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Direitos Fundamentais
A CRP veio sistematizar os direitos fundamentais em direitos, liberdades e garantias em direitos económicos, sociais e
culturais.
Esta sistematização corresponde à divisão presente nos dois pactos internacionais da União Europeia, assinados na
sequência da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão:
Encontramos, porém, outra forma de sistematização dos direitos fundamentais, presente na Carta dos Direitos
Fundamentais da UE, de acordo com os valores fundamentais.
Critério radical subjetivo – de acordo com este critério, os direitos, liberdades e garantias seriam direitos
com referência pessoal ao homem individual, ou seja, como uma função e titularidade subjetiva. Trata-se de
um critério não constitucionalmente adequado, visto que existem alguns direitos, liberdades e garantias que
só podem ser titulados por pessoas coletivas (art. 40º, 54º, 56º e 57º)
Critério da natureza defensiva ou negativa – numa lógica de compreensão liberal, os direitos, liberdades e
garantias seriam direitos que teriam como destinatário o Estado e, como objeto, a obrigação de abstenção
do mesmo relativamente à esfera jurídico-subjetiva dos cidadãos
Trata-se, de novo, de um critério não constitucionalmente adequado:
o Existem direitos, liberdades e garantias que são direitos positivos e ações ou prestações do Estado
(art. 40º e 35º)
o Os destinatários dos direitos, liberdades e garantias não são apenas os poderes públicos, mas
também as entidades privadas (art. 53º e 57º)
o Existem direitos, liberdades e garantias que exigem o cumprimento, por parte do Estado, do dever
de proteção, como o direito à vida (art. 24º/1)
legislativos concretizadores (como é por exemplo o direito à greve). Contudo, aponta para duas dimensões
distintivas dos direitos, liberdades e garantias – a aplicabilidade direta e a densidade normativa suficiente
para valerem na ausência da lei ou mesmo contra ela.
Os direitos económicos, sociais e culturais (Título III), serão os direitos sujeitos ao regime geral dos direitos
fundamentais, mas que não beneficiam do regime especial dos direitos, liberdades e garantias.
Muitos destes direitos consistem em direitos a prestações ou a atividades do Estado, embora alguns possuam uma
natureza defensiva (como o deito de iniciativa privada, art, 61º e 62º) e outros tenham como destinatário não apenas
o Estado, mas também a generalidade dos cidadãos (como o direito dos consumidores, art. 60º e 69º).
Não existem direitos fundamentais apenas formalmente constitucionais, pela mesma lógica segundo qual não
existem normas constitucionais que o sejam apenas a nível formal.
São direitos fundamentais que se encontram fora do catálogo (art. 24º - 79º). Alguns destes direitos gozam de
natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, enquanto que outros se aproximam dos direitos sociais. Ver
exemplo do art. 268º/4.
O art.17º menciona uma categoria de direitos – os direitos de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias.
Estes direitos que, apesar de não constarem no catálogo dos direitos, liberdades e garantias, gozam do seu regime
especial. Podem, assim, encontra-se entre os direitos económicos, sociais e culturais, ou entre os restantes direitos
fundamentais dispersos.
Contudo, a determinação dos contornos destes direitos de natureza análoga não está isenta de dificuldades. O Dr.
Gomes Canotilho propõe a seguinte metódica para captação da natureza análoga de um direito:
O art. 16º/1 consagra o princípio da cláusula aberta, também chamado de princípio de não tipicidade ou da norma
com “fattispiece” aberta, que reconhece a existência de direitos fundamentais fora do texto constitucional. Assim,
em virtude de as normas que os reconhecem e protegem não terem a forma constitucional, estes direitos são
chamados de direitos fundamentalmente constitucionais.
Função de defesa da pessoa humana e da sua dignidade perante os poderes do Estado. Dupla perspetiva:
Direitos enquanto normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo as ingerências
destes na esfera judicial individual
Direitos enquanto faculdades de exercício positivo dos mesmos pelos cidadãos.
Direitos a prestações são direitos do particular a obter algo através do Estado (saúde, educação e segurança social).
Assim, o Estado é chamado a garantir um conjunto de bens fundamentais – Estado Social.
