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O processo de deglutição começa por uma fase - Conduzir o alimento da faringe ao estômago
voluntária (fase oral), na qual o bolo alimentar (peristalse, relaxamento dos esfíncteres);
(preparado pela mastigação e salivação) é lançado à - Evitar a deglutição de ar, ou aerofagia, durante a
faringe pela contração da musculatura da língua. respiração (tônus do EES);
A partir desse instante, uma série de movimentos - Evitar que o alimento retorne do estômago (tônus
musculares involuntários (o "reflexo da deglutição"), do EEI).
plenamente coordenados, se inicia, permitindo que
em menos de um segundo o bolo alimentar chegue ao A maioria dos distúrbios do esôfago se deve à
esôfago, sem penetrar no trato respiratório... Durante interferência nessas funções, frequentemente
esse curtíssimo tempo, a laringe se move para cima e resultando em sinais e sintomas:
para frente (fechando a epiglote e protegendo a via
- Disfagia: Dificuldade na deglutição.
aérea), enquanto a contração da faringe superior e do
palato mole empurram o alimento para baixo, - Odinofagia: Dor à deglutição.
iniciando o movimento peristáltico.
- Pirose: Sensação de queimação retroesternal.
O EES relaxa, permitindo o trânsito do bolo alimentar
até o corpo do esôfago. - Regurgitação: Retorno do alimento através do
esôfago até a boca.
Essa fase reflexa é controlada pelo SNC, utilizando
nervos cranianos bulbares: glossofaríngeo (IX par), - Cólica esofagiana: Dor retroesternal "em aperto".
que provêm a inervação sensitiva (aferência); e os - Hematêmese: Vômito de sangue (sangue vivo ou
nervos vago (X par) e hipoglosso (XII par), que provêm coagulado).
a inervação motora (eferência).
- Sialose: Hiper salivação.
FASE ESOFÁGICA
DISFAGIA
A musculatura lisa presente no corpo do esôfago e EEI
sofre influência dos interneurônios do plexo A "dificuldade de engolir alimentos" (disfagia) pode
mioentérico (rede neuronal do tubo digestivo) que, ocorrer no início da deglutição, ou seja, na
por sua vez, faz contato com o sistema nervoso transferência do alimento da boca para o esôfago
autônomo. (fase orofaríngea) ou na condução do bolo alimentar
até o estômago (fase esofágica).
O movimento peristáltico inclui uma fase inicial de
relaxamento (inibição), seguida de contração. Ele é Existem dois tipos básicos de disfagia, de acordo com
feito de forma sincronizada, sempre empurrando o o mecanismo: disfagia mecânica, quando existe um
alimento na direção do estômago. estreitamento anatômico do conduto (oral, faríngeo
ou esofágico) ou um volume de bolo alimentar
Existem dois tipos de peristalse esofágica: (1) desproporcionalmente grande; e disfagia motora,
primária – aquela em resposta ao reflexo da quando o problema está na coordenação da
deglutição; (2) secundária – em resposta à distensão motilidade do conduto (orofaríngeo ou esofágico).
mecânica do esôfago pelo bolo alimentar Ainda, de acordo com a sede do processo,
classificamos as disfagias mecânicas e motoras em três Se houver disfagia para sólidos e líquidos, devemos
grupos: pensar em uma obstrução mecânica muito severa, ou
então, mais comumente, se trata de um distúrbio
1-DISFAGIA OROFARÍNGEA (OU DE TRANSFERÊNCIA) motor do esôfago (seja neurológico ou muscular),
Na disfagia orofaríngea, o paciente tem dificuldade como: acalásia, espasmo esofagiano difuso,
em iniciar a deglutição, não conseguindo fazer com esclerodermia, etc.
que o alimento passe da boca para o esôfago. O Por outro lado, se houver disfagia APENAS para
paciente se engasga ao tentar deglutir, sólidos, provavelmente se trata de um distúrbio
experimentando regurgitação nasal e aspiração exclusivamente mecânico, em geral uma lesão
traqueal, seguida de tosse. Pode haver uma sensação anatômica obstrutiva (câncer, estenose péptica,
de desconforto na garganta ("disfagia cervical"). cáustica, compressão extrínseca, etc.).
Ocorre tanto para sólidos quanto para líquidos, e os Disfagia para sólidos progressivamente mais intensa
distúrbios que podem originá-la são aqueles que (semanas a meses) é um sinal muito sugestivo de
afetam os músculos esqueléticos ou a porção do câncer de esôfago!
sistema nervoso necessária para o controle
voluntário (fase oral) e involuntário (reflexo) da Disfagia para sólidos intermitente (meses a anos,
deglutição. intercalando-se períodos assintomáticos) sugere a
presença de membranas e anéis esofágicos.
