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Palavras chaves
Assunto
Cosmovisão Reformada
1
Este capítulo com variações encontra-se em diversos textos meus. Ele é colocado aqui, com ênfases
específicas, apenas para que possamos entender suficientemente como a Reforma fundamentou a sua fé a
partir das Escrituras.
2
Jacques de Senarclens, Herdeiros da Reforma, São Paulo: ASTE, 1970, p. 103.
3
Timothy George, Teologia dos Reformadores, São Paulo: Vida Nova, 1994, p. 319.
4
Alister E. McGrath, A Revolução Protestante, Brasília, DF.: Editora Palavra, 2012, p. 12.
Tentando pensar e viver como um Reformado: Reflexões de um estrangeiro residente - Rev. Hermisten – 02/11/2023 – 2
Introdução
O tempo em que nós vivemos normalmente tem tanta influência sobre nós
que medimos as eras passadas por ele, pensando que anteriormente o que
deveria ser feito ou deveria ser impossível é o que hoje está feito ou é
impossível. Em seguida as pessoas cujo testemunho deve-se usar,
especialmente aquelas que têm sido conhecidas ao longo dos anos por sua
santidade e virtude, frequentemente nos levam ao erro por sua autoridade.
Por último, o amor à opinião e doutrinas que gozam de nossa afeição
frequentemente constrange nossas mentes, e mesmo inconscientemente
podemos ter visões errôneas dos fatos. Essa servidão tripla deve, portanto,
5
com toda as nossas forças, ser arrancada de nossas mentes.
As fronteiras históricas
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O medievalista Jacques Le Goff (1924-2014) discute essa questão no que concerne à periodicidade da Idade
Média. Veja-se: Jacques Le Goff, Em busca da Idade Média: conversas com Jean-Maurice de Montremy, Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006, p. 53ss. Devemos ter em mente também, que o período do
Renascimento é considerado com certa elasticidade no que se refere ao seu início e fim. Sciacca (1908-1975),
por exemplo, o coloca como que indo dos séculos XIII-XIV até XVII-XVIII. (M.F. Sciacca, História da
Filosofia, 3. ed. São Paulo: Mestre Jou, 1968, v. 2, p. 8). Vejam-se: Renascimento: In: José Ferrater Mora,
Dicionário de Filosofia, São Paulo: Loyola, 2004, v. 4, [p. 2510-2512], p. 2510; G. Fraile, Historia de la
Filosofia, Madrid: La Editorial Catolica, S.A., (Biblioteca de Autores Cristianos), 1966, v. 3, p. 8-9; Philip
Schaff; David S. Schaff, History of the Christian Church, Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers,
1996, v. 6, p. 561-562; John M. Frame, A History of Western Philosophy and Theology, Phillipsburg, New
Jersey: P&R Publishing, 2015, p. 165-168. Devemos considerar também, que o Renascimento não ocorreu
simultaneamente em todas cidades e países que o conheceram (Ver: Paul Johnson, O Renascimento, Rio de
Janeiro: Objetiva, 2001, p. 12ss.).
9
Mesmo o filósofo dominicano Fraile (1909-1970), desejoso de mostrar a grande relevância do período
Medievo, tem de se render aos fatos. Escreve: "Em muitos aspectos, o 'Renascimento' é a culminação da
Idade Média, a etapa final de um longo processo de desenvolvimento. Porém ao mesmo tempo entram em
função outros fatores que abrem o começo de uma nova era (...). O Renascimento não é uma ruptura
completa com seu passado imediato, nem um salto brusco, menos ainda uma ressurreição, senão o resultado
de um processo histórico, cujas raízes mais profundas e autênticas devem ser buscadas em solo medieval (...).
Não obstante, o Renascimento não é uma simples continuação da Idade Média” (Guillermo Fraile, Historia
de la Filosofia, Madrid: La Editorial Catolica, S.A., (Biblioteca de Autores Cristianos), 1966, v. 3, p. 8-9,12 e
16).
