segundo o filósofo francês Merleau-Ponty (1968), é a experiência perceptiva que
introduz os seres humanos no ambiente onde vivem. Nesse sentido, parece apro-
priado pensar na percepção como um feixe de luz que ilumina e traz à existência
aquilo que pela escuridão se mantinha anônimo. Um elemento importante que
envolve o processo psicológico básico da percepção, e que precisa ser considerado
para sua compreensão, refere-se à dimensão psicofísica em sua constituição.
Nesse contexto, se de um lado há elementos mais qualitativos, contextuais,
políticos e sociais que intervêm no ato humano, de outro há um componente
quantitativo e biofisiológico que, a partir da energia física gerada no ambiente,
interfere na intensidade do que é percebido. Ou seja, no processo sensório-
-perceptivo há a emissão de mensagens eletroquímicas que afetam, via sistema
nervoso, as experiências humanas. Tais experiências têm influência direta em
processos como a sensação e a percepção.
Neste capítulo, você vai estudar os processos da percepção e da sensação sob
o prisma da psicofísica, um ramo da psicologia que envida esforços para entender
a relação que se estabelece entre estímulos físicos (do ambiente) e seu efeito
sobre as sensações e percepções humanas.
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Figura 1. Curva hipotética versus curva típica relacionando o percentual de detecção à inten-
sidade do estímulo. O gráfico da esquerda representa uma curva hipotética que considera
100% detectáveis os estímulos possíveis do ambiente. Por sua vez, o gráfico da direita ilustra
um experimento típico de limiar absoluto em que são considerados detectáveis apenas 50%
dos estímulos possíveis no ambiente.
Fonte: Schiffman (2005, p. 18).
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Métodos psicofísicos
Como qualquer ramo científico, a premissa básica para a produção de
conhecimentos, compreensões e conceituações é a adoção de um método
validador, ou seja, um modo de realizar experimentações precisas que
reproduzam os fenômenos-alvo a ponto de descrever fidedignamente
como e por que ocorrem. Na psicof ísica, alguns modelos experimentais
têm essa pretensão e buscam, sob determinado limite, reproduzir e
descrever os processos da sensação e da percepção, ao definirem o limiar
absoluto.
A seguir são listados e definidos cada um dos principais métodos apli-
cados em experimentos psicofísicos. Nos três métodos a serem descritos,
há uma variação no controle de duas variáveis: intensidade e duração
da exposição do estímulo. Nesse sentido, ainda vale entender que outro
elemento precisa ser considerado: o sujeito (ser humano) do experimento,
ora no controle, ora à mercê do experimentador.
Figura 2. Medida de limiar absoluto pelo método dos limites. Para cada série de es-
timulação (A) ascendente e (D) descendente, modifica-se a intensidade do estímulo
até se obter uma reversão. As últimas reversões são usadas para o cálculo do limiar.
Fonte: Costa (2017, p. 24).
Curvas ROC
Como aponta Schiffman (2005), a TDS apregoa que não se pode estabelecer
(leia-se calcular) um limiar absoluto. Isso não significa que não há qualquer tipo
de medida a ser obtida. Nesse sentido, há na TDS a medida da sensibilidade
do observador frente ao fornecimento de um estímulo e do critério por ele
adotado. Logo, se a relação entre “sins” e “nãos” muda conforme os critérios
variam, faz-se necessário, a fim de se ter uma medida, dimensionar os efeitos
da sensibilidade tanto do observador em detectar o estímulo-sinal quanto
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Figura 5. Análises gráficas de valores obtidos com a curva ROC. Os gráficos representam
a relação entre número de acertos e número de alarmes falsos. Em ambos, as variações
de vieses de resposta representam um percentual referente à discriminabilidade: máxima
(equilibrado; C = 0), tendenciosamente negativo (C > 0) ou positivamente tendencioso (C < 0).
Fonte: Costa (2017, p. 38-39).
Até aqui tivemos contato com alguns preceitos e conceitos que a psico-
física apresenta a fim de descrever aspectos específicos concernentes aos
fenômenos psicológicos. Na próxima seção, examinaremos as principais
leis, conceitos, premissas e entendimentos que delimitam o modo como a
psicofísica encaminha e procede seus estudos e que balizam a natureza de
suas contribuições.
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A interação dos quatro aspectos elencados por Costa (2007) pode ser
visualizada pelo esquema ilustrado na Figura 6. Nele identificamos
elementos objetivos e subjetivos que explicam como procede a sensação de dor.
Para tentar descrever como a dor é sentida e percebida, por exemplo, pode-se
descrevê-la sob a ótica da aplicação de indicadores. Sob essa premissa, existem
indicadores de ordem fisiológica e indicadores de ordem psicofísica. Isso denota
uma condição muito particular a cada ser humano sobre a experiência de dor
que ele vivencia. Ao sentir uma dor, o ser humano, em geral, a experiencia tendo
como parâmetro o contexto que o circunda. Assim, existem elementos que
intensificam mais ou menos o estímulo mobilizador que provoca a sensação
de dor. Isso implica que a dor precisa ser detectada (ter um mínimo de energia
suficientemente mobilizadora), identificada (delimitada dentro de um campo
classificatório que assim a implica), discriminada (diferenciada de sensações
que provoquem outra coisa que não a mesma “dor”) e escalonada (quantificada
em termos de intensidade).
