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Tubarão
2020
PAULA EDUARDA ALBERTON RIGONE
Tubarão
2020
PAULA EDUARDA ALBERTON RIGONE
Friedrich Nietzsche
RESUMO
OBJECTIVE: The main goal of this term paper is to feature the possibility of
constituting the crime of attempt homicide of a police officer, at the time the suspect is
escaping and to guarantee it, he shoots a fire gun at the police. Therefore, the
compatibility of the resistance crime and the material concurrence of crimes was
analyzed, as well as the compatibility of the institutes of attempt and eventual intent.
METHODS: The methods used in this research were three, which were: qualitative;
exploratory; and bibliographic, with the collection of documental and bibliographic data.
RESULTS: The result obtained was that, jurisprudentially, there are two
understandings regarding the compatibility between the attempt and eventual
intention. The first one understans the possibility of the coexistence of both institutes,
as it is a matter of criminal law and non-procedural law, alleging that the article 18, I of
the Criminal Code does not distinguish the will of the agent in direct and eventual intent,
therefore, both are equivalent to the criminal material law. The second, in turn, believes
that it is not possible, according to article 14, II of the Criminal Code, which deals with
the attempt, and determines the need for circumstances beyond the control and will of
the agent, and in the case of eventual intent there is no will. Finally, it is unsdertood
that the crime of resistance is compatible with the material concurrence of crimes,
according to article 329, §2° of the Criminal Code. CONCLUSION: It can be noticed
that, first, there is no obstacle for the crime of resistance to coexist with another one of
a violent nature, in a material crime contest. Furthermore, for material criminal law, it
is fully possible to configure the crime of attempt homicide of a police officer, at the
time the suspect is escaping and to guarantee it, he shoots a fire gun at the police.
Finally, it should be noted that the resistance crime cannot be absorbed by bodily injury
ou attemped homice, according to §2° of article 329, of the Criminal Code, nor can it
absorb them.
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 7
1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA ............................................................... 7
1.2 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ............................................................................... 9
1.3 DEFINIÇÃO DOS CONCEITOS OPERACIONAIS ..................................................... 9
1.4 JUSTIFICATIVA .......................................................................................................... 9
1.5 OBJETIVO GERAL .................................................................................................... 11
1.5.1 Objetivos Específicos .............................................................................................. 11
1.6 DELINEAMENTO DA PESQUISA ............................................................................ 11
1.7 ESTRUTURAÇÃO DA MONOGRAFIA .................................................................... 12
2 CRIME COMO FATO TÍPICO .................................................................................. 14
2.1 CONCEITO DE CRIME ............................................................................................. 14
2.2 CONCEITO ANALÍTICO ........................................................................................... 15
2.2.1 Fato Típico .............................................................................................................. 16
2.2.1.1 Conduta .................................................................................................................. 16
2.2.1.2 Resultado ............................................................................................................... 17
2.2.1.3 Nexo de Causalidade .............................................................................................. 17
2.2.1.4 Tipicidade .............................................................................................................. 18
2.2.1.4.1 Tipicidade Objetiva ........................................................................................... 18
2.2.1.4.2 Tipicidade Subjetiva .......................................................................................... 19
2.2.1.5 Erro de Tipo ........................................................................................................... 23
2.2.1.5.1 Erro de Tipo Essencial ..................................................................................... 23
2.2.1.5.2 Erro de Tipo Acidental ...................................................................................... 23
2.2.1.6 Crime Consumado e Crime Tentado ....................................................................... 24
2.2.1.7 Concurso de Crimes ............................................................................................... 25
2.2.2 Antijuridicidade ...................................................................................................... 26
2.2.2.1 Legítima Defesa ..................................................................................................... 27
2.2.2.2 Estado de Necessidade............................................................................................ 28
2.2.2.3 Estrito Cumprimento do Dever Legal ..................................................................... 28
2.2.2.4 Exercício Regular de Direito .................................................................................. 28
2.2.3 Culpabilidade .......................................................................................................... 29
2.2.3.1 Imputabilidade ....................................................................................................... 29
2.2.3.2 Embriaguez ............................................................................................................ 30
2.2.3.3 Emoção e Paixão .................................................................................................... 30
2.2.3.4 Potencial Consciência da Ilicitude .......................................................................... 30
2.2.3.5 Delito Putativo por Erro de Proibição ..................................................................... 31
2.2.3.6 Exigibilidade de Conduta Diversa........................................................................... 31
3 INSTITUTOS DA TENTATIVA E DO DOLO .......................................................... 32
3.1 TENTATIVA .............................................................................................................. 32
3.2 DOLO DIRETO E DOLO EVENTUAL ...................................................................... 35
4 CRIME DE HOMICÍDIO FUNCIONAL ................................................................... 38
4.1 CRIME DE HOMICÍDIO ............................................................................................ 38
4.2 CRIME DE HOMICÍDIO FUNCIONAL ..................................................................... 42
5 POSSIBILIDADE DE CONFIGURAÇÃO DE HOMICÍDIO FUNCIONAL
TENTADO QUANDO O SUSPEITO DISPARA ARMA DE FOGO EM DIREÇÃO AO
AGENTE POLICIAL DURANTE A FUGA..................................................................... 46
6 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 58
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 61
7
1 INTRODUÇÃO
prisão em flagrante, visto que em momento algum os suspeitos usaram a mira da arma
contra os policiais, restando afastado o “animus necandi” e tendo, por conseguinte,
excluída a competência do Tribunal do Júri, pela desclassificação da imputação (RIO
GRANDE DO SUL, 2019). No voto do referido acórdão, por fim, concluiu-se que
restava configurado apenas o crime de resistência.