Nesta função, o eixo das relações que se estabelecem já não é entre o indivíduo e o Estado, mas sim entre os
indivíduos. O “outro” pode constituir uma condição de desenvolvimento, mas também uma ameaça. Assim, alguns
direitos impõem um dever ao Estado no sentido de este proteger perante terceiros os titulares de direitos
fundamentais, assegurando uma coexistência pacífica. É exemplo o direito à vida (art.24º), apesar de nele também
podermos encontrar uma dimensão prestacional.
A partir do princípio da igualdade e dos direitos específicos de igualdade constitucionalmente consagrados, deduz-se
a função de não discriminação dos direitos fundamentais. Trata-se aqui, de assegurar que o Estado trata os seus
cidadãos como iguais. Inclui também a função de criar discriminações positivas, como a criação de cotas para a
participação das mulheres na política.
Três notas:
Existe um regime geral de direitos fundamentais. Este regime é comum aos direitos, liberdades e garantias e
aos direitos económicos, sociais e culturais
Existe uma mais valia para os direitos, liberdades e garantias que são próprios destes. Tem uma natureza
análoga – um regime específico.
Princípio da Universalidade
Consiste na sua universalidade, isto é, todas as pessoas, pelo simples facto de o serem, são titulares de direitos
fundamentais. Neste engloba-se:
e apátridas. A equiparação dos cidadãos estrangeiros e dos apátridas aos cidadãos portugueses vale para
todos os direitos, salvo disposição em contrário.
Admitem-se, contudo, exceções a este princípio de equiparação, através da delimitação de círculos de
cidadania – a resposta à pergunta “será que todos têm todos os direitos ?” é negativa.
O nº 4 introduzido com a 2ª Revisão Constitucional, é uma exceção ao nº2 do art. 15º, pois consente a extensão
aos estrangeiros residentes em Portugal de um direito político, a capacidade eleitoral nas eleições dos titulares das
autarquias locais. Este direito está sujeito à cláusula da reciprocidade.
Os direitos fundamentais valem também para os cidadãos não residentes no território nacional, que têm os mesmo
direitos e deveres dos cidadãos portugueses residentes em Portugal, salvo aqueles que sejam incompatíveis com a
ausência do país (algo que terá de ser determinado caso a caso). Os cidadãos portugueses nessas condições também
têm direito à proteção do Estado para o exercício desses direitos, estabelecendo-se uma discriminação positiva.
A Constituição reconhece expressamente a capacidade de gozo de direitos às pessoas coletivas, superando assim
uma conceção de direitos fundamentais exclusivamente centrada sobre os indivíduos. Contudo, é necessário
responder ás seguintes perguntas: qual o sentido de pessoas coletivas usado? Todas as pessoas coletivas gozam de
direitos fundamentais?
As pessoas coletivas não podem ser titulares de todos os direitos fundamentais, mas apenas daqueles que sejam
compatíveis com a sua natureza. Este problema deverá ser resolvido casuisticamente. Não serão aplicáveis, por
exemplo:
Levanta-se a questão da titularidade de direitos por parte das pessoas coletivas de direito público, opondo-se uma
tese negativa e positiva.
Argumento da natureza dos direitos – os direitos fundamentais são direitos de defesa perante os poderes
públicos, logo não faz sentido reconhecer às entidades públicas estes direitos.
Argumento da confusão – se as pessoas coletivas de direito público fossem titulares de direitos, então seriam
simultaneamente titulares e destinatárias dos mesmos
Argumento literal – a Constituição não distingue entre pessoas coletivas de direito público e de direito
privado
Algumas pessoas coletivas gozam de uma posição de infra ordenação em relação ao Estado, podendo como
tal ocorrer situações de conflito entre elas. Assim, as pessoas intraestaduais terão de ser titulares de direitos
fundamentais (exceção de hierarquia)
Direitos fundamentais coletivos – assim como certos direitos fundamentais pressupõem uma referência
humana, não sendo suscetíveis de gozo e exercício por parte de pessoas coletivas, também existem na
Constituição cuja titularidade é inerente às pessoas coletivas como tais (arts. 40º - direito de antena, 54º, 56º
e 57º)
Direitos fundamentais de exercício coletivo – existem também direitos cuja titularidade é individual , mas
que só se podem exercer coletivamente (exemplo do direito à greve)
A distinção do direito privado entre capacidade de gozo de direitos (ou titularidade) e capacidade de exercício não
terá qualquer utilidade no direito constitucional. Por um lado, porque não faz sentido reconhecer direitos
fundamentais insuscetíveis de ser exercidos; por outro lado, esta restrição pode ser um expediente para a restrição
inconstitucional de direitos.
