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Doença do refluxo gastroesofágico

Letícia Muniz – Itpac Porto – Turma 34

Anatomia Já o esfincter esofágico inferior (gastresofágico) está


- A anatomia do sistema digestório é dividida em parte localizado um pouco acima da área em que o esôfago liga-
superior, parte intermediária e parte inferior. se ao estômago, passando por um orifício (ou hiato)
• Parte Superior: composta pela boca, esôfago e existente no diafragma na região de transição ao estômago,
estômago, sendo responsável pela fonte de que evita o refluxo do conteúdo gástrico para dentro do
ingestão e receptáculo esôfago
- O músculo do esfíncter gastroesofágico permanece em
• Parte Intermediária: composta pelo duodeno, contração, promovendo uma pressão que impede o refluxo.
jejuno e íleo, onde ocorre a maior parte dos Quando há deglutição de alimentos ocorre “relaxamento
processos digestivos e absortivos receptivo” do esfíncter esofágico inferior, que viabiliza a
• Parte inferior: composta pelo ceco, cólons e reto, propulsão fácil do conteúdo do esôfago para
que funciona como canal de armazenamento para dentro do estômago. A parte do diafragma que circunda o
eliminação eficiente das escórias metabólicas esfíncter esofágico inferior ajuda a manter a zona de
pressão alta necessária para evitar refluxo do conteúdo
ANATOMIA SUPERIOR gástrico para dentro do esôfago.
Boca: é a “porta de acesso” dos alimentos ao sistema
digestório, onde localiza-se os dentes usados para mastigar
os alimentos e a língua e outras estruturas necessárias ao
direcionamento do bolo alimentar para as estruturas da
faringe e o esôfago. A boca também funciona como
receptáculo para a saliva produzida pelas glândulas
salivares. A saliva umidifica e lubrifica os alimentos para
que possam ser deglutidos mais facilmente. Além disso, a
saliva contém enzimas encarregadas da digestão inicial dos
lipídios e dos amidos.

