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Ensino Médio - FILOSOFIA - 3º Ano – Bimestre: 3º e 4º

Professora : Elza L. Ribeiro Aluno(a)___________________


A filosofia moral

Ética ou filosofia moral

Toda cultura e cada sociedade institui uma moral, isto é, valores concernentes ao bem e ao
mal, ao permitido e ao proibido e à conduta correta e à incorreta, válidos para todos os seus
membros. Culturas e sociedades fortemente hierarquizadas e com diferenças de castas ou de
classes muito profundas podem até mesmo possuir várias morais, cada uma delas referida aos
valores de uma casta ou de uma classe social.
No entanto, a simples existência da moral não significa a presença explícita de uma ética, entendida
como filosofia moral, isto é, uma reflexão que discuta, problematize e interprete o significado dos
valores morais. Ao contrário, toda sociedade tende a naturalizar a moral, de maneira a assegurar
sua perpetuação através dos tempos. De fato, os costumes são anteriores ao nosso nascimento e
formam o tecido da sociedade em que vivemos, de modo que acabam sendo considerados
inquestionáveis e as sociedades tendem a naturalizá-los (isto é, a tomá-los como fatos naturais
existentes por si mesmos). Não só isso. Para assegurar seu aspecto obrigatório que não pode ser
transgredido, muitas sociedades tendem a sacralizá-los, ou seja, as religiões os concebem
ordenados pelos deuses, na origem dos tempos. Como as próprias palavras indicam, ética e moral
referem-se ao conjunto de costumes tradicionais de uma sociedade e que, como tais, são
considerados valores e obrigações para a conduta de seus membros.
A filosofia moral ou a disciplina denominada a ética nasce quando se passa a indagar o que
são, de onde vêm e o que valem os costumes.
Na língua grega existem duas vogais para pronunciar e grafar nossa vogal e: uma vogal breve,
chamada epsflon, e uma vogal longa, chamada eta. Éthos, escrita com a vogal longa, significa
costume; porém, se escrita com a vogal breve, éthos, significa caráter, índole natural,
temperamento, conjunto das disposições físicas e psíquicas de uma pessoa. Nesse segundo
sentido, éthos se refere às características pessoais de cada um, as quais determinam que virtudes e
que vícios cada indivíduo é capaz de praticar.
A filosofia moral ou a ética nasce quando, além das questões sobre os costumes, também se
busca compreender o caráter de cada pessoa, isto é, o senso moral e a consciência moral
individuais.

Podemos dizer, com base nos textos de Platão e de Aristóteles, que, no Ocidente, a ética
ou filosofia moral inicia-se com Sócrates.
Sócrates, o incansável perguntador.

Percorrendo praças e ruas de Atenas — contam Platão e Aristóteles —, Sócrates perguntava


aos atenienses, fossem jovens ou velhos, o que eram os valores nos quais acreditavam e que
respeitavam ao agir.
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Que perguntas lhes fazia ele? Indagava: “O que é a coragem?”, “O que é a justiça?”, “O que é a
piedade?”, “O que é a amizade?” A elas os atenienses respondiam dizendo serem virtudes. Sócrates
voltava a indagar: “O que é a virtude?”. Retrucavam os atenienses: “É agir em conformidade com o
bem”. E Sócrates questionava: “Que é o bem?”.