Princípio de Igualdade
Um dos princípios estruturantes do regime geral dos direitos fundamentais é o princípio da igualdade, que tem como
base o princípio da dignidade social de todos os cidadãos. Considera-se que o princípio da igualdade é um dos
princípios estruturantes do sistema constitucional, visto conjugar dialeticamente as dimensões liberais, democráticas
e sociais do Estado de Direito democrático e social:
Dimensão liberal – ideia de igual status social de todas as pessoas independentemente do nascimento,
perante a lei, geral e abstrata
Dimensão democrática – ideia de igualdade na participação da vida política
Dimensão social – eliminação das desigualdades de facto para se assegurar uma igualdade material
Esta igualdade é, desde logo, a igualdade formal – que também recebe o nome de liberal ou jurídica –, que
corresponde ao que está consagrado no art.13º/1. Assim, podemos afirmar que a Constituição acolhe a versão
historicamente adquirida da fórmula clássica do princípio da igualdade, que veio pôr fim ao sistema de privilégios do
antigo regime e se traduz na exigência de igualdade de aplicação do direito.
Mas o alcance da proteção constitucional do conteúdo, quer quanto ao âmbito, quer quanto ao conteúdo, não fica
por aqui. Num dado momento da História, o Estado “cão de guarda noturno” entra em crise e exige-se, para além de
uma igualdade formal – igualdade perante a lei –, uma igualdade material – igualdade na criação e através da lei.
Constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, como princípio
negativo de controlo. Assim, existirá observância de igualdade quando indivíduos ou situações iguais não são
arbitrariamente tratados como desiguais, e assim este princípio tem de andar sempre ligado a um fundamento
material ou critério material objetivo. Este critério costuma ser sintetizado em 3 notas:
1. Fundamento sério
2. Sentido legítimo
3. Estabelecimento de uma diferenciação jurídica com fundamento razoável
Contudo, a vinculação do legislador ao princípio da igualdade não elimina a sua liberdade de conformação legislativa,
pois a ele pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações que poderão funcionar como
elementos de referência a um tratamento igual ou desigual.
Consagrado no art. 13º/2, não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe
diferenciações de tratamento.
Consagra um conjunto de fatores discriminatórios ilegítimos, que correspondem aos mais frequentes e
historicamente mais significativos. Contudo, esta lista não tem um carácter exaustivo, sendo puramente enunciativo.
Assim, exige-se que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança
jurídica, da proporcionalidade e da justiça, não se baseando num motivo constitucionalmente impróprio.
Vem compensar a desigualdade de oportunidades, confirmando a função social do princípio de igualdade, ou seja, o
dever de atenuação das desigualdades fácticas (sociais, culturais e sociais) pelos poderes públicos, através de
discriminações positivas.
Diferenciação e discriminação não são conceitos equivalentes pois, numa situação de diferenciação, não existe
necessariamente discriminação. A discriminação negativa é uma diferenciação ilegítima, enquanto que discriminação
positiva já é um tipo de diferenciação legítima.
É outra manifestação do princípio da igualdade, que afirma que estes devem ser objeto de igualdade material. O seu
sentido tendencial é o seguinte:
Ao lado do princípio geral da igualdade, que encontra a sua positivação constitucional no artigo 13º, a Constituição
consagra um conjunto de direitos específicos ou especiais de igualdade, que visam efetivar o princípio material de
igualdade. Estes direitos específicos valem como lex speciallis relativamente ao princípio geral, e como tal
sobrepõem-se ou têm preferência sobre os preceitos do art. 13º/1 que vale como lex generallis.
O princípio constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, plasmado no art. 20º da CRP, é um direito
fundamental. Aí se vê o acesso ao direito dos tribunais, e mais precisamente o direito de fazer-se acompanhar por
advogado perante qualquer autoridade.
Os direitos, liberdades e garantias e os direitos de natureza análoga beneficiam de um regime específico, ou seja,
uma disciplina jurídico-constitucional específica que goza dos seguintes traços caracterizadores:
Aplicabilidade direta
Esta cláusula de aplicabilidade direta ganhou inspiração na Lei Fundamental de Bona, e implica o fim da doutrina das
liberdades.