Por sua vez, o marxista Bloch (1885-1977), não poupa elogios à Renascença: “Nosso tema é uma aurora
como a história universal rara vezes contemplou, com o frescor de uma classe ascendente; em uma palavra: o
Renascimento. Não foi simplesmente um novo renascimento no sentido de que algo velho houvera voltado a
aparecer, como, por exemplo, a Antiguidade, segundo a interpretação corrente; senão que foi um nascimento
de algo que antes jamais havia passado pela mente humana, uma irrupção de figuras como jamais havia sido
vista sobre a terra” (Ernst Bloch, Entremundos en la Historia de la Filosofía, Madrid: Taurus Ediciones,
1984, p. 149). (Vejam-se: Alister McGrath, The Intellectual Origins of The European Reformation,
Cambridge, Massachusetts: Blackwell Publishers, 1995 (reprinted), p. 191ss.; Jean Delumeau, A Civilização
do Renascimento, Lisboa: Editorial Estampa, 1984, v. 1, p. 19-20; Daniel-Rops, A Igreja da Renascença e da
Reforma: I. A reforma protestante, São Paulo: Quadrante, 1996, p. 173ss.; Paul Kristeller, Tradição Clássica
e Pensamento do Renascimento, Lisboa: Edições 70, (1995), p. 12; Paolo Rossi, O Nascimento da Ciência
Moderna na Europa, Bauru, SP.: EDUSC, 2001, p. 16-18; Christian Amalvi, Idade Média: In: Jacques Le
Goff; Jean-Claude Schmitt, Coords. Dicionário Temático do Ocidente Medieval, Bauru, SP.; São Paulo, SP.:
Editora da Universidade Sagrado Coração; Imprensa Oficial do Estado, 2002, v. 1, [p. 537-551], p. 548;
Jacques Le Goff, Em busca da Idade Média: conversas com Jean-Maurice de Montremy, Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2006, p. 55; É. Bréhier, História da Filosofia, São Paulo: Mestre Jou, 1977-1978, I/3,
p. 206ss.
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Daniel-Rops, A Igreja da Renascença e da Reforma: I. A reforma protestante, p. 173.
11
John Piper, O Legado da Alegria Soberana: a graça triunfante de Deus na vida de Agostinho, Lutero e
Calvino, São Paulo: Shedd, 2005, p. 124.
12
Michael Horton, Doutrinas da fé cristã, São Paulo: Cultura Cristã, 2016, p. 16-17.
13
Karl Barth, Esboço de uma Dogmática, São Paulo: Fonte Editorial, 2006, p. 12.
14
Cf. Gene Edward Veith, Jr., De Todo o Teu Entendimento, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 22-23. Veja-se:
Hermisten M.P. Costa, Introdução à Metodologia das Ciências Teológicas, Goiânia, GO.: Cruz, 2015, p. 180-
193.
15
Veja-se a exposição de Alan Richardson, Así se hicieron los Credos: Una breve introducción a la historia de
la Doctrina Cristiana, Barcelona: Editorial CLIE, 1999, p. 15ss.
16
Veja-se, por exemplo: Francis A. Schaeffer, Nenhum conflito final: a Bíblia sem erro em tudo o que ela
afirma, Brasília, DF.: Monergismo, 2017, p. 13-33.
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Veja-se: F.A. Schaeffer, O Deus que intervém, São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 250-251.
18
Georges Duby (1919-1996), dentro de uma perspectiva puramente histórica, admite: “O Cristianismo, que
impregnou fundamentalmente a sociedade medieval, é uma religião da história. Proclama que o mundo foi
criado num dado momento e que, num outro, Deus fez-se homem para salvar a humanidade. A partir disso, a
história continua e é Deus quem a dirige” (Georges Duby, Ano 1000, ano 2000, na pista de nossos medos,
São Paulo: Editora UNESP; Imprensa Oficial do Estado, 1999, p. 16). “Os historiadores insistiram com
justeza sobre o fato de que o cristianismo é uma religião histórica, ancorada na história e se afirmando como
tal” (Jacques Le Goff, Tempo: In: Jacques Le Goff; Jean-Claude Schmitt, Coords. Dicionário Temático do
Ocidente Medieval, Bauru, SP.; São Paulo, SP.: Editora da Universidade Sagrado Coração; Imprensa Oficial
do Estado, 2002, v. 2, p. 534). “O cristianismo, como também a religião de Israel, da qual ele nasceu, se
apresenta como uma religião histórica de forma absolutamente concreta, em comparação à qual nenhuma das
outras religiões do mundo pode se equiparar – nem mesmo o Islã, apesar de este se aproximar mais do
cristianismo e do judaísmo, nesse sentido, que qualquer outra religião” (Christopher Dawson, Dinâmicas da
História no Mundo, São Paulo: É Realizações Editora, 2010, p. 343). Do mesmo modo: Marc Bloch,
Apologia da história, ou, O ofício do historiador, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997, p. 58. Veja-se também:
Gordon H. Clark, Uma visão cristã dos homens e do mundo, Brasília, DF.: Monergismo, 2013, p. 85, 92.
