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ANATOMIA GERAL

Sistema nervoso:
meninges e sistema
ventricular
Tuane Bazanella Sampaio

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

> Identificar as três meninges do sistema nervoso central e os ventrículos


encefálicos.
> Descrever as características anatômicas e as funções das meninges.
> Relacionar a função da barreira hematoencefálica com doenças neuro-
degenerativas, como a doença de Parkinson.

Introdução
O sistema nervoso central é constituído pela medula espinal e pelo encéfalo.
Tal sistema é muito delicado e não responde bem a lesões ou ferimentos,
exigindo proteção considerável. A primeira camada de proteção para o sistema
nervoso central é o sólido crânio ósseo e a coluna vertebral. Esta última envolve
a medula espinal, fornecendo proteção contra pancadas e colisões.
A segunda camada de proteção é formada pelas meninges, na forma de
três membranas situadas entre o envoltório ósseo e o tecido nervoso, tanto
do encéfalo quanto da medula espinal. Somado a isso, um espaço entre duas
membranas meníngeas, contendo líquido cerebrospinal, forma o espaço su-
baracnóideo. Esse espaço mantém o sistema nervoso central suspenso em
um ambiente sem peso e envolto por um meio hidráulico absorvente. Além
disso, o líquido cerebrospinal também é encontrado no sistema ventricular,
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um conjunto de cavidades do encéfalo que cumprem função protetora contra


danos mecânicos e que estabelecem comunicação entre as diversas estruturas
do sistema nervoso central.
Por fim, há ainda a proteção contra agentes químicos e biológicos realizada
pela barreira hematoencefálica. Essa barreira está localizada entre o sistema
vascular e o encéfalo e tem como função selecionar as substâncias que ganham
acesso ao sistema nervoso central. Alterações na permeabilidade e na inte-
gridade dessa membrana estão associadas a diversas doenças neurológicas,
como Parkinson, Alzheimer, epilepsia, entre outras.
Neste capítulo, você vai conhecer a organização anatomofuncional do sis-
tema ventricular e das meninges. Além disso, vamos abordar a constituição do
líquido cerebrospinal e da barreira hematoencefálica. Tendo como base esses
conhecimentos, você vai compreender a importância desses elementos para a
proteção do tecido neural e como possíveis danos a essas estruturas podem
prejudicar a homeostase do sistema nervoso central.

O sistema ventricular e as meninges


O encéfalo é dividido em três regiões principais. Em ordem ascendente a partir
da medula espinal, são elas: metencéfalo, mesencéfalo e prosencéfalo. O me-
tencéfalo subdivide-se em bulbo, ponte e cerebelo, enquanto o prosencéfalo
— mais conhecido como cérebro — é subdivido em diencéfalo (parte central
do encéfalo) e telencéfalo (hemisférios cerebrais) (TORTORA; NIELSEN, 2012).
Além dessa divisão estrutural, o sistema nervoso central apresenta uma
organização interna tubular, composta por cavidades. Em conjunto, essas cavi-
dades formam o sistema ventricular. Este sistema compreende os ventrículos
e seus estreitos canais de comunicação, nos quais o líquido cerebrospinal se
acumula, atuando como um amortecedor do sistema nervoso central contra
choques físicos e como um agente para a comunicação química. Além disso,
os ventrículos são revestidos em toda sua extensão por epêndima e originam-
-se da cavidade do tubo neural no desenvolvimento.
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Nesse contexto, temos dois ventrículos laterais, conectados pelos forames


interventriculares (forame de Monro) ao terceiro ventrículo. Este, por sua vez,
conecta-se ao quarto ventrículo através do aqueduto do mesencéfalo (aque-
duto de Sylvius). Do quarto ventrículo, o sistema ventricular estende-se para
dentro da medula espinal através do canal central (Figura 1) (MARTIN, 2014).