Os preconceitos dos direitos, liberdades e garantias vinculam as entidades públicas, princípio este que não pode ser
uma particularização do princípio geral da constitucionalidade, sendo conotado com a aplicabilidade direta. Esta
cláusula exige uma vinculação sem lacunas, ou seja, abrangendo todos os âmbitos funcionais, e deve ser entendida
de duas perspetivas:
A primeira das “entidades públicas” a ser vinculada é o Estado em sentido estrito, ou seja, o legislador, a
administração/governo e os tribunais.
Vinculação da administração a administração está obrigada a respeitar e dar satisfação aos direitos fundamentais.
Contudo, coloca-se o problema de saber se a administração está obrigada, no caso de uma lei violar um direito
fundamental, a preferir a Constituição à lei – conflito entre o princípio da constitucionalidade e da legalidade. À
administração não é reconhecido o poder de fiscalização da constitucionalidade das leis, mesmo se dessa aplicação
resultar a violação dos direitos fundamentais. Assim, são reconhecidas algumas exceções – pois, as entidades
administrativas devem:
No caso de violação de um preconceito consagrador de direitos, liberdades e garantias, optar pela não
decisão imediata do problema e a apresentação do caso aos superiores hierárquicos;
Optar pela prevalência das normas constitucionais quando a observância do princípio da legalidade conduzir
à prática do mesmo crime (art. 271º/3)
Não praticar atos aplicadores da lei violadora de direitos, liberdades e garantias sempre que estes se
defrontem com o direito de resistência de particulares (art.21º)
Vinculação do poder judicial a vinculação dos tribunais pelos diretos, liberdades e garantias concretiza-se através
da conformidade, em sentido formal e material, das normas consagradoras destes direitos.
Os preceitos dos direitos, liberdades e garantias vinculam também as entidades privadas, adquirindo assim eficácia
geral. Esta eficácia também nas relações entre particulares pressupõe uma conceção dos direitos fundamentais
incompatível com a tese liberal, que via nestes direitos exclusivamente direitos de defesa perante o Estado,
relevantes apenas nas relações entre este e os particulares. Assim, a eficácia dos direitos, liberdades e garantias não
é apenas vertical, mas também horizontal.
Importa esclarecer se a eficácia dos direitos fundamentais na relação entre particulares é imediata ou mediata:
• Eficácia imediata – a vinculação das entidades privadas é absoluta e ocorre de forma direta, sem necessidade de
mediação do legislador
• Eficácia mediata – a vinculação das entidades privadas afirma--se apenas através da lei.
O texto da Constituição não faz qualquer restrição, afirmando que os direitos fundamentais são “diretamente
aplicáveis e vinculam as entidades (...) privadas”. Podemos, portanto, concluir que os direitos têm uma eficácia
imediata perante as entidades privadas.
Também se pode discutir se esta eficácia vale para todas as entidades privadas. Apesar de terem sido defendidas
conceções restritivas, entende--se que, como a Constituição não faz qualquer restrição, a eficácia vincula todas
as entidades, à exceção daqueles direitos que, expressamente ou pela sua natureza, só valem perante o Estado.
O regime específico dos direitos, liberdades e garantias não exclui a possibilidade de restrição, por via de lei, do seu
exercício – porém, submete tais restrições a vários requisitos. Para que uma lei restritiva seja constitucionalmente
legítima, é necessária a verificação cumulativa das seguintes condições:
• A restrição seja exigida por essa salvaguarda, seja apta e se limite à medida necessária para alcançar esse fim;
Para além destes quatro pressupostos materiais, a validade das leis depende ainda de três requisitos formais:
• A lei deve ser uma lei da AR ou, quanto muito, um decreto--lei autorizado.
• Limites constitucionais expressos ou imediatos – casos em que a própria Constituição estabelece um limite
ao âmbito potencial de determinado direito fundamental.
• Limites constitucionais mediatos – casos em que a Constituição remete para a lei apenas a delimitação, geral ou
específica, do âmbito de um determinado direito fundamental.
o Que a definição de tais limites seja o único meio de resolver conflitos de outro modo insuperáveis;
o que tais limites reduzam o âmbito do direito antigo apenas na medida necessária
Só nos casos expressamente previstos na Constituição podem ser restringidos os direitos, liberdades e garantias e só
a lei os pode restringir.