A etiologia da disfagia orofaríngea é dividida em três
subgrupos: anatômica, neurológica e muscular. 3-PSEUDODISFAGIA (GLOBUS HYSTERICUS)
Outros sintomas comuns são a sialorreia (pela É uma sensação de "bolo na garganta", bastante
dificuldade de engolir a própria saliva) e disfonia (pelo comum na população. Está relacionada ao estresse
comprometimento concomitante do aparelho emocional e ocorre, pelo menos uma vez na vida, em
fonador). cerca de 45% das pessoas (53% das mulheres e 35%
dos homens).
O melhor exame para avaliar a disfagia de
transferência é a videofluoroscopia baritada O globus pode ser diferenciado da disfagia verdadeira
(videoesofagografia), testando a deglutição de "bolos" por duas características: (1) a sensação está presente
de variadas consistências. entre as refeições; e (2) quando o paciente engole
algum alimento, não sente seu "entalamento".
Disfunção Cricofaríngea
Os exames complementares (videofluoroscopia,
Este é um tipo especial de disfagia orofaríngea. A esofagografia, manometria, etc.) são todos normais. O
dificuldade desses pacientes é de impelir o alimento tratamento consiste em tranquilizar o paciente e
da faringe para o corpo esofágico, devido a uma indicar psicoterapia quando necessário.
constrição do EES, pela contratura do músculo
constritor inferior da faringe (cricofaríngeo). DISTÚRBIOS MOTORES PRIMÁRIOS DO ESÔFAGO
A "disfagia cervical" (sensação de bolo ou ACALÁSIA:
"entalamento" na garganta), associada à disfonia
intermitente é o quadro clínico mais comum. O ● Cardioespasmo
músculo cricofaríngeo auxilia o aparelho fonador, ao ● Aperistalse esofágica
distender as cordas vocais...
● Megaesôfago
Os sintomas do refluxo gastroesofágico estão
presentes em 30-90% dos indivíduos com esta A acalásia, termo que significa "não relaxamento"
entidade. ("calásia" = relaxamento), é o distúrbio motor
primário mais comum do esôfago, ocorrendo com
2-DISFAGIA ESOFAGIANA (OU DE CONDUÇÃO) - pct maior frequência em pacientes de 25 a 60 anos de
Na disfagia de condução, a dificuldade está no idade (especialmente antes dos 40 anos), sendo
transporte dos alimentos pelo esôfago até o caracterizado por:
estômago e, sendo assim, geralmente é relatada como ● Déficit de relaxamento fisiológico do Esfíncter
uma sensação de interrupção e estagnação do bolo Esofagiano Inferior (EEI) durante a deglutição
alimentar no tórax – o paciente se sente "entalado". (principal característica).
"É uma forma de disfagia que pode ser observada ● Graus variados de hipertonia do EEI (incluindo
tanto para sólidos quanto para líquidos, e pode ser tônus normal em alguns casos!!!).
intermitente ou progressiva".
● Substituição total (100%) da peristalse normal do - Quando devo suspeitar de acalásia?
corpo esofagiano por contrações anormais (as
peristalses anormais podem ser fracas, de pequena Sempre que houver disfagia e perda de peso ao longo
amplitude, na "acalásia clássica", ou extremamente de meses ou anos, associadas à regurgitação e tosse
vigorosas, na "acalásia vigorosa"). crônica (especialmente noturna).
A perda de peso é uma constante, mas geralmente é O carcinoma escamoso é derivado do epitélio
insidiosa, além de ser leve a moderada na maioria das estratificado não queratinizado, característico da
vezes – perda de peso importante e rápida deve mucosa normal do esôfago.
levantar a suspeita de câncer de esôfago! Nas últimas décadas tem sido observada uma queda
importante de sua incidência (motivo desconhecido),
com diminuição da diferença entre o carcinoma pacientes se aproxima a 95%, apresentando-se,
escamoso e o adenocarcinoma (que vem geralmente, após os 65 anos de idade.
aumentando!).
- Outros fatores: bulimia, infecções fúngicas crônicas,
A maioria dos fatores de risco para câncer de esôfago, HPV, exposição à radiação, história pessoal de câncer
que serão descritos adiante, são para este tipo no trato aerodigestivo (cabeça, pescoço e pulmão),
histológico! presença de divertículos no esôfago e doença celíaca.
