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ANA CAROLINA CAMARGO, JÕAO PEDRO FADEL, KARINE


FERNANDA, LETICIA GUIARO, LIDIA NOGUEIRA

ANESTESIA EM FÊMEAS GESTANTES: PEQUENOS E


GRANDES ANIMAIS

Londrina
2022
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Sumário

1. Introdução ........................................................................................................................ 3
2. Caninos e felinos......................................................................................................... .... 4
3. Equinos ............................................................................................................................ 8
4. Ruminantes ..................................................................................................................... 9
5. Conclusão ................................................................................................................... ....13
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Introdução

A fêmea em gestação, independente da espécie, possui diversas alterações


orgânicas e fisiológicas que se constituem em adaptações do organismo à nova condição,
no caso a gestacional. Alterações cardiovasculares, respiratórias, hemodinâmicas, entre
outras, podem comprometer a sua higidez tornando-a uma paciente especial ou de risco ao
ser submetida a um procedimento anestésico. Para se obter de uma maneira satisfatória os
três objetivos básicos da anestesia: hipnose, analgesia e relaxamento muscular, com o
menor risco para a fêmea gestante e seu(s) feto(s), consiste na anestesia balanceada. A
placenta das cadelas é do tipo endotélio corial e é caracterizada por menor espessura em
relação à placenta das vacas e éguas, que é do tipo epitélio corial, portanto, a passagem de
fármacos pela placenta em cadelas é maior (LUZ et al., 2005).
De acordo com Hellyer (1), a depressão fetal e neonatal ocorre em grau variável após
a indução anestésica da mãe, porém esse fator depende do tipo de fármaco usado, a dose
e, o tempo de utilização até a retirada do feto. Segundo Moon et al. (2), há fatores que
determinam o aumento do risco fetal, como cirurgias emergenciais, raças braquicefálicos, o
número de filhotes gerados e os protocolos anestésicos que incluem xilazina e
metoxifluorano. Devido as características físico-químicas de uma grande parte dos agentes
anestésicos, terão correlação com a barreira placentária; levando a uma incerteza da técnica
ou anestésico ideal para todas as abordagens com a fêmea gestante.
As alterações podem ser sofridas em decorrência da gestação são:
• Sistema cardiovascular: essas atingem rapidamente o feto, devido ao fluxo sanguíneo
fetal não ser capaz de autorregular-se e a perfusão sanguínea ser diretamente
proporcional à diferença entre a pressão arterial e a venosa, e inversamente proporcional
à resistência vascular uterina. Aumento do DC e elevação do volume sanguíneo da mãe
para atender a alta demanda; assim, as intercorrências transcirúrgicas como hemorragia,
hipovolemia e hipotensão severa;
• Sistema respiratório: ocorrem principalmente por causa do deslocamento diafragmático
e de órgãos abdominais devido o útero gestante. Devido o menor volume pulmonar, ficam
suscetíveis a atelectasia pulmonar e suscetivelmente ao aumento da frequência
respiratória que, aparece devido a ação da progesterona que leva a um relaxamento da
(3),
musculatura lisa brônquica. Pascoe, Moon afirmam que a hiperventilação materna,
4

devido ao estresse ou incorreta ventilação por pressão positiva pode ocasionar valores
de PaCO2 muito reduzidos, podendo chegar a 22mmHg. Por outro lado, a hiperventilação
iatrogênica em pacientes gestantes pode estar associada ao menor fluxo sanguíneo
umbilical, agravando a possibilidade de efeitos depressores fetais;
• Sistema nervoso central (SNC): a fêmea gestante tem aumento da concentração
sanguínea de progesterona, o que acarreta um efeito sedativo sobre o SNC; com o
aumento da -endorfina circulante, pode haver uma redução do requerimento anestésico
na gestante;
• Sistema gastrointestinal: por ter o deslocamento do estômago, tem-se uma diminuição
da motilidade, além do aumento da pressão intra-abdominal e, ao comprimir as vísceras,
(2).
predispõe a gestante a apresentar refluxo gastroesofágico Sendo assim, a utilização
de agentes antieméticos na pré-anestesia torna-se útil.

