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Relações entre Psicologia e

Educação

Conteudista
Prof. Me. Pascoal Ferrari
Prof.ª Dra. Rosana Tosi Costa

Revisão Textual
Camila Yuraki Ferrari

Revisão Técnica
Prof. Me. Bruno Pinheiro Ribeiro
Sumário

Objetivos da Unidade.............................................................................................................3

Introdução............................................................................................................................... 4

A Importância da Psicologia para a Educação................................................................ 4

A Psicologia e a Formação de Professores....................................................................... 6

E o que a Psicologia tem a Ver com Tudo Isso?.............................................................. 9

Então: Formar Professores. Que Professores? Que Formação?................................ 10

A Psicologia e a Educação Infantil....................................................................................13

A Psicologia e as Necessidades Educacionais Especiais (NEEs)............................... 14

A Psicologia e o Processo de Alfabetização...................................................................16

A Psicopedagogia.................................................................................................................18

Práticas Psicopedagógicas................................................................................................ 22

Material Complementar.....................................................................................................24

Referências............................................................................................................................ 25
Objetivos da Unidade

• Observar os processos relacionais entre Psicologia e Educação;

• Compreender a importância da Psicologia para a formulação de dinâmicas


educacionais;

• Perceber as implicações da Psicologia em algumas áreas educativas como:


Educação Infantil, Necessidades Educacionais Especiais (NEEs) e o processo
de alfabetização;

• Refletir sobre as estruturas psicopedagógicas.

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VOCÊ SABE RESPONDER?

Como a inter-relação entre Psicologia e Educação influencia a formulação de di-


nâmicas educacionais e quais são as implicações da Psicologia em áreas especí-
ficas da educação, como Educação Infantil, Necessidades Educacionais Especiais
(NEEs) e o processo de alfabetização, levando em consideração as estruturas
psicopedagógicas?

Introdução
Qual é a relevância da Psicologia para os processos educacionais? Essa é uma per-
gunta fundamental que, ao longo da Unidade, será debatida em vários flancos. Longe
de ser exaurido, esse questionamento serve como estímulo para reflexões teóricas
sobre esse imbricamento entre Psicologia e Educação, bem como para a produção
de possibilidades práticas, de ações no interior das múltiplas instâncias educacionais.

A Importância da Psicologia para


a Educação
Como podemos notar, estamos nos referindo à Psicologia como ciência, e não
àquela que vem do senso comum, do uso cotidiano do que chamamos de psicologia.
Estamos aqui nos referindo a um conhecimento sistemático, que tem seu início ao
final do século XIX, quando delimita seu objeto e seu campo de estudo, uma ciência
que investiga o desenvolvimento e o comportamento humano e suas correlações
com o ambiente em que vivemos, considerando a história que vivemos.

A Psicologia é uma ciência que compreende o homem como um ser bioló-


gico, psicológico, social e acumulador de experiência, criando, assim, uma
visão mais total do homem.

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Além do processo de ensino-aprendizagem, a Psicologia como ciência pode, tam-
bém, contribuir para uma melhor compreensão do fenômeno educacional quando
ampliamos nosso objeto de estudo e focamos nas relações humanas. Partindo da
premissa de que aprendemos com o outro e de que as interações com o ambiente
que nos cerca influenciam a nossa aprendizagem, encontraremos na escola um es-
paço que propicia as relações humanas.

A escola é lugar privilegiado de


relacionamentos e interações. Na
escola, temos nossos amigos, lá
brincamos, conversamos, fazemos
novos vínculos com professores,
com as pessoas que lá trabalham
ou com os colegas da turma.

Quando focamos nas relações humanas, não podemos deixar de considerar a afetivida-
de pertinente às relações entre as pessoas. Os vínculos que criamos com outras pessoas
são carregados de afetividade, de sentimentos e de significados particulares que vamos
construindo à medida que convivemos com as pessoas frequentadoras da escola.

Como podemos notar, a Psicologia pode contribuir com a Educação de maneira


sistemática, exercendo um importante papel nesta. Davis e Oliveira (1994) argu-
mentam sobre o tema e podem ajudar a nossa reflexão:

O papel da Psicologia é investigar as modificações que ocorrem nos


processos envolvidos na relação do indivíduo com o mundo (cognitivos,
emocionais, afetivos etc.), analisando os seus mecanismos básicos. Para
realizar sua proposta, a psicologia interage com outras ciências tais como
a Medicina, a Biologia, a Filosofia, a Genética, a Antropologia, a Sociolo-
gia, além da Pedagogia.

