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MARCO HISTÓRICO E CONCEITUAIS DA SAÚDE

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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Sumário
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2

INTRODUÇÃO ........................................................................................ 4

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE SAÚDE ........................... 5

MARCOS HISTÓRICOS RELEVANTES PARA A PROMOÇÃO DA


SAÚDE ............................................................................................................... 7

ANOS 80 E O PRINCÍPIO DA SAÚDE PÚBLICA COMO DIREITO ...... 12

O MOVIMENTO SANITARISTA E A 8ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE


SAÚDE ......................................................................................................... 13

A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A CRIAÇÃO DO SUS: O DIREITO À


SAÚDE COMO DEVER DO ESTADO ............................................................. 14

FUNÇÕES DO SUS: REGULAR, FISCALIZAR, CONTROLAR E


EXECUTAR .................................................................................................. 18

FUNÇÃO DE REGULAÇÃO ........................................................... 18

FUNÇÃO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE ............................... 19

FUNÇÃO DE EXECUÇÃO NO SUS............................................... 20

DIRETRIZES E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO SUS ................. 21

O CONTRATO ORGANIZATIVO DE AÇÃO PÚBLICA – COAP ........... 27

O PACTO PELA VIDA ........................................................................... 32

O PACTO EM DEFESA DO SUS....................................................... 32

O PACTO DE GESTÃO DO SUS ...................................................... 33

METODOLOGIA ................................................................................ 36

CRÍTICAS ÀS NORMAS OPERACIONAIS E DELIMITAÇÃO DO


PROBLEMA ..................................................................................................... 38

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................... 40

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 43

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INTRODUÇÃO

Nas múltiplas áreas do conhecimento humano e a compreensão dos


fenómenos sociais e sua influência no bem-estar das populações, veio
determinar a evolução do conceito de saúde. As atuais definições de saúde,
valorizam o homem, não como um elemento isolado, mas como um ser social
que vive em sociedade, influenciando-a e fazendo parte dela ao mesmo tempo
que dela recebe as suas influências e a ela se adapta. Atualmente a saúde é
entendida como uma situação de equilíbrio entre o nível físico, psíquico e
socioambiental. Mais do que prevenir a doença, importa hoje prevenir a saúde.
A promoção da saúde é uma das chaves deste grande objetivo. Começou
a ser equacionada com a Declaração da Alma-Ata, tendo o seu desenvolvimento
na Carta de Ottawa para a Promoção da Saúde. Esta carta, constituiu uma fonte
de inspiração e de orientação para posteriores ações. Mais do que uma
atividade, a promoção da saúde é considerada uma estratégia que urge
incorporar em todas as dimensões da vida (individual, social e ambiental). Está
inserida numa estratégia global de proteção à saúde que visa o desenvolvimento
da saúde nos vários sectores: saúde ocupacional, saúde ambiental, saúde
alimentar, saúde oral, entre outros. O conceito de promoção da saúde assente,
no paradigma salutogénico, valoriza os fatores que interferem positivamente na
saúde. A ação sobre aqueles fatores tem que ser multidireccional e
multidimensional e deve fazer apelo ao contributo de diferentes disciplinas e
setores.
Assim, aborda-se o conceito de saúde numa perspectiva evolutiva,
salientam-se os principais marcos históricos inerentes à promoção da saúde e
reflete-se sobre o paradigma que sustenta a promoção da saúde.

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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE SAÚDE

O homem primitivo atribuía o processo de saúde/doença à punição ou à


recompensa de entidades sobrenaturais. Esta interpretação, limitada ao conceito
teológico, ainda prevalece atualmente. Da interpretação sobrenatural evolui-se
nas civilizações antigas (grega, romana, egípcia), para uma interpretação
natural, isto é, física. Nesta perspectiva as causas que determinam o processo
de saúde/doença têm origem no corpo; daí que, a saúde seja definida por um
bem-estar físico. Pertence a Hipócrates, 460 anos antes de Cristo, a primeira
interpretação natural do binómio saúde/doença, substituindo a causalidade
divina pela causalidade física. Hipócrates, explica as origens da doença a partir
de um desequilíbrio entre as forças da natureza que estão dentro e fora da
pessoa.
Durante longo período de tempo e até meados de século XVI, dominaram
estas duas interpretações. Com o evoluir dos tempos, foram-se identificando
factores ambientais como causa de doença. Surgiu a teoria dos Miasmas, a qual
atribuía o aparecimento da doença ao efeito do meio ambiente. Esta teoria foi
aceite pelos pensadores e cientistas da época e mais tarde confirmada,
especialmente a partir do século XVII, devido ao aparecimento de meios que
permitiram a identificação de microrganismos causadores de doença. Foi neste
período, que se deu início ao conhecimento científico sobre a saúde. Passou a

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considerar-se que toda a doença corresponderia a uma causa, presumivelmente
à ação de um organismo já conhecido ou a descobrir.
Foi no século XIX, com o desenvolvimento das ciências bacteriológicas,
que se conheceu a natureza das doenças transmissíveis. No século XX o
conceito de saúde modificou-se e com o passar dos anos foi adquirindo um
significado mais amplo e completo. O conhecimento dos múltiplos fatores que
influenciam a saúde do homem trouxe-nos uma nova perspectiva de saúde. A
medicina, foi analisando os fenómenos ligados ao mal-estar humano e
determinando as suas causas o que permitiu o reconhecimento de múltiplos
fatores intervenientes no processo de saúde/doença. Portanto de ante dos
fatores de natureza fisiológica e anatómica, estudados tradicionalmente,
passaram também a considerar-se como causadores de doença, fatores
socioeconómicos, culturais e ecológicos.
Nos EUA que surge, em meados dos anos 60, um novo modelo etiológico
ou teoria explicativa da saúde/doença, o lifestyle-risk factor (Human Population
Laboratory, 1966; Belloc, 1972; Berkam, 1983),citado por (GRAÇA 1999: 135).
Trata-se de uma nova variante do paradigma epidemiológico segundo o qual
certos comportamentos individuais ou estilos de vida constituem fatores de risco
(por ex., o tabagismo, o sedentarismo e os maus hábitos alimentares) e são
decisivos para o desenvolvimento de doenças crónicas, de elevada mortalidade
(por ex., cancro do pulmão, doenças cardiovasculares e diabetes ).
Os modernos pontos de vista sobre a saúde começaram a considerar a
pessoa como um todo e a relacionar os seus estados com as características da
sociedade e o meio em que se integra. Na atual definição de saúde, reconhecida
universalmente, queconsidera a saúde um completo bem-estar físico, mental e
social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade (OMS), está
implícitos múltiplos fatores que se interligam e que influenciam a saúde do
homem.
Nesta perspectiva, a saúde é entendida como pleno desenvolvimento das
potencialidades físicas, mentais e sociais do homem, tendo em conta, como
principais fatores, a carga genética e a procura permanente do equilíbrio com o
ambiente. É pois à luz desta percepção positiva e multidimensional, que a saúde
é entendida atualmente. O entendimento da saúde já não passa apenas pelos
níveis prevenção primária (evitar os riscos profissionais, a doença e o acidente,

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ou seja, a incapacidade), secundária (tratar a doença ou reparar a incapacidade),
e terciária (atenuar os seus efeitos). Vai mais além, colocando questões como é
que o indivíduo realiza as suas potencialidades de saúde e como responde
positivamente às exigências (físicas, biológicas, psicológicas e sociais) dum
ambiente (laboral e extralaboral) em constante mutação.

MARCOS HISTÓRICOS RELEVANTES PARA A


PROMOÇÃO DA SAÚDE

O sanitarista, morto aos 61 anos em decorrência de um câncer, é


reconhecido por sua produção científica e a liderança conquistada na construção
do Sistema Único de SaFoi presidente da Fiocruz em 1985, momento marcado
pela democratização da

Fundação, professor concursado da Escola Nacional de Saúde Pública,


além de chefe do Departamento de Planejamento da ENSP. A tese de doutorado
de Arouca, intitulada O dilema preventivista: contribuição para a compreensão e
crítica da medicina preventiva, forneceu fundamentos teóricos estruturantes para
a constituição da base conceitual da saúde coletiva. Em seu aniversário de 49

7
anos (2003), a ENSP agregou o nome de Arouca ao seu, tornando-se Escola
Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca.
Arouca nasceu em Ribeirão Preto (SP) e formou-se médico, em 1966,
pela Universidade de São Paulo (USP). Em sua vida acadêmica, buscou
vincular-se sempre com as propostas de democratização da sociedade brasileira
na defesa de que todo cidadão tenha direito à saúde, entendida não só como
assistência médica, no momento adequado e com a qualidade necessária, mas
também como uma série de condições para que a população não adoeça:
reforma agrária, educação, lazer, liberdade, habitação digna, transporte etc. O
sanitarista foi um dos principais teóricos e líderes do chamado “movimento
sanitarista”, que mudou o tratamento da questão da saúde pública no Brasil. A
consagração do movimento veio com a Constituição de 1988, quando a saúde
tornou-se um direito inalienável de todos os cidadãos, como está escrito na Carta
Magna: "A saúde é direito de todos e dever do Estado".
Após a criação da Organização Mundial de Saúde (OMS) (1945), a saúde
passou a ser considerada “um dos direitos fundamentais de todo o ser humano
sem distinção de raça, religião, opiniões políticas e condições económicas e
sociais” e foi aceite o princípio da ajuda mútua entre os países. Daqui para frente,
as preocupações com a saúde dos povos foram sendo cada vez mais sentidas,
reunindo sucessivamente responsáveis pela saúde de vários países, no sentido
de refletirem sobre a saúde, os fatores que a determinam e a forma de os
controlar.
Uma das principais reuniões para a saúde, ocorreu em Alma-Ata (1977).
A Declaração de Alma-Ata constituiu um marco importante no movimento da
"Saúde para Todos". Baseada no reconhecimento de que a saúde é um objetivo
social de primeira importância, a Declaração instituiu uma nova orientação para
a política de saúde, conferindo especial ênfase ao envolvimento das pessoas, à
cooperação entre os vários sectores da sociedade, bem como à criação dos
Cuidados de Saúde Primários (CSP). A saúde passou a ser entendida num
sentido positivo, como um recurso da maior importância para o desenvolvimento
social, devendo constituir um direito humano fundamental.