Anestesia em cadelas e gatas gestantes


Alguns cuidados com a cadela e gata gestante devem ser tomados ao serem
submetidas à anestesia cirúrgica, alguns deles são a fluidoterapia antes e após a operação
que podem minimizar a hemorragia que venha aparecer durante o procedimento. Outro fator
importante é a posição da mãe na mesa cirúrgica; o decúbito dorsal pode levar a um
desconforto respiratório maior do que a paciente está passando, uma maneira de reverter
esse fator é a inclinação da mesa, deixando a cabeça mais elevada em relação ao restante
do corpo, aliviando a compressão do diafragma pelo útero. Os fármacos utilizados no
procedimento anestésico irão produzir efeito similar no feto, mesmo que em grau reduzido,
(4)
aumentando a morbidade e a mortalidade neonatal.
Na anestesia regional, o uso de fármacos menos depressores poderia ser uma boa
opção, porém, a necessidade de manter imobilidade total da paciente e a inviabilidade de
alguns procedimentos cirúrgicos com o animal acordado dificultam essa técnica como sendo
de protocolo único, assim, mantendo-se a preferência por associações de fármacos e
técnicas de anestesia geral.
A forma mais segura, portanto, de realizar-se um procedimento anestésico na cadela
gestante é a anestesia balanceada, procurando a utilização de doses menores e explorando
(5)
as características mais evidentes e menos deletérias de cada fármaco.
5

• Medicação pré anestésica (MPA)


O uso de sedativos e tranquilizantes na cadela gestante devem apenas serem usados
em real necessidade. Thurmon et al.(6) recomendam seu uso apenas no caso extremo de
ansiedade ou agressividade, objetivando a diminuição do estresse e facilitando o preparo
pré-anestésico. Porém, essa tranquilização pode ocasionar depressão neonatal e redução
do vigor dos filhos ao nascerem.
Matsubara et al. (7) trouxeram em estudo uma diminuição significativa da pressão arterial
em cadelas gestantes que receberam Acepromazina (0,05mg/kg) na MPA, e que perdurou
até o final da anestesia com sevofluorano. A acepromazina por ser um potente bloqueador
dos receptores alfa-adrenérgicos e depressora do centro vasomotor central, contribui para a
hipotensão durante a anestesia geral. Com as observações citadas, a MPA precisa contar
com o uso de opióides, com preferência pelos agonistas-antagonistas tendo como exemplo
o butorfanol, que leva a uma tranquilização e anestesia geral além de, terem mínimos efeitos
sobre os fetos, ou utilizar opioides de ação curta, como o fentanil. Em gatos, os opioides
causam dilatação pupilar e, em alguns casos, excitação. O comportamento maníaco
(excitatório) induzido pelos opioides geralmente só é visto após a administração de altas
doses. Em doses terapêuticas, os opioides causam analgesia e euforia e, em alguns casos,
disforia. Opioides podem ter um efeito bifásico sobre o sistema cardiovascular em gatos. Em
baixas doses, eles podem diminuir a frequência cardíaca e a pressão sanguínea, enquanto
(11)
doses maiores aumentam frequência cardíaca, débito cardíaco e pressão sanguínea.
A única contraindicação de MPA nas fêmeas gestantes é a xilazina, que é
comprovadamente responsável por produzir efeitos depressores no feto, além de aumentar
a pressão e a motilidade uterina. Com essa exceção, não há contraindicações do uso de
MPA, mas desde que sejam respeitadas as doses mínimas efetivas para que não produzam
alterações dos parâmetros de forma intensa.

