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TEXTOS E CONTEXTOS: divulgação de


pesquisas e de atividades relacionadas à
língua portuguesa

As interações verbais de acordo com Kerbrat-


Orecchioni

A ORGANIZAÇÃO ESTRUTURAL DAS CONVERSAÇÕES

Uma conversação é uma sucessão de turnos de fala regida pela alternância e submetida


 a princípios de coerência interna.

Uma conversação é uma organização que obedece a regras de encadeamento sintático,


semântico e pragmático.

Uma conversação é um texto produzido coletivamente, no qual todos os fios devem de


certo modo se enlaçar.

Os enunciados dos interlocutores devem ser mutuamente determinados.

A GRAMÁTICA DAS CONVERSAÇÕES

Organização global > cenário (script) que embasa o desenvolvimento do conjunto da


interação.
Organização local > encadeamento dos diferentes constituintes do diálogo.

O MODELO HIERÁRQUICO

As conversações são arquiteturas complexas e hierarquizadas, fabricadas a partir de


unidades que são encaixadas umas nas outras, segundo algumas regras de composição.
unidade comunicativa
1. unidade máxima de que apresenta uma
análise > interação evidente continuidade
interna (assunto)
bloco de trocas ligadas
unidades 2. combinadas, por um forte grau de
dialogais constituem as coerência semântica
interações > sequência ou pragmática
(mesmo tema)
3. combinadas,
constituem as menor unidade
sequências > troca dialogal

4. entre dois falantes, contribuição de um


constituem as trocas > falante particular a
intervenção
uma troca particular
unidades
monologais 5. combinados,
constituem as pergunta – convite –
intervenções > ato de promessa –
fala cumprimento

Estrutura interna da troca

1. com uma intervenção > intervenção por meios não-verbais; ausência da segunda
intervenção

2. com duas intervenções > par adjacente: intervenção iniciativa + intervenção reativa
(troca simétrica e troca complementar)

3. com três intervenções > intervenção iniciativa (pergunta) + intervenção reativa


(resposta) + intervenção avaliativa

4. com mais de três intervenções > ciclo de negociações

A RELAÇÃO INTERPESSOAL

Uma interação verbal é uma ação que afeta as relações consigo e com o outro numa
comunicação face a face.

Propriedades da interação verbal

reflexibilidade O emissor da mensagem é, ao mesmo tempo,


seu primeiro receptor.
simetria Todo receptor funciona, ao mesmo tempo,
como um emissor em potencial.
Se um emissor X transmite a um receptor Y uma
informação I, Y tem a possibilidade de
transitividade
transmitir, por sua vez, I a Z, sem ter
vivenciado ele próprio a experiência da validade
de I.

Relação horizontal e vertical

Toda interação se desenrola num certo quadro e põe em presença determinadas


pessoas. (dados externos)

Em toda interação ocorre um certo número de eventos por meio de um certo número de
signos. (dados internos)

Relação horizontal (distância social)

O eixo da relação horizontal é gradualmente orientado, de um lado para a distância, e,


de outro, para a familiaridade e para a intimidade. Essa relação é negociável entre os
interlocutores por meio dos relacionemas (indicadores e construtores da relação
interpessoal).

Relação vertical (relação de poder)

Os interlocutores não são sempre iguais na interação: um pode se encontrar numa alta
posição de dominante e o outro numa baixa posição de dominado. A relação de
lugares depende da produção de taxemas (aparência física, postura, organização do
espaço, formas de tratamento).

POLIDEZ: ASPECTOS TEÓRICOS

A polidez tem a função de preservar o caráter harmonioso da relação interpessoal. Seus


princípios exercem pressões muito fortes sobre a produção dos enunciados.

O modelo de Brown e Levinson

a. noção de “face”

Todo indivíduo possui duas faces:

a face negativa, que corresponde grosso modo ao que Goffman descreve como os
“territórios do eu” (território corporal, espacial ou temporal, bens materiais ou
saberes secretos…)

a face positiva, que corresponde grosso modo ao narcisismo e ao conjunto de


imagens valorizantes que os interlocutores constroem de si e que tentam impor na
interação.
b. A noção de “FTA” (Face Threatening Act)

Em qualquer interação com dois interlocutores, quatro faces se encontram postas em


presença.

