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MATERIAL INFANTIL COMO FONTE DE SONHO

Em casos específicos sonhos podem ser formados com lembranças remotas dos
primeiros anos de vida, memórias essas que não surgem em nossos momentos de
vigília, trata-se de impressões da infância.

A. Maury conta a história de um homem que, certo dia, decidiu visitar sua cidade
natal após vinte anos. Na noite anterior à partida, ele sonhou que se encontrava
numa cidade completamente estranha onde, na rua, encontrou um senhor
desconhecido, com o qual conversou. Ao voltar para sua terra natal, descobriu que
essa cidade estranha realmente existia nas proximidades de sua cidade natal, e
também o homem desconhecido do sonho era um amigo do seu falecido pai,
habitante daquela cidade.

Outra situação relacionada ao sonho infantil, é quando se trata de sonhos


recorrentes da infância que retornam novamente no sonho adulto, um exemplo
disso é dado por um médico de 30 anos diz que desde sua primeira infância
sonhava com frequência com um Leão Amarelo, que inclusive consegue descrevê-lo
em detalhes, certo dia esse leão toma forma real em um objeto de porcelana, objeto
esse que foi dado como perdido a muito tempo, e era seu brinquedo favorito, que já
não se lembrava desse fato.

A Partir de uma interpretação e análise de alguns desses sonhos, vem à tona o


próprio desejo que provocou o sonho, e cuja realização é o próprio sonho, provém
da vida infantil, de modo que, para nossa surpresa, vemos que a criança prossegue
vivendo com seus impulsos no sonho, e esse desejo que provoca o sonho, apesar
de atual, extrai um poderoso reforço de lembranças mais profundas da infância.

Como por exemplo, uma grande vontade que Freud tinha de visitar Roma a vida
toda, e certa vez sonhou que olhava pela janela do vagão pontos turísticos da
cidade como a ponte de sant’angelo e o rio tibre, e logo em seguida se dava conta
que nunca havia pisado naquela cidade, e essa vista que tinha no sonho era a
reprodução de uma gravura famosa que havia visto em algum lugar, além de tantos
outros sonhos que expressavam o mesmo, esse desejo e anseio pela cidade de
Roma recebia impressões da infância.

Quanto mais nos aprofundamos na análise dos sonhos, mais frequentemente


deparamos com vivências infantis, que no conteúdo latente do sonho têm o papel de
fontes oníricas.

Como vimos, dificilmente os sonhos retratam de forma literal e detalhada


experiências vividas na primeira infância, sem mudança e alteração no conteúdo
sonhado, porém existem casos dentro da raridade, onde uma dissertação fiel dos
fatos nessa idade podem ocorrer, um caso de um paciente de Freud, é um
exemplo disso; aos 12 anos um homem visita um colega acamado por conta de uma
doença, que por algum motivo se encontrava nu, na cama durante a visita, ao ver
seus órgãos genitais o paciente que foi tomado por um tipo de compulsão também
se despiu e levou sua mão ao órgão genital do colega, este porém reagiu com
surpresa e reprovação, fazendo com que o garoto se sentisse envergonhado e
soltasse, e um sonho repete essa mesma cena que ocorreu aos 12, porém agora
aos 23 anos, somados a todos os sentimentos de desconforto e vergonha da época,
porém o substituindo o colega acamado por outro colega da atualidade.

Porém esses casos não são a regra, pois geralmente a cena infantil no conteúdo
manifesto do sonho é representada apenas por uma alusão e precisa ser
desenvolvida a partir do sonho, através da interpretação.

As experiências na análise dos sonhos chamaram a atenção de Freud para o fato


de que também dos sonhos cuja interpretação parece, a princípio completa e
facilmente identificada porque pode mostrar facilmente as fontes do sonho e os
instigadores de desejos, partem pensamentos importantes que se estendem até a
primeira infância.

Ao generalizar esse pensamento cada sonho apresentaria em seu conteúdo


manifesto um vínculo com eventos recentes, em seu conteúdo latente, porém, um
vínculo com a vivência mais antiga.

