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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA - FACULDADE DE DIREITO - 2018.2


MARIANA SOARES SANTOS
AULA 1 – 22/08/2018
Contatos: 71988987728; juridicoabr@gmail.com
Bibliografia
CPP comentado - Renato Brasileiro - Juspodium
Curso de Processo Penal - Eugenio Paceli - Atlas
Iniciação ao PP - Fauzi H Choukr - E do Direito
Introdução aos fundamentos do PP - Elmir Duclerc - E. Do Direito
Processo Penal, V. 1 - Fernando Tourinho F. - Saraiva
Manual de P. P - Fernando Tourinho F - Saraiva
Processo Penal - Gustavo Badaró – Revista dos Tribunais
Manual de Processo e Execução Penal - G. Nucci – Forense (Crítica)
DPP – Aury Lopes jr – Saraiva
Mitologia processual penal – Rubens Casali – Saraiva
Processo penal do espetáculo – Rubens Casali
Criminologia Crítica – Vera Regina Pereira de Andrade
Ano: processo penal tem passado por reformas/mudanças, e muitas leis de 2016/17/18 (13.641/2) alteraram o processo
penal brasileiro. 2011: prisão preventiva.
Curso: mais complexo, denso. Manual: mais resumido.
Sites interessantes
Jusbrasil
Conjur
STF e STJ
Empório do Direito
IBCCRIM (boletim periódico)
IBRASPP
IBADPP (@misaelfranca)
CONPEDI
Texto do primeiro debate: Jacinto Nelson Coutinho – Por que sustentar a democracia no sistema processual penal
brasileiro? emporiododireito.com.br e pasta
O processo penal brasileiro tem leis esparsas, que extrapolam o CPP.
AVALIAÇÕES
1 prova – 10, toda discursiva, 4 questões, bem fundamentadas, sem consulta (não exige literalidade dos artigos, número de
art./súm, mas sua compreensão). Só cobra o dito em sala de aula. Calendário normal da faculdade. Peso 4.
2 avaliação, 10 pontos no total – bipartida. Duas notas: 7 em uma prova individual no cronograma normal da faculdade –
talvez seja objetiva ou talvez nos mesmos moldes, 3 pontos de trabalho. Sempre há um tema. Tema: processo penal e
segurança pública. Tema a ser tratado a luz da estatística. Setor do direito: jurimetria, aplicação da estatística ao direito.
Trabalho com pesquisa empírica. Trabalho se divide em 4 etapas. 1: coleta de dados (30 julgados sobre segurança pública,
pode ser recurso extraordinário, mandado, ação penal, habeas corpus, qualquer procedimento, pode ser plenário ou
fracionário, não há linha do tempo, do STF – perceber o entendimento da corte superior sobre uma questão que está no
início, no sistema de segurança pública). 2: análise dos dados (concluir, extrair, inferir a partir dos 30 julgados, qual a
tendencia do STF no tema de segurança pública; STF respeita ou desrespeita a CF?). 3: elaboração de relatório descritivo,
resumo das etapas anteriores, discriminar quais julgados, sobre qual tema, constatação. Neste relatório é necessário trazer
considerações de quatro obras – 1)quem matou eloá? Doc disponível no YouTube (mídia e segurança pública em SP), 2)
vida bandida, doc disponível no YouTube (saga de Leonardo Pareja, aborda segurança pública, polícia civil), 3)
engenharia reversa, black mirror (inspirado no combate a terroristas, mas pode ser relacionado com o sistema de
segurança pública atual) e 4) texto necropolítica, necropoder, e biopoder (pasta da xerox), Achille Mbembe (opção
política pela morte de parcela da sociedade para satisfazer os interesses de outra). 4: apresentação disso em seminário na
Congregação (5 de dezembro: quarta-feira, seminário, 9h da manhã). Peso 6. Trabalho por grupo – grupo 1 coleta de
dados, entrega para o grupo 2 que vai fazer a análise e entregar para dois destinatários – grupo 3 e a turma de processo 2
de seg e qua a noite. 15 alunos coleta, 15 outros para análise, 15 outros para fazer relatório final de modo que no

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seminário só 5 farão. Só haverão 5 oradores para a turma toda. Mini relatório ao final de cada etapa. Cada mini grupo terá
uma nota.
Modificou: 3 grupos de 20 alunos de livre arranjo, cada um fará o levantamento de 10 julgados do STF sobre o tema
segurança pública. A análise desses dados: 1 relatório que toma por base as 4 obras já citadas e o relatório final e a
conclusão do levantamento de dados tem que levar a participação de todos. Dia 5: seminário em que dois representantes
de cada grupo explanarão sobre os seus trabalhos, sendo que o prof estabelecerá a data do sem. (5 de dezembro) e outra
para entregar a análise dos dados e o relatório – sem fala quem fez o quê ainda (31 de outubro); entregamos para prof e ele
entrega para a turma de processo 2. Especificar indivíduos no relatório final, em novembro (21 de novembro) – deve
constar a análise dos dados, as conclusões que extraíram com base nos elementos das 4 obras citadas e a participação
individual de cada componente do grupo. Segurança pública: polícia – rosto do processo penal no sistema, tudo começa
pela polícia, é a primeira agência da execução penal.
AULA 2 – 27/08/2018

INTRODUÇÃO AO PROCESSO PENAL BRASILEIRO


“PATRIMÔNIO AUTORITÁRIO”
Existem dois marcos históricos que revelam na legislação processual penal o que pode ser denominado
patrimônio autoritário, na obra “O ponto cego do direito”. O nosso processo penal traz uma herança autoritária, e isso
significa que é uma legislação que traz regras/perfil antigarantista. É voltada para a imposição de um discurso em
detrimento dos direitos e garantias fundamentais de uma parcela da população. O processo penal brasileiro desde as
suas origens veicula um discurso de poder. Crimes, enquanto ofensas mais graves, tornam a situação mais preocupante.
Esse patrimônio autoritário ajuda a compreender porquê o perfil da legislação é antigarantista.
O primeiro marco: 1500, século XVI. Com o processo de colonização do país, com o que se convencionou
chamar de descoberta do Brasil. Houve grande resistência indígena a imposição da cultura da metrópole. Isso passou pela
legislação portuguesa que foi importada para o Brasil. O Código de Processo Criminal do Império confere amplos
poderes ao juiz em 1832: pode o juiz ordenar diligências de ofício mesmo sem as partes requererem, assim como
produção de provas de ofício. Era um sistema inquisitório: acumulo de poderes nas mãos do juiz. O CPPI vem com
essa característica. Em Portugal vigiam as Ordenações Filipinas à época, que tinham regras de caráter violento.
Código Criminal de 1890: vadiagem e capoeira tinham pena de prisão, isso após a liberdade dos escravos. Na
Bahia se perseguia terreiros de candomblé.
Há ainda outro marco importante, pois retrata o ano em que foi decretado o nosso CPP vigente - em 1941 há
decreto 3.689 que é o nosso CPP atual. Ele traz características autoritárias e antigarantistas – basta lembrar em 1937,
Getúlio Vargas como presidente que fechou o Congresso e implementou o Estado Novo no Brasil, e outorgou a polaca,
pedindo um CPP que fosse inspirado no Código Penal da Itália fascista. Traz, portanto, um perfil marcadamente
inquisitorial com um juiz que acumula poderes de julgador e acusador, se imiscuindo dos interesses das partes .
Apesar desse perfil antigarantista foi bastante arrojado e complexo, além de bem elaborado para a época, tanto que
continua vigente. Foi recepcionado por uma nova ordem constitucional em 1988 e aí está. Getúlio Vargas foi muito
inteligente, pois se de um lado foi ditador, por outro, em 1943, dá a CLT aos brasileiros.

NECESSIDADE DE CONSTITUCIONALIZAÇÃO
Dilema: em 1988, uma nova ordem constitucional, apesar das polêmicas, surge. É promulgada uma Constituição
federal apelidada de cidadã, pelos valores que possui. A CF/88 tem rol extenso de direitos e garantias fundamentais em
seu art. 5º, além dos outros pulverizados ao longo do texto constitucional. Há um novo paradigma, portanto, que passa a
existir no Brasil. Dilema: o que fazer com o CPP antigarantista em uma nova ordem constitucional que preza pelos
valores da pessoa humana? O rol do art. 5º consagra valores que devem convergir para a satisfação dos interesses da
pessoa humana. A ideia é que todos os ramos do ordenamento jurídico, inclusive o Direito Penal e o Processo Penal,
devem obediência e lealdade à Constituição Federal. O indivíduo nasce com valor inerente à ele, inalienável que
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impede que ele seja utilizado como meio para consecução de fins externos à ele. Indivíduo não pode ser objetificado, não
pode ser meio para fins do Estado. O individuo é um fim em si mesmo, e todas as ações do Estado devem se encontrar no
horizonte dignidade da pessoa humana – visão kantiana.
Dá pra chamar de neoconstitucionalismo – ideia de que a CF reassume o seu papel de norma primeira de um
ordenamento jurídico, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, e já na Primeira Guerra Mundial, com as
Constituições de Bohn e do México. Há retomada da CF como lei suprema de um país. Surge carga de valores que se
dissemina por todo o ordenamento jurídico visando a satisfação da dignidade da pessoa humana. É possível vislumbrar
esse contexto nos moldes do garantismo penal/processual penal – ideia de que a punitividade do Estado deve frear
diante dos direitos e garantias fundamentais do individuo. A ideia passou a ser racionalizar o poder publico de punir,
que não pode ser arbitrário. Os direitos e garantias fundamentais surgem como barreira para a capacidade de punir do
Estado.

O “NOVO CPP”
Como juntar um CPP fascista, que flexibiliza direitos e garantias fundamentais, além de reunir amplos poderes
nas mãos de juízes (chega a prever no art. 385 que o juiz pode condenar mesmo se o MP pedir absolvição, posição
defendida pelo STJ; art. 198, tacitamente revogado, segundo o qual o silêncio do acusado não importa confissão, mas o
juiz pode levar esse silêncio e em consideração na hora de decidir; que estabelece que a vítima pode ser conduzida
coercitivamente, dentre outros - como o juiz que pode ordenar diligências de ofício e busca e apreensão ainda que
nenhuma das partes peça isso) com a nova ordem constitucional de 1988? Reformas pontuais foram feitas no CPP, por
meio de diversas leis que procuraram alterar o CPP na tentativa de aproximar o códigos 41 com a CF/88, nem
sempre houve êxito do legislador. Se considerar todo o histórico do sistema inquisitorial desde o século XIII, não dá pra
diluir 8 séculos de inquisitorialismo por meio de uma lei. Há patrimônio autoritário que dificulta a democratização do
processo penal, uma cultura antigarantista, autoritária, arraigada na legislação brasileira que não se demove com
uma caneta do legislador infraconstitucional. São diversas leis, microssistemas jurídicos processuais penais.
Lei 10.792/03: esforço do legislador infraconstitucional para poder compatibilizar o CPP/41 com a CF/88. A ideia
é de que se nós recepcionamos o CPP/41, que foi forjado em outro contexto sócio politico, tem que harmonizá-lo com a
nova ordem constitucional de 88, com microreformas. O procedimento comum ordinário começa após o oferecimento da
denúncia/queixa, juiz recebendo a denúncia (inicial acusatória) abre o prazo de 10 dias para a defesa se manifestar. Com a
resposta na mão, o juiz pode entender que é caso de absolvição sumária e acaba o processo, decisão de mérito. Se não,
audiência de instrução e julgamento. (Art. 400 à 405 do CPP). Primeiro: ouve ofendido. Depois: testemunhas, peritos,
acareações se necessário (confronto de depoimentos), reconhecimento de pessoas e coisas, interrogatórios, alegações
finais e por fim sentença.
Há mais de um procedimento, mas essa é a regra, e é o que se aplica supletivamente no silêncio da lei especial.
Essa lei colocou o interrogatório onde este está, pois depois vem as alegações finais com debates para preparar para a
sentença.
O interrogatório passou a ser o último ato da instrução penal, antes dessa lei era o primeiro . Em 2003
remanejou o interrogatório como último ato da instrução criminal. Interrogatório: meio de prova e defesa, para estudiosos
da USP. É quando o acusado/a vai falar, contar sua versão, exercendo a sua autodefesa, que é um braço/corolário da
ampla defesa.
Em que medida remanejar o interrogatório de primeiro ato para último ato homenageia a CF/88? No Processo
Penal a defesa sempre fala por último, para garantia do contraditório, e para zelar pela ampla defesa, para ter
noção do que a ele está sendo imputado. Para a defesa é muito melhor falar por último do que primeiro – em cima só
tem a denúncia, é o único parâmetro para se defender, enquanto por último tem um leque muito mais amplo para elaborar
a tese defensiva. Nesse aspecto, essa lei procurou homenagear o contraditório e a ampla defesa, que são garantias
fundamentais previstas no art. 5 da CF/88.
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Leis 2008 – 11.689 (alterou tribunal do júri, que teve seu procedimento alterado); 11.690 (alterou a disciplina das
provas no processo penal) e 11.719 (alterou o procedimento comum ordinário): na primeira delas, quanto ao tribunal do
júri, é preciso entender que o procedimento do júri é bifásico.
1) Primeiro procedimento perante o juiz presidente e depois
2) Perante o conselho de sentença.
No primeiro, começa com o oferecimento de uma denúncia pelo MP e só há a segunda fase se houver decisão
chamada de pronúncia – se o acusado for pronunciado, haverá a segunda fase. Se não, o processo termina na primeira.
Na segunda fase, sete jurados vão decidir quanto a absolvição ou condenação de alguém que cometeu crime doloso
contra a vida, tentado ou consumado. Antes disso: MP tinha que apresentar o libelo – peça. Haviam duas petições,
portanto, a denúncia que começava e libelo do crime acusátorio, outra petição destinada aos jurados que devia espelhar
toda a denuncia. Com essa lei, essa peça foi suprimida. Como isso homenageia a CF/88? Tentativa de desburocratizar o
procedimento, tornar mais célere. A duração razoável do processo, no art. 5º – tem que ser célere, econômico,
transitar só pelo tempo necessário. Ter duas petições é burocratização que não se coaduna com a ideia de duração razoável
de processo.
Outra alteração do júri: o conselho de sentença é formado por sete jurados e o juiz presidente, quem condena ou
absolve são os sete jurados. Ao final dessa fase todos eles se reunem em uma sala secreta, cada jurado com duas cédulas,
uma com a palavra sim, outra com a não. O juiz pergunta quanto a materialidade delitiva: no dia x de x de xxxx,
aconteceu acidente que vitimou x e x? Passa uma urna e recolhe os votos. O juiz computa. Antes: podia ter
unanimidade. Reforma de 2008 mudou: 4 votos iguais nãos zeram. Não vai conhecer os outros votos. Antes podia
ter 7 a 0, o que revela quem votou contra, o que ofendia a CF/88 na medida em que o sigilo é um dos princípios do
júri. Não tem como garantir o sigilo (princípio constitucional do júri) com 7 a 0. Agora, não tem mais. Essa mesma lei
suprimiu o recurso chamado de protesto por novo júri, que era um recurso exclusivo da defesa nas condenações
superiores a 20 anos. Essa lei extinguiu esse recurso, o que diminuiu as chances de defesa no processo penal. Nem sempre
a tentativa de aproximar o código da CF teve êxito.
Lei 12.403/11: “nova lei de prisão e liberdade provisória”. A alteração mais importante dela foi estabelecer que a
prisão preventiva passa a ser a ultima ratio das cautelares pessoais. Prisão preventiva é especie de prisão provisória (que é
gênero: prisão temporária, preventiva, em flagrante/medida pré cautelar). Na prática: o poder judiciário tem uma série de
medidas cautelares mais brandas antes da prisão, só decreta prisão no ultimo caso, se for adequada e necessária e as
outras medidas mais brandas não forem suficiente para garantir a regularidade do processo penal. É uma medida cautelar
pessoal pois incide na liberdade de alguém, no individuo, acusado. Submeteu, portanto, a prisão preventiva aos
parâmetros de proporcionalidade. Não é suficiente dizer isso e nada adiantaria dizer isso se não houvesse catálogo de
quais medidas devem ser decretadas antes da prisão preventiva.
A mesma lei, no art. 319, elencou diversas outras medidas menos severas. Do cotejo entre os arts. 282 e 319, o
resultado é que o poder judiciário diante de um indivíduo que responde processo, para resguardar este, deve verificar se
não é caso de monitoração eletrônica, fiança, prisão domiciliar, proibição de se ausentar da comarca sem autorização
judicial, obrigação de comparecer em juízo para dar satisfação das suas atividades periodicamente, e em último caso, se
isso não for suficiente, prisão preventiva. O juiz pode cumular medidas cautelares, decretar dois.
Isso homenageia a CF/88 ao homenagear a presunção de inocência, que é princípio que se direciona ao poder
judiciário e à imprensa. Quem ainda não teve sentença transitada em julgado deve ser tratada como inocente. A mesma lei
que garantiu isso também disse no art. 311 que o juiz pode decretar a prisão preventiva de ofício - o que é isso se não
resquício inquisitorial que revela patrimônio autoritário do nosso código? Quem vai aplicar a lei é o indivíduo, que
traz em si ideologias, o que vai na caneta na hora de sentenciar. Tem que romper os paradigmas antes. Substituir o
patrimônio autoritário por liberdade.

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REALIDADE E PERSPECTIVAS
Para alguns a nossa CF é programática, apenas simbólica, com um programa que não sai das promessas. Isso por
conta do paradigma do patrimônio autoritário. A necessidade de constitucionalização esbarra em uma realidade que tem
dificultado a concretização do projeto do constituinte de 88 no que se refere ao Processo Penal. A ideia que nós
vivenciamos em dias atuais é de que a criminalidade avança, os criminosos se aprimoram e para combater a impunidade
nesse contexto o Estado também tem que se aprimorar na investigação criminal, com leis penais mais duras, tipificando
mais condutas, criar mais crimes, aumentar penas, na tentativa de trazer um ambiente seguro para parcela hegemônica da
sociedade. Segurança pública: segurança de alguns em detrimento da flexibilização de garantias de outros.
Essa ideia de aumento do sistema punitivo, depósito de todas as fichas no sistema de justiça criminal, pode ser
conhecida como eficientismo penal. Algo cunhado nos EUA, que foi responsável pela tolerância zero quanto ao crime.
O Estado tem que ser eficiente sob pena de favorecer a impunidade, então é preciso endurecer o sistema. Também é
conhecido como punitivismo, a ideia de que precisa se preocupar com a punição, e aí vem a imagem de alguém algemado
ou encarcerado, como se o sistema penal se restringisse a prisão de alguém.
A racionalidade moderna é que o Direito Penal tem que ser prima ratio do controle social, não última. As
soluções só podem ser encontradas no sistema punitivo. Analisando precedentes disso, se depara com a expressão
sociedade risco, oriunda do processo de globalização econômica. A sociedade que favoreceu a criminalidade também
clama por segurança pública. O direito não se dissocia da economia, o processo penal tem todo um discurso de poder
pautado em lógica mercadológica (gestão dos indesejáveis). Encarcera uma parcela para garantir a liberdade de outros
(necropolítica). Essa realidade tem dificultado o implemento da constitucionalização.
O “PROCESSO PENAL DE EMERGÊNCIA/DO ESPETÁCULO”
No eficientismo o processo penal tem que ser rápido, porque a condenação tem que vir logo para dar satisfação a
uma sociedade que clama por segurança pública. Consequencialismo penal está nesse contexto. O Processo Penal de
emergência não tolera o respeito a garantias fundamentais. A academia e a advocacia são ‘’obstáculos’’ a isso. Há
ainda a satanização do advogado criminal, além da vulnerabilização do indivíduo. Rebaixamento de standards
probatórios, atenuando o rigor do juiz quanto a provas. Se processo rápido fosse justo, a santa inquisição estava cheia de
bons exemplos – não tinha defesa.
O Processo Penal de emergência tem que ser do espetáculo, expressão de Rubens Casali. Essa ideia vem da
expressão sociedade do espetáculo, que tem a ver com civilização do espetáculo. A ideia é que não vale a pena, não é
suficiente que o processo seja rápido, ele tem que apresentar os seus resultados à sociedade. Tem que apresentar
algemado à imprensa, denominar operações policiais (colocar entre aspas e fazer rodapé explicando o que é, pois o CNJ já
determinou que não é algo a ser usado formalmente), dentre outros. A espetacularização é proibida por lei, mas é algo
recorrente.
AULA 3 – 29/08/2018
PERSPECTIVAS DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
REALIDADE X PERSPECTIVAS
A realidade é pautada numa racionalidade penal moderna, que traz preocupação punitivista, eficientista, mas
existem perspectivas para a modernização ou democratização do nosso processo penal. Há um projeto de Novo Código
Penal, projeto 8.045/10, que adveio do 156/09, iniciando no Senado Federal. Ao ser remetido para a câmara recebeu o
numero 8.045/10. Está em discussão no CN e, por ser complexo e polêmico, ainda não foi concluído. Tem sofrido
emendas diversas, além de ser alvo de diversas discussões e debates sobre as suas propostas.
Há a figura do juiz de garantias, que é uma figura que deve zelar pelos direitos e garantias fundamentais na
primeira fase da persecução penal, na fase de investigação criminal. Existirão dois juízes, portanto. Hoje temos um juiz só
que atua nas duas fases. O juiz de garantias vai funcionar só na primeira fase, homologando flagrante, busca e apreensão,
etc. E outro juiz na fase do processo propriamente dito, recebendo a denúncia e presidindo a persecução criminal.
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O art. 4º do projeto 8.045 diz que o Processo Penal brasileiro seguirá o sistema acusatório (aquele que prega
que o juiz é um terceiro imparcial, que não se envolve em interesses das partes, as partes que são responsáveis por
produzir as provas e geri-las; juiz é terceiro imparcial ignorante). Esse projeto de lei traz diversas reminiscências
inquisitoriais, como poderes instrutórios do juiz, o que faz com que esse CPP não seja tão novo assim.

TEORIA AGNÓSTICA DO PROCESSO


Outra perspectiva para o Processo Penal é a teoria agnóstica do processo. Elmir Duclerc se preocupa com a vítima
num Processo Penal burocratizado, que é esquecida. Há um dever de institucionalizar a vingança no processo
retributivo, e se esquece da vítima e sua família. Duclerc parte de Zaffaroni, que tem obra Teoria Agnóstica da Pena. A
vítima precisa ser lembrada no processo, e essa teoria agnóstica quer restabelecer o papel da vítima no processo,
não o Estado. O principal sujeito passivo no processo tem que ser a vítima, não o Estado. Duclerc diz que ao invés
do titular da ação penal ser o Estado personificado no MP, deveria ser a vítima. Quem detém o poder de deflagrar a ação
penal é a vítima – logo, defende a ação penal pública condicionada a representação do ofendido como regra.
Isso tem ponto de contato com justiça restaurativa, que é modelo de resolução de conflitos pautada no diálogo
entre as partes, inspirado nas formas de solução de conflitos de comunidades aborígenes. A justiça restaurativa prega
formas de solução de conflito que restabelecem o papel das partes como protagonistas da relação. A justiça restaurativa
depõe contra o modelo retributivo, que é o nosso, que volta para o castigo como solução de conflito. Na justiça
restaurativa não se preocupa com castigo, pois o foco no castigo secundariza a vítima. Nem sempre a vítima quer um
castigo, muitas vezes ela só quer a devolução da res furtada, do patrimônio, uma reparação pelos danos que sofreu
decorrente do delito, ou um pedido de desculpas. “Pagar pelo o que fez” esquece as dores da vítima. Justiça restaurativa
deveria ser plano A – se não for possível, então vai para o plano B, que é a justiça retributiva.
Práticas restaurativas pedem uma sociedade madura. No momento vivemos um contexto de vingança,
linchamento público, etc. Uma das práticas restaurativas é colocar o autor do fato perante a sociedade – e, para alguns, é
possível até em homicídio. Reconciliação é consequência, pode acontecer ou não. Mas é uma oportunidade para que o
autor do fato ouça a vítima.
Outra perspectiva ainda é tentar se inspirar na reforma democrática do processo na América Latina. Outros
países da AL, com destaque para Chile e Uruguai, realizaram reformas significativas no Processo Penal para efetivamente
democratizar o processo. No Chile, por ex., tudo é produzido na audiência. O juiz não tem nenhum contato com o
processo, só com as versões das partes. Não há “papelada”. O que há é carpeta, um pequeno classificador, que transita
somente entre as mãos das partes, MP e defesa, juiz não tem contato nenhum com isso. As partes chegam ao juiz,
apresentam ao juiz, juiz ouve primeiro acusação, se tiver prova já ouve testemunha na hora. Isso evita vícios. O contato
com o comportamento, tom da fala, do MP e da defesa, principalmente do acusado, dá condições de o poder judiciário
proferir decisão mais justa que aquela que se apega no papel.
Há preocupação em desburocratização do processo – aqui ainda temos modelo cartorial, que pode dificultar a
probidade do processo. A reconstrução da verdade é impossível, existem apenas fragmentos de verdade, então dá para
reviver. O Brasil ainda está muito aquém da reforma processual, apegado ao modelo cartorial. Para evitar as “falsas
memórias”, é preciso desburocratização e adoção de mecanismos para a duração razoável do processo.