Fonte: DAVIS; OLIVEIRA, 1994, p. 17

As autoras demonstram a importância de um olhar plural sobre a Educação. Apon-


tam para um entendimento mais completo e complexo sobre o fenômeno da Edu-
cação, entendendo os indivíduos dos pontos de vista cognitivo, emocional e afetivo,
objetos de estudo da Psicologia.

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A Psicologia, enquanto ciência, abre espaço para o estudo da Educação, da Psico-
logia da Educação, da Psicopedagogia e da Psicologia do Desenvolvimento, essas
são áreas de conhecimento que convergem seus interesses e investigações para
os processos de ensino-aprendizagem ou tudo que se relaciona às problemáticas
educativa e escolar. A aprendizagem é um fenômeno fundamental para a sociedade,
tanto que criamos espaços e contextos especificamente educativos, que chama-
mos de escola, para tornar a Educação mais eficiente e eficaz.

Figura 1 - Moving Circles, de Sophie Taeuber-Arp


Fonte: Wikimedia Commons
#ParaTodosVerem: a imagem mostra uma série de círculos – a maioria deles, na cor preta, e alguns azuis. A disposição
dos círculos pode dar a impressão de movimento, como sugere o nome da obra, Moving Circles. Fim da descrição.

A Psicologia e a Formação de
Professores
Ensinar sempre causou curiosidade entre os educadores/professores. Parece haver
uma espécie de mistério quanto ao fato de levar/orientar alguém a apreender conhe-
cimentos e saberes relacionados à sobrevivência tanto física quanto mental e social.

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O fantástico parece estar na situação de assumir uma postura de poder sobre o ou-
tro, conduzindo-o para o que nos parece correto e lógico. É transformar e mudar o
percurso de vida de sujeitos postos em nossas mãos (pensem em educadores como
um todo, incluindo pais).

Portanto, intervir na existência de outro(s), pela via do ensinar, configura-se como


um ato de muita responsabilidade e compromisso. O poder contido nesta ação al-
tera vidas para o bem ou para o mal, tornando o nosso próprio existir confortável ou
desconfortável conforme o que objetivarmos enquanto educadores.

Figura 2 – Educadores podem guiar os caminhos de vida dos aprendizes


Fonte: Freepik
#ParaTodosVerem: vista superior de pés com tênis cinza e calça preta. No chão, uma seta amarela aponta para
frente.Fim da descrição.

É certo que a educação não nos serve como panaceia, porém é um dos grandes
movimentos da humanidade para formar um ser que seja compatível com o tempo
e o espaço vividos e para planejar elementos do futuro.

Sendo assim, nada mais justo do que pensarmos em um lugar para educar e formar pesso-
as coerentes para o ensinar nesse lugar. Surge a perspectiva da escola e dos professores.

Reflita
Considerando o exposto, já imaginou o quanto o professor, den-
tro da escola, é poderoso na liderança de formação de pessoas
para o mundo?

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Abramovich (1994) relata o quanto o professor que é inconsciente de sua ação pode
fazer “coisas” no ato de ensinar que “levem” o aluno a organizar-se como pessoa
(personalidade) para seu aperfeiçoamento ou total destruição. Enfatiza que ensinar
parece ser um ato confuso em que não se tem clareza sobre “passar” certezas pes-
soais ou arriscar para que os alunos encontrem as suas verdades.

Formar cabeças feitas ou abrir cabeças pro que der e vier? Passar minhas
certezas ou arriscar que os alunos escorreguem, caiam e achem a sua
resposta, o seu caminho? Talvez, até oposto ao meu. [...] Complicado tudo
isso. É onde mais me debato. Cada mergulho e cada volta à tona pra res-
pirar me trazem novas perguntas. Novas dúvidas. Novas incertezas.

Fonte: ABRAMOVICH, 1994, p. 84

Então, para ser professor, há a necessidade de consciência profissional e pessoal.


Saber que é um líder poderoso, “fazedor” de cabeças e, muito mais, organizador de
vidas em um contexto de existências (tempo e espaço determinados), agindo para
que o movimento do mundo assuma características de qualidade ou de um mesmis-
mo sem sabor e meramente impositivo e destruidor.

