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Filologia Românica II

Questionário I
1) Explicite os conceitos de Romania, Romania Vetus, Romania Nova e língua
românica, comentando os fatores históricos e linguísticos envolvidos nos
mesmos.
Entende-se como Romania o conjunto de línguas românicas derivadas do
latim, dividindo-se da seguinte forma: línguas românicas nacionais (espanhol, francês,
italiano, português e romeno), regionais (catalão e galego) e provençais (reto-românico
e sardo).
A Romania Vetus se configura em espaço territorial que compreende
Portugal, Espanha, França, um trecho da Bélgica e da Suíça, Itália e Romênia. Assim,
com a expansão de países europeus a partir do período renascentista, as línguas
portuguesa, francesa e espanhola foram transportadas à porções notáveis Américas,
África, Ásia e Oceania, oportunidade na qual se fundou a Romania Nova. Nesta, estas
línguas europeias (português, francês e espanhol) tornaram-se língua materna de nações
dotadas de grande influência, e por conseguinte, desempenharam importante papel no
processo de oficialização destas línguas.
Importante, neste contexto, definir o conceito também de línguas nacionais,
línguas oficiais e línguas regionais.
A língua nacional é aquela definida como sendo a dominante de uma nação,
e guarda relação com um Estado politicamente constituído, sendo, dessa forma, um item
de caracterização política e social, inexistindo, no entanto, vínculo direto entre Estado e
língua nacional.
Já a língua oficial é aquele eleita como língua a ser utilizada em contextos
oficiais nacionais e /ou internacionais, ganhando, desta forma, status jurídico. Assim,
em muitos casos, se há coincidência entre a língua nacional e a língua oficial, como no
caso da França e Portugal, em que tanto a língua nacional como a língua oficial são,
respectivamente, o francês e o português.
As línguas regionais são aquelas consideradas como veículo de expressão
em regiões autônomas de influências, como a Catalunha e a Galizia, nas quais se fala,
respectivamente, catalão e galego.
Também se pode mencionar a língua crioula como sendo a mescla das
línguas oriundas da interação dos idiomas faladas em países europeus com outras
línguas nativas ou importadas, como ocorreu no caso de pessoas escravizadas trazidas
da África ao Brasil, aos quais o português era a língua imposta e eles a aprendiam de
forma improvisada, sem a composição gramatical e ou fonética entendida como
adequada, misturando-a com elementos de sua própria língua ao tentar se comunicar em
português e, assim, fazendo nascer uma terceira língua.
2 – Explique e fundamente com base em exemplos a seguinte afirmação do texto:
“...o português, o espanhol e o italiano têm muitas semelhanças, enquanto o francês
apresenta particularidades que os separam das outras três línguas. Por isso, o leitor
lusófono deverá conhecer especialmente a distância que separa sua língua do
francês”. A resposta deverá contemplar os níveis ortográfico, fonético,
morfológico, sintático e lexical.

É um fato notório que, dentre as línguas neolatinas nacionais, o português,


o espanhol e o italiano guardam, entre si, maiores similaridades que o francês, que,
por conta de sua ortografia arcaica, permite o estabelecimento de uma espécie de
“europeu comum”, mostrando uma dada homogeneidade cultural ocidental.
Todavia, as diferenciações também se estendem à esfera morfossintática, fonética e
léxica, Vejamos:

A nível ortográfico, temos a seguinte situação: ao passo que o português, o


espanhol e o italiano estão mais próximos da correspondência direta entre letras e
fonemas, o francês apresenta uma ortografia arcaica, incoerente e imprevisível
quando observadas juntamente com a pronúncia das palavras. Seria o caso, a título
exemplificativo, do conjunto de palavras advindo do grego em ‘ph’, pronunciadas
em [f], ‘th’, pronunciadas em [t], e ‘ch’, pronunciadas em [k], como em pharmacie,
thêàtre e chronologie, sendo que as demais línguas românicas procedem à
substituição destes grupos por f, t e c.