Ventrículo lateral
Corno frontal
Átrio
Corpo
Corno temporal
Corno occipital

Aqueduto do
Forame mesencéfalo
interventricular
Quarto
ventrículo
Terceiro ventrículo

Figura 1. Sistema ventricular, composto pelos ventrículos laterais e seus cornos, terceiro
ventrículo e quarto ventrículo, bem como pelos canais que os conectam. O forame inter-
ventricular é o elemento de ligação do ventrículo lateral ao terceiro ventrículo, enquanto o
aqueduto do mesencéfalo é a conexão entre o terceiro e quarto ventrículos.
Fonte: Adaptada de Martin (2014).

Mais especificamente, no interior de cada um dos hemisférios cerebrais


existe um ventrículo lateral, que na verdade é uma estrutura par, possuindo
lado direito e esquerdo. Cada ventrículo lateral é composto por uma cavidade
com formato aproximado da letra C e preenchido com líquido cerebrospinal.
Além disso, o ventrículo lateral apresenta uma porção central, que ocupa o
lobo parietal, e da qual os cornos frontal, occipital e temporal estendem-se
aos respectivos lobos cerebrais (Figura 2).
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Lobo parietal

Terceiro
ventrículo

Ventrículo
lateral
Tálamo

Lobo temporal

(1X)
Mesencéfalo Aqueduto do mesencéfalo

Figura 2. Corte coronal do prosencéfalo na junção com o mesencéfalo e tálamo, evidenciando


ambos os ventrículos laterais e, inferiormente a eles, o terceiro ventrículo.
Fonte: Adaptada de Bear, Connors e Paradiso (2017).

Abaixo dos ventrículos laterais há o terceiro ventrículo, localizado entre as


duas metades do diencéfalo. Sendo assim, o terceiro ventrículo é uma estrutura
ímpar que se conecta com o diencéfalo através de todas as suas estruturas
(tálamo, hipotálamo, epitálamo e subtálamo). Logo, o terceiro ventrículo é uma
cavidade englobada pelo diencéfalo, que se comunica através do aqueduto
cerebral — uma cavidade do mesencéfalo — com o quarto ventrículo e com
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os ventrículos laterais através dos forames interventriculares. Suas paredes


laterais são formadas pelo tálamo e hipotálamo, enquanto a parede anterior e
as adjacências das paredes laterais pertencem ao telencéfalo. Ademais, a luz
do terceiro ventrículo forma quatro recessos, denominados de infundíbulo,
óptico, pineal e suprapineal (SPLITTGERBER, 2021).
Partindo do terceiro ventrículo pelo aqueduto do mesencéfalo, chegamos
ao quarto ventrículo. Essa cavidade é uma estrutura ímpar que se situa entre
a face posterior do bulbo e da ponte e a face ventral do cerebelo, conforme
ilustra a Figura 3. A porção aberta do bulbo constitui o assoalho do quarto
ventrículo, juntamente com a parte dorsal da ponte, enquanto seus limites
laterais são conferidos pelo afastamento do sulco mediano que termina a
meia altura do bulbo. Esse prolongamento lateral estabelece a comunicação
do quarto ventrículo com o espaço subaracnóideo (SPLITTGERBER, 2021).

Quarto ventrículo

Córtex
cerebelar

Núcleo
cerebelares

Forma reticular (0,8X)


pontina
Núcleos pontinos

Figura 3. Corte transversal da ponte e cerebelo, demonstrando a formação do quarto ventrículo.


Fonte: Adaptada de Bear, Connors e Paradiso (2017).

Uma vez que a ponte cumpre papel fundamental na regulação do ritmo


respiratório, lesões na região do quarto ventrículo podem causar
distúrbios respiratórios graves (MACHADO; HAERTEL, 2014). Adicionalmente,
na metade caudal do bulbo, um estreito canal se abre, configurando a comuni-
cação do quarto ventrículo com a medula espinal através do canal central da
medula (MARTIN, 2014).
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É importante destacar que o líquido cerebrospinal é encontrado tanto