O tumor se origina principalmente no terço médio do Fatores de risco – adenocarcinoma:
órgão (em 50% dos casos).
O fator de risco mais importante é a presença do
O adenocarcinoma é derivado do epitélio de Barrett – epitélio de Barrett (metaplasia intestinal), secundário
metaplasia intestinal que complica alguns pacientes à forma erosiva da esofagite de refluxo.
com DRGE erosiva. Portanto, este tumor é localizado
no terço distal do esôfago e, eventualmente, se As células do epitélio de Barrett evoluem para câncer
confunde com o adenocarcinoma da cárdia (junção através de um processo de displasia progressiva (com
esofagogástrica). aneuploidia, mutações no gene p53, etc.).
No exame baritado, a diferenciação entre estenose (1) polipoide exofítico (60% dos casos);
péptica e câncer de esôfago não é difícil: neste último, (2) escavado ou ulcerado (25% dos casos); e
é nítida a irregularidade da mucosa e a súbita
transição entre o esôfago normal e a obstrução (3) plano ou infiltrativo (15% dos casos).
("sinal do degrau").
Estadiamento:
A aparência radiológica da neoplasia de esôfago na
O câncer de esôfago se caracteriza por ter um
esofagografia é de uma súbita redução do lúmen
comportamento extremamente agressivo,
(aspecto de degrau de escada ou maçã mordida),
disseminando-se localmente e a distância.
diferente da observada em patologias benignas em
que o afunilamento é progressivo (ex.: aspecto em A rica rede linfática presente na lâmina própria e na
bico de pássaro na acalásia). submucosa (intramural) facilita a disseminação
linfonodal precoce mesmo para tumores superficiais e
pequenos. A ausência de serosa facilita a
disseminação do tumor para órgãos adjacentes (por
contiguidade)!!!
Os tumores do terço superior e médio invadem a
árvore traqueobrônquica, a aorta e o nervo laríngeo
recorrente, enquanto os tumores do terço distal
avançam sobre o diafragma, pericárdio e estômago.
Cerca de 75% dos pacientes diagnosticados com CA de
esôfago já apresentam invasão linfática no momento
do diagnóstico. Os tumores do terço superior ou ● Diagnóstico de CA de esôfago por biópsia
médio drenam para os linfonodos cervicais profundos endoscópica (precedida ou não pela realização de
(supraclaviculares), paraesofágicos, mediastínicos esofagografia);
posteriores e traqueobrônquicos.
● TC toracoabdominal para determinar a presença de
Os do terço distal, para os linfonodos paraesofágicos, metástases a distância – cuja existência já classifica o
celíacos e do hilo esplênico. doente no Estágio IV, independentemente de outros
fatores. O PET-scan tem sido cada vez mais utilizado
As metástases a distância mais importantes são: em associação à TC. Todavia, como se trata de exame
fígado e pulmão, ocorrendo também para ossos e menos específico (uma área de captação anormal
rins. pode corresponder, por exemplo, a uma infecção ou
O estadiamento do CA de esôfago se baseia na escala outro processo inflamatório), recomenda-se que
TNM (T = tumor, N = linfonodos, M = metástase a qualquer suspeita de metástase pelo PET seja
distância). Nos últimos anos constatou-se que o tipo confirmada por biópsia antes de se excluir o paciente
histológico também influencia o prognóstico e, por da possibilidade de tratamento cirúrgico;
este motivo, o AJCC (American Joint Committee on ● Na ausência de metástase a distância, um
Cancer) possui dois sistemas de estadiamento Ultrassom Endoscópico (USE) é realizado para avaliar
conforme o subtipo histológico. a penetração do tumor na parede esofagiana, bem
O chamado câncer de esôfago precoce é aquele que como avaliar a extensão da doença para os linfonodos
invade até a submucosa (T1 ou estágio I). locorregionais. Devido à excelente sensibilidade do
Infelizmente, esta é uma apresentação rara deste USE, a mediastinoscopia tem sido pouco indicada;
câncer.
Os exames utilizados para o estadiamento são:
● Ultrassom endoscópico atualmente é o melhor
exame para definir os componentes T e N do
estadiamento. Sempre que possível, o componente N
deve ser confirmado por meio da coleta de material
por PAAF (Punção Aspirativa com Agulha Fina).
● RX de tórax: alterado em 50% dos pacientes; pode
mostrar adenopatia mediastinal, derrame pleural e
metástases pulmonares.
