Você está na página 1de 20

ABORDAGEM PSICODINÂMICA DO PACIENTE

P S I C O PAT O L O G I A
BORDERLINE
BORDERLINE
• Não se enquadra nos limites genético-dinâmicos (teoria estrutural).

• Diferenciariam das categorias das neuroses e das psicoses.

• Tratamento pode exigir tal reestruturação do setting habitual – como aumento da atividade do
terapeuta, estabelecimento de limites, intervenções de apoio, uso de fármacos, hospitalizações,
entrevistas com cônjuges e familiares, entre outras ações – que o enquadre terapêutico parece
se transformar em qualquer coisa que não o normalmente conhecido pela tradição psicanalítica
ou pelo atendimento psiquiátrico convencional.
• refere-se ao status psicodinâmico de pacientes tanto na fronteira entre a neurose e a psicose
quanto, do ponto de vista terapêutico, na fronteira da analisabilidade com a não analisabilidade.

• 10% cometiam suicídio,80% se engajavam em graves condutas automutilantes, e de 70 a 80%


apresentavam diversos transtornos do humor associados.

• O termo “limítrofe” apareceu no fim do século XIX, com o objetivo de diferenciar casos mais
leves de psicose, de prognóstico melhor, de formas mais graves, como a esquizofrenia. A
fronteira com a esquizofrenia foi, portanto, o viés dominante do diagnóstico, tanto psiquiátrico
como psicanalítico.
As características básicas do transtorno da personalidade
borderline são:

Padrão geral de instabilidade nos relacionamentos interpessoais, nas manifestações afetivas e


na própria autoimagem, associado a acentuada impulsividade, cujo início pode estar presente
desde a infância e a adolescência, mas que costuma ser mais manifesto no início da vida adulta.

Para o diagnóstico de TPB, o DSM exige que, pelo menos, cinco sintomas referidos nos critérios
diagnósticos estejam presentes.
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA O TRANSTORNO DA PERSONALIDADE
BORDERLINE DE ACORDO COM O DSM-5

•Esforços frenéticos para evitar abandonos reais ou imaginários.

•Padrão instável e intenso de relacionamentos interpessoais, alternando extremos de idealização


e desvalorização.

•Distúrbio de identidade – autoimagem e percepção de si mesmo persistentemente instáveis.

•Impulsividade em pelo menos duas áreas da vida potencialmente autodestrutivas: gastos


exagerados, sexualidade promíscua, abusos de substâncias, anorexia/bulimia.

•Comportamentos suicidas ou automutilações recorrentes.


...
•Instabilidade afetiva decorrente de acentuada reatividade do humor: intensos episódios de
irritabilidade ou ansiedade, em geral durando horas, raramente mais que alguns dias.

•Sentimentos crônicos de vazio.

•Raiva intensa e inapropriada ou dificuldades em controlar a raiva: frequentes manifestações de


irritabilidade, raiva constante, brigas físicas recorrentes.

•Ideação paranoide ou graves sintomas dissociativos transitórios, associados a estresses


Organização da personalidade.
A organização BORDERLINE se caracteriza por:

• Uma síndrome de difusão da identidade; predomínio do uso de mecanismos de defesa primitivos


manutenção do teste de realidade

De modo diferente, a organização neurótica da personalidade, ao lado do teste de realidade estável,


tem um senso de identidade mais integrado, e nela predominam mecanismos de defesa mais
maduros.

Já na organização psicótica, encontram-se extensas alterações na identidade, com domínio de


mecanismos primitivos intensos e grave comprometimento do teste de realidade.
difusão da identidade
• Constituída pela fragmentação das representações do eu e dos outros, internalizadas ao longo
do desenvolvimento.

• Falta de coerência e consistência nos próprios valores, nas motivações e nas interações pes-
soais.

• Incapacidade de se dar conta das motivações e dos estados mentais dos outros.

• Desenvolve relações caóticas, dificuldades interpessoais crônicas e falta de empatia para com
os demais.
Mecanismos primitivos de defesa
negação, idealização, identificação projetiva, controle onipotente), cisão.

Ao contrário das defesas neuróticas (isolamento, anulação, racionalização, formação reativa),


que são organizados em torno da repressão.

Em vez de protegerem o ego por meio da repressão de derivados instintivos inaceitáveis,


tentam manter separadas – ou cindidas – experiências contraditórias de si mesmos e dos outros:
enquanto esses estados mentais antagônicos estiverem dissociados uns dos outros, o ego se vê
poupado de conflitos diretos entre eles.
A cisão dos objetos internos no borderline é a divisão dos objetos externos em totalmente bons e
totalmente maus, com mudanças súbitas de uma das categorias para a outra.

A idealização e a desvalorização primitivas acentuam a cisão, aumentando patologicamente a


qualidade de “bondade” ou “maldade” dos objetos.

A identificação projetiva é uma forma de projeção complexa. Nela, o paciente continua a vivenciar as
relações de objeto projetadas, teme a pessoa sobre a qual as projetou e sente necessidade de
controlá-la.

O paciente tenta induzir a outra pessoa a funcionar de acordo com as partes projetadas.

A presença generalizada das identificações projetivas nos pacientes borderline torna essencial aos
terapeutas manterem-se atentos à contratransferência, a fim de captarem parte dos aspectos
dissociados, negados e projetados do mundo interno do paciente.
Negação
Se expressa pela recusa do impacto de experimentar.

O paciente se dá conta da existência de pensamentos, emoções e percepções simultaneamente


antagônicos, sem que isso, no entanto, perturbe seus sentimentos presentes. Mostra-se
indiferente às contradições, ainda que cognitivamente ciente delas. É a negação afetiva de um
desses estados em relação ao outro que, ao que parece, permite a ele tolerar essa coexistência
sem maior ansiedade.
Onipotência e Desvalorização
•São subprodutos das operações de cisão das representações do eu e dos objetos.

•Elas se expressam pela ativação de estados do ego de um eu grandioso relacionado a imagens


emocionalmente degradadas e desprezadas dos outros.

•São bastante proeminentes na personalidade narcisista, de modo que se tornam manifestas na


descrição que o paciente faz dos outros e pela atitude que adota em relação ao terapeuta.
Tratamento e Estratégias Terapêuticas.
O objetivo da psicoterapia é desenvolver, mediante interpretação, maior integração das
representações cindidas do próprio eu e dos objetos, esperando mudanças integrativas na
personalidade do paciente.

No caso de déficits interpessoais, o objetivo é permitir, pela provisão de um adequado holding e


validação empática das carências do paciente, que se introjetem objetos bons e tranquilizadores
inexistentes, devido a sua ausência real na infância.
•o principal conflito: dificuldade no manejo da agressão, de origem inata, exacerbada pela predominância
de experiências adversas no ambiente precoce.

•incapacidade primária de sintetizar introjetos negativos e positivos (pelo perigo de os bons serem
destruídos pelos maus) em representações mentais coerentes do próprio eu e dos objetos.

• Como a ansiedade resultante da síntese seria intolerável, a criança ativa mecanismos primitivos de
splitting (DIVISÃO) para evitar uma catástrofe interna e preservar a sobrevivência da “mãe boa”
internalizada.

•A manutenção separada desses estados mentais cindidos demanda grande atividade e gasto de energia por
parte do ego, contribuindo para seu enfraquecimento, sua vulnerabilidade no teste de realidade e para a
tendência a recair na forma primária de pensamento.
Terapeuta
•Precisa ficar atento ao surgimento da transferência negativa, inevitável pelo excesso inato da
agressão, e interpretá-la de forma vigorosa assim que for identificada, bem como confrontar os
estados mentais contraditórios com os quais o paciente se apresenta. Ele admite que isso só é
possível quando duas condições forem estabelecidas:

•que haja um setting bem estruturado por um contrato capaz de preservá-lo das atuações do
paciente.

•que as percepções distorcidas das interpretações sejam examinadas e esclarecidas no momento


em que ocorrerem, para que possam ser integradas imediatamente.


Psicoterapias efetivas com o paciente
borderline:
•construção de um setting estável e estruturado;
• atividade maior do terapeuta;
•tolerância das transferências negativas;
•transformação dos comportamentos autodestrutivos em não gratificantes;
•limites para as atuações;
•estabelecimento de conexões entre as ações e os sentimentos do paciente com a situação
presente;
•foco das intervenções no aqui e agora; monitoramento cuidadoso da contratransferência;
Prioridades a serem abordadas com
pacientes Borderline
•Ameaças de suicídio ou homicídio;

•Ameaças à continuidade do tratamento;

•Desonestidade ou omissão deliberada de informações nas sessões;

•Quebras contratuais;

• Atuações dentro das sessões (gritar, jogar objetos, recusar-se a sair no fim da sessão);

•Atuações (não letais) entre as sessões;

•Preenchimento das sessões com temas triviais e despidos de afeto;


Ilustração Clínica
Rosa é uma dona de casa de 47 anos, com traços histéricos, comportamentos conflituosos com a família e ideação suicida crônica. Há
quatro anos, apresenta sintomas compatíveis com transtorno da personalidade bipolar tipo II e é medicada com estabilizadores do
humor, sem maiores melhoras no relacionamento caótico com a família, bem como na sensação de infelicidade e na vontade de morrer.

Filha de pai branco (que se suicidou) e de mãe negra, foi encaminhada para adoção quando ainda era pequena e teve uma infância
tumultuada. Mulata clara, foi adotada por uma mulher branca que a registrou como filha. Desde pequena, desprezou as próprias origens
e evitou qualquer contato com a mãe biológica. Ao entrar na puberdade, seu cabelo começou a encarapinhar. A “mãe branca” repudiou
o fato e, desde os 11 anos de idade, obrigou-a a usar uma peruca loira, de cabelos lisos, que a paciente nunca mais tirou (a não ser para
trocar por uma nova). Casou-se aos 18 anos e teve dois filhos, porém nem o marido nem os filhos jamais a vi-ram sem a peruca; usava a
justificativa de que tinha uma doença congênita que a deixara calva.
Durante a internação, a paciente começou a apresentar sintomas dissociativos inesperados, em que “outra personalidade”

sua se comportava de forma arrogante, agressiva e ameaçadora, diferente do seu “eu normal”, cooperativo e dócil. Essas

súbitas mudanças de personalidade passaram a provocar ansiedade crescente na equipe que a atendia. Durante uma

entrevista de avaliação, a paciente, que até então falava calmamente, deu um soco no braço de sua cadeira e, com voz grossa

e alta, passou a vociferar contra os presentes, gritando que iria matá-los, que eram desprezíveis e que mereciam ser

eliminados “junto com aquela negrinha fedida”.

O impacto das ameaças, sublinhado pelo soco na cadeira e a voz raivosa, deixou a todos imobilizados e assustados. A partir

do que sentiu, no entanto, o supervisor imaginou que esses podiam ser sentimentos de uma parte cindida da mente da

paciente, uma parte assustada, frágil, carente e confusa quanto à própria identidade – simbolicamente, a parte “carapinha”

não aceita e que precisava ser eliminada –, mantida cronicamente submetida e imobilizada pela parte onipotente, sádica e

controladora (que usava peruca), que não permitia que a outra se manifestasse e se integrasse ao ego da paciente.
Assegurando-se de que a entrevista poderia prosseguir – foi perguntando à paciente se havia
condições de o diálogo continuar ou se preferia interrompê-lo e sair do consultório –, o
supervisor assinalou que, no fundo, ela esperava que a equipe não se assustasse com seus
gritos, que talvez ela estivesse solicitando ajuda para também não se atemorizar com essas
ameaças internas e conseguir retirar sua peruca, a fim de tentar viver uma vida menos dividida.
A agitação da paciente foi se extinguindo, e a entrevista prosseguiu fluente, com sua parte
“normal” reassumindo o controle e relembrando a angústia que foi passar a vida toda se
escondendo de si mesma, da família e dos outros.

Você também pode gostar