Nesse sentido, a problemática levantada no presente trabalho baseia-se nos
critérios de direito material que levam o magistrado a entender pela configuração, ou
não, do crime de tentativa de homicídio funcional, em situações semelhantes ao
julgado. Esta pesquisa, assim, consiste em um ponto principal, qual seja a análise da
possibilidade de configuração de um crime cometido com dolo eventual, na forma
tentada.
Tendo em vista que não há um critério único e objetivo para a configuração
do crime, há de demonstrar-se quais os que, obrigatoriamente, devem ser
observados. Neste ponto, dá-se início a indagação acerca da possibilidade de
configuração do crime de tentativa de homicídio funcional, em concurso material com
a resistência, quando o suspeito atira na direção de um agente policial, para garantir
sua fuga.
Cabe ressaltar, ainda, que a análise do animus necandi, por sua natureza, é
subjetiva, visto que devem ser considerados todos os fatos e provas processuais para
apurar se houve o intuito, verdadeiro, de cometer o crime de homicídio. Assim, a
comprovação do dolo do agente, ou seja, da real intenção deste, só se dará dentro do
devido processo legal. Logo, processualmente, após esclarecida a intenção real do
suspeito, e demonstrado se tais disparos foram ou não direcionados aos agentes
policiais, a ocorrência poderia se enquadrar apenas no crime de resistência, do art.
329 do Código Penal (BRASIL, 1940), ou este em concurso com o homicídio funcional
tentado.
Porém, o presente possui o intuito de tratar somente das possibilidades
existentes dentro do direito material e suas perspectivas, não adentrando o direito
processual para responder quaisquer indagações.
9
1.4 JUSTIFICATIVA
o dolo eventual e tentativa, sobretudo nos casos de disparo de arma de fogo contra
agente policial, no momento da fuga do suspeito.
esclarecido por Motta (2013, p. 86), “[...] o pesquisador estabelece seu raciocínio de
forma com que as primeiras considerações acerca do problema sejam consideradas
universais ou gerais para, em seguida, analisar o problema de forma específica ou
particular.”.
Em outro aspecto, qual seja o nível da pesquisa, essa se dará de forma
exploratória, abrangendo uma consideração acerca das leis e princípios, do direito
penal brasileiro, a respeito do tema escolhido. Tal nível se dá pela familiarização dos
leitores para com o assunto, que será apurado e ao final, ponderado. (MOTTA, 2013).
Quanto a coleta de dados, o procedimento a ser utilizado será o bibliográfico
e o documental, visto que será elaborada em material publicado e oficial, tendo sua
veracidade consultada (PRODANOV; FREITAS, 2013).
A técnica de pesquisa será a exposição e análise das bibliografias e
jurisprudências exemplificativas estudadas e, após, a consideração final do
entendimento acerca do tema abordado, tanto doutrinária, quanto
jurisprudencialmente.
Enfim, com o término da pesquisa, será possível fazer uma avaliação da
possibilidade de configuração do crime tentado do art. 121, §2°, VII do Código Penal,
quando o suspeito dispara arma de fogo em direção ao agente policial, para garantir
sua fuga.
em direção do agente policial, para garantir sua fuga. Por fim, o sexto capítulo foi o da
conclusão, em que se recapitulou o conteúdo tratado nos capítulos anteriores,
apresentando-se as possíveis respostas ao problema exposto.
14
O crime, em seu conceito geral, pode ser classificado como material ou formal.
Nesse sentido, conforme desenvolve Ricardo Andreucci (2019, p. 79), o “conceito
material de crime é a violação de um bem penalmente protegido.”, já o “conceito formal
de crime é a conduta proibida por lei, com ameaça de pena criminal.”.
Portanto, tem-se que a quanto a matéria, o crime é classificado como um
atentado a um bem jurídico tutelado pelo Estado, que contrarie os interesses sociais,
como por exemplo a ofensa à vida, à propriedade, etc. Por outro lado, quanto à sua
formalidade, o crime é caracterizado por ser uma ação ou omissão ilícita, defesa em
lei e punível penalmente.
A ação ou omissão punida, assim, será destinada a certo objetivo e, dessa
forma, poderá ser observado o objeto jurídico do crime. Tal objeto define qual o bem
jurídico tutelado pelo Estado que é ofendido em determinado crime, podendo este ser
a vida, a propriedade, a honra, a dignidade sexual, etc. (NUCCI, 2019).
Nesse mesmo sentido, conforme Guilherme Nucci (2019), poderá ser
observado o objeto material do crime, sendo este o alvo do agente no cometimento
de determinada conduta. Como exemplo, tem-se o crime de estupro de vulnerável,
disposto no art. 217-A, do Código Penal (BRASIL, 1940), em que o objeto material, ou
seja, a vítima do crime, é a criança e ou adolescente, menor de 14 anos.
Por outro lado, o artigo de lei descreverá quais os sujeitos passíveis do crime,
tanto o sujeito ativo quanto o passivo, ou seja, quem poderá cometê-lo e quem poderá
ser o alvo do crime. Logo, se o artigo não chegar a prever os sujeitos, estes serão
15
De acordo com Andreucci (2019, p. 91), fato típico é composto por quatro
elementos, quais sejam a conduta humana, o resultado, o nexo de causalidade e a
tipicidade. Portanto, tem-se que para que esteja caracterizado o fato típico, há que se
observar se a conduta do agente gerou um resultado, direto ou indireto, e se tal
conduta é punível por uma norma penal específica.
2.2.1.1 Conduta
2.2.1.2 Resultado
Resultado, à luz das palavras de Nucci (2019), pode ser tido como a alteração
do mundo físico, ou como uma afronta às normas penais, sendo que estes conceitos
advêm dos critérios naturalístico e jurídico, respectivamente. Nesse sentido, o direito
penal brasileiro claramente aderiu ao primeiro conceito, haja vista fazer a
diferenciação entre crimes formais, materiais e de mera conduta. Assim, à força do
que diz o autor Gustavo Junqueira (2016, p. 77), os crimes materiais são os que
descrevem o resultado e o exigem para a consumação, já os crimes formais trazem a
descrição mas não o exigem e, por fim, os de mera conduta não trazem sequer a
descrição do resultado.
Dessa forma, tem-se que o legislador descreve o resultado (alteração do
mundo físico), requerido para a configuração de determinado crime, mas só o exige
nos crimes materiais.
responsabilizado pelos atos até então efetuados, justamente porque a concausa não
foi planejada ou desejada por ele.
Portanto, para que os crimes materiais possam se configurar, necessária a
existência de nexo causal entre a conduta do agente e o resultado decorrente desta.
Logo, todos os atos feitos pelo agente para que o resultado se tornasse possível serão
tomados como nexo de causalidade entre a conduta e o referido resultado. Porém, o
resultado advindo de uma concausa superveniente exclui o nexo causal entre a
conduta anterior e o resultado, fazendo com que o agente somente responda pelos
atos efetuados até o acontecimento da concausa.
2.2.1.4 Tipicidade
Primeiramente, vale ressaltar que a palavra tipo, para o direito criminal, refere-
se à descrição de uma conduta permitida (tipo justificador), ou criminosa (tipo
incriminador), por uma normal penal (MASSON, 2019, p. 225). Logo, um tipo penal
será sempre uma conduta disposta em lei, seja esta permitida ou proibida.
Consonantemente, destaca-se o que é a tipicidade no âmbito do direito penal.
Segundo Junqueira (2016, p. 81), tipicidade “é a perfeita adequação entre o fato
concreto e o tipo incriminador.”, ou seja, a conduta enquadrada na norma penal.
Portanto, para que ocorra a tipicidade, deve ser observado se a conduta do agente se
enquadra perfeitamente em uma ou mais norma(s) penal(is), seja(m) esta(s)
permissiva(s) ou punitiva(s).
Ademais, para que seja possível a análise da tipicidade, em um caso concreto,
necessária se faz sua divisão em tipicidade objetiva e subjetiva, o que será visto a
seguir.
a tipicidade objetiva material tem por fim a análise da “importância” do fato, para que,
ao fim, a conduta seja considerada típica por si só, ou insignificante e materialmente
atípica.
Por outro lado, a tipicidade objetiva formal trata-se da letra da lei, ou seja, das
elementares e circunstâncias trazidas pelo tipo penal, que possibilita a análise da
adequação do fato ao tipo (GOMES, 2006).
Diante disso, tem-se que o uso dos conceitos referentes à tipicidade objetiva
tem por finalidade a análise do fato, e seu enquadramento no tipo, tanto por sua
significância penal, quanto pelos elementos do tipo que se encaixam na conduta e
resultado produzido pelo agente, atendo-se sempre aos aspectos exteriores ao
indivíduo.
O Código Penal brasileiro, em seu artigo 18, inciso II, descreve a conduta
culposa como “quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência
ou imperícia.” (BRASIL, 1940).
Cumpre ressaltar que, para que seja punível criminalmente, a conduta culposa
deve ter previsão de sua modalidade dentro do tipo penal, especificamente. Logo, se
22
o tipo não prevê tal modalidade, a conduta é atípica. Além disso, salienta-se que a
conduta culposa só se configura com a consumação do resultado, sendo impossível
de se caracterizar na modalidade tentada. (NUCCI, 2019).
Ademais, para que seja configurada a conduta culposa, devem estar
presentes alguns elementos essenciais. O primeiro elemento principal, assim, é
chamado de previsibilidade objetiva que, conforme expõe Masson (2019), é a
possibilidade média, de uma pessoa comum, de prever o resultado de sua conduta e
as consequências de seu ato. O segundo, por sua vez, é chamado de violação do
dever de cuidado, e diz respeito aos cuidados que todos os indivíduos de uma
sociedade conhecem e devem tomar, não necessariamente determinados em lei
(JUNQUEIRA; VANZOLINI, 2019). Logo, dizer que existia uma previsibilidade objetiva
das consequências da conduta do indivíduo, significa que o resultado era previsível
para qualquer pessoa comum. Por outro lado, a violação do dever de cuidado,
portanto, se dá por um descuido inapropriado, e que causa danos a terceiro, sendo
que poderia ser evitado.
Outrossim, a culpa pode se dar em 03 (três) modalidades, quais sejam a de
imprudência, negligência e imperícia. A primeira sendo uma ação que não observa as
cautelas essenciais. A segunda, por sua vez, sendo uma omissão à conduta
esperada. A terceira, por fim, é chamada “culpa profissional”, porquanto embora o
agente esteja habilitado a realizar a conduta, não possui instrução que o capacite,
configurando a falha do próprio agente. (JUNQUEIRA, 2016).
Por fim, e não menos importante, a doutrina classifica a culpa em consciente
e inconsciente e, dessa forma, é possível diferenciar a culpa do dolo eventual, mais
claramente. A culpa consciente se dá à luz da previsão do resultado, mas com certa
confiança de que este não será produzido. Por outro lado, a culpa inconsciente se dá
sem a previsão do resultado, mesmo que possível fosse sua previsibilidade. (NUCCI,
2019). Logo, diferencia-se a culpa do dolo eventual, visto que em nenhuma hipótese
da primeira o sujeito aceita o resultado, já no segundo o agente aceita, ao menos, o
risco de produzi-lo.
23
Além dos crimes praticados com dolo e culpa, o Código Penal brasileiro prevê
a possibilidade da configuração do tipo preterdoloso, ou seja, praticado um crime
dolosamente, com um resultado posterior culposo (BITENCOURT, 2019). A exemplo,
tem-se o crime de lesão corporal seguida de morte, previsto no artigo 129, §3° do
Código Penal (BRASIL, 1940).
No mais, salienta-se que, para que haja a possibilidade da configuração de tal
modalidade de crime, por evento culposo posterior ao doloso, há de existir a previsão
legal dentro do tipo penal, como no caso do crime citado acima.
concursos, no direito penal, tem o objetivo de cumular as penas dos crimes cometidos,
beneficiando o acusado em duas das modalidades. (JUNQUEIRA; VANZOLINI, 2019).
O concurso material, disposto no artigo 69 do Código Penal (BRASIL, 1940),
trata de crimes cometidos mediante duas ou mais condutas, com dois ou mais
resultados, podendo estes serem iguais ou diversos. Nesse caso, as penas finais
aplicadas são somadas, em sua integralidade, nos moldes do artigo acima citado.
No caso do concurso formal, elencado no artigo 70 do Código Penal (BRASIL,
1940), os crimes são cometidos mediante apenas uma conduta, gerando dois ou mais
resultados. Além disso, pode ser classificado em perfeito e imperfeito. No primeiro, o
agente age com dolo em apenas uma das condutas, sendo a(s) outra(s) com culpa,
respondendo, assim, somente pela pena mais alta, aumentada de um sexto até a
metade. No segundo, por sua vez, o agente age com dolo em todos os crimes e
responde pelas penas somadas em sua integralidade. (JUNQUEIRA, 2016).
Por fim, no caso de crime continuado, descrito no artigo 71 do Código Penal
(BRASIL, 1940), o agente age com duas ou mais condutas, originando-se dois ou mais
resultados, sendo eles da mesma espécie e, ao fim, responde apenas pelo crime com
pena maior, aumentada de um sexto até dois terços.
Nesse caso, segue-se o entendimento STJ (BRASIL, 2018), conforme colhe-
se do Recurso Especial 1.767.902/RJ, em que para caracterizar o crime continuado
devem os crimes preencherem os 05 (cinco) requisitos elencados no artigo
supracitado, quais sejam: pluralidade de condutas; meios de execução semelhantes;
semelhança entre os delitos, ou seja, crimes que violam o mesmo bem jurídico
tutelado; semelhança entre os lugares de cometimento, no máximo até cidades
próximas; limite do lapso temporal, de 30 (trinta) dias entre cada um dos crimes.
2.2.2 Antijuridicidade
2.2.3 Culpabilidade
2.2.3.1 Imputabilidade
2.2.3.2 Embriaguez
conhecer da ilicitude de sua conduta. Por tal razão, classifica-se o erro de proibição
cometido pelo sujeito em evitável e inevitável, sendo que o primeiro diminui a pena, e
o segundo exclui a culpabilidade. (JUNQUEIRA; VANZOLINI, 2019).
3.1 TENTATIVA
O instituto da tentativa, que tem sua definição dada pelo artigo 14, II do
Código Penal (BRASIL, 1940), diz o seguinte:
Art. 14 - Diz-se o crime:
Crime consumado
I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição
legal;
Tentativa
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
Pena de tentativa
Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a
pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.
(grifei)
2019). Essa teoria foi adotada expressamente pelo Código Penal brasileiro, nos
crimes de empreendimento e de atentado, por exemplo.
Por fim, a terceira teoria (sintomática), amplia a abrangência do instituto ao
entender que os atos preparatórios geram perigo aos bens jurídicos tutelados pelo
Estado e, portanto, podem e devem ser punidos. (NUCCI, 2009).
Além disso, importante evidenciar que, para possibilitar a configuração de um
crime na forma tentada, deve ser possível fracionar o iter criminis (fases do crime), no
caso concreto. (ANDREUCCI, 2018). Portanto, se em determinado crime é possível
observar-se o início e o final, tanto da cogitação quanto dos atos preparatórios, da
execução e da consumação, tem-se, então, a possibilidade de configurá-lo como
tentado, na medida dos requisitos impostos no tipo.
Nesse sentido, alguns crimes deixam de ser punidos na forma tentada, haja
vista não poderem ser cometidos em 04 (quatro) fases divisíveis ou, ainda, possuírem
previsão legal de impossibilidade de cometimento, ou inexistência de punição, em
suas tentativas.
Conforme Masson (2019), são 12 (doze) tipos criminais que não são passíveis
de punição na forma tentada, são eles:
I- Crimes culposos, uma vez que se faz necessária a presença do dolo
para que a conduta seja punida na forma tentada;
II- Crimes preterdolosos, visto que se tratam de crimes cometidos
inicialmente com dolo e posteriormente com culpa e, sempre impossível a punição de
crime culposo tentado, não admitem, também, o instituto da tentativa;
III- Crimes unissubsistentes, ou seja, cometidos em apenas um ato, sendo
impossível o fracionamento de seu iter ciminis;
IV- Crimes omissivos próprios, visto que que, pela lógica, não se pode tentar
não fazer algo;
V- Crimes de perigo abstrato, onde apenas a consumação gera o referido
perigo;
VI- Contravenções penais, por expressa previsão da Lei de Contravenções
Penais;
34
teoria do assentimento e, por mais que não seja o resultado obtido não fosse fruto
exatamente da vontade do agente, esta ainda se faz presente. (ANDREUCCI, 2019).
A vontade do agente, no dolo eventual, se faz presente no momento da
execução. (NUCCI, 2019). Assim, ao entrar na terceira fase do iter criminis, o agente
tem a vontade de iniciar a execução e não se importa com o resultado que será obtido,
mesmo após prevê-lo e consentir com a probabilidade de produzi-lo.
Com efeito, nota-se que o instituto do dolo eventual se diferencia do instituto
da culpa consciente, abordado no item 2.2.1.4.2.2, visto que, no segundo, o agente
não assume o risco de produzir o resultado após prevê-lo, mas internaliza uma certeza
de que conseguirá evitá-lo. A previsão do resultado está presente nas duas
modalidades e esta é a única semelhança existente entre elas.
A diferença encontra-se estritamente na vontade do agente, sendo que no
dolo eventual esta existe, mesmo que de forma mais tênue que no dolo direto, e na
culpa consciente esta não é observada em momento algum. (NUCCI, 2019). A teor
disso, pode-se dizer que no dolo eventual o agente age com desprezo pelo resultado
danoso, ignorando as consequências de seus atos. E, assim, a frágil linha que auxilia
na distinção entre dolo eventual e culpa consciente pode acabar por se desfazer, visto
que muitas vezes a vontade do agente acaba não sendo observada com clareza.