19
Veja-se: Alister E. McGrath, Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do Evangelicalismo, São
Paulo: Shedd Publicações, 2007, p. 23ss. “Qualquer coisa que se apresente como cristianismo, mas
que não insista na absoluta e essencial necessidade de Cristo, não é cristianismo. Se Ele não for o
coração, a alma e o centro, o princípio e o fim do que é oferecido como salvação, não é a salvação
cristã, seja lá o que for” (D. M. Lloyd-Jones, O supremo propósito de Deus: Exposição sobre Efésios
1.1-23, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 143). “O evangelho nos
confronta com fatos. Ele se baseia completamente numa pessoa; está fundamentado em fatos
definidos que ocorreram ao longo da história. (...) Ele me conduziu por entre os fatos, ao longo
do túnel das trevas em direção à aurora que ilumina a outra extremidade” (D.M. Lloyd-Jones,
Não se perturbe o coração de vocês, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2016,
p. 29). Vejam-se Alister E. McGrath, A gênese da doutrina: fundamentos da crítica doutrinária, São
Paulo: Vida Nova, 2015, p. 195ss.; D.A. Carson, O que é o evangelho? – revisitado: In: Sam Storms;
Justin Taylor, orgs., John Piper: Ensaios em sua homenagem, São Paulo: Hagnos, 2013, [p. 177-
206], p. 204.
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Veja-se: Michael S. Horton, Os Sola’s de Reforma: In: J.M. Boice; B. Sasse, Reforma Hoje, São Paulo:
Cultura Cristã, 1999, [p. 97-127], p. 97.
21
Herman Bavinck, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 311.
22
Mark A. Noll, Momentos Decisivos na História do Cristianismo, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2000, p.
16. Veja-se também: Clyde P. Greer, Jr., Refletindo Honestamente sobre a História: In: John F. MacArthur Jr.
ed. ger. Pense Biblicamente!: recuperando a visão cristã do mundo, São Paulo: Hagnos, 2005, p. 400-401.
23
Cf. J. Gresham Machen, Cristianismo e Liberalismo, São Paulo: Os Puritanos, 2001, p. 77.
24
Karl Barth, A Palavra de Deus e a Palavra do homem, São Paulo: Novo Século, 2004, p. 217.
25
“Gostemos ou não, não podemos escapar ao fato de que historicamente o Cristianismo foi fundado sobre a
crença na ressurreição” (Alan Richardson, Así se hicieron los Credos: Una breve introducción a la historia
de la Doctrina Cristiana, Barcelona: Editorial CLIE, 1999, p. 24).
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Jesus Cristo é a revelação final e especial de Deus. Porque Jesus Cristo era
verdadeiramente Deus Ele nos mostrou mais plenamente com quem Deus
era semelhante do que qualquer outra forma de revelação. Porque Jesus foi
também completamente homem, Ele falou mais claramente a nós do que
26
pode fazê-lo qualquer outra forma de revelação.
No final de sua vida, Paulo, com a consciência certa de ter concluído fielmente o
seu ministério, exorta ao jovem Timóteo:
Prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende,
exorta com toda a longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo em que
não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres
segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos;
e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas (mu=qoj
= lenda, mito). Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições,
faze o trabalho de um evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério.
(2Tm 4.2-5).
A História da Igreja, bem como da Teologia, tem um lado divino: Deus dirige a
História e, um lado humano: os fatos compartilhados por todos nós que a vivemos.
