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Disciplina de Pediatria Neonatal

UNIDADE Departamento de Pediatria


NEONATAL Escola Paulista de Medicina
Hospital Universitário da UNIFESP Universidade Federal de São Paulo

ASFIXIA PERINATAL

A asfixia pode ser definida como uma síndrome clínico-neurológica


caracterizada por hipoxemia, hipercapnia e acidose decorrente de hipóxia e
isquemia no período periparto. Sua incidência varia de 1 a 8 por 1.000 nascidos
vivos.

Etiopatogenia
De forma geral, a asfixia pode ser desencadeada por quatro mecanismos:
1. Interrupção do fluxo sanguíneo através do cordão umbilical.
2. Alteração da troca gasosa a nível placentário por descolamento da placenta.
3. Alteração da perfusão placentária.
4. Falha na expansão pulmonar imediatamente após o nascimento.

Na maioria dos casos, a asfixia é provocada por fatores que comprometem a


oxigenação e a perfusão intraútero, sendo as causas neonatais responsáveis por
apenas 10% dos casos.
Os fatores que podem comprometer a circulação umbilical estão relacionados
às compressões do cordão umbilical provocadas pelo prolapso, nó verdadeiro,
circulares, hematomas e compressões de cordão umbilical.
O descolamento de placenta pode comprometer a oxigenação do feto por
diminuir a oxigenação da placenta e também por representar perda de volume de
sangue do feto formando o coágulo retro-placentário. Dessa forma, no descolamento
prematuro de placenta, além do componente hipóxico, o choque hipovolêmico no
feto representa um agravante para o prognóstico da criança.
A alteração da perfusão placentária pode ocorrer na hipertensão arterial
crônica, na pré-eclâmpsia, no trabalho de parto prolongado ou em outras situações
que cursam com insuficiência placentária.
Com menor frequência, pode ocorrer asfixia por depressão respiratória após o
nascimento como, por exemplo, quando se administra opioides à mãe antes do
parto, ou em recém-nascidos com obstruções ou compressões de vias aéreas.

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 1


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Fatores de risco
Com base nos mecanismos que desencadeiam a hipóxia no feto, são
considerados fatores de risco para asfixia perinatal:
 Durante a gestação: Ausência de pré-natal, tabagismo, alcoolismo e uso de
drogas ilícitas materna, diabetes melito, cardiopatia, hipertensão arterial
crônica, pré-eclâmpsia e anemias.
 No período periparto, trabalho de parto e parto: Placenta prévia,
descolamento prematuro de placenta, prolapso, nó e circular de cordão
umbilical, gestação múltipla, trabalho de parto prematuro, trabalho de parto
prolongado, apresentações anômalas, macrossomia fetal, tocotraumatismos,
líquido amniótico meconial, amniorrexe prolongada, anestesia geral e/ou
analgésicos/sedativos, infecções materna e/ou fetal.
 Imediatamente após o nascimento: Depressão respiratória no feto,
malformações ou obstruções de vias aéreas.

Fisiopatologia
A asfixia é desencadeada por hipóxia progressiva que leva à hipercapnia e
acidose, desencadeando o metabolismo anaeróbico e produzindo ácidos que são
inicialmente tamponados pelo bicarbonato. Quando o bicarbonato se esgota, se
instala a acidose metabólica. Inicialmente, a acidose e a hipoxemia desencadeiam
mecanismos compensatórios, com taquicardia, vasoconstrição periférica, elevação
da pressão arterial e manutenção da perfusão de órgãos nobres. Com o progredir da
hipoxemia, tal mecanismo entra em falência e ocorre a lesão de múltiplos órgãos.