CRIMINAL COMPLIANCE
Se refere a regras de boa conduta. Adequação às regras de boa convivência. As empresas têm adotado o
compliance no combate à corrupção. No Processo Penal tem sido usado para evitar um Processo Penal, na
criminalidade econômica/societária. A empresa adota, coloca um sujeito responsável pelo escritório de compliance, e
busca soluções internas para evitar a judicialização da causa. Criminal compliance tem funcionado – em que medida as
técnicas de governança interna têm sido suficientes para evitar o Processo Penal? É uma organização para se adequar às
normas da empresa e evitar um Processo Penal. Criminalidade ambiental tem usado compliance também.

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NATUREZA JURÍDICA DO PROCESSO
Alguns autores clássicos do processo se debruçaram sobre a natureza jurídica do processo.
Na Europa, em 1868, os estudos de Oskar von Bülow, que estabeleceu que a natureza jurídica do processo de
relação jurídica (esse pensamento influenciou o Processo Civil e o Processo Penal) autônoma de direito público e
complexa, de formato triangular, um triângulo equilátero. Direitos e obrigações são recíprocos entre as partes, por
isso esse triângulo é equilátero. Juiz, acusação e defesa nos vértices – é uma relação caracterizada por direitos e
obrigações recíprocas entre as partes.
Nesse triângulo já percebemos desequilíbrio na balança do direito, pois o acusado, a defesa, é a parte
hipossuficiente da relação. Não desconsiderando as dores da vítima, mas na relação processual, sobretudo no sistema
retributivo, o acusado é a parte hipossuficiente. Em um vértice: Estado Juiz que vai julgar com “imparcialidade”. No
outro: Estado Acusação, MP – vítima, Estado Polícia, imprensa. A outra parte se encontra em relação desequilibrada. A
defesa está numa posição de desvantagem no processo penal retributivo. Essa visão de von Bülow influenciou
inúmeros doutrinadores brasileiros por muitos anos, até hoje.
1868, final do século 19, era o auge do processo de globalização econômica. Neocolonização da África e da Ásia,
é nesse contexto que isso foi cunhado. Potências europeias, colonizando regiões da África e da Ásia.
Mais adiante, indo de encontro com essa visão, em 1925, há teoria de que o processo não é relação jurídica
harmônica. Goldschmidt vem com a teoria, em 1925, de que o processo é uma situação jurídica ao invés de relação
jurídica. Situação jurídica caracterizada por incertezas em que cada parte busca uma condição que lhe é mais favorável.
Na concepção dele, indo de encontro com a visão de von Bülow, é uma situação jurídica em que cada parte busca
situação que lhe é mais favorável, então o que existe é luta, não relação triangular harmônica, equilibrada da visão
romântica de Bülow. É uma situação de conflito, em verdade.
Essa visão acaba relativizando a ideia de direitos subjetivos das partes. Enxergar processos como situação
jurídica é enxergar que o Estado tem o dever de solucionar o conflito, simplesmente. Não haveria a noção de direitos e
obrigações recíprocas, apenas dever do juiz que decorre da lei, só. É uma visão que relativiza os direitos fundamentais e o
dever de cooperação, é uma visão que se aproxima da teoria dos Jogos de Alexandre Morais da Rosa. Processo Penal é
jogo: cada parte tem que conhecer as regras para conquistar as melhores oportunidades. Assim se aproxima de
Goldschmidt quando fala sobre conflito no Processo Penal.
Goldschmidt é contrário à visão de processo como relação jurídica, de von Bülow. São posições divergentes.
Existe ainda uma terceira, de 1950, de autor chamado Elio Fazzalari. Define natureza jurídica do processo como
procedimento em contraditório em que os atos processuais estão vinculados numa relação de prejudicialidade, um
ato depende do outro e, na qual, o juiz, o poder judiciário, é terceiro imparcial que deve zelar pelas garantias das
partes. Contraditório: palavra que aparece aqui como o direito de informação e reação a partir dessa informação. Sua
visão aprimorou a concepção de Goldschmidt – acaba aprimorando, melhorando a concepção de Goldschmidt.
Pergunta de prova: estabeleça a relação entre von Bülow, Golschmidt e Fazzalari.
Fazzalari também vê o Processo Penal como algo tenso, mas com o contraditório e tendo o juiz a atribuição de
zelar pelos direitos e garantias das partes. Assume, portanto, uma posição de juiz de garantias. Fazzalari é o que mais se
aproxima de um Processo Penal democrático, pois estabelece contraditório judicial como necessidade para o
desenvolvimento do Processo, e porque reconhece o juiz como imparcial, característica do sistema acusatório que mais
se aproxima da democratização do Processo Penal.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
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MARIANA SOARES SANTOS
CONCEITOS, OBJETO E FINALIDADE DO DIREITO PROCESSUAL PENAL
Como um instrumento de poder de classe hegemônica sobre outra, o Processo Penal vai ser conceituado ao sabor
do contexto socio político que se examina.
De Marsico vê o Direito Processual Penal como ramo do ordenamento jurídico que estuda o conjunto das
normas ditadas pela lei para aplicação do Direito Penal na esfera judiciária, tendo, por fim, não só a apuração do
delito e a atuação do direito estatal de punir em relação ao réu, mas, também, a aplicação das medidas de segurança
adequadas às pessoas socialmente perigosas e a decisão sobre as ações conexas à penal. É um conceito tecnocrático,
que pode ser adequado ao Processo Penal no seu contexto sociopolítico, mas traz autoritarismo manifesto no Processo
Penal. Revela a seletividade do sistema punitivo do Processo Penal. Direito não é lei, para começar, é paradigma
positivista, mas vivemos o paradigma pós-positivista, o direito não é só a lei, os princípios têm status de norma jurídica
junto com a lei/regras. O Tridimensionalismo Jurídico de Reale diz que direito é fato, valor e norma. Na esfera judiciária é
uma visão restritiva do Processo Penal, que não estuda só a esfera judiciária. Persecução penal tem duas fases:
investigação criminal e fase judiciária. Logo, De Marsico desconsidera a primeira fase, que também é objeto do processo
penal. A fase da persecução penal também é objeto do direito processual penal. Logo: peca pela visão restritiva quanto ao
objeto de estudo de direito processual.
Direito estatal de punir: visão extremamente autoritária. Não é direito, tampouco: direito de punir parece que o
direito pode ser exercido como quiser, o que não é verdade. A ideia que mais se relaciona com o Processo democrático é
o dever de resolver o conflito, e não de punir. Aplicar a pessoas socialmente perigosas: demonstra seletividade do
sistema. Essa visão de punir os socialmente perigosos é uma visão que se adequa a esse conceito, revela a seletividade do
sistema e desconsidera os direitos fundamentais dos indesejáveis. Visão de que precisa aplicar medida de segurança a
pessoas socialmente perigosas começou com o sistema manicomial no Brasil. Hoje: reforma desse sistema, justamente
para mudar isso.
José Frederico de Marques traz conceito diferente. Escreveu a obra “Elementos de Direito Processual Penal”. É
o conjunto de normas e princípios que regula a aplicação jurisdicional do Direito Penal, bem como as atividades
persecutórias da polícia judiciária, e a estruturação dos órgãos da função jurisdicional e respectivos auxiliares.
Comparar ele com De Marsico: Marques se preocupa com a força normativa dos princípios e a questão
persecutória da primeira fase do processo penal latu senso. Estruturação dos órgãos da função jurisdicional e
respectivos auxiliares não é bem objeto da matéria em questão, essa atribuição é Direito Constitucional e regimental. São
dois conceitos que se voltam para modelo burocratizado de Processo Penal. Em nenhum momento se ouviu
preocupação com a vítima. Ou seja: voltados para uma vingança institucionalizada, Processo Penal retributivo que
relativiza a vítima na relação. Tampouco se importa com direitos e garantias fundamentais do Réu. São conceitos pouco
humanizados. Vemos objeto de estudo e finalidade do Processo Penal.
Obra de Adhemar Raymundo da Silva: “é a luta do direito contra o mal que se desenvolve no Processo Penal,
com o objetivo de assegurar a aplicação da lei penal”. Conceito maniqueísta, de 1957 que ainda permeia o imaginário de
vários juízes. Cometer um crime é algo muito mais complexo do que cometer um mal. No final: nós contra eles. Visão
maniqueísta, que revela seletividade manifesta. Quem são eles? Quem é o mal? Sempre os mesmos indivíduos.
Indesejáveis, consumidores falhos. Isso é uma visão lúdica. Enquanto pensar o Processo Penal assim, não conseguiremos
efetivar um Processo Penal democrático. Esse imaginário ainda permeia a mente dos “operadores” do direito.
Afrânio Silva Jardim, 2005, “Processo Penal é fruto do avanço civilizatório da humanidade, resultante da
jurisdicização do poder punitivo do Estado. Enquanto o Direito Penal apresenta caráter marcantemente repressivo, o
Direito Processual Penal é comprometido com a questão da liberdade”. Deve, portanto, zelar pela liberdade de alguém
que não teve sentença transitada em julgado. A liberdade é o bem maior, ao ponto de comprometer o Direito
Processual Penal.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
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MARIANA SOARES SANTOS
Rubens Casali: “o Processo Penal é o sistema de garantias, direcionado à concretização do programa
constitucional para as respostas estatais aos desvios sociais etiquetados como delituosos, que abrange a necessidade de
redução do arbítrio, de contenção da violência legítima (PP é violência para coibir a violência), da erradicação da
violência ilegítima e, por fim, a elevação do valor dignidade da pessoa humana como diretriz para toda e qualquer
atividade estatal”. Teoria do etiquetamento foi citada. Se preocupa com a humanização, indivíduo com fim em si
mesmo. Dignidade da pessoa humana em sentido amplo, não só ao acusado, de todos os envolvidos interessados
diretamente na solução do conflito, inseridos a vítima, a família da vítima, família do acusado.
Arturo Rocco, autor do CPP da Itália fascista: “a dignidade da pessoa humana, se não extingue o jus puniendi,
ao menos lhe impõe limitações; a pessoa é um fim e não um meio”. É um paradoxo: o CPP 41 é autoritário, antigarantista,
foi inspirado no código de Rocco, e Rocco tem essa passagem. Outro pensador, que serviu a Alemanha nazista: mas a
personalidade do indivíduo é, para o pensamento ocidental que se baseia nas ideias do iluminismo, mais que um simples
meio para consecução de um fim. Mesmo autores de regimes totalitários se preocuparam em algum momento com direitos
inalienáveis.
AULA 4 – 03/07
DENOMINAÇÕES DA MATÉRIA
A primeira foi “Direito Judiciário Penal”- só que é uma denominação equivocada, parcial. Direito judiciário
não contempla exatamente a essência e os limites da matéria. Essa denominação foca só na última fase da persecução
penal – como se só fosse o estudo a partir da denúncia, o que não é verdade. Há, ainda, a fase de investigação penal.
Estudamos diversos institutos pré-processuais, inclusive.
Já foi chamada, ainda, de “Direito Penal Adjetivo”: aparece muito na classificação do Direito Penal, quando os
autores vão tratar da denominação do Direito Penal, dizem que existe Direito Penal Substantivo e Direito Penal Adjetivo,
o último sendo o Direito Processual Penal. Substantivo é o núcleo, e o que o qualifica é o adjetivo – é uma metáfora da
sintaxe. O Adjetivo instrumentalizaria o Direito Penal. Ainda é chamado de “Direito Penal Formal”. Enquanto o
Material seria aquele no qual se tipifica condutas e sanções respectivas, o Formal responsabiliza essa condenação penal.
O CPP já foi chamado de Código de Processo Criminal, hoje sendo Código de Processo Penal. É comum
parecer na prática jurídica como “Estatuto Repressivo Formal”; o Material seria o CP. Código de Ritos Penais é outra
nomenclatura comum.
SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS
Numa perspectiva neoconstitucional, há relevância em falar de sistemas. Há uma força muito grande dos
princípios enquanto normas jurídicas. Há ainda o paradigma neoconstitucionalista, ou garantismo penal, com a ideia de
um núcleo do ordenamento jurídico ocidental que é a Constituição Federal. Em torno desse núcleo gravitam outros
subsistemas jurídicos que devem obediência e lealdade à Constituição Federal. Essa visão sistemática é importante
porque se a CF é o núcleo e todos os ramos devem obediência a CF, então o nosso CPP, o Direito Processual Penal,
também deve se submeter aos valores constitucionais como parte desse sistema. Geraldo Prado traz a imagem de círculos
concêntricos para definir esse sistema jurídico ocidental contemporâneo. A CF seria o círculo do meio e todos os outros
círculos a partir desse círculo central são reverberações da voz do constituinte, ou devem ser, desdobramentos dos
valores constitucionais nos outros círculos.
Guedes Valente diz que a polícia é o rosto jus constitucional de um ordenamento jurídico. O perfil da polícia
de um Estado define o perfil da sua constituição. Já Klaus Roxin se refere ao Processo Penal como sismógrafo da CF de
um país, o termômetro da CF de um Estado. O perfil da CF de um país vai ditar o perfil do CPP. O perfil da CF vai
ditar o perfil da sua polícia. Esse é um sistema do qual nosso Direito Processual Penal faz parte – quando falamos de
sistemas processuais penais estamos falando de modelo que o processo penal de um país adota, o perfil.
Na doutrina processual penal existem três sistemas a serem estudados na nossa matéria.

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SISTEMA ACUSATÓRIO
Durou na Europa até os séculos XII/XIII, e tem como principal característica a separação entre as funções de
acusar e julgar. Um ente vai ter a tarefa de acusar, o outro, terceiro, imparcial, distante, que vai julgar (não só o juiz não
pode se envolver em interesse de partes, que não pode produzir provas/ter iniciativa probatória, não é só o Estado, a
recíproca também é verdadeira – as partes não podem se envolver em interesses do poder judiciário, ex: barganha, delação
premiada).
Outra característica vinculada a essa é a gestão da prova, que compete às partes, acusação e defesa. O processo é
público – há publicidade dos atos processuais. O acusado/a é visto como sujeito de direitos, que devem ser respeitados
por aquele que julga. Outra: relativização da verdade. Verdade não existe, Lacan diz que a verdade só pode ser omitida
nas malhas da ficção, a verdade é utópica, só há uma verdade contigencial, formal. A verdade é uma reconstrução a
partir de versões, não há verdade absoluta. O que não estava nos autos não existe.
Por fim, há duração razoável do processo: entendendo razoável como a duração necessária de acordo com as
peculiaridades de cada causa. Existem processos com conjunto de agentes e de crimes, com um número grande de vítimas
– não é razoável que um processo assim tramite em um ano, por exemplo. Problema: as partes sozinhas não conseguiam
colocar em prática a justiça, efetivá-la. O Estado percebeu isso. Não ocorria pois
1) Não conseguiam produzir provas sozinhas; ou,
2) A participação das partes era pautada em violência extrema. À época vigia o código de Hammurabi, com a lei
de Talião. Por isso esse sistema foi superado pelo sistema inquisitório/inquisitorial/inquisitivo.
SISTEMA INQUISITÓRIO
O Estado percebeu que as partes não conseguiam levar a diante, e daí usurpou delas o conflito. A vingança, que
antes era privada, passou a ser institucionalizada, pública. No século XIII surge esse sistema na Europa ocidental como
superação de um modelo que não conseguia efetivar a justiça. A vingança privada não conseguia efetivar a justiça
criminal. Assim, o Estado roubou o conflito das partes e ele mesmo passou a ditar as diretrizes do Processo Penal. Suas
características são diametralmente opostas as do sistema acusatório.
A função de acusar e julgar é do Estado, o juiz que julga é o mesmo que acusa. A autoridade que faz a acusação
também o julga. A defesa é somente uma fachada, uma falácia, que existe com limites muito reduzidos diante do poderio
do Estado. O papel da defesa era só para legitimar o sistema. À defesa era relegado um papel insignificante no sistema.
Aqui, o Estado que conduz as provas. Gestão das provas nas mãos do julgador. Aqui o juiz também pode, mas a parte
também – ainda que o papel da defesa seja reduzido, e a acusação seja o Estado. Os atos processuais são sigilosos – tanto
que o acusado tinha sobre a sua cabeça um capuz, para não ver quem eram seus acusadores. O acusado não sabia do que
estava sendo acusado, nem quem o estava acusando. Processo kafkiano é assim.
Há coisificação do indivíduo, no sistema acusatório o acusado era visto como sujeito de direitos, nesse era um
mero objeto nas mãos do Estado, desprovido de direitos e características fundamentais. Defesa: só para legitimar o
sistema, não para garantir os direitos do acusado. Se no acusatório há verdade relativa, aqui há absolutização da verdade
– verdade é absoluta, e a confissão é a rainha das provas. Nesse caso, vale qualquer meio para obtenção dessa verdade,
inclusive a tortura. Foi um sistema que teve sua expressão máxima na Santa Inquisição – a ideia era que crime era
pecado, e o corpo devia ser destruído para tentar salvar a alma. A absolutização da verdade passa pela adoção de tortura
para a obtenção dessa verdade.
Se no acusatório há duração razoável do processo, aqui há processo sumário, rápido. Se processo bom fosse
rápido, a Santa Inquisição estava cheia de bons exemplos. Duração razoável varia de acordo com o processo em questão.
Há característica de sumariedade do processo, defesa não participa significativamente, para obter a verdade pode qualquer
meio, e quem acusa é quem julga – é algo rápido, sumário.

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SISTEMA MISTO
Sistema adotado por Napoleão Bonaparte na França. Século XVIII, Napoleão gostava de misturar os institutos.
No Direito Constitucional ele outorgava a constituição e depois referendava no povo. A parte de investigação criminal
era inquisitória, e a segunda parte era o sistema acusatório, seguido do processo propriamente dito na fase
judiciária. É uma reunião dos dois sistemas em um só.
SISTEMA BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO
Do ponto de vista das persecuções penais, adotamos o sistema misto segundo a maioria dos autores. Começa, via
de regra, na policia e adota inquisitorial nesta fase, e a outra fase, acusatória. Vigora então o sistema misto. A primeira
fase de investigação criminal embasa a segunda fase. Nós recepcionamos a figura do inquérito policial no art. 4 do CPP,
que é o instrumento de investigação criminal por excelência no Brasil.
DO INQUÉRITO POLICIAL
Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e
terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.
Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja
cometida a mesma função.
A autoridade policial conduz investigação com o fim de obter elementos para informar ao MP a respeito da
materialidade delitiva e os indícios de autoria e participação. É uma sistemática unilateral, não cabe contraditório e
ampla defesa.
O delegado conduz as investigações de modo unilateral, só ouve as pessoas para formar a sua convicção e destinar
os elementos de investigação ao MP. Não existe contraditório e ampla defesa plenos no inquérito policial. Inquérito
policial é sigiloso, diligências que ainda estão em curso devem ser mantidas sob sigilo, mas há Súmula Vinculante 14 do
STJ dizendo que é direito do defensor ter acesso aos elementos de prova já concluídos em qualquer investigação criminal.
Súmula Vinculante 14 - É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam
respeito ao exercício do direito de defesa.
O art. 7 do estatuto da OAB só garante o sigilo daquilo que ainda não foi concluído, em nome da inquisitoriedade
do inquérito policial. É preciso manter o sigilo nessa fase para garantir o “sucesso” da investigação.
O art. 20 do CPP é nessa linha.
Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da
sociedade.
Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar
quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes. (Redação dada pela Lei nº
12.681/2012)
Blindar a investigação e evitar influências externas – o problema é que a própria polícia vaza informações para
a imprensa. Às vezes a defesa sabe por último de algo que aconteceu no inquérito policial.
Há um esforço judiciário no sentido de garantir direitos fundamentais no inquérito. A Lei 13.245/16 ampliou
as prerrogativas da advocacia brasileira na investigação criminal, alterando o art. 7 do estatuto da OAB, que fala das
prerrogativas da advocacia brasileira – ex.: presença do advogado no interrogatório policial; garantia de informação
sobre os elementos já concluídos da investigação, repetindo a súmula vinculante 14/09.
A autoridade policial tem fundamental sigilo, sob pena da responsabilidade civil, penal e administrativa;
possibilidade de a defesa formular quesitos na investigação, perguntas a serem respondidas no curso da investigação. São
expressões de que tentamos minimizar os impactos do rigor do sistema inquisitório no inquérito policial brasileiro,
harmonizando-o com a CF/88.