● TC toracoabdominal: avalia o tamanho do tumor, os
linfonodos mediastinais e as metástases a distância ● A laparoscopia é considerada "opcional", sendo,
(ex.: fígado e linfonodos celíacos). contudo, fortemente recomendada em pacientes com
adenocarcinomas localizados na porção intra-
● Broncofibroscopia: mostra a invasão abdominal do esôfago ou próximos à junção
traqueobrônquica (fístula esofagotraqueal); indicada esofagogástrica, bem como nos pacientes com
especialmente nos cânceres do esôfago proximal e suspeita de disseminação intraperitoneal.
nos pacientes com tosse persistente.
Prognóstico e tratamento:
● Mediastinoscopia e laparoscopia com biópsia:
avalia linfonodos e metástases a distância. Os A sobrevida em cinco anos do CA de esôfago, de
linfonodos celíacos são bem avaliados na laparoscopia acordo com o estadiamento final (clínico + cirúrgico) é
– o seu acometimento contraindica a cirurgia curativa a seguinte:
para a maioria dos autores. ● Estágio I: 60%;
● PET-scan: é mais sensível que a TC e o US ● Estágio II: 30%;
endoscópico para determinação de metástases a
distância. Apesar do alto custo, a tendência atual é ● Estágio III: 20%;
que se analisem conjuntamente os resultados da TC
● Estágio IV: 4%.
com o PET (PET-TC).
Em pacientes com razoável estado geral (nutridos,
A sequência de estadiamento que é seguida na grande
com albumina próximo ao normal) e sem
maioria dos casos, na prática, é a seguinte:
comorbidades preocupantes (cardiopatia,
pneumopatia, hepatopatia, nefropatia), a cirurgia
curativa pode ser tentada na ausência de metástases O estômago é dissecado (juntamente com seus vasos)
a distância (incluindo linfonodos a distância) e de um e "suspenso" para a cavidade torácica, para ser
T4 irressecável. anastomosado no espaço paravertebral do mediastino
posterior. A anastomose é realizada com grampeador.
Em pacientes com tumores T1 sem metástases (CA de
esôfago precoce), inclusive, pode-se optar pela Para evitar uma obstrução gástrica pós-vagotomia,
ressecção endoscópica da lesão. uma piloroplastia ou pilorotomia deve sempre ser
confeccionada.
Cerca de 40-50% dos pacientes com CA de esôfago
encontram-se no grupo "ressecável". Mesmo assim, a O principal risco desta cirurgia é a deiscência da
cura só é alcançada em 10-35% dos casos. anastomose intratorácica (abaixo da clavícula), que
leva à mediastinite grave, sepse e óbito em 50% dos
A estratégia cirúrgica curativa proposta pela maioria casos.
dos autores envolve a realização de esofagectomia +
linfadenectomia regional, com margens de segurança Muitos pacientes evoluem com problemas
de pelo menos 8 cm. pulmonares pós-operatórios, decorrentes da
toracotomia prolongada.
Vale ressaltar que a reconstrução do trânsito deve ser,
sempre que possível, com o estômago! Um estômago Outra complicação comum é a esofagite de refluxo (do
normal bem dissecado alcança prontamente o remanescente esofágico). A mortalidade operatória
pescoço em todos os pacientes. varia entre 7-20%.
A interposição do cólon tem a desvantagem de
requerer três anastomoses (coloesofagostomia,
colojejunostomia e colocolostomia), sendo uma
cirurgia de maior morbimortalidade. Só é indicada em
pacientes com gastrectomia total ou parcial prévia, ou
quando o tumor avança sobre o estômago.
Deve ser realizada rotineiramente uma jejunostomia
para alimentação enteral no pós-operatório.
No pré-operatório, em pacientes desnutridos por
disfagia, sempre que possível deve-se dilatar a
estenose com a implantação endoscópica de um stent
esofagiano, e inserir um cateter de Dobbhoff para
garantir aporte nutricional de pelo menos 2.000
kcal/dia, postergando a cirurgia até a melhora Esofagectomia com esofagogastrostomia. Veja em (A),
nutricional. Indivíduos com perda ponderal > 10% do a incisão da toracotomia lateral posterior direita. Em
peso habitual, bem como aqueles com níveis séricos (B), a parte do esôfago a ser ressecada (com o tumor).
de albumina < 3,4 g/dl, encontram-se com risco muito Em (C), a anastomose feita com o estômago. Observe
aumentado de complicações pós-cirúrgicas (ex.: a piloroplastia.
deiscência de anastomose). 2-Esofagectomia trans-hiatal: nesta cirurgia, não há
As duas técnicas mais utilizadas para esofagectomia incisão torácica: ela é executada através de uma
pelos cirurgiões torácicos são: incisão abdominal e outra cervical.