Ao longo do desenrolar da interação, os interlocutores são levados a realizar um certo


número de atos verbais e não-verbais.

Atos que o caso da oferta ou da promessa, pelas


ameaçam a face quais se propõe ou se compromete a
negativa do efetuar um ato suscetível de lesar, no
emissor futuro, seu próprio território.

Atos que
ameaçam a face a confissão, a desculpa, a autocrítica e
positiva do outros comportamentos
emissor “autodegradantes”.

as violações territoriais de natureza não-


Atos que verbal (por exemplo, contatos corporais
ameaçam a face inadequados).
negativa do as ameaças territoriais de natureza
receptor verbal: as perguntas “indiscretas”; e atos
inoportunos ou diretivos.

Atos que a crítica, a refutação, a reprovação, o


ameaçam a face insulto e a injúria, a chacota e o sarcasmo
positiva do que colocam em risco o narcisismo do
receptor outro.

c. A noção de face want (desejo de preservação das faces)

Os atos efetuados de ambas as partes ao longo da interação são potencialmente


ameaçadores para os interactantes: “Uns e outros, sejam cuidadosos”.

d. A noção de face work (tudo o que uma pessoa empreende para que suas ações não
impliquem perda diante de ninguém)

Para Brown e Levinson: utilizando diversas estratégias de polidez. A polidez aparece


como um meio de conciliar o mútuo desejo de preservação das faces, com o fato de que a
maioria dos atos de fala são potencialmente ameaçadores para uma dessas faces.

AS MANIFESTAÇÕES LINGUÍSTICAS DA POLIDEZ


Polidez positiva

A polidez positiva consiste exatamente em produzir algum ato que tenha um caráter
essencialmente “antiameaçador” para seu destinatário: manifestação de acordo, oferta,
convite, elogio, agradecimento, fórmula votiva ou de boas-vindas.

Polidez negativa

Evasão: A melhor maneira de ser (negativamente) polido é evitar cometer um ato que,
aparecendo na interação, correria o risco de ser ameaçador para o destinatário (crítica,
recusa etc.).

Suavizadores
voz mansa, sorriso ou inclinação lateral da
de natureza cabeça (que acompanha frequentemente a
paraverbal ou formulação das interpelações ou das
não-verbal refutações).
Suavizadores ato de fala indireto:

de natureza ordem substituída um pedido:


verbal Você pode fechar a porta?;

pergunta que equivale a uma


reprovação: Você colocou todo
esse sal na sopa?.

desatualizadores modais,
substitutivos
temporais ou pessoais:
consistem em
substituir a condicional: Você poderia
fomulação mais fechar a porta?;
direta por uma passado de polidez: Eu queria te
outra mais pedir que … ;
“suave”
apagamento da referência
direta aos interlocutores: O
problema não foi resolvido
corretamente. Não se fuma aqui.

lítotes ou eufemismo:

Não é muito inteligente o que


você acaba de fazer.
enunciado preliminar
(fórmula especializada): por
favor; se for possível; Você tem
um momento?; Posso te dar uma
opinião?
minimizadores: Eu queria
simplesmente te pedir; Você
pode me dar uma ajudinha?; Eu
acompanhantes tenho uma perguntinha pra te
fazer; Me dá um cigarrinho.
são
procedimentos modalizadores: eu
subsidiários penso/creio/acho/tenho a
impressão que… ; me parece
que… ; talvez/possivelmente/
provavelmente; para mim; na
minha opinião (pelo menos).
desarmadores: Não queria te
importunar, mas… ; Fico
embaraçado por te incomodar,
mas… ; Espero que você não me
interprete mal, mas … ;
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Nílvia Pantaleoni
08/04/201308/04/2013

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