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te filmeo filme Metrópolis não é de hoje e nem do futuro. Ele fala de um lugar
nenhum. Ele não serve a nenhuma tendência, partido ou classe. Ele tem uma moral que
cresce quando há compreensão: o mediador entre o cérebro e as mãos deve ser o
coração.
SPOILERS!
Quando filmou Metrópolis (1927), Fritz Lang já tinha grande importância para a então
jovem história do cinema, com longas como As Aranhas (1919 – 1920), A Morte
Cansada (1921), Dr. Mabuse, o Jogador (1922) e Os Nibelungos (saga dividia em A
Morte de Siegfried e A Vingança de Kriemhilde, ambos de 1924).
Para a imagem geral da cidade, Lang inspirou-se na visão que teve dos arranha-céus de
Nova York e pediu para que o desenhista de produção, Erich Kettelhut, esboçasse
cenários baseados nas descrições do roteiro e da novelização que Harbou escrevia em
paralelo, material que foi primeiramente lançando em partes na revista Illustrierte Blatt,
de Frankfurt (1925), e posteriormente publicado em livro.
Perceba a constituição dos quadros. Luz quase uniforme, localizada na fonte, para o
quaro de Freder; bordas difusas e filtro para o quadro de Maria. A indicação a diferença
também pode ser vista a partir do figurino do rapaz, o único a vestir seda inteiramente
branca em seu quadro. Perceba como a colocação dele no quadro da esquerda se liga
com a colocação de Maria no quadro da direita. O mesmo vale para a equivalência dos
que rodeiam cada um.
O roteiro de Lang e Harbou é claramente marcado pelo épico literário, com grandes
sequências desenvolvidas até certo ponto e em seguida a retomada de outra ação
dramática, até completar um ciclo narrativo que se reinicia, já com a história avançada.
Como o filme foi criminosamente picotado após a sua estreia devido ao fracasso de
bilheteria, não podemos apostar todas as fichas no encadeamento rigoroso do enredo
porque sabemos que faltam muitas cenas. Mesmo com a restauração lançada em 2010
(duração de 2h 33min.), já adicionado o material encontrado na Argentina dois anos
antes e a trilha sonora original de Gottfried Huppertz, temos uns buracos que, embora
não nos impeça de entender a fita, impedem que a apreciemos em sua totalidade e com
todos os detalhes pensados e filmados pelo diretor.
A primeira coisa que vemos em Metrópolis é o seu título feito pela junção de luzes,
como se fosse um filme abstrato. Em seguida temos o desenho da cidade, também cheia
de luzes e já em toda sua majestosa arquitetura, mista de Bauhaus e art déco. passamos
então para máquinas em pleno funcionamento, quase em estilo documental (os
fotógrafos tiraram a ideia de dois filmes de Eisenstein, ambos lançados em 1925: A
Greve e O Encouraçado Potemkin), os relógios marcando tempos diferentes — o turno
de 10 horas e a hora real — e então os trabalhadores cabisbaixos e andando como
máquinas, saindo e entrando das profundezas, uma sequência que inspiraria Chaplin ao
realizar Tempos Modernos (1936).
O maior exemplar de “fé + obras” que o escopo cristão do filme nos dá vem quando
Freder troca de vida. O Messias Freder, após ver seus irmãos, Maria e Moloch, troca de
vida com o trabalhador #11811. É uma espécie de batismo de fogo ou ritual de
passagem. Antes de chegar às catacumbas e ouvir o discurso pacifista de Maria, é
necessário sofrer, ser esgotado ao máximo. O martírio de Freder é como o de Cristo
(coisa de Messias…). Percebam que Lang dá essa impressão de crucificação através
passagem dos ponteiros do relógio.
Isolado e meio (?) louco, Rotwang leva Joh Fredersen para o local onde está o robô que,
mais adiante, terá um papel central na narrativa. Repare na compensação de equilíbrio
dos quadros e no pentagrama invertido atrás do robô (Homem-Máquina/Hel/Maria II),
símbolo que abre espaço para um sem-número de teorias da conspiração místicas a
respeito de Rotwang e do filme como um todo.
A primorosa montagem foi responsável por esta beleza: a passagem cativante do rosto
do robô para o rosto de Maria. Mesmo séria, perceba que o rosto desta Maria é
completamente diferente da Maria I. A maquiagem e a iluminação dão uma impressão
completamente diferente. Potencialmente sexy e dominadora, embora aparentemente
pacífica.
O complemento dramático para a dança da falsa Maria vem com a volta do sermão
apocalíptico, dando-lhe a nomenclatura de Besta e causando um colapso nervoso no já
frágil Freder.
E com a cidade afundando, temos o clímax do filme. Sequência poderosa, com ritmo
interno e externo invejáveis. A destruição da máquina principal, a inundação da cidade,
a fuga das crianças, o desespero dos adultos, tudo é interessante e bem dirigido, com
uma finalização de montagem de atrações que torna o eventos ainda mais intensos. O
espectador se angustia pela perspectiva de uma maior tragédia acontecer. Note também
que o centro da praça onde o gongo fica vai se preenchendo aos poucos. Maria se torna
um ímã de salvação, a única esperança das crianças.
Mesmo que tenha um final um tantinho decepcionante — mas é possível ver um pouco
de ambiguidade ali! — Metrópolis é um filme para se apaixonar. Grandioso em
cenários, tecnicamente ousado e vanguardista — destaque para a direção de arte,
fotografia e montagem –, com uma trilha sonora sinfônica cujos temas são o corpo do
filme, e uma direção absolutamente precisa, o longa se tornou um marco da ficção
científica e influência direta ou indireta para inúmeros filmes do gênero, robôs das mais
diversas categorias e distopias urbanas. Uma espantosa e inesquecível obra-prima
atemporal e imortal do cinema. LUIZ sANTIAGO ( Critico de cinema ).