Esôfago: é um tubo localizado atrás da traqueia que


conecta a boca (orofaringe) com o estômago por onde
passa o alimento. Esse órgão possui musculatura lisa que
permite que ele se contraia para promover a passagem do
alimento. Além disso, existem glândulas mucosas e DRGE
submucosas que secretam muco para proteger a superfície - A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é um
e facilitar a lubrificação do alimento. distúrbio gastrointestinal alto causado pelo refluxo do
- As paredes do esôfago são formadas de mucosa, conteúdo gástrico, que provoca sintomas ou complicações
submucosa, muscular externa e deletérias nos pacientes, inclusive regurgitação e pirose
adventícia, refletindo a organização estrutural geral do (azia) devido a relaxamentos transitórios do esfíncter
sistema digestório. A camada mucosa interna contém esofágico inferior fraco ou incompetente (principalmente
epitélio estratificado não queratinizado. Na junção durante a peristalse do estômago), possibilitando o refluxo
esofagogástrica, o epitélio resistente à abrasão transforma- e, além disso, o retardo da neutralização do ácido refluído
se repentinamente no epitélio colunar simples do estômago. do estômago depois que ocorre., uma vez que o conteúdo
A camada submucosa contém glândulas secretoras de que iria ser neutralizado pelo ácido estomacal volta para a
muco, que produz líquidos contendo mucina e que estrutura anterior (esôfago)
lubrificam a parede esofágica e facilitam a passagem dos - O esvaziamento gástrico mais lento também pode
alimentos. A camada muscular externa consiste em contribuir para o refluxo porque aumenta o volume e a
músculos esqueléticos no terço superior do esôfago, em pressão do estômago e aumenta as chances de ocorrer
uma mistura de músculos lisos e esqueléticos no terço refluxo. A lesão da mucosa esofágica está relacionada com
intermediário e em músculo liso apenas em seu terço distal. a composição destrutiva do material refluído e com o
A camada adventícia fibrosa externa do esôfago é formada tempo que ele permanece em contato com a mucosa. Os
unicamente de tecido conjuntivo, que se imiscui nas líquidos ácidos do estômago (pH < 4,0) são particularmente
estruturas circundantes ao longo de seu trajeto. deletérios. As paredes do esôfago não são protegidas contra
- Nas extremidades do esôfago existem estruturas a acidez, o que pode acarretar esofagite e surgimento de
chamadas de esfíncter (esfíncteres esofágicos superior e úlceras. Normalmente, o refluxo gastresofágico é
inferior). O esfíncter esofágico superior (faringoesofágico) neutralizado e eliminado pela peristalse esofágica e pelo
consiste em uma camada circular de músculos esqueléticos bicarbonato da saliva. Salivação diminuída e redução da
que impede que o ar entre no esôfago durante a respiração.
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capacidade tamponadora da saliva podem contribuir para a confundida com angina). A pirose pode ou não ser
neutralização mais lenta do refluxo ácido do esôfago. acompanhada de regurgitação (percepção de um fluido
- Em bebês, a regurgitação normalmente ocorre após a salgado ou ácido na boca).
alimentação e é considerada normal devido à imaturidade Sinais e sintomas respiratórios: asma, tosse crônica e
fisiológica do sistema digestório que ainda não é como o de laringite de origem multifatorial além do diagnóstico de
um adulto. O refluxo normalmente piora nos primeiros DRGE.. Os mecanismos propostos para explicar a asma e a
meses de vida, atinge o pico aos seis a sete meses de tosse crônica associadas ao refluxo incluem
idade e então diminui gradualmente. Em quase todos os microaspirações e macroaspirações, lesões da laringe e
bebês com refluxo, o distúrbio desaparece por volta dos broncospasmo mediado por estímulos vagais.
dezoito meses de idade. Quando passa a ser patológico, o Esofagite: refluxo constante causa uma lesão da mucosa do
refluxo interfere na alimentação e no crescimento, causa esôfago, além de hiperemia e inflamação. As complicações
esofagite e etc. Nesses casos, a musculatura do esfíncter como estenoses e esôfago de Barrett desencadeiam um
pode estar subdesenvolvida ou pode relaxar em momentos ciclo de lesão da mucosa seguida de hiperemia, edema e
impróprios, permitindo que o conteúdo do estômago se erosão da superfície interna do órgão. As estenoses são
mova para trás (reflua) para o esôfago causadas por uma combinação de fibrose tecidual, espasmo
e edema., causando estreitamento do esôfago e disfagia
quando a constrição do lúmen esofágico é significativa. O
esôfago de Barrett caracteriza-se por um processo
reparativo, no qual a mucosa escamosa que normalmente
recobre o esôfago é substituída gradativamente por epitélio
colunar anormal semelhante ao do estômago ou do
intestino. Essa complicação está associada ao aumento do
risco de desenvolver adenocarcinoma do esôfago.
Dizemos que o paciente tem esofagite de refluxo quando
ele desenvolve alterações inflamatórias na mucosa
esofagiana visíveis pela endoscopia que podem ser
classificados pela classificação de Los Angeles (grau A: uma
ou mais erosões > 5mm restrito no fundo das dobras da
mucosa / grau B: pelo menos uma erosão > 5mm sendo
Existem três anormalidades básicas (não mutuamente todas restritas no fundo das dobras da mucosa / grau C:
excludentes) que podem originar refluxo: erosões contínuas que cruzam o topo das dobras da
1. Relaxamentos transitórios do EEI não relacionados mucosa, acometendo <75% / grau D: acomete >75% do
à deglutição (mais comum); esôfago)
2. Hipotonia verdadeira do EEI (diminuição da
pressão sobre a musculatura lisa do esfíncter que DIAGNÓSTICO
o mantém fechado); - O diagnóstico de DRGE é baseado, principalmente, na
3. Desestruturação anatômica da junção história de sintomas de refluxo e nos exames diagnósticos
esofagogástrica (hérnia de hiato - passa a não opcionais, inclusive teste de supressão da acidez,
contar mais com a ajuda da musculatura esofagoscopia e monitoramento ambulatorial do pH
diafragmática). esofágico.
➢ Testes de supressão da acidez: consistem em