Percepção subliminar
Ao discutirmos a questão do limiar absoluto, tratamos da questão da
detecção de um estímulo suficientemente intenso. Mas e quando os es-
tímulos estão abaixo desse limiar? Aí entra em cena o que Schiffman
(2005) denominou percepção subliminar, que ocorre quando determinado
estímulo está presente em níveis muito fracos de intensidade ou por um
período muito curto de exposição. Não se trata de um aspecto da qualidade
da mensagem, de seu significado (percepção), mas de sua disponibilidade
sensorial.
Um modo interessante de evidenciar a percepção subliminar é uma
técnica denominada priming semântico, em que são alinhados dois estí-
mulos, como duas palavras, a duas imagens, de modo que o significado
de um influencie (pré-ative, ou sensibilize) alguma resposta relativa ao
segundo.
Limiar diferencial
Se de um lado temos um limiar absoluto, em que há um espectro de detec-
ção possível de determinado estímulo, de outro há o que Schiffman (2005)
denomina limiar diferencial. Trata-se de um limiar relacional, em que dois
estímulos são contrapostos de modo a encontrar-se uma diferença signi-
ficativa entre eles. Há um mínimo necessário de energia a ser considerada
para percebê-los distintos entre si. Segundo Costa (2017, p. 22):
Este limiar está relacionado à mínima quantidade de energia necessária para que
haja a experiência consciente de modificação na intensidade do estímulo para
mais ou para menos. Outro termo também utilizado para este limiar é a Diferença
Apenas Perceptível (DAP).
Figura 7. Análises gráficas de valores obtidos com a curva ROC mostram que, comparativa-
mente, diferentes partes do corpo têm maior sensibilidade para certos estímulos do que
para outros, mas isoladamente acabam exigindo mais energia para mobilizar uma detecção.
Fonte: Almeida Junior (2013, p. 39).
A pele do rosto (lábios, bochecha, nariz e testa) tem um maior limiar absoluto ao
toque, enquanto que na pele dos dedos dos pés é mais baixo. A pele dos dedos da
mão tem o maior limiar diferencial, enquanto que na pele da parte superior dos
braços e das costas é mais baixo. Mesmo nas mãos, nem todas as suas partes são
igualmente sensíveis ao toque. [...] A sensibilidade aumenta da palma da mão para
a ponta dos dedos. A menor distância percebida entre dois pontos estimulados
foram os seguintes: 8 mm na palma, 4 mm na parte média dos dedos e 2 mm na
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ponta dos dedos. O limiar diferencial mostra uma extensão maior do que o limiar
absoluto em diferentes regiões da pele. O limiar diferencial faz mais sentido em
resposta às mudanças dinâmicas do ambiente e na sutil manipulação de produtos
(ALMEIDA JUNIOR, 2013, p. 39).
Lei de Fechner
Para o filósofo alemão Gustav Theodor Fechner, a experiência mental (no
sentido de sensação) está relacionada quantitativamente ao estímulo físico. É
nesse sentido que, ao relacionar sensação e estímulo físico, Fechner estabe-
leceu uma escala numérica para cada um dos sentidos sensoriais. A chamada
Lei de Fechner considera que a magnitude da sensação está relacionada
logaritmicamente ao estímulo a ela correspondente:
S = k log I
Referências
ALMEIDA JUNIOR, G. Avaliação dos aspectos subjetivos relacionados aos materiais:
proposição de método e escalas de mensuração aplicadas ao setor moveleiro. 2013.
Dissertação (Mestrado em Design) — Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo
Horizonte, 2013.
BORINE, M. S. Consciência, emoção e cognição: o efeito do priming afetivo subliminar
em tarefas de atenção. Ciênc. cogn., v. 11, p. 67-79, jul. 2007.
COSTA, M. F. Manual didático de teoria e prática de psicofísica. São Paulo: USP, 2017.
Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5150752/mod_resource/
content/1/Manual%20Did%C3%A1tico%20de%20Psicof%C3%ADsica.pdf. Acesso em:
13 dez. 2021.
MERLEAU-PONTY, M. Résumés des Cours (Collège de France, 1952-1960). Paris: Gallimard,
1968.
SCHIFFMAN, H. R. Sensação e percepção. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2005.
SILVA, J. A.; RIBEIRO-FILHO, N. P. A dor como um problema psicofísico. Rev Dor, v. 12,
n. 2, p. 138-151, 2011.
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Leituras recomendadas
AMON, D. et al. Psicologia social e comunicação publicitária: uma análise crítica. Ciências
Sociais Unisinos, v. 46, n. 2, p. 178-186, mai/ago. 2010.
LOPES, C. R. M. Comunicação e percepção no ciberespaço: um estudo sobre a experiência
de imersão em ambientes lúdicos interativos. 2013. Tese (Doutorado em Comunicação
e Semiótica) — Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2013.