• Anestésicos dissociativos
O uso de cetamina ou tiletamina na anestesia dissociativa não é recomendada devido ao
aumento do tônus uterino, o que leva a uma diminuição do fluxo sanguíneo, resultando em
hipóxia fetal. Embora seus efeitos sobre o sistema cardiovascular sejam menores
comparados aos efeitos do propofol e do tiopental, a cetamina causa efeitos depressores
(8)
prolongados sobre o filhote. A associação de cetamina-xilazina também pode causar
6

alterações cardiopulmonares como hipotensão, depressão respiratória, apneia etc., assim,


não sendo recomendada.
(9)
Estudos desenvolvidos por Luna et al compararam os efeitos neurológicos e
cardiorrespiratórios nos neonatos nascidos de cesarianas de cadelas que foram submetidas
a diferentes protocolos anestésicos e o uso de clorpromazina na MPA; as fêmeas
anestesiadas com associação de cetamina e midazolam tiveram filhotes mais deprimidos do
que as demais mães anestesiadas com propofol, tiopental ou anestesia epidural.

• Anestesia geral
A anestesia geral é a conduta mais indicada e segura na paciente, pois permite intubação
traqueal, o que controla as vias aéreas da mãe, prevenindo a aspiração de conteúdo
gástrico, permite a manutenção anestésica sempre associada à administração de oxigênio.
Algumas desvantagens existem, como por exemplo, se houver um plano anestésico
superficial e liberação de catecolaminas pela mãe, levaria a uma diminuição da perfusão
uterina causando alterações severas da função cardiopulmonar. O propofol foi associado
com uma melhor resposta fetal quando comparado com o tiopental e o tiamilal; Matsubara
et al.(7) ao utilizarem o propofol em cadelas com 45 dias de gestação na indução, observaram
a diminuição da pressão arterial materna, mas sem depressão fetal; também, o tempo de
(10),
recuperação anestésica na cadela é mais curto. Segundo Gabbas et al. o uso de
acepromazina, propofol e sevofluorano na anestesia geral mostrou-se efetivo e seguro para
a mãe e para os fetos.
A depuração corporal total foi registrada como sendo pelo menos duas vezes mais rápida
em cães do que em gatos. O propofol é metabolizado por meio de glicuronização pela UGT
e hidrólise pela CYP2B6 e CYP2C em seres humanos; em cães, é relatado que o ponto
limitante na taxa de eliminação é a atividade da CYP2B11. 15 Portanto, não está claro,
baseando-se no estudo citado acerca da similaridade de atividade da CYP2B em cães e
gatos, porque os gatos depuram o propofol mais lentamente que os cães; de qualquer
maneira, as diferenças no metabolismo do propofol podem ter consequências clínicas, visto
que tem sido relatado que o aumento na duração da infusão de propofol em gatos prolonga
sua recuperação. (11)
Os anestésicos inalatórios são os mais indicados para a manutenção da anestesia em
pacientes gestantes, mesmo causando efeitos indesejáveis no sistema cardiorrespiratório e
na da perfusão uterina (diminuição). O isofluorano demonstra um menor grau de solubilidade
quando comparado com o halotano, levando a uma recuperação mais rápida da mãe e do
7

(12)
neonato. No estudo de Robbins e Mullen (1994) em que 26 gatas foram submetidas à
cesariana devido a distocia, e a indução da anestesia foi feita com isoflurano, as taxas de
sobrevida neonatal atingiram apenas 41%. Em relação ao sevofluorano, apresenta baixo
coeficiente de solubilidade sangue-gás proporcionando curtos períodos de indução e
recuperação. As alterações hormonais que ocorrem com a gestante diminuem a
necessidade anestésica e a CAM, o que pode predispor a sobredose anestésica.

• Anestesia epidural
Embora exija maior sedação na fêmea, apresenta a vantagem de evitar a exposição dos
fetos aos anestésicos esse tipo de anestesia apresenta baixos índices de mortalidade fetal,
porém, a técnica epidural precisa de treinamento, além dos fármacos produzirem paralisia
dos membros pélvicos da mãe, levando a um pós operatório mais demorado. A lidocaína 2%
na anestesia epidural apresenta menores efeitos depressores nos neonatos nascidos de
mães anestesiadas com a associação de lidocaína e bupivacaína pela via epidural.
Após injeção epidural pode haver bloqueio simpático capaz de provocar hipotensão e
redução da perfusão uteroplacentária, o que pode ser controlado pela aplicação intravenosa
de fluido, para compensar a maior capacidade da rede vascular. Além do fluido IV, pode-se
utilizar vasopressores para o tratamento da hipotensão materna decorrente do bloqueio
simpático. A efedrina pode ser utilizada para tratar a hipotensão materna, pois atua
centralmente e tem mínima propriedade vasopressora arterial, aumenta o tônus venoso e a
pré-carga, podendo, assim, restabelecer o fluxo sanguíneo ao útero.

• Anestesia em animais gestantes para procedimentos não obstétricos

Em animais gestantes que são submetidos a anestesia para procedimentos não


obstétricos, o protocolo anestésico deve ser adaptado às necessidades da mãe e deve ser
assegurada a sobrevivência da ninhada, o que significa que deve ser realizada perfusão e
oxigenação adequadas e evitar a teratogênese. O risco de embriotoxicidade e/ou
teratogênese é maior no início da gestação, antes e durante a organogênese e
principalmente nos primeiros vinte dias de gestação, antes mesmo da implantação do
blastocisto. No entanto, quando a vida do animal prenhe estiver em risco, dependendo da
preferência do proprietário ou do clínico e, por necessidade e independentemente do risco,
a possibilidade de teratogênese ou aborto pode ser descartada. Nas últimas fases da
gravidez não existe esse risco. A maioria dos anestésicos e analgésicos pode causar
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teratogênese em altas doses, mas as doses utilizadas na prática clínica são consideradas
seguras.
Anestesia em éguas gestantes

Em equinos, as principais cirurgias não obstétricas realizadas em éguas gestantes


estão relacionadas às emergências, a anestesia é complicada, pois há uma sobrecarga
fisiológica no organismo materno, como, ocitocina elevada circulante por vasodilatação,
alteração cardiovascular, útero gravídico pressionando o diafragma diminuindo capacidade
funcional e relaxamento tônus do esfíncter esofágico. Isso faz com que reduza pressão
arterial, tenha dificuldade na ventilação e oxigenação e a possibilidade de refluxo e aspiração
do conteúdo gástrico, segundo a classificação da “Sociedade Americana de Anestesiologia”
(ASA) que estabelece o risco anestésico, pacientes gestantes classificam-se como ASA 2
(pacientes com doenças sistêmicas de grau leve) (BIDWELL, L. A., 2013; PASTOR, F. M,
PAGANINI, A. P., 2017). Desta maneira a escolha e administração dos fármacos devem ser
de forma cuidadosa para evitar uma depressão excessiva materno-fetal, e é aconselhado
um breve exame físico, que inclua a auscultação cardíaca e pulmonar para a escolha do
protocolo anestésico adequado (PASTOR, F. M, PAGANINI, A. P., 2017).
A sedação deve ser evitada, pois o sedativo se transfere para o feto e reduz o fluxo
sanguíneo placentário, o que pode comprometer e levar a uma hipoxia fetal (PYNNRETO,
O., 2015; PIMENTEL, G. S., et al 2021). No entanto caso animal esteja com um grau de dor
elevado e/ou agitado o indicado para sedação seria um fármaco da classe alfa-2 agonistas,
assim, o mais recomendado é a xilazina combinada com butorfanol, devido a sua curta
duração, menor chance de hipotensão materna e por ser de fácil reversão (PYNNRETO, O.,
2015; PIMENTEL, G. S., et al 2021).
Já na indução anestésica, o protocolo anestésico mais recomendado cetamina na via
intravenosa, pois o fármaco pode ser removido rapidamente da circulação e efeitos
cardiovasculares discretos, pode ser atribuído uma baixa dose diazepam ou midazolam, pois
o benzodiazepínico pode levar depressão respiratória. O tiopental apresenta a característica
de rápida metabolização, porém quando usado sozinho proporciona uma indução com
agitação e efeitos indesejáveis. Na indução inalatória os fármacos mais indicados são o
isoflurano, sevoflurano e desflurano, pois a indução e a recuperação são mais rápidas
(BIDWELL, L. A., 2013; PASTOR, F. M, PAGANINI, A. P., 2017; PIMENTEL, G. S., et al
2021).
9

A manutenção da anestesia geral pode ser proporcionada pela combinação de


guaifenesina, cetamina e detomidina, para a prevenção cardiovascular materno-fetal. A
guaifenesina sua distribuição fetal é muito pequena, e pela sua atuação como relaxante
muscular de ação central, é muito utilizada na clínica de equinos inclusive a campo. Em
situações em que não há disponibilidade do uso da anestesia inalatória, a associação entre
guaifenesina, cetamina e xilazina pode ser injetada para obtenção dos efeitos desejados,
tem duração de até uma hora, com depressão adequada do sistema nervoso central. A
associação tem estabilidade na pressão arterial da égua e do feto, mas causa bradicardia
de forma similar a do uso de halotano (PASTOR, F. M, PAGANINI, A. P., 2017).
Existem casos em que a anestesia geral se torna impossível, podemos realizar
anestesia locorregional como anestesia paravertebral lombar e/ou anestesia peridural, que
levará a maior qualidade anestésica e analgésica ao procedimento. Nesse caso o anestésico
local mais utilizado é a lidocaína a 2%, no entanto, associação de ropivacaina e fentanil
prolonga a analgesia, mas em altas concentração pode levar uma depressão. (GANIDAGLI
S., et. al., 2015; PIMENTEL, G. S., et al 2021)
A recuperação de uma anestesia na maioria dos casos é dificultosa nas éguas, já que
elas já que apresentam dificuldade para recuperar as forças necessárias, por isso, o local
escolhido para recuperação deve ser seco, com paredes bem acolchoadas com estrutura
adequada para contenção e sustentação do paciente e livre de qualquer tipo de líquido. O
uso de sedativos para retardar a recuperação e permiti a eliminação máximos dos
anestésicos inalatórios, mas deve ser feito de forma cautelosa, depende da condição e do
comportamento da égua. A analgesia pós-operatória é importante para evitar complicações
no período pós-cirúrgico. (PASTOR, F. M, PAGANINI, A. P., 2017)
Sendo assim, a escolha do protocolo anestésico ideal é extremamente importante
para garantir a viabilidade fetal. A escolha do fármaco, via de administração e a sua dose
devem ser um processo cauteloso, a intenção é que cause uma mínima depressão materno-
fetal. Por isso a escolha de fármacos com reversores é essencial para reduzir os efeitos
indesejáveis.

Ruminantes

Os ruminantes (bovinos) quando submetidos a procedimentos diagnósticos e


cirúrgicos, requerem ao uso de sedativos e anestésicos quando necessário, apresentam boa
aceitabilidade de contensão física, que quando associada a sedativos, anestesia local ou
10

regional, são suficientes para realização de procedimentos menos incisivos e dolorosos,


tendo como possibilidade associar anestésicos gerais em procedimentos com maior grau de
complexidade.
Há algum tempo, tem se afirmado que a pré-medicação raramente é necessária
(GALATOS, 2011; HALL et al., 2001; RIEBOLD, 2007) e muitas vezes é indesejável em
ruminantes e pequenos ruminantes, pois pode aumentar a incidência de regurgitação e
prolongar a recuperação (HALL et al., 2001). No entanto, a MPA torna o manejo e a indução
da anestesia de animais menos dóceis mais segura. (HALL et al. 2001; VALVERDE;
DOHERTY, 2008).
Fêmeas ruminantes quando prenhas apresentam alterações fisiológicas, que devem
ser levadas em consideração quando submetidas a procedimentos que requerem ao uso de
anestésicos e sedativos, pois ocorre a diminuição da reserva cardíaca durante a prenhez,
propiciando a uma descompensação cardíaca ou insuficiência cardíaca aguda, também
devido às alterações da função pulmonar do seu estado fisiológico, à maior propensão a
hipóxia, hipoventilação e aumento da pressão parcial de CO2 no sangue (hipercapnia). 1
Eleva-se o risco de sobredose e depressão exacerbada quando não há redução ou
cautela do uso dos fármacos nessas condições, colocando em risco de vida a fêmea e de
seu feto, pois é preciso assegurar a manutenção da fisiologia materna durante os
procedimentos a serem realizados, a fim de preservar a perfusão uteroplacentária e a
demanda de oxigênio reduzindo possíveis danos ao feto. 1
A xilazina, fármaco do grupo alfa-2 agonista, geralmente usado em ruminantes como
medicação pré-anestésica, desempenha um efeito parecido com o da ocitocina no útero de
vacas e ovelhas prenhas, podendo impactar na motilidade uterina aumentando os riscos de
parto prematuro e retenção das membranas fetais. Observou-se que a administração de
xilazina (0,04 mg/kg IV) em vacas leiteiras prenhes desencadeou aumento da resistência
vascular uterina e redução do fluxo sanguíneo uterino, causando redução na oferta de O2
em ruminantes no trimestre final da gestação podendo induzir ao parto prematuro e à
retenção de membranas fetais e, portanto, deve ser evitado (LIN; PUGH, 2004).

• Cesariana em bovinos
A realização de cesariana em bovinos é indicada quando distocias impedem o curso
natural do parto, pondo em risco a vida da parturiente e do feto, as principais causas de
distocias são o tamanho desproporcional do bezerro, alterações na pelve da vaca, torção
uterina e anomalias fetais. A intervenção cirúrgica ocorre quando as distocias não são
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corrigidas de maneiras mais simples como a remoção forçada do bezerro ou emprego de


lubrificantes para melhor deslizamento do mesmo.3
No momento do procedimento, o emprego de MPA é indicado somente em situações
extremas, é dispensável quando a técnica utilizada for realizada de maneira quadrupedal
com o animal bem contido. O uso de lidocaína como anestesia local pode ser feito de
maneira infiltrativa na região de flanco descrevendo um “T, e anestesia peridural
intercoccìgea na região de primeira e segunda vértebras, com dose de 5 a 7ml de lidocaína,
a fim de evitar decúbito, que não é desejável para esse acesso cirúrgico que é realizado em
posição quadrupedal. Outra forma de cordão infiltrativo, é em forma de “L” invertido ou
paravertebral, com 80-100ml de lidocaína 1% e agulha 100x12.4
Quando realizada na posição de decúbito lateral direito, indicado para situações em que
a vaca está debilitada, prostrada ou indócil, a emprego da lidocaína a 2%, infiltrando 80-
4
100ml em retângulo ou cordão anestésico na região em que será feita a incisão cirúrgica.

Anestesia em Pequenos Ruminantes gestantes


Geralmente, as técnicas anestésicas utilizadas em ovinos e caprinos se resumem em
anestesias locais, com ou sem medicação pré-anestésica (MPA), anestesias dissociativas
e, mais raramente, anestesias gerais (MASSONE, 2008) Neste último caso, deve-se
associar protocolos balanceados para propiciar narcose, analgesia e relaxamento muscular,
minimizando, dessa forma, a resposta ao estresse induzido pela anestesia e pela cirurgia
(LIN; PUGH, 2004). A analgesia deve ser parte integral da anestesia, entretanto, o uso de
analgésicos em pequenos ruminantes não é uma prática comum (TAYLOR, 1998). As razões
para não utilizar analgésicos em ovinos incluem dificuldades em avaliar a dor, a falta de
conhecimento do uso adequado de analgésicos e risco de resíduos (LIZARRAGA;
CHAMBERS, 2006). Dessa forma, a maioria dos procedimentos cirúrgicos realizados nesses
animais ainda é realizada sob contenção física ou química associada ou não a anestesia
local (GALATOS, 2011). Dentre os analgésicos disponíveis para esses animais, os opioides
são fármacos de escolha, contudo apresentam curta duração nos ovinos. Os agonistas alfa-
2 adrenérgicos também produzem um curto efeito analgésico, embora a sedação e intensa
salivação produzida por esse grupo de fármacos limitem o seu uso. (GALATOS, 2011).