 Circulação e padrão respiratório na asfixia perinatal


Estudos experimentais mostram que na presença de hipóxia, o padrão
respiratório fetal é o primeiro a se alterar (Figura 1). Sob hipóxia, ocorre inversão do
movimento do fluxo de líquido pulmonar, passando a ter um fluxo de fora para dentro
dos pulmões e, ao mesmo tempo, são desencadeados movimentos respiratórios
rápidos, seguidos de um período de apneia primária. Se a hipóxia persiste, ocorre
novo esforço respiratório com movimentos respiratórios irregulares de amplitude e
profundidade variáveis, denominado de gaspings. Após algum tempo, ocorre
Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 2
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novamente um período de apneia, denominado de apneia secundária. A seguir, o


feto evolui para o óbito, caso não sejam aplicadas as manobras de reanimação.
Na apneia primária, a frequência cardíaca começa a declinar, mas nesse
momento, a pressão arterial ainda se mantém elevada, usualmente, até o início da
apneia secundária, quando então ocorre uma queda acentuada da pressão arterial e
da frequência cardíaca.
Essas alterações podem ser iniciadas ainda intraútero e, ao nascer, o neonato
pode encontrar-se em qualquer fase de alteração do padrão cardiorrespiratório. Se
uma criança nasce em apneia primária, um estímulo táctil pode induzir a respiração.
Na apneia secundária, o recém-nascido não responde à estimulação, havendo
necessidade de iniciar imediatamente a ventilação. Na prática clínica, qualquer
recém-nascido que se encontra em apneia ao nascer deve ser considerado como
apneia secundária e iniciada imediatamente as manobras de reanimação.

 Comprometimento clínico e neurológico


Em recém-nascidos a termo, o comprometimento renal, neurológico, cardíaco
e pulmonar ocorre em 50%, 28%, 25% e 25% dos casos, respectivamente,
dependendo do grau e extensão da lesão asfíxica (Tabela 1).
Na fase inicial da asfixia ou quando a hipóxia não é tão acentuada, pode
haver comprometimento de órgãos periféricos, mas à medida que a hipóxia se
acentua ou se perpetua, ocorre também comprometimento de órgãos nobres como o
coração e o cérebro. Tal mecanismo de lesão progressiva pode ser explicado pela
redistribuição do débito cardíaco que ocorre na fase inicial da asfixia, mas que entra
em falência na fase mais avançada do processo asfíxico.

 Distúrbios metabólicos
Com a hipoxemia e má perfusão tecidual, o metabolismo anaeróbico torna-se
preponderante, com diminuição da produção de energia e formação de acido lático e
ocorrência de acidose metabólica.
Além da acidose metabólica, outros distúrbios metabólicos, como a
hipoglicemia, a hipocalcemia, a hiponatremia e a hiperpotassemia podem ser
encontradas na asfixia perinatal.

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 3


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Devido ao metabolismo anaeróbico, com baixa produção de energia, as


reservas hepáticas de glicogênio são rapidamente consumidas, podendo predispor à
hipoglicemia nas primeiras horas de vida, após a reanimação neonatal.
A acidose também pode aumentar a incorporação do cálcio ao osso sob a
ação da calcitonina que se encontra elevada na presença da acidose, levando à
hipocalcemia.
A diminuição da produção de energia pode alterar o funcionamento da bomba
de sódio e potássio e predispor à hiperpotassemia e hiponatremia. Por outro lado, a
ocorrência de insuficiência renal, relativamente frequente na asfixia, também explica
a presença de hiperpotassemia. A hiponatremia pode ocorrer também pelo aumento
da natriurese decorrente da lesão tubular renal ou devido à síndrome de secreção
inapropriada de hormônio antidiurético.

 Comprometimento pulmonar
Na asfixia perinatal, pode haver comprometimento do sistema respiratório
devido a síndrome de aspiração de mecônio, síndrome de escape de ar, hipertensão
pulmonar, síndrome do desconforto respiratório, edema e hemorragia pulmonar.

Síndrome de aspiração de mecônio: Devido à redistribuição do fluxo sanguíneo na


asfixia com diminuição da circulação mesentérica, ocorre aumento do peristaltismo
intestinal e relaxamento do esfíncter anal com eliminação do mecônio para o líquido
amniótico. Se a hipóxia persiste, o feto apresenta alteração do padrão respiratório
com movimentos respiratórios rápidos e gasping, possibilitando a aspiração do
mecônio através da glote aberta para os pulmões. A síndrome de aspiração de
mecônio também pode se associar à síndrome de escape de ar seja por mecanismo
de válvula em vias aéreas parcialmente obstruídas, seja por pressões excessivas
utilizadas na ventilação com pressão positiva durante as manobras de reanimação.
Hipertensão pulmonar: A hipertensão pulmonar persistente ocorre devido à
hipóxia, facilitando a passagem de sangue através do forame oval e canal arterial.
Com persistência do canal arterial.
Edema pulmonar: Durante a asfixia pode também ocorrer lesão endotelial com
extravasamento de líquido e proteínas para dentro dos alvéolos pulmonares,
provocando e edema pulmonar.

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Síndrome do desconforto respiratório: Na asfixia perinatal, pode ocorrer lesão do


pneumócito tipo II com consequente diminuição de produção de surfactante. Além
disso, o extravasamento de proteínas e líquidos pode inativar o surfactante alveolar,
predispondo a ocorrência de síndrome de desconforto respiratório em prematuros
tardios.
Hemorragia pulmonar: A hemorragia pulmonar pode ocorrer por trombocitopenia,
alteração dos fatores de coagulação e por atonia e lesão do endotélio capilar com
extravasamento de sangue para os alvéolos.

 Comprometimento cardíaco
A acidose reduz a contratilidade miocárdica e diminui a resposta a
catecolaminas, provocando a hipotensão arterial. Além disso, na asfixia grave,
também ocorre a disfunção cardíaca devido à sobrecarga hemodinâmica decorrente,
sobretudo, da hipertensão pulmonar, acometendo predominantemente o coração
direito com insuficiência tricúspide e insuficiência cardíaca.
A ocorrência de arritmia cardíaca pode ser observada na presença de
hiperpotassemia.

 Comprometimento renal e supra-renal


O comprometimento renal ocorre em cerca de 50 a 60% dos casos de asfixia
grave e, em geral, se associa a lesão neurológica. Com a isquemia renal, pode
haver necrose tubular aguda e, mais raramente, necrose cortical ou medular,
levando à insuficiência renal.
Na asfixia perinatal, pode eventualmente ocorrer hemorragia supra-renal
devido a alterações de coagulação. Em geral, a hemorragia é unilateral e
assintomática e só diagnosticada se realizado exame ultrassonográfico. Quando há
comprometimento bilateral, pode haver insuficiência adrenal.

 Comprometimento gastrointestinal
A redistribuição de fluxo sanguíneo pode provocar diminuição da perfusão dos
intestinos com risco de enterocolite necrosante.

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Por outro lado, a vasoconstrição periférica pode também comprometer o


fígado, provocando disfunção hepática, que pode evoluir com colestase, aumento de
enzimas hepáticas e distúrbios de coagulação.

 Comprometimento neurológico
O quadro neurológico da asfixia perinatal é representado classicamente pela
encefalopatia hipóxico-isquêmica. O edema cerebral também pode ocorrer com
certa frequência, mas a hemorragia intracraniana é ocasional. A encefalopatia
hipóxico-isquêmica será discutida em capítulo especifico.