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS administrar um inibidor da bomba de prótons por
Pirose: é a manifestação clínica mais comum da DRGE e 7 a 14 dias para determinar se os sintomas são
frequentemente é grave, começando 30 a 60 min depois aliviados.
da ingestão alimentar. Em geral, o sintoma piora quando o ➢ Esofagoscopia: consiste em introduzir um
indivíduo inclina o corpo abaixo da cintura ou se deita e endoscópio de fibra óptica flexível no esôfago com
frequentemente é aliviado na posição sentada ereta. A a finalidade de examinar o lúmen do sistema
gravidade da pirose não reflete a extensão da lesão da digestório superior. Esse exame também possibilita
mucosa. Apenas uma porcentagem pequena dos pacientes fazer uma biopsia, se for necessário
que se queixam de pirose tem lesão da mucosa. Em muitos
casos, a pirose começa durante a noite. A pirose também INDICAÇÕES DE ESOFAGOMANOMETRIA NA DRGE
pode vir acompanhada de dor torácica localizada na região 1. Localizar o EEI de modo a permitir o correto
epigástrica ou retrosternal e frequentemente irradia para a posicionamento do cateter de pHmetria.
garganta, o ombro ou o dorso (pode facilmente ser
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2. Antes da cirurgia antirrefluxo, com o objetivo de avaliar aereto e que a posição de decúbito deve ser evitada por
competência motora do esôfago e determinar o tipo de várias horas depois de uma refeição. A inclinação do corpo
fundoplicatura a ser realizada. para frente por períodos longos também deve ser evitada,
3. Suspeita de algum distúrbio motor associado. porque tende a aumentar a pressão intra-abdominal e
causar refluxo gástrico. Dormir com a cabeceira elevada
➢ Monitoramento ambulatorial do pH esofágico ajuda a evitar refluxo durante a noite.
(pHmetria): é o exame padrão-ouro em que um - Os antiácidos ou uma combinação de antiácidos com
tubo fino com eletrodo de pH é introduzido pelo ácido algínico também são recomendáveis aos pacientes
nariz até o esôfago e o pH é monitorado por 24h com doença branda.. O ácido algínico forma uma espuma
quando entra em contato com o ácido gástrico; se houver
INDICAÇÕES DE PHMETRIA DE 24H refluxo, a espuma em vez do ácido sobe para o esôfago.
1. Sintomas refratários ao tratamento clínico. - Os antagonistas bloqueadores do receptor de histamina
2. Avaliação de sintomas atípicos (ex.: tosse, rouquidão, dor tipo 2 (H 2 ), que inibem a produção de ácido gástrico,
torácica) também são recomendados
3. Documentação da real existência de DRGE antes de uma - Os inibidores da bomba de prótons atuam por inibição
cirurgia antirrefluxo. desta bomba, que regula a via final de secreção ácida.
4. Reavaliação de pacientes ainda sintomáticos após a Esses fármacos podem ser usados pelos pacientes que
cirurgia antirrefluxo. continuam a referir sintomas durante o dia, ou que têm
➢ Endoscopia digestiva alta (EDA): identificar as estenoses recidivantes ou úlceras esofágicas volumosas.
complicações da DRGE, como esofagite (observada - O tratamento cirúrgico pode ser indicado em alguns
em 30-40% dos pacientes), estenose péptica, casos.
esôfago de Barrett e adenocarcinoma. Também é Refluxo gastroesofágico em crianças
útil para o diagnóstico diferencial com as - A capacidade reduzida do reservatório esofágico dos
condições que simulam os sintomas de refluxo. lactentes, combinada com reduções espontâneas e
INDICAÇÕES DE ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA EM frequentes da pressão dos esfíncteres, contribui para o
PACIENTES SUSPEITOS OU DIAGNOSTICADOS COM refluxo. Com 8 meses, o refluxo torna-se menos frequente
DRGE e desaparece com 2 anos, 18 à medida que a dieta da
1. Presença de "sinais de alarme": disfagia, emagrecimento, criança avança naturalmente e ela consegue manter uma
odinofagia, sangramento gastrointestinal e anemia. postura mais ereta. Embora muitos recém-nascidos tenham
2. Sintomas refratários ao tratamento. graus brandos de refluxo, as complicações podem ocorrer
3. História prolongada de pirose (> 5-10 anos): maior risco nas crianças com episódios mais frequentes ou
de esôfago de Barrett. persistentes. Essa condição é mais comum nas crianças
4. Idade > 45-55 anos. com paralisia cerebral, síndrome de Down, fibrose cística e
5. Presença de náuseas e vômitos, história familiar de outras doenças neurológicas.
câncer e sintomas intensos ou noturnos devem levar o - Na maioria dos casos, os recém-nascidos com refluxo
médico a "considerar" a simples crescem normalmente e são saudáveis e seus
realização de EDA. sintomas regridem entre 9 e 24 meses de idade. O refluxo
patológico é classificado em três grupos:
- Os principais diagnósticos diferenciais da DRGE são: 1. Regurgitação com desnutrição
1. Esofagite infecciosa (CMV, HSV, Candida); 2. Esofagite
2. Esofagite eosinofílica; 3. Problemas respiratórios.
3. Dispepsia não ulcerosa;
4. Úlcera péptica gastroduodenal; MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
5. Doença do trato biliar; - Os sintomas da esofagite de refluxo incluem queixa de
6. Distúrbios motores do esôfago; dor ao deglutir, hematêmese, anemia secundária ao
7. Doença coronariana. sangramento esofágico, pirose, irritabilidade e choro
repentino ou inconsolável. As crianças com refluxo
TRATAMENTO gastresofágico frequentemente apresentam dificuldades
- O tratamento do refluxo inclui evitar posições e condições alimentares como recusa ou aversão aos alimentos com
que aumentam o refluxo gástrico bem como evitar determinadas texturas.
refeições lautas e alimentos que diminuem o tônus do - Em alguns casos, a regurgitação está associada a cáries
esfíncter esofágico inferior (p. ex., cafeína, gorduras e dentárias e otalgia recidivante. A dor na orelha parece ser
chocolate), álcool e tabagismo. Os pacientes devem ser devida à irradiação da dor esofágica para a orelha por
orientados a ingerir suas refeições sentados com o corpo meio do nervo vago.
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- Vários sinais e sintomas respiratórios são causados pela