nos ventrículos quanto no espaço subaracnóideo do encéfalo e da medula
espinal, como veremos em mais detalhes na próxima seção deste capítulo.
Trata-se se de um líquido com constituição iônica inorgânica semelhante à do
plasma sanguíneo, porém de aspecto límpido e incolor. Sua concentração de
glicose é de cerca de 50% daquela encontrada no sangue, e sua quantidade
de proteínas é muito reduzida. A presença de células é escassa, sendo uma
contagem normal de linfócitos equivalente a 0 a 3 células por mm3.
A localização do líquido cerebrospinal em superfícies tanto externas
quanto internas do encéfalo e da medula espinal é essencial para evitar
traumas mecânicos entre o tecido do sistema nervoso central e os ossos
que o circundam. Além disso, alterações de volume encefálico ou sanguíneo
podem ser contrabalanceadas pelo líquido cerebrospinal a fim de manter
a homeostase e a pressão. Há indícios também de que este líquido cum-
pre função nutritiva e de detoxificação de metabólitos neuronais. Por fim,
devido à estreita diferença de densidade entre o líquido cerebrospinal e o
encéfalo, ele proporciona sustentação e flutuabilidade mecânica, funções
auxiliadas pela presença das membranas meníngeas, conforme veremos a
seguir (SPLITTGERBER, 2021).

Anatomofisiologia das meninges


O encéfalo reside na cavidade craniana e é contínuo com a medula espinal
através do forame magno. Ao seu redor, há três membranas protetoras ou
meninges: a dura-máter, aracnoide-máter e pia-máter (Figura 4), comumente
chamadas de dura, aracnoide e pia, as quais são contínuas com as meninges
correspondentes da medula espinal.
Em latim, o termo dura-máter significa “mãe dura”. Nesse sentido, a dura-
-máter consiste na meninge mais externa e mais espessa, tendo importante
função protetora. Ela é constituída por duas lâminas — a lâmina periosteal e a
lâmina meníngea — estreitamente unidas, que se separam em alguns pontos
para a formação dos seios da dura-máter.
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Aracnoide-máter
Pia-máter
Dura-máter

Figura 4. Representação das três membranas meníngeas — da mais externa para a mais
interna: dura-máter, aracnoide-máter e pia-máter.
Fonte: Adaptada de Martin (2014, p. 25).

Em geral, a lâmina periosteal é o periósteo que reveste o interior


dos ossos do crânio e a lâmina meníngea é a dura-máter em si.
Esta última apresenta-se composta por um tecido fibroso resistente e denso,
que se invagina, dando origem a septos ou pregas da dura-máter.

Os hemisférios cerebrais constituem a maior porção encefálica e são


separados por uma fissura mediana profunda. Essa fissura, denominada
fissura longitudinal do cérebro, possui uma prega (ou septo) da dura-máter,
a foice do cérebro. Uma segunda prega da dura-máter, dessa vez horizontal,
é responsável por separar o cerebelo dos hemisférios cerebrais, sendo cha-
mada de tentório do cerebelo (Figura 5) (MACHADO; HAERTEL, 2014). Tais septos
têm como função a restrição do deslocamento do encéfalo em situações de
aceleração e desaceleração da cabeça.
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Foice do cérebro

Tentório
do cerebelo

Figura 5. Localização das duas pregas da dura-máter: a foice do cérebro, que separa lon-
gitudinal e parcialmente os hemisférios cerebrais, e o tentório do cerebelo, que separa
horizontalmente os hemisférios cerebrais do cerebelo.
Fonte: Adaptada de Martin (2014).

Por sua vez, a aracnoide-máter é composta por uma membrana imperme-


ável situada entre a pia-máter e a dura-máter. Esta membrana é caracterizada
por ser delicada e contínua e possuir células mesoteliais achatadas. Entre as
meninges interna e externa, há um espaço – ao menos virtual. Dessa forma,
o espaço existente entre a aracnoide-máter e a pia-máter é conhecido como
espaço subaracnóideo, preenchido por líquido cerebrospinal (SPLITTGERBER,
2021).
Por outro lado, o espaço subdural — entre a aracnoide-máter e dura-máter
— é considerado um espaço potencial. Isso ocorre pois a meninge aracnoide
está fixada à dura-máter sob condições fisiológicas, não havendo espaço real
entre elas. Sendo assim, o espaço subdural existe como resultado de uma
situação traumática ou patológica, que culmina na separação da aracnoide-
-máter da dura-máter ou da dura-máter do crânio.
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Nesse contexto, a formação do espaço subdural é clinicamente relevante.


