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DLCV – FFLCH / USP

FLC0276 – Morfologia do Português I


Profa: Flaviane R. Fernandes Svartman

AULA 1:
MORFOLOGIA: NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
§ Objeto de estudo da morfologia:
1. Introdução: o objeto de estudo da morfologia o A forma interna das palavras, i.e., a estrutura
o A relação formal entre as palavras
“A morfologia, como disciplina da linguística, trata da forma interna o Os princípios que regem a formação de novas
das palavras, mais precisamente de sua estrutura” (Ortega, 1990:3). palavras

“Morfologia é o estudo da estrutura interna das palavras” (Jensen, 2. Alguns conceitos introdutórios
1990:1).
2.1. Palavra e vocábulo (cf. Monteiro, 2002)
§ Morfologia: § Termos utilizados indistintamente para designar um conjunto
o [morf(o)], do grego morphē “forma”, + [logia], do de fonemas que expressam significado:
grego logía “estudo”
o Parte da gramática que estuda a forma das palavras (1) /l/ + /u/ + /t/ + /a/ = luta “combate”
§ Forma = estrutura
§ Estrutura: contém elementos intimamente o Porém:
relacionados
§ Palavras: (i) constituídas por unidades (2) /d/ + /e/ = de “?” - apenas exerce função de relacionar dois
menores que, combinadas, produzem um termos1
significado; (ii) exercem uma função em cada
enunciado onde aparecem § Assim:
§ Forma, função e significado: elementos o Palavra: vocábulos que apresentam significado
solidários e interdependentes lexical

“Forma é o aspecto sob o qual se apresenta um elemento linguístico, 1


Função: aplicação que uma forma tem na língua em vista de seu valor
com a abstração do seu sentido e função” (Carreter, 1962). grammatical – Cf. Câmara Jr., 1968.

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§ Formas livres (podem existir sozinhas num “Um morfema pode ser definido como ‘unidade gramatical mínima
enunciado): nomes, verbos, pronomes distintiva’, uma subunidade da palavra, que não pode ser
o Vocábulo: palavras e instrumentos gramaticais significativamente subdividida em termos gramaticais” (Lang,
§ Instrumentos gramaticais: formas dependentes 1990:22).
(não funcionam isoladamente num enunciado)
- artigos, preposições e conjunções “Os morfemas são as menores unidades significativas que podem
constituir palavras ou partes de palavras” (Nida, 1962: :§1.1).
“Toda palavra é vocábulo, mas nem todo vocábulo é palavra”
(Monteiro, 2002:12). “Morfema é a menor parte indivisível da palavra que, por sua vez,
tem uma relação direta ou indireta com a significação” (Dokulil, ap.
§ Vocábulo X palavra2 ≅ lexema X categorema (cf. Carvalho, Vachek, 1970:49).
1974)3
§ Morfema:
2.2. Morfe e morfema o Menor unidade formal dotada de significado
“Os morfemas são os elementos mínimos das emissões linguísticas o Compõe-se de um ou vários fonemas e destes se
que contêm um significado individual” (Hockett, 1967:§14.1). distingue por apresentar significado
o Unidade abstrata que pode apresentar variações
“Um morfema é a unidade mínima no sistema de expressão que pode formais
ser correlacionada diretamente com alguma parte do sistema do
conteúdo” (Gleason Jr., 1978:58). (3) vida [vid] e vital [vit]

§ Morfe:
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Para Azeredo (2000:69), o termo “palavra” se aplicaria tanto a “lexemas” quanto o Realização de um morfema – sequência fonêmica
aos instrumentos lexicais e “vocábulo” seria a forma concreta com que cada mínima a que se pode atribuir um significado
palavra, lexical ou gramatical, ocorre nas frases.
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Cabe ressaltar que, entre os categoremas, Carvalho inclui os pronomes e os
§ Alomorfe:
advérbios (excetuando-se os de modo), além dos artigos, preposições e o Realização de um morfema, quando há mais de um
conjunções. tipo de realização

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§ Analogia entre: § Constitui o núcleo semântico da palavra e costuma ser


o Morfema e fonema chamado de “semantema”
o Morfe e fone § Parte comum a um grupo de palavras aparentadas pelo
o Alomorfe e alofone vínculo de significação

2.3.Semantema e morfema (5) [caval]: cavalo, cavalar, cavalariça, cavalaria, cavaleiro,


§ Semantema: cavalete
o Parte da palavra em que se concentra o significado
lexical, confundindo-se com o que se denomina de b. Morfema derivacional
raiz § Prefixos, infixos e sufixos que possibilitam a criação de
o Espécie de morfema que se opõe aos demais por novas palavras a partir de uma forma primitiva
concentrar o núcleo significativo da palavra o Forma primitiva: vocábulo através do qual se
§ Num conceito amplo: originam outros através do processo de derivação
o Morfema é qualquer unidade linguística dotada de o Formas secundárias: vocábulos derivados
forma e significado
o O semantema é um tipo de morfema que se combina (6) a. cavalo: forma primitiva
com outros para a realização ou circulação do b. cavaleiro: forma secundária – caval + [eiro]
vocábulo entre os falantes da língua (morfema derivacional)
§ Num conceito restrito: c. cavalaria: forma secundária – caval + [aria]
o Morfema – elementos que se opõem ao semantema (morfema derivacional)
o Semantema – parte fundamental ou núcleo
significativo do vocábulo c. Morfema categórico
§ Também chamados de morfemas flexionais ou morfemas
(4) “belíssimas” : semantema [bel] e morfemas [íssim], [a] e [s] gramaticais
§ Não criam novas palavras, apenas indicam as flexões que as
2.4. Classificação dos morfemas formas assumem
a. Morfema lexical

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§ Tem como função permitir que as formas se apresentem nas e. Morfema classificatório
diversas categorias próprias dos nomes ou dos verbos4 § Não acrescentam ao significado do vocábulo
§ Servem para definir estrutura, se nominal ou verbal
(7) a. peru + [a] èo morfema [a] assinala o feminino § Função gramatical: situa o vocábulo num paradigma,5
b. peru + [s] èo morfema [s] assinala o plural agrupando-o numa estrutura nominal ou verbal
c. and + [o] èo morfema [o] traduz a noção da
primeira pessoa do singular: (eu) ando (9) a. [menin] + [o] è vogal temática que marca a classe
dos nomes
b. [cadeir] + [a] è vogal temática que marca a classe
d. Morfema relacional dos nomes
§ Funcionam como elo entre duas palavras: c. [doente] + [e] è vogal temática que marca a classe
o Preposições dos nomes
o Artigos
o Conjunções (10) a. [estud] + [a] + [r]: [a] è vogal temática que marca
o Pronomes relativos a primeira conjugação verbal
§ Formas livres, morficamente autônomas b. [corr] + [e] + [r]: [e] è vogal temática que marca a
§ Apresentam possibilidade de intercalação (8a) ou de segunda conjugação verbal
disjunção (8b) c. [ca] + [i] + [r]: [i] è vogal temática que marca a
terceira conjugação verbal
(8) a. livro de João; livro de teu grande amigo João
b. me chamo João; chamo-me João 2.5. Outras denominações
§ Gramema e lexema
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o Na terminologia de Pottier:
Entenda-se aqui categoria como flexão. Para os nomes, há as categorias de
gênero (categoria divida nas subcategorias de masculino e feminino) e número
(categoria divida nas subcategorias de singular e plural) e, para os verbos, as
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categorias de modo, tempo, aspecto, número e pessoa, dividas em diversas O termo paradigma aqui empregado se refere a um conjunto de unidades
subcategorias. linguísticas que se opõem umas às outras por sistemas de oposição.

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§
Gramema: morfema gramatical, formas presas o Morfe e morfema
(afixos) ou formas soltas (artigos, preposições e o Semantema e morfema
alguns advérbios) o Classificação dos morfemas
§ Lexema: unidades de base do léxico e pertencem § Morfema lexical
a inventários ilimitados e abertos, dado que novos § Morfema derivacional
radicais podem ser criados § Morfema categórico
§ Glossema e plerema § Morfema relacional
o Glossema: equivale ao morfema e é identificado como § Morfema classificatório
uma invariante irredutível, uma forma mínima não sujeita o Gramema e lexema
a novas divisões o Glossema e plerema
o Plerema: unidade do conteúdo que permite um número o Monema e sintema
infinito de variantes
§ Plerema central: tema ou radical 3.2. Leitura obrigatória
§ Plerema marginal: afixo MONTEIRO, J. L. Noções introdutórias. In: MONTEIRO, J. L.
§ Monema e sintema Morfologia Portuguesa, 4a. edição revista e ampliada. Campinas:
o Monema: unidade significativa mínima (cf. Henri Frei), Pontes, 2002, p. 11-20.
equivalente ao morfema
o Sintema: complexo formado de monemas ligados Referências bibliográficas citadas
§ Signo linguístico que resulta da combinação de AZEREDO, J. C. Fundamentos de gramática do português. Rio de
outros, mas se comporta como se fosse um único Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
monema CÂMARA, JR. J. M. Dicionário de filologia e gramática. 3a. ed.
São Paulo: J. Ozon, 1968.
3. Considerações finais CARRETER, F. L. Diccionario de términos filológicos. Madrid:
3.1. Sumário Gredos, 1962.
§ Objeto de estudo da morfologia CARVALHO, J. G. H. Teoria da Linguagem. Coimbra: Atlântida, t.
§ Alguns conceitos introdutórios II, 1974.
o Palavra e vocábulo

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JENSEN, J. T. Morphology. Word Structure inGenerative Grammar.


Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins, 1990.
MONTEIRO, J. L. Morfologia Portuguesa. 4a. edição revista e
ampliada. Campinas: Pontes, 2002.
ORTEGA, S. V. Fundamentos de morfología. Madrid: Editorial
Sintesis, 1990.

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Exercícios sobre a aula “Morfologia – noções introdutórias”

1. Na tabela abaixo, quais pronomes não são formas livres? Justifique sua resposta.
Pronomes pessoais – Pronomes pessoais Pronomes pessoais
caso reto oblíquos átonos oblíquos tônicos
eu me mim
tu te ti
ele, ela se, lhe, o, a si
nós nos
vós vos
eles, elas se, lhes, os, as

2. Na produção das palavras “pe[t]rificar” e “pe[d]regulho”, a variação entre “t” e


“d” pode ser considerada um caso de alomorfia ou alofonia? Justifique sua
resposta.

3. Classifique os morfemas das palavras segmentadas abaixo:

a) arvor – ed – o – s
b) form -os – ur – a
c) camis – ol -inh – a – s
d) mar – inh – eir – o
e) and -á -va – mos

4. Na palavra “danças”, o morfema “s” pode expressar mais de um significado


gramatical. Identifique esses dois significados.

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