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Há, ainda, a Lei 13.257/16, o estatuto da primeira infância. Diz que no interrogatório judicial ou policial deve ser
feita pergunta obrigatória ao investigado – se o investigado tem filhos menores/portadores de deficiência e com quem
estão no momento no interrogatório, para balizar o juiz quando na declaração da escolha de medida cautelar dessa
pessoa. São direitos e garantias fundamentais dos filhos, principalmente, mas por via de consequência garante a liberdade
da pessoa. Hoje cabem contraditório e ampla defesa no inquérito policial. Numa questão aberta se problematiza isso,
numa fechada, simplesmente se diz que cabe.
As irregularidades que ocorrem no inquérito policial não contaminam o processo, pois tudo o que foi
produzido no inquérito pode ser repetido sob o crivo do contraditório e ampla defesa. Confissão sob ameaça pode ser
resolvido no bojo do processo com contraditório e ampla defesa, sem prejuízo de quem cometeu tortura responder por
abuso de autoridade. Essas características do sistema inquisitório, mutatis mutandis, se aplicam ao sistema misto.
A segunda fase tem características do sistema acusatório.
Art. 129, I da CF/88 é o endereço do sistema acusatório de Processo Penal no Brasil.
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
Diz que o MP é titular privativo da ação penal. Quando o constituinte disse isso, atribuiu ao MP a titularidade
da ação penal, a legitimidade para deflagrar o processo, via de regra. Quando o constituinte disse isso, separou as
funções de iniciar e julgar. A Lei 13.260/16 diz que o juiz pode decretar busca e apreensão de ofício no combate ao
terrorismo – poder instrutório do juiz, poder judiciário com iniciativa probatória. Juiz pode ouvir testemunha de ofício.
Art. 404. Ordenado diligência considerada imprescindível, de ofício ou a requerimento da parte, a audiência será
concluída sem as alegações finais.
Parágrafo único. Realizada, em seguida, a diligência determinada, as partes apresentarão, no prazo sucessivo de 5
(cinco) dias, suas alegações finais, por memorial, e, no prazo de 10 (dez) dias, o juiz proferirá a sentença.
Ou seja, depois de toda instrução, se o juiz tiver dúvida, pode ordenar diligência de ofício, como ouvir nova
testemunha, ouvir testemunha de novo, produção de prova, etc.
Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz,
de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por
representação da autoridade policial. (Alterado pela Lei 12.403/2011)
Permite ao juiz decretar prisão preventiva de ofício no bojo do processo penal. Ex.: há juiz que se depara com
sujeito que acha que vai fugir, sem o MP formular nenhum requerimento, quem vai julgar essa causa é esse juiz.
Sistema neoinquisitorial, para o professor.
A Lei 13.441/17 alterou o ECA para prever, no art. 90, a figura do agente infiltrado na internet para combater
abuso sexual na internet; MP tem acesso a esse termo. E a defesa? Não.
AULA 5 – 05/09/2018
O nosso CPP foi recepcionado pela CF/88 – não existe contraditório e ampla defesa plenos na primeira fase, mas
também não dá pra dizer que a segunda fase é completamente despida de respeito aos princípios constitucionais. Uma
série de microreformas processuais tiveram esse objetivo. Nosso sistema, oficialmente, é acusatório – a segunda fase. O
constituinte disse que o titular privativo da ação penal é o MP. O juiz, nas entrelinhas, fica na posição de terceiro
imparcial e equidistante. Com o projeto de novo CPP não é diferente: tramita no Congresso Nacional hoje, no seu art. 4,
que fala dos direitos fundamentais do processo, diz que o Processo Penal brasileiro seguirá o sistema acusatório. Isso está
expressamente previsto.
Isso não garante a plenitude, a efetivação, de um sistema acusatório puro no Brasil . Isso por conta das
reminiscências inquisitoriais no histórico do nosso Processo Penal. Lembrar do patrimônio autoritário do qual já
falamos. O projeto confere amplos poderes instrutórios ao juiz, por exemplo. No CPP/44, vigente hoje, isso é
perceptível em diversos artigos, bem como em leis esparsas como a lei antiterror (deixa ordenar busca e apreensão de
ofício para combater terrorismo), reserva de informações da defesa para melhor investigação criminal – se a defesa
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quiser ter acesso ao termo de delação premiada tem que pedir autorização ao juiz, por exemplo. Isso fere a isonomia entre
as partes, a paridade de armas. O art. 190 do ECA também foi alterado autorizando agentes infiltrados na internet para
coibir crimes contra crianças e adolescentes, deixando a defesa de for a das informações/investigação.
Existe uma série de entraves na efetivação de um sistema acusatório efetivo, o que faz com que alguns autores
digam que o nosso sistema é neoinquisitorial.
Vivemos sob a égide de uma Constituição Federal que traz direitos e garantias fundamentais que estão
pulverizados por todo o texto constitucional, inclusive ratificando normas internacionais. Dessa forma, é preciso estudar
os princípios processuais penais/principiologia processual penal.

PRINCÍPIOS PROCESSUAIS PENAIS/PRINCIPIOLOGIA PROCESSUAL


PENAL
Há um descrédito quanto a principiologia processual penal, pois na prática os princípios seriam pouco respeitados,
e seria algo apenas da teoria. No plano concreto há um inegável desvirtuamento do Processo Penal para atender
finalidades estranhas ao Processo Penal. Essas finalidades estranhas dificultam a efetivação dos valores da CF. Para o
professor, é preciso lutar pela efetivação do Processo Penal democrático.
Princípios são obstáculos aos desvirtuamentos do Processo Penal democrático.
São o que limitam o poder de punir do estado, o jus puniendi. O estudo dos princípios é tão relevante que Reale,
estudando o tridimensionalismo jurídico, diz que “direito é fato, valor e norma”. A importância dos princípios está na
efetivação dos valores para o Direito. O jus positivismo dogmático contrapõe ao positivismo clássico a um jus
positivismo crítico, um modelo garantista de Estado é aquele que admite um jus positivismo crítico: Direito se cria
através da tarefa de interpretação da lei. O Direito não é a lei. A lei é o instrumento para criação do Direito. O
intérprete como protagonista na criação do direito a partir de valores, que são os princípios. A força dos princípios é
tão grande que permite a ponderação de valores no caso concreto, proporcionalidade em sentido estrito. Princípios são
freios à sanha punitivista de um Estado eficientista.
Esses princípios de Processo Penal são encontráveis no texto constitucional e na doutrina. Via de regra,
encontraremos no art. 8 da Convenção Interamericano de Direitos Humanos, quanto as garantias processuais.
DEVIDO PROCESSO LEGAL
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
Art. 5, LIV, CF.
A matriz de todo processo legal. No nosso processo, se trata de princípio que não é exclusivo do processo penal,
mas sim do direito – ninguém pode ser privado dos seus bens sem o devido processo legal. É um princípio que vaza todo
o Direito, não só o Processual Penal, Processo Civil também. No nosso caso, temos o princípio de devido processo legal
que é a matriz de todos os outros (presunção de inocência, juiz natural, promotor natural, proporcionalidade, ne bis in
idem, paridade de armas, fair play, etc.).
É dividido em duas subespécies: a formal e o substancial/material.
Obra de José Nery Jr. de Rosa Nery – Princípios do Processo na Constituição Federal.
A) Formal: respeito à sequência legal dos atos processuais. O procedimento comum ordinário, padrão do Processo
Penal Brasileiro, visto do art. 395 e seguintes, sobretudo a partir do art. 400, é onde está positivada a instrução
criminal no Processo Penal brasileiro.
1) MP oferece denúncia;
2) Poder judiciário analisa se a denúncia atende aos pressupostos e requisitos legais, se está apta a transitar em
juízo - caso sim, recebe, caso não, rejeita a denúncia;
3) Em recebendo, deve haver prazo de dez dias para oferecimento de resposta à acusação, uma contestação
criminal;
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4) Com a resposta à acusação na mão, o poder judiciário pode absolver sumariamente, ou designar audiência de
instrução e julgamento, na qual primeiro é ouvido o ofendido e depois testemunhas (as de acusação primeiro).
Quem arrolou a testemunha pergunta primeiro.
Existe uma sequência de atos legalmente prevista, portanto. No júri, em plenário, primeiro o MP fala e sustenta a
sua tese nos debates, depois, defesa. Se o MP quiser falar de novo, pode usar réplica. Como no Processo Penal a
defesa fala por último, cabe ainda tréplica por parte da defesa e encerram-se os debates. Seguir essa sequência de
atos é no que consiste o devido processo legal formal.
B) Substancial/material: respeito à proporcionalidade no Processo Penal. Houve respeito ao devido processo penal
substancial quando adota a proporcionalidade no Processo Penal. A proporcionalidade é muito mais que um
princípio: é instituto de lógica jurídica, e não de direito positivado. Não é só de princípio de Processo Penal, é
postulado do Direito. Tanto assim que se fala de proporcionalidade em todas as áreas. A proporcionalidade como
póstula, berço dos princípios, se subdivide em três espécies:
1) Em sentido estrito (juízo de ponderação, teoria do sopesamento, no caso concreto);
2) Necessidade;
3) Adequação-idoneidade.
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:
I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente
previstos, para evitar a prática de infrações penais;
II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.
Ou seja, o legislador diz que a prisão preventiva vai ser decretada quando adequada e necessária para resguardar a
regularidade do processo. Medida cautelar pessoal, portanto. É decretar a prisão preventiva por último, é
proporcionalidade em sentido estrito. Não é razoável decretar prisão preventiva quando se revela, no
interrogatório, que o investigado tem filhos menores ou portadores de deficiência que estão vulneráveis, sem
ninguém para cuidar deles.
Num juízo de razoabilidade, não havendo necessidade de decretar prisão preventiva, o juiz pode decretar prisão
domiciliar, adotando um juízo de proporcionalidade em sentido estrito, monitoração eletrônica ou obrigação de
comparecer em juízo periodicamente para dar satisfação das suas atividades e da sua rotina.
Outra: segundo decisão do STF, flexibilizando precedente de 2016 (STF passou a entender que cabe execução provisória
da pena, indo contra o próprio precedente), se o indivíduo respondeu a todo o processo em liberdade, não é
razoável, em nome da proporcionalidade em sentido estrito, que eu execute provisoriamente a pena. Juízo de
razoabilidade, proporcionalidade em sentido estrito, adotado pelo STF e seguido pelo STJ.
Outra manifestação da proporcionalidade: julgamento do STF em junho de 2016, retirando o caráter hediondo do tráfico
privilegiado. Tráfico está tipificado em lei, e o § 4 do art. 33, lei 11.343/06 traz causa de diminuição de pena
quando o indivíduo tem bons antecedentes, não se dedica ao trafico, é primário, não é parte de organização
criminosa, que autorizam como direito subjetivo de diminuição de pena, havendo tráfico “privilegiado” (termo
atécnico, pois, para ser privilegiado, deveria ser outra pena, e não pena minorada).
CONTRADITÓRIO
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Pode ser definido como direito à informação e reação. É a garantia do acusado de saber a imputação que lhe foi feita
e poder reagir perante isso. Há divisões didáticas.
A) Contraditório real: é aquele que se efetiva no momento da produção da prova. Ocorre simultaneamente à
produção da prova. Ex.: julgamento em plenário do júri, 2 fase do procedimento do júri perante o conselho de
sentença, testemunha vai depor/falar. Logo em seguida, juiz faculta a parte fazer pergunta a testemunha.

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Efetivação do contraditório real, no momento da produção da prova. Esse contraditório está se efetivando no
momento da produção da prova. Ou seja: meio de prova e também de defesa.
B) Contraditório diferido/postergado/prorrogado: aquele que se efetiva em momento posterior a produção de
prova. Se o contraditório real se efetiva no momento da produção da prova, o diferido se efetivará em momento
posterior a produção da prova.
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as
provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Art. 155, caput, CPP, prevê o livre convencimento motivado do juiz, mas veda que o juiz decida exclusivamente com base
nos elementos colhidos na investigação. Provas cautelares configuram exemplo de contraditório diferido que é
admitido. Ex. de prova cautelar: interceptação telefônica. A interceptação telefônica, que é prova cautelar, pode
ocorrer no curso da investigação ou instrução criminal, não admite contraditório real. Se fosse assim,
inviabilizaria a própria diligência. Deve se submeter a contraditório em momento posterior. Quando a diligência
for cumprida, ao final a autoridade que presidiu essa interceptação vai fazer relatório que vai pros autos e as
partes vão se manifestar a respeito dessa diligência. O contraditório é garantido, mas posteriormente. Prova
não repetível: pericia em documento do século XVI que está se desfazendo, ou em uma sobra/fragmento de livro
do século XVI. No primeiro contato, o objeto se desfaz – o contraditório não vai ser realizado na hora,
posteriormente as partes vão poder se manifestar. Prova antecipada: testemunha que vai viajar para concurso,
precisa ser ouvida logo na investigação, incidente de antecipação de prova é instaurado. A testemunha vai ser
ouvida logo, e o contraditório será efetivado posteriormente. Prova irrepetível: testemunha em fase terminal de
doença. Outra forma: produzido na investigação criminal, não dá pra se manifestar agora, aí vai ter contraditório
posterior. Prova antecipada, cautelar, etc.: vai ser submetido a contraditório posterior. Como? Tudo o que for
produzido na investigação tem que ser reduzido à escrita, que vai ser submetido à apreciação das partes para que
elas possam se manifestar.
C) Contraditório formal: mera oportunidade de manifestação nos autos. Ex.: se eu, juiz, recebo inicial acusatória -
em nome do contraditório formal devo abrir prazo de 10 dias para a defesa se manifestar. Se estou interrogando
acusado/a, devo abrir às partes a oportunidade de fazer pergunta.
Mera oportunidade/possibilidade de se manifestar nos autos. Esse contraditório não é suficiente para garantir um
Processo Penal verdadeiramente democrático. O contraditório material junto com o formal constituem a
plenitude do contraditório. Só da pra dizer que houve efetivação do contraditório se houve a oportunidade de
manifestação dos autos e se garantir que a manifestação foi levada em consideração pelo Poder Judiciário.
Ex.: imaginar que o juiz abre as vistas no prazo de dez dias para a defesa se manifestar oferecendo resposta à acusação.
Defesa levanta a tese de legitima defesa, vislumbrando absolvição sumária do 337. Juiz tem que contemplar essa
tese na sua decisão, nem que seja para rechaçar. Mesmo para alegações de participação, defesa, etc.
Ex.: defesa antes das alegações finais quer ouvir testemunha arrolada pela acusação que mencionou existência de
terceira testemunha que favorece defesa. Defesa pede ao juiz que ouça, que intime, essa nova testemunha, terceira, para
depor em juízo. Juiz autoriza: contraditório formal. Essa testemunha é inquirida por carta precatória, vem o testemunho
dela para o processo e é juntado aos autos, favorecendo a defesa. Em respeito ao contraditório material, na sentença, o
juiz precisa analisar esse terceiro depoimento. Precisa se manifestar a respeito disso na sua manifestação. O contraditório
material está relacionado com o dever de justificação nas decisões judiciais. Tem que analisar todas as teses
ventiladas no processo em nome do contraditório material.
AULA 6 - 10/09/2018

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CONTRADITÓRIO DIFERIDO
É o contraditório oportunizado depois da produção da prova. Ex.: pedido de interceptação telefônica – tem
que colocar todos os motivos pelos quais você quer que a interceptação ocorra: urgência, pertinência, etc.
Necessariamente. A medida é a última possível para chegar onde quer chegar. A pessoa que já tendo a intercepção
realizada sobre ela não pode saber, só depois, ou então o seu motivo de existir cessaria. Art. 155 fala sobre contraditório
diferido e provas antecipadas.
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas
cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.
Dois casos de contraditório diferido e um de contraditório real – caso de prova antecipada. No momento da
produção da prova: testemunha que está prestes a morrer, ou então não estará viva para depor. Momento de prova oral,
que aconteceria posteriormente, vai ser antecipado, jogado para frente para que seja oportunizado que a prova aconteça
da forma como tem que acontecer. Vai ter a presença de advogado, juiz, e eles colherão as provas.
Súmula 707, STF – Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contra-razões ao recurso
interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo.
Ou seja, diz que quando a denúncia é rejeitada, não há Processo Penal, a pessoa não é citada e arquivam-se os
autos. Se o MP recorrer da decisão, é preciso citar o acusado para que ele ofereça contrarrazões – precisa dar a
oportunidade dele dizer que não quer ser réu e não pode ser réu por determinados motivos. A não citação do denunciado
nesse caso seria violação do contraditório e ampla defesa.
JUIZ NATURAL
Princípio que manda o juiz do processo ser prévio, independente e imparcial.
Prévio: estabelecido segundo regras objetivas do direito antes que o processo seja instaurado, não pode ocorrer o
que houve no tribunal de Nuremberg – banca de juízes para situação especifica, réus específicos.
Imparcial: juiz equidistante das partes, não vai ser parcial na ação. É um ganho do sistema acusatório – juiz não
pode atuar de forma diligente como parte nesse sistema, pois precisa ser equidistante das partes.
Independente: não sofre influências dos outros poderes. Tripartição dos poderes dá origem a isso, não pode
sofrer influências nem para mais, nem pra menos, dos outros poderes.
Esses três subrequisitos são o princípio do juiz natural.
Neutralidade x imparcialidade: não há juiz neutro. Sofre influências inúmeras, é um ser humano com os seus
pontos de vista. Imparcial: tem suas convicções, formação jurídica especifica, mas precisa seguir o que está na lei. Ex.: x é
garantista, mas enquanto juíza não pode deixar de condenar porque preferiria não condenar, se houverem elementos que
levem à condenação.
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
Réu precisa ter o direito de ter a sua sentença revisada por outro órgão hierarquicamente superior àquele que
proferiu a sentença de primeiro grau. Direito positivado no Brasil e internacionalmente, em todas as convenções de
Direitos Humanos. Não é um direito que sofre muita flexibilização. Não dá pra deixar que uma sentença equivocada
continue existindo no sistema jurídico e manter uma pessoa presa.
Foro privilegiado: alguns cargos sofrem essa proteção no Brasil, e os processos contra eles já são processados
por Tribunais Superiores. Então estes já são o primeiro grau e único – não é recurso. Se diz que alguns cargos, como
governador, se fosse julgado por juiz de primeiro grau, este não teria independência necessária para julgar a ação, pois
poderia sofrer influências políticas, financeiras, etc. Logo: para que a decisão seja efetiva, deve ser feita por Tribunal
Superior. Professor era contra: duplo grau de jurisdição seriam as instâncias ordinárias e extraordinárias, e não pode fazer
flexibilização de deixar alguém à mercê das extraordinárias.
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AMPLA DEFESA
Princípio pelo qual o réu precisa ter a oportunidade de se manifestar e se defender no Processo Penal.
Autoexplicativo. Parece com o de contraditório.
Tem duas subdivisões: defesa técnica e autodefesa.
Esse princípio no Processo Penal não pode sofrer flexibilização - sua flexibilização leva a nulidade do ato, não
tem discussão, anula o ato e refaz ele. Tanto que a súmula 707 começa com “constitui nulidade…”.
Súmula 707, STF – Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contra-razões ao recurso
interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo.
A ampla defesa: se não respeita por algum motivo, o resultado é a nulidade do ato. É bem pacífico, jurisprudência
e doutrina.
a) Defesa técnica: acusado tem o direito de ser assistido por profissional habilitado. Alguém não bacharel em
direito não pode defender acusado em Processo Penal. Profissional habilitado pode ser advogado constituído
nos autos, defensor público, defensor ad hoc… Mas precisa haver profissional habilitado e técnico, precisa
entender as regras do Direito para defender acusado no Processo Penal.
Falta de defesa técnica em qualquer dos atos do Processo Penal tem como consequência a nulidade.
Súmula 523, STF – No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o
anulará se houver prova de prejuízo para o réu.
O interrogatório precisa contar com a presença de um advogado, se não, nulidade. Tem que refazer o interrogatório.
Inquérito policial é sigiloso, via de regra, até que seja finalizado – quando pode ser requisitado pelo advogado. Para
negar uma tentativa do advogado ter acesso aos autos do inquérito policial, precisa fundamentar uma decisão.
Sem fundamentação: é nulo o ato de negar, e tem que dar acesso ao advogado. No interrogatório e nas
perguntas feitas pela autoridade policial, se o advogado estiver presente este também pode formular perguntas
ao acusado ou a vitima.
É pacífico que a ampla defesa é indisponível. Tem que ter defesa técnica, não dá pra dizer que não quer. Tem que
ter. Ex.: sentença penal condenatória, sendo condenado diz que não quer recorrer, quer ir para a prisão, se o advogado
constituído interpor recurso, esse recurso precisa ser processado e analisado mesmo contra a vontade do condenado.
b) Autodefesa: direito que o réu tem de exercer pessoalmente a sua defesa – precisa ter defesa técnica, mas tem
alguns direitos que o réu não tem em outros processos. Ex.: direito ao silêncio, pois não pode produzir prova
contra si mesmo; algo que é espécie de defesa. Direito de mentir: a doutrina entende que não pode legitimar
um erro, mas na verdade pode mentir quanto aos fatos. O Processo Penal tem a fase de qualificação e a fase
de exposição dos fatos. Qualificação: quem é você? Qual seu nome? Você estava naquele lugar? Aqui não
pode mentir. Quanto aos fatos: pode. Você bateu em x? Não, não bati, ainda que tenha vídeo. Isso é possível
no Processo Penal por causa da ampla defesa, por causa da possibilidade de exercer pessoalmente a sua
defesa.
Direito a não autoincriminação: muito respeitado no Brasil, tanto que a discussão do bafômetro teve a ver com
isso. Se não fizer: constrói prova contra si mesmo. Discussão: não seria possível exigir que a pessoa assoprasse, pois seria
produzir prova contra si mesmo, algo vedado no ordenamento jurídico brasileiro. Essa é uma exceção ao direito a não
autoincriminação. Esse direito tem muitas ramificações: tem direito a ser interrogado. Interrogatório antes era meio de
prova, hoje é meio de defesa e eventualmente de prova. Pode ser que no interrogatório colha provas e a pessoa confesse,
mas a confissão não necessariamente vai levar a condenação, pois o interrogatório em si é meio de defesa e eventualmente
de prova. Ou seja: pode ser interrogado ou não, mas se quiser comparecer, é um direito dele, pois é um meio de defesa.
Reprodução simulada: pode ou não comparecer, porque não pode produzir prova contra si mesmo.

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b.1) AUTODEFESA POSITIVA: réu participa ativamente do processo, cobra do advogado, do juiz, faz o escarcéu.
Ele, pessoalmente, está participando do processo ativamente. Em todos os atos processuais ele participa ativamente. Se
chama autodefesa positiva.
b.2) AUTODEFESA NEGATIVA: possibilidade de silenciar, ficar quieto, não produzir provas. Às vezes é melhor
ficar calado. Se fizer isso, não produziu nada. Silêncio não é confissão. Silêncio é silencio, vazio jurídico. Autodefesa é
DISPONÍVEL, por isso pode não fazer nada, não ir pro interrogatório, não falar nada, ficar de boa, isso é completamente
possível.
AULA 7 – 12/09/2018
Aviso de Miranda: avisar que pode se manter calado, aviso sobre os direitos fundamentais. Interrogatório sub-
reptício é aquele que ocorre sem o aviso dos direitos fundamentais, sem o aviso de Miranda, foi conduzido de maneira
irregular, sem respeito às garantias constitucionais, sobretudo o direito ao silêncio, o direito a permanecer calado.
Há súmula sobre defesa técnica.
Súmula 523, STF: No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se
houver prova de prejuízo para o réu.