Também se pode acrescer a esta diferenciação o fato de que o francês conta


com palavras que possuem consoantes, ao final destas, que não se pronunciam,
como em: pendant, dehors, chevaux, de modo que, no caso dos verbos, as
desinências verbais são graficamente demonstradas, mas, a nível fonético, não se
diferenciam.

É de se destacar que a mesma vogal nasal [ã] pode ser representada de


formas gráficas diversas, a saber: an (banc), am,(camp) en (vent), em (temps), ean
ou aon (taon).

Por outro lado, apesar das diferenças fonéticas, esta grafia permite
reconhecer as semelhanças existentes entre o francês e as demais línguas românicas,
estabelecendo entre si uma relação de origem comum, como de observa de palavras
francesas como sang (sangue), dent (dente) e temps (tempo).

A nível fonético, o português, o espanhol e o italiano contam com acentos


tônicos que se enquadram nas categorias de oxítonas, paroxítonas e proparoxítonas,
podendo estas apresentar valor distintivo, como cántara (“cântara”) e cantara (verbo
cantar no imperfeito do subjuntivo) em espanhol; dúvida e dúvida em português,
sendo certo que, na língua italiana, o acento tônico gráfico somente é exigido no
caso das oxítonas. No entanto, nenhuma destas regras é aplicável ao francês, que
encontra sua acentuação na última sílaba pronunciada, o que lhe confere uma
entoação demasiadamente distintiva das demais línguas neolatinas. Neste particular,
outra peculiaridade da língua francesa se consubstancia no seu sistema vocálico,
cuja pronúncia se dá com o arredondamento dos lábios (como nas palavras tour,
môle e molle).

Em termos de morfologia, é possível dizer que o latim é uma língua


sintética, ou seja, que se expressa através de um número menor de palavras, ao
passo que as línguas românicas são classificadas como analíticas, razão pela qual
suas unidades significativas se partem em diversos palavras singulares, sendo o
francês a mais analítica dentre as quatro línguas neolatinas.

Assim, em nível sintático, significa dizer que o francês demanda o uso de


mais palavras na formação de uma frase; isso porque a línguas românicas não
herdaram do latim as suas declinações, que possibilitavam a expressão da função
gramatical através de desinências, e, por conseguinte, a utilização de menos palavras
para a composição de uma frase. Nesse passo, para suplantar a ausência de
declinações, estas línguas se valem de artigos e preposições. No que toca à forma
verbal, a deriva não foi demasiadamente impactada, de maneira que o português, o
italiano e espanhol carregaram, do latim, a marca da pessoa verbal, tornando
possível a omissão do sujeito da frase (ex.: dõ – latim; dou – português; doy –
espanhol; e do - italiano; o francês, pelo contrário, com o passar dos séculos, tendeu
ao apagamento, na forma falada, das desinências verbais, tornando, assim, essencial
o emprego dos pronomes pessoais, sob risco de ausência de compreensão com
relação à pessoa da fala (ex.: parle, parles, parlent, que uma guardam o mesmo
som, apesar se tratarem de 1ª e 2ª pessoa do singular e 3ª pessoa do plural,
respectivamente).

No caso da marcação do plural, o francês também diverge das demais


línguas em questão, haja vista que estas marcam seus respectivos plurais através da
utilização de desinências próprias, também marcadas na fala, enquanto o francês,
por não distinguir, majoritariamente, em termos de fala, o singular do plural (ex.:
ami e amis são pronunciados de forma idêntica), esta marca deve vir através dos
possessivos, demonstrativos e artigos (ex.: un ami – singular - e des amis – plural).