Portanto, deve-se fazer um juízo de valor ao analisar-se casos em que a
vontade do agente pode definir se o crime foi cometido dolosa (dolo eventual) ou
culposamente. Para tanto, tem-se que um dos critérios que devem ser observados,
primariamente, é a capacidade do homem médio de entender até onde seus atos
executórios se estenderiam e quais os resultados mais prováveis de acontecerem,
independente da possibilidade de evitá-los por alguma habilidade pessoal
(JUNQUEIRA, 2016). Ademais, o perigo causado pelos atos do agente deve ser
levado em conta para distinguir a vontade deste, visto que a extensão de sua vontade
poderá ser medida pelos instrumentos utilizados e os danos que sua conduta causou.
(JUNQUEIRA; VANZOLINI, 2019). Utilizando-se da análise da capacidade de
entendimento do homem médio, bem como observando-se a extensão do perigo
gerado pelos atos do agente, possível será uma abordagem mais justa ao caso,
evitando a impunidade, bem como o excesso de punição.
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Conforme visto anteriormente, atos criminosos são aqueles que ferem algum
bem jurídico tutelado pelo Estado, ou seja, crimes cometidos contra à vida, à
integridade física, à honra, etc. Ademais, para que sejam puníveis, devem os crimes
estarem previstos na lei penal, descrevendo a conduta necessária para sua
configuração, bem como a pena aplicável.
O crime de homicídio, assim, está disposto na parte geral da lei penal,
estritamente no artigo 121 do Código Penal (BRASIL, 1940), veja-se:
Homicídio simples
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social
ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta
provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
Homicídio qualificado
§ 2° Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;
II - por motivo fútil;
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que
dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;
V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de
outro crime:
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
Feminicídio
VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:
VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição
Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança
Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu
cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão
dessa condição:
VIII - (VETADO):
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
39
este. A vontade, então, deixa de ser certa e determinada, para existir de uma forma
geral e não concentrada.
O inciso grifado acima, ao dispor acerca dos requisitos necessários para que
o crime de homicídio seja considerado funcional, possibilita a diferenciação deste em
relação ao homicídio simples.
Nesse sentido, o inciso evidencia a característica pela qual o referido crime é
considerado “funcional”, qual seja o seu sujeito passivo. Assim, conforme dita o
dispositivo, será considerado funcional o crime de homicídio cometido contra qualquer
autoridade, no que tange às autoridades estatais, ou agentes descritos pela
Constituição Federal, que integrem a Força Nacional de Segurança Pública, incluindo
o sistema prisional.
Ao dispor acerca dos agentes, o inciso indica os artigos constitucionais que
os elenca, quais sejam os artigos 142 e 144 da Constituição Federal (BRASIL, 1988):
CAPÍTULO II
DAS FORÇAS ARMADAS
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e
pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares,
43
Essa é, também, a posição adotada por Sanches (2017, p. 355), quando diz
que “não se pode imaginar a possibilidade de que alguém mate um agente de
segurança pública no exercício da função ou em decorrência dela [...] e o faça por
motivo de relevante valor social ou moral.”.
De outro lado, o Superior Tribunal de Justiça (BRASIL, 1992, p. 01) posiciona-
se favorável à compatibilidade, em se tratando de qualificadoras tanto subjetivas
quanto objetivas, pois “não constitui empeço a que incida a qualificadora da
surpresa.”.
Sendo assim, tem-se que é possível a existência da figura do homicídio
privilegiado qualificado, principalmente nos casos em que a qualificadora possui
caráter objetivo. Logo, para que seja possível a aplicação do privilégio do §1°, em
casos de homicídio funcional, deve-se tender para o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça.
Salienta-se, ainda, que o crime de homicídio funcional se encontra listado na
Lei n° 8.072/90, chamada de Lei de Crimes de Hediondos (BRASIL, 1990), em seu
artigo 1°, inciso I, veja-se:
Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no
Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal,
consumados ou tentados:
Portanto, desde que o agente policial que tenha sofrido a ofensa seja membro
de uma das seis instituições listadas pelo artigo supracitado, este estará dentro da
proteção do artigo 121, §2°, VII do Código Penal.
Assim, a problemática se dá na hipótese de uma tentativa incruenta de
homicídio funcional, conduta posterior ao cometimento de determinado delito, somada
à resistência com o empreendimento de fuga.
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sua fuga e, com seu intuito única e exclusivamente voltado para garanti-la, ele saca
sua arma, se vira rapidamente e, sem parar para mirar, dispara na direção do policial
que, por ocasião, esquiva-se do projétil. Nesse ponto, a possibilidade de configuração
da tentativa acaba por não ser inegável. Assim, tem-se a problemática principal, que
diz respeito à compatibilidade dos institutos da tentativa e do dolo eventual.
Nesse sentido, sabe-se que o dolo eventual é característico da conduta do
agente que, sem desejar o resultado, assume o risco de produzi-lo ao realizar
determinada ação ou omissão. Logo, ao disparar sua arma, na terceira situação, o
suspeito assume, ao menos, o risco de causar a morte do policial, agindo com dolo
eventual.