Enfatiza Abramovich (1994):

Chega deste vai levando... Chega de botar a culpa nos outros e lavar as
minhas mãos. Está na hora de crescer. Crescer como professora. Como
pessoa. Como pessoa-professora. Assumir as minhas responsabilidades
nisto tudo que está aí. Parar de me achar uma vítima. Sou vítima, sou
carrasco. Sou decapitada e decapito. Sou mandada e mando. Ensino e
sou ensinada. Aprendo com os meus alunos e desaprendo com outros
professores. Sou cutucada por alguns professores e desanimada por um
montão de alunos. Tudo acontecendo junto. Ao mesmo tempo. Tenho
que parar de me lamentar. Tomar uma atitude. Depende de mim. A esco-
lha é minha. Só minha.

Fonte: ABRAMOVICH, 1994, p. 90

Pelo que foi exposto até o momento, é possível afirmar, para começar a conversar
sobre a formação de professores, que o ato educativo não é tarefa fácil. É, pois, um
trabalho árduo que exige do profissional reflexão constante para tomada de deci-
sões e organização de atos gestores do que se pretende enquanto ação deliberada
sobre outros.

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Na proposição de Paulo Freire
(ilustre educador brasileiro, que
podemos ver na imagem), é deci-
dir “politicamente” entre o libertar
(emancipar) e o escravizar pessoas
pelo ato educativo na ação profis-
sional do professor. A escolha é do
próprio sujeito que se colocou à
disposição de ser professor.

Não se trata de imposições, porém, de informações para que a pessoa se cons-


cientize do seu campo de atuação e referencie seus atos, reconhecendo-os como
úteis à formação de outras pessoas para responder, com qualidade, aos desígnios no
contexto vivencial em que se encontra.

Educar é um ato necessário para a adaptação do ser humano no mundo de cultura e


também para humanizá-lo. Não basta impor conhecimentos sem que haja neles sen-
tido e significado para que possamos ser “homens do mundo”; convivendo e comun-
gando harmônica e interativamente dos prazeres de saber, ser e fazer (L. S. Vygotsky).

E o que a Psicologia tem a Ver


com Tudo Isso?
Na Educação, a Psicologia, enquanto ciência, visa orientar o futuro educador para
que se torne consciente de seu poder de liderança na transformação do sujeito e do
mundo. Assim, não é fazer de qualquer jeito; é fazer tendo a real noção do que se
deseja como interventor do mundo.

A Psicologia está em um curso de formação de professores para fazê-lo entender-se


como indivíduo que influencia e que é influenciado, além de auxiliar na compreensão de
como essa relação repercute no movimento da coletividade e da pessoa a ser formada.

Não se trata de terapia, mas de fornecer elementos para que o futuro profissional
encontre a sua identidade profissional e se assuma como corresponsável pelos re-
sultados da ação educativa no mundo. Trata-se da nossa identidade pedagógica.

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Reflita
Nessa perspectiva, é fundamental responder com lógica às
questões: que tipo de professor(a) sou eu? O que quero? For-
mar quem? Para quê? Que mundo? Em que tempo? Em qual
cultura? Que sujeito estou ajudando a formar? Qual sujeito en-
contrarei no futuro?

Então, a Psicologia está bastante relacionada ao fornecimento de conteúdos muito


mais ligados ao autoconhecimento profissional do que aos conteúdos que versam
sobre o aluno e tantas outras “coisas” ligadas ao ato de ensinar. Por isso, a Psicologia
compõe os fundamentos da Educação, completando e sendo complementada por
disciplinas como Didática, Metodologias, Filosofia, Sociologia e outras.

Nosso foco é: uma vez que o profissional de Educação – professor – seja conscien-
tizado pelos conteúdos diversos da ciência Psicologia, os demais conteúdos terão
maiores sentidos e significados na atuação educativa.

Importante
Sabendo sobre o eu, há maiores chances de compreender e in-
tervir sobre os outros. É o sujeito consciente orientando a for-
mação de outros sujeitos conscientes.

O real é vislumbrado exatamente como é e em condições de nos percebermos como


parceiros cooperadores para mudanças qualitativas nos planos individual e coletivo
(interação constante entre indivíduo e objeto).

Então: Formar Professores. Que


Professores? Que Formação?
Flores (2003) destaca que a maneira de se enfatizar a formação de professores está
diretamente ligada a determinadas concepções que se têm do papel do docente, da
escola e do currículo em determinada sociedade. Assim, ensinar implica levar à aqui-
sição de atitudes, valores, conhecimentos, técnicas e, também, requer um proces-
so reflexivo e crítico sobre o que significa ser professor, os propósitos e os valores

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relacionados à própria ação e ao que se impõe nas políticas públicas de Educação.
É, então, não só “fazer” ou desenvolver conteúdos impostos por diretrizes curricu-
lares, mas tomar decisões, emitir pareceres fundamentados, justificar e reconhecer
as próprias ações, ler e interpretar ocorrências do contexto educacional/escolar em
que atua, agindo coerente e logicamente, com o propósito sendo sempre o de con-
duzir/orientar o ensino para o aprender.

Se pretendemos formar professores para um bom desempenho profissional, ainda


ressalta a autora, é então necessário promover novas atitudes em tais professores
em formação, pois, além de aprenderem conteúdos, processos de pesquisa, reflexão
e fazeres metodológicos, é essencial pôr em discussão o que significa ser professor
em um tempo de desafios no qual sociedade e escola são cada vez mais exigentes
para responder às imposições das sociedades local e mundial.

Vídeo
Durante o processo de formação de professores,
não se pode deixar de incentivar a reflexão: o que
é ser professor? O que significa ser professor no
nosso tempo?

Tornar-se professor trata-se de um processo complexo e multidimensional que


abrange inúmeras facetas, desde motivações individuais até imposições sociopolíti-
cas e culturais. Flores (2003) estabelece quatro elementos básicos para contextua-
lizar a formação do professor. Confira-os a seguir.

Contexto político

Enquadramento legal para formar professores; ênfases nacionais e regio-


nais e normatização de leis educacionais;

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Contexto curricular

Papel do professor; papel de aluno; compreensão do que é ensinar e apren-


der; matrizes curriculares (conteúdos propostos para as disciplinas especí-
ficas) e noções de políticas para formar sujeitos;

Contexto de investigação

Aprender a ensinar; aperfeiçoamento e desenvolvimento profissional;


constante reflexão sobre a prática educativa (conscientização); socializa-
ção profissional (trocas entre parceiros de profissão);

Contexto prático

Condições de trabalho; interação com as instituições educacionais; aquisi-


ção de cultura e estruturação de liderança; organização de papéis e tarefas;
oportunizar aprendizagens (formação ao longo do tempo).

Dessa forma, percebe-se a responsabilidade de ser professor e de formar o profes-


sor. É fundamental a manutenção da ligação com o real e o plano consciente sem
perder o foco de que ser profissional da educação exige constante investigação,
reconhecendo desafios da sociedade de informação, potencialidades de cada insti-
tuição e de si mesmo em contextos direcionados por valores e propósitos políticos.
É preciso superar uma formação técnica que é, em grande parte, gerenciada por
modelos racionalistas, formais, com preocupação no diplomar para práticas sem
sentido e inválidas para a transformação.

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Figura 3 – Woman Seated by an Easel, de Georges Seurat
Fonte: Wikimedia Commons
#ParaTodosVerem: a imagem mostra um quadro de Georges Seurat em que se vê uma mulher sentada, com
vestimenta própria do século XIX. Ela está escrevendo em uma folha ou caderno que apoia sobre o colo. À sua
frente, vemos um trecho de um cavalete de pintura. Fim da descrição.

A Psicologia e a Educação Infantil


Dentre as modalidades de ensino, para a Educação Infantil, a Psicologia faz uma contribui-
ção especial. A Psicologia do Desenvolvimento é uma área de conhecimento da Psicologia
que investiga a respeito dos desenvolvimentos motor, cognitivo e afetivo da criança. Essa
investigação permite um entendimento melhor acerca das fases do desenvolvimento in-
fantil e uma melhor compreensão sobre a aprendizagem e como ela se concretiza.

Vejamos o que Davis e Oliveira (1994) argumentam sobre as pretensões da Psicolo-


gia do Desenvolvimento:

A Psicologia do desenvolvimento pretende estudar como nascem e como se


desenvolvem as funções psicológicas que distinguem o homem de outras
espécies. Ela estuda a evolução da capacidade perceptual e motora, das fun-
ções intelectuais, da sociabilidade e da afetividade do ser humano. Descreve
como essas capacidades se modificam e busca explicar tais modificações.
Por intermédio da Psicologia do Desenvolvimento é possível constatar que
as manifestações complexas das atividades psíquicas no adulto são frutos de
uma longa caminhada. Daí a importância desta disciplina para a Pedagogia:
subsidiar a organização das condições para a aprendizagem infantil, de modo
que se possa ativar, na criança, processos internos de desenvolvimento, os
quais, por sua vez, serão transformados em aquisições individuais.

Fonte: DAVIS; OLIVEIRA, 1994, p. 17

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As autoras nos oferecem a dimensão da importância da Psicologia do Desenvolvi-
mento para a Educação Infantil. Essa ciência construiu e sistematizou conhecimen-
tos fundamentais sobre as fases do desenvolvimento humano, permitindo, dessa
forma, uma maior adequação das atividades pedagógicas realizadas nessa moda-
lidade de ensino. Conhecendo melhor o desenvolvimento infantil, a escola poderá
planejar, de forma mais ajustada, as sequências didáticas aplicadas à sala de aula.

Alguns pensadores foram basilares na sistematização de teorias que fundamenta-


ram essa área do conhecimento, isto é, desenvolveram, abriram o horizonte a res-
peito do conhecimento que tínhamos da criança e de como ela aprende. Podemos
destacar três: Jean Piaget (1896-1980), Henri Wallon (1879-1962) e Lev Vygotsky
(1896-1934).

As ideias de Piaget, Wallon e Vygotsky nos fizeram ver a criança de forma


mais completa e complexa. Esses estudiosos demonstraram que a criança
passa por etapas em seu desenvolvimento e que essas etapas devem ser
respeitadas. Além disso, ampliaram nossa visão sobre os indivíduos e sobre
como aprendem ou como constroem conhecimento. Aprendemos influen-
ciados por fatores genéticos, cognitivos, afetivos e sociais.

A Psicologia e as Necessidades
Educacionais Especiais (NEEs)
Com inúmeros estudos e pesquisas a respeito das síndromes e das necessidades
especiais que crianças podem apresentar, a Psicologia contribui muito com a Edu-
cação mais inclusiva, no sentido de reunir conhecimento acerca desses fenômenos,
oferecendo pistas e reflexões para os encaminhamentos educativos mais adequa-
dos à realidade de cada criança.

Importante
A Psicologia fornece subsídios para o desenvolvimento e a ela-
boração do planejamento curricular de uma educação formal
que inclua essas crianças no universo escolar.

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São inúmeras as Necessidades Educacionais Especiais (NEEs). Podemos pensar em
necessidades cognitivas em relação a crianças intelectualmente superiores ou mais
lentas em sua aprendizagem, necessidades sensoriais como dificuldades auditivas
ou visuais, desajustes comportamentais advindos de distúrbios emocionais ou afeti-
vos, síndromes e distúrbios genéticos, como autismo, dislexia etc. Ou, ainda, dificul-
dades múltiplas. Certamente, todas as crianças têm direito à educação de qualidade.

O papel do professor é fundamental no trato com alunos que possuem NEEs, é um


trabalho personalizado, pois cada criança tem formas específicas de aprender. Além
de atuar como propositor de sequências didáticas, o professor deverá desenvolver
processos de avaliação pedagógica, a fim de saber quais serão as próximas sequên-
cias a serem aplicadas para o pleno desenvolvimento da criança com NEEs.

Figura 4 – Professor e alunos com NEEs


Fonte: Freepik

De fato, é um grande desafio para o professor o trabalho com crianças com necessidades
especiais. A Psicologia com foco de estudos nessa área poderá trazer subsídios para um tra-
to mais humanizado com essas crianças; todavia, reafirmamos o direito de todas as crianças
participarem do sistema educacional de forma plena.

Os avanços observados em relação ao atendimento das NEEs pelas escolas


se concretizam, uma vez que estas são determinadas, em primeiro lugar,
por documentos internacionais, como a Declaração de Salamanca (1994),
e pela legislação educacional vigente, que garante direitos básicos, como a
inclusão desses alunos no sistema educacional e, em segundo lugar, pelas
novas concepções psicológicas e pedagógicas que compreendem que a
aprendizagem favorece o desenvolvimento dos indivíduos.

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Com essa nova visão sobre os limites de aprendizagem de pessoas com NEEs, a
escola pode redimensionar esses limites, ampliando-os e criando novos horizontes.
A escola, como espaço de aprendizagem, é de fundamental importância para o de-
senvolvimento cognitivo/afetivo desses indivíduos.

O professor, munido do conhecimento construído por esse foco de estudo da Psico-


logia, acerca das NEEs, pode melhor atuar em sua profissão. A formação do profes-
sor é fator essencial para a melhoria do entendimento dessa questão e da atuação
com ela.

A Psicologia e o Processo de
Alfabetização
Na maioria das vezes, pensamos que alfabetizar tem ligação com apresentar aos sujeitos,
que estão no processo de ler e escrever, letras e números e fazê-los unir, por justaposição,
cada uma das letras e cada um dos números – em um ato mecânico de redação e operações
matemáticas.

Importante
Um dos maiores educadores brasileiros – Paulo Freire – defen-
deu a ideia de que ler e escrever, a alfabetização, pressupõe
orientar o sujeito que aprende pela via das letras e dos números,
para passar de um nível de pensamento ingênuo para um ní-
vel superior de consciência crítica, ou seja, da escravidão para a
emancipação mental.

A alfabetização, para o autor, representa o adquirir de capacidades de reflexão crí-


tica sobre toda a realidade vivenciada, construindo maneiras coerentes e lógicas
de agir no mundo, com o mundo e para o mundo (FREIRE, 1998). Viver sem razão
transforma-se em viver de forma consciente, livre e politicamente organizada (alfa-
betização política).

Sendo assim, o sujeito busca constantemente relações mais consistentes, perce-


bendo-se como homem que cria a sua história junto a outros homens em um pro-
cesso ativo e transformador.

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Figura 5 – Grupo de Meninas Brincando, de Cândido Portinari
Fonte: wikiart.org
#ParaTodosVerem: a imagem mostra a tela “Grupo de meninas brincando”, de Cândido Portinari. Nela, há um
grupo de meninas maiores, vestidas de branco, e uma menor, em primeiro plano, com vestido azul e segurando
um guarda-chuvas. Todas estão com os pés descalços, sob um chão de terra. Ao redor, há balões, pipas e uma
casinha. Fim da descrição.

O processo educacional constitui-se, então, como campo favorável e fértil para essa
alfabetização emancipatória, promovendo e provocando contínua reflexão sobre a
realidade social. Nesse processo, afirma Freire (1998), o diálogo torna-se fundamen-
tal como troca de experiências.

Nessas relações dialógicas, o papel do professor é fundamental, pois é ele que “ani-
ma” e gerencia todo o debate entre os sujeitos do campo educacional escolar. O
professor, pela via do seu conteúdo (matéria), é que vai garantir relações saudáveis
no enfrentamento e na resolução de problemas considerados fundamentais para o
processo de conscientização da realidade e da formação crítica do sujeito.

No contexto, o papel da Psicologia é fomentar mecanismos de compreen-


são dessa natureza complexa do processo de alfabetização. É a busca por
apreender o movimento interativo entre sujeitos que aprendem e objetos a
serem aprendidos.

São muitas e longas pesquisas psicológicas que visam descrever todo o percurso
constituído pelo ser humano desde os primeiros rabiscos até a mais complexa ela-
boração de hipóteses relacionadas ao mundo que é vivenciado.

17
Assim, compreender quais elementos estão presentes no processo de aquisição e
construção de saberes almeja instrumentalizá-lo para que venha a facilitar todas
as intervenções na conscientização de alunos e de si, sistematizando um caminhar
suave para a transposição de uma visão ingênua para a absoluta criticidade.

A Psicopedagogia
A Psicopedagogia surgiu como área de conhecimento a partir da demanda práti-
ca de atendimento a crianças com dificuldades de aprendizagem. Uma das ques-
tões importantes para a compreensão epistemológica da Psicopedagogia é a sua
dinâmica transdisciplinar.

Importante
A Psicopedagogia é produto de uma interface que converge
múltiplas áreas do conhecimento e as elabora tendo em vista
a compreensão dos processos de aprendizagem. No entanto, é
importante salientar que ela não é um mero reflexo das discipli-
nas as quais ela toma como referência, sobretudo a Psicologia
e a Pedagogia.

Como defende Bossa (2007, p. 19), “a psicopedagogia enquanto produção de um


conhecimento científico nasceu da necessidade de uma melhor compreensão do
processo de aprendizagem, não basta como aplicação da psicologia à pedagogia”.
Sendo assim, sua perspectiva epistemológica se relaciona com outras influências
conceituais, por vezes, fazendo-se valer de conceitos importantes dessas discipli-
nas; contudo, sua perspectiva não é a de simplesmente somar conceitos e experiên-
cias, e sim constituir um campo que consiga avançar nos estudos sobre o objeto em
questão, o processo de aprendizagem.

O art. 1º da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) define seus termos


assim:

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A Psicopedagogia é um campo de conhecimento e ação interdisciplinar
em Educação e Saúde com diferentes sujeitos e sistemas, quer sejam
pessoas, grupos, instituições e comunidades. Ocupa-se do processo de
aprendizagem considerando os sujeitos e sistemas, a família, a escola, a
sociedade e o contexto social, histórico e cultural. Utiliza instrumentos
e procedimentos próprios, fundamentados em referenciais teóricos dis-
tintos, que convergem para o entendimento dos sujeitos e sistemas que
aprendem e sua forma de aprender.

Nesse ambiente transdisciplinar da Saúde e da Educação, a Psicopedagogia se orien-


ta fundamentalmente, segundo Golbert (apud BOSSA, 2007), por dois parâmetros:
o preventivo e o terapêutico.

Preventivo Terapêutico

A educação é o pilar fundamen- O parâmetro terapêutico se con-


tal. O aprendizado deve ser en- centra no estudo, na análise e na
tendido por meio dos processos elaboração de métodos de diag-
educativos, e tal enfoque não se nóstico e tratamento das dificulda-
limita às escolas, mas atinge fa- des de aprendizado, tendo o traba-
mílias, comunidades, instituições lho clínico como grande agente.
etc. A dimensão educacional, que
procura compreender e melhorar
os processos de aprendizado, é
ampla, tentando se espalhar pelo
corpo social.

Além das questões da validação de campo, dada a sua conjugação transdisciplinar, a


Psicopedagogia também enfrenta, desde a sua fundação e no interior de seu desen-
volvimento, o problema de definição de seu objeto.

19
Reflita
Se sabemos que a Psicopedagogia debruça seus interesses so-
bre os processos de aprendizagem, é necessário que algumas
perguntas sejam feitas, como: o que é aprendizagem? Como se
aprende? O que é uma dificuldade de aprendizagem? Como lidar
com dificuldades de aprendizagem? Como se educa? Quais são
as instâncias de prevenção e tratamento? E tantas outras pergun-
tas que a teoria e a prática psicopedagógica tentam responder.

Nos primórdios da Psicopedagogia, o trabalho concentrava-se mais detidamente


nos processos de reeducação, nos quais a aprendizagem era medida de acordo com
a capacidade de realização de determinados padrões, que, quando não cumpridos,
eram tratados como déficits. Nessa perspectiva, a Psicopedagogia insidia para ultra-
passar os déficits e atingir os padrões. O objeto da Psicopedagogia era então o “não
aprendizado”, ou seja, o sujeito que não aprendia e deveria aprender. Nessa linha
epistemológica, buscava-se estabelecer uma norma que pudesse servir de corte
para determinar a capacidade e gerar um padrão, a fim de garantir uma uniformida-
de entre as crianças.

Figura 6 – O objeto da Psicopedagogia era o “não aprendizado”


Fonte: Freepik
#ParaTodosVerem: ilustração de um homem, que segura uma caneta do seu tamanho e finaliza a escrita “A+”
envolta por um círculo. O fundo da escrita é verde-claro. Fim da descrição.

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Num momento posterior, por influência de outras áreas do conhecimento, sobretu-
do da Psicologia Genética e da Psicanálise, a Psicopedagogia passou a conceber o
“não aprendizado” de uma outra maneira. Essa nova forma começou a considerar a
singularidade dos sujeitos envolvidos nos processos de aprendizagem. Sendo assim,
as características individuais das crianças, bem como suas histórias e seus contextos
socioculturais, passaram a ser levados em conta para a compreensão do processo
de aprendizagem. O foco agora deixa de ser no “não aprendizado” e passa a ser no
sujeito “aprendendo”.

Depois dessa transição epistemológica, a Psicopedagogia passou a entender a


aprendizagem como parte de uma dinâmica afetiva e intelectual que faz parte da
constituição do sujeito. Constituição essa que dinamiza o meio no qual ele está in-
serido e, ao mesmo tempo, é dinamizada por esse meio.

Com isso, a aprendizagem tem relação intrínseca com os processos sociais


e culturais, com as relações familiares, com as amizades, com as convivên-
cias das mais variadas e com características físicas e biológicas do sujeito.
São esses elementos em conjunto e em relação que tecem os processos de
aprendizagem para essa nova concepção psicopedagógica.

Nessa perspectiva, as dificuldades de aprendizagem não são percebidas como irredu-


tíveis, ao contrário, elas são passíveis de soluções. O foco dessa linha epistemológica é
a aposta no desenvolvimento dos processos de aprendizagem do sujeito, isto é, nessa
dinâmica de aprendizagem, o intuito não é definir a aprendizagem como parâmetro
de um grupo determinado de sujeitos nem de determinadas práticas específicas. Sua
intenção é evidenciar que o aprender é possível mesmo diante das dificuldades.

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Figura 7 – Sem título, de Mira Shendel
Fonte: Wikimedia Commons
#ParaTodosVerem: a imagem mostra uma linha com diversos elementos escuros e espalhados sobre ela. Fundo
branco. Fim da descrição.

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Práticas Psicopedagógicas
No ambiente escolar, de acordo com Cavichia (2000), o trabalho da Psicopedagogia
pode ser o de assessor ou coordenador pedagógico. Na assessoria, cabe a interlo-
cução com educadores e a reflexão de suas práticas pedagógicas. Na coordenação,
se faz necessário orientar os educadores em relação ao trabalho com as crianças, de
modo que as identidades profissionais e pessoais possam ser esclarecidas.

Assim como no trabalho clínico, o trabalho institucional prevê a interdisciplinaridade,


de forma que as avaliações sobre os processos de aprendizagem possam ser mais
completas e complexas, gerando mais qualidade nos métodos de trabalho.

Como dito anteriormente, o trabalho institucional se destaca como preventivo, e,


para Bossa (2007), existem três níveis de prevenção.

1º Nível 2º Nível 3º Nível

Trabalha com
Consiste na tentativa
questões didático-
de eliminação
metodológicas e
desses transtornos,
é direcionado aos No segundo nível,
e, embora seja uma
educadores e ao são realizados
instância com forte
aconselhamento diagnósticos e
caráter clínico,
da família. O seu depois são propostas
a prevenção nas
objetivo é mitigar intervenções para
instituições é muito
os problemas de que os transtornos
importante para que
aprendizagem, instalados possam
esse transtorno não
evitando que eles diminuir.
se restabeleça ou
se desenvolvam e
mesmo que novos
cresçam em tamanho
transtornos apareçam.
e complexidade.

A escola é o ambiente onde acontece ou deveria acontecer, a parte mais substancial


do processo de aprendizagem do sujeito e, apesar de ainda não conseguir trabalhar
dinamicamente com as necessidades preventivas, ela deve ser um espaço de práti-
ca e desenvolvimento metodológico e didático para a Psicopedagogia, bem como
um objeto de estudo importante para o desenvolvimento e o aprimoramento dos
processos de aprendizagem na sociedade.

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Material Complementar

Vídeos
Entenda: Qual a Função do Psicopedagogo?
https://youtu.be/d-s_TmahO_A

Psicologia da Educação
https://youtu.be/74LyXVseCIg

Leituras
Psicologia e Educação: Novas Perspectivas para a Educação Brasileira
https://bit.ly/3QdWsLk

A Formação Docente: entre a Regulação e a Emancipação


https://bit.ly/3rHjX5o

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Referências

ABRAMOVICH, F. Que raio de professora sou eu? São Paulo: Scipione, 1994.

BOSSA, N. A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Rio Gran-


de do Sul: Artmed, 2007.

CAVICCHIA, D. C. Psicopedagogia na instituição educativa: a creche e a pré-escola.


In: SISTO, F. F. et al. (Org.). Atuação psicopedagógica e aprendizagem escolar. 5.
ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 196-212.

DAVIS, C.; OLIVEIRA, Z. Psicologia na educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994.

FLORES, M. A. Dilemas e Desafios na formação de professores. In: MORAES, M. C.;


PACHECO, J. A.; EVANGELISTA, M. O. (Org.). Formação de professores: perspecti-
vas educacionais e curriculares. Porto: Porto Ed., 2003. p. 127-160.

FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação. São Paulo: Moraes, 1979.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

FREIRE, P. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

LEITE, S. A. S.; COLELLO, S. M. G. Alfabetização e letramento: pontos e contrapon-


tos. São Paulo: Summus, 2010.

MOREIRA, P. R. Psicologia da educação: interação e individualidade. São Paulo: FTD,


1994.

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