Uma vez que a dura-máter é altamente irrigada, a ruptura de vasos sanguí-
neos em decorrência de um traumatismo cranioencefálico pode resultar em
hemorragia ou hematoma subdural. Nesse caso, a formação de um coágulo
sanguíneo gera o afastamento entre as meninges, podendo comprimir o tecido
nervoso subjacente (MARTIN, 2014).
Por fim, a pia-máter consiste na membrana meníngea mais interna e
delicada. Ela é vascularizada e coberta por células mesoteliais achatadas.
Apresenta-se aderida à superfície do encéfalo, cobrindo seus giros e os
sulcos mais profundos. Além disso, a pia-máter estende-se sobre os nervos
cranianos, fundindo-se com o epineuro.

Espaço subaracnóideo
O espaço subaracnóideo encontra-se entre a aracnoide-máter e a pia-máter, e é
preenchido por líquido cerebrospinal. Este espaço é transposto por filamentos
da aracnoide-máter que se conectam com a pia-máter, gerando um aspecto de
teia de aranha, razão do nome aracnoide (em latim, arache significa aranha).
Somado a isso, o líquido cerebrospinal está intimamente ligado com a
vascularização cerebral. Isso ocorre porque a maior parte do líquido cere-
brospinal é produzida por secreção ativa de íons do plasma sanguíneo pelo
plexo coroide. Adicionalmente, com o intuito de manter um volume cerebral
constante, o líquido cerebrospinal retorna ao sangue através de válvulas
existentes entre o espaço subaracnóideo e os seios da dura-máter. Assim, os
seios da dura-máter funcionam como canais de baixa pressão para o fluxo do
sangue venoso voltar à circulação sistêmica (MARTIN, 2014).
Cabe frisar ainda que a porção aumentada do espaço subaracnóideo
no “saco dural” da medula espinal — contendo líquido cerebrospinal e a
cauda equina — é a cisterna lombar. É nessa região que, quando necessário,
é realizada a punção lombar. Ou seja, para se obter uma amostra de líquido
cerebrospinal, é inserida uma agulha de punção lombar com um estilete no
espaço subaracnóideo. A punção lombar deve ser realizada com o paciente
inclinado para frente ou em decúbito lateral com o dorso fletido, pois a flexão
da coluna vertebral facilita a inserção da agulha. Sob condições assépticas,
a agulha é inserida na linha mediana entre os processos espinhosos das
vértebras lombares L III e L IV ou L IV e L V (Figura 6). Nesses níveis, não há
risco de lesão da medula espinal em adultos (MOORE; DALLEY; AGUR, 2014).
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Primeira
vértebra Medula
lombar espinal

Primeira
vértebra
lombar

Agulha
na
cisterna
lombar

Figura 6. Paciente sentado com flexão de tronco para realização de punção lombar.
Na ampliação, observa-se a região intervertebral em que a agulha deve ser inserida.
Fonte: Adaptada de Martin (2014).

Utilizando a mesma posição descrita para a punção lombar, pode-


-se injetar um agente anestésico no espaço extradural (epidural).
O anestésico exerce efeito direto sobre as raízes dos nervos espinais da cauda
equina, fazendo com que o paciente perca a sensibilidade abaixo do nível de
bloqueio (AVILA HERNANDEZ; SINGH, 2022).

Implicações da barreira hematoencefálica


em doenças neurológicas
Como exposto anteriormente, o sistema nervoso central requer um ambiente
estável para seu funcionamento. Dessa maneira, isolar o encéfalo de substân-
cias carreáveis pelo sistema circulatório se torna necessário. Tal separação é
possível devido à presença de membranas semipermeáveis.
Em termos fisiológicos, esse papel é realizado pela barreira hematoence-
fálica, conforme ilustrado na Figura 7. Essa barreira é composta por células
endoteliais, astrócitos, micróglia, neurônios, oligodendrócitos e componentes
não celulares provenientes da matriz extracelular. Dentre eles, as células
endoteliais cumprem papel de destaque na manutenção da homeostase ce-
rebral. Isso ocorre devido à presença de proteínas de ligação e a preservação
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de uma polaridade específica, que resultam em uma linha de demarcação


entre a corrente sanguínea e o encéfalo (MAIUOLO et al., 2018).