lesão da mucosa respiratória quando o refluxo gástrico
entra no esôfago. O refluxo pode causar laringospasmo,
apneia e bradicardia. Cerca de 50% das crianças asmáticas
podem ter também DRGE.

DIAGNÓSTICO
- O diagnóstico do refluxo gastresofágico dos lactentes e
das crianças maiores baseia-se nas observações clínicas dos
pais e do pediatra. O diagnóstico pode ser confirmado por
exames de dosagem do pH esofágico, esofagografia
radioscópica contrastada e cintigrafia nuclear. Em alguns
casos, a esofagoscopia pode ser realizada para revelar
refluxo e fazer biopsia.

TRATAMENTO
- A primeira linha terapêutica consiste numa combinação
de medidas não farmacológicas, por exemplo: (1) aumentar
a frequência das mamadas, diminuindo o volume em cada
mamada individual; (2) manter a criança em posição ereta
após a alimentação; (3) "engrossar" a fórmula de
amamentação. Nos lactentes maiores e nas crianças, a
elevação da cabeceira do leito e a manutenção da criança
ereta podem ser medidas úteis.
- Em geral, os fármacos não são acrescentados ao esquema
terapêutico antes que o refluxo patológico tenha sido
comprovado por exames complementares.
- Os antiácidos são os fármacos usados mais
frequentemente para tratar refluxo e podem ser
conseguidos facilmente sem prescrição médica.
- Os antagonistas do receptor H2 e os inibidores da bomba
de prótons podem ser usados nas crianças com refluxo
persistente.
- Os agentes procinéticos (p. ex., metoclopramida, um
agonista dos receptores de dopamina tipo 2 e de 5-
hidroxitriptamina [5-HT 3 ]; betanecol, um agonista
colinérgico) estão associados a efeitos colaterais
significativos e seu uso terapêutico não é recomendado.

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