• Medicação pré anestésica


Durante um procedimento anestésico geral, raramente os pequenos ruminantes
desenvolvem bradicardia, entretanto, na ocorrência desta, o tratamento pode ser realizado
12

com atropina (0,02 mg/kg, IV) ou glicopirrolato (0,005mg/kg, IV) (HALL et al., 2001). De
acordo com Muir III (2001), apesar da atropina possuir curta duração de ação em ruminantes,
a dose de 0,04mg/kg (IM ou SC) pode ser útil na prevenção da bradicardia e hipotensão
durante a manipulação de vísceras. Já Galatos (2011) afirmou que o glicopirrolato pode ser
a escolha mais adequada em muitos casos, porque tem maior duração de ação do que a
atropina e não atravessa facilmente as barreiras hematoplacentária e hematoencefálica.

• Anestesia local peridural


A anestesia deve ser realizada com o animal em uma posição quadrupedal, com o animal
contido pois a realização da aplicação da agulha é profunda, podendo ocasionar lesões na
medula. Deve se injetar uma pequena quantidade de anestésico local 2 a 4 ml até se
observar o abaixamento da cauda. A anestesia peridural lombossacra deve ser realizada
com 5 a 10 ml de lidocaína a 1%. A bupivacaína, um anestésico local de longa duração, tem
sido empregada como analgésico peridural em ovinos saudáveis, bovinos e caprinos. Tem
sido relatado que a bupivacaína epidural tem pouco efeito na pressão arterial média, pressão
venosa central, gasometria arterial e parâmetros clínicos (SINGH et al., 2007). Em
comparação entre lidocaína (2,86mg/kg), tramadol (1,0mg/kg) e a combinação desses dois
fármacos (2,46mg/kg de lidocaína mais 1,0mg/kg de tramadol) para analgesia epidural em
cordeiros, observou-se que o opioide produziu maior tempo de analgesia do que a lidocaína
isolada e do que a associação de lidocaína-tramadol. Além disso, a combinação produziu
maior tempo de analgesia do que a lidocaína isoladamente, apesar do período de latência
ter sido semelhante (HABIBIAN et al., 2010)

• Anestesia geral
Taylor (1998a) observou maior diminuição da pressão arterial média em ovinos pré-
medicados com acepromazina (0,03mg/kg, IM) e submetidos à anestesia com tiopental e
halotano do que em ovinos que não receberam esse fenotiazínico. Em outro trabalho, com
a mesma espécie e a mesma dose de acepromazina, Taylor (1998b) observou que não
houve diferenças na pressão arterial média e frequência respiratória entre os dois grupos. A
administração do cloridrato de levomepromazina, 24 na dose de 0,5mg/kg por via
intramuscular, produziu adequada tranquilização em ovinos submetidos à cirurgia fetal
experimental com anestesia geral, evidenciada pelo comportamento cooperativo dos
animais na manipulação pré-operatória (NATALINI et al., 1993).
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Conclusão
Do ponto de vista anestésico a fêmea gestante é um paciente de risco, pois seu
organismo está sofrendo uma série de alterações fisiológicas e, não raramente, patológicas,
que não são decorrentes da gestação. Além disso, a depressão fetal causada por
anestésicos está intimamente ligada ao grau depressão materna, e em muitos casos o feto
acaba sendo mais sensível aos fármacos que a mãe. O anestesista deve proporcionar a
paciente uma analgesia e anestesia eficientes, sem causar maiores riscos ao feto. Porém,
em alguns animais há necessidade de tranquilização e até anestesia geral, sendo importante
o conhecimento sobre as características farmacológicas dos fármacos anestésicos,
diminuindo os riscos de toxicidade fetal.
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