PROMOTOR NATURAL
Ver HC 10.2147/GO – STF.
Princípio polêmico, pois o STF não o admitiu durante muito tempo, sob a alegação que no processo penal não há
de se exigir imparcialidade do MP. No processo penal o MP, que é titular privativo da ação penal pública (a parte também
pode manejar ação penal, desde que nos casos específicos), o representante do MP tem parcialidade no processo, é parte
no processo penal. Por isso não dá pra dizer que há um princípio do promotor natural, pois não há imparcialidade no
membro do MP, ele é parte do processo, sustenta tese acusatória. A própria CF, no art. 127 diz que o MP deve zelar
pela ordem democrática, pela justiça.
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
O MP, muito embora seja titular privativo da ação penal, sempre será fiscal para o juiz. Alguns autores dizem
que se trata de parte suis generis do processo, pois, em que pese seja responsável por sustentar a acusação, deve sempre e
acima disso zelar pelos direitos e garantias fundamentais de todos os envolvidos no processo, inclusive o acusado.
O MP não é meramente acusatório, portanto. Deve fiscalizar o cumprimento da ordem jurídico
democrática brasileira. MP pode até pedir absolvição, pode não se convencer de elementos para condenar. O MP não
acusa arbitrariamente, mas com responsabilidade. Daí ser órgão suis generis: é parte e fiscal das garantias fundamentais
de todos os envolvidos (acusado, vítima, testemunha, parentes da vítima). Acusado: hipossuficiente no processo penal
(lembrar da figura triangular, era pra ser um triângulo equilátero, mas há desequilíbrio manifesto).
Hoje, o STF aceita esse princípio, mas o promotor deve ser previamente designado para a causa, não no que se
refere a sua parcialidade, pois não dá pra exigir imparcialidade. O promotor natural se refere ao caráter prévio do
membro do MP para a causa, ex.: homicídio/indícios de homicídio doloso contra vida, policial vai ser remetido para
promotoria do júri, que é o promotor natural para a causa. Dentro do MP, se tiver mais de um promotor, há livre
distribuição para ver em que ofício esses elementos de investigação, esse inquérito, vai cair, em obediência ao princípio
do promotor natural. É o caráter prévio do MP de ser previamente designado, impedindo a figura do promotor de acessão,
configurando a figura do promotor natural.
Súmula 234, STJ: A Participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu
impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.
A súmula diz que o promotor não está impedido de atuar no processo. O fato de ter atuado na investigação
criminal, ter requisitado instauração do inquérito, representado pela decretação de prisão preventiva, etc. – o fato de aí

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atuar não impede que o membro do MP atue no oferecimento da denúncia. Impedimento e suspeição são aplicados aos
membros do MP. Atuar na investigação e oferecer a denúncia não significa suspeição, mas as hipóteses de suspeição e
impedimento aplicam-se tanto aos membros do MP, quanto aos juízes. Não se aplica aos agentes da polícia, mas
membros do judiciário e MP, inclusive os juízes leigos, conselho de sentença do tribunal do júri, os jurados também são
passiveis de suspeição e impedimento. Promotor natural: prévio a causa.
Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito
policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará
remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão
do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a
atender.
O art. do CPP traz a hipótese interessante do promotor natural. Trata da hipótese de conflito entre MP e poder
judiciário. Quando a polícia encerra o inquérito policial, remete o seu relatório para o MP, para que o MP, dono da
ação/titular da ação penal, ofereça denúncia ou não. Pode ser que o MP entenda que não é caso de oferecimento de
denúncia. O art. 28 permite que o juiz discorde do membro do MP e entenda que é sim caso de oferecimento de
denúncia e invoque o art. 28. Se o juiz não concordar, submete a causa a instância superior do Ministério Público, que
pode adotar três condutas:
a) ela mesma oferece a denúncia (concordar com o juiz e discordar do MP);
b) concorda com o membro do MP (é caso de arquivamento, e não oferecimento de denúncia, o que vincula o poder
judiciário);
c) concorda com o poder judiciário e designa outro membro substituto do MP para oferecer a denúncia (respeita a
autonomia do membro e designa outro).
Membro designado não pode discordar do oferecimento da denúncia, está no exercício do dever funcional, se
não oferecer viola esse dever, “capando” a autonomia, ainda que parcialmente. Está vinculado. Para resguardar o
promotor natural, aí essa designação deverá ser por livre distribuição entre os membros do MP. Se tiver mais de uma
promotoria do júri, livre distribuição em nome do princípio do promotor natural. Se o membro designado obrigado a
oferecer a denúncia entender que não é caso de condenação, para conservar a sua autonomia, pode ter como saída pedir a
absolvição nas alegações finais. Seria uma espécie de compatibilização da exigência da designação vinculada com a
autonomia dos membros do MP conferida pela CF.
Há crítica quanto ao art. 28, pois há resquício de inquisitorialidade do processo penal brasileiro. Invocar o art. 28
fere a imparcialidade do juiz, é uma reminiscência do sistema inquisitorial, o que faz com que alguns autores
afirmem que o nosso sistema é neoinquisitorial, com resquícios de uma época autoritária que foi o berço do processo
penal. Isso se revela no art. 28, por ex. O 156, 385, e tantos outros também trazem isso. O art. 28 a favor do réu: MP não
pediu a suspensão condicional do processo, o juiz, discordando, pode invocar analogicamente o art. 28 in bona partem.
“NE BIS IN IDEM”
No direito penal quer dizer que não pode valorar a mesma circunstância duplamente. Ex.: se houvesse um
incêndio doloso no museu nacional do RJ, e esse incêndio doloso teve a finalidade de matar alguém. Ou seja: homicídio
doloso. A pessoa efetivamente morreu carbonizada. Processo, o juiz, na dosimetria da pena, em considerando que se trata
de homicídio qualificado pela utilização do fogo, não pode agravar a pena com base na utilização do fogo, seria ofensa ao
ne bis in idem, valorar duplamente a mesma circunstância. Ou utiliza o fogo para qualificar o crime de homicídio, ou para
agravar a pena, mas não pode utilizar a mesma circunstância duas vezes.
No processo penal o princípio do ne bis in idem se manifesta dessa maneira e também na vedação de dois
processos ou dois inquéritos idênticos. De acordo com esse princípio, segundo Brasileiro de Lima, ele impede a
deflagração de mais de um processo idêntico, com mesmas partes, mesmo fato, mesmo pedido. Não pode ter dois

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processos idênticos. Da mesma forma, não pode admitir enquanto Estado a instauração de dois inquéritos policiais ou
mais idênticos para apurar o mesmo fato envolvendo os mesmos indivíduos, por ofensa ao princípio do ne bis in idem.
O nome técnico seria litispendência, a ser resolvido por exceção de litispendência. Vai recepcionar para um
processo ser arquivado. Litispendência só existe com relação a processo, não existe com relação a inquérito policial, não é
técnico dizer que diante da dupla instauração de inquéritos policiais idênticos houve formação de litispendência, que é
adstrito a processo. Litispendência: mesmas partes, mesmo pedido, mesmo fato. Ex.: acontece situação/fato consumado na
cidade de Niterói, RJ, e cidadão é preso na capital, RJ. Dois processos: MP de Niterói e de RJ capital oferecem denúncia.
Se for por crimes diferentes? Tipos diferentes? Aí precisa verificar se há conexão ou continência entre as duas situações,
se houver, os processos deverão ser unidos em um juízo só, ou em Niterói ou no rio. Isso a ser visto posteriormente.
A dupla instauração de inquéritos idênticos também ofende o ne bis in idem. Litispendência é resolvida pela
exceção de litispendência, questão prejudicial que consiste em elaborar peça chamada exceção de litispendência no
mesmo prazo de resposta da acusação, que é 10 dias. Pode protocolizar duas peças: resposta e exceção de litispendência.
Ou: pode arguir a litispendência na mesma peça de resposta da acusação, antes do mérito, abrir tópico preliminar para
falar de litispendência e pedir arquivamento dos autos. Há ainda terceira forma de resolver litispendência: pode dizer que
é constrangimento ilegal, e entrar com habeas corpus trancativo/profilático tendo como autoridade coautora o juiz que
recebeu a segunda denúncia que precisa ser arquivada por litispendência. Violação expressa ao dever jurídico. Tem dois
processos que constrangem a liberdade de locomoção duplamente.
Duplo inquérito idêntico: não serve exceção porque não é litispendência, sobra habeas corpus
trancativo/profilático (higienização/limpeza).
Há hipótese em que se admite no ordenamento jurídico brasileiro a instauração de dois inquéritos idênticos.
Hipótese de exceção ao ne bis in idem: mais de um inquérito para apurar os mesmos fatos envolvendo os mesmos
indivíduos. Crime doloso contra a vida praticado por policias militares contra civis. A lei é 9.299/96,
infraconstitucional, gerou polêmica pois ampliaria competências e seria inconstitucional. Houve emenda constitucional
que alterou o art. 125, permitindo que nos crimes dolosos contra a vida praticados por militares contra civis, o processo vá
para tribunal de júri, e não era mais, deixou de ser na justiça militar. Homicídio, participação em suicídio, infanticídio e
aborto: crime doloso contra a vida praticado por policial militar contra civil, dois inquéritos, um na polícia civil
(DHPP – para MP na vara do júri) e outro na própria corporação (inquérito penal militar, para apurar falta
militar, se é caso de prisão, demissão). A corporação também tem interesse em saber o que de fato aconteceu,
começando na corregedoria para apurar os mesmos fatos. No caso de contradição entre esses inquéritos isso é resolvido da
seguinte forma: esses dois inquéritos irão para o Ministério Público, que é o dono da ação, que vai ser ajuizada na vara do
júri. Se o MP é dono, ele pode pegar esse inquérito e requisitar a polícia militar o outro, como é dominus lide, a decisão é
dele. Não vincula o MP. MP e polícia tem grande rusga nesse sentido. Problema para o MP vai ser lastrear essa denúncia,
vai ser mais um argumento a ser vencido pelo MP no oferecimento da denúncia.
ESTADO DE INOCÊNCIA
Aparece como presunção de inocência também. O STF atribuiu a esse princípio a “presunção de não
culpabilidade”. Se refere a não se poder considerar ninguém culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal
condenatória. Art. 5, LVII, e art. 8 do Pacto de San José.
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

Artigo 8. Garantias judiciais


1.Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente,
independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou
para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.

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2.Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.
Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
a.direito do acusado de ser assistido gratuitamente por tradutor ou intérprete, se não compreender ou não falar o idioma do juízo ou
tribunal;
b.comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada;
c.concessão ao acusado do tempo e dos meios adequados para a preparação de sua defesa;
d.direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e
em particular, com seu defensor;

e.direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação
interna, se o acusado não se defender ele próprio nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei;
f.direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes no tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de
outras pessoas que possam lançar luz sobre os fatos;
g.direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada;
h.direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior.
3.A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza.
4.O acusado absolvido por sentença passada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos.
5.O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça.
Tem envergadura supraconstitucional, é algo convencional. A ideia é que a pessoa é presumidamente inocente.
Tem repercussão na prova penal, no que se refere às provas do processo penal, na hora de decretar prisão preventiva, na
hora da dosimetria da pena (Súmula 444, STJ - É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para
agravar a pena-base), na garantia do sigilo do inquérito policial. É a pedra de toque do processo penal democrático, já
que o status libertatis tem que ser garantido.
No direito penal alemão já se discute a participação da vítima no crime, há quem prefira nem falar na expressão
vítima, pois dá a ideia de passividade, inferioridade. A questão é que a vítima não é necessariamente protegida dentro
do processo. O processo penal é o direito da dor, a vítima sofre com o processo penal, muitas vezes a vítima só quer uma
reparação, a devolução do bem, não quer prisão, audiência de custódia, execução provisória da pena, etc. Existem vítimas
que tremem quando são intimadas a comparecer para depor. Isso precisa ser considerado pelo próprio Estado.
Ver HC 126292 de 2016. Nesse HC o STF altera o seu próprio precedente de sete anos atrás e passou a admitir a
execução provisória da pena no Brasil. O placar: 7x4. Em 2009 a mesma tese foi apreciada pelo STF, lá o caso era de
tentativa de homicídio, e em 2016, caso de furto consumado. Na tentativa de homicídio, foi um empresário mineiro, e o
furto, auxiliar de serviços gerais em SP. Em sede de habeas corpus, o STF diz que é possível no caso do furto, mas em
2009, não. O mesmo placar em 2009 e 2016. Lewandowski foi voto vencido em 2016, e disse que não poderia admitir
execução provisória da pena pois a CF é clara, ninguém pode ser considerado culpado antes do trânsito em julgado de
sentença penal condenatória, mas esse não foi o entendimento que venceu em 2016.
A execução provisória da pena ocorre quando há sentença condenatória em primeiro grau, recorre ao tribunal, a
segunda instância nega provimento ao apelo e mantém a condenação, a partir disso a pena já pode ser executada, ainda
que tenha recurso para as instâncias extraordinárias (STF e STJ). Ainda não transitou em julgado. Ter uma diminuição da
chance de liberdade, é condenado em primeiro grau, se mantém no segundo, recorreu para o STJ e perdeu, é uma
diminuição gradual da presunção de inocência. Daí seria melhor falar em presunção de não culpabilidade, pois a
culpabilidade vai se ampliando, se tornando clara, enquanto diminuem as chances de liberdade. Existem mitigações a essa
tese no STJ e STF.
Não é razoável que o cidadão responda a todo o processo em liberdade e tenha pena antecipada.
Prisão/cumprimento: é uma prisão/pena executada antes do trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória. O
grande problema, é que quem vai preso no Brasil não é aquele mesmo que julga/decide por isso. A clientela da prisão

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brasileira não pertence à mesma categoria dos juízes, ministros. Não haveria empatia para a causa. Mandar para a prisão é
um problema.
Foi debatido e flexibilizado nesse HC, portanto, passando-se a admitir a execução provisória da pena. Súmula 444
do STJ: não dá para usar ações penais em curso para aumentar a pena base. É vedado ao poder judiciário. A dosimetria
tem três fases, e a fixação da pena base ocorre na primeira, e não pode usar ações penais em curso para agravar a pena
base.
Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da
sociedade.
Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer
anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes.
Ou seja, nos atestados de antecedentes criminais que forem solicitados aos delegados e autoridades policiais não
se pode mencionar inquérito policial em curso. Ação penal em curso só quem pode expedir é o Tribunal.
Na hora de decretar prisão preventiva ou outra medida cautelar diversa da prisão, o juiz precisa atentar para
presunção de inocência. Prisão cautelar: prisão não pena, sem sentença, a ser decretada no curso do processo,
inclusive quando não tem nem denúncia. Zelar pela presunção de inocência na hora de decretar prisão preventiva:
tem que trazer argumentos concretos na hora de dizer que oferece risco a garantia da ordem pública. Ameaça,
mantém contato com outros participantes do crime, está em contato com a vítima, etc. “Se solto poderá delinquir” não é
fundamentação. Essa decisão fica dentro do inquérito e tem como recurso o habeas corpus de revogação de prisão
preventiva, compondo um auto judicial. Ou pedido de liberdade provisória. A decisão que for tomada aí será lançada
e encaminhada cópia para o inquérito policial. Em audiência de custódia esses pedidos são orais, não tem papel. Às vezes
esse pedido ainda precisa ser feito via papel, por conta da cultura cartorial.
Existem duas dimensões da presunção de inocência, dois desdobramentos: presunção de inocência na dimensão
interna e externa. Interna: a presunção de inocência se destina ao poder judiciário, os juízes precisam tratar aquele que
não tem sentença condenatória com trânsito em julgado como pessoa inocente. Posturas do poder judiciário em
homenagem a presunção de inocência. Externa: tem como destinatário a imprensa. A imprensa na dimensão externa do
princípio da presunção de inocência precisa tratar a pessoa como inocente. No mínimo observando a lei de execução
penal, 7.210/84, que diz que nenhuma pessoa presa pode ser exposta a sensacionalismo.
Art. 41 - Constituem direitos do preso:
[...] VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
Seja prisão processual ou prisão penal. Prisão processual com mais razão ainda. Deve se tratar a pessoa como
presumidamente inocente. Como? Na hora de abordar uma pessoa presa em uma delegacia, as perguntas não podem ser
como vem sendo conduzidas, tem que se respeitar as garantias de quem é presumidamente inocente. Não pode apresentar
a pessoa como alguém culpado pelo crime. A imprensa tem que ter cuidado ao reportar delito ainda em fase de
processo/inquerito. O MP diz isso, mas… a ressalva é importante, e isso é um comprometimento dos órgãos de imprensa
em forma constitucionalmente prevista.
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo
não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em
qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
Isto quer dizer que se estabelece princípios a serem seguidos pelos órgãos de imprensa no Brasil. Vemos muito
essa violação com a conivência dos bacharéis em Direito. Pois essas violações acontecem dentro de repartição pública.
AULA 8 - 17/09/2018

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PRINCÍPIO DE INICIATIVA DAS PARTES
Quem tem iniciativa de movimentar o processo penal, sobretudo quanto o começo e a produção de provas,
são as partes e não o poder judiciário . Isso, tomando como premissa, o sistema acusatório. Por isso não há mais o
processo que tem iniciativa do poder judiciário. Ou seja: inércia do poder judiciário, e iniciativa das partes. Nosso sistema
não é acusatório puro, genuíno. Na atualidade não há sistema puro, inquisitório ou acusatório. Os sistemas são mistos, e
numa perspectiva crítica do nosso processo, seria neo inquisitorial, pois temos premissas acusatórias ao longo de
diversos dispositivos que conferem amplos poderes ao juiz/a no processo penal, usurpando das partes a iniciativa de
movimentar o processo, principalmente no que se refere a questões probatórias.
Movimentar o processo: processo deve tramitar por impulso oficial (despachos, juntadas, abrir vista) – atos de
mero expediente que impulsionam o processo por atuação do poder judiciário. O poder judiciário não precisa de iniciativa
da parte pra mandar juntar – junta-se. Mas em termos de diligência probatória, abertura e deflagração, aí é iniciativa
das partes.
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes,
observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida
sobre ponto relevante.
Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público
tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
Tem sido algo desrespeitado pelo próprio legislador brasileiro. Lei 13.260/16 (lei de combate ao terrorismo) –
permite ao juiz/a ordenar busca e apreensão de ofício.
PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO/FUNDAMENTAÇÃO
Decisões do poder judiciário devem ser fundamentadas, art. 93, IX, CF.
Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura,
observados os seguintes princípios:
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de
nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a
estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse
público à informação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Júri não precisa fundamentar, o conselho de sentença não fundamenta. No tribunal do júri vigora o sistema da
íntima convicção – jurados, juízes leigos, não precisam fundamentar a condenação/absolvição, mas o legislador
estabeleceu que há possibilidade de recurso de apelação da decisão do júri se a decisão dos jurados for contra a prova dos
autos. Mitiga a não exigência de fundamentação das decisões do conselho de sentença. Não precisa fundamentar, julga
com íntima convicção, mas se julgar contra provas dos autos, é passível de apelação e até anulação de sentença ,
sendo submetido a novo júri com novo conselho de sentença.
Dispensa fundamentação a decisão do conselho de sentença. A regra é que todas as decisões do poder judiciário
devem ser fundamentadas.
Decisão que recebe inicial acusatória (denúncia ou queixa crime) – receber a inicial acusatória é entender que ela
está apta, preenche os pressupostos de admissibilidade/requisitos do processo e está apta a tramitar em juízo. É uma
decisão judicial de recebimento, e o oposto é a rejeição de inicial acusatória.
Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:
I - for manifestamente inepta;

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II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.
STJ e STF entendem que a decisão que recebe a inicial acusatória não precisa ser fundamentada. De acordo com
o STF e o STJ a decisão que recebe a inicial acusatória dispensa justificação. Demandaria fundamentação, na visão de
Misael.
Rejeição: é fundamentada, é usual. E quanto ao recebimento? Receber é ofender, em certa medida, o direito de
liberdade de locomoção de quem está sendo acusado. Há recurso da decisão que rejeita inicial acusatória, da decisão que
recebe inicial acusatória não há recurso previsto legalmente. Para impugnar uma decisão dessas: habeas corpus, que é
ação constitucional e não recurso, mas serve, às vezes, como recurso. Seria um HC trancativo. Se o indivíduo estiver
solto, preventivo. Se preso: repressivo. A finalidade seria trancar o processo iniciado indevidamente.
O princípio da correlação se relaciona com a fundamentação – segundo ele a sentença tem que espelhar a inicial
acusatória. A sentença tem que estar adstrita aos limites da inicial acusatória, deve haver correlação entre sentença e
denúncia. Sentença e queixa crime. Lógico que no meio do curso do processo, algumas questões podem alterar a forma
como a denúncia/queixa foi elaborada – pode aditar a denúncia, emendar, se valer da emendatio liberio – institutos que
alteram a inicial de uma queixa. Isso feito pelo MP ou pelo judiciário. São questões que podem alterar a configuração
inicial da denúncia ou da queixa, mas de acordo com esse princípio a sentença deve espelhar a denúncia/queixa, o que faz
cair o art. 385 (que diz que o magistrado pode condenar mesmo quando o MP pede absolvição).
Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público
tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
Dispositivo inquisitorial.
DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO
LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação.
Garantia fundamental fruto da emenda 45/04. Nem sempre existiu. Duração razoável do processo não significa
processo rápido – ou o Tribunal do Santo Ofício seria um exemplo de duração razoável do processo. É aquele processo
cuja duração atende as peculiaridades de cada prazo. Razoabilidade é um desdobramento da proporcionalidade.
Razoabilidade só pode ser aferida casuisticamente. Ex.: mensalão, 40 denunciados, por óbvio esse processo não vai
tramitar no mesmo tempo, ter a mesma duração de tramitação, que um processo só com dois acusados. Por determinação
de normas internacionais, para dizer se houve duração razoável do processo, tem que analisar as características de cada
caso. Vítimas, concurso de crimes, quantas testemunhas, etc.
Tem a ver com economia e celeridade processual – que são corolários, desdobramentos, da duração razoável do
processo. Só pode dizer se houve duração razoável do processo casuisticamente.
A doutrina do não prazo é outro desdobramento. É uma doutrina que tem vigorado no que se refere a prisão
preventiva. O legislador de 2011 esqueceu de colocar termo final na duração da prisão preventiva, que não tem prazo.
Há termo final fatal – a condenação, transitado em julgado, que aí a prisão vai deixar de ser processual para ser transitada
em julgado. Não existe no Código de Processo Penal um prazo de duração, termo final para prisão preventiva. Ela será
mantida enquanto for necessária para o processo. Sua duração está amparada no juízo a ser feito na prática. Isso é uma
armadilha para o processo penal democrático, a presunção de inocência. Se o juiz pode dizer que vai manter o réu
preso preventivamente pois ele ainda oferece risco ao processo/ainda há necessidade da prisão preventiva se manter, então
esse juiz precisa fundamentar. Se há possibilidade de manter prisão preventiva com base na proporcionalidade apenas,
precisa fundamentar.
Art. 394-A. Os processos que apurem a prática de crime hediondo terão prioridade de tramitação em todas as
instâncias. (Incluído pela Lei nº 13.285, de 2016).

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Os processos que apurem crimes hediondos terão prioridade de tramitação em relação aos outros em todas as
instâncias. Preocupação com a celeridade na apuração de crimes hediondos e equiparados no Brasil. Isso garante a
duração razoável do processo? Só tem como aferir casuisticamente. Não dá pra entender que todos os processos que
envolvem crimes hediondos devem tramitar mais rápido que os demais. Estabelecer isso como um padrão é um risco
para a segurança jurídica. Por ex.: estupro de vulnerável, 1 autor, 1 vítima e 2 testemunhas. Ou processo envolvendo
estupro com 30 denunciados, 15 vítimas e 60 testemunhas. De outro lado, pode ter um processo que não envolva crime
hediondo, furto com 2 vítimas, 1 testemunha e 1 acusado. Se estabelece o art. 394-A como dogma, acaba tomando decisão
injustas em relação ao processo do furto.
É preciso analisar criticamente o art. 394-A. Precisa analisar à luz da proporcionalidade. Seria política
criminal de espetáculo. Espécie de resposta à sociedade, falsa sensação de segurança à sociedade. Isso pode ser um tiro no
pé do legislador, pois não se garante efetivamente a justiça criminal simplesmente dando celeridade ao processo,
tem que atentar as nuances de cada caso.
“IN DUBIO PRO REO”
Se o poder judiciário está em dúvida, favorecerá a defesa. É um princípio direcionado ao poder judiciário.
A geratriz desse princípio é a presunção de inocência, status libertatis. A liberdade é a regra no processo penal. O
processo penal está comprometido com a liberdade. Se manifesta principalmente na produção e valoração das provas.
Autoria colateral: não há concurso de agentes, os agentes de um crime não se conhecem, e por isso ambos respondem por
tentativa.
Art. 404. Ordenado diligência considerada imprescindível, de ofício ou a requerimento da parte, a audiência será
concluída sem as alegações finais. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
Parágrafo único. Realizada, em seguida, a diligência determinada, as partes apresentarão, no prazo sucessivo de 5
(cinco) dias, suas alegações finais, por memorial, e, no prazo de 10 (dez) dias, o juiz proferirá a sentença.
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:
(Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes,
observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; (Incluído pela Lei nº 11.690, de
2008)
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida
sobre ponto relevante.
Arts. 404 e 156 – diligências de ofício para tirar dúvida sobre pontos relevantes. Se está na dúvida, deveria ser pro
réu.
O júri possui procedimento bifásico. Primeira e segunda fase – no final da primeira fase, o que a sociedade
espera é decisão de pronúncia, que faz surgir a fase dois. O juiz/a/júri pode estar em dúvida quanto ter havido crime
doloso contra a vida, e o CPP permite que na dúvida, ele ou ela impronuncie o acusado, que não faz coisa julgada
material. Diante de uma decisão de impronúncia, significa dizer que o juiz não está convencido sobre a probabilidade de
ter acontecido crime doloso contra a vida. Se estiver convicto da probabilidade, pronuncia, para que o juiz natural da
causa decida. Nesse caso de impronúncia, ele está na dúvida. Se está na dúvida, não deveria impronunciar, deveria
absolver – in dúbio pro reu. Impronúncia: a qualquer momento o MP pode levantar novos elementos e nova pronúncia.
ISONOMIA PROCESSUAL
Tem a ver com o procedimento do contraditório, cabe ao juiz a tarefa de zelar pelos direitos das partes. As
partes que devem conduzir o processo com iniciativa e isonomia, paridade de armas. As mesmas oportunidades que
oferece ao MP, tem que oferecer a defesa. Acusação e defesa tem que atuar de forma a garantir a isonomia, e o juiz tem
dever fundamental nesse âmbito.