Na situação, frisa-se que o intuito inicial do agente é unicamente garantir sua
fuga. Porém, existe a assunção do risco de causar a morte do agente policial, ao
escolher disparar arma de fogo em direção deste, mesmo sem a vontade específica
de matar, tampouco a certeza de que o atingirá. Logo, não há como dizer que o sujeito
agiu com dolo direto ao disparar a arma em direção ao agente, tendo em vista que
sua vontade estava direcionada a conseguir furtar-se do local. Evidente, dessa forma,
que o sujeito agiu com o dolo eventual, tanto pelo meio escolhido para executar a
ação, quanto pela própria execução.
Tem-se, aqui, o direcionamento da vontade do agente para o meio de
execução, que põe em risco o policial. É esse risco assumido, portanto, que
caracteriza o dolo eventual, e distancia a conduta da culpa consciente.
Sabendo-se com qual dolo o agente agiu no momento do disparo da arma e,
ainda, que não houve consumação do resultado previsto, passa-se à análise de
questão primordial à resolução do problema. É possível a coexistência dos institutos
da tentativa e dolo eventual, na situação apresentada? Assim sendo, necessária se
faz uma reabordagem ao conceito de dolo trazido pelo Código Penal.
Conforme visto anteriormente, o Brasil adotou duas teorias relacionados ao
dolo, a da vontade e a do consentimento/assentimento e, dessa forma, foram
positivadas no artigo 18, I do Código Penal (BRASIL, 1940). Portanto, para o direito
material penal, tem-se que o dolo se dá pelo querer e/ou pela assunção do risco.
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configuração de delitos tentados cometidos com dolo eventual, tendo em vista que o
Código teria adotado as duas teorias do dolo, equiparando-as.
Ademais, o instituto da tentativa não possuiria um dolo próprio e específico,
sendo que se houver comprovação de qualquer modalidade de dolo no cometimento
de um delito, bem como se preenchidos os requisitos da tentativa, esta poderá
configurar-se. Logo, a única incompatibilidade do instituto tentativa relaciona-se com
o delito culposo, sendo que nada impede que um delito cometido por dolo eventual
seja punido na forma tentada.
Por outro lado, há quem posicione-se contra a compatibilidade e, para tanto,
baseiam-se na interpretação do artigo 14, II do Código Penal (BRASIL, 1940), que
descreve o instituto da tentativa.
O principal fundamento para aqueles que seguem a corrente ligada à
incompatibilidade, portanto, seria de que o legislador adotou apenas a teoria da
vontade, no inciso que trata do conceito dos crimes tentados. Releia-se o dispositivo
do Código Penal: “Art. 14 - Diz-se o crime: II - tentado, quando, iniciada a execução,
não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. (BRASIL, 1940).
Para Rogério Greco (2009), a tentativa é admissível apenas nas hipóteses em
que o agente direciona sua vontade à produção do resultado, não sendo compatível,
portanto, com os casos em que há somente a assunção do risco de produzi-lo.
É o que diz Júlio Fabbrini Mirabete (2002, p. 157): “Com fundamento no
elemento subjetivo que se distingue a tentativa de homicídio, que exibe ato inequívoco
de matar, do crime de lesões corporais. Diz-se que não é possível a tentativa com
dolo eventual, já que neste não existe o querer o resultado.”.
De outro lado, mas não destoante, Fernando de Almeida Pedroso entende
que o dolo eventual só é punível acompanhado de um resultado consumado, tendo
em vista que não existe verdadeiramente a vontade do agente, nos casos em que o
este assume determinado risco.
Nos dizeres do legislador, para aqueles que adotaram o posicionamento
contrário à compatibilidade, ao especificar as circunstâncias como sendo alheias à
vontade do agente, a tentativa só poderia ser punida caso estivesse ligada ao próprio
desejo, este último especificamente direcionado a um resultado. Assim, estaria o
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de fogo na direção do agente policial, para garantir sua fuga, está na (in)
compatibilidade dos institutos da tentativa e do dolo eventual.
A corrente que abraça a teoria da compatibilidade entre os institutos,
defendendo a ideia de que o Código Penal equiparou o dolo direto ao eventual, no
dispositivo que conceitua os crimes dolosos, baseia-se no posicionamento de Nelson
Húngria, que participou da redação da referida legislação. A posição entende que não
o Código adotou as teorias da vontade e do assentimento, porém, não com a intenção
de induzir um tratamento diferenciado para cada uma das modalidades. Logo, para a
configuração da tentativa, apenas exige-se a existência do dolo, seja ele direto ou
eventual.
Por outro lado, a corrente contrária à compatibilidade, preceitua que o instituto
da tentativa adotou apenas a teoria do assentimento no que tange ao conceito dos
crimes tentados. Assim, não há como punir o agente por um delito em que este não
depositou qualquer vontade. As “circunstâncias alheias à vontade do agente”,
conforme dita o art. 14, II do Código Penal (BRASIL, 1940), só se configuram quando
há expresso e inequívoco desejo do sujeito, voltado à produção do resultado
específico. Logo, impossível punir o agente pela tentativa de um crime que sequer
desejou.
Por existirem duas correntes doutrinárias e jurisprudenciais divergentes, uma
compactuando com a tese e a outra rejeitando-a, bem como pela ausência de uma
decisão vinculante a respeito, abriu-se um espaço para que os Tribunais Estaduais
julguem os casos conforme suas convicções, podendo estes escolherem
particularmente qual posição irão aderir.
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6 CONCLUSÃO
função pública. Além disso, foi feita uma análise breve acerca do avanço legal, quanto
à proteção aos agentes que exercem papéis importantes na segurança pública do
país, ao incluir o referido delito no rol dos crimes hediondos.
A seguir, foi aberto o tema principal, abordando as problemáticas acerca
da hipótese fática em que o suspeito dispara arma de fogo contra o agente policial,
para garantir sua fuga. Assim, após indicar que jurisprudencialmente o entendimento
é de que o agente age com dolo eventual ao cometer tal conduta, apontou-se o ponto
chave para solucionar o problema formulado, sendo este a análise da compatibilidade
dos institutos da tentativa e do dolo eventual.
A compatibilidade dos institutos é defendida pela corrente jurisprudencial e
doutrinária majoritária e, para justificá-la, os autores e Tribunais entendem que o
Código Penal equiparou as modalidades de dolo, ou seja, seria o dolo direito igual ao
eventual, perante a lei material penal. Portanto, querer um resultado possuiria o
mesmo valor que tomar o risco de produzi-lo. Porém, nada impediria que o juízo
entenda por considerar a eventualidade do dolo quando da dosimetria da pena.
A incompatibilidade, por sua vez, é defendida pela corrente minoritária com
o argumento de que o dispositivo que conceitua a tentativa adotou, expressamente,
apenas a teoria da vontade, em que o agente deseja diretamente o resultado. Logo,
não seria possível configurar um crime tentado quando cometido com dolo eventual,
pois neste não há vontade específica em produzir um resultado.
Cumpre ressaltar que o posicionamento da autora se modificou ao decorrer
da presente monografia. No início, compactuava com a corrente que argumenta a
compatibilidade entre os institutos, com um ideal intrínseco de defesa à política
criminal. Porém, ao aprofundar-se no assunto, não viu como continuar com a opinião
anterior, por perceber a incongruência entre os dispositivos que conceituam a tentativa
e o dolo eventual, em seus próprios incisos.
Pois bem, nos casos em que o suspeito dispara arma de fogo contra agente
policial, com o fim de garantir sua fuga, para configurar-se o crime de homicídio
funcional tentado, após verificado o dolo eventual do agente, deve-se inclinar ao
posicionamento de Nelson Húngria. O referido professor é autor do argumento mais
utilizado pela corrente majoritária e, ao ditar que na tentativa tem-se o mesmo dolo
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que se teria na consumação, bem como que as modalidades de dolo são equiparadas
pelo Código Penal, não haveria empecilho algum para a configuração de um delito
tentado cometido com dolo eventual.
Ademais, para a corrente majoritária a vontade do agente existe, ao agir
com dolo eventual, porém, é direcionada ao meio executório e não ao resultado
propriamente dito e, portanto, seria suficientemente compatível com o instituto da
tentativa. Portanto, resta claro que a corrente é voltada à uma postura defensiva, que
preza pelas políticas criminais e tende a amparar o aspecto punitivo do Estado.
Por outro lado, caso tome-se a posição da corrente minoritária, não há
como configurar-se o crime de homicídio funcional tentado, quando cometido com dolo
eventual, justamente por não haver vontade do agente ao assumir o risco de produzir
o resultado morte.
Particularmente, a autora posiciona-se pela incompatibilidade dos
institutos, pela lógica interpretativa do dispositivo que conceitua a tentativa. Ao ditar
“circunstâncias alheias à vontade do agente”, o Código visivelmente limitou a
aplicação do instituto aos casos em que o agente possui manifesta vontade. Assim,
não há como punir pela tentativa o agente que assume o risco de produzir certo
resultado, visto que não as circunstâncias que impediram a consumação do delito
nada interferiram na vontade do agente, que nunca existiu.
61
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Tentativa. Homicídio. Dolo eventual. Incompatibilidade. O dolo eventual, em linhas
67
gerais definido como a aceitação, pelo agente, da produção do resultado mais grave,
mas que conscientemente não pretende obter, é incompatível com o instituto da
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defensivo. Relator: Newton Brasil de Leão. Porto Alegre, 07 de agosto de 2013.
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SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ Carlos Eduardo Adriano. Direito penal:
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