Lipídeos
solúveis
Pinocitose Lipídeos solúveis

Fenda intercelular Transporte mediano


de passagem
Passagem
transcelular
Mitocôndria
Pé do
Fenestra astrócito
A B Junção estreita

Figura 7. Representação comparativa de corte transversal: (a) um capilar sanguíneo periférico;


(b) um capilar sanguíneo do sistema nervoso central.
Fonte: Adaptada de Martin (2014).

A permeabilidade da barreira hematoencefálica está inversamente rela-


cionada com o tamanho molecular e diretamente associada com o grau de
lipossolubidade da molécula. Logo, gases e água a atravessam facilmente,
enquanto glicose e eletrólitos encontram maior restrição, ultrapassando-a
lentamente. Vale destacar que a barreira hematoencefálica é praticamente im-
permeável às proteínas plasmáticas, como anticorpos e fatores de coagulação
e outras moléculas orgânicas de alto peso molecular (≥ 60 mil kDa), fazendo
com que elas permaneçam na circulação periférica (SPLITTGERBER, 2021).
Com isso, a barreira hematoencefálica representa uma proteção adicional
ao encéfalo, pois protege-o de substâncias potencialmente nocivas, permitindo
somente a passagem de gases e nutrientes ao tecido nervoso. Entretanto, uma
lesão na camada endotelial pode culminar em alterações na sua polaridade
e permeabilidade, resultando por fim em desequilíbrio central.
De fato, alterações na expressão de proteínas de junção ocorrem durante
o envelhecimento e em situações patológicas, como nas doenças neurodege-
nerativas. Adicionalmente, evidências atuais demonstram que disfunções em
processos fisiológicos, como distúrbios do ciclo sono–vigília e desequilíbrio
na microbiota intestinal, podem estar relacionadas com alterações da per-
meabilidade da barreira hematoencefálica.
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Mas o que há em comum entre essas doenças e processos fisiológicos?


Em geral, o principal mecanismo descrito como disruptor da continuidade
desta membrana é a superprodução de citocinas pró-inflamatórias, como a
interleucina 1β e o fator de necrose tumoral α (TNF- α), bem como de espécies
reativas de oxigênio e nitrogênio, a exemplo do ânion superóxido, óxido nítrico
e peróxido de hidrogênio (MAIUOLO et al., 2018).
Sendo assim, é atribuída a essas citocinas e espécies reativas a desor-
ganização e/ou destruição das proteínas de junção. Como consequência,
há alterações de polaridade na barreira hematoencefálica, possibilitando a
difusão passiva de substâncias do sangue para o encéfalo que inicialmente
não a atravessariam, bem como a infiltração maciça de células do sistema
imunológico.
Ambos processos podem ser danosos. Primeiramente, a possibilidade de
substâncias que não alcançavam inicialmente o tecido nervoso cerebral o
acessarem expõe o cérebro a substâncias tóxicas que eram detoxificadas e
eliminadas em nível periférico. Tais substâncias podem incluir desde medica-
mentos que não têm a capacidade de permear a barreira hematoencefálica até
toxinas produzidas por microrganismos ou os próprios agentes patológicos,
como bactérias e vírus.
Somado a isso, o aumento da permeabilidade da barreira hematoen-
cefálica permite a entrada de células e componentes solúveis do sistema
imunológico. Embora a ativação desse sistema compreenda uma atividade
fisiológica do nosso organismo, é de suma importância relembrarmos que é
ele o responsável por induzir processos inflamatórios, gerando desde edema
até uma possível perda de função no local inflamado. Ou seja, quando essa
inflamação se apresenta como um processo desregulado e não é finalizado no
tempo apropriado, torna-se uma situação crônica que pode causar malefícios.
No caso do tecido nervoso, chamamos esse processo de neuroinflamação
(SPLITTGERBER, 2021).
Ademais, cabe frisar a importância da barreira hematoencefálica em prover
e selecionar os nutrientes que são conferidos do sangue para o sistema ner-
voso central. Nesse sentido, o transporte facilitado de pequenas moléculas
hidrofílicas, como a glicose, é reconhecido como o sistema de transporte mais
importante da barreira hematoencefálica, sendo realizado por transportadores
de glicose como GLUTs e SLC2As e por cotransportadores de glicose e sódio
(SGLTs e SLC5A). Dentre eles, os transportadores de glicose 1 (GLUT1) apre-
sentam destaque, por serem expressos tanto na membrana luminal como na
interface com o endotélio da barreira hematoencefálica (MAIUOLO et al., 2018).
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Nesse contexto, diversas doenças neurodegenerativas, como a doença