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Foi presidente da Fiocruz em 1985, momento marcado pela
democratização da

Fundação, professor concursado da Escola Nacional de Saúde Pública,


além de chefe do Departamento de Planejamento da ENSP. A tese de doutorado
de Arouca, intitulada O dilema preventivista: contribuição para a compreensão e
crítica da medicina preventiva, forneceu fundamentos teóricos estruturantes para
a constituição da base conceitual da saúde coletiva. Em seu aniversário de 49
anos (2003), a ENSP agregou o nome de Arouca ao seu, tornando-se Escola
Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca.
Arouca nasceu em Ribeirão Preto (SP) e formou-se médico, em 1966,
pela Universidade de São Paulo (USP). Em sua vida acadêmica, buscou
vincular-se sempre com as propostas de democratização da sociedade brasileira
na defesa de que todo cidadão tenha direito à saúde, entendida não só como
assistência médica, no momento adequado e com a qualidade necessária, mas
também como uma série de condições para que a população não adoeça:
reforma agrária, educação, lazer, liberdade, habitação digna, transporte etc. O
sanitarista foi um dos principais teóricos e líderes do chamado “movimento
sanitarista”, que mudou o tratamento da questão da saúde pública no Brasil. A
consagração do movimento veio com a Constituição de 1988, quando a saúde
tornou-se um direito inalienável de todos os cidadãos, como está escrito na Carta
Magna: "A saúde é direito de todos e dever do Estado".
Após a criação da Organização Mundial de Saúde (OMS) (1945), a saúde
passou a ser considerada “um dos direitos fundamentais de todo o ser humano
sem distinção de raça, religião, opiniões políticas e condições económicas e
sociais” e foi aceite o princípio da ajuda mútua entre os países. Daqui para frente,
as preocupações com a saúde dos povos foram sendo cada vez mais sentidas,
reunindo sucessivamente responsáveis pela saúde de vários países, no sentido
de refletirem sobre a saúde, os fatores que a determinam e a forma de os
controlar.
Uma das principais reuniões para a saúde, ocorreu em Alma-Ata (1977).
A Declaração de Alma-Ata constituiu um marco importante no movimento da
"Saúde para Todos". Baseada no reconhecimento de que a saúde é um objetivo
social de primeira

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O espírito de Alma-Ata teve o seu desenvolvimento na Carta de
promoção da saúde, que foi adoptada em Ottawa, em 1986. A carta lançou
um desafio dirigido a uma nova saúde pública, afirmando a justiça social e
a equidade, como pré-requisitos para a saúde, e a advocacia e a mediação,
como processos para atingi-la. É a partir daqui que a promoção da saúde
começou teoricamente a ser equacionada, debatida e verdadeiramente
valorizada. Os encontros e conferências internacionais, que se seguiram,
permitiram precisar o sentido e a pertinência das principais estratégias
enunciadas na Carta, nomeadamente: - Estabelecer Políticas Públicas
Saudáveis – A Conferência de Adelaide, na Austrália, em 1988;
Criar Meios Favoráveis à Saúde – A Conferência de Sündsvall, na
Suécia, em 1991. Seguiu-se a Declaração de Jacarta sobre a Promoção da
Saúde, em 1997, com vista a responder aos desafios da Promoção da Saúde no
século XXI e por último a 5ª Conferência Global sobre a Promoção da Saúde,
subordinada ao tema: Rumo a uma Maior Equidade realizada na Cidade do
México, em 2000 donde resultou a Declaração ministerial do México para a
promoção da saúde. Das ações recomendadas destacam-se as seguintes:
➢ Colocar a promoção da saúde como prioridade
fundamental das políticas e programas locais, regionais,
nacionais e internacionais;

➢ Assumir um papel de liderança para assegurar a


participação ativa de todos os sectores e da sociedade
civil, na implementação das ações de promoção da saúde
que fortaleçam e ampliem as parcerias na área da saúde;

➢ Apoiar a preparação de planos de ação nacionais para


promoção da saúde, se preciso utilizando a capacidade
técnica da OMS e dos seus parceiros nessa área. Esses
planos variam de acordo com o contexto nacional, mas
seguirão uma estrutura básica estabelecida de comum
acordo durante a Quinta Conferência Global sobre
Promoção da Saúde, podendo, incluir, entre outros; -
Identificação das prioridades de saúde e estabelecer
políticas e programas públicos para as implantar. - Apoio a

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pesquisas que ampliem o conhecimento sobre as áreas
prioritárias.
➢ Estabelecer ou fortalecer redes nacionais e internacionais
que promovam a saúde.

De uma forma ou de outra as políticas governamentais dos países em


geral, incluindo Portugal, têm sido norteadas pelos valores e princípios
decorrentes destas conferências. Pelo menos teoricamente, tem-se procurado
concretizar as recomendações que delas partem. Na prática, o conceito não
parece totalmente assimilado, resumindo-se, quanto muito, quer para o público
em geral e para os profissionais de saúde em particular a atividades pontuais e
desligadas com vista à educação para a saúde e a adopção de estilos de vida
saudáveis.
A promoção da saúde é muito mais do que isso. Mais do que uma
atividade é uma estratégia bem definida que, através de programas educacionais
visa a “melhoria dos estilos de vida individuais, influenciando escolhas pessoais
realizadas num contexto social” (FRANK-STROMBORG, M et al: 1998). A
promoção da saúde “é uma intervenção conjunta e integrada sobre o indivíduo
e o meio envolvente em que em nasce, cresce, vive, respira, trabalha, consome
e se relaciona” (GRAÇA, 2000: 77). Na verdade, esta ideia faz todo o sentido
pois está provado, que a melhoria do estado de saúde das populações começou
um século antes da medicina ter meios eficazes de intervenção no combate às
doenças, sendo esse salto atribuído, em grande medida, aos progressos da
envolvente socioeconómica (alimentação, habitação, saneamento básico,
higiene ambiental e pessoal, nível de instrução e de informação, serviços de
saúde pública, etc.).
Assim, torna-se uma evidência inquestionável que, para atingir o grau
mais alto nível de saúde, têm que estar implicados, além do sector da saúde,
todos os sectores e aspectos conexos do desenvolvimento nacional e
comunitário (agricultura, alimentação, indústria, educação, habitação, obras
públicas, comunicações) e requer os esforços coordenados de todos estes
sectores. GREEN (1991) também corrobora esta ideia, ao afirmar que “a
promoção da saúde consiste, fundamentalmente, na combinação de apoios
educativos e ambientais e ações e condições de vida que conduzem à saúde e

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influenciam os fatores determinantes desta” (NUNES, 1997). Só levando à
prática estas concepções, que apesar derivarem de diferentes teóricos, expressa
uma ideia única, esta abrangente estratégia conseguirá alcançar o seu objetivo:
permitir ao indivíduo adquirir maior domínio sobre os fatores da sua própria
saúde.
A preocupação com os problemas de saúde das populações, não é
recente e está, naturalmente, relacionada com a evolução do conceito de saúde
ao longo dos tempos. Esta preocupação, durante séculos, esteve centrada em
torno da doença, e limitou-se a uma atitude de aceitação passiva, já que a saúde
era encarada numa perspectiva teológica. As medidas implementadas para
preservar a saúde limitaramse durante séculos à repressão, segregação e
abandono dos doentes.
O desconhecimento sobre a etiologia da doença humana conduziu
durante longos anos à ausência de uma consciência coletiva da saúde e da
doença dúvidas, de que, tanto como prevenir a doença é igualmente importante
investir na saúde e valorizar positivamente os fatores que a determinam. Passou-
se do investimento na prevenção da doença para o investimento na prevenção
da saúde. organizacional. GRAÇA, 2000).

ANOS 80 E O PRINCÍPIO DA SAÚDE PÚBLICA COMO


DIREITO

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O MOVIMENTO SANITARISTA E A 8ª CONFERÊNCIA NACIONAL
DE SAÚDE
O movimento sanitarista foi de importância ímpar ao entendimento de
saúde pública, do conceito de saúde e também da evolução do direito à saúde
no Brasil. A reforma sanitária se refere às ideias de uma série de mudanças e
transformações necessárias à saúde. Sua composição era de técnicos da saúde
– médicos, enfermeiros, biomédicos… – e intelectuais, partidos políticos,
diferentes correntes e tendências e movimentos sociais diversos. Ao fim da
década de 1970, o movimento adquiriu certa maturidade em função de uma série
de estudos acadêmicos e práticos realizados, principalmente, nas faculdades de
Medicina. Nas universidades, o entendimento de medicina se tornava cada mais
social, pensando a saúde como uma série de fatores que vão além do bem-estar
do corpo humano.
De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), alguns dos atores
do movimento sanitarista foram os médicos residentes, “que na época
trabalhavam sem carteira assinada e com uma carga horária excessiva”, por
exemplo. Outras movimentações da Reforma Sanitária foram as primeiras
greves realizadas depois de 1968 e os sindicatos médicos, que também estavam
em fase de transformação.
“Esse movimento entra também nos conselhos regionais, no Conselho
Nacional de Medicina e na Associação Médica Brasileira – as entidades médicas
começam a ser renovadas. A criação do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
(Cebes), em 1976, também é importante na luta pela reforma sanitária. A
entidade surge com o propósito de lutar pela democracia, de ser um espaço de
divulgação do movimento sanitário, e reúne pessoas que já pensavam dessa
forma e realizavam projetos inovadores”, de acordo com a Fiocruz.
Enquanto a ditadura militar existia, o movimento sanitarista foi “testando”
uma série de hipóteses a respeito do seu entendimento de saúde. Na Escola
Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fundação Oswaldo Cruz são colocados
em prática diversos projetos “e pessoas que faziam política em todo Brasil foram
treinadas”. Os projetos envolviam:
➢ saúde comunitária;
➢ clínica de família;

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➢ pesquisas comunitárias.