As perguntas socráticas terminavam sempre por revelar que os atenienses respondiam sem
pensar no que diziam. Repetiam o que lhes fora ensinado desde a infância. Como cada um havia
interpretado à sua maneira o que aprendera, era comum, quando um grupo conversava com o
filósofo, uma pergunta receber respostas diferentes e contraditórias. Após um certo tempo de
conversa com Sócrates, um ateniense via-se diante de duas alternativas: ou zangar-se com a
impertinência do filósofo perguntador e ir embora irritado, ou reconhecer que não sabia o que
imaginava saber, dispondo-se a começar, na companhia de Sócrates, a busca filosófica da virtude e
do bem.
Por que os atenienses sentiam-se embaraçados (e mesmo irritados) com as perguntas
socráticas? Por dois motivos principais: em primeiro lugar, por perceberem que confundiam valores
morais com os fatos constatáveis em sua vida cotidiana (diziam, por exemplo, “Coragem é o que fez
fulano na guerra contra os persas”); em segundo lugar, porque, inversamente, tomavam os fatos da
vida cotidiana como se fossem valores morais evidentes (diziam, por exemplo, “É certo fazer tal
ação, porque meus antepassados a fizeram e meus parentes a fazem”). Em resumo, confundiam
fatos e valores, pois ignoravam as causas ou razões por que valorizavam certas coisas, certas
pessoas ou certas ações, e desprezavam outras. Por isso mesmo se embaraçavam ou se irritavam
quando Sócrates lhes mostrava que estavam confusos, dizendo-lhes que haviam dito que a conduta
de fulano era corajosa, mas não haviam explicado o que é a coragem, ou que a conduta de beltrano
era justa, mas não haviam explicado o que é a justiça. Tais confusões, porém, não eram (e não são)
inexplicáveis.
Nossos sentimentos, nossas condutas, nossas ações e nossos comportamentos são modelados
pelas condições em que vivemos (família, classe e grupo sociais, escola, religião, trabalho,
circunstâncias políticas, etc.). Somos formados pelos costumes de nossa sociedade, que nos educa
para respeitarmos e reproduzirmos os valores propostos por ela como bons e, portanto, como
obrigações e deveres. Dessa maneira, valores e deveres parecem existir por si e em si mesmos,
parecem ser naturais e intemporais, fatos ou dados com os quais nos relacionamos desde nosso
nascimento: somos recompensados quando os seguimos, punidos quando os transgredimos.
Sócrates embaraçava os atenienses porque os forçava a indagar qual a origem e a essência (ou
a significação verdadeira e necessária) das virtudes (valores e obrigações) que julgavam praticar ao
seguir os costumes de Atenas. Como e por que sabiam que uma conduta era boa ou má, virtuosa ou
viciosa? Por que, por exemplo, a coragem era considerada virtude e a covardia, vício? Por que
valorizavam positivamente a justiça e desvalorizavam a injustiça, combatendo-a? Numa palavra: o
que eram e o que valiam realmente os costumes que lhes haviam sido ensinados?
Dirigindo-se aos atenienses, Sócrates lhes perguntava qual o sentido dos costumes estabelecidos
(os valores éticos ou morais da coletividade, transmitidos de geração a geração) mas também
indagava quais as disposições de caráter (características pessoais, sentimentos, atitudes,
condutas individuais) que levavam alguém a respeitar ou a transgredir os valores da cidade, e por
quê.
Ao indagar o que são a virtude e o bem, Sócrates realiza, na verdade, duas interrogações. Por
um lado, interroga a sociedade para saber se o que ela está habituada a considerar virtuoso e bom
corresponde efetivamente à virtude e ao bem; e, por outro, interroga os indivíduos para saber se, ao
agir, possuem efetivamente consciência do significado e da finalidade de suas ações, se seu caráter
ou sua índole são virtuosos e bons realmente. A indagação ética socrática dirige-se, portanto, à
sociedade e ao indivíduo.
As questões socráticas inauguram a ética ou filosofia moral porque definem o campo no qual
valores e obrigações morais podem ser estabelecidos pela determinação de seu ponto de partida: a
consciência do agente moral. É sujeito ético ou moral somente aquele que sabe o que faz, conhece
as causas e os fins de sua ação, o significado de suas intenções e de suas atitudes e a essência dos
valores morais. Sócrates afirma que apenas o ignorante é vicioso ou incapaz de virtude, pois quem
sabe o que é bem não poderá deixar de agir virtuosamente.
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O legado dos filósofos gregos

Se examinarmos o pensamento filosófico


dos antigos, veremos que nele a ética afirma
três grandes princípios da vida moral:
1. por natureza, os seres humanos aspiram
ao bem e à felicidade, que só podem ser
alcançados pela conduta virtuosa;

2. a virtude é uma excelência alcançada pelo


caráter, tanto assim que a palavra grega que
a designa é aretê, que quer dizer “excelência”.
É a força interior do caráter que consiste na
consciência do bem e na conduta definida
pela vontade guiada pela razão, pois cabe a
esta última o controle sobre instintos e
impulsos irracionais descontrolados, que
existem na natureza de todo ser humano;
Ilustração de Charles Robinson para a fábula “O vento e
3. a conduta ética é aquela na qual o agente o sol”, de Esopo, autor consagrado pelos gregos do
século V a.C. pela simplicidade com que transmitia suas
sabe o que está e o que não está em seu
liçoes morais.
poder realizar, referindo-se, portanto, ao que
é possível e desejável para um ser humano

Saber o que está em nosso poder significa, principalmente, no se deixar arrastar pelas
circunstâncias nem pelos instintos, nem por uma vontade alheia, mas afirmar nossa independência e
nossa capacidade de autodeterminação.
O sujeito ético ou moral não se submete aos acasos da sorte (ou o que os antigos chamavam de
fortuna), nem à vontade e aos desejos de um outro, nem à tirania das paixões (ou sentimentos e
desejos incontroláveis), mas obedece apenas à sua consciência — que conhece o bem e as virtudes
— e à sua vontade racional — que conhece os meios adequados para chegar aos fins morais. A
busca do bem e da felicidade são a essência da vida ética.

Os filósofos antigos (gregos e romanos) consideravam que a vida ética transcorria como um
embate contínuo entre nossos apetites e desejos — as paixões — e nossa razão. Por natureza,
somos passionais e a tarefa primeira da ética é a educação de nosso caráter ou de nossa natureza
para seguirmos a orientação da razão. A vontade possuía um lugar fundamental nessa educação,
pois era ela que deveria ser fortalecida para permitir que a razão controlasse e dominasse as
paixões.

O passional é aquele que se deixa arrastar por tudo quanto satisfaça imediatamente seus apetites
e desejos, tornando-se escravo deles. Desconhece a moderação, busca tudo imoderadamente,
acabando vítima de si mesmo.

Podemos resumir a ética dos antigos em três aspectos principais:

1. o racionalismo: a vida virtuosa é agir em conformidade com a razão, que conhece o bem, o
deseja e guia nossa vontade até ele. A vida virtuosa é aquela em que a vontade se deixa guiar pela
razão;

2. o naturalismo: a vida virtuosa é agir em conformidade com a natureza (o cosmo) e com nossa
natureza (nosso éthos), que é a parte do todo natural. Agir voluntariamente não é, portanto, agir
contra a necessidade natural (sobre esta não temos poder nenhum) e sim agir em harmonia com
ela, de tal maneira que o possível, desejado e realizado por nossa vontade realize nossa natureza
individual e a coloque em harmonia com o todo da natureza;
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3. a inseparabilidade entre ética e política: isto é, a inseparabilidade entre a conduta do indivíduo
e os valores da sociedade, pois somente na existência compartilhada com outros encontramos
liberdade, justiça e felicidade.