Outra situação a ser considerada é o caso do aumentativo e diminutivo que,


no português, espanhol e italiano é formado a partir da utilização de sufixos, ao
passo que o francês, com exceção dos diminutivo -ette e do aumentativo-pejorativo -
ard, se vale de adjetivos situados antes das palavras, como em une petite fille (uma
menininha em português, una ragazzina em italiano e una niñita em espanhol). O
mesmo se aplica aos superlativos, conforme observamos dos exemplos: altíssimo
(português), altísimo (espanhol), altissimo (italiano) e très haut ou extrêmemant
haut em francês.
Na parte do léxico, verifica-se que o francês também se distancia um tanto
do português, espanhol e italiano. Tomando por exemplo, levando em conta a grafia
e o significado, a palavra perigo em português, peligro em espanhol e pericolo em
italiano, temos o correspondente em francês como danger (que se assemelha ao
inglês). Da mesma maneira temos a palavra casa em português, espanhol e italiano,
cujo correspondente em francês é maison.

No entanto, apesar do distanciamento, ainda se consegue estabelecer uma


relação entre as línguas neolatinas e sua origem através de vocábulos tais quais
parte e muro (português, espanhol e italiano) e part e mur em francês. Há outros
casos em que a similaridade é mais tênue, tornando mais difícil a percepção quanto
à origem latina, como nas palavras populares olho (português), ojo (espanhol),
occhio (italiano) e oeil (francês); já outras palavras de origem latina tidas como
cultas e retomadas em momentos diversos da história, mas mantendo a estrutura
latina, como em ocular (português e espanhol), oculare (italiano) e oculaire
(francês), todas advindas de oculare (latim), tornam evidente a relação entre si e sua
origem.

Portanto, em termos lexicais, conclui-se que o francês, ao mesmo tempo em


que se aproxima, até certo ponto, das demais línguas românicas, também guarda
suas semelhanças com a língua inglesa.

3) Responda, sempre com justificativas que contemplem as quatro línguas em


estudo, qual(is) dessas mesmas línguas apresenta(m)

a) tendência à ditongação do e e do o breves e tônicos;

O latim contava com 05 (cinco) vogais breves e 05 (cinco) vogais longas.


Com a passagem dos anos, a ditongação alterou em alguns casos, a vogal, da
seguinte forma: não houve ditongação em português; todavia, quando se dá nas
demais 03 (três) línguas, o e breve torna-se ie, ao passo o que o o breve ganha a
forma de ue em espanhol, uo em italiano e eu em francês, como se verifica dos
exemplos abaixo:

Latim Português Espanhol Italiano Francês

Novum Novo Nuevo Nuovo Neuf

b) tendência à queda do n intervocálico;

Na língua portuguesa, não se verifica, atualmente, a presença do n


intervocálico, como se verifica da passagem de corona (latim) para coroa
(português). Em alguns casos, todavia, é possível observar a grafia do n entre
vogais, mas não desacompanhado – em vinho, por exemplo, o n vem acompanhado
do consoante h.
Em se tratado do português, a tendência é a desanalização e, por
conseguinte, a queda do n intervocálico, como se vê também das passagens de
lanam (latim) para lã (português) e manum (latim) para mão (português).

No caso do espanhol, italiano e francês, é possível afirmar que o n


intervocálico foi mantido, como se nota do quadro abaixo exposto:

Latim Espanhol Italiano Francês

Coronam Corona Corona Couronne

Lanam Lana Lana Laine

É de se mencionar que, no caso do francês, apesar da existência do n


intervocálico em palavras como couronne (que contou com o acréscimo de um
segundo n), a formação intervocálica do n não é absoluta, como se vê dos seguintes
vocábulos: plein, main e vin.

c) tendência à passagem do f inicial a h;

A passagem do f para o h é uma característica da língua espanhola que a


diferencia das demais línguas neolatinas, que, via de regra, mantiveram o f inicial
oriundo do latim, como disposto do quadro abaixo:

Latim Português Espanhol Italiano Francês

Factum Feito Hecho Fatto Fait

Farinam Farinha Harina Farina Farine

Furnum Forno Horno Forno Four

Fames Fome Hambre Fame Faim

d) afinidade entre si, no que diz respeito ao léxico;

No que toca ao léxico, é possível observar a existência de semelhanças


entre as quatro línguas românicas, inobstante o francês seja a língua mais distante
dentro deste espectro e o grupo hispano-português seja mais próximo entre si do que
em comparação com as demais.
Tomando por exemplo, levando em conta a grafia e o significado, a palavra
perigo em português, peligro em espanhol e pericolo em italiano, temos o
correspondente em francês como danger (que se assemelha ao inglês). Da mesma
maneira temos a palavra casa em português, espanhol e italiano, cujo
correspondente em francês é maison.

A relação hispano portuguesa fica mais evidente em alguns casos, como no


do verbo matar, comum ao português e ao espanhol, ao passo que o correspondente
italiano se traduz em uccidere e, em francês, tuer, com os quais não se consegue
estabelecer facilmente uma relação. Nesse particular, também é possível falar na
formação de um subgrupo franco-italiano, como no caso do verbo manger em
francês e mangiare em italiano, ao passo que, tanto em português quanto em
espanhol, se utiliza o verbo comer.

No entanto, apesar do distanciamento, ainda se consegue estabelecer uma


relação entre as línguas neolatinas e sua origem através de vocábulos tais quais
parte e muro (português, espanhol e italiano) e part e mur em francês. Há outros
casos em que a similaridade é mais tênue, tornando mais difícil a percepção quanto
à origem latina, como nas palavras populares olho (português), ojo (espanhol),
occhio (italiano) e oeil (francês); já outras palavras de origem latina tidas como
cultas e retomadas em momentos diversos da história, mas mantendo a estrutura
latina, como em ocular (português e espanhol), oculare (italiano) e oculaire
(francês), todas advindas de oculare (latim), tornam evidente a relação entre si e sua
origem.

e) um sistema de consoantes geminadas, sendo que a duração desses fonemas tem


valor distintivo.

A língua italiana conta com um sistema completo de consoantes geminadas,


razão pela qual estas possuem valor de duração distintivo, como observado nas palavras
cappello e capello, cammino e caminho, pena e penna, pala e palla, cujos significados
entre si são absolutamente diversos. Tal característica torna mais fácil, para o estudante
de língua italiana, a compreensão de sua escrita e de sua fonética, haja vista que as
sílabas que possuem consoante duplicada devem ser pronunciadas de forma prolongada,
de maneira que, ao ler a palavra, o estudante saberá pronunciá-la, e a escutando, saberá
como escrevê-la.

O mesmo não ocorre com as demais línguas românicas. No caso do


espanhol, o sistema de consoantes geminadas se apresenta com as letras ‘l’ e ‘r’. Neste
particular, interessante mencionar que, na hipótese de duplicação da letra ‘l’, não se fala
em duração do valor distintivo do fonema, mas em verdadeira alteração fonética, como
se vê em lunes (pronunciado [l′unes]) e lluvia (pronunciado [λ′ubja]). Em relação ao ‘r’,
também não se fala em prolongamento de fonemas contendo consoantes geminadas,
mas de um pronunciamento mais acentuado destes, como em morir (pronunciado [mor
′ir]) e guerra (pronunciado [g′er̄ a]).

Já no português, podemos tomar por exemplo a palavra sossego, inexistindo


o prolongamento da sílaba que é grafada com ‘ss’, de maneira que o primeiro ‘s’ é
pronunciado de forma exatamente igual ao ‘ss’. O mesmo se aplica ao francês, como
vemos de donner e donation e salle e sale, não havendo prolongamento da sílaba que
contém as consoantes duplicadas. Todavia, também é de se observar, na língua francesa,
uma particularidade relativa à letra ‘s’, que, quando duplicada, deixa de soar como ‘z’ e
passa a soar como ‘s’, havendo, também, mudança no significado das palavras, como se
vê em poison (veneno) e poisson (peixe) e caser (guardar) e casser (quebrar).

4) Exponha os conceitos de patrimônio hereditário comum, formas divergentes,


criatividade lexical por recursos morfológicos e empréstimo linguístico. Essa
exposição também deve dar conta das possíveis relações entre esses conceitos e os
processos que levaram a disparidades, similaridades, intercâmbio e
enriquecimento do léxico dessas línguas.

Nos termos propostos pela Gramática Comparativa Houaiss: Quatro Línguas


Românicas, temos que patrimônio hereditário comum se consubstancia no fundo
compartilhado de vocábulos, de origem latina, pelas quatro línguas neolatinas, como se
pode observar dos exemplos abaixo:

Latim Português Espanhol Italiano Francês

Partem Parte Parte Parte Part

Murum Muro Muro Muro Mur

Cymam Cima Cima Cima Cime

Em outras palavras, é possível afirmar que o patrimônio hereditário forma uma


pequena porção do léxico atual destas línguas. Neste quadro, vê-se a semelhança entre
tais, inobstante o desgaste fonético que fez desaparecer, no caso francês, o ‘e’ e o ‘u’ de
partem e murum, ao passo que, no português, espanhol e italiano, o ‘e’ de partem
permaneceu e o ‘u’ se transformou em ‘o’. No tocante à cyman, vemos que o ‘a’
permaneceu em português, francês e italiano, ao passo que transformou em ‘e’ não
pronunciado na língua francesa. Assim, apesar da evolução linguística ao longo dos
séculos, tem-se a percepção das palavras em sua origem comum. Há outros casos em
que a similaridade é mais tênue, tornando mais difícil a percepção quanto à origem
latina, como nas palavras populares olho (português), ojo (espanhol), occhio (italiano) e
oeil (francês).

As formas divergentes se apresentam no léxico das línguas românicas como


espécie de revisitação daqueles que utilizavam as palavras pela via escrita, tais quais
cientistas, juristas, sacerdotes e poetas se valham do patrimônio hereditário com o
objetivo de descobrir novos vocábulos que transponham novas perspectivas ou como
fonte de enriquecimento textual. Para tanto, desconsidera-se as alterações fonéticos
promovidas ao longo do tempo para retomar o estágio desta palavra em latim.

Nesse passo, a divergência se dá da origem latina para as novas palavras


criadas, como vê-se de circulus (latim), do qual se originou cerchio e circolo (italiano),
ambos guardando o sentido de “círculo”. Igualmente, da palavra legitimus (latim),
derivou-se lindo e legítimo em espanhol e português, caso em que as palavras
apresentam sentidos diversos.

Outro exemplo pode ser dado com a palavra pensare (latim), considerando o
fato de que e todos os grupos consonantais formados por ns, a consoante s desapareceu
da fala na época do Império Romano, passando, portanto, a ser pronunciada pesare. Daí,
obteve-se pesar (português e espanhol), pesare (italiano) e peser (francês), todos com o
sentido de “mágoa”. Neste caso, é possível supor que eram concomitantes, na época
latina, a pronúncia popular pesare e a erudita pensare.

Assim, comparando-se as línguas neolatinas, conclui-se que é possível haver


uma simetria de vocábulos, passível de rompimento por empréstimos entre si.

A criatividade lexical demonstra como o vocabulário pode ser enriquecido


através do processo de derivação de palavras, com a utilização de prefixos e sufixos, do
regresso à origem latina em suas palavras eruditas e pelos empréstimos linguísticos de
outras línguas, seja por espécie de apropriação de vocabulário externo ou contato com
este. Desta maneira, não há equívoco em afirmar que a criatividade lexical é de caráter
ilimitado para a formação de vocábulos.

Exemplifiquemos: se tomarmos por base a palavra partem em latim, no sentido


de sair de um lugar para outro, teremos: partir (português, espanhol e francês) e partire
(italiano). Com o acréscimo de um prefixo, podemos formar, por exemplo, repartir
(português e espanhol), ripartire (italiano) e repartir (francês). Com o acréscimo de um
prefixo e um sufixo à palavra base tomada como exemplo, temos um outro significado:
repartição (português); repartición (espanhol), ripartizione (italiano) e répartition
(francês).

Dessa forma, temos várias palavras que foram retiradas do latim e


posteriormente encaixadas ao contexto das chamadas “línguas vulgares”, em alguns
casos a partir da utilização de prefixos e sufixos oriundos do latim, criando, assim,
resultados românicos similares, nas quatro línguas, ao modelo latino em termos
morfológicos e semânticos, como em particular (português e espanhol), particolare
(italiano) e particulier (francês). Consequentemente, a criatividade lexical por recursos
morfológicos costuma resultar em espécie de paralelismo entre os vocábulos das quatro
línguas, eis que formadas a partir da utilização dos mesmos prefixos e sufixos. Por outro
lado, é de se mencionar que outras palavras, como partir no sentido de quebrar,
inexistem no francês ou italiano, apesar de recorrente no português.

Por fim, o empréstimo linguístico é tido como uma outra maneira de


enriquecimento do acervo lexical, e possui relação direta com o intercâmbio linguístico.
É o que se verifica de implicare (latim) em relação à empregar (português), impiegar
(italiano), employer (francês) e emplear (espanhol), tendo sido emplear adquirido por
via empréstimo do francês empleiir na Idade Média.

Inclusive, é de mencionar que tal fato aconteceu na época dos descobrimentos,


quando os portugueses apresentaram à Europa vocábulos inéditos, tais quais
“mandarim”, “banana” e “coco”. Noutro giro, a França, no período conhecido como
‘século das luzes’, considerando a grande força política exercida na Europa, também foi
exportadora de numerosas palavras, bem como a Itália na época do Renascimento,
notadamente no universos das letras e das artes. A título exemplificativo, apresenta-se a
palavra sonetto (italiano), que ingressou no português e no espanhol como soneto e, no
francês, como sonnet.

Em termos musicais, o italiano reinou até o século XIX. O espanhol também


exerceu considerável influência nos séculos XVI e XVII, tendo fornecido, inclusive, ao
francês, diversas palavras, tais quais bravoure, camarade e tabac, e o italiano, como se
vê de piccaro e disinvoltura.

No entanto, o empréstimo linguístico não necessariamente ocorre apenas entre


as línguas europeias, mas também pode advir de fora. É o caso dos arabismos trazidos
pelos mouros quando da ocupação da Península Ibérica entre os anos de 711 até 1610,
como se vê de almotacé (português – em desuso), almotacén (espanhol) e al-muhtacib
(árabe); azeite (português), aceite (espanhol) e az-zait (árabe), tendo os arabismos, em
muitos dos casos português e espanhol, conservado o artigo árabe al.

Também há arabismos nas línguas francesa e italiana, porém, com menos


frequência, e, normalmente, sem a presença do artigo árabe al, como em: sukkar
(árabe), zucchero (italiano) e sucre (francês).

5) Comente, à luz da abordagem proposta na Gramática Comparativa Houaiss, a


seguinte citação de Umberto Eco (In La ricerca della lingua perfetta, apud Brito et
al., 2010): “Uma Europa de poliglotas não é uma Europa de pessoas que falam
correntemente muitas línguas, mas, na melhor das hipóteses, de pessoas que podem
encontrar-se falando cada uma a própria língua e compreendendo a do outro e que,
apesar de não saberem falá-la de forma fluente, a entendem mesmo com alguma
dificuldade e compreendem o “gênio”, o universo cultural que cada um exprime
falando a língua dos seus antepassados e da sua tradição.”

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