Ao fim da ditadura, as propostas da Reforma Sanitária foram reunidas


num documento chamado Saúde e Democracia, enviadas para aprovação do
Legislativo. Uma das conquistas foi a realização da 8ª Conferência Nacional da
Saúde em 1986. Pela primeira vez na história, foi possível a participação da
sociedade civil organizada no processo de construção do que seria o novo
modelo de saúde pública brasileiro.
Essa conferência foi tão importante pois desde o seu tema – “saúde como
direito de todos e dever do Estado” – teve como resultado uma série de
documentos que basicamente esboçaram o surgimento do Sistema Único de
Saúde (SUS). A conferência ampliou os conceitos de saúde pública no Brasil,
propôs mudanças baseadas no direito universal à saúde com melhores
condições de vida, além de fazer menção à saúde preventiva, à descentralização
dos serviços e à participação da população nas decisões. O relatório da
conferência teve suas principais resoluções incorporadas à Constituição Federal
de 1988.

A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A CRIAÇÃO DO SUS: O


DIREITO À SAÚDE COMO DEVER DO ESTADO

Foi criada a Lei Federal 8080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe


sobre as atribuições e funcionamento do Sistema Único de Saúde, bem como a
Lei Federal 8142, de 28 de dezembro de 1990, que trata sobre a participação da
comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e sobre as transferências

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intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde. Há
procedimentos do SUS que são veiculados por meio de regulamentos, decretos,
portarias, especificados no capítulo a seguir. Essas normas infralegais devem
adequar-se à moldura constitucional que impõe a observância dos
procedimentos à efetivação dos direitos fundamentais.
Desse modo, integra o chamado direito sanitário não apenas a
Constituição Federal de 1988 e leis específicas atinentes à saúde, mas também
as portarias e protocolos dos SUS, sendo imperioso que todas as normas
atendam à finalidade constitucional do direito à saúde. Cabe ao Estado, por ser
o responsável pela consecução da saúde, a regulamentação, fiscalização e
controle das ações e serviços de saúde. Desse modo, o amplo acesso aos
medicamentos, por integrar a política sanitária, insere-se no contexto da
efetivação do direito à saúde, de modo que as políticas e ações atinentes aos
produtos farmacêuticos devem sempre atender ao mandamento constitucional
de relevância pública.
A Constituição Federal de 1988, em seu Art. 198, estabelece como
diretrizes do Sistema Único de Saúde a descentralização, com direção única em
cada esfera de governo, o atendimento integral, com prioridade para as
atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais e a participação
da comunidade. Importante observar que as diretrizes do SUS não se esgotam
nessas três diretrizes, porquanto ao longo da seção destinada à saúde
observam-se alguns fundamentos desse direito, que servem de norte para a
conduta da Administração Pública no tocante ao direito à saúde.
Nos 25 anos do Sistema Único de Saúde (SUS), são apontados avanços
na implementação dos seus princípios e diretrizes constitucionais, em especial,
a universalidade e a descentralização, com uma importante inclusão social no
sistema público de saúde. Ocorrem também avanços na gestão do sistema
público com a criação dos fundos de saúde, dos repasses fundo a fundo, das
comissões intergestores (tripartite e bipartite), das normas operacionais básicas
pactuadas e, recentemente, no Pacto pela Saúde, em suas três dimensões:
Pacto pela Vida; em Defesa do SUS; e de Gestão (SANTOS, 2010).
O Pacto pela Vida compõe um conjunto de compromissos sanitários
considerados prioritários, expressos em objetivos de processos e resultados que
apresentam impacto sobre a situação de saúde da população (BRASIL, 2006).

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O Pacto em Defesa do SUS expressa os compromissos entre os gestores do
sistema, de repolitizar a saúde com a consolidação da Reforma Sanitária
Brasileira (BRASIL, 2006). O Pacto de Gestão estabelece diretrizes para o
sistema, valorizando o fortalecimento da gestão compartilhada e solidária
(BRASIL, 2006). A partir do Pacto pela Saúde, os acordos estabelecidos entre
as três esferas de governo são formalizados por meio da assinatura do Termo
de Compromisso de Gestão (TCG), que compreende responsabilidades,
objetivos e metas associados a indicadores e prioridades definidas
nacionalmente.
Atualmente, com o Decreto no 7.508/11, o TCG será substituído pelo
Contrato Organizativo da Ação Pública da Saúde (BRASIL, 2011), que ainda não
está vigente em todo o território nacional. O Pacto pela Saúde, em suas três
dimensões, representou uma mudança na forma de atuação do nível federal,
assim como uma revisão das relações federativas no SUS, com aumento da
necessidade de cooperação intergovernamental. No entanto, embora haja
ênfase na pactuação federativa como eixo, a elaboração dos compromissos
pactuados se articula pouco com o planejamento, se baseando mais na
expectativa de solidariedade entre os entes, o que acaba sendo um ponto frágil
do Pacto pela Saúde.
Isso se evidencia pela pouca ênfase no diagnóstico situacional prévio à
pactuação, pela dificuldade de cada realidade local realizar uma adaptação das
metas e prioridades, e pela não definição de instrumentos para atingir as metas
pactuadas (investimentos, recursos, estruturas etc.) (MACHADO ET AL., 2010).
Segundo Santos (2007, p. 434), as mudanças propostas no Pacto pela Saúde
devem ser analisadas sob o ponto de vista da macropolítica e da microgestão.
A microgestão está atrelada à micropolítica do trabalho em saúde, “onde
está localizado o espaço para acumulação de êxitos visíveis e consecução de
mudanças significativas do SUS”. Nesse sentido, as prioridades definidas
nacionalmente para o Pacto pela Vida (BRASIL, 2008) apresentam objetivos,
metas e indicadores que, necessariamente, se traduzem em um conjunto de
compromissos e responsabilidades para as práticas cotidianas nos serviços de
Atenção Primária à Saúde (APS), articulando-os à finalidade do trabalho.
Entre estas prioridades está o fortalecimento da própria APS, organizada
e qualificada pela Estratégia Saúde da Família (ESF) (BRASIL, 2008). A Política

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Nacional da Atenção Básica elege a ESF como a estratégia de reorientação do
modelo de atenção à saúde em todo o território nacional. Desde a implantação
da saúde da família, em 1994, houve grande expansão no número de equipes,
sendo que, em setembro de 2010, a cobertura, segundo o Ministério da Saúde,
chegou a 99,4 milhões de pessoas, com 31.500 equipes implantadas (BRASIL,
2008).
Contudo, para além da expansão, questões de qualidade permanecem
no debate, ao lado de problemas ligados à própria natureza de um programa
público universal que almeja a equidade. Uma discussão premente centra-se na
potencialidade para transformação da ESF, ao privilegiar outras interfaces do
sistema, à medida que busca estimular a organização dos sistemas locais e
aproximar os serviços à realidade da população, envolvendo os atores sociais
desses cenários, para que possam desenvolver todas as competências
necessárias para a produção do cuidado, em uma Atenção Básica que
ambiciona resolver cerca de 80% dos problemas de saúde apresentados pelos
usuários, embora nem sempre isso se concretize.
Atenção Básica que deve ser necessariamente entendida como aquela
que disputa seu papel, que não deve ser simplesmente reiterado sob o ponto de
vista do discurso, mas consolidada gradualmente através da ampliação da sua
legitimidade perante os usuários, como efetivamente resolutiva e coordenadora
do cuidado (CECILIO ET AL., 2012). Assim, quanto mais estudos aproximarem
os trabalhadores da Atenção Primária à Saúde envolvida no processo de
trabalho dos serviços de saúde com o compromisso político institucional
assumido pelo município com o Pacto pela Saúde, maiores serão as chances de
que este se torne uma política pública efetiva.
O profissional de saúde produz trabalho vivo no exercício de suas
funções, ou seja, o resultado de seu trabalho é consumido durante sua produção,
apropriando-se dos instrumentos para produção do trabalho e sendo o produto
desse trabalho (MERHY, 1997, 2002). Este estudo apoiou-se no referencial da
micropolítica do trabalho em saúde de Mehry (1997/ 2002). Este autor conceitua
a micropolítica do trabalho vivo em ato, que nos permite duvidar, analisar e
revelar os sentidos e a direcionalidade (intencionalidade) do processo de
trabalho em saúde, e seus modos de operar cotidianamente os processos
produtivos.

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Esse movimento é fundamental nas dobras da gestão dos
estabelecimentos de saúde e de seus resultados, como o lugar onde se
governam os processos institucionais, pois é o espaço da formulação e da
decisão de políticas. É também o lugar onde imprime direcionalidade aos atos
produtivos, ao governar processos de trabalho. Na micropolítica, o processo de
trabalho está sempre aberto à presença do trabalho vivo em ato, possibilitando
ao trabalhador a criação de novos processos de trabalho, interrogando os velhos
processos cristalizados. Entende-se que a simples pactuação não garante que
venham a ocorrer mudanças na maneira de se produzir o cotidiano dos serviços
de saúde.
Porem depende da descentralização do processo de gestão para que os
atores locais – gestores, trabalhadores de saúde, prestadores de serviço e
usuários – tornem-se protagonistas na pactuação de novos compromissos e
responsabilidades (BRÊTAS; SILVA, 2010, p. 31). Diante desse desafio, o
objetivo em compreender o processo de implementação do Pacto pela Saúde na
prática cotidiana dos trabalhadores de saúde vinculados à coordenação da Rede
de Atenção Primária à Saúde e os vinculados à coordenação da equipe saúde
da família.

FUNÇÕES DO SUS: REGULAR, FISCALIZAR, CONTROLAR E


EXECUTAR
FUNÇÃO DE REGULAÇÃO

Regular alguma coisa é estabelecer as regras para que exista, funcione,


consiga os resultados etc. As regras da saúde, na verdade, começam na CF,
que estabelece o direito à saúde e as linhas gerais desse direito. Depois vêm as
Leis 8.080 e 8.142 que regulamentam melhor esse direito. A partir daí, vão
surgindo as regulamentações menores.
Na saúde, além de ser necessário regular a organização do sistema
público e privado, também se regulamentam as ações e serviços de saúde.
Regulação do SUS, de um lado, é estabelecer como devem funcionar os
hospitais públicos e privados, as unidades de saúde, os consultórios privados,

18
quem pode exercer a função de médico, dentista etc., quais são os dados
essenciais que devem ser gerados pelos serviços; de outro lado, como serão
tratadas determinadas doenças de interesse público, quais os medicamentos,
quais as dosagens, como será feita a vacinação de adultos, crianças etc., como
as pessoas devem entrar no sistema de saúde público para serem atendidas
corretamente. Tudo isso e muito mais coisas fazem parte da função de
Regulação.

FUNÇÃO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE

Esses dois termos, previstos na CF e na Lei 8.080, se misturam e se


completam com outro que é a auditoria. Digo que os termos: Fiscalizar, Controlar
e Auditar têm em sua gênese a mesma ferramenta e processo, que é Avaliar.
Todos os três termos usam da avaliação que é feita do comparar duas coisas ou
duas realidades e emitir um juízo de valor. Avaliar é comparar o que se observa
com o que se quer como bom e certo, com um paradigma, um ótimo, uma
situação ideal e emitir o juízo de valor se aquilo está do jeito que deveria estar,
ou se mais longe ou mais perto do ótimo.
Os três termos Fiscalizar, Controlar e Auditar são baseados em avaliação
de conformidade. Essa é a grande igualdade entre eles. Entretanto, começam a
ser feitas separações entre eles tentando estabelecer diferenças para
caracterizar que são processos diferentes. As diferenças podem ser
estabelecidas pelo ponto de vista de quem avalia: se de dentro, é controle, se
de fora, é fiscalização-auditoria. Não é o de fora da instituição é o de fora do
cenário onde acontece, da responsabilidade pelo fazer acontecer. Aí dizem:
quem faz deve controlar, e depois nós de fora (de outro departamento, de outro
nível, de fora do setor ou da instituição) vamos fiscalizar-auditar. Outros querem
separar pelo corte que controle é de processo e que fiscalização-auditoria é de
sistema. Aí se misturam e digladiam definidos e definidores. Prefiro ver imensa
igualdade entre uma e outra coisa.
Apenas vislumbro uma nuance do controle ligado a quem tem a
incumbência de garantir que as coisas devam acontecer, e fiscalização-auditoria
seja de alguém mais externo e que pode olhar com outro olhar de quem só vai
fiscalizar e não tem a incumbência de fazer acontecer. A fiscalização e controle

19
no SUS pode ser dentro do próprio público ou do privado (contratado-conveniado
ou não): da ação de saúde, do serviço, da instituição, dos profissionais, dos
contratos-convênios, dos planos e seguros de saúde etc.
Podemos ainda falar em controle público que é a especificidade de se
controlar o público e que se divide em controle público institucional e social. O
controle público institucional é aquele exercido pela própria instituição pública,
sobre o público. O controle público social é aquele exercido pela sociedade,
pelos cidadãos sobre a instituição pública.

FUNÇÃO DE EXECUÇÃO NO SUS

O SUS tem que executar, fazer as ações de saúde. É a incumbência do


SUS precípua, explicitada em outros locais da CF e da Lei 8.080 e que vamos
comentar logo a seguir. Essa execução das ações deve ser feita diretamente ou
através de terceiros e também por pessoa física ou jurídica de direito privado.
O SUS tem que ter serviços próprios para executar diretamente e tem a
possibilidade de contratar terceiros para completar os serviços que não der conta
de executar por si próprio. Além disso, a execução de serviços de saúde é
livremente permitida ao privado, pessoa física ou jurídica. Que ações o SUS
executa? É interessante, pois o SUS é reconhecido como o Sistema Público de
Saúde. Deve, portanto, exercer ações públicas. Antigamente, quando se falava
em ações públicas de saúde se pensava na concepção antiga da saúde pública:
ações mais coletivas e de promoção e proteção à saúde e para as doenças de
maior interesse coletivo e com pouco apelo comercial, como tuberculose,
hanseníase, malária, febre amarela, doença mental etc.
Hoje, a concepção e o campo da saúde pública, enquanto SUS, é
abrangente, incluindo o individual e o coletivo, com ações de promoção, proteção
e recuperação da saúde em todos os campos e fazendo todos os campos como
vigilância sanitária, epidemiológica, saúde do trabalhador, alimentação e
nutrição, saúde da pessoa portadora de deficiência e todos os procedimentos:
consultas, exames, urgências, internações, cirurgias, transplantes, UTI etc.

20
DIRETRIZES E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO SUS

As Diretrizes e princípios do Sistema Único de Saúde têm seu fundamento


na CF e na Lei 8.080.
Didaticamente, costumo tomar essas diretrizes e princípios unificados e
separá-los quanto aos aspectos técnico assistenciais e os técnicos gerenciais
que dizem respeito à organização administrativa do sistema.
As diretrizes e princípios tecnoassistenciais da CF e Lei 8.080 são:
universalidade, igualdade, equidade, integralidade, intersetorialidade, direito à
informação, autonomia das pessoas, resolutividade e base epidemiológica.
• Universalidade – O direito à saúde, bem-estar, felicidade é de
todos: pobres, ricos; empregados, desempregados; quem tem plano e quem não
tem plano... O SUS não pode discriminar quem tem direito: nem discriminação
positiva, nem negativa. Universalidade significa o Para Todos.
• Igualdade – Não discriminar a prioridade e a qualidade da atenção.
Todos os cidadãos têm igualdade de acesso às ações e serviços de saúde. Sem
discrimina ção positivo-negativa, com acesso nem tratamento diferenciados para
problemas iguais. Essa igualdade, ao não ser praticada, pode virar desigualdade
e iniquidade, movida por dois grandes parceiros: o financeiro e o tráfico de
influência. O tráfico de influência é um causador da desigualdade de acesso.
Muitas vezes queremos reduzir o tráfico de influência, aquele praticado por
políticos (vereadores, prefeitos, deputados etc.), mas a maioria dos atos de
tráfico de influência é feita diariamente nos serviços de saúde públicos pelos
próprios funcionários. É uma quebra da igualdade, quando pessoas têm
privilégios por laços de parentesco, favores de autoridades, funcionários etc.
Além disso, temos hoje o desafio de criticar a quebra da igualdade da dupla porta
de entrada em serviços públicos de saúde que usam de seu poder de influência
e da impunidade para fazer uma porta de entrada para os usuários do SUS e
outra melhorada e diferenciada para atender os pacientes privados e de planos
e seguros de saúde. Os serviços públicos de saúde devem tratar todos de
maneira igual sem diferenças odiosas e discriminadoras.
• Equidade – Aqui vale comentar sobre a equidade que é a
qualificação da igualdade. O princípio da equidade é muitas vezes invocado, mas

21
ele não existe na legislação federal a não ser em algumas legislações, como a
do Estado de São Paulo. Equidade é a igualdade adjetivada pela justiça. Pela
equidade buscamos tratar diferentemente os diferentes (equidade vertical) e
igualmente os iguais (equidade horizontal). No SUS, só se pode fazer equidade
e tratar diferentemente a partir das necessidades de saúde. Priorizar atenção e
tratamentos só se por carências de saúde. Muitas pessoas imaginam que o SUS
possa fazer diferenças a partir do estado de pobreza das pessoas. Pensam que
o SUS além de ser dos pobres pode priorizar tratamentos e medicamentos para
os chamados carentes. Esse raciocínio é incorreto. Diferenças no SUS só por
necessidades de saúde.
• Integralidade – A integralidade também pode ser vista sob dois
prismas. A integralidade vertical que lembra a necessidade de se ver o ser
humano como um todo e não apenas como um somatório de órgãos e aparelhos.
O segundo prisma é o da integralidade horizontal onde se entende que a ação
deva abranger seus três enfoques: promoção, proteção e recuperação da saúde.
Ver como um todo e agir nesse todo, integralmente.
• Intersetorialidade – Não pensar saúde só como área de
recuperação da saúde: consulta, remédio, especialista, exame, internação...
Pensar saúde garantida por políticas econômicas e sociais que diminuam o risco
de as pessoas ficarem doentes ou piorarem. Levar em consideração a
determinação econômica e social da saúde. Os fatores determinantes e
condicionantes da saúde devem sempre ser levados em consideração:
“alimentação, moradia, saneamento, meio ambiente, trabalho, renda, educação,
transporte, lazer, acesso a bens e serviços essenciais; saúde expressando a
organização social e econômica do Brasil” (Lei 8.080,3).
• Direito à informação – Todas as pessoas assistidas têm direito a
todas as informações sobre seu estado de saúde-doença. Todas as informações
sobre os pacientes: exames, prontuários etc. são de propriedade e direito do
paciente. O segredo médico é um segredo consequente do direito primeiro ao
segredo que é do paciente. Além disso, a população tem direito a “informações
quanto ao potencial dos serviços de saúde e de sua utilização pelo usuário”.
• Autonomia das pessoas – As pessoas – os cidadãos usuários –
devem ter preservada sua autonomia na defesa de sua integralidade física e
mental. Trata- -se da preservação – dentro dos serviços de saúde – da liberdade

22
de decisão dos pacientes. Aqui se completa a autonomia associada ao direito de
informação. A verdadeira autonomia é condicionada pelo direito de acesso à
informação, o princípio discutido acima. Só bem informado o cidadão poderá
usufruir da verdadeira autonomia.
• Resolutividade – As ações e serviços de saúde devem atender
também ao princípio de ter capacidade de resolução em todos os níveis de
assistência. Os serviços de saúde devem buscar resolver os problemas das
pessoas da melhor maneira possível e ao menor custo. Essa é uma questão que
cada vez fica mais complexa pela incorporação tecnológica cada vez maior e
onde o sistema de encaminhamentos acaba por bloquear a capacidade de ser
resolutivo. Cada vez mais se resolvem menos problemas que, mesmo os menos
complexos, são encaminhados quase que em cadeias. Princípio do SUS:
capacidade de resolver problema.
• Epidemiologia como base – A epidemiologia é uma das ciências
da saúde que têm como objetivo conhecer aquilo que ocorre com a população:
as condições ambientais em que vive a população, as condições gerais de
saúde, a oferta de ações e serviços de saúde. O objetivo mais importante da
epidemiologia é o estudo da morte e de doenças que ocorrem em determinada
população, em determinado lugar. A epidemiologia define o perfil demográfico e
o perfil de morbimortalidade em relação às doenças agudas e
cronicodegenerativas (hipertensão, diabetes, câncer etc.); os agravos dos
acidentes de trabalho, de trânsito, de tóxicos, dos homicídios; as doenças
evitáveis; as doenças tratáveis precocemente. As diretrizes e princípios
tecnogerenciais da CF e Lei 8.080 são: descentralização, regionalização,
hierarquização, gestor único em cada esfera de governo, conjugação de
recursos das três esferas de governo, organização dos serviços para evitar
duplicidade, complementariedade e suplementariedade do privado,
financiamento tripartite e participação da comunidade.
• Descentralização – A descentralização no sistema de saúde
brasileiro é uma diretriz-princípio. Consta como diretriz na CF e como princípio
na Lei 8.080. Descentralização, segundo o Glossário do MS do Projeto de
Terminologia da Saúde, é “redistribuição de recursos e responsabilidades entre
os entes federados, com base no entendimento de que o nível central, a união,
só deve executar aquilo que o nível local, municípios e estados, não podem ou

23
não conseguem. A gestão do SUS passa a ser responsabilidade da União, dos
Estados e dos Municípios, agora entendidos como os gestores do SUS”. Quem
fazia não tem mais a competência de fazer e precisa passar a outra esfera de
governo o que fazia e como fazia (se souber ). A descentralização que
defendemos é aquela com ênfase na municipalização, com regionalização
ascendente e gestor único por esfera de governo. Regiões organizadas pelos
municípios com a cooperação técnica dos Estados e do MS. É colocar nas mãos
do município a decisão do quê e do como fazer saúde e os meios, principalmente
o financeiro, para poder fazer. Poder perto da necessidade do povo é mais fácil
de o cidadão controlar. Existem entraves a essa descentralização colocados pelo
gestor descentralizador. Uns assumem posição favorável com argumentos como
descentralizar para desresponsabilizar e colocar menos dinheiro para a saúde
deixando para Estados e municípios o ônus. São feitas constantemente
acusações de desvio e mau uso dos recursos descentralizados a Estados e
municípios. Interpretações restritivas de leis criando controle distorcidos pelos
próprios organismos federais, como Tribunal de Contas da União (TCU),
Controlaria Geral da União (GCU), Tribunais de Contas dos Estados (TCE) e
Sistema Nacional de Auditora (SNA). Desfinanciamento desencadeando
desestímulo de se conseguir implantar e implementar o SUS. Muitos servidores
descentralizados têm restrições à descentralização (implicitamente sempre
temendo maior controle de trabalho, horário e quase nada de ideológico).
Existem entraves também por parte dos gestores descentralizados que não
querem muitas vezes assumir seu papel e, comodamente, deixam suas
competências constitucionais e legais nas mãos dos outros gestores. Outras
vezes são limitações por falta de profissionais da área administrativa e técnica,
como vigilância epidemiológica, sanitária e ambiental.
• Direção única – O SUS é de responsabilidade constitucional das
três esferas de governo, não podendo nenhuma delas se eximir dessa
obrigação. O comando legal é de que, em cada esfera de governo, só possa ser
gestor uma das esferas de governo. No município comanda o prefeito e o
secretário municipal de Saúde. No Estado, o governador e seu secretário de
Saúde; e na União, o presidente e o ministro da Saúde. A direção única em cada
esfera de governo é um complemento da descentralização. Hoje existe uma
questão falaciosa sendo discutida. Discute-se que a gestão única é apenas por

24
esfera de governo e não por território. Equivaleria a dizer que na esfera municipal
só poderia ter um gestor, não poderiam ser várias secretárias e secretários
cuidando da saúde. Apenas um. Entretanto, no território municipal poderia ter
um único gestor municipal concomitante a um único gestor estadual ou um único
gestor federal. Isso é controverso, e ainda que defendido pelas secretarias
estaduais de Saúde, não é reconhecido pelas secretarias municipais de Saúde.
• Regionalização – As ações e serviços de saúde devem ser
organizados de forma regionalizada. Seria impossível que os 5.600 municípios
brasileiros fossem, cada um deles, suficientes e capazes de atender a toda sua
demanda em todos os níveis de atenção. A regionalização é fundamental à
organização do SUS, mas só dará certo quando for uma regionalização
funcional, ascendente, e nunca uma regionalização burocrático-administrativa e
descendente. “A proposta de regionalização, sem investimentos para cobrir os
‘vazios regionais de infraestrutura’, sem redefinir a relação público-privado
(especialmente diante dos planos de saú- de) e sem mudança nos modelos de
atenção, seria mais uma proposta tecnocrática que não daria conta dos desafios
atuais do SUS. Sob o pretexto da regionalização, poderia estar havendo um
movimento de recentralização de decisões junto ao poder estadual” (Prof. Dr.
Jairnilson da Silva Paim – ISC – UFBA.) No mundo inteiro, no público e no
privado, sabe-se que ações e serviços de saúde precisam ser organizados de
forma regionalizada e hierarquizada. Quer dizer que não se podem alocar todos
os serviços em todos os lugares, independentemente de seu tamanho, território
e disponibilidade de equipamentos e pessoal. Os serviços de saúde devem se
complementar numa associação permanente entre os mais simples e os mais
complexos, se referenciando e contrarreferenciando.
• Hierarquização – Começa pela atenção ao indivíduo, à família e à
comunidade por meio dos Agentes Comunitários de Saúde, do Programa de
Saúde da Família, das Unidades Básicas de Saúde com seus procedimentos de
menor complexidade tecnológica (equipamentos e aparelhos) e da mais alta
complexidade de saber e prática humanos. Da atenção primária se vai à
secundária (especialistas, exames mais complexos, internações em clínicas
básicas, como pediatria, clínica e cirurgia gerais, ginecologia e obstetrícia). Da
secundária à terciária com profissionais e hospitais em áreas mais
especializadas. Na quaternária se encontram os profissionais e hospitais

25
superespecializados em uma única área, como os de cardiologia, neurologia,
cirurgia plástica etc.
• Complementariedade do privado – O art.199 da CF coloca
claramente que a saúde está livre à iniciativa privada. Além de ser possível o
livre exercício das profissões de saúde e dos serviços privados de saúde, esses
poderão também ser utilizados pelo SUS todas as vezes que sua capacidade de
atendimento for insuficiente para dar conta da demanda. A complementaridade
poderá se dar com o privado através de contrato de direito público ou convênio.
Nessa chamada de complementação dos serviços públicos a preferência será
dada às entidades filantrópicas e às sem fins lucrativos. Todas as vezes que o
próprio estatal não for suficiente para atender a demanda é constitucional
recorrer-se complementarmente ao privado. Atenção, que não se trata de
entregar o público ao privado (terceirização pelas Organizações Sociais,
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público Social (Oscips),
Cooperativas, Associações), mas de recorrer ao privado para complementar o
público. Não para substituir o público. Ordem de preferência: público estatal,
universitário público, universitário filantrópico, filantrópico, privado lucrativo.
• Suplementariedade do privado – Na área de saúde, no Brasil, é
livre a iniciativa privada que pode ser exercida e utilizada de maneira totalmente
liberal, nos consultórios e nas clínicas contra pagamento direto. Pode também
ser organizada em forma de operadoras de planos e seguros de saúde,
individuais, familiares ou coletivos, conforme faculta a legislação. Entre as
operadoras de saúde temos, de um lado, os seguros de saúde, que são
seguradoras e não podem ter serviços de saúde; de outro, têm-se as empresas
de Medicina de Grupo, o Sistema de Autogestão patrocinado por empresas ou
trabalhadores e as Cooperativas Médicas e Odontológicas.

26
O CONTRATO ORGANIZATIVO DE AÇÃO PÚBLICA –
COAP

De acordo com o discurso institucional do Ministério da Saúde, o instituto


do Contrato Organizativo de Ação Pública – COAP - “acordo de colaboração
entre os entes federativos para organização da rede Inter federativa de atenção
à saúde”, conforme o Decreto Federal nº 7.508/2011, que regulamentou a Lei nº
8080/90, pode ser entendido como um dispositivo que “aprimorou” o antigo
Termo de Compromisso de Gestão (previsto pelo Pacto de Gestão) e, portanto,
viabilizaria uma relação entre os entes federativos com maior segurança jurídica,
com maior transparência das suas respectivas responsabilidades, dentre outros
aspectos (BRASIL, 2011, p. 78).

Conforme ensinamento de Santos L., (2012), os contratos organizativos


encontram respaldo constitucional através do art. 37, § 8º, da CF, que previu
acordos organizatórios, visando à ampliação da autonomia dos entes e órgãos
públicos em nome da maior eficiência dos objetivos públicos. Todavia, adverte
que somente contratos organizativos serão capazes de vincular os entes
federativos signatários na organização das redes de saúde, no que se referem
às suas obrigações, responsabilidades e demais compromissos, e que sem eles

27
a governança da rede poderá ser falha, ante a ausência de segurança jurídica
aos compromissos sanitários pactuados.
De outro lado, o recurso às portarias ministeriais tem sido um valioso,
senão o principal, instrumento de coordenação das ações nacionais de saúde,
estabelecendo um arranjo no qual o Governo Federal ocupa posição central,
detendo o poder de agenda e exercendo maior influência sobre processos
decisórios que, especialmente por meio da Comissão Intergestores Tripartite,
afetaram o formato da cooperação e a destinação dos recursos transferidos,
enquanto os municípios se converteram em executores e gestores diretos dos
serviços que compõem a atenção à saúde.
Neste contexto, a construção de sistemas regionalizados de atenção à
saúde foi vista como condição para o alcance da equidade e integralidade do
acesso, demandando tratar questões federativas, uma vez que tais redes
regionais extrapolariam os limites territoriais dos municípios.
O estabelecimento de pactos de acesso entre municípios, sob a
coordenação dos governos estaduais, tornou-se, portanto, a alternativa central
para a garantia dos objetivos finalísticos do SUS, independente do município
de residência do cidadão, o que passou a requerer um esforço de construção
normativa de regras que viessem a regulá-los. O Pacto da Saúde, vigente de
2006 a 2011, registra um momento dessa construção. Observa-se que o
Ministério da Saúde trata o processo de transição do instrumento Pacto pela
Saúde para o Contrato Organizativo de Ação Publica como um “processo de
aprimoramento” muito bem ilustrado pela Figura 1:

28
Depreende-se da figura acima que o Termo de Compromisso de
Gestão (TCG) segue um modelo padronizado composto de seis cláusulas
(objeto, atribuições e responsabilidades sanitárias dos Estados, objetivos e
metas prioritárias dos Pactos pela Vida e de Gestão, indicadores de
monitoramento e avaliação dos pactos pela Vida, em Defesa do SUS e de
Gestão, revisão e publicação) e os seguintes anexos:

➢ Protocolo de Cooperação entre Entes Públicos


(PCEP),

➢ Termo de Limite Financeiro Global (TLFG),

➢ Declaração de Comando Único (DCU).

O Contrato Organizativo por sua vez, de acordo com suas diretrizes


gerais, é consubstanciado a partir das decisões nacionais dos entes federativos
na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e os consensos referendados na
Comissão Intergestores Bipartite (CIB), devendo suas regras de
operacionalização durante a execução serem discutidas na Comissão
Intergestores Regional (CIR) e é organizado em quatro partes , como bem ilustra
a figura abaixo (Brasil, 2012):

29
Segundo Sandro Terabe, coordenador geral de contratualização do
Ministério da Saúde, defende que,

“Entre as dificuldades estão a capacidade, a forma de


condução desse processo e a mudança de cultura (...) o
COAP é o produto do processo de planejamento integrado
realizado na região. Ele facilita a organização do sistema,
mas não resolve todos os problemas. Quem faz a mudança
são as pessoas que estão lá dentro, essa é uma ferramenta
para tentar garantir acesso com qualidade em tempo
adequado às necessidades de saúde dos cidadãos e
oferecer maior segurança jurídica frente aos compromissos
assumidos entre os entes federativos. O COAP é a
oportunidade para construção de um a nova gestão
sistêmica do SUS.”

Santos L., (2002, p.143), por sua vez, ao destacar a importância da


política de contratualização, podendo ser considerada como a ligação entre os
entes descentralizados, o poder central e a sociedade, adverte: No SUS,
fundado na descentralização com regionalização, na interdependência dos entes
nas redes de serviços, o contrato é um vínculo importante entre os entes para
definição de responsabilidades. Há atividades que são comuns aos entes
públicos, mas que não se realizam a contento se praticadas isoladamente,
havendo necessidade de conjugação dessas competências.
A contratação clássica, que deriva os chamados contratos comutativos,
pressupõe a existência de um acordo de vontades entre duas pessoas com
interesses distintos, sendo o contrato a via jurídica para a troca de bens
econômicos entre os contratantes, exaurindo-se o vínculo obrigacional entre as
partes a partir da execução da prestação (ASCARELLI apud JUSTEN FILHO,
2005).
Desse modo, o regime jurídico das contratações públicas difere do regime
jurídico clássico do Direito Civil. Àquele é atribuída natureza vinculante, não se
tratando de mera questão política, de modo que, exemplifica Justen Filho (2005,
p. 52) “se a União se vincular perante um Estado, assumindo o dever de realizar
determinadas transferências voluntárias de recursos, existirá um dever jurídico
cujo adimplemento será protegido pelo Direito”. No que tange a validade desses
contratos administrativos o referido autor lista os seguintes requisitos:
➢ Respeito às exigências constitucionais e legais pertinentes,
buscando limitar as contratações dessa ordem a se evitar,
consequentemente, o abuso do direito;

30
➢ Observância ao Princípio da Legalidade, a fim de reforçar o
caráter indispensável da autorização legislativa para a
execução dos atos.

No entendimento de Santos L. (2002, p.145):


Na área da saúde, o contrato organizativo veste como uma
luva para a organização dos sistemas regionais. Pois são
contratos que unem os entes federativos, ao mesmo tempo
em que se definem as responsabilidades e obrigações de
cada um na rede de serviços que deverá prover a saúde da
comunidade. Trata-se de um documento no qual os entes se
reúnem em favor da organização de seus serviços para o
atendimento da população, a grande credora das obrigações
ali definidas.

As competências na área da saúde pública não são claras nem precisas,


por esse motivo os contratos administrativos seriam de grande valia para o
estabelecimento das responsabilidades de cada ente federativo (SANTOS L.,
2002). Dentre algumas características do contrato de ação pública na área da
saúde são: garantia da integralidade da assistência à saúde; horizontalidade nas
negociações; interdependência dos entes contratantes; solidariedade sistêmica;
função organizativa; referenciamentos do cidadão na rede e compensação
financeira ao ente federativo responsável; multilateralidade de contratantes; e
igualdade jurídica das partes (SANTOS 2002).
De acordo Santos (2002, p.147), no caso do SUS, não há outra forma de
se organizar um sistema polissêmico, um sistema em rede que perpassa
diversos territórios municipais e exige coparticipação dos entes. O contrato
organizativo será um elemento essencial para unir os entes em torno da
execução de uma função pública comum a todos, interdependentes e ao mesmo
tempo descentralizadas.
Ao definir o contrato organizativo na área da saúde, Santos (2002, p.148)
o coloca como “(...) mais que um programa, a própria rede de atenção à saúde,
o próprio sistema de saúde, que deve ser organizado em rede. Organiza-se, na
realidade, o sistema de saúde regional; é o meio pelo qual se regulam as
relações de interdependência dos entes federativos no SUS”.
Outra questão que merece reflexão é se os contratos organizativos
previstos pelo Decreto nº 7508/2011 teriam natureza vinculativa para os entes
federativos. Jean Keiji Uema, consultor jurídico do Ministério da Saúde, em

31
parecer sobre minuta do Decreto em questão, sustenta que o SUS é matéria de
competência comum dos entes federados (art. 23, II, da CF) e abarca recursos
e ações de todos os entes, devendo, portanto, atuarem obrigatoriamente de
maneira harmônica e integrada. [...] nem se pode dizer que o acordo necessário
entre os entes está implícito ou subentendido nas normas da lei, eis que é uma
obrigação que salta diretamente dos textos dos dispositivos para os olhos de
quem interpreta.
Cabe referência à regra verba legis cum effectu sunt accipienda segundo
a qual não há palavras inúteis ou ociosas na lei, devendo o intérprete garantir-
lhes a eficácia e o resultado [...] (UEMA,2011, p. 6).

O PACTO PELA VIDA

O Pacto pela Vida está constituído por um conjunto de compromissos


sanitários, expressos em objetivos de processos e resultados e derivados da
análise da situação de saúde do País e das prioridades definidas pelos governos
federal, estaduais e municipais.
Significa uma ação prioritária no campo da saúde que deverá ser
executada com foco em resultados e com a explicitação inequívoca dos
compromissos orçamentários e financeiros para o alcance desses resultados.

O PACTO EM DEFESA DO SUS

O Pacto em Defesa do SUS envolve ações concretas e articuladas pelas


três instâncias federativas no sentido de reforçar o SUS como política de Estado
mais do que política de governos; e de defender, vigorosamente, os princípios
basilares dessa política pública, inscritos na Constituição Federal.
A concretização desse Pacto passa por um movimento de repolitização
da saúde, com uma clara estratégia de mobilização social envolvendo o conjunto
da sociedade brasileira, extrapolando os limites do setor e vinculada ao processo
de instituição da saúde como direito de cidadania, tendo o financiamento público
da saúde como um dos pontos centrais.
As prioridades do Pacto em Defesa do SUS são:

32
➢ Implementar um projeto permanente de mobilização social com a
finalidade de:
• Mostrar a saúde como direito de cidadania e o SUS como sistema
público universal garantidor desses direitos;
• Alcançar, no curto prazo, a regulamentação da Emenda
Constitucional nº 29, pelo Congresso Nacional;
• Garantir, no longo prazo, o incremento dos recursos
orçamentários e financeiros para a saúde.
• Aprovar o orçamento do SUS, composto pelos orçamentos das
três esferas de gestão, explicitando o compromisso de cada uma
delas.
➢ Elaborar e divulgar a carta dos direitos dos usuários do sus.

O PACTO DE GESTÃO DO SUS

O Pacto de Gestão estabelece as responsabilidades claras de cada ente


federado de forma a diminuir as competências concorrentes e a tornar mais claro
quem deve fazer o quê, contribuindo, assim, para o fortalecimento da gestão
compartilhada e solidária do SUS.
Esse Pacto parte de uma constatação indiscutível: o Brasil é um país
continental e com muitas diferenças e iniqüidades regionais. Mais do que definir
diretrizes nacionais é necessário avançar na regionalização e descentralização
do SUS, a partir de uma unidade de princípios e uma diversidade operativa que
respeite as singularidades regionais.
Esse Pacto radicaliza a descentralização de atribuições do Ministério da
Saúde para os estados e para os municípios, promovendo um choque de
descentralização, acompanhado da desburocratização dos processos
normativos. Reforça a territorialização da saúde como base para organização
dos sistemas, estruturando as regiões sanitárias e instituindo colegiados de
gestão regional.
Reitera a importância da participação e do controle social com o
compromisso de apoio à sua qualificação.

33
Explicita as diretrizes para o sistema de financiamento público tripartite:
busca critérios de alocação eqüitativa dos recursos; reforça os mecanismos de
transferência fundo a fundo entre gestores; integra em grandes blocos o
financiamento federal e estabelece relações contratuais entre os entes
federativos.
As prioridades do Pacto de Gestão são:
➢ DEFINIR DE FORMA INEQUÍVOCA A RESPONSABILIDADE
SANITÁRIA DE CADA INSTÂNCIA GESTORA DO SUS: federal, estadual
e municipal, superando o atual processo de habilitação.
➢ ESTABELECER AS DIRETRIZES PARA A GESTÃO DO SUS, com
ênfase na Descentralização; Regionalização; Financiamento;
Programação Pactuada e Integrada; Regulação; Participação e Controle
Social; Planejamento; Gestão do Trabalho e Educação na Saúde.

Este PACTO PELA SAÚDE 2006 aprovado pelos gestores do SUS na


reunião da Comissão Intergestores Tripartite do dia 26 de janeiro de 2006, é
abaixo assinado pelo Ministro da Saúde, o Presidente do Conselho Nacional de
Secretários de Saúde - CONASS e o Presidente do Conselho Nacional de
Secretarias Municipais de Saúde - CONASEMS e será operacionalizado por
meio do documento de Diretrizes Operacionais do Pacto pela Saúde 2006.

DILEMAS FEDERATIVOS E RELAÇÕES FEDERATIVAS NO SUS

A despeito de divergências conceituais, o ponto comum entre as


diversas definições sobre federalismo é que o mesmo organiza o Estado em
dois ou mais níveis de governo, que têm autoridade formal sobre o mesmo
espaço territorial e cidadãos. Ao garantir, constitucionalmente, espaços de
atuação própria a cada instância de governo, seria de se esperar que
promovesse algum nível de dispersão de poderes.
Ele envolveria um pacto que supõe, ao mesmo tempo, cooperação e
reciprocidade entre os entes federados, bem como a cessão parcial de

34
autonomia das partes constituintes a fim de obter um bem coletivo comum.
Tanto as formas e conteúdo do espaço compartilhado entre entes federados
quanto seu grau de autonomia varia significativamente entre diferentes
federações.
Mas tal compartilhamento requer a solução de problemas da
coordenação entre níveis de governo, eventualmente sob constrangimentos
constitucionais e legais e sob instrumentos de regulação manejados pelo nível
nacional no sentido de induzir cooperação, porém sem ferir a autonomia e os
direitos dos governos subnacionais. Seja como for, a cooperação dos entes
federados para a realização de objetivos coletivos dependerá de incentivos
institucionais, mas também da natureza dos problemas que se apresentam nas
diferentes áreas governamentais.
De sua parte, o federalismo brasileiro incorporou atributos que sugerem
alto grau de descentralização política, fiscal e de competências,
particularmente para a execução das políticas sociais pelos municípios. Mas,
ao conferir ampla autoridade legislativa à União e limitadas oportunidades de
veto aos governos subnacionais, a Constituição brasileira permitiu à primeira
exercer poderosa influência sobre a formação da agenda e a formulação das
políticas sociais. Para tanto, atuou decisivamente na formatação de legislação
específica para cada área governamental, assim como passou a exercer uma
regulação federal sobre o modo de execução das políticas descentralizadas.
Ao concentrar maior volume de arrecadação de receitas, a União se
valeu, ainda, de transferências condicionadas para governos subnacionais
como incentivo para seu alinhamento às prioridades da agenda federal. Tal
alinhamento viabilizou a superação dos problemas de coordenação e a
construção de padrões mais homogêneos de bens e serviços a serem providos
sob as políticas públicas.
No caso da política de saúde, a exigência de inter-relação entre os entes
federados, dado o elevado nível de externalidades de caráter vertical ou
horizontal, produzidas a partir de escolhas dos gestores públicos, é ainda maior
que nas outras áreas. Neste sentido, o SUS foi criado sob uma clara concepção
de cooperação entre as três esferas de governo, transferindo
responsabilidades para governos subnacionais e buscando superar relações

35
competitivas e predatórias, tanto entre entes da mesma esfera de governo
quanto de esferas distintas.
A coordenação federativa tem se sustentado por uma combinação de
mecanismos, incluindo constrangimentos constitucionais e legais – atribuições
estabelecidas na Lei 8.080/90 e 8.142/90, ou obrigações de cada esfera no
financiamento nos termos da Emenda Constitucional 29/2000 e Lei
Complementar 141/2012 –, bem como transferências condicionadas de
recursos para estados e municípios, que ampliaram o papel indutor e regulador
do Executivo Federal a partir da edição de Normas Operacionais Básicas.
De outro lado, o recurso às portarias ministeriais tem sido um valioso,
senão o principal, instrumento de coordenação das ações nacionais de saúde,
estabelecendo um arranjo no qual o Governo Federal ocupa posição central,
detendo o poder de agenda e exercendo maior influência sobre processos
decisórios que, especialmente por meio da Comissão Intergestores Tripartite,
afetaram o formato da cooperação e a destinação dos recursos transferidos,
enquanto os municípios se converteram em executores e gestores diretos dos
serviços que compõem a atenção à saúde.
Neste contexto, a construção de sistemas regionalizados de atenção à
saúde foi vista como condição para o alcance da equidade e integralidade do
acesso, demandando tratar questões federativas, uma vez que tais redes
regionais extrapolariam os limites territoriais dos municípios.
O estabelecimento de pactos de acesso entre municípios, sob a
coordenação dos governos estaduais, tornou-se, portanto, a alternativa central
para a garantia dos objetivos finalísticos do SUS, independente do município
de residência do cidadão, o que passou a requerer um esforço de construção
normativa de regras que viessem a regulá-los. O Pacto da Saúde, vigente de
2006 a 2011, registra um momento dessa construção.

METODOLOGIA

Para o objetivo de analisar o processo de formulação e implementação


do Pacto a partir de atores estratégicos envolvidos, optou-se por um estudo
qualitativo a fim de melhor captar as nuances do processo de discussão e

36
negociação entre os mesmos, ainda pouco conhecidas na literatura. Entrevistas
semiestruturadas foram realizadas entre agosto a dezembro de 2013, num total
de oito gestores ou consultores na área da saúde que participaram do processo
de formulação ou implementação do Pacto pela Saúde, enquanto representantes
do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS); do Conselho
Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) ou do Ministério da
Saúde (MS) – instituições componentes da CIT, objeto do estudo –, conforme
relação abaixo.
Foram complementadas pela análise das atas de reuniões da CIT,
realizadas entre 2004 e 2012, tendo sido o critério de seleção das atas a menção
ao Pacto pela Saúde ou às dimensões que o compõem, sendo excluídas aquelas
nas quais o tema não era mencionado
Os conteúdos das entrevistas foram classificados em quatro categorias
centrais, eleitas a partir de desenvolvimentos recentes da literatura brasileira
sobre federalismo, a fim de orientar o tipo de informação a ser coletada e
analisada:
• o papel de first mover;

• o controle sobre a agenda de discussão;

• a influência na formulação ou desenho;

• e no processo de implementação do Pacto.

A discussão se beneficiou de categorias da abordagem institucionalista


aplicadas à análise de políticas públicas – em especial aquelas relacionadas ao
comportamento estratégico dos atores diante da antecipação de efeitos
distributivos, entre si, no processo de construção de regras institucionais –
apoiadas na discussão sobre o federalismo, a coordenação e a cooperação
intergovernamental. As subseções seguintes expressam a evolução do processo
de construção institucional do Pacto.