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Assim, isonomia de paridade de armas é abordada no procedimento ordinário, no qual ambas a acusação e
defesa podem arrolar 8 testemunhas para cada fato/resultado. Em alegações finais cada parte fala por 20 minutos. Se o
assistente de acusação quiser falar em alegações finais, pode fazer isso em 10m que devem ser devolvidos para a defesa,
paridade de armas. No júri, nos debates orais, primeiro fala a acusação, depois, fala a defesa. Após a fala da defesa, o
poder judiciário pode perguntar se o MP quer replicar. Pode haver, a partir daí, tréplica. São expressões dessa isonomia.
Essa isonomia é material? E não só formal? Se parte da premissa de processo democrático, essa isonomia precisa
ser material, juiz de garantias tem que ir nesse sentido. No nosso modelo, o juiz se coloca na posição de investigador.
Há então quebra na isonomia, que passa a ser formal. Isso acontece na própria lei, muitas vezes. Ex.: Lei 12.850 (nova lei
de organização criminosa). No que se refere a colaboração premiada, MP e autoridade policial tem acesso ao termo de
colaboração premiada, mas advogado tem que pedir autorização ao juiz. Que isonomia processual é essa?
Agente infiltrado na internet (Lei 13.441/17) – essa figura do agente infiltrado, para ter acesso à investigação só
tem previsão o MP e o delegado de polícia.
Entra, então o conceito de fair play processual: boa-fé processual, lealdade entre as partes. Aí não haveria fair
play processual. Na colaboração premiada não haveria fair play processual pois é induzido a colaborar com a
justiça, pois a liberdade de locomoção está ameaçada. No processo penal o acusado pode mentir em relação aos fatos,
mas não quanto a sua qualificação. Tampouco pode haver mentira agressiva – que é a denunciação caluniosa, imputando
falsamente o crime a terceiros. A mentira no processo penal quebra o fair play do MP?
AULA 9 – 19/09/2018

JURISDIÇÃO
CONCEITOS
Vem de jurisdizer – jurisdictio. Dizer o direito, literalmente. Pode ser conceituado como o poder-dever de dizer
o direito no caso concreto. Ao lado de um autoritarismo, de uma potestade pública, há preocupação com o direito
fundamental. Não é só poder de dizer o direito – é o poder, em nome da soberania do Estado, mas também dever
ressaltando a ideia de um direito puro subjetivo. O conceito conservador é: poder-dever de dizer o direito no caso
concreto. Mas isso não é suficiente, pois precisamos trabalhar, analisar, os institutos de direito processual penal à luz dos
valores constitucionais e convencionais. Jacinto Coutinho e Lopes Jr: além de ser poder-dever de dizer direito no caso
concreto, é, com muito mais razão, direito fundamental.
No processo penal acusatório democrático: jurisdição é o poder-dever de dizer o direito no caso concreto e
também um direito fundamental.
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
Assim, é o princípio da inafastabilidade da jurisdição. Direito de ação como direito fundamental. Com base
nisso, nesse princípio, o poder judiciário não pode se eximir de dizer o direito quando for demandado, ali consagrado
o direito de ação como direito fundamental. Com base nesse fundamento, os teóricos dizem que jurisdição é direito
fundamental. Se trata mais de garantia fundamental ao direito de ação – jurisdição seria uma garantia fundamental. Por
um argumento ou por outro, a jurisdição está atrelada a um direito fundamental. Princípio da inafastabilidade da
jurisdição, portanto.
Possível pergunta da prova: “é correto afirmar que jurisdição pode ser conceituada exclusivamente como poder-
dever de dizer o direito no caso concreto?”. É isso, mas não exclusivamente isso, e explicar por que trazemos o outro lado
do conceito.

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PRINCÍPIOS
INÉRCIA
Parte da premissa de um sistema acusatório. O sistema processual penal acusatório é o que mais se coaduna com
o processo penal democrático de garantias.
Jurisdição não pode atuar de ofício. Jurisdição não pode deflagrar o processo, iniciar, ordenar diligências
probatórias, quando não foi provocada para tanto. Não pode/deve ordenar prisão de ofício, se tomar como premissa
sistema efetivamente acusatório. Não há sistema puro, mas há sistema que está mais coordenado aos ditames
constitucionais.
Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo
juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou
por representação da autoridade policial.

Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito
policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará
remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão
do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a
atender.
Juíza aplicou para arquivar processo. Processo judiciari forme – que se inicia por iniciativa da autoridade judicial.
Não existe mais por força do princípio da inércia da jurisdição.
JUIZ NATURAL
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
Constitucionalmente previsto, garantindo que o poder judiciário atue com independência, imparcialidade, seja
prévio a causa (sem juízes ou tribunais de exceção).
INVESTIDURA
Só quem pode dizer o direito são aqueles investidos em jurisdição. Investidura é, essencialmente, tomar posse
do cargo. Precisa necessariamente passar em concurso de provas e títulos para magistratura? Não, é um dos meios para ter
acesso à magistratura. Acesso aos tribunais por meio interinstitucional, advogados e membros do MP com mais de dez
anos de carreira. Indicação para ministros, também, do STJ/STF. É possível dizer o direito sem ser bacharel em direito,
inclusive. Ministros do STF/STJ não precisam, por exemplo. Julgamento de impeachment pelo senado. Conselho de
sentença, também – condena ou absolve e não tem conhecimento jurídico, indo de encontro com o princípio da justiça
profissional da América Latina.
INDELEGABILIDADE
Princípio da indelegabilidade dos atos jurisdicionais. Princípio que impede que atos jurisdicionais, de
conteúdo decisório, sejam delegados para pessoas que não tenham investidura, que não estejam investidas na tarefa
de jurisdizer, em jurisdição. Há exceções. Atos de mero expediente podem ser delegados pelos magistrados aos seus
serventuários. Junte-se não tem conteúdo decisório, então pode ser feito pelo secretário/analista/diretor. Ato ordinatório:
faço vistas a. Certifique-se o trânsito em julgado. Acoste-se a planilha de custas. Atos de conteúdo não decisório podem
ser delegados. Exceção ao princípio da indelegabilidade da jurisdição dos atos jurisdicionais.
IDENTIDADE FÍSICA
Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do
acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente. (Redação dada pela
Lei nº 11.719, de 2008).

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§ 1o O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua
apresentação. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
§ 2o O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
Se relaciona a pessoa que vai presidir a instrução criminal. Esse princípio é novidade de 2008, previsto no art.
399 do CPP, §2. É novidade, advento da lei 11.719/08, lei que reformou o procedimento comum ordinário, uma das
grandes reformas de 2008 no CPP (essa, a 11.689, e 11.690). Reformou a disciplina das provas. Por esse princípio, a
pessoa que colheu a prova deve sentenciar o processo. Aquele ou aquela que presidiu a instrução criminal, a produção
da prova, que vai a partir do art. 400 até o 402. Desde o depoimento do ofendido/a até o interrogatório do acusado/a,
passando pela inquisição de testemunhas, oitiva de peritos, etc., antecedendo os debates orais que podem ser escritos nas
formas de memoriais.
Vai dizer que o juiz que colheu a prova deve julgar. Nem sempre foi assim. Antes: qualquer um que fosse
investido de jurisdição, mesmo não tendo colhido a prova, julgava o processo. Isso do ponto de vista de economia
processual e maior intimidade/aproximação física com o processo, é um ganho. É defendido pelos teóricos do direito
processual penal democrático. Coloca nas mãos da pessoa que estava com contato direto com a instrução. Crítica contra:
esse juiz estaria “viciado”, contaminado. Parece ao professor que o aspecto positivo pesa mais, do ponto de vista da
duração razoável do processo, princípio da correlação para fundamentar melhor a sentença, etc.
Há de se refletir se, no Chile, onde tem mais juízes, é um ganho. No Chile: 24h, no máximo. Dentro de um mês:
decidido pelo colegiado de três juízes. Lá: oral, produzida na frente do juiz. Juiz não ordena diligência probatória, por ex.
Aqui: sistema cartorial, acaba precisando desse princípio. Processo civil sempre teve esse princípio. Em 2008, o processo
penal se harmonizou com o civil nesse sentido.
Tem exceções: remoções, férias, exonerações, promoções para desembargador, aposentadoria, morte, autos
serão remetidos ao substituto legal para efeitos de decisão, de proferimento de sentença.

COMPETÊNCIA
Estudaremos esse assunto pela CF/88 e pelo CPP. É um assunto de direito processual penal e direito
constitucional. Existem critérios de fixação de competência criminal no brasil,
CONCEITOS
Tradicionalmente a doutrina conservadora, inspirada na Itália, lançou mão de vários expoentes de TGP e trouxe o
conceito de que competência é a parcela de jurisdição, fragmento de jurisdição. Nem todas as pessoas investidas em
jurisdição podem decidir todas as causas. Existe um rol delimitado de causas que podem ser decididas por aquele/a
juiz/a. Ele/a tem jurisdição, mas não pode decidir todas as causas, nesse sentido se diz que competência é uma
delimitação, uma parcela/fragmento de jurisdição. Ex.: juíza da vara de tóxicos não pode decidir pela decretação de uma
medida de restrição da liberdade contra um adolescente infrator, que são questões da vara de infância e juventude. Juiz
singular não pode condenar ou absolver num crime doloso contra a vida – não tem competência para isso. Um juiz da vara
da paz nos bairros não pode decidir uma causa militar pelo mesmo motivo.
Esse conceito (o antigo, tradicional e italiano) não se sustenta sozinho num sistema penal democrático. É
também uma garantia fundamental – não é só delimitação, isso seria dizer pouco e seria um conceito tecnicista.
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
Tem relação com o princípio do juiz natural, imparcial, prévio e independente. Não é qualquer juiz, é o juiz
com esses atributos.
ESPÉCIES
Existem as absolutas e a relativa. Absoluta: questão de ordem pública. Vício de incompetência absoluta pode
ser reconhecido a qualquer tempo pelo poder judiciário, e não se submete à preclusão. Já competência relativa, é

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questão que diz respeito mais à esfera das partes – não que não seja alvo de interesse do Estado e da sociedade, pois toda
sociedade tem direito ao respeito ao devido processo legal. Todos os outros princípios estão encontrados na ideia de
devido processo legal. Competência relativa é mais relacionada à esfera de domínio das partes, por isso deve ser o vício
reconhecido oportunamente, na primeira oportunidade que a parte tiver de falar nos autos, sob pena de preclusão.
Critérios de competência absoluta: em razão da pessoa e em razão da matéria. Critérios de competência relativa:
em razão do lugar.
Exceção à regra: Aury Lopes Jr. diz que todas as competências são absolutas, inclusive a em razão do lugar.
Ele é minoritário quando afirma que mesmo a competência em razão do lugar também é absoluta. Ele diz que com base
no art. 109 do CPP (Art. 109. Se em qualquer fase do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente,
declará-lo-á nos autos, haja ou não alegação da parte, prosseguindo-se na forma do artigo anterior.), o juiz pode
reconhecer a qualquer tempo qualquer vício que lhe torne incompetente para a causa. Para Aury, quando o art. 109 diz
isso, não especifica qual vício era esse – competência em razão da matéria, pessoa, local, etc. Diante disso, inclusive a
competência em razão do lugar, é absoluta pois o juiz pode reconhecer de qualquer tempo, mesmo se ninguém lhe pedir. É
entendimento minoritário, não é o que prevalece na doutrina.

CRITÉRIOS DE COMPETÊNCIA
Na CF, parte do poder judiciário, 102/105/125/108 a 121/109. No CPP – a partir do art. 69 e seguintes. Critérios
principais: em razão da “pessoa” (não é a pessoa, o fundamento é proteger o cargo, a instituição a qual ela pertence, não a
pessoa; para quem pensa assim: competência funcional, por prerrogativa de foro), ratione materia, em razão de matéria
(especializada, eleitoral, militar, justiça comum federal/estadual – dentro da comum, não especializada) e em razão do
lugar (tem que saber: ex.- conduziu delito em Niterói mas está custodiado no RJ, o processo vai ser deflagrado onde? E se
não souber de qual município alguma rua pertence? Qual a justiça competente? E se o paradeiro do acusado for
desconhecido? E se for crime permanente/continuado? Quando recebe a intimação para oferecer resposta, argui logo a
incompetência relativa – se não fizer isso, vai ser como se tivesse aceitado a mudança do foro, pois quem fixou a
competência foi o MP que ofereceu a denúncia).
O professor usou Levy Emanuel Mário nesse esquema: competência em razão da pessoa, matéria e por último
lugar.
EM RAZÃO DA PESSOA/FUNCIONAL
FUNDAMENTO
Competência funcional, por prerrogativa de foro, foro privilegiado (pior termo). Seu fundamento é ser uma
proteção à instituição, não a pessoa. Por isso não é privilegio puro e simples. Não é prerrogativa da pessoa, pessoal, mas
sim da instituição à qual ela pertence. Quando diz que determinadas pessoas serão julgadas por Tribunal (ou seja, não
responder a juiz singular, mas à tribunal). É uma prerrogativa institucional, não individual.
Segundo fundamento: é para proteger quem julga essa pessoa também. Ex.: juiz singular de interior julgando
governador? A pressão política/social pode prejudicar.
Esses são os dois fundamentos.
HISTÓRICO DO ART. 84 CPP
Art. 84. A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos
Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que
devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade.
Chances de recurso: e o duplo grau de jurisdição? Não há. Não tem as mesmas chances de recursos que os
outros tem. Dentro do Brasil, não tem mais. A não ser que saia da turma para ser julgado pelo plenário. É um argumento
que vai de encontro com a ideia de um privilégio – tanto que existem pessoas que renunciam ao cargo para não serem
julgadas pelo Tribunal, aí o processo sai do Tribunal e vai pro juiz singular. Carmem Lúcia: se o cidadão com foro

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renuncia perto do julgamento pelo STF, na visão dela há indício de fraude e por isso o processo continua lá, não havendo
a remessa dos autos. Processo todo instruído no STF: não vai para instância ordinária, não há remessa dos autos. Isso fica
ao crivo do próprio Ministro relator. Professor defende que não é algo privilegiado. Mais suscetível a espetacularização da
mídia.

STF 394,451, Lei 10628/02, ADI 2797-2 + 2860-0


AULA 10 - 24/09/2018
Na prática, discute competência via exceção, e nos casos de HC. Qual o juízo competente? O primeiro ou o
segundo? Dá pra fazer isso via exceção de litispendência, exceção de incompetência e se falar do remédio constitucional,
o HC, ação autônoma de impugnação exclusiva do paciente/réu para salvaguardar a liberdade de locomoção quando
restringida ou sob risco de ser restringida.
Além dos critérios já citados, existem critérios auxiliares para competência funcional: residência do acusado,
conexão e continência, prevenção, distribuição, etc.
Súmula 394, STF: Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de
função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício.
Ou seja, dizia que o foro por prerrogativa de função continuava, se mantinha, mesmo após o fim do exercício do
cargo ou do mandato. Ocorre que, em 2001, o próprio STF cancelou a sua súmula. Em 2001 o STF cancelou a sua súmula
394 passando a valer a súmula 451.
Súmula 451, STF: A competência especial por prerrogativa de função não se estende ao crime cometido após a cessação
definitiva do exercício funcional.
É dizer: uma vez extinto o cargo ou mandato, o processo tem que ser redistribuído. É o sentido
completamente oposto – o foro por prerrogativa de função só perdura enquanto perdurar o cargo ou mandato. O
que está fundamentando esse enunciado é o princípio da atualidade do exercício do cargo ou mandato. Essa súmula,
451, ao contrário da sua antecessora, 394, homenageando o princípio da atualidade do exercício do cargo ou mandato,
passou a prever que o foro privilegiado só duraria enquanto durasse o exercício do cargo ou mandato – quando
acabasse/aposentasse/renunciasse redistribuiria para a primeira instância. Os atos instrutórios se mantêm, os decisórios
se renovam.
No apagar das luzes do governo FHC, 24 de dezembro de 2002, foi sancionada a lei 10.628/02, que acrescentou
dois parágrafos ao art. 84 do CPP. Para garantir os processos dos parlamentares que respondiam no governo FHC,
acrescentaram
1) represtinando o entendimento cancelado no STF: repristinação é quando uma lei que revogou é revogada e o
efeito da revogada volta – volta do entendimento de que o foro por prerrogativa de função se manteria íntegro mesmo
após o exercício do cargo ou mandato (já tinha sido objeto de controle de inconstitucionalidade pelo STF);
2) o foro privilegiado se mantém mesmo em ações de improbidade administrativa (ação de improbidade
administrativa não é penal, é cível, e foro por prerrogativa de função é competência criminal, então não pode tramitar no
Tribunal, só na primeira instância – inconstitucionalidade flagrante e material).
Duas ADIs foram ajuizadas para declarar a inconstitucionalidade desses dois parágrafos, e foram julgados
inconstitucionais.
Tudo que diz respeito a competência funcional deve ter como paradigma o ano de 2018. Em maio, o STF julgou
questão de ordem na ação penal 937. Já havia uma discussão anterior no sentido de restringir o foro privilegiado, na
questão de ordem o STF resolveu
a) restringir o foro por prerrogativa de função somente para as pessoas previstas na Constituição Federal;
b) somente para infrações penais comuns (não é qualquer infração; nas de responsabilidade o sistema é outro e
o julgamento é pelo Senado com presidência do presidente do STF);
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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
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MARIANA SOARES SANTOS
c) além de somente enquanto durar o exercício do cargo ou mandato dessa pessoa (princípio da atualidade
do cargo ou mandato; acabou o cargo ou mandato por qualquer questão, redistribui o processo para a primeira
instância do poder judiciário).
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:
Art. 118. São órgãos da Justiça Eleitoral:
Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas
eleitorais.
Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.
Art. 102, 105, 108, 125, 118, 121 – revisão constitucional.
Súmula 704, STF: Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por
continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.
Supremo mitigou essa restrição no que se refere a instruções criminais já concluídas no STF – se a instrução
criminal já concluiu (prova já foi colhida) no Supremo, em nome do princípio da identidade física do juiz, art. 399, §2,
CPP, não redistribui. Isso foi seguido pelos outros tribunais do Brasil, TJs, TRE, STJ. Esse entendimento acabou
mudando a sistemática da competência.
Hoje, falar sobre competência funcional precisa falar da ação penal de ordem 937. Antes disso, o próprio STF
tinha outro entendimento, o da sumula 704, que foi superada pelo entendimento da questão de ordem 937 do STF. Essa
súmula foi fruto da ação penal 470 (mensalão). Quando, no calor da discussão sobre a ação penal 470, que julgava o
mensalão, 40 denunciados, dentre eles parlamentares e não parlamentares.
No entendimento do STF a reunião de processos no STF envolvendo pessoas com e sem prerrogativa de foro não
ofendia o devido processo legal. Houve discussão se os sem prerrogativa, pelas regras de conexão, deviam responder no
STF ou isso ofendia o devido processo legal, o princípio do juiz natural, contraditório, ampla defesa. O STF devolveu a
comunidade jurídica a resposta de que não ofendia, súmula 704. O problema é que essa sumula tem que ser relida a luz da
questão de ordem na ação penal 937. Hoje, essa súmula restringe o foro por prerrogativa de função no Brasil,
enquanto antes ampliava. Causas conexas tem que ser redistribuídas pra quem não tem foro por prerrogativa de
função e não respondem no STF.
PRERROGATIVA DE FORO + JECRIM
Quem tem foro e comete infração penal de menor potencial ofensivo, parece conflito aparente de normas. Uma
norma diz que Rui Costa, por exemplo, tem foro privilegiado no STJ, mas outra norma constitucional diz que infrações de
menor potencial ofensivo devem ser processadas e julgadas no JECRIM.
No exemplo de Rui Costa cometer importunação ofensiva ao pudor: todas infrações e contravenções com pena
menor de 2 anos são julgadas pelo JECRIM. Rui Costa responde, nesse caso, pois quem tem foro por prerrogativa de
função e comete menor potencial ofensivo continua respondendo no seu Tribunal, porém com observância do
procedimento comum sumário, o do JECRIM.
O processo se mantém no STJ para respeitar norma constitucional, mas no STJ será respeitado o rito sumaríssimo,
dos Juizados Especiais Criminais. O rito é não caber prisão em flagrante (se comparece à delegacia e se compromete a
comparecer em juízo quando for intimado, não cabe prisão em flagrante); no primeiro momento cabe tentativa de
reparação cível dos danos (procedimento cível dentro do criminal); possibilidade de transação penal (em troca de não
ter processo, o cidadão paga uma pena alternativa – pintar, dar cesta básica, palestras).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA - FACULDADE DE DIREITO - 2018.2
MARIANA SOARES SANTOS
Pode querer o processo e provar a sua inocência – frustra a transação penal, o juiz recebe a denúncia e ainda há
possibilidade de sursis processual. Ainda pode ter uma pena restritiva de direitos. A lei 9.099 é cheia de institutos
despenalizadores, foi a intenção de diminuir o superencarceramento no Brasil.
Em resumo: foro por prerrogativa de função e comete menor potencial ofensivo, ainda responde no Tribunal, mas
com observância à lei 9.099.
PRERROGATIVA DE FORO + JÚRI (STF 721)
Crime doloso contra a vida com prerrogativa de foro? Ex.: ACM Neto comete homicídio doloso, feminicídio.
Existe regra expressa na CF, que diz que ele vai responder no TJ. Ou seja: quem tem foro por prerrogativa de função
não vai pro júri, continua respondendo no seu Tribunal. Aqui estamos diante de exceção criada pela própria CF, a
competência do júri também está na CF, mas a regra de competência para determinados parlamentares também está na
CF. Quem comete crime doloso contra a vida com prerrogativa de foro continua respondendo no seu Tribunal. Problema:
há pessoas com foro privilegiado dado pela Constituição estadual. Ex.: secretário de estado tem foro por prerrogativa
de função no TJ pela Constituição do estado da Bahia. Vereadores, também. Nesse problema para o STF, quando um
secretário de estado comete crime doloso contra a vida, responde no TJ ou no júri? No júri. Isso por uma questão de
hierarquia das normas. A norma constitucional está acima da norma estadual, então a competência do júri prevalece
sobre a competência criada pela Constituição estadual.
Súmula 721, STF: A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função
estabelecido exclusivamente pela constituição estadual.
É um júri normal de primeira instância no caso do secretário de estado.
PREFEITOS (art. 29, X, CF; STF 702)
Prefeitos: prerrogativa de foro no TJ. Art. 29, X – prefeitos respondem ao TJ.
Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e
aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos
nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
[...] X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça;
É, sobretudo, forma de proteger quem julga. No caso de juiz de primeira instância julgar prefeito, haveria
instabilidade jurídica. O foro por prerrogativa de função não é para proteger a pessoa que ostenta a prerrogativa, mas sim
a instituição, e quem julga. Dentre os princípios de processo penal: princípio de juiz natural, que é independente, e para
garantir isso há essa regra.
A CF não disse tudo o que deveria no 29, X. Há situações em que prefeitos cometem, por ex., crimes eleitorais,
federais. Diante disso: súmula 702 que diz que a competência do TJ é só para crimes estaduais comuns. Crimes eleitorais,
TRE. Desvio de verbas federais: TRF. Crimes especializados ou federais serão julgados pelo tribunal respectivo.
Súmula 702, STF: A competência do tribunal de justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da
justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau.
Ver súmulas 208 e 209 do STJ: tratam da hipótese de desvio de verbas pelos municípios.
Súmula 208, STJ: Compete a Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a
prestação de contas perante órgão federal.
Súmula 209, STJ: Compete a Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada
ao patrimônio municipal.
Quando a verba ainda está pertencente ao orçamento da União, competência federal. Integralizado no município:
competência estadual. Tem que ser analisado caso a caso para ver se há interesse direto da União na causa ou não. Se sim,
competência federal pelo 109, I, CF.
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
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I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de
autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e
à Justiça do Trabalho;
Não dá para ler essas duas súmulas desgarradas da CF. A CF está acima dessas duas, então tem que recorrer ao
109,I, para dizer se houve competência federal ou não na matéria.
RENÚNCIA AO CARGO
STF: AP 333/07 X AP 396/10
Parlamentares respondiam no STF por infração penal comum, e com a proximidade do julgamento renunciaram
ao cargo, para não serem julgados e demorar mais o processo e dar oportunidade a extinção da punibilidade pela
prescrição. O STF viu isso, porém, respeitando o princípio da atualidade do cargo ou mandato, não havia nada a fazer.
Ação penal 333/07, sob a relatoria do ministro Joaquim Barbosa. Parlamentar da Paraíba respondia no STF e, próximo do
julgamento, renunciou para favorecer a extinção da punibilidade pela prescrição. Joaquim Barbosa respeitou a
jurisprudência do STF. A renúncia, portanto, redistribuiria para a primeira instância.
Em 2010, 3 anos depois, em outra ação penal discutindo ação parecida, 396/10, min. Carmem Lúcia teve
entendimento contrário e vislumbrou fraude processual, negando a redistribuição diante do indício de fraude.
Contrariou precedente do STF e manteve o processo lá. Houveram oscilações no entendimento da renúncia. Hoje:
casuístico. Tem que analisar a questão de ordem da 937/18 – decisão de Joaquim Barbosa respeitando a identidade física
do juiz.
Quando já concluiu a instrução criminal: continua. É uma instabilidade jurídica muito grande. A força dos
precedentes judiciários, no processo penal não acontece/não é respeitado. Atos instrutórios: produção de provas
(testemunhas, interrogatórios, peritos); atos decisórios: podem ser revogados. Ideia: juiz que produziu a prova
pode produzir decisão melhor.
ART. 85 CPP
Art. 85. Nos processos por crime contra a honra, em que forem querelantes as pessoas que a Constituição sujeita à
jurisdição do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Apelação, àquele ou a estes caberá o julgamento, quando
oposta e admitida a exceção da verdade.
Imaginar que um juiz de direito tenha sofrido um crime contra a honra de um cidadão. Calúnia. O juiz de direito,
então, ajuizou queixa crime no JECRIM – até então tá certo. No JECRIM, o cidadão comum, para se defender,
excepcionou: exceção da verdade (nos crimes contra a honra cabe provar que o que disse não era mentira, era verdade) –
mas essa exceção precisa ser julgada também. Quem tem competência para julgar a exceção? JECRIM, turma recursal do
JECRIM, TJ, STJ? Cidadão comum não tem foro privilegiado, mas juiz de direito tem, no TJ. A quem cabe processar e
julgar a exceção da verdade nesse caso? TJ, pois o réu, na exceção da verdade, agora é o juiz . Na ação principal ele
era vítima. Na exceção da verdade os papéis se inverteram, quem era vítima passou a ser réu, e quem era réu passou a ser
vítima. O excipiente é o caluniador, autor da exceção, e o excepto é o réu, o juiz de direito. Quem tem como julgar juiz
como réu, TJ. Art. 85 CPP.
Só cabe exceção da verdade nessa hipótese para o crime de calúnia. Para os que tem foro privilegiado, não
cabe exceção da verdade no crime de difamação. Embora o CP preveja a exceção da verdade para calunia e difamação,
a jurisprudência majoritária, inclusive nos tribunais superiores, só admitem exceção da verdade contra quem tem foro
por prerrogativa de função na calunia. A ideia é de que não teria interesse. Difamação: história que não é crime (x sai com
mulheres casadas); injúria (raça, cor, etnia); calúnia (atribuir falsamente a autoria de um crime).
COMPETÊNCIA “RATIONE MATERIAE”
Investigamos a natureza do crime imputado à pessoa: especializada ou comum? Especializada: vai ser lá. Comum:
justiça residual. Dentro da justiça comum, ainda precisa perguntar se é competência federal ou estadual. Justiça
especializada em matéria criminal no Brasil são duas: militar e eleitoral.
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MARIANA SOARES SANTOS
Justiça do trabalho é justiça especializada, mas não tem competência criminal. Crime de falso testemunho
em audiência trabalhista: quem vai julgar o crime é a justiça comum federal, pois a justiça jus laborarista, trabalhista,
não tem competência criminal, embora juiz do trabalho possa dar voz de prisão em flagrante, quem atua em
flagrante é justiça federal.
Justiça comum é tudo que não é nem criminal nem eleitoral: o que sobra. Justiça comum tem caráter residual.
Justiça federal e estadual/distrital – tudo que não é especializado é comum, residual, e dentro dela tem essas duas. Só vai
ser estadual o que não for federal, ou seja, residual do residual. A federal prevalece sobre a justiça dos estados e Distrito
Federal.
Observação: júri? O tribunal do júri, seria justiça especializada ou pertence a justiça comum? Do ponto de vista
da hierarquia, trata-se de justiça comum. Do ponto de vista da organização judiciária, o júri está no âmbito da justiça
comum dos Estados e da União, pois há júri federal. É pouco usado, mas existe. Justiça da paz dos lares/vara da
violência doméstica e familiar: pertence a justiça comum. Vara da infância e juventude: julga questões da infância e
juventude, pertence a justiça comum.
AULA 11 – 26/09/2018
JUSTIÇA ESPECIALIZADA
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR (ARTS. 124 E 125 CF; CPM; CPPM)
Art. 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.
Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência da Justiça Militar.
Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.
[...] § 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos
em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil,
cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
O CPM é o Decreto Lei 1.001/69 (auge da ditadura militar). O CPPM é o Decreto Lei 1.002/69. A sistematização
da justiça militar segue dois princípios que norteiam a vida na caserna: hierarquia e disciplina. As peculiaridades da
justiça militar que fazem com que esta acabe divergindo da justiça não militar estão assentadas na hierarquia e disciplina.
Quando um crime deve ser julgado pela justiça militar? Quando praticado por militar em serviço? Quando for praticado
contra instituição militar? Quando atinge um bem jurídico militar?
PRINCÍPIOS
Analisando jurisprudência e precedentes começamos a perceber esvaziamento da competência da justiça militar
no Brasil durante muito tempo. O STJ, acompanhado pelo STF, passou a entender que só haveria competência da
justiça militar se houver interesse militar. Não é qualquer conduta praticada por militar em serviço. O simples fato de
ser praticado por militar em serviço não arrastaria a competência para a justiça militar, seria necessário mais, seria preciso
haver interesse militar sendo discutido na causa.
INTERESSE MILITAR
Interesse militar é entendido, na jurisprudência do STJ (que passou a julgar conflitos de competência), como:
1) se o crime estiver tipificado no CPM (tem que ser crime militar, portanto – existem duas espécies de crime
militar, os próprios e impróprios; os próprios são aqueles previstos só no CPM, como deserção, insubordinação,
abandono de posto, crimes exclusivos da caserna; os impróprios são aqueles previstos no CP e no CPM, ou seja,
estupro, furto, homicídio culposo, lesão corporal);
2) deve haver uma hipótese no art. 9 do CPM (ter sido praticado em uma das hipóteses do art. 9);