Diagnóstico
Alguns parâmetros podem dar uma idéia do grau de comprometimento na
asfixia perinatal, mas nenhum deles apresenta sensibilidade e especificidade
desejáveis. A cardiotocografia, a gasometria fetal e umbilical, o índice de Apgar,
assim como os sinais clínicos e neurológicos podem ser considerados em conjunto
para avaliação do recém-nascido com asfixia.
Cardiotocografia: A ausência ou pequena variabilidade na frequência cardíaca por
1 hora ou mais, desaceleração tardia recorrente, taquicardia persistente ou
bradicardia inferior a 80 bpm parecem se associam à acidemia no feto. A
cardiotocografia tem baixo valor preditivo positivo, mas o padrão normal se associa à
ausência de acidemia no feto.
Gasometria de cordão umbilical: A gasometria de cordão umbilical pode ser usada
como indicador de oxigenação fetal, imediatamente após o nascimento. Para definir
acidemia, tem sido utilizado, pH de artéria umbilical menor que 7,20, entretanto, tem
sido observado maior morbidade apenas em recém-nascidos que apresentam pH <
7,0 ao nascer.
Boletim de Apgar: O índice de Apgar no 5o minuto < 3 tem se mostrado um bom
preditor de óbito neonatal, entretanto, o índice de Apgar do 1 o e 5o minuto baixos em
neonatos com asfixia que sobrevivem tem sido um fraco preditor de sequelas
neurológicas em longo prazo.
Para o diagnóstico da asfixia perinatal pode ser necessária a análise conjunta
de vários indicadores. Segundo a Academia Americana de Pediatria e o Colégio
Americano de Obstetrícia e Ginecologia, para definir asfixia é necessário que haja

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 6


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todas as seguintes alterações: pH < 7,0 em artéria umbilical, persistência de Apgar


<3 por mais que 5 minutos e sinais de comprometimento clínico e neurológico.

Conduta
Na asfixia perinatal, é importante reverter a hipóxia e isquemia, impedindo
que a lesão necrótica se estenda e, ao mesmo tempo, evitando que a zona de
penumbra de células neuronais apoptóticas se transforme em nova zona de
necrose. Com esses objetivos, realiza-se imediatamente a reanimação na sala de
parto, seguida de monitoração e controle das complicações clínicas e neurológicas.

 Reanimação na sala de parto


A reanimação na sala de parto é, sem dúvida, a medida de maior importância
para resolução imediata da condição de hipoxemia e isquemia, restabelecendo a
respiração, a circulação e a condição hemodinâmica do recém-nascido. Esse tema
será abordado em capítulo específico neste livro.

 Cuidados pós-reanimação
As lesões hipóxico-isquêmicas decorrentes da asfixia perinatal podem ser
agravadas após o nascimento. Por essa razão, recém-nascidos com asfixia perinatal
devem ter os seus sinais vitais monitorados, sistematicamente, após reanimação em
sala de parto, de preferência, em unidades de cuidados intensivos neonatais.
Devem ser monitorados os neonatos que se enquadrem em qualquer dos
seguintes critérios:
 Recém-nascido submetido à ventilação com pressão positiva na sala
de parto acompanhada ou não de outros procedimentos.
 Tempo para início da respiração espontânea superior a um minuto.
 Boletim de Apgar no 5o minuto menor ou igual a 5.
 Qualquer alteração clínica, sistêmica ou neurológica, sugestiva de
lesão hipóxico-isquêmica.

Na unidade de cuidados intensivos neonatais, esses pacientes devem ser


monitorados, de acordo com a evolução clínica, por 48 a 72 horas, procurando
prever as complicações e manter os sinais vitais estáveis para não agravar a lesão

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 7


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neurológica preexistente. Os cuidados devem ser individualizados, mas de forma


geral, fazem parte desses cuidados:
Manipulação mínima: O exame clínico, as punções arteriais ou venosas, as
aspirações traqueais e outros procedimentos podem provocar dor e alterar a
oxigenação e a pressão arterial e, consequentemente, a perfusão cerebral. Por isso,
o recém-nascido deve ser manipulado o mínimo possível, programando-se os
procedimentos de modo a permitir que o paciente disponha de tempo para sua
recuperação nos intervalos das manipulações.
Controle de temperatura: Evitar de qualquer forma a hipertermia para não piorar o
prognóstico neurológico e considerar as indicações de hipotermia. Verificar as suas
indicações em capítulo específico.
Assistência ventilatória: Recém-nascidos submetidos à reanimação prolongada
podem necessitar de assistência ventilatória, por comprometimento neurológico com
períodos de hipoventilação ou apneia ou por comprometimento pulmonar. Os
parâmetros ventilatórios devem ser ajustados para manter a PaO 2 entre 45 e
70mmHg, PaCO2 entre 45 e 60mmHg (evitar níveis abaixo de 35mmHg), pH entre
7,25 e 7,40 (procurar manter próximo do limite inferior nas 1as 12 horas de vida) e a
saturação de oxigênio entre 89% e 93%.
Controle hemodinâmico: As repercussões cardiovasculares da asfixia perinatal
decorrem da miocardiopatia isquêmica associada ao mau controle do tônus vascular
sistêmico. Procurar manter a pressão arterial média entre 30 e 50 mmHg para
preservar a perfusão cerebral. Na presença de sinais de baixo débito como
taquicardia persistente, hipotensão arterial, tempo de enchimento capilar superior a
três segundos, acidose metabólica sem hipoxemia e débito urinário abaixo de 1
mL/kg/hora, iniciar infusão contínua de dobutamina (5,0 mcg/kg/minuto),
aumentando, se necessário, até 20 mcg/kg/minuto. Caso não haja resposta iniciar
infusão de adrenalina (0,1 a 0,3 mcg/kg/minuto). Reservar o uso de expansores de
volume (SF 0,9% - 10 a 20 mL/kg, em 15 a 30 minutos) para casos de persistência
de sinais de insuficiência cardiocirculatória após o início das drogas vasoativas ou
quando houver alguma evidência de hipovolemia (descolamento prematuro da
placenta, placenta prévia ou acidentes de cordão umbilical).

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 8


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Suporte metabólico: É importante que os distúrbios metabólicos sejam


pesquisados sistematicamente, visto que, em muitos casos, não apresentam sinais
clínicos, como ocorre, em geral, com a hipoglicemia.
 Hipoglicemia: Realizar a triagem para hipoglicemia com 3 horas de vida e
depois a cada 6 horas na dependência das condições clínicas. Procurar
manter a glicemia entre 75 a 100 mg/dL. Nos neonatos submetidos à
reanimação prolongada na sala de parto deve-se iniciar a infusão de glicose
na velocidade de 4 a 6 mg/kg/minuto logo após a reanimação.
 Hipocalcemia: Na asfixia perinatal grave, a hipocalcemia pode ocorrer por
persistência pós-natal de níveis elevados da calcitonina. Monitorar os níveis
de cálcio sérico, de preferência, o cálcio ionizado, procurando mantê-lo entre
1,1 a 1,4 mmol/L ou acima de 4 mg/dL. Após a reanimação na sala de parto
iniciar com infusão de 2 mL/kg/dia de gluconato de cálcio a 10% no soro de
manutenção (18,4 mg de cálcio/kg/dia).
 Hipomagnesemia: Os neonatos com asfixia perinatal, em particular aqueles
com retardo de crescimento intrauterino, podem apresentar hipomagnesemia.
Deve-se lembrar, ainda, de pesquisar a possibilidade de hipomagnesemia nos
casos de hipocalcemia refratária ao tratamento. Após a reanimação iniciar
com infusão endovenosa de 0,5 ou 1 mL/kg/dia de sulfato de magnésio a
10%, respectivamente no neonato pré-termo e termo.
 Acidose metabólica: Em recém-nascidos a termo, após estabilização das
condições hemodinâmicas e dos níveis de oxigenação, se o pH, na
gasometria colhida na primeira hora de vida, for inferior a 7,10 e os níveis de
bicarbonato abaixo de 10mEq/L, considera-se a infusão de bicarbonato de
sódio na concentração máxima de 3%, por via endovenosa, lentamente por
volta de 2 horas. Calcular a necessidade de bicarbonato segundo a fórmula:
mEq de HCO3 = 0,5 x peso(Kg) x (15 - HCO3 observado).
 Hiponatremia: Na asfixia, deve-se determinar a causa da hiponatremia, pois
dela depende o tratamento, ou seja, na síndrome da secreção inapropriada
de hormônio antidiurético preconiza-se a restrição hídrica, devendo-se evitar
a oferta de sódio. Na lesão tubular renal recomenda-se o aumento da oferta
de sódio, na tentativa de compensar as perdas renais. Quando os valores de
sódio sérico forem menores que 120 mEq/L, indica-se a correção da natremia

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 9


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para níveis entre 125 e 130 mEq/L, através da seguinte fórmula: mEq de Na =
Peso (kg) x 0,60 x (130 - Na observado). Deve-se lembrar que a correção da
natremia deve ser realizada lentamente, mantendo uma infusão máxima de
sódio de 1 mEq/kg/hora. O sódio pode ser infundido sob forma de NaCl ou
NaHCO3, sendo o último melhor tolerado pelos túbulos renais do recém-
nascido.
Suporte renal: O quadro da insuficiência renal pode ser transitório com períodos de
oligúria (diurese < 1 mL/kg/hora) ou poliúria. Quando o quadro persiste por mais de
24 horas está, em geral, associada a lesões de múltiplos órgãos. Monitorar a função
renal com controle rigoroso do débito urinário e balanço hídrico a cada 6 horas. Além
disso, avaliar os níveis de uréia, creatinina e eletrólitos séricos e urinários a cada 24
horas. Em casos de anúria persistente (> 24 horas) realizar ultrassom com
dopplerfluxometria para afastar anomalias congênitas e trombose de veia renal e
considerar diálise peritonial.
Suporte nutricional: Nos pacientes instáveis do ponto de vista clínico e laboratorial,
manter jejum oral até a estabilização hemodinâmica, respiratória, metabólica e do
equilíbrio ácido-básico e resolução do íleo paralítico. Eventualmente pode ser
necessária a introdução de alimentação parenteral. Ao iniciar a alimentação enteral,
dar preferência ao leite humano da própria mãe, iniciando-se com pequenas
alíquotas (10 a 20 mL/kg/dia).
Repercussões neurológicas: Os neonatos com asfixia perinatal grave podem
evoluir com manifestações neurológicas como alteração da consciência, do tonus
muscular e dos reflexos ou presença de crises convulsivas. Esse quadro pode se
apresentar logo após o nascimento ou desenvolver após algumas horas. Em geral,
os sinais de acometimento neurológico estão acompanhados de outras
manifestações clínicas, podendo, no entanto, aparecerem isoladamente. É
importante salientar que, após o nascimento, as lesões neurológicas podem ser
agravadas por distúrbios metabólicos, hemodinâmicos e ventilatórios, sendo
necessário o controle dessas situações em todo recém-nascido com asfixia
perinatal. Em relação aos cuidados específicos, destacam-se as medidas para o
controle das convulsões e prevenção ou diminuição do edema cerebral.
Controle das convulsões: As convulsões estão presentes em cerca de 70% dos
casos de encefalopatia moderada. Entretanto, as convulsões podem aparecer

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 10


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devido a distúrbios metabólicos que devem ser sempre descartados. Qualquer que
seja a etiologia, as crises convulsivas devem ser prontamente controladas porque
podem agravar as lesões cerebrais. As drogas utilizadas no controle das convulsões
são:
- Fenobarbital Sódico
o Dose de ataque: 20 mg/kg, EV em 10 minutos. Caso as crises convulsivas
persistam administrar mais 5 mg/kg de fenobarbital, a cada 5 minutos, até
a dose total de 40 mg/kg.
o Dose de manutenção: 3 a 4 mg/kg/dia, EV lento ou IM, iniciar com intervalo
de 12 horas após a dose de ataque, dividida em duas tomadas. Ajustar a
dose para manter o nível sérico do fenobarbital entre 20 a 40 mcg/mL.
Verificar o nível sérico 72 horas após a dose de ataque, colhendo a
amostra sanguínea para análise imediatamente antes da administração da
dose da manhã.