AS FONTES SOMÁTICAS DOS SONHOS

Por muitos, diante do senso comum e até estudiosos e nomes que se voltaram às
investigações da origem dos sonhos, se baseiam em fontes somáticas como os
estímulos sensoriais objetivos, que partem de objetos externos, e os estados de
excitação interna dos órgãos sensoriais, além dos estímulos somáticos provenientes
do interior do corpo, segundo essa linha de pensamento o sonho se apresenta
não como fenômeno psíquico, resultante de motivações psíquicas, mas como
produto de um estímulo fisiológico que se manifesta em sintomas psíquicos,
pois o aparelho afetado pelo estímulo não é capaz de se expressar de outra forma.

Observamos a tendência dos autores de diante dessas fontes de estímulos


somáticos, passar para o segundo plano ou até mesmo excluir totalmente
eventuais fontes psíquicas do sonho, porém dentro de uma experiência dentro
desse mesmo viés prova que somente uma pequena parcela dos sonhos possuem
conteúdos em que o elemento de percepção sensorial externa pôde ser
demonstrado, somente poucos casos portanto podem remontar a sensações
orgânicas.
O ponto fraco dessa teoria segundo freud, ela é incapaz de apontar qualquer motivo
que regulamente a relação entre o estímulo externo e a representação onírica
selecionada para sua interpretação, ou seja, de explicar a “curiosa seleção” que os
estímulos “frequentemente fazem na sua atividade produtiva”, pois existem
numerosos exemplos em que diversos estímulos sensoriais ou motores fortes
permanecem sem efeito durante o sono, e a psique seria incapaz de reconhecer a
natureza real dos estímulos sensoriais objetivos, além disso uma falta de interesse
da psique de representar isso durante o sonho.

Se o sonho de um voo simboliza o subir e descer dos lobos pulmonares durante a


respiração, como já observou Strümpell, ou esse sonho precisaria ocorrer com uma
frequência muito maior ou teria de ser possível demonstrar uma atividade
respiratória intensificada durante ele.

O sonho possui um valor próprio como ação psíquica, que um desejo se torna o
motivo de sua formação e que as vivências do dia anterior fornecem o material para
seu conteúdo, todas as outras teorias do sonho que negligenciam um
procedimento de investigação tão importante e, apresentam o sonho como
reação psíquica inútil e enigmática a estímulos somáticos já estão condenadas
e fadadas ao erro, portanto a essência do sonho não é alterada quando um material
somático se junta às fontes psíquicas do sonho; ele continua sendo uma
realização de desejo, independentemente de como sua expressão é determinada
pelo material atual, então quando os estímulos nervosos externos e os estímulos
somáticos internos são suficientemente intensos para obter a atenção psíquica, eles
constituem um ponto fixo para a formação dos sonhos, um núcleo no material
onírico, para o qual é buscada uma realização de desejo correspondente.

Um dos poucos exemplos de sonho que possui relação com estímulos externos
físicos é um em que um paciente de Freud sonha que se monta sobre um cavalo
cinza pela primeira vez sem cela, e nunca antes havia sonhado ou mesmo montado
sobre um cavalo, porém, na fatídica noite em que esse sonho surge ele estava com
um furúnculo na região da pélvis, o qual doía muito e seria impossível montar sobre
o cavalo sem cela na vida real, portanto representou o desejo de não estar com
aquela dor fisiológica, e nas possibilidades que teria caso não estivesse.

Sem dúvida alguma, a sensação geral do corpo faz parte dos estímulos somáticos
internos que comandam o sonho. Não que ela forneça o conteúdo do sonho, mas
impõe aos pensamentos oníricos uma seleção do material a ser representado no
conteúdo do sonho.
SONHOS TÍPICOS

Existe certo número de sonhos que quase todos os indivíduos têm da mesma forma
e que nos habituamos a supor que tem o mesmo significado para todos. Esses
sonhos típicos merecem um interesse especial também porque, presumivelmente,
vêm das mesmas fontes em todas as pessoas e, portanto, parecem especialmente
adequados a nos esclarecer sobre as fontes dos sonhos.