A ética, portanto, era concebida como educação do caráter do sujeito moral para dominar
racionalmente impulsos, apetites e desejos, para orientar a vontade rumo ao bem e à felicidade, e
para formá-lo como membro da coletividade sociopolítica. Sua finalidade era a harmonia entre o
caráter do sujeito virtuoso e os valores coletivos, que também deveriam ser virtuosos.

O determinismo e a liberdade

 O determinismo absoluto « A liberdade não existe, pois o homem é sempre determinado,


seja por sua natureza biológica. (necessidades e instintos), seja por sua natureza histórico-
social (leis, normas, costumes). Ou seja, as ações individuais seriam causadas e
determinadas por fatores naturais ou constrangimentos sociais, e a liberdade seria apenas
uma ilusão, essa concepção encontra-se presente no pensamento de filósofos materialistas
do século XVIII, tais como os franceses Helvetius (17154771) e Holbach (17234789).

A liberdade absoluta — O homem é sempre livre, embora os defensores dessa posição
admitam a existência das determinações de origem externa, sociais, e as de origem interna,
tais como desejos, impulsos etc., sustentam a tese de que o indivíduo possui uma liberdade
moral que está acima dessas determinações. Ou seja, apesar de todos os fatores sociais e
subjetivos que atuam sobre cada indivíduo, ele sempre possui uma possibilidade de escolha e
pode agir livremente a partir de sua autodeterminação. A maior expressão dessa concepção
filosófica acerca da liberdade é encontrada no pensamento de Jean Paul Sartre, que afirmou
que “o homem está condenado a ser livre”. A relação dialética entre liberdade e
determinismo — O homem é determinado e livre ao mesmo tempo. Determinismo e
liberdade não se excluem, mas se complementam. Nessa perspectiva não faz sentido pensar
em uma liberdade absoluta, nem em uma negação absoluta da liberdade, a liberdade é
sempre uma liberdade concreta, situada no interior de um conjunto de condições objetivas de
vida, embora a nossa liberdade seja restringida por fatores objetivos que cercam a nossa
existência concreta, podemos sempre atuar no sentido de alargar as possibilidades dessa
liberdade, e isso será tanto mais eficiente quanto maior for a nossa consciência a respeito
desses fatores. Essa concepção é encontrada nos pensamentos de Espinosa, Hegel e Marx.
Embora haja muitas diferenças entre eles, o ponto em comum é a ideia de que a liberdade é
a compreensão da necessidade (dos determinismos).

A relação entre liberdade e determinismo

Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob
circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e
transmitidas pelo passado.
KARL MARX.
O 18 Brumário de Luís Bonaparte in Gol. Os pensadores, p. 329

Volto ao conceito marxiano, segundo o qual ,os homens fazem eles mesmos a história, mas em
circunstâncias que não escolheram. Eu o expresso agora com a fórmula: O homem é um ser que
dá respostas. Um ser que dá respostas é um ser que reage somente às alternativas que lhe são
colocadas pela realidade objetiva. Mas, fazendo isso, este ser abstrai certas tendências contidas no
processo espontâneo para transformá-las em perguntas e encontrar para elas uma resposta. Por
isso, esta reação não é puramente espontânea. Um leão, ao devorar um antílope, constitui um
processo puramente biológico, no qual não está presente qualquer alternativa. Quando, ao contrário,
o homem, através de seu trabalho, eleva à abstração sua relação de intercâmbio com o ambiente
para fazer dela um problema ao qual deve ser dada uma resposta, esta alternativa é inserida no
processo histórico.
GEORG LUKÁCS.
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A Cidadania, a Virtude e a Felicidade