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3) tende a ofender bem jurídico militar (é preciso que exista uma ofensa ou ameaça de ofensa ao bem jurídico
da administração militar; pode ser conduta tipificada no CPM, esteja presente circunstância do art. 9 e não ofenda
necessariamente o bem jurídico militar – é algo a ser aferido casuisticamente).
Se faltar um desses critérios, será competência da justiça penal comum, civil, não militar.
Houve um esvaziamento da justiça militar diante desse argumento, principalmente da justiça militar federal. São poucos
processos, poucos servidores, poucos membros do MP militar da União, expediente de trabalho reduzido. Simplesmente
não há muitos processos. Esse esvaziamento se expressou em alguns precedentes, que viraram súmula.
HC 13.1076 STJ (BRIGA ENTRE MILITARES)
Ministros entenderam que briga entre militares fora da função não tem interesse militar. Competência não é da
justiça militar, mas da justiça comum.
STJ 53 (JM ESTADUAL x CIVIL)
Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar civil acusado de prática de crime contra instituições militares
estaduais.
Justiça militar estadual não julga civil, só militar. Ou seja: se um civil comete conduta ou é partícipe em
conduta tipificada como crime militar, não responde na justiça militar do estado, mas a justiça militar federal julga civil.
Deserção, insubordinação, são crimes de mão própria – mas nos crimes militares impróprios dá pra imaginar a figura do
partícipe. Nessa hipótese, cisão do processo. Civil pela justiça comum, militar pela justiça militar estadual.
STJ 6 (ACIDENTE DE TRÂNSITO)
Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar delito decorrente de acidente de trânsito envolvendo viatura de
Polícia Militar, salvo se autor e vítima forem Policiais Militares em situação de atividade.
Que envolva viatura militar. A vítima era civil. Nessa hipótese, o STJ disse que a competência não é militar.
Acidente de trânsito com viatura militar envolvendo vitima civil é da competência da justiça comum. Se a vítima for
militar, aí é da justiça militar.
STJ 78 (CRIME EM OUTRO ESTADO)
Compete à Justiça Militar processar e julgar policial de corporação estadual, ainda que o delito tenha sido praticado em
outra unidade federativa.
Crime militar praticado em outro estado na federação: policial militar do estado A estava em missão no estado B,
e no estado B cometeu crime militar. Vai responder na justiça militar do estado A. Se não estivesse em missão, nem
teria interesse militar.
STJ 90 (CRIME MILITAR)
Compete à Justiça Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar, e à Comum pela
prática do crime comum simultâneo àquele.
Justiça militar só julga crime militar. Se o crime não militar for cometido em conexão ou continência com
crime militar, à luz da súmula 90, devia haver cisão obrigatória dos processos, de modo que o crime militar fosse
julgado na justiça militar e o crime não militar fosse julgado na justiça comum.
STJ 75 (FACILITAÇÃO DE FUGA)
Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar o policial militar por crime de promover ou facilitar a fuga de
preso de estabelecimento penal.
Fuga de preso em presídio não militar. Também era da competência da justiça comum, pois o estabelecimento era
não militar. Hipótese de militar que vai no PLB e facilita fuga de detento, não haveria interesse militar para o STJ.
São sumulas que esvaziaram a competência da justiça militar.

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DESCLASSIFICAÇÃO PRÓPRIA
Os jurados podem entender que não houve dolo. Ex.: conselho de sentença está julgando homicídio doloso
praticado por militar contra civil. Isso é da competência do júri militar estadual. Lei 9.299/96. Crime doloso contra a
vida de militar estadual contra civil: júri. Imaginar que foi para o Tribunal do júri, e nas perguntas ao conselho de
sentença, os jurados entendem que foi homicídio culposo e não doloso – a isso se dá o nome de desclassificação própria.
Houve crime que não foi da competência do júri, já que o júri só tem competência para crimes dolosos contra a vida.
Sendo um homicídio culposo: o processo tem que ser remetido para a justiça militar, porque homicídio culposo é da
competência da justiça militar. O que remanesceu da desclassificação própria foi crime militar, homicídio culposo,
previsto no CPM.
LEI 13.491/17
Mudou tudo, e ampliou a competência da justiça militar no Brasil. O panorama atual, contexto atual, da justiça
militar no Brasil, envolve a lei sancionada em outubro de 2017, 13.491, que alterou o art. 9 do CPM, ampliando a
competência da justiça militar. Ampliando, pois, agora, os crimes militares próprios ou impróprios, e os crimes que não
estejam previstos no CPM, ainda que não militares, se praticados em uma das circunstâncias do art. 9, são da
competência da justiça militar.
CRIMES MILITARES E COMUNS
Antes: justiça militar só julgava crime militar, súmula 90 do STJ. Hoje: com a lei 13.491/17, a justiça militar
pode julgar inclusive crime não militar, porque a redação passou a ser “os crimes militares e os crimes previstos na
lei civil, quando:”, no art. 9. Ex.: abuso de autoridade – um militar praticava furto e abuso de autoridade, dois crimes.
Furto: crime militar. Abuso de autoridade, não. Abuso de autoridade é conduta prevista na lei 4.898/65., que não tem
previsão no CPM. Trata-se de crime não militar. Como julga isso? Antigamente, súmula 90: deveria haver cisão
obrigatória dos processos, de modo que a justiça militar julgaria o crime militar e a justiça comum o abuso de autoridade,
que não é crime militar. Isso mudou em 2017. Desde então, com a mudança do art. 9 do CPM, o abuso de autoridade vai
ser julgado pela justiça militar, havendo interesse militar (circunstância do art. 9 e ofender bem jurídico militar). Para
polícia militar julgar crime não militar hoje: basta ter sido cometido nas circunstâncias do art. 9 e ofender bem
jurídico militar, não precisa ter sido cometido em conjunto com crime do CPM.
CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA
Até outubro de 2017 o que existia era: Militares dos Estados (PM, PRF), em praticando crimes dolosos contra a
vida contra civis, respondem no Tribunal do Júri (essa era uma inovação em 1996). Aqui segue-se a mesma linha de
raciocínio do STJ de esvaziar a JM. Com o advento da EC 45, ratificou-se essa ideia. Surge uma interrogação: E os
militares das Forças Armadas respondem perante quem? Com o advento da lei acima (vide art 9º, §1º), não se especifica
qual a “espécie” de militar é esse, todavia, da leitura do §2º, os crimes praticados por militares das Forças
Armadas, quando praticados em tais contextos (ver na lei), serão de competência da Justiça Militar.
Em suma: ela amplia a competência da Justiça Militar para os crimes comum conexos quando praticados
no contexto do art. 9º. Antes não era assim, pois havia cisão obrigatória. O que acontece é a usurpação da
competência do Tribunal do Júri. Outro ponto é a fixação da competência da JM da União para julgar crimes dolosos
contra a vida no contexto do parágrafo 2º e seus incisos do art. 9. Esses incisos possuem muita generalidade e por isso dão
muita margem de interpretação. Na prática, tendo em vista a amplitude, qualquer crime pode ser encaixado nesse rol e ser
julgado na JM.
ESTRUTURA DA JUSTIÇA MILITAR
ESTADUAL
No âmbito estadual, a 1º instância é formada por Auditorias e Conselhos Militares. Por sua vez, a 2º instância é
formada pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal da Justiça Militar. Vide art. 125 na CF - Só existe em SP, MG, RS.

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Observação: Ela somente julga militares. Se um civil pratica crime com uma policial rodoviária federal ele deverá
ser julgado na Justiça Comum.
A Justiça Estadual Militar não julga civil.
A 3º instância é o Superior Tribunal Militar.
FEDERAL
No âmbito federal, 1ª Auditorias e Conselhos Militares. (Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica). Há
um MP Militar formado por promotores de justiça de carreira própria. Seu concurso é específico. No âmbito dos Estados,
há uma carreira única e esse promotor é designado para essa função.
2ª STM.
A Justiça Federal Militar pode julgar civil.
Atenção: um civil pode ser julgado na justiça militar? Depende. Dependerá da competência, se dos Estados ou
Federal. Ver art. 342 do CPM.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL
Vide art. 118 à 121, CF + Lei 4737/65, CE.
Art. 118. São órgãos da Justiça Eleitoral:
I - o Tribunal Superior Eleitoral;
II - os Tribunais Regionais Eleitorais;
III - os Juízes Eleitorais;
IV - as Juntas Eleitorais.
Art. 119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete membros, escolhidos:
I - mediante eleição, pelo voto secreto:
a) três juízes dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal;
b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça;
II - por nomeação do Presidente da República, dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade
moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal.
Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os Ministros do
Supremo Tribunal Federal, e o Corregedor Eleitoral dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça.
Art. 120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no Distrito Federal.
§ 1º - Os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão:
I - mediante eleição, pelo voto secreto:
a) de dois juízes dentre os desembargadores do Tribunal de Justiça;
b) de dois juízes, dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça;
II - de um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do Estado ou no Distrito Federal, ou, não havendo, de
juiz federal, escolhido, em qualquer caso, pelo Tribunal Regional Federal respectivo;
III - por nomeação, pelo Presidente da República, de dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e
idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça.
§ 2º - O Tribunal Regional Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente- dentre os desembargadores.
Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas
eleitorais.
§ 1º - Os membros dos tribunais, os juízes de direito e os integrantes das juntas eleitorais, no exercício de suas funções, e
no que lhes for aplicável, gozarão de plenas garantias e serão inamovíveis.
§ 2º - Os juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de
dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual
para cada categoria.

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§ 3º - São irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta Constituição e as
denegatórias de habeas corpus ou mandado de segurança.
§ 4º - Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando:
I - forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei;
II - ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais;
III - versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais;
IV - anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais;
V - denegarem habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção.
ESTRUTURA
1º Juízes e Juntas Eleitorais. Não há carreira específica de Juiz Eleitoral. 2º Tribunal Regional Eleitoral. 3º
Tribunal Superior Eleitoral
Algumas observações devem ser feitas:
a) O TSE não possui competência criminal originária, mas possui competência criminal recursal.
b) Cabe recurso ordinário eleitoral para o TSE de decisões denegatórias de HC e MS proferidas pelo TER.
c) Quando o TSE julga matéria infraconstitucional a decisão é irrecorrível. Se a matéria for constitucional cabe
recurso extraordinário ao STF
d) Recurso especial eleitoral é julgado pelo TSE em matéria infraconstitucional em razão da uniformização da
jurisprudência.
e) Da sentença criminal eleitoral cabe recurso criminal eleitoral (como se fosse uma apelação), no prazo de 10
dias.
Art. 363 do CE já previa a execução provisória da pena, embora haja possibilidade de recurso. Olhar. HC 126. 292.
Art. 363. Se a decisão do Tribunal Regional for condenatória, baixarão imediatamente os autos à instância inferior para
a execução da sentença, que será feita no prazo de 5 (cinco) dias, contados da data da vista ao Ministério Público.
Parágrafo único. Se o órgão do Ministério Público deixar de promover a execução da sentença serão aplicadas as
normas constantes dos parágrafos 3º, 4º e 5º do Art. 357.
PRERROGATIVA DE FORO E JE
Quem tem prerrogativa de foro no TJ e no TRF, se praticar crime eleitoral, será julgado onde? Responderá
perante o TRE.
Quem tem foro privilegiado no STJ ou no STF responde perante o STJ, pois quem ostenta foro por prerrogativa
função no STJ ou no STF, responde perante eles, isso porque a Constituição Federal não excepcionou.
JUSTIÇA ELEITORAL E JÚRI
Quem comete crime eleitoral conexo com o crime doloso contra a vida responde perante quem? Haverá cisão
obrigatória, pois a CF prevê que a competência dos crimes dolosos contra a vida será julgada no Tribunal do Júri.
JUSTIÇA ELEITORAL E JECRIM
E quando o crime eleitoral for de menor potencial ofensivo (crimes cuja pena máxima cominada em abstrato
não supera 2 anos)? Será na Justiça Eleitoral, observando o rito sumaríssimo e os institutos despenalizadores.
Discussão - Lembrar da soberania popular, do exercício da cidadania. Caso da delação premiada que dizia que
Dilma gastou mais verba que a declarada pelo TSE nas eleições de 2014. Essa colaboração premiada que nem foi aceita
pelo MP trata-se de um abuso à democracia, pois o intuito é claro em prejudicar o outro partido.
AULA 13 – 08/10/2018
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM
É a que sobra, em caráter residual. O que recai sobre o âmbito de competência da justiça comum: tudo o que não
for da justiça especializada. Se não é da competência da justiça militar nem eleitoral, será da competência da justiça
comum. A justiça comum se subdivide entre estadual/distrital e federal/da união. Nesse contexto, dentro da esfera da

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justiça comum, a estadual é residual da residual. Ou seja: tudo o que não for da competência da justiça federal, cujas
hipóteses estão taxativamente previstas no art. 109 da CF, será da competência da justiça estadual. Art. 125 da CF prega o
caráter residual ao quadrado da justiça estadual.
Temos 5 regiões da JF. A BA pertence à primeira região. Somos da 5 região da justiça do trabalho que é
especializada federal. Tanto que os magistrados do trabalho são chamados de juízes federais do trabalho, ou
desembargadores federais do trabalho. Na competência criminal, estamos na primeira região. A primeira região tem sede
em Brasília, a segunda, RJ; a terceira, SP; quarta, POA; quinta, recife.
JUSTIÇA FEDERAL (ART. 109, I CF)
A CF estabelece que compete a justiça federal processas e julgar as causas que versem sobre interesse da união,
das suas entidades autárquicas e fundacionais e das suas empresas públicas. Art. 109, I, CF. Nos incisos encontramos
várias hipóteses da competência que explicam o que é competência da JF. O art. 109, I é bastante genérico, o que fez com
que a jurisprudência, sobretudo o STJ, fixasse o que é de fato competência da JF e o que não é. O STJ tem papel de
unificar a jurisprudência e zelar pela lei infraconstitucional.
Assim, uma série de súmulas foi editada nesse sentido. Essas súmulas foram editadas para explicar o que é de fato
competência federal e o que não é.
“Interesse da União” - todas as causas em que se discute, contraria, interesse de União, é da competência da JF? A
jurisprudência diz que será da competência da JF se o interesse de União for direto. Se houver interesse indireto, será
competência da Justiça Estadual. É possível que se cometa um delito, de acordo com essa perspectiva, em que a União
está presente em algum momento do crime. Ex.: aconteceu o crime em empresa terceirizada da União, logo, há interesse,
mas sendo uma empresa terceirizada, ao exemplo de serviço postal, o interesse da União é indireto. Serviço postal é
empresa/entidade terceirizada da União, de uma empresa pública federal. Nesse caso, um delito contra bem jurídico desse
serviço postal, ao ex. Do furto de um computador. Há interesse muito remoto da União nesse caso. Isso se justifica pois o
interesse da União aqui é remoto, quase inexistente. Logo haverá competência da JF quando o interesse da União for
direto, sendo indireto, é da estadual.
Como saber se é direto ou indireto? É casuístico, caso a caso.
“causas que versem sobre interesse da União, das suas entidades autárquicas, fundacionais e empresas públicas” -
e sociedades de economia mista? Os crimes contra sociedades de economia mista devem ser processados e julgados na
justiça comum estadual. Tem sumula do STJ nesse sentido: o constituinte, ao se omitir quanto a sociedades de economia
mista, fez isso intencionalmente.
“VIS ATRACTIVA” – STJ 122
Se houver conexão entre crime da estadual e federal, havendo como efeito a reunião dos processos em um único
juízo, essa reunião se dará na JF. Isso é a vis atrativa da JF, entendimento sumulado. Ex.: 04/12/2016; FDUFBA;
explodiram o caixa eletrônico de uma sociedade de economia mista. Renderam indivíduos a serviço de uma autarquia
federal, e a invadiram. São crimes conexos. Os processos serão reunidos, a conexão induz a reunião dos processos num
mesmo juízo para garantir a economia processual, evitar insegurança jurídica, etc. de acordo com a sumula 122 o juízo
competente é a justiça federal, onde serão reunidos os processos por crimes comuns estaduais e federais nesse contexto.
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA – STJ 42
Crime contra a Petrobrás, Banco do Brasil e outras sociedades de economia mista são processados e julgados na
justiça estadual. Os crimes envolvendo a Petrobrás em Curitiba foram para a JF, pois estavam conexos com crimes
federais. Isso arrastou o crime estadual para a Justiça Federal.
SERVIÇO POSTAL
Não existe súmula, é entendimento jurisprudencial. É terceirizada de empresa pública, é competência da justiça
estadual. Precisa tomar cuidado pois, se a lesão for exclusivamente a. Bem jurídico do serviço postal, se justifica a
competência da justiça estadual. Se houver lesão mútua, tanto ao bem jurídico do serviço postal que atinja também bem