OS SONHOS DE EMBARAÇO CAUSADO PELA NUDEZ

O sonho de nudez nos interessa apenas quando é vinculado à vergonha e ao


embaraço, quando o sonhador deseja fugir ou se esconder e é tomado pela peculiar
inibição de não conseguir sair do lugar, sentindo-se incapaz de alterar a situação
penosa, e as pessoas contidas neste sonho geralmente não expressam essa
insegurança e embaraço mas sim uma indiferença com a situação, a vergonha do
sonhador e a indiferença das pessoas geram uma contradição que é comum nos
sonhos.

O contexto em que esse tipo de sonho ocorre em minhas análises de pacientes


neuróticos não deixa dúvida de que existe uma lembrança da primeira infância
subjacente ao sonho, pois apenas em nossa infância éramos vistos sem roupas
tanto por nossos familiares e pessoas próximas, e não sentíamos vergonha
nessa época, quando olhamos para trás, essa infância livre de vergonha parece um
paraíso, e esse paraíso nada mais é do que a fantasia coletiva da infância do
indivíduo, portanto os sonhos de nudez são simplesmente desejos
exibicionistas, no sonho de exibição também se manifesta a repressão, segundo a
intenção inconsciente, a exibição deve ser continuada; segundo a exigência da
censura, deve ser interrompida.

Numa psicanálise, aprendemos a interpretar a proximidade temporal como


interdependência temática; dois pensamentos que, aparentemente desvinculados,
se apresentam em sequência imediata pertencem a uma mesma unidade.

OS SONHOS COM MORTE DE PESSOAS QUERIDAS

Outra série de sonhos que podem ser chamados típicos é aquela em que parentes
queridos, os pais ou irmãos, os filhos etc, morrem. Sendo separados 2 tipos de
sonhos correspondentes a esse conteúdo, os que não sentimos nenhuma tristeza ou
remorso e acordamos surpresos com nossa indiferença e insensibilidade e outro em
que sentimos uma dor profunda por causa da morte, expressando-a por meio de
lágrimas durante o sono.
O primeiro sonho geralmente não representa necessariamente o conteúdo,
podendo por exemplo apenas retornar a um enterro em que estava presente uma tia
querida que só se encontrou nesta ocasião, deixando em segundo plano a pessoa
sepultada.

Um caso diferente são os sonhos que representam a morte de um parente


amado e que são acompanhados de um afeto doloroso. Estes significam o que
o conteúdo expressa, o desejo de que aquela pessoa morra.

Os sonhos como já vimos representam desejos recentes ou passados


descartados, encobertos ou reprimidos, podendo vir a tona os desejos da primeira
infância, portanto quando alguém sonha com a morte do pai ou da mãe, do irmão ou
da irmã, manifestando grande dor, não significa que deseja a morte de seus entes
agora, mas podemos deduzir que em algum momento da primeira infância esse
desejo foi real.

Podemos exemplificar uma situação em que a rivalidade entre irmãos é real e


acontece na infância, pois sabemos que a infância é repleta de egoísmo e
necessidade por satisfação própria, possuindo pouca preocupação com a felicidade
e satisfação alheia, o irmão mais velho maltrata o mais novo durante um tempo, o
sentimento de raiva e ódio surge nessa relação, podendo aparecer de maneira
consciente ou não na psique do irmão oprimido que o seu opressor morra,
mesmo que quando adultos, esse sentimento não exista mais, os sonhos retratam
desejos que já foram pulsantes um dia.

Em alguns casos o irmão mais velho ao se deparar com um novo integrante da


família recém nascido já possui ciúmes e raiva por sua presença, já podendo
identificar um novo irmão irá apresentar risco a sua satisfação egóica, há um caso
em que uma menina de três anos tentou sufocar, no berço, o recém-nascido, cuja
presença não podia significar algo bom. Nessa fase, as crianças são capazes de
sentir ciúme em toda a sua nitidez e força.

Uma paciente afirma nunca ter tido contato com um sonho desse conteúdo, porém
certo dia se recorda de um sonho em que aos 4 anos estava em um campo
brincando com seus irmãos, e de repente todos criaram asas e voaram para longe,
onde não seria mais possível vê-los, e a partir de uma análise é possível interpretar
que à essa sonhadora quando criança foi dito que quando as crianças morrem,
criam asas como anjos e voam para o céu, portanto esse sonho sugere a morte de
seus irmãos porém influenciada pela censura.

Para a criança que é poupada da visão do sofrimento da morte, interpreta ela como
apenas “estar ausente” ou seja, não perturbar mais a vida dos sobreviventes,
portanto para algumas crianças desejar que a outra não esteja presente seria o
mesmo que ela morresse, pois não tem esse contato, por isso se torna tão comum
esse desejo e pulsão.

Já na relação entre pais e filhos, existe não apenas uma ocasião para a inimizade;
as condições para a formação de desejos que não resistem à censura são
numerosas, e esses desejos partem novamente da primeira infância, tendo como
marco para esse condicionamento o Complexo de Édipo, quando as primeiras
inclinações da menina se dirigem ao pai, que os primeiros desejos infantis do
menino têm a mãe como seu objeto, assim, o pai se torna um concorrente para o
menino; e a mãe, para a menina, e o amor do adulto significa para ela não só a
satisfação de uma necessidade especial, mas também a garantia de que sua
vontade é feita em todos os outros aspectos. Assim, a criança se rende à sua
própria pulsão sexual e renova simultaneamente a inclinação dos pais e
consequentemente a competição e ódio por um deles.

A lenda de Édipo provém de um material onírico antiquíssimo, que tem como


conteúdo aquela perturbação dolorosa da relação com os pais pelos primeiros
impulsos da sexualidade, e o sonho de ter relações sexuais com a mãe ocorre, hoje
como no passado, em muitos homens, que o relatam com surpresa e indignação.
Compreensivelmente, a chave para a tragédia e para se completar o sonho, é a
morte do pai.

Em um caso em específico um homem jovem, que durante sua neurose obsessiva,


ficou incapacitado de sair de casa, pois tinha medo de matar todos que entrasse em
contato com ele, apesar de um homem moral, e a análise que o levou a cura revelou
como causa dessa obsessão embaraçosa, impulsos assassinos contra o pai
excessivamente severo, e o início dessas pulsoes surgiram da primeira infãncia,
porém após a morte de seu pai por uma doença, o remorso obsessivo tomou forma
daquela fobia limitadora.

OUTROS SONHOS TÍPICOS


O sonho em que a pessoa está em queda livre sem apoio algum, surge de
brincadeiras da infância onde o adulto gira essa criança até que seus pés saiam do
chão, e futuramente essa memória é revisitada de forma mais fantasiada porém
remetendo a mesma sensação de prazer e medo ao mesmo tempo.

OS SONHOS DE EXAMES
Sonhos com provas escolares, com baixas notas, reprovação acadêmica,
desclassificação em um concurso, são as lembranças inextinguíveis dos castigos
que sofremos na infância pelos erros cometidos que voltam a se manifestar em
nosso íntimo nos dois momentos cruciais dos nossos estudos.

O sonho de provas acompanhado de sentimentos de angústia, que, como se


confirma cada vez mais, ocorre quando o dia seguinte espera um desempenho
responsável e a possibilidade de passar vergonha, teria então escolhido uma
oportunidade no passado em que essa angústia provou ser injustificada e foi
refutada pelo êxito.

Porém é o sonho do exame final só ocorre em pessoas que passaram no exame,


jamais em pessoas que falharam, tanto que Freud exemplifica que sonha somente
com os exames em que melhor ia, como história, não os outros em que seu bom
desempenho não era esperado, portanto o sonho referente as provas surgem
quando tem medo e receio de passar vergonha caso seu desempenho não alcance
suas expectativas e dos demais.

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