37
CRÍTICAS ÀS NORMAS OPERACIONAIS E
DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA

A discussão de um novo pacto intergovernamental para o


compartilhamento da gestão em saúde entre as três esferas de governo iniciou-
se em 2003, na gestão do Ministro Humberto Costa apoiada, sobretudo, na
crítica à Norma Operacional de Assistência à Saúde - NOAS 01/2002. Dentre os
principais argumentos apontados, à época, destacam-se a crítica ao seu
desenho excessivamente normativo e rígido, que incluía, por exemplo, o caráter
unicêntrico dos módulos assistenciais, menor unidade territorial da região de
saúde; e o excessivo detalhamento dos procedimentos para formatação das
regiões de saúde nos estados.
Mas, somente em agosto de 2004, foi realizada na CIT a 1° Oficina
Tripartite, que marcaria o início das discussões sobre o novo pacto para a
regionalização da atenção à saúde, incluindo revisão de seus instrumentos de
planejamento, gestão e regulação.
Nesse primeiro momento, o foco recaiu sobre aspectos relacionados à
gestão descentralizada, não incluindo metas sanitárias ou compromissos
políticos que, mais tarde, compuseram o Pacto.
A agenda orientava-se para a formulação do desenho de um novo “Pacto
de Gestão”, conforme proposição que circulava entre CONASS, CONASEMS e
MS. Era seu objetivo alterar a lógica na articulação das esferas de governo na
gestão do sistema, requalificando a descentralização, regionalização e o
financiamento, bem como revisando o papel das normas ministeriais na
orientação da gestão do SUS, como vinha ocorrendo desde a NOB 01/199316.
A crítica mais contundente ao modelo normativo e indutório adotado pelo MS na
gestão da política de saúde, com destaque para o caráter técnico-processual e
adoção de diretrizes e procedimentos excessivamente detalhados que
desconsideravam as particularidades e iniquidades regionais, vinha do
CONASEMS.

38
A partir de 2003, foram intensificados os questionamentos dos secretários
municipais de saúde sobre o engessamento da gestão municipal, a partir das
restrições produzidas por normas federais, somadas ao avanço tímido do
processo de regionalização.

Tal avaliação era compartilhada pelo CONASS, que criticava a adesão


cartorial ao processo de regionalização sob as normas vigentes, com pouca
ênfase na “solidariedade compartilhada entre os três entes federativos” na
gestão do território. A chamada “regionalização solidária”, então defendida, não
seria, nestes termos, a negação da municipalização, mas sua superação sob as
novas condições. As críticas do CONASS e do CONASEMS focavam outros
aspectos, embora relacionados. Para o primeiro, a dificuldade de articulação das
redes regionais decorreria de dois fatores: a forma de municipalização da gestão
da saúde, que fragmentou muito o sistema sob a indução do MS, por meio de
repasses financeiros; e a herança do Instituto Nacional de Assistência Médica

39
da Previdência Social - INAMPS, cuja rede hospitalar nunca se integrou, de fato,
às redes de atenção básica.
Para o CONASEMS, a persistência de obstáculos estruturais e
conjunturais teria feito com que a descentralização se constituísse em algo
perverso para os municípios, em razão das grandes amarras burocráticas que
dificultavam a gestão do trabalho, dos processos de compras, da contratação de
serviços e da realização de investimentos. Essa situação entraria em conflito
com a solidariedade e com a integralidade, fazendo de um instrumento como a
Programação Pactuada e Integrada – PPI - um mero espaço declarativo, sem
clara responsabilidade sanitária.
Em síntese, as representações nacionais de estados e municípios
defendiam a desburocratização dos processos normativos, a superação da
escassez crônica de recursos, a definição das responsabilidades sanitárias e a
reversão das iniquidades de acesso entre municípios e regiões.
Um ponto fundamental para o novo Pacto seria a superação da gestão
por habilitação em favor de uma proposta de pactuação de compromissos
sanitários e financiamento solidário entre as esferas de governo. Entendia-se,
cada vez mais, que os conflitos na organização dos sistemas regionais de saúde
previstos na NOAS não se restringiam apenas à fase de formulação, mas
persistiam nas dificuldades para promover a articulação entre os entes
federativos, implantar instrumentos de cooperação e estabelecer regiões de
saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Portanto, determinado grupo político à frente da gestão estadual -


viabilizou grandes avanços como, por exemplo, a possibilidade de maior
flexibilidade no uso dos recursos, a oportunidade para o processo de negociação
e construção de consensos, a criação dos espaços interfederativos de
negociação, os Colegiados de Gestão Regionais, a reinserção do protagonismo
dos municípios nos processos decisórios, a valorização da regionalização ao
possibilitar relações interfederativas mais horizontalizadas, a viabilidade de se
construir um planejamento com vistas à assegurar um padrão mínimo de

40
integralidade e uma mudança na visão das responsabilidades dos entes na
organização das ações de saúde.
Entretanto, enfrentou uma série de limitações, como fragilidade do
instrumento, a utilização de forma cartorial, a dificuldade de tornar consensual o
desenho das regiões de saúde retardando a instituição dos Colegiados de
Gestão, que se revelaram espaços com baixa governabilidade, a descrença dos
gestores no processo de pactuação, reforçado pelo fato da PPI de 2010 ter tido
um caráter meramente redistributivo de recursos, acentuando ainda mais as
disputas entre os atores e, por fim, o problema sistêmico do subfinanciamento
dos recursos da saúde.
Porém, revelou-se um caminho para superação dos modelos anteriores
(descentralização tutelada), mas a determinada altura do processo de
implantação apresentou um esgotamento frente aos problemas já elencados. Eis
que surge o COAP, anunciado pelo Ministério da Saúde como um instrumento
de “aprimoramento” e não uma mera “substituição” do Pacto de Gestão.
Importante registrar que incialmente os estudos o processo de
implantação do

COAP, movida pelo desejo de entender a razão do “insucesso” do


instrumento anterior. Por outro lado, permitiu identificar uma série de apostas e
desafios em torno do COAP - tal como encontram na literatura acadêmica
referente ao período de inauguração da política do Pacto pela Saúde – que
somente poderão ser confirmadas ou não após sua efetiva implantação.
Ademais, no sentido de que a utilização de contratos organizativos de
ação pública possam efetivamente contribuir para a consolidação do SUS,
convém apontar alguns desafios a serem enfrentados, como a necessidade de
estruturação das redes de atenção à saúde, imprescindíveis ao processo de
construção do COAP; a articulação com o COSEMS e convencimento técnico,
jurídico e político dos gestores a assinarem o contrato plurilateral; o
subfinanciamento dos recursos para a saúde; o apoio fragmentado do Ministério
da Saúde; o modelo de atenção médico centrado; a necessidade de apoio
técnico e financeiro aos Estados e Municípios; o respeito às singularidades de
cada Estado e a definição de qual espaço se dará o processo de
acompanhamento e avaliação e controle das metas previstas pelo contrato.

41
Diante da complexidade e diversidades de desafios colocados pelo SUS
é imprescindível que se tenha uma grande oferta de instrumentos de gestão,
disponíveis para serem utilizados de acordo com a conveniência de cada
cenário, de cada problema. Consideramos que o COAP é mais um desses
instrumentos, ou seja, um recurso instrumental para a gestão, que, no caso,
pode vir a viabilizar avanços importantes como a segurança jurídica
oportunizada pela natureza jurídica do COAP, aperfeiçoamento da gestão
financeira a partir da otimização de recursos e do processo de
acompanhamento, avaliação e fiscalização das ações e compromissos
assumidos pelos entes signatários.
Não resta dúvida acerca da necessidade de uma articulação federativa
sólida e harmônica entre as três esferas de gestão do SUS. No entanto, a
experiência tem mostrado que é imprescindível a implicação dos atores/gestores
nos processos de pactuação/contratualização para garantirmos a
responsabilização sanitária, não bastando tão somente a existência de um
instrumento jurídico. O contrato não terá o condão de resolver problemas
históricos do SUS como, por exemplo, o subfinanciamento, a disputa técnica e
política do modelo de atenção à saúde, que se almeja implantar a necessidade
de consenso e cooperação para o sucesso na execução de políticas de saúde,
dentre outros.
Mas, abre um terreno para se incorporar na gestão da saúde pública
técnicas gerenciais já utilizadas largamente em outros países e que tem
apresentado resultados positivos. Em última análise, podemos dizer que a
utilização de políticas de pactuação e contratualização se revelam iniciativas que
permitem o aperfeiçoamento do SUS.
A utilização de mecanismos que estimulem o diálogo e a articulação entre
os gestores possibilita a gestão pública da saúde a acompanhar a tendência
mundial da gestão por resultados, bem como a ampliação da responsabilização
solidária. Convém ressaltarmos, ainda, que o estudo analisou a fase inicial da
implementação da política, no entanto, durante o curso do processo de
implementação é provável que novas necessidades sejam detectadas. Ao
mesmo tempo, as já colocadas serão revistas, em um processo contínuo de
alimentação e articulação entre as etapas do ciclo da política, permitindo
reformulações e adaptações constantes às transformações da realidade.

42
Por fim, como desdobramento e/ou aprofundamento do estudo surge uma
gama de possibilidades de pesquisas que tenham a contratualização de
responsabilidades sanitárias no SUS como objeto, contando com o
desenvolvimento de estudos que tenham como foco o acompanhamento da
implantação dessa política, com vistas a uma avaliação dos seus
efeitos/impactos para posteriormente comparam com os avanços e limites da
política anterior

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