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jurídico da empresa pública federal, se justifica a reunião dos processos da JF. Se a conduta lesionar tanto bem jurídico do
serviço postal quanto bem jurídico da empresa brasileira de correios e telégrafos, ex.: furta computador que prejudicou a
entrega de correspondências pelos correios. Tem conduta que lesionou bem jurídico do serviço postal e bem jurídico,
regularidade das comunicações, dos correios. Assim, ambos os delitos serão processados e julgados pela JF.
É algo casuístico: tem que ver se a conduta que afetou o serviço postal violou também ou não bem jurídico da
empresa pública federal, e só dá pra analisar isso no caso concreto. Embora o STJ tenha dito isso de forma restritiva,
excludente e taxativa, isso tem causado controvérsias na doutrina. Doutrina: é estadual se houver crime exclusivamente
contra serviço postal, é precedente do STJ. Tem que ter cuidado com esse entendimento pois se na casuística se revelar
que a conduta afetou bem jurídico do serviço postal e dos correios, a consequência é que o processo seja da consequência
da JF, pois há crimes conexos: um da competência estadual, outro da federal, a súmula 122 faz ir para JF.
ART. 297, CP – STJ 62 (CTPS)
Esse artigo trata de crime contrafé pública, crime de falsa notação na carteira de trabalho e previdência social. De
acordo com súmula, esse delito, quando praticado por empresa privada, é da competência da justiça estadual. Subiu ao
STJ uma situação em que empresa falsificou anotação na CTPS dos empregados. Quem seria competência para processar
e julgar esse crime? STJ veio com a sumula 62, a competência é da justiça estadual, pois o interesse da União seria
remoto, e não direto. O maior prejudicado é o empregado, particular, o problema está restrito a esse âmbito, contra o
empregado. Nessa hipótese, a competência é da justiça estadual, portanto, mas há controvérsias.
Douglas Fischer, membro do MPU, discorda. A doutrina diverge.
1) CTPS é expedida pela casa da moeda, entidade federal.
2) ao falsificar anotação na CTPS, a intenção é prejudicar a vida laboral mas prejudica autarquia federal, que é o
INSS.
A doutrina critica essa sumula no sentido de que essa análise deve ser feita no caso concreto, casuisticamente.
Professor concorda. Não dá pra dizer que crime de falsa anotação de CTPS por empresa privada é JE. Não dá para
padronizar, depende do caso concreto: o interesse da empresa pode ser de lesar o obreiro e a previdência social, estando
manifesto o interesse da União na causa. Essa sumula já caiu em concurso para juiz, e o gabarito era esse.
ART. 289, CP – STJ 73
Outro crime contra a fé pública, moeda falsa. Falsificar papel moeda ou moeda, níquel, é crime federal. O STJ,
mais uma vez, se viu diante de situação em que entendeu que poderia haver competência da JF a depender do caso, da
falsificação, da contrafação. De acordo com entendimento sumulado do STJ, sumula 73, se a falsificação do papel moeda
fosse grosseira, aquela que não serve para iludir/enganar ninguém, o cidadão médio, isso não configuraria a figura do 289.
No máximo seria 171, estelionato. A depender do caso, tem que ver se atingiu ou não interesse da União para fixar
interesse da justiça federal. Só seria 289 se a falsificação fosse idônea, perfeita que enganasse inclusive cidadão médio.
Tem que analisar no caso concreto se houve ou não interesse da União. Se pegar a mesma nota e na contrafação desloca a
tarja magnética alguns milímetros à esquerda – é moeda falsa, mas essa falsificação é idônea, para iludir/enganar qualquer
pessoa. Aí sim configurou 289, competência da JF.
Sempre que a falsificação não for idônea, não será 289, será 171, sendo 171 analisa se houve ou não interesse da
União. Sempre que for idônea, é JF.
IES PARTICULAR – STJ 104
Falsificação por instituição de ensino superior particular. Ex.: falsificação de diploma acadêmico. STJ diz que é
competência estadual. Daí, sumula 104. Há controvérsias. O interesse da União nessa hipótese é remoto, indireto. O que
está em evidência aqui é interesse particular. Empresa particular falsificando documento de particular. Súmula: essa
situação fixa na justiça estadual, não federal. Para professor, não dá para generalizar. Um diploma tem a sua expedição
regulamentada pelo MEC. A IES está prestando serviço público, que é educação, regulamentado pelo ministério da

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educação. Não dá para padronizar e dizer que sempre que houver falsificação de documento por IES é particular. É algo
casuístico para Misael. A tendência no STJ é de esvaziamento, talvez a JF no brasil funciona melhor por isso.
INDÍGENAS – STJ 140
É algo interessante no direito penal e direito processual penal. Há pouco material nesse sentido. O estatuto do
índio prevê que índio condenado tem que cumprir pena em estabelecimento prisional próximo a FUNAI. Tem atenuação
da pena, STF já firmou entendimento que é equiparado a inimputável e semi-inimputável.
A sumula 140 é no sentido de que se o crime for contra um índio, se a ideia for individualizada, a competência é
da justiça estadual. Só será JF se o crime atingir a coletividade indígena. Se o móvel do crime, a intenção do agente ao
praticar a conduta for atingir toda a coletividade, uma questão indígena. Se mata índio para facilitar o acesso à região
habitada por eles, há competência da JF, pois o que fez que o crime fosse cometido foi a causa indígena, contra a
coletividade.
Crime contra único índio é competência estadual? Não, é o interesse que define. Dá para praticar contra um ou
dois para cometer contra a coletividade. Isso vale para ser vítima ou autor do crime.
Tem que analisar a intenção do agente para o professor. A súmula diz sobre o interesse da coletividade – a partir
desse entendimento a JE só julga se for individualizado. Federal, só se for interesse da coletividade.
VÍTIMA FUNCIONÁRIO PÚBLICO FEDERAL – STJ 147, STF 714
A competência é JF. Crime contra funcionário público federal é competência da JF, com uma condição: tem que
ser propter officious, relacionado com o cargo, em razão do cargo/função. Isso não significa no exercício. Servidor
público pode estar de férias, ou licenciado, não estar no exercício da função mas ser vítima de crime no qual o agente quis
atingir a sua posição de servidor público. Ameaça contra juiz seria, por exemplo. A conduta do agente tem que estar
ligada a função exercida pelo funcionário.
A sumula 714 do STF se relaciona a crime contra a honra praticado contra funcionário público federal. Aqui é
federal e estadual. Esse processo pode começar por queixa crime do próprio servidor público e denúncia do MP
condicionada a representação do ofendido. Crime contra a honra de servidor público admite tanto queixa, a ação penal
pode ser privada, como ação penal pública condicionada a representação do ofendido. STF editou a sumula 714 nesse
sentido. A ação penal pode ser de duas espécies: pública ou privada. Dentro da pública, há a condicionada e a
incondicionada, enquanto na privada há exclusiva, personalíssima e subsidiária.
A petição de uma ação penal pública é denúncia, que é titularizada pelo MP. Seja o crime de ação pública
condicionada ou incondicionada, o que vai iniciar o processo é o oferecimento de denúncia. Na condicionada: só tem
denúncia se o ofendido autoriza. A regra é incondicionada. Uma ação penal privada tem como petição inicial a queixa
crime. O nome do autor é o querelante, e no polo passivo há o querelado. Crime contra a honra de servidor público admite
ação penal pública condicionada e ação privada.
Se não houver nenhuma correlação entre crime e função, JF. Ex.: juíza assaltada na porta de casa, ao chegar com
o veículo, o delito não tem relação com o cargo. Se for retaliação pelo o que faz na magistratura, aí é.
FALSO TESTEMUNHA NA JUSTIÇA DO TRABALHO – STJ 165
Como essa justiça não tem a competência criminal, então o crime que for praticado na justiça do trabalho será
processado e julgado pela justiça comum federal. Previsão da sumula 165. Ex.: em audiência trabalhista. Não JE pois
estamos diante de ato praticado em processo trabalhista, que é processado e julgado por uma justiça federal especializada.
Justiça do trabalho, entretanto, não tem competência criminal. Em caráter residual: só pode ser justiça comum federal. E
se for crime que permita situação de flagrante? Juiz do trabalho pode dar voz de prisão em flagrante. Está no regimento
interno do TRT. O que não pode é prender em flagrante.
Dar voz de prisão é uma coisa, prender efetivamente é outra. Só pode prender em flagrante a polícia. Não só a
polícia, mas a autoridade policial. Tanto assim que se um crime for praticado na justiça do trabalho, o juiz pode dar voz de
prisão em flagrante mas vai chamar a polícia federal, acionando a polícia do tribunal. O indivíduo que cometeu o delito

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vai para a superintendência da JF onde vai ser lavrado o auto de prisão em flagrante, e a pessoa será conduzida para
audiência de custodia dentro de 24h.
Art. 342 do CP brasileiro, de mão própria, ou seja: não pode ser praticado por interposta pessoa. Se alguém
oferecer dinheiro para testemunha mentir, responde pelo 343 (facilitação). Só testemunha, perito, tradutor, contador ou
interprete podem cometer 342. Só há modalidade dolosa, não há culposa. Teve pena elevada com a lei de organização
criminosa.
AULA 14 - 10/10 - AULA 15 - 15/10 - AULA 16 - 17/10
Critérios subsidiários/suplementar: Iremos recorrer a eles quando os outros não forem suficientes. São eles: Domicilio do
réu, conexão/continência, prevenção, distribuição.

CONTRAVENÇÕES PENAIS
Eles são os chamados crimes anões em razão do reduzido grau de potencialidade lesiva que possui normatização
no Decreto 3688/41. Vide art. 109, IV, CF. Se processa mediante ação pública incondicionada. Não se pune a tentativa e a
contravenção é sempre dolosa. Não há contravenção culposa. Todas elas são de competência da Justiça Estadual, ainda
que ofenda interesse da União.

Sendo assim, se eu pratico vias de fato contra um funcionário público, a depender da sua não tipificação como um
crime contra a honra, ela será de Competência Estadual.

Exceção: Súmula 38, STJ: No caso de foro por prerrogativa de função, se o sujeito que a ostenta vier a cometer
uma contravenção penal este será processado e julgado no Tribunal respectivo, ressalvada a observância do rito
sumaríssimo. Aqui teremos a prevalência da competência funcional.

CRIMES POLÍTICOS
Ele está previsto na Lei 7.170/83. Ela é chamada Lei de Segurança Nacional. Eles são punidos em razão de o
agente cometê-lo para ofender a ordem política democrática. O crime é de competência da Justiça Federal com recurso
ordinário constitucional (ROC) para o STF, embora esse crime seja julgado por um juiz de 1º grau. Esse recurso é o per
saltum.

Basta que se cometa qualquer crime dessa lei para que ele seja de competência federal? E necessário qieh6haja
motivação política par a que se enquadre nessa lei. Ausente essa motivação, não se trata de crime político.

O STF já entendeu que o crime eleitoral não é necessariamente um crime político.

Art. 30 dessa lei não foi recepcionado pela CF, vide art. 109, IV.

INCIDENTE DE DESLOCAMENTO DE COMPETÊNCIA (IDC) ART. 109, §5º


Consiste em o Procurador Geral da República requerer ao STJ a transferência de uma causa de um processo dos
Estados/DF para a União. Ele também é conhecido como a federalização de causas. A justificativa é de que se garanta a
segurança jurídica e a idoneidade da prestação jurisdicional, além de evitar que se persiga uma ação movida por interesses
políticos. Acontece quando a PGR entender que houve grave violação dos direitos humanos.

É como se fosse uma arguição da competência absoluta feita pelo MPF.

Um bom exemplo é a chacina do Cabula em Salvador. Foi Rodrigo Janot quem requereu o IDC desse caso. Os
atos, quando transferidos são aproveitados. O caso Marielle franco também tem o IDC requerido.

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CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EM CARÁTER COLETIVO
Remissão legal: Art. 187 – 207 do CP. São da competência da Justiça federal. Não é sempre que um crime contra
a organização do trabalho será de competência da JF, para sê-lo é necessário que ele afete uma coletividade de
trabalhadores.

CRIME CONTRA A ORDEM ECONÔMICA


São os chamados crimes de colarinho branco. É correto dizer que todos eles são processados e julgados na Justiça
Federal? Não, pois não é sempre que o crime afetará interesse direto da União.

- Lei 7.492/86: Lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional. Ela pune, por exemplo, gestão fraudulenta,
gestão temerária, etc. São crimes de competência da Justiça Federal. Acontece que o crime fora praticado contra uma
SEM num contesto de interesse federal -> vis atrativa.

- Lei 8.137/90: Pune as relações de consumo, crime contra ordem econômica e crimes contra a ordem tributária.
Não esquecer que nem todos os crimes tributários serão da competência federal, pois se uma pessoa sonega ICMS ele não
responderá diante da Justiça Federal, sendo assim, só os tributos federais serão de competência da JF.

- Lei 9.613: Ela foi alterada pela lei 12.683/2012 (Lei de lavagem de capitais ou branqueamento de capitais).
Consiste no disfarce de aquisição de quantia ilícita para fazer com que esse capital ingresse no ordenamento de maneira
lícita. A justiça competente para julgar vai variar a depender do crime antecedente. O crime posterior vai seguir a sorte do
crime antecedente. Por isso que não é errado dizer que alguns crimes serão processados e julgados pela justiça estadual.

- Lei 9.605/98: Crimes ambientais. A fixação de competência vai depender da circunstância, como por exemplo,
as áreas de proteção ambiental. Ele poderá ser Estadual ou Federal, a depender do ente que realize a proteção.

CRIMES PRATICADOS A BORDO DE NAVIO OU AERONAVE


Art. 109, CF. A competência da Justiça Federal.

Problemáticas:

1. O que é um navio? É toda embarcação de grande cabotagem dotada de capacidade de realizar viagens
internacionais. Lembrar dos assuntos de Penal 1 no que se refere a lei penal no espaço.
Exemplo: Navio PRIVADO de bandeira Filipina trouxe para o Brasil tripulantes filipinos para prestarem serviço no
Porto de Aratu. Chegando aqui (território brasileiro – mar territorial), os tripulantes estavam bebendo e houve troca de
ofensas entre eles. Um deles subiu à cabine do desafeto e bateu nele. Este que foi surrado pegou uma barra de ferro e
estraçalhou a cabeça do outro. Ele foi preso no navio e o navio atracou no porto de Salvador. Esse cidadão foi submetido à
superintendência da JF.

2. Quando a aeronave estiver pousada, em solo, a competência é de quem? A competência é da Justiça Federal. HC
108. 478.

CRIME DE INGRESSO OU PERMANÊNCIA IRREGULAR DE ESTRANGEIRO NO TERRITÓRIO NACIONAL,


ART. 338, CP
Competência da Justiça Federal. Isso porque quem regula a permanência do estrangeiro em nossos território é a
União. Convença de Viena foi revogado pela Lei de Migração. Revisar (os dois últimos são mais afetos ao assunto)

Extradição: Entrega de alguém a outro país para ser processado e julgado lá.

Deportação: Clandestino reversível que pode voltar ao seu país;

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Expulsão: Crime grave contra a ordem constitucional de caráter irreversível. Discussão sobre o caráter irreversível
e a pena perpétua.

COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO LUGAR


É uma competência relativa, admitindo a preclusão. Aury Lopes entende que é absoluta, mas a maioria da
doutrina defende ser relativa, visto que ao não ser alegada no prazo de 10 dias opera-se a precisão. O CPP adota a teoria
do resultado, em que o foro do processo é no local de ocorrência do resultado. No entanto, o CP adota a teoria da
ubiquidade, podendo o foro ser adotado de acordo com o local da ação ou do resultado.

Essa diferença não é uma contradição, pois o CP faz referência a um crime, um direito material, já em termo de
processamento a teoria é da ação.

a) HC 196458 STJ – Em alguns casos de homicídio e aborto (crimes contra a vida), pode se adotar a teoria da
ação no processamento, pois se considera mais fácil colher a prova no lugar da ação, independentemente de onde ocorreu
o resultado.

b) Corrupção passiva também se adota a teoria da ação visto que é um crime de mero resultado, outros casos é o
do JECRIM.

c) Crimes empresariais falimentares, em que o lugar do processamento é o local onde ocorreu a falência da
empresa ou onde ela está sendo recuperada judicialmente,

d) Nos crimes de estelionato, quando envolver clonagem de cartões e cheques falsos:

Em questão de cheque não se sabe diferenciar qual a ação e o resultado. Cheque falsificado é crime de falso, não é
real, adotando-se o lugar onde ocorreu o efetivo prejuízo. Ex: Alguém compra um vestido com o cheque falso, o efetivo
prejuízo vai ser o local da loja.
Cheque sem fundo, o qual existe, mas não tem dinheiro lastreando. Nesse caso, o local do foro é onde foi recusado o
saque, pois não se sabe se quando assinado o cheque já havia o dolo ou não, ou seja, não se sabe se havia dinheiro ou não.
STJ 521244
No caso da clonagem do cartão o entendimento veio de HC781969, estabelecendo que o foro competente é o lugar em
que foi expedido o cartão (original). E nos casos como NUBANK, onde não há uma sede bancária, se considera o lugar
onde houve o efetivo prejuízo.
e) No caso de documento falso, o foro é o do lugar em que o documento foi apresentado. Agora se a pessoa que falsificou
é a mesma que usou, o foro é o do local de produção do documento falsificado.

f) No crime de contrabando o processamento é no local onde foi apreendido os bens do contrabando.

g) Quando o crime for apropriação indébita o foro é no local em que ocorreu a inversão ilícita da posse. Ex: local em que
houve a recusa a devolver. A posse deixou de ser licita e passou a ser ilícita com a recusa.

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h) Nos crimes contra a honra praticados pela imprensa, o foro do caso é no local da impressão ou no local da internet em
que foi veiculado.

O primeiro critério a ser observado é o da teoria do resultado, caso não seja possível identificar o foro por essa
característica, deve-se observar o domicilio do acusado, em seguida a prevenção, e por fim a conexão.

DESCONHECIMENTO DO LOCAL
Nesse caso, o foro competente é o do local de domicilio do acusado.

INCERTEZA
Sabe onde ocorreu o resultado do crime, mas não sabe se aquele lugar pertence a um território ou outro. Ex: crime
cometido na divisa entre Bahia e Sergipe, em que não se sabe distinguir qual é o Estado daquele território

O lugar de foro é aquele lugar em que primeiro se atuou no caso com colhimento de provas, inquérito policial, etc.
Portanto, há a adoção da teoria da prevenção.

Ex: crime continuado/permanente – não se pode aplicar a teoria do resultado pois em todo lugar se consuma o
crime, não se aplica o domicilio do acusado pois se sabe onde aconteceu.

Esse critério abarca também os crimes estrangeiros abrangidos pela extraterritorialidade.

Nos crimes a bordo de aeronave, se adota o foro do lugar que vai chegar, se envolver águas continentais. Se
dentro do mar territorial, que pertencem a um estado, vai ser considerado o foro o lugar que saiu ou que chegou – nesses
casos a fixação da competência não precisa seguir o critério de prevenção, mas ir de acordo com o melhor para o
processo.

Nos crimes à distância, que começam em um território e terminam em outro, o foro é estabelecido no último local
do país em que se realizaram atos envolvendo o crime, embora o crime continue em outro país.

Comentário aleatório do professor: Art. 232-A: Coiotismo – Promover a migração ilegal com finalidade
econômica. Pena de 2 a 5 anos. O art. 338 (há desvalor maior do valor e resultado), por sua vez, possui pena menor. Do
ponto de vista da proporcionalidade cabe a reflexão.

AULA 17 - 22/10

CONEXÃO E CONTINÊNCIA
CONCEITO
Se conceituam como critérios acessórios de fixação da competência criminal. Já passamos pelos critérios
principais, falamos da fixação da competência em razão da pessoa, por prerrogativa do foro, competência funcional (art.
84, súmulas – uma delas superada em 2018), competência em razão da matéria (justiça especializada e comum, dentro da
especializada a militar, que é mais restrita, a eleitoral, comum residual, que se divide entre federal – art. 238 do CPP,
imunidades diplomáticas*).
*Ano passado foi sancionada a nova lei de imigração, e foi feita uma alteração: extradição não tem tempo para
terminar. Antes era irreversível, hoje é reversível. Outra alteração: criação de artigo novo do CP, agora o CP tem o 232-A,
que tipifica a conduta de “coiotismo”: promoção de migração ilegal com finalidade econômica. 232-A x 238, que é
ingresso de estrangeiro expulso. A comparação é, do ponto de vista da proporcionalidade, temos problemas. O 232-A tem
pena maior, o 338, que tem desvalor maior, a pena é menor, 1 a 4 anos e admitindo suspensão condicional do processo,
enquanto o 232-A não. Há reflexão do ponto de vista da proporcionalidade.