O legislador não tem, no ordenamento jurídico--constitucional português, uma autorização geral de direitos,
liberdades e garantias. A lei fundamental individualizou expressamente os direitos que podem ficar no âmbito de
uma lei restritiva. Esta autorização de restrição expressa tem como objetivo levar o legislador a procurar nas normas
constitucionais o fundamento concreto para o exercício da sua competência de restrição, visando criar segurança
jurídica.
• Princípio da proibição do excesso (ou proporcionalidade em sentido amplo) (art. 18.º/2). O princípio da
proibição do excesso está associado a três exigências:
o Adequação – a medida restritiva tem de ser apropriada para a prossecução dos fins invocados pela lei.
o Necessidade – a medida restritiva tem de ser exigível, ou seja, deve--se evitar a adoção de medidas que não
sejam necessárias para obterem os fins de proteção visados pela Constituição e pela lei.
A generalidade e a abstração são dois requisitos cumulativos para a legitimidade das leis restritivas de direitos,
liberdades e garantias.
o Uma lei geral é aquela lei que se dirige a uma generalidade de pessoas, sendo o contrário da lei
o Uma lei abstrata é a lei aplicável a um conjunto indeterminado de casos, sendo o contrário da lei concreta,
aplicável apenas a um caso ou a um número determinado.
Contudo, não basta que as leis sejam formais ou aparentemente gerais e abstratas, importa que o sejam
material e realmente. Assim, as leis individuais e/ou concretas camufladas em forma geral e abstrata – leis que
formalmente contêm uma normação geral e abstrata, mas, segundo o conteúdo e efeitos, se dirigem a um círculo
determinado ou determinável de pessoas – são ilegítimas. Apesar das modernas figuras de lei – leis-medida, leis-
plano e leis-grupo – não estarem constitucionalmente proibidas noutros domínios, não podem restringir direitos,
liberdades e garantias.
•Proibição da retroatividade
Apesar de a proibição da retroatividade admitir exceções no ordenamento constitucional português, é--o de forma
absoluta no que respeita a leis restritivas de direitos, liberdades e garantias.
Assim, as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias não se podem aplicar a situações ou atos passados,
mas apenas aos verificados após a sua entrada em vigor:
o A proibição incide sobre a retroatividade autêntica ou retroatividade, em que as leis afetam posições
jusfundamentais já estabelecidas no passado.
o A proibição abrangerá também alguns casos de retroatividade inautêntica ou retrospetividade sempre que as
medidas se revelem arbitrárias, inesperadas, desproporcionadas ou afetarem direitos de forma excessivamente
imprópria.
A ideia fundamental deste requisito é aparentemente simples: existirá um núcleo essencial dos direitos, liberdades e
garantias que não pode ser violado. Contudo, este preceito suscita vários problemas.
o O objeto de proteção
O primeiro problema consiste em saber qual o objeto de proteção da norma, ou seja, se esta protege o
conteúdo essencial da garantia geral e abstrata (teoria objetiva) ou, antes, o conteúdo essencial da proteção
jurídica e essencial da posição jurídica e individual de cada cidadão (teoria subjetiva). A expressão “preceitos
constitucionais” parece apontar para uma teoria objetiva – todavia, a proteção do núcleo essencial não pode
dispensar uma dimensão subjetiva dos direitos fundamentais.
o O valor da proteção
Outro problema é o de saber se o conteúdo essencial é uma realidade de natureza absoluta ou relativa, isto é, se só
se pode conhecer em cada caso concreto, mediante uma ponderação de bens ou interesses concorrentes (teoria
relativa), ou se ela possui uma substancialidade própria, independentemente da colisão de interesses verificada
no caso concreto (teoria objetiva). Também aqui não há alternativas radicais – se, por um lado, a teoria subjetiva
acabaria por reduzir o núcleo essencial ao princípio da proporcionalidade, por outro, a teoria absoluta esquece
que a determinação do âmbito de proteção de um direito pressupõe necessariamente a equação com outros
bens, havendo a possibilidade de o núcleo de certos direitos ser relativizado. A indicação do direito
constitucional positivo parece apontar para a aceitação tendencial de uma teoria mista.