de Parkinson, a doença de Alzheimer, a epilepsia e outros distúrbios cogniti-
vos, apresentam morte neuronal progressiva devido a déficits energéticos.
Tal ausência nutricional não se restringe somente à ausência de glicose.
Estudos relatam que também existe prejuízo no transporte de aminoácidos
e ATP para o cérebro. De fato, pacientes diagnosticados com a doença de
Parkinson apresentam níveis reduzidos de valina, leucina e isoleucina no
líquido cerebrospinal. Ademais, há redução de transportadores do tipo ABC,
que realizam o transporte de ATP, nas doenças de Parkinson e Alzheimer,
esclerose lateral amiotrófica e epilepsia.
Como se não bastasse, o transporte de metais também é afetado, resul-
tando em acúmulo ou deficiência desses elementos no encéfalo. A redução
de níveis de ferro no cérebro, por exemplo, induz problemas cognitivos e
distúrbios motores; por outro lado, seu acúmulo está associado à exacerbação
do processo neurodegenerativo visto nas doenças de Parkinson, Alzheimer
e Huntington. Evidências similares tem sido observadas com o acúmulo de
cobre, sendo que sua ausência está associada a prejuízo neurológico e retardo
no crescimento (MAIUOLO et al., 2018).
De modo geral, pode-se concluir que o sistema nervoso central repre-
senta um tecido de extrema importância e que, por isso, é fisiologicamente
protegido de diversas formas. Tal proteção é conferida desde o envoltório
ósseo resistente do crânio e da coluna vertebral até a ação das três meninges,
que além de barreira física cumprem o papel de produzir e alocar o líquido
cerebrospinal. Este, por sua vez, atua tanto no espaço subaracnóideo quanto
no sistema ventricular como um sistema amortecedor à danos físicos e cho-
ques mecânicos. Por fim, temos a ação seletiva da barreira hematoencefálica
frente às substâncias que acessam o encéfalo, protegendo o tecido nervoso
contra danos químicos e biológicos.

Referências
AVILA HERNANDEZ, A. N.; SINGH, P. Epidural anesthesia. StatPearls, Mar. 2022. Disponível
em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK542219/. Acesso em: 12 nov. 2022.
BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema
nervoso. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.
MACHADO, A.; HAERTEL, L.M. Neuroanatomia funcional. 3. ed. São Paulo: Atheneu, 2014.
MAIUOLO, J. et al. The “Frail” Brain Blood Barrier in Neurodegenerative Diseases: Role
of Early Disruption of Endothelial Cell-to-Cell Connections. International Journal of
Molecular Sciences, v. 19, n. 9, 2018. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/
articles/PMC6164949/. Acesso em: 12 nov. 2022.
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MARTIN, J. H. Neuroanatomia: texto e atlas. 4. ed. Porto Alegre: AMGH; Artmed, 2014.
MOORE, K. L.; DALLEY, A. F.; AGUR, A. M. R. Fundamentos de anatomia clínica. 7. ed. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.
SPLITTGERBER, R. Snell neuroanatomia clínica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021.
TORTORA, G. J.; NIELSEN, M. T. Princípios de anatomia humana. 12. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2012.

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