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Estudamos a competência territorial, em razão do lugar, e agora falamos dos critérios acessórios para fixação da
competência.
São critérios complementares para fixação da competência criminal. A doutrina prefere dizer que conexão e
continência devem ser conceituados como regras de modificação da competência criminal. Para a doutrina, é comum
aparecer conexão e continência como regras de modificação: a competência, de acordo com os critérios principais,
originariamente seria uma, porém, em razão de circunstâncias concretas que aproximam os processos, estabelece-se uma
mudança da competência originária, ou conexão ou continência.
Ou seja: doutrinariamente são regras de modificação da competência criminal.
FUNDAMENTOS
São dois: segurança jurídica e economia processual. Segurança jurídica no sentido de evitar decisões
conflitantes sobre causas/situações que foram praticadas em um mesmo contexto. Existe um vínculo, nexo de
causalidade, entre as causas, entre os resultados/crimes e, portanto, por uma questão de segurança jurídica, para evitar
decisões conflitantes, aplicamos as regras de conexão e continência. Economia processual é no sentido de respeitar a
duração razoável do processo.
EFEITOS
Na prática, a conexão e a continência levam a duas consequências: reunião de processos em um mesmo juízo e
prorrogação do foro. São questões muito parecidas com as de processo civil. Tanto, que não é incomum que o MP, por
exemplo, advogados, etc., ao falar de conexão e continência, usarem obras do processo civil. Conexão e continência
pressupõem mais de uma causa, mais de um resultado, em tese, mais de um processo seria deflagrado – daí vemos
que havia competência originária para cada processo. A ideia é ter uma situação A que geraria processo X, e outra
situação que geraria processo Y. Porque as causas são conexas, ou um processo está contido no outro, eles devem ser
reunidos em um único juízo. Isso, para que se garanta segurança jurídica e economia processual.
Evita-se, assim, duas instruções criminais de causas semelhantes. Usa uma instrução, uma colheita de prova, para
tudo.
CONEXÃO, ART. 76 CPP
Art. 76. A competência será determinada pela conexão:
I - se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou
por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras;
II - se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade
ou vantagem em relação a qualquer delas;
III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra
infração.
Há separação feita pelo legislador entre conexão e continência. Art. 76 (conexão) e 77 (continência) – essa divisão
faz com que o Brasil esteja na contramão de outros países. Enquanto outros países europeus e americanos não
diferenciam conexão e continência na lei, insistimos em fazê-lo. Esses países não separam conexão e continência
pois, do ponto de vista prático, as consequências são as mesmas. O fundamento dos institutos é o mesmo, então na
prática não vamos diferença entre conexão e continência. A doutrina defende a unificação dos institutos, mas o Brasil
insiste em separar, inclusive no projeto de Código de Processo Penal novo.
A chancela, a marca da conexão, é mais de uma conduta com mais de um resultado.
CONEXÃO INTERSUBJETIVA
Diversas condutas produzidas por mais de um sujeito, entre sujeitos. A marca da conexão/continência é
plural, mas a da conexão é a pluralidade de condutas com a pluralidade de resultados. Partimos da premissa de que há
mais de um sujeito praticando condutas distintas, que produz mais de um resultado. São condutas que dariam ensejo a
mais de um processo penal, mas por segurança jurídica e economia processual, são reunidas.
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CONEXÃO INTERSUBJETIVA DE SIMULTANEIDADE
Do ponto de vista prático não há distinção, mas no ponto de vista didático, há grande relevância. A intersubjetiva
por simultaneidade ocorre quando há mais de um sujeito, sem vínculo subjetivo, nas mesmas circunstâncias de
tempo e lugar. Se não há vínculo subjetivo, afasta concurso de pessoas. Imaginar um caminhão parado na BR, cheio de
cerveja, a população local começa a saquear a carga. Pessoas que não se conhecem, todas praticando furtos, mais de uma
conduta, nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar sem vínculo subjetivo. Se não houvesse conexão e continência, o
MP teria que ajuizar mais de uma denúncia. Como as causas estão conexas, haverá apenas um processo.
CONEXÃO INTERSUBJETIVA CONCURSAL
A intersubjetiva concursal ocorre quando há mais de uma pessoa, em concurso, praticando mais de uma
infração penal em circunstâncias de tempo e lugar distintas. Há união, há vínculo subjetivo. Ex.: uma pessoa no PR e
outra na BA – lava-jato. Um praticando a falsidade documental, hoje, 22/10, BA, para que outro, dali a um mês, pratique
estelionato com aquele documento. Revisar concurso de pessoas para esse assunto poder ser importante. Esse assunto
dialoga muito com direito penal. Pluralidade de agentes, vínculo subjetivo, relevância causal das condutas e
identidade de infração penal – Bitencourt. Para haver concurso de agentes não é preciso ter relação prévia, basta que os
requisitos do concurso de agente estejam presentes no tempo do crime.
Saber se há concurso de agentes ou não é importante para a dosimetria da pena.
Resultados distintos, lesões distintas a bens jurídicos distintos – tipos podem ser os mesmos.
CONEXÃO INTERSUBJETIVA DE RECIPROCIDADE
Mais de uma pessoa praticando mais de uma infração penais umas contra as outras, de forma recíproca, o
que exclui o crime de rixa, art. 137 do CP. Rixa não é conexão intersubjetiva por reciprocidade, pois o crime de rixa é
um crime só, e conexão e continência são caracterizadas pelo plural, resultados e crimes distintos.
CONEXÃO OBJETIVA, LÓGICA OU MATERIAL
Aqui já não é mais entre sujeitos, é um sujeito só. A conexão objetiva, lógica ou material pressupõe um único
agente, se tiver mais que um, é intersubjetivo. O nome “material” vem porque as hipóteses estão definidas no CP, no
direito penal material, por isso conexão material. Há um sujeito, com mais de uma conduta, produzindo mais de um
resultado.
HIPÓTESES ARTS. 61, II, “B”; 69; 1215, 2º, V, CP
Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:(Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
[...] II - ter o agente cometido o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
[...] b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;
Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não,
aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de
penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Uma é agravante e a outra é qualificadora. O juiz, na dosimetria, não pode aplicar as duas por ofensa ao ne bis in
idem. Esse rol de hipóteses é taxativo.
TELEOLÓGICA -> PARA FACILITAR A PRÁTICA
Essa e a consequencial são desdobramentos da conexão objetiva, lógica ou material. Ocorre quando o
indivíduo pratica um crime para facilitar a prática de outro crime futuro. Teleológico significa visar a algo. Olhamos
para o futuro.

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CONSEQUENCIAL -> PARA GARANTIR EXECUÇÃO, IMPUNIDADE, VANTAGEM
Ocorre para garantir a execução, impunidade ou vantagem de outro crime anterior. Olhamos para o
passado. Um crime é cometido para garantir a execução, impunidade ou vantagem de crime anterior – preocupação com o
passado. Garantir a ocultação de um crime é garantir que esse crime não seja descoberto, a autoridade não sabe da
existência de um crime anterior. Ex.: apagar provas, esconder cadáver para não descobrir homicídio – pratica crime para
garantir a ocultação de outro crime, para que não venha a ser conhecido. Garantir impunidade é partir do pressuposto
que os crimes são conhecidos pela autoridade, mas não quer que prove a ligação com o crime . Ex.: matar
testemunha, para que crime já conhecido pelas autoridades não seja comprovado. Aqui, quer apagar elemento de prova
que seja apto a condenar o sujeito. Eliminar testemunha, atrapalhar perícia, subornar testemunha. Garantir vantagem é
auferir lucro ou êxito relacionado a crime. Ex.: sujeito que elimina comparsa para ficar com a totalidade da res furtiva,
garantindo a vantagem de outro crime. Pratica um crime para garantir a ocultação de outro anterior, ou a impunidade ou a
vantagem de outro crime pretérito.
PROBATÓRIA
Ex.: Receptação, lavagem de capitais.
Também conhecida como instrumental ou processual. Aqui, não olha para a quantidade de agentes. Olha
para a relação de prejudicialidade entre a prova de um crime e a prova de outro crime. Há conexão probatória
instrumental ou processual quando a prova de um crime depende da prova de um outro crime, ou seja, a prova de um
delito influindo/influenciando na prova de outro delito. Receptação é o exemplo mais comum, o mais emblemático, pois
para provar receptação tem que provar a origem ilícita da conduta anterior. Lavagem de capitais é no mesmo
sentido: conduta anterior ilícita, tenta dar a aparência de licitude a conduta anterior. São dois crimes: a lavagem de capitais
e um crime anterior.
A prova da lavagem de capitais depende da prova de um crime anterior. Diante de questão prejudicial,
heterogênea, art. 92, CPP.
Art. 92. Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute séria e
fundada, sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso até que no juízo cível seja a
controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição das testemunhas e de
outras provas de natureza urgente.
Parágrafo único. Se for o crime de ação pública, o Ministério Público, quando necessário, promoverá a ação civil ou
prosseguirá na que tiver sido iniciada, com a citação dos interessados.
Há questão prejudicial quando precisa provar uma coisa para depois provar outra – se não provar a coisa anterior,
a prova da posterior fica comprometida. Existe, por sua vez, questão prejudicial homogênea e heterogênea. A homogênea
envolve situações que devem ser decididas pelo juízo criminal. Ex.: processo penal tramitando perante juízo criminal,
aparece situação que precisa de prova que vai influir no mérito da ação penal. Essa questão é prejudicial homogênea,
porque ambas vão ser solucionadas pelo mesmo juízo criminal. Receptação: crime antecedente também vai ser provado
na esfera criminal. Heterogênea, por outro lado, uma vai ser decidida no cível, enquanto o processo penal fica
suspenso esperando a decisão do cível. Exemplo heterogêneo: bigamia.
CONTINÊNCIA, ART. 77 CPP
Art. 77. A competência será determinada pela continência quando:
I - duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração;
II - no caso de infração cometida nas condições previstas nos arts. 51, § 1o, 53, segunda parte, e 54 do Código Penal.
Há ideia de que o processo está contido em outro. Utilizando a matemática, enquanto a conexão é um contendo
um pedaço do outro, a continência é um maior que abarca o outro. A marca da continência é uma conduta produzindo
mais de um resultado. A diferença em relação a conexão é que agora, na continência, só tem uma causa de pedir
produzindo mais de um resultado lesivo/delitivo.

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HIPÓTESES
POR CUMULAÇÃO SUBJETIVA (ART. 29)
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua
culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. (Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será
aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
Ocorre quando há concurso de agentes. Na conexão intersubjetiva concursal, as circunstâncias de tempo e lugar
são distintas; na continência por cumulação subjetiva, tem uma conduta produzida em concurso entre agentes na
mesma circunstância de tempo e lugar. Funciona como um arranjo só, um empreendimento: é uma conduta sendo
praticada. É uma empresa delitiva, um bloco, que é uma conduta. A doutrina classifica assim. Por cumulação subjetiva,
tem concurso de pessoas produzindo mais de um resultado criminoso. Há, por exemplo, várias pessoas em um mesmo dia
cometendo fraude previdenciária do INSS em concurso de agentes. Isso é classificado como continência por cumulação
subjetiva. Porque não conexão intersubjetiva concursal? Pois as circunstâncias de tempo e lugar são as mesmas. O que
diferencia os dois são as circunstâncias de tempo e lugar, de resto é igual, inclusive os efeitos que são os mesmos na
prática. Por isso há doutrinadores e países que não diferenciam continência e conexão, pois os efeitos são os mesmos.
Continente: a invasão do sistema previdenciário do INSS. O conteúdo: as diversas fraudes cometidas.
POR CUMULAÇÃO OBJETIVA (ART. 70, 73, 74)
Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-
lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até
metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes
resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código. (Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que
pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao
disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender,
aplica-se a regra do art. 70 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Art. 74 - Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado
diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o
resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
São três hipóteses no CP. O art. 70 é quanto ao concurso formal de crimes, que tem como definição uma
conduta e mais de um resultado. Lembrar concurso formal próprio (ocorre quando o agente produz dois ou mais
resultados criminosos, mas não tinha o desígnio de praticá-los de forma autônoma) e impróprio (ocorre quando diversos
resultados forem decorrentes de desígnios autônomos, dolo direto distinto – quer todas as condutas).
O art. 73, diz quanto ao aberratio ictus – acidente na execução, erro na execução. O sujeito que não sabe manejar
arma, cidadão que se confunde em relação a pessoa (atinge um pensando que é o outro). Tem uma conduta com mais de
um resultado: se atingir ambos, tem mais de um resultado decorrente de uma única conduta, continência por cumulação
objetiva, aberratio ictus.
Paulo Queiroz: mulher queria matar marido, colocou chumbinho e mandou o casal de filhos levar. Os meninos
foram e o pai já tinha comido. As crianças comeram a marmita e morreram. Aplicando-se aberratio ictus tem que
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considerar a vítima virtual, não a vítima real. Desconsidera os filhos, então não incide as agravantes de descendente ou
menor de 14 anos, nem contar o fato de ser duplo homicídio – vai ser da mulher contra o marido, aplica o art. 20 do CP.
Mais de um resultado por erro de execução, art. 70, concurso formal de crimes. Se além de matar os filhos ela matasse
também o marido, um único processo que reúne as questões num único juízo.
Aberratio delicti ou criminis, art. 74, resultado diverso do pretendido. Quer praticar um crime e pratica outro, por
erro. Aberratio ictus é confundir pessoa, mas o crime é o mesmo. Já aberratio delicti/criminis, quer praticar um
crime e acaba praticando outro crime. Pessoa x coisa ou coisa x coisa. Pessoa x pessoa, aberratio ictus. Ex.: quer
atingir janela, taca pedra que bate em criança, lesão corporal + dano: dois processos em tese, em um mesmo juízo – uma
conduta que produziu dois resultados, praticou os dois e os dois vão para o mesmo juízo. Quer tacar fogo e acaba matando
bichos. Quer atingir carro, mas atinge cachorro.
Obs.: reunião de inquéritos policiais. Para Nucci, sim, por conexão e continência desde que a decisão da
autoridade policial seja fundamentada e seja ouvido o MP, dono da ação.
AULA 18 - 24/10
REVISÃO
Prova: não precisa de dispositivo ou súmula literalmente. Moa do katendê: continência e conexão. Está
denunciado por homicídio consumado e tentativa de homicídio.
Processo penal tem tempo para a duração dos atos: procedimento comum ordinário deve durar 60 dias, do
depoimento do ofendido até o interrogatório, vem alegações finais e prolação de sentença em mesa.
Desclassificação própria: justiça militar; crime doloso contra a vida praticado por militar contra civil é da
competência do júri, tem lei e norma constitucional regendo isso. Na quesitação os jurados podem entender que o crime
não foi doloso, se foi sustentada a tese da culpa, Se o jurado entender nesse sentido, o que ocorreu foi uma
desclassificação próprio: jurado entendeu que houve dolo, não culpa, restando homicídio culposo que é crime militar
previsto no CPM. A competência do júri é para crime doloso, culposo: remete os autos para justiça militar, pois o cidadão
é militar. Se não fosse militar: juiz presidente do conselho de sentença/tribunal do júri que decide. Militar que praticou
crime militar: remete os autos para juiz competente. Juiz natural dos crimes dolosos contra vida é conselho de sentença,
que disse que o crime não é dele – quem julga é o juiz presidente, mas se é situação de crime militar, homicídio culposo,
então é justiça militar.
Questão história, concepções clássicas da natureza jurídica (cai com certeza), teoria dos jogos (próxima da
concepção de Goldschmidt), sinônimos e finalidade do processo penal (possível), princípios processuais penais
(principalmente questões mais recentes: ampla defesa, pode mentir? Há verdade no processo penal? Texto de jacinto
Coutinho – quais os limites da mentira no processo penal?), execução provisória da pena e presunção de inocência,
contraditório e suas modalidades, princípio da proporcionalidade (retirada do caráter hediondo do tráfico privilegiado
porque não era proporcional/razoável), medidas cautelares diversas da prisão, autodefesa (interrogatório – começou a se
modificar em 2003 com lei 10792/03 -11343-, mas quem efetivou o remanejamento do interrogatório do primeiro ato da
instrução para o último foi a reforma processual de 2008 11719/08 art. 185, 5 anos depois – homenagem aos princípios do
contraditório e da ampla defesa; em 2016 o STF, julgando HC 127900 AM 16, fazendo controle concentrado de
constitucionalidade concedeu a ordem para entender que em todas as leis do BR onde o interrogatório figura no primeiro
ato da instrução, deve ir para o último – inclusive na lei de drogas, onde está previsto como primeiro ato). Interrogatório
sub-reptício, aviso de Miranda, mentira agressiva.
Competência criminal: é possível que uma juíza colha a prova, presida a instrução e outro juiz julgue a casa,
sentencie? Em nome do princípio da identidade física do juiz, o juiz/a que colhe a prova deve julgar a causa. Porém, há
situações em que isso é possível. Férias, remoção, promoção, passou para concurso, exoneração, morte, etc. princípio da
identidade física: não era aceito no código de processo penal, passou a ser positivado em 2008, art. 389 2º.

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É possível o aproveitamento, ratificação dos atos realizados sobre outro juízo. STF vai nessa linha. Pode pegar
prova já colhida e aproveitar no novo processo.
Jurisdição, princípios. Competência. Espécies. Em tese, competência em razão de lugar é relativa, mas há entendimento
de que inclusive ela seria absoluta, porque o art. 109 autoriza o poder judiciário, enquanto não aberta a instrução, a
reconhecer qualquer vício que lhe torne incompetente de ofício. Para Aury: inclusive o vício de competência em razão do
lugar é absoluto – posição minoritária. Uma das características da incompetência absoluta é poder ser arguida de ofício.
Isso é discussão, herança do processo civil – há regras para fixação da competência. Competência em razão da pessoa, art.
84.
Súmula 721 STF. Prefeitos: 702 STF. Foro por prerrogativa de função e JECRIM, foro por prerrogativa de função
x crime eleitoral – se rui costa comete crime eleitoral é julgado pelo STJ/Igor Kanario comete crime eleitoral em período
eleitoral, responde no STF.
Exceção da verdade.
Em razão da pessoa, lei 13.718, que tornou crime importunação ofensiva ao pudor.
Competência da justiça militar tem que ser analisada fazendo divisor de águas: antes de 2017 e depois de 2017.
Até 2017 tinha tendência de esvaziar a competência da justiça militar no brasil. A partir da lei, começou a ampliar a
competência. Há discussão a respeito de foro, cisão obrigatória, desclassificação própria do júri, competência da justiça
eleitoral, vis atrativa, justiça eleitoral x júri e JECRIM, súmula 702. Competência da justiça comum, justiça federal
extensa, vis atrativa, índios. Dimensão da embarcação, ferry boat, justiça estadual. Federal: embarcação com capacidade
de fazer viagem internacional ou aeronave.
Competência em razão do lugar: regra, teoria do resultado, fixa-se a competência no lugar da consumação da
infração. Exceções: crimes dolosos contra a vida de acordo com precedentes do STJ. Os crimes dolosos contra a vida,
com consumação em momento posterior a ação, competência no lugar da ação – JECRIM também, teoria da ação e não
do resultado. Crime continuado, permanente, regra da prevenção. Cartão clonado, cheque falsificado, lugar
desconhecido/incerto. Por fim: conexão e continência.
AULA 19 - 07/11 [perdi o começo]

REGRAS GERAIS DE CONEXÃO E CONTINÊNCIA (ART. 78 E 82 CPP)


TRIBUNAL DO JÚRI
[perdi o perdi o começo] Crime doloso contra a vida arrasta o outro, conexo, ou em relação de continência,
para o mesmo tribunal. É o tribunal do júri que prevalece, excepcionando-se as regras de justiça especializada (justiça
militar e eleitoral: conexão de crime eleitoral no júri, ha cisão). Ex.: caso de David Fiuza, o MP estava investigando
homicídio e sequestro, crimes conexos, um doloso contra a vida e outro não. A denúncia foi oferecida na promotoria do
júri pelo 78, único, CPP.
Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras:
(Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
I - no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri;
(Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
Il - no concurso de jurisdições da mesma categoria: (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
a) preponderará a do lugar da infração, à qual for cominada a pena mais grave; (Redação dada pela Lei nº
263, de 23.2.1948)

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b) prevalecerá a do lugar em que houver ocorrido o maior número de infrações, se as respectivas penas forem de igual
gravidade; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
c) firmar-se-á a competência pela prevenção, nos outros casos; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
III - no concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de maior graduação; (Redação dada
pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
IV - no concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá esta. (Redação dada pela Lei nº 263, de
23.2.1948)
Se houver desclassificação pelo júri, isso repercute na fase de quesitação. Se o júri desclassificar crime para
um que não seja de sua competência, quem decide é o juiz presidente.
Há a regra de reunião dos processos no júri. Militar contra civil, homicídio culposo, orienta-se para
encaminhamento dos autos para justiça militar.
Doloso contra a vida conexo com contravenção penal/menor potencial ofensivo: reúne no júri com
institutos despenalizadores da lei 9.099.

JURISDIÇÕES DE MESMA CATEGORIA


Crime que aconteceu em Salvador. Um em Salvador, outro em Feira de Santana, e estão conexos ou em relação
de continência. Onde reúne os processos, já que um dos efeitos é a reunião em um único juízo? Qual juízo competente
para julgar ambos? Tem que ser um juízo só. Ex.: roubo em Salvador, furto em Feira de Santana. Estão vinculados por
regra de conexão ou continência. Consequência: só um juízo decide os dois. Serão reunidos onde for praticada a
infração mais grave, segundo o código penal.
Aparente conflito entre jurisdições de mesma categoria (quem tem competência para roubo é vara comum, idem
para furto – mesma hierarquia, uma não prevalece sobre a outra, mesma categoria, não tem uma superior a outra). O juízo
do CP: onde foi praticada a infração mais grave, no caso, Salvador. Infração mais grave: pela pena cominada em
abstrato. Esse é o primeiro critério. Se as jurisdições forem de mesma categoria, mesmo patamar de igualdade, primeiro
vê onde foi praticada a infração mais grave. Se resolveu aqui, acabou.
Outra hipótese: roubo em Salvador e roubo em Feira de Santana. Não tem uma mais grave que a outra. Resolve
pelo segundo critério: onde foi praticado o maior número. Em Salvador, dois roubos, em Feira de Santana, três:
infrações do mesmo patamar de igualdade em razão da pena cominada em abstrato, vai pela quantidade de infrações. Aí,
fixa na vara crime comum de Feira de Santana: lá foi praticado o maior número de infrações.
Se o número for o mesmo: prevenção. Prevento é o juízo que tomou a primeira providência no processo, na
causa. Não necessariamente é o que recebeu a denúncia, pode ser o que expediu mandado de prisão preventiva, por ex.
Ou, de busca e apreensão. Prevenção não diz respeito especificamente a recebimento de inicial acusatória, juízo
prevento é o que adotou a primeira providência na situação, na causa. Providência essa que pode ser inclusive pré-
processual, pode decretar prisão preventiva no inquérito policial, antes do processo.

JURISDIÇÕES DE CATEGORIAS DISTINTAS


Categorias distintas: reúne na jurisdição mais graduada. Temos a justiça federal como a mais graduada em
relação a estadual, súmula 122 do STJ é no sentido de reunir os processos por crimes federais em conexão/continência
com crimes não federais, na justiça federal.
Súmula 122, STJ - Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência
federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, a, do Código de Processo Penal.

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Se houver conflito aparente (vai ser solucionado com a reunião em um único juízo), se forem jurisdições de
categorias distintas, ao exemplo de JF e JE, vara crime e tribunal, processos serão reunidos na instância/jurisdição
mais graduada. Justiça federal e tribunal, nos exemplos.
Essa observação nos remete para a análise da questão de ordem na ação penal 937 do STF. Restrição do foro por
prerrogativa de função no Supremo Tribunal Federal, algo acompanhado pelo STJ. Muito embora o art. 78 do CPP fale
que no caso de jurisdição de categorias distintas, reúne na jurisdição mais graduada, por ex.: de quem não tem foro de
prerrogativa de função nos tribunais, súmula 704 do STF.
Súmula 704, STF - Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por
continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.
Com essa ação penal, foi isso. Só que, em 2018 o STF mudou o entendimento, restringindo o foro por
prerrogativa de função para dizer que só fica quem tem foro por prerrogativa de função, quem não, vai para
primeira instância. Para Misael o que ocorre é interpretação de uma lei de 1941 a luz da CF88, não conflito aparente de
normas. Só dá para salvar o entendimento do STF por essa lógica.

JURISDIÇÕES COMUM E ESPECIAL


Jurisdição comum: é falar de justiça federal e justiça estadual. Jurisdição especializada é falar em justiça
militar e justiça eleitoral. Rever competência em razão da matéria. Em especial as “exceções”. Não esquecer do
entendimento superado do STJ pela lei de 2017, quanto a justiça militar só julgar crime militar, ampliação da competência
da justiça militar.

CISÕES OBRIGATÓRIAS
Embora presentes os requisitos de conexão e continência, os processos não podem ser reunidos. A ideia aqui
é essa. Um dos efeitos da conexão e continência é reunião de processos para evitar insegurança jurídica e garantir
celeridade, mas tem situações em que não ocorre.

INFÂNCIA E JUVENTUDE
Separa obrigatoriamente. Ex.: associação criminosa, 3 ou mais pessoas – dois maiores, um menor de idade.
Quem vai processar o menor é a vara da infância e juventude, não a vara crime. Não praticou crime, praticou ato
infracional. Separa. Há conexão e continência, pois é associação criminosa, todos os requisitos da continência
subjetiva estão presentes, deveriam ser reunidos na vara crime, mas o art. 78 diz que vara da infância e da
juventude separa. Adolescente lá, demais na vara crime. Separação obrigatória de processos. Para efeito de
contabilizar, não importa se é menor ou maior de 18 anos. Mesmo que um dos indivíduos seja menor de 18 anos. O
fato de ser processado por outra justiça não importa na contagem dos indivíduos para contar o crime.

SUPