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pp. 103-...
Argumento contra o qual incide: a razão da percepção é o objeto; a percepção constitui o objeto,
o que aparece como uma explicação. Mas MP se pergunta: como se deu a casa dada? As
hipóteses clássicas pressupõem que o objeto já está dado. No argumento, o que vem primeiro,
a percepção, ou o objeto enquanto casa perceptível? Essa casa que se dá a perceber não existe
se não for percebida.
Há um pressuposto aqui: Husserl: a correlação. Se não houver alguém que perceba, não há
objeto, mas, sem o objeto como algo a ser percebido, não há percepção.
Porque a própria figura é cambiável, posso perceber a casa como uma diferença. Não é a sua
atenção que constitui e muda o percebido. O percebido tem uma lógica própria. Porém, se o
órgão perceptor não tivesse tal constituição, não seria possível a percepção. Corpo e percepção
são ativos e passivos. Há a solicitação e quem recebe o estímulo: ambos são atos. Há uma
prefiguração do objeto, o que escapa à hipótese do sujeito moderno.
O objeto não me afeta, mas se prefigura em relação a mim. O objeto e a percepção formam-se
ao mesmo tempo.
Hipótese contra a qual incide: a própria casa e a percepção independente; há, de um lado, a
casa; de outro, as perspectivas sobre a casa. A casa, para essa hipótese, é a síntese* de suas
perspectivas; coisa e fenômeno são separados.
MP: ver um objeto é tê-lo ou na margem ou no centro de um campo, como figura ou como
fundo. Fixar: palavra pouco precisa. A terminologia, por vezes, não contribui para a exposição
neste livro; ver livros posteriores. Por exemplo, “a casa não é um objeto”.
A percepção participa da totalidade, não a constitui, como em Husserl.
O fundo é percebido na medida em que a própria coisa, a figura, o traz.
“A linguagem poética de MP ajuda a entender o conceito.” (Alex)
Quando percebo a mesa, eu a “fixo”, passo a perceber a mesa em suas relações. Horizonte
interno e horizonte externo. Não há, precisamente, fixação, um ponto: há um jogo de relações
no objeto que se relaciona com as demais relações “externas”. Para que algo apareça, outro algo
tem de se esconder. Se não houvesse relação, a referência, não haveria o percebido.
Só há figuração se há o velamento de alguma outra coisa, que vai para a margem (trata-se da
lógica do percebido). É um jeito poético de falar de figura e fundo. Percebemos estruturas e não
pontos, entidades isoladas.
O tempo funda algo de uma vez por todas, e esse algo fundado tem por testemunha todos os
objetos no tempo. O tempo é um só fluxo que se transforma. Cada momento traz o seu passado
e antecipa o futuro, o presente será uma transformação ao futuro, que, por seu turno, se
transformará em passado. É uma unidade e uma mudança; há fundação e retomada; a cada
visão, está fundada no presente, mas, ao mesmo tempo, está condenada a passar. Há o passado
eminente e o futuro eminente na própria coisa. É como os lados da mesa que não são vistos,
mas estão em eminência de serem percebidos. Os horizontes gerais têm uma eminência que
constituem o presente. É quase como se eu não visse o presente, mas a passagem. Não vemos
só o presente, na medida em que ele carrega seus horizontes; nisso, a percepção reconhece seus
horizontes. Não há ponto no espaço, tampouco o há no tempo.
Na transição, no fluxo, a percepção capta um campo desse fluxo e “a chamo de presente”. A
mesa permanece porque nunca foi um ponto, mas sim um fluxo.
O presente tem um horizonte de retenção daquilo que passou. Pensemos os momentos do tempo
como um campo de horizontes. Uma vez instituído um momento, ele será sempre retomado
necessariamente, toda a cadeia o retomará – a cada novo presente, de um modo distinto. O
passado é sempre carregado de modos distintos, com maior ou menor força, conforme for um
passado mais próximo ou mais distante.
Não há possibilidade de uma síntese porque os horizontes são abertos. A lógica do tempo é
aberta – até chegar a um horizonte anônimo. Um passado recente tem uma presença no presente,
enquanto um mais distante tem outra: mais diluída. Quanto mais distante, mais anônimo. Se
houvesse uma síntese definitiva, o tempo pararia, seria eternidade.
Eu entro numa perspectiva que remete aos horizontes, como no presente, e essa lógica me dá
mais do que aquilo que eu realmente vejo, o que configura a unidade do objeto e faz com que
seja percebido como algo. Os horizontes garantem esse êxtase. Um perfil remete para fora de
si espontaneamente (êxtase). Essa perspectiva (da mesa) abre para os horizontes não vistos, e
essa referência faz com que o campo de relações “mesa” seja percebi como algo.
Graças a isso, eu crio a ilusão de objeto, fundando a ideia de totalidade: eis a origem do erro
daquelas duas hipóteses ou vertentes advindas da modernidade.