Aristóteles, bom filósofo, bom intelectual, mas também dotado de um agudo sentido prático,
do dever e da ação, não deixa de discutir os prós e os contras da vida ativa e da vida contemplativa.
Cidadão é, em geral, o homem politicamente ativo, politicamente partícipe da coisa pública.
Sobretudo se for membro de assembleia deliberativa ou juiz, ou seja, se, de algum modo ou em
alguma medida, participar do poder público. E especialmente se o enquadramento geral da sua
participação política for, precisamente, uma forma política propícia a essa participação, como a
democracia.
Podendo haver diversas formas de cidadania, e várias classes ou tipos de cidadãos, a verdade
é que Aristóteles compreendeu bem que pode haver uma cidadania mais formal que real, e que a
verdadeira cidadania implica uma efetiva participação (até nos cargos – e o autor cita o próprio
Homero em seu abono). Esta ordem de ideias leva a uma conclusão talvez chocante, mas muito
verdadeira: é que sem um mínimo de ócio e de ilustração, não se pode ser verdadeiro cidadão, até
porque se não pode participar, por falta de tempo e de disponibilidade mental, reflexiva. Não é,
assim, por elitismo ou outro qualquer complexo de exclusão que Aristóteles considera não poder um
artesão ser um autêntico cidadão. É que ele não se encontra suficientemente livre, e não alcançará
a plena virtude, que é incompatível com uma vida “mecânica e mercenária” .
E nem sequer o homem de bem e o bom cidadão são uma e a mesma coisa, pois requerem
diferentes virtudes. Quem comanda, por exemplo, deve ter como principal virtude a prudência. E é
muito adequado que os cidadãos sejam tão capazes de mandar como de obedecer…
Mas o que será melhor: participar ativamente na cidadania, ou remeter-se para o recolhimento
da vida privada? Para responder a esta questão, Aristóteles procura primeiro indagar qual a
verdadeira felicidade. Porque não é ser-se político ou ser-se particular de qualquer forma que está
em causa, mas a excelência da vida política, de um lado, e a excelência da vida privada, por outro.
Neste sentido, antes de mais, deve investigar-se sobre as condições da felicidade particular. E,
ao contrário do que muitos pensam, tanto nesse tempo como hoje, tal felicidade não reside na
acumulação da riqueza ou dos bens exteriores, que apenas são instrumentos úteis. Assim, o que
realmente importa são a inteligência e costumes excelentes, os bens da alma.
E assim encaradas as coisas, a felicidade pública não difere da felicidade privada. Tal como
acerca da felicidade privada, também os juízos se dividem sobre a pública, e de forma concorde e
simétrica: os que louvam a riqueza privada como suprema felicidade, enaltecem os estados ricos; os
que na vontade de poder, na dominação, no despotismo privado vêm a maior felicidade, louvam os
estados opressores ou dominadores de outros; e finalmente os que prezam as virtudes privadas
vêem a felicidade nas virtudes públicas. Aristóteles conta-se entre estes últimos.
Mesmo assim, o problema não se encontra resolvido. Porque a vida virtuosa pode ser mais
ativa ou mais contemplativa. E aí não há unanimidade entre os que louvam a virtude em geral.
A descrição das duas posições sobre o envolvimento político é muito vívida, e poderia ter sido
escrita por um autor de qualquer época, revelando não só dois tipos de pessoas, como ainda duas
tendências contraditórias que por vezes se encontram em guerra no mesmo indivíduo:
“Uns não dão nenhuma importância aos cargos políticos e consideram a vida de um homem livre
muito superior à que se leva na confusão do governo; outros preferem a vida política, não
acreditando que seja possível não fazer nada, nem portanto ser feliz quando não se faz nada, nem
que se possa conceber a felicidade na inacção”.
E agudamente comenta o Filósofo, com palavras de uma emudecedora sabedoria:
“Uns e outros têm razão até certo ponto e se enganam sobre o resto”.

E explicita as limitações e as ilusões de uns e outros. Aproveita para sublinhar a necessidade da


igualdade entre os semelhantes, sendo contra a natureza e assim contra a honestidade a
desigualdade que não derive da dissemelhança, assim como a necessidade do mérito provado e de
energia muito activa para que alguém mereça ser obedecido.
Tudo exposto, tudo ponderado, pronuncia-se a favor da vida activa, mas não da mera acção pela
acção. A felicidade estará na acção política, desde que devidamente precedida pela meditação. A

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felicidade é, assim, tanto nos particulares como nas sociedade políticas, fruto de uma acção
ponderada, previamente reflectida. De uma acção fruto da virtude, e de uma virtude pensada.
A cidadania tem, pois, de ser virtude, e só ela conduzirá à felicidade.

Meus amigos, minha vida!

Para manter uma


amizade
verdadeira é
necessário ter,
além de boa
vontade,
intensidade,
intimidade e
anseio pessoal.

A ética investiga os problemas humanos que envolvem caráter e sentimentos. Amizade é uma disposição do
caráter, afinada pela virtude, pelo qual desejamos ser iguais aos outros; é o desejo de exercer o bem.
Convivência é característica importante da amizade pela qual sentimos necessidade de partilhar gostos,
alegrias e pesares. Unidos pela amizade sincera, somos capazes de exercer o bem ao outro e a nós mesmos,
almejando a felicidade mútua.
Aristóteles enumera três tipos de amizade no Livro VIII da obra Ética a Nicômaco. O critério dessa
classificação estabelece o motivo pelo qual estabelecemos vínculos de amizade:
— Utilidade: amizades conquistadas por causa da utilidade são circunstanciais e passageiras, pois desejamos o
outro para satisfazer uma necessidade imediata nossa. Feita a conquista do que desejávamos, a amizade
termina.
— Prazer: amizades fundamentadas no prazer visam apenas desfrutar daquilo que é agradável no outro,
portanto também passageira e circunstancial.
— Virtude: amizades perfeitas são aquelas em que os seres humanos se unem pelo desejo de fazer o bem;
invulneráveis à calúnia, ao tempo, à distância. Para Aristóteles, só os homens bons podem ser verdadeiros
amigos. A virtude revela- se como característica fundamental para estabelecer amizade sincera, verdadeira e
duradoura.
Outro pensador que filosofou a respeito da amizade foi Heráclito de Éfeso (540a.C - 470 a.C), que
desenvolveu suas idéias antes de Aristóteles.

“Ele acreditava que o conflito determina o mundo. A relação e interação entre os opostos (bem e mal, luz e
sombra, masculino e feminino etc.) são responsáveis pelo constante fluxo do mundo” conta Portolano. Para
Heráclito, os contrastes andam juntos.

“Neste caso, ao contrário do que pensou Aristóteles, a amizade surge do encontro de dois entes
antagônicos”.

E como diz o ditado popular: os opostos se atraem. Para Heráclito, os opostos são uma única
coisa, logo, a amizade é simplesmente uma união.
O escritor e aviador francês Antoine de Saint Exupéry (1900-1944) abordou o tema da amizade
no famoso livro O Pequeno Príncipe. Na obra, ele conta a história de um garoto solitário que vive
no espaço, e o seu sentimento por uma rosa.
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“O príncipe vive sozinho, mas aprendeu como amar uma rosa. Ele era amigo daquela flor. A
amizade e o amor se confundem muitas vezes” ressalta Márcia. Num amor profundo, há uma
amizade profunda também.

“Os casamentos fluem melhor quando existe uma amizade por trás do amor”.
Sabemos que existem aqueles que procuram ser amigos do outro por interesse, porque precisam
de algo que determinada pessoa possui. Mas, além desse tipo de aproximação, há pessoas que
passam por um processo de emulação para procurar a figura do outro.

“Ela admira tanto a outra pessoa que chega ao ponto


de querer ser o amigo em sua amplitude. Ela quer ser
o outro, mesmo tendo plena consciência de quem ela
é”, explica Márcia Rodrigues Semenov.
-Esse sentimento não é relacionado à inveja, mas sim
a uma admiração intelectual, ou até mesmo da beleza
da amiga.

DEVEMOS VALORIZAR CADA UMA DE NOSSAS


AMIZADES. ELA É ESSENCIAL PARA UMA VIDA
FELIZ.

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Ética e Política

Se a política tem como finalidade a vida justa e feliz, isto é, a vida propriamente humana digna
de seres livres, então é inseparável da ética.
De fato, para os gregos, era inconcebível a ética fora da
comunidade política – a pólis como koinonía ou
comunidade dos iguais -, pois nela a natureza ou essência
humana encontrava sua realização mais alta.
Quando estudamos a ética, vimos que Aristóteles
distinguira entre teoria e prática e, nesta, entre fabricação
e ação, isto é, diferenciara poiésis de práxis. Vimos
também que reservara à práxis um lugar mais alto do que
à fabricação, definindo-a como ação voluntária de um
agente racional em vista de um fim considerado bom. A
práxis por excelência é a política. A esse respeito, na
Ética a Nicômaco, escreve Aristóteles: Se, em nossas
ações, há algum fim que desejamos por ele mesmo e os
outros são desejados só por causa dele, e se não
escolhemos indefinidamente alguma coisa em vista de
uma outra (pois, nesse caso, iríamos ao infinito e nosso
Congresso Nacional desejo seria fútil e vão), é evidente que tal fim só pode ser
o bem, o Sumo Bem…Se assim é, devemos abarcar, pelo
menos em linhas gerais, a natureza do Sumo Bem e dizer de qual saber ele provém. Consideramos
que ele depende da ciência suprema e arquitetônica por excelência. Ora, tal ciência é
manifestamente a política, pois é ela que determina, entre os saberes, quais são os necessários
para as Cidades e que tipos de saberes cada classe de cidadãos deve possuir… A política se serve
das outras ciências práticas e legisla sobre o que é preciso fazer e do que é preciso abster-se; assim
sendo, o fim buscado por ela deve englobar os fins de todas as outras, donde se conclui que o fim
da política é o bem propriamente humano. Mesmo se houver identidade entre o bem do indivíduo
e o da Cidade, é manifestamente uma tarefa muito mais importante e mais perfeita conhecer e
salvaguardar o bem da Cidade, pois o bem não é seguramente amável mesmo para um indivíduo,
mas é mais belo e mais divino aplicado a uma nação ou à Cidade.

Platão identificara a justiça no indivíduo e a justiça na pólis. Aristóteles subordina o bem do


indivíduo ao Bem Supremo da polis. Esse vínculo interno entre ética e política significava que as
qualidades das leis e do poder dependiam das qualidades morais dos cidadãos e vice-versa, das
qualidades da Cidade dependiam as virtudes dos cidadãos. Somente na Cidade boa e justa os
homens poderiam ser bons e justos; e somente homens bons e justos são capazes de instituir uma
Cidade boa e justa.
ÉTICA E POLÍTICA BRASILEIRA

A ética pode ser entendida como a ciência que estuda as relações morais dos homens entre
si. Originada do grego ethos que significa costume, a ética surge para estudar e investigar os
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princípios, as normas de comportamento, ou seja, as práticas morais e tradicionais consideradas
valores que regem as condutas humanas de determinada sociedade. (VAZQUÉZ, 2000).
Os princípios éticos de uma sociedade podem e devem evoluir seguindo os valores morais que
sofrem mutação conforme as mudanças econômicas, tecnológicas e sociais. Para Adolfo Vazquéz
(2000) os princípios éticos evoluem devido a "necessidade de relacioná-los com as condições
sociais as quais se referem, com as aspirações e interesses que os inspiram e com o tipo concreto
de relações humanas que pretendem regulamentar".
Durante a Idade Média a visão teocêntrica do mundo fez com que os valores morais da
sociedade fossem substituídos. Essa começava a ser regida pelos valores religiosos, mais
precisamente os católicos, que impuseram a dialética do bem X o mal vinculados a fé, e pelos Dez
Mandamentos que são seguidos e respeitados até hoje, como: não matar, não roubar, etc.
Posteriormente, a visão iluminista transformou os valores éticos da sociedade, pois estes se
tornaram secularizados. O fundamento ético passava a ser o próprio homem, e não mais Deus. Na
concepção Kantiana (apud ARANHA, 1993)1, que é iluminista, o agir moralmente se funda
exclusivamente na razão. Essa nova visão pressupõe o individualismo, uma vez que o homem é
levado a agir seguindo a sua consciência, seus costumes ou a favor do que seria bom para si
mesmo.
Atualmente Habermas (1980 apud ARANHA, 1993) traz uma nova concepção para a ética. Sua
teoria, influenciada por Kant, também pontifica a razão como fundamento básico, porém é uma
razão comunicativa, onde o sujeito recorre à comunidade, ao dialogo, a interação social para chegar
à razão. Dessa forma, é necessário o entendimento para se conseguir uma única conclusão entre os
indivíduos do grupo social, conseguida através da utilização de argumentação racional.
Por outro lado, a palavra "política" foi utilizada pela primeira vez por Aristóteles. Este disse que
"o homem é um animal político, porque nenhum ser humano vive sozinho e todos precisam
da companhia de outros". Dessa forma, "política se refere à vida na polis, ou seja, a vida em
comum, as regras de organização dessa vida, aos objetivos da comunidade e as decisões sobre
todos esses pontos". (ARISTÓTELES, apud DALLARI, 1999).
Weber (1926) traz duas concepções de política. A primeira diz que "por política entenderemos tão
somente a direção do agrupamento político hoje denominado 'Estado' ou a influência que se exerce
nesse sentido". Nessa concepção, torna-se viável e tolerável o uso da força ou violência pelo Estado
para a garantia do seu poder, soberania e ideais. Na Segunda, entende por política "o conjunto de
esforços feitos visando a participar do poder ou a influenciar a divisão do poder, seja entre Estados,
seja no interior de um único Estado". Dessa maneira, para Weber "qualquer homem que se entrega
a política aspira ao poder". O Estado consiste apenas em uma relação de dominação do homem
pelo homem.

Poderíamos citar além dessas inúmeras outras definições do que é política, mas tomaremos como
base a concepção de Dallari (1999, p.10) : "política é a conjugação das ações de indivíduos e
grupos humanos, dirigindo-as a um fim comum". Este fim comum deve ter como ideal o bem-estar, a
igualdade entre os componentes da sociedade e a paz social.
A política resulta da própria vida em sociedade, das ações humanas e da necessidade de
organização dessa sociedade, visando sempre ao bem comum, de tal modo que se atinja uma
sociedade justa e livre.

Entre a ética e a política parece não existir um ponto em comum, pois agir conforme os padrões
políticos significam que as suas atitudes estão distantes dos valores éticos da sociedade. Essa
afirmação parece ser contraditória, pois se uma aspira a uma vida justa e feliz, torna-se inseparável
da outra. Porém, esta finalidade é mera teoria, pois a política, na prática, não realiza o bem comum,
mas o bem dos próprios detentores do poder e seus apadrinhados.
A prática dos privilégios acontece no Brasil desde a época colonial. Ficou explicita com a divisão
das capitanias hereditárias, pois os donatários que receberam as terras eram os nobres e/ou os
amigos do Rei português.

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Atualmente, as palavras mais ouvidas nos jornais televisionados são promessas não cumpridas,
corrupção, má utilização ou desvio de dinheiro público, desonestidade, compra de votos e abuso de
poder, contradizendo a vontade dos eleitores que escolhem seus representantes a espera de
pessoas honestas e preocupadas com os inúmeros problemas sociais enfrentados pelo Brasil. Os
cidadãos exigem um mínimo de postura ética dos seus representantes no poder, mas não há
resposta a esse clamor, pois os compromissos assumidos durante as campanhas eleitorais são
"esquecidos".
Depreendemos daí que os políticos não se preocupam com os problemas sociais que aterrorizam
a população, o que seria a sua obrigação. Ao contrario, são guiados pela sede do poder, o único fim
a que se dedicam. Dessa forma, a ética é "esquecida", torna-se mera especulação e inspiração para
filósofos e escritores.
1
VÁZQUEZ, Adolfo Sanchez. Ética. 20. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000
1
ARANHA, Maria Lucia. Filosofando. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993

Bonito ou feio? Uma questão de bom gosto

Todas as belezas contêm, como todos os fenômenos possíveis, algo de eterno e algo de
transitório, de absoluto e de particular. A beleza absoluta e eterna não existe, ou melhor, ela não é
mais que uma abstração que des flora na superfície geral de diversas belezas. O elemento particular
de cada beleza provém das paixões e, como ternos nossas paixões particulares, temos nossa
beleza.
Charles Baudelaire (1821 1867)

Certamente você já ouviu frases como: beleza não se põe à mesa; quem ama o feio, bonito lhe
parece: ou o trecho do poema de Vinícius de Moraes: as muito feias que me perdoem, mas beleza
é fundamental. Cada urna aborda o belo de maneira diferente: nem sempre o que é belo é bom; o
amor transforma o feio em bonito; a beleza, com as desculpas do poeta, é mais que fundamental.

Mas afinal: a beleza está no objeto admirado ou no sujeito que o admira?

Quando contemplamos uma obra, uma música ou um objeto qualquer, somos afetados por eles,
ou seja, o ato de perceber provoca sensações. A beleza, especificamente, causa sensações de
plenitude e prazer. O objeto belo fala por si.

Várias vertentes filosóficas definem o que é o belo.

Para Platão, existe um modelo ideal para a beleza em si. Nesse


sentido, o belo é inerente ao objeto, independente do sujeito que o
observa.
Aristóteles definiu o belo como algo apreendido na sua totalidade,
cuja constituição é harmoniosa, simétrica e ordenada.
Para Hegel (1770—1831), o belo é a manifestação sensível do
absoluto, e a verdade, a manifestação objetiva e universal; portanto
beleza e verdade são equivalentes.
Para Kant (1724—1804), não existe um modelo-padrão do que é
belo. Com suas palavras belo é aquilo que, sem conceito, apraz
universalmente. Nesse contexto, o belo depende do sentimento do
sujeito e não do conceito do objeto.

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A questão do feio está ligada à do belo, porém no sentido contrário. Tanto um quanto o outro
abrange a questão do julgamento. O feio causa sensação de repulsa, desprezo, vergonha e, tal qual
o belo, não se encerra numa única definição.
Como vimos, os conceitos de belo e feio não são fechados, não possuem um único significado,
pois o julgamento estético depende do estado de espírito, da situação histórica, da cultura, da visão
de mundo, da interpretação e doação de significados.
É possível estabelecer o que é belo ou feio? Bem, isso é uma questão de gosto!
Não podemos compreender o gosto como algo arbitrário e determinado por preferências. Nesse
sentido, o julgamento estético cai em dogmas geradores de preconceitos. Contemplar uma obra de
arte ou uma paisagem requer a entrega ao campo da sensibilidade, momento em que acontece um
diálogo entre contemplador e contemplado.

COMPREENDER PELOS SENTIDOS

A palavra estética vem do grego aesthesis, que significa sensibilidade. Ela foi utilizada
originalmente pelo filósofo alemão Baumgarten (1 714—1 762) para designar o ramo da filosofia
que estuda as manifestações artísticas.
Baumgarten definiu essa nova disciplina como pensamento que reflete sobre a emoção. Para
ele, a estética deve ser abordada do ponto de vista da subjetividade. Como, o subjetivo é muito
amplo, envolve a imaginação, a sensação, o sentimento, o entusiasmo, o gosto, o sublime, as
paixões, a memória e muito mais. Como seria possível, então, abstrair o conceito de estética, se ela
investiga justamente o que é rebelde a qualquer racionalização?

Baumgarten afirmou que o pensamento belo deve brotar da contemplação das belas artes,
momento em que a harmonia que existe no mundo cultural e natural se manifesta aos sentidos. Por
isso, a sensibilidade é o canal aberto que possibilita a compreensão do belo.

Obra de arte, artista e admirador

Nem a verdade, nem o bem, nem o belo, nem a forma determinam o que é a arte. Em latim, ars,
artis designa o ato de fazer, ou seja, instante em que se cria a obra, seja ela artística seja utilitária.

O que determina o ato de fazer? A personalidade do artista e o contexto histórico-cuural em que


ele vive, portanto não há uma definição fechada para a manifestação artística. Criar não significa
pregar valores!

O olhar do admirador faz parte da obra na sua interpretação, como afirmou Pablo Picasso:
depois de terminado, o quadro continua a mudar, conforme o estado daquele que o contempla.

O artista pode determinar funções para sua obra:

Políticas: a obra toma uma posição crítioa respeito de um fato ou problema social, denuncianfo urna
injustiça, propondo união ideologia política ou simplesmente, retratando a realidade de uma
sociedade:
Reigiosas: servem às necessidades míiiças das pessoas, para afirmar determinada proposta
reIiosa; fazem parte do próprio culto em alguns casos, tal como, as imagens sagradas da religião
católica.
Pedagógicas: têm uma função social de colaborar na educação das pessoas, levando-as a
compreender o mundo por meio dos objetos artísticos.
Naturalistas: á obra tem a finalidade exclusivá de retratar a realidade; por.exemplo, a fotográfia
3 x 4 no RG.
Formalistas: preocupam-se exclusívamente om a técnica usada naquele tipo de arte.

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Atividade

1 – Relacione o poema de Ferreira Gultar com a obra de Marc Chagali, que vêm a seguir.
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Ao balcão de Marc Chagali — O poeta 1911

A arte em nosso cotidiano

Nos dias de hoje, a palavra estética é usada em vários sentidos; todos eles, porém, partem do
conceito primitivo usado pelos gregos antigos, ou seja, designar aquilo que tenha a ver com os
sentimentos, com os sentidos, com a percepção. Assim, a estética também está ligada à atividade
artística, já que se preocupa com as obras que o ser humano faz com a finalidade de serem belas, e
com os sentimentos que elas provocam em nós. Em termos gerais, podemos dizer que a estética é
a área da filosofia que estuda a arte e as suas relações com o ser humano.

A arte é o fundamento do mundo, pois todas as coisas existentes possuem forma, cor, textura,
peso, cheiro, e esses objetos são apreendidos pelos nossos sentidos e pela nossa razão. Ao
construir algo — qualquer coisa —, o criador está dando livre vazão ao seu imaginário, tornando
reais seus desejos, suas fantasias e seus sonhos.
O homem é um ser sociável, vive numa sociedade e convive com seus semelhantes. As coisas
que criamos têm por objetivo despertar no outro sensações de prazer ou dor; admiração ou repulsa;
aprovação ou desaprovação. Criamos coisas belas ou feias — não importa, pois beleza e feiúra são
conceitos subjetivos —, para despertar sentimentos nos outros. Criamos coisas para tocar no mais
íntimo dos sonhos e desejos. E é esse justamente o objetivo de toda obra de arte: despertar
sentimentos, sensações, tornar presentes sonhos e desejos que tanto escondemos e reprimimos.
O olhar é o sentido artístico por excelência, pois é por ele que conhecemos as coisas, que lemos
o mundo.
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A arte é o centro da vida, e é a partir dela que deciframos o mundo. É somente com os olhos da
arte que o homem consegue apreender a sua essência, pois esta se manifesta sob a forma artística.

GalIo, Ética e cidadania.

Arte e técnica

Vimos nesta apostila, que a maioria das pessoas aproxima espontaneamente arte e artesanato. Essa
aproximação, como dissemos, decorre do fato de que o artista e o artesão produzem sozinhos e por inteiro uma
obra e que esta exprime seus talentos e habilidades. Mas há ainda outro motivo para essa aproximação: o fato
de que, historicamente, arte e artesanato eram a mesma coisa, e, portanto, o artesão e o artista eram o mesmo.
A palavra arte vem do latim ars e corresponde ao termo grego tékhne, “técnica”, significando “toda
atividade humana submetida a regras com vista à fabricação de alguma coisa”. Em latim, artesão, artífice ou
artista se diz artifex, “o que faz com arte”, e também opticis, “o que exerce um ofício”; e o resultado de sua
ação se diz opus (no singular) e opera (no plural), isto é, “obra” em português. A arte ou técnica era, portanto,
uma atividade regrada com vista á produção de uma obra.

Em sentido amplo, ars ou tékhne significava “habilidade e agilidade para inventar meios para vencer uma
dificuldade ou um obstáculo postos pela natureza”. Em sentido estrito, significava “o aprendizado e a prática de
um ofício que possui regras, procedimentos e instrumentos próprios”. Ars ou tékhne era um saber prático.
Por isso, a arte ou técnica se definia por oposição ao que acontece por acaso, ao que é espontâneo ou não
deliberado e ao que é natural. Em seu sentido mais geral, ars (arte) era um conjunto de regras e procedimentos
com a função de dirigir uma atividade humana para que esta realizasse fim a que se propôs.
Assim, falava-se em arte médica, arte política, arte militar, arte retórica, arte poética, arte dietética, arte da
navegação, arte da caça, arte de pintar, esculpir, dançar, etc.

Platão não distinguia a arte das ciências nem da filosofia, uma vez que todas elas são atividades humanas
ordenadas e regradas. Aristóteles, porém, estabeleceu duas distinções que perduraram por séculos na cultura
ocidental. A primeira distingue ciência de arte ou técnica: a ciência é um saber teórico que se refere ao
necessário, enquanto a arte ou técnica é um saber prático que opera no campo do contingente ou do possível.

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FUNÇÕES DA ARTE

Ao longo da História, nem sempre a arte teve a mesma função. A arte serviu para aplacar a ira
dos deuses, para contar uma história, rememorar acontecimentos importantes, despertar um
sentimento religioso, aclamar virtudes morais, despertar sentimentos cívicos. Só no final do século
XIX e início do século XX é que a arte foi desvinculada desses interesses não-artísticos e
considerada um objeto propiciador de experiência estética com valores intrínsecos. Assim,
repassando pelas mais diversas situações e épocas, podemos distinguir três funções principais para
a arte:

A) Função pragmática ou utilitária – quando ela é um meio para alcançar outra finalidade.
Exemplos: a) nas igrejas medievais, as paredes pintadas ensinavam à população (que era
analfabeta) as histórias de Cristo e dos santos; b) no início do séc. XX, os socialistas viam na arte
um meio para despertar sentimento cívico e manter a lealdade da população. Ou seja: a obra seria
“boa” se correspondesse à sua finalidade.

B) Função naturalista – quando a obra apenas retrata, imita, copia, enviando-nos para o mundo
dos objetos. É o caso dos retratos de figuras políticas ou das imagens fiéis da natureza. Essa função
surge na Antigüidade com os gregos e caminhou até o século XIX, quando surgiu a fotografia.

C) Função formalista – quando a preocupação é com a forma de apresentação da obra, sendo esta
a função que se preocupa unicamente com a forma artística como tal. Assim, qualquer que seja o
tipo de obra analisado: pintura, escultura, literatura, cinema, música, teatro etc., todos comportam
uma estruturação interna de signos selecionados a partir de um código específico. É esta função que
é capaz de sustentar e análise de um espectador cuja sensibilidade seja educada e madura. Existe
na arte contemporânea, mas também existe na arte de todos os séculos anteriores, pois mesmo que
a função da obra tenha sido utilitária ou formalista, o senso estético do artista fazia o melhor que
podia.

Mas é bom que saibamos que esta distinção das funções é meramente didática, pois sabemos que
freqüentemente há mais de uma função em uma só obra.

O que sabemos é
uma gota,
o que ignoramos é um
oceano.
Isaac Newton

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