Os atos de Deus na história não são objeto de análise do historiador. Não somos
Lucas, inspirados infalivelmente por Deus, apresentando uma interpretação
inspirada.27
26
James W. Sire, O universo ao lado, São Paulo: Hagnos, 2004, p. 40.
27
Conforme já citamos, Carson constatando a secularização na prática e nos discursos, arrematou: "Hoje não
existe um departamento de história na terra que aprovaria uma dissertação de doutoramento que tentasse
inferir algumas coisa sobre a providência" (D.A. Carson, O Deus amordaçado: o Cristianismo confronta o
pluralismo, São Paulo: Shedd Publicações, 2013, p. 38-39). Por sua vez, estimulando a nossa modéstia na
interpretação da histórica, veja-se: Darryl G. Hart, 1929 e tudo aquilo, ou o que o calvinismo diz aos
historiadores em busca de significado?: In: David W. Hall, Calvino em praça pública, São Paulo: Cultura
Cristã, 2017, p 19-34.
28
Ver: Michel De Certeau, A Escrita da História, 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 33ss.
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A História da Igreja, por exemplo, é uma ciência que não está atrelada a nenhuma
ciência em particular. Como ciência histórica, deve apresentar um quadro histórico e
cronológico dos principais fatos da vida da Igreja do período analisado. Para que
isso seja feito com clareza, tornam-se necessárias fontes documentais, onde
possamos nos alicerçar para exaurir as informações de cada época, a fim de
formular um quadro interpretativo coerente com os documentos disponíveis.
29
Nelson W. Sodré, Formação Histórica do Brasil, São Paulo: Brasiliense, (1962), p. 3.
30
Veja-se: R.G. Collingwood, A Ideia de História, Lisboa: Editorial Presença, [s.d.], p. 21.
31
“O homem sente necessidade absoluta de chegar ao conhecimento autêntico do que verdadeiramente
aconteceu, ainda que tenha consciência da pobreza dos meios de que para isso dispõe” (Johan Huizinga, El
Concepto de la Historia y Otros Ensayos, 4. reimpresión, México: Fondo de Cultura Econômica, 1994, p.
92).
32
Veja-se: Quentin Skinner, Liberdade antes do Liberalismo, São Paulo: Editora UNESP/Cambridge, 1999, p.
90.
33
Georges Duby, O Prazer do Historiador: In: Pierre Nora, et. al. Ensaios de Ego-História, Lisboa: Edições 70,
(1989), p. 110.
34
“O estudo da história da Igreja pode ser um abridor de olhos. Os heróis da fé geralmente têm pés de barro, às
vezes pernas, corações e cabeças também. As eras de ouro do passado geralmente revelam-se manchadas se
forem examinadas bem de perto. Em torno dos heróis da fé existem muitos vilões e alguns deles se parecem
um bocado com os heróis” (Mark A. Noll, Momentos Decisivos na História do Cristianismo, São Paulo:
Editora Cultura Cristã, 2000, p. 20).
35
Veja-se de forma ilustrativa, C.S. Lewis, Cartas do Inferno, São Paulo: Vida Nova, 1964, p. 160-161.
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36
Adam Schaff, História e Verdade, p. 293.
37
H.I. Marrou, Do Conhecimento Histórico, p. 51. Veja-se: Adam Schaff, História e Verdade, p. 284.
38
“Por mais que lutemos arduamente para evitar os preconceitos associados a cor, credo, classe ou sexo, não
podemos evitar olhar o passado de um ponto de vista particular. O relativismo cultural obviamente se aplica,
tanto à própria escrita da história, quanto a seus chamados objetos. Nossas mentes não refletem diretamente a
realidade. Só percebemos o mundo através de uma estrutura de convenções, esquemas e estereótipos, um
entrelaçamento que varia de uma cultura para outra” (Peter Burke, Abertura: a nova história, seu passado e
seu futuro: in: Peter Burke, org. A Escrita da História: novas perspectivas, São Paulo: UNESP., 1992, p. 15).
39
Veja-se: Carlo Ginzburg, Mitos, Emblemas, Sinais: morfologia e história, São Paulo: Companhia das Letras,
1989, p. 150.
40
Veja-se: Edward Hallet Carr, O que é história?, 3. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996 (7ª reimpressão), p. 60-
61.