- Fenitoína: Se as crises convulsivas persistirem, mesmo após a dose máxima


de fenobarbital, pode-se associar a fenitoína.
o Dose de ataque: 15 a 20mg/kg, EV em infusão lenta (1 mg/kg/minuto) ou,
no mínimo em 30 minutos. Pode-se optar por dividir a dose em duas
tomadas de 10mg/kg, administrando-as com intervalo de 20 minutos.
Monitorar a freqüência cardíaca e o ritmo cardíaco durante a infusão.
o Dose de manutenção: 4 a 8 mg/kg/dia, EV, dividida em duas tomadas.
Iniciar 12 horas após a dose de ataque. Ajustando a dose de fenitoína
para manter o nível sérico entre 15 a 20 mcg/mL. Colher a amostra para
análise cerca de 72 horas após a dose de ataque e imediatamente antes
da administração da dose da manhã.

- Midazolam: Se as crises convulsivas persistirem mesmo após a dose máxima


de fenobarbital e hidantal, podem-se utilizar outras opções. Dentre estas,
destacam-se os derivados benzodiazepínicos como o midazolan. Iniciar com
dose de ataque de 0,15 mg/kg por via endovenosa em, no mínimo, cinco
minutos, seguido de manutenção com dose de 0,1 a 0,4 mg/kg/hora.
 Controle do edema cerebral: As medidas para o controle do edema cerebral na
encefalopatia hipóxico-isquêmica são controversas, visto que ainda não se sabe

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 11


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exatamente qual o papel do edema cerebral na gênese da encefalopatia.


Acredita-se que o edema decorra da lesão neuronal e não seja a causa
determinante da lesão celular. Não há indicação do uso de agentes
hiperosmolares, corticóides e hiperventilação, pois podem piorar o prognóstico
neurológico.
 Prevenção da morte neuronal tardia: Os recentes conhecimentos na
fisiopatologia da encefalopatia hipóxico-isquêmica abriram novas perspectivas
para o uso da hipotermia moderada aplicada nas primeiras 6 horas de vida
durante 72 horas, por resfriamento seletivo da cabeça ou do corpo inteiro. Ver
capitulo específico.

Prognóstico
O prognóstico do recém-nascido a termo asfixiado depende da intensidade e
duração da hipóxia e isquemia antenatal somada às complicações clínicas que
ocorrem após a reanimação. O melhor parâmetro disponível no momento é a
evolução da síndrome neurológica apresentada pelo recém-nascido. Dessa maneira,
quanto mais prolongada a síndrome neurológica, quanto mais precoces forem o
início das convulsões e mais intensa as alterações eletroencefalográficas pior será o
prognóstico. A presença de alterações na tomografia computadorizada ou na
ressonância magnética também pode se associar a casos de pior prognóstico
neurológico.

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 12


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Tabela 1: Comprometimento clínico e neurológico na asfixia perinatal.


SNC Encefalopatia hipóxico-isquêmica, Edema cerebral, Convulsões.
Metabólico Hipoglicemia, Hipocalcemia, Hiponatremia, Hiperpotassemia
Pulmonar Persistência da circulação fetal, Síndrome de aspiração de
mecônio, Deficiência de surfactante, Hipertensão pulmonar
persistente, Hemorragia pulmonar, Edema pulmonar.
Cardíaco Insuficiência cardíaca congestiva, Disfunção miocárdica,
Insuficiência tricúspide e mitral, Arritmias.
Hemodinâmico Hipotensão por disfunção miocárdica.
Renal Necrose tubular aguda, Trombose de veia renal, Necrose cortical
renal.
Gastrointestinal Enterocolite necrosante, Disfunção hepática.
Hematológico Distúrbios da coagulação, Trombocitopenia.

Autor: Amélia M N Santos - data da versão: abr/2013 13

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