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ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA

2a EDIÇÃO/2023

1. INTRODUÇÃO 2
1.1. EVOLUÇÃO DO ESTADO E ORDEM ECONÔMICA 2

2. PRINCÍPIOS GERAIS DA ORDEM ECONÔMICA 3

3. DA POLÍTICA URBANA 7

4. DA POLÍTICA AGRÍCOLA E FUNDIÁRIA E DA REFORMA AGRÁRIA 10

5. DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL 11

1
1. INTRODUÇÃO

“A intervenção do Estado na economia sobressaiu-se no século XX, sobretudo pelos efeitos da Primeira
Guerra Mundial e pela perda das crenças ainda existentes na manutenção do Estado Liberal. Nesse período o
Estado adquiriu postura mais intervencionista; deixou de ser omisso, observando o que as Encíclicas Papais tanto
insistiam. Os freios e contrapesos da teoria de Montesquieu também não serviram ao propósito de evitar maiores
transtornos à economia da época. A Revolução Industrial evidenciou problemas que o liberalismo não resolvia e
sua manutenção só agravaria ainda mais a situação”1.
Dessa forma, o Estado percebeu a necessidade de uma maior intervenção nos direitos econômicos e
sociais dada sua relevância. Para Gomes Canotilho, os direitos econômicos podem ser entendidos como:

“Conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos definidores de um determinado


sistema econômico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e
constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica.”

1.1. EVOLUÇÃO DO ESTADO E ORDEM ECONÔMICA2


Partindo da ideia de Estado de Direito, podemos identificar, segundo a doutrina, uma tríplice vertente:
liberal, social e pós-social. No Estado Liberal percebe-se uma evidenciação do indivíduo, delineando-se um Estado
não intervencionista, dentro da perspectiva de “intervenção mínima”.
Diante das novas necessidades sociais, surge a teorização do Estado Social, evidenciando-se o grupo e
colocando a questão social como preocupação principal do Estado. Norberto Bobbio assevera que a proteção dos
direitos sociais requer uma atuação estatal, de forma ativa, diferente da solicitada (ou não solicitada) durante o
Estado Liberal, produzindo tal organização dos serviços públicos, que teria sido a responsável pelo surgimento do
próprio Estado Social.3
O Estado Pós-Social é baseado em movimentos sociais, em um primeiro momento pode-se afirmar que
os institutos clássicos do direito de propriedade e a autonomia da vontade privada eram suficientes para
regulamentar a atividade econômica, até porque o capitalismo primitivo pregava a autorregulação, sem qualquer
interferência do Estado na economia. A partir do século XX, no entanto, a situação começa a ser repensada,
especialmente diante das constantes situações de abuso do poder econômico. Surge, então, “clima” propício para
a constitucionalização da economia. Nesse sentido, o art. 170, caput, da CF/88 estabelece que a ordem
econômica, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

1
Saleme, Edson R. Direito constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (5th edição). Editora Manole, 2022.
2
Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022.
3
Norberto Bobbio, A era dos direitos, p. 72.

2
2. PRINCÍPIOS GERAIS DA ORDEM ECONÔMICA

O art. 170 da Constituição Federal apresenta as bases da ordem econômica, define seus objetivos e os
princípios que devem ser respeitados em seu âmbito.

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:

I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - DEFESA DO CONSUMIDOR;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental
dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte (EPP) constituídas sob as leis brasileiras e
que tenham sua sede e administração no País.

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de
autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

Interessante termos em mente que a Constituição de 1988, inova e passa a tratar da ordem social
em título próprio, desvinculando-a da ordem econômica, que, por sua vez, recebe matérias sobre o sistema
financeiro nacional (Título VII). Alguns temas da ordem social que eram assegurados nas Constituições anteriores,
como os direitos dos trabalhadores, foram deslocados para o Título II, que trata dos direitos e garantias
fundamentais (direitos sociais).4
São princípios da ordem econômica e financeira, comentados por Sylvio Motta5:
1. Soberania Nacional: “este princípio complementa o contido no inciso I do artigo primeiro de nossa
Constituição. Enquanto lá se impõe que nosso Estado seja politicamente soberano, aqui se exige que esta
soberania engloba também a esfera econômica, não no sentido de excluir a atividade econômica
estrangeira no território nacional – o que é atualmente inviável e contrário aos mais básicos postulados de
coexistência das nações –, mas no sentido de fortalecer a economia interna, fazendo-a preponderar sobre
os investimentos estrangeiros, na atividade econômica desenvolvida em nosso Estado;”
Importante salientar que trata-se de fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, I, da CF) e,
segundo o professor Pedro Lenza, quando previsto como princípio da ordem econômica visa evitar a

4
Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022.
5
Motta, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (29th edição). Grupo GEN, 2021.

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influência descontrolada de outros países em nossa econômia.

2. Propriedade Privada: “o respeito à propriedade privada é princípio basilar de qualquer Estado capitalista”
(corolário dos direitos individuais previstos no art. 5º, XXII, XXIV, XXV, XXVI, CF);
Ao instituir a propriedade privada como princípio da ordem econômica, o constituinte assegurou a
propriedade privada dos meios de produção.

3. Função social da propriedade: A função social da propriedade (art. 5.º, XXIII) se desdobra em política
urbana (arts. 182 e 183), no âmbito da política agrícola e fundiária, bem como da reforma agrária (arts. 184
a 191).6

4. Livre concorrência: “a livre concorrência decorre diretamente da liberdade de iniciativa, considerada,


como dito, um dos fundamentos da ordem econômica brasileira. A respeito convém lembrar que “ofende o
princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do
mesmo ramo em determinada área”, nos termos da Súmula Vinculante nº 49;”
O art. 173, § 4.º, dispõe que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos
mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Nesse contexto, para se ter
um bom exemplo, lembramos o entendimento do STF que declarou inconstitucional a proibição ou
restrição, por meio de lei municipal, do transporte individual de passageiro por motoristas cadastrados em
aplicativos (e.g. Uber, Cabify, 99 Táxi, Lyft etc.)7, vejamos a decisão da Corte:

Ementa: Direito constitucional. Recurso Extraordinário. Repercussão Geral. Transporte individual remunerado de
passageiros por aplicativo. livre iniciativa e livre concorrência.

(...)

6. Recurso extraordinário desprovido, com a fixação das seguintes teses de julgamento: “1. A proibição ou
restrição da atividade de transporte privado individual por motorista cadastrado em aplicativo é
inconstitucional, por violação aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência; e 2. No exercício de
sua competência para regulamentação e fiscalização do transporte privado individual de passageiros, os
Municípios e o Distrito Federal não podem contrariar os parâmetros fixados pelo legislador federal (CF/1988, art.
22, XI)”.(RE 1054110, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 09/05/2019, PROCESSO
ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-194 DIVULG 05-09-2019 PUBLIC 06-09-2019)

5. Defesa do consumidor: “a defesa do consumidor, além de ser princípio da ordem econômica, é também
direito fundamental individual, nos termos do art. 5º, XXXII, o que autoriza a intervenção do Estado no
domínio econômico amparado por tal finalidade;”
Estamos diante da consagração, nas relações de consumo, do princípio da vulnerabilidade, tendo o
constituinte considerado que o consumidor é a parte mais fraca da relação. A proteção ao consumidor se

Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022.
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Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022
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implementa, dentre tantos instrumentos, pelo CDC (Lei n. 8.078/90), e, apenas para recordar, o STF
entendeu a sua aplicação nas relações entre instituições financeiras e seus usuários:

“... As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de
Defesa do Consumidor. ‘Consumidor’, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou
jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. Ação direta julgada
improcedente” (ADI 2.591-ED, Rel. Min. Eros Grau, j. 14.12.2006, DJ de 13.04.2007).

Finalmente, lembramos que o STF, apreciando o tema 210 da repercussão geral, fixou a seguinte tese no
tocante ao transporte aéreo: “nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os
tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros,
especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do
Consumidor” (RE 636.331, j. 25.05.2017, DJE de 13.11.2017).8

6. Defesa do meio ambiente: “este dispositivo foi alterado pela EC no 42, de 2003, justamente para autorizar
um tratamento mais benéfico, inclusive tributário, conforme o impacto ambiental da atividade econômica;”
De acordo com o art. 225, caput, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.9

7. Redução das desigualdade regionais e sociais: ”a redução das desigualdades, mais que princípio da
ordem econômica, é um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (CF, art. 3º, III);”
Esse princípio é implementado por diversos instrumentos, como a criação de regiões administrativas (art.
43), a lei que institui o plano plurianual (art. 165, § 1.º), a possibilidade de concessão de incentivos fiscais na
forma do art. 151, I, o fundo de erradicação da pobreza, que teve o seu prazo prorrogado por tempo
indeterminado nos termos da EC n. 67, de 22.12.2010 etc.10

8. Busca do pleno emprego: “princípio que decorre diretamente do outro fundamento da ordem econômica,
o trabalho humano, além de constituir um direito fundamental de segunda geração;”

9. Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que
tenham sua sede e administração no País: “o dispositivo foi alterado pela EC nº 6/1995. Na sua redação
original, era assegurado tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de
pequeno porte; o art. 171, I, revogado pela mesma emenda, conceituava como brasileira a empresa
constituída sob nossas leis e com sede e administração no país. Com a alteração constitucional, o
tratamento favorecido permanece, mas agora ele é dirigido a todas as empresas de pequeno porte, seja

Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022
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seu capital nacional ou estrangeiro, desde que sejam constituídas sob as nossas leis e tenham sua sede e
administração no país. Não se encontra mais expressa no texto constitucional a conceituação de empresa
brasileira, mas os critérios que serviam para sua definição – constituição sob a lei pátria e sede e
administração no Brasil – são agora requisitos para a obtenção do tratamento favorecido, de acordo com a
nova redação do art. 170, IX.”

O art. 173, CF, dispõe sobre as hipóteses em que se autoriza ao Estado atuar diretamente na área
econômica:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo
Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante
interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de
serviços, dispondo sobre:

I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;

II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações
civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração
pública;

IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas


minoritários;

V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.

§ 2º As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não
extensivos às do setor privado.

§ 3º A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.

§ 4º - lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da
concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

§ 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a
responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a
ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

Dessa forma, fica claro que “a exploração de atividade econômica pelo poder público deve estar
condicionada ao princípio da subsidiariedade; na ordem econômica revela-se o entendimento de que o Estado
intervém na economia de forma excepcional, supletivamente; no âmbito federativo, com a valorização das esferas
de poder local, ou seja, valorizando, ao máximo, o poder municipal como unidade da Federação; e na participação
popular, incentivando os cidadãos a se manifestarem em diversas decisões locais, por meio da opinião na tomada
de decisões governamentais.11”
A intervenção direta do Estado é realizada por meio das empresas públicas e sociedades de economia

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Saleme, Edson R. Direito constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (5th edição). Editora Manole, 2022.

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mista. A intervenção indireta por sua vez está regulamentada no art. 174, CF:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as
funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este DETERMINANTE para o setor público e
INDICATIVO para o setor privado.

§ 1º A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual


incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento.

§ 2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.

§ 3º O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do


meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros.

§ 4º As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na autorização ou concessão para
pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e
naquelas fixadas de acordo com o art. 21, XXV, na forma da lei.

Sendo assim, “apesar de o texto constitucional de 1988 ter consagrado uma economia descentralizada, de
mercado, autorizou o Estado a intervir no domínio econômico como agente normativo e regulador, com a
finalidade de exercer as funções de fiscalização, incentivo e planejamento indicativo ao setor privado, sempre com
fiel observância aos princípios constitucionais da ordem econômica.12”

🚨JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco (FCC - 2022), considerando o entendimento do STF e
a Constituição federal foi tida como correta a alternativa que apontava: “a União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento
jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias,
previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.”
Na prova para Procurador do Estado de Rondônia (CESPE - 2022), foi assinalada como correta, a despeito dos
princípios e valores que tutelam a ordem econômica, a alternativa que trouxe: ”A função social da propriedade
refere-se à utilização racional no uso da propriedade privada, sob pena de expropriação.”

3. DA POLÍTICA URBANA

A política urbana, é competência dos municípios, que devem efetivá-la por meio do plano diretor, e está
regulamentada nos arts. 182 e 183 da CF.
O art. 182, CF, é regulamentado pelo Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257, de 10.07.2001). O dispositivo
estabelece a obrigatoriedade do Plano Diretor para cidades com mais de 20 mil habitantes, in litteris:

Moraes, Alexandre D. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (38th edição). Grupo GEN, 2022.
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Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes
gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e
garantir o bem-estar de seus habitantes.

§ 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de 20 mil
habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.

§ 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de
ordenação da cidade expressas no plano diretor.

§ 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.

§ 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir,
nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que
promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II -IPTU progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo
Senado Federal, com prazo de resgate de até 10 anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o
valor real da indenização e os juros legais.

O § 2º, do art. 182, também é de extrema importância, uma vez que prevê que a propriedade urbana
cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais do plano diretor.
O § 4º, do art. 182, por sua vez, estabelece uma ordem para a aplicação das sanções aos proprietários que
não utilizarem seus imóveis de acordo com sua função social. Conforme ensina Sylvio Motta13:

“Nos termos da Lei no 10.257/2001, considera-se subutilizado o imóvel cujo aproveitamento seja inferior ao
mínimo definido no plano diretor ou em legislação dele proveniente.

A constituição da obrigação dá-se mediante notificação ao proprietário para utilizar, edificar ou parcelar seu
imóvel, devendo ser averbada no Registro de Imóveis competente.

Os prazos para que o proprietário cumpra a obrigação, também fixados na lei específica, não poderão ser
inferiores a:

1. 1 ano, a contar da ciência da notificação, para que seja protocolado o projeto no órgão municipal
competente;

2. 2 anos, a contar da aprovação do projeto, para que se iniciem as obras de execução.

Em empreendimentos de grande porte, em caráter excepcional, lei municipal específica poderá prever a
conclusão do projeto em etapas, assegurando que o projeto protocolado e aprovado abranja todo o
empreendimento.

A obrigação de parcelar, edificar ou utilizar tem natureza real, vinculando-se ao imóvel, não ao seu proprietário,
de modo que é transferida junto com aquele em caso de transmissão por ato inter vivos ou causa mortis em data
posterior à notificação.”

O art. 183, da Constituição Federal trata do usucapião constitucional urbano:

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Motta, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (29th edição). Grupo GEN, 2021.

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Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até 250m2, por 5 anos, ininterruptamente e sem
oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos,


independentemente do estado civil.

§ 2º Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

“A usucapião é forma originária de aquisição de propriedade imóvel, que se efetiva mediante sua
ocupação mansa e pacífica, sem oposição do titular do domínio, por determinado período de tempo. No caso da
usucapião pró-moradia, este período é de 5 anos”14. Mais três requisitos são impostos pela Constituição para que
se configure essa hipótese da usucapião, conforme ensina Sylvio Motta15:
a. que o imóvel seja utilizado para a moradia do possuidor ou de sua família. A Carta não veda que haja
exploração de outra natureza do imóvel, apenas exige que o imóvel seja utilizado como moradia para o
possuidor ou sua família. Com isso, percebe-se que apenas pessoas físicas podem se valer dessa hipótese
de usucapião;
b. que o possuidor não seja proprietário de qualquer outro imóvel urbano ou rural;
c. que não se trate de um imóvel público, pois o § 3º do art. 183 declara que os imóveis públicos não serão
adquiridos por usucapião, consagrando a imprescritibilidade dos imóveis públicos.

🚨JÁ CAIU
Na prova para Magistratura do Estado de Pernambuco (FGV - 2022), foi contada a seguinte história: “João,
proprietário de terreno no centro da cidade de Pouso Feliz, subutiliza-o, sem edificar ou parcelar, mantendo-o
abandonado, com vegetação aleatória, acúmulo de água, entre outras situações que deixam claro o não
cumprimento do princípio da função social.” a questão pedia para que se assinalasse a alternativa correta que
indicava que a melhor a ser tomada seria: “o Município onde está localizado o terreno deverá intimar João a
edificar, parcelar ou utilizar o terreno, sob pena de estipulação de alíquotas progressivas de IPTU”.
Na prova para Defensor Público do Estado do Paraná (Instituto AOCP - 2022), foi assinalada como correta a
alternativa que trouxe: “o Poder Público Municipal, mediante lei específica, para área incluída no Plano Diretor,
pode determinar, nos termos de lei federal, que proprietário de solo urbano não edificado, subutilizado ou não
utilizado promova seu adequado aproveitamento, sob pena de, sucessivamente: parcelamento ou edificação
compulsórios, IPTU progressivo no tempo e desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de
emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até 10 anos.”

Motta, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (29th edição). Grupo GEN, 2021.
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Motta, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (29th edição). Grupo GEN, 2021.
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4. DA POLÍTICA AGRÍCOLA E FUNDIÁRIA E DA REFORMA AGRÁRIA

Em primeiro lugar, é importante conceituar política agrícola e reforma agrária, para isso utilizaremos os
conceitos apresentados pelo professor Alexandre de Moraes16:

POLÍTICA AGRÍCOLA REFORMA AGRÁRIA

A política agrícola será planejada e executada na forma A Constituição Federal concedeu à União a
da lei, com a participação efetiva do setor de competência para desapropriar por interesse social,
produção, envolvendo produtores e trabalhadores para fins de reforma agrária, o imóvel rural. Reforma
rurais, bem como dos setores de comercialização, de agrária deve ser entendida como o conjunto de notas e
armazenamento e de transportes, levando em conta, planejamentos estatais mediante intervenção do
especialmente, os seguintes preceitos: os Estado na economia agrícola com a finalidade de
instrumentos creditícios e fiscais; os preços promover a repartição da propriedade e renda
compatíveis com os custos de produção e a garantia fundiária. Esse procedimento expropriatório para fins
de comercialização; o incentivo à pesquisa e à de reforma agrária deverá respeitar o devido processo
tecnologia; a assistência técnica e extensão rural; o legal, havendo necessidade de vistoria e prévia
seguro agrícola; o cooperativismo; a eletrificação rural notificação ao proprietário, uma vez que haverá
e irrigação; a habitação para o trabalhador rural. privação de bens particulares,20 sendo considerada
modalidade de “desapropriação-sanção”.

O tema está regulamentado nos arts. 184 a 191, CF.

Art. 184. COMPETE À UNIÃO desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural
que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida
agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até 20 anos, a partir do 2° ano de
sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.

§ 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a
propor a ação de desapropriação.

§ 3º Cabe à LC estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de
desapropriação.

§ 4º O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o montante de
recursos para atender ao programa de reforma agrária no exercício.

§ 5º São ISENTAS DE IMPOSTOS federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis


desapropriados para fins de reforma agrária.

Conforme conclui Sylvio Motta: “É fácil perceber que todo o art. 184 denota a importância que a Constituição

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Moraes, Alexandre D. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (38th edição). Grupo GEN, 2022.

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outorga à função social da propriedade rural, estabelecendo, minuciosamente, as formas de intervenção do Estado
na propriedade improdutiva.17”
O art. 185, CF, prevê as propriedades insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária, na
sequência o art. 186 analisa se o bem de produção rural está ou não cumprindo a sua função social:

Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:

I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;

II - a propriedade produtiva.

Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento
dos requisitos relativos a sua função social.

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e
graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Saltando para o art. 191, CF, este possui elevada importância, uma vez que dispõe sobre o usucapião
constitucional rural:

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por 5 anos
ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a 50 hectares, tornando-a produtiva
por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

⚠️ ATENÇÃO
“A grande diferença desta modalidade especial de usucapião, comparativamente à usucapião pró-moradia,
é, além da área máxima muito superior – cinquenta hectares –, a exigência de que o possuidor, com o seu trabalho
ou o de sua família, torne a propriedade rural produtiva, pois é esta justamente sua finalidade.18”

5. DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL

O art. 192, CF que dispõe sobre o sistema financeiro nacional, foi alterado por meio da EC n. 40/2003, a
qual manteve o caput, mas revogou todos os seus incisos.
Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País
e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de

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Motta, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (29th edição). Grupo GEN, 2021.
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Motta, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (29th edição). Grupo GEN, 2021.

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crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital
estrangeiro nas instituições que o integram.

Para Edson Ricardo Saleme19, “basicamente, o artigo determina seja referido Sistema estruturado de
forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as
partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito. Mantém a lei complementar para regular sobre a
participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.”
Conforme apresenta Pedro Lenza extraindo o conhecimento do professor José Afonso da Silva, dois são
os sistemas financeiros regulados na Constituição:
a) público: “que envolve os problemas das finanças públicas e os orçamentos públicos, constante dos arts.
163 a 169”;
b) parapúblico: “que ela denomina de Sistema Financeiro Nacional, previsto no art. 192, cujos incisos e
parágrafos foram desconstitucionalizados pela Emenda Constitucional 40/2003”.
Apesar disso, continua o mestre, “... ainda se pode dizer que o Sistema Financeiro Nacional cuida das
instituições financeiras creditícias, públicas ou privadas, de seguro, previdência (privada) e capitalização, todas sob
estrito controle do Poder Público (art. 192). O Banco Central, que é instituição financeira, constitui, em verdade, um
elo entre as duas ordens financeiras (arts. 164 e 192)”20

📌 OBSERVAÇÃO
Interessante que um dos incisos revogados do art. 192 é o que tratava da previsão de taxa de juros reais
de 12% ao ano, o STF entendia que o revogado § 3.º do art. 192, que fixava as taxas dos juros reais não superiores
a 12% a.a., era norma constitucional de eficácia limitada, dependente de lei complementar para sua aplicação
prática.
A EC n. 40, de 29.05.2003 (PEC n. 53/99 da CD e n. 21/97 do SF), ao tratar do Sistema Financeiro Nacional,
alterou a redação do inciso V do art. 163 e do caput do art. 52 do ADCT, revogando todos os incisos e parágrafos do
art. 192, permitindo a sua regulamentação por mais de uma lei complementar e não por apenas uma lei
complementar como era antes.
Em razão dessa nova sistemática, a já desprestigiada taxa de juros reais de 12% a.a.
desconstitucionaliza-se, infelizmente, assim como as importantes regras que constavam do referido art. 192.
Cabe destacar a Súmula Vinculante nº 7/2008, com o seguinte teor: “a norma do § 3º do artigo 192 da
Constituição, revogada pela Emenda Constitucional n. 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano,
tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar”.21

Saleme, Edson R. Direito constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (5th edição). Editora Manole, 2022.
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Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022
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Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (26th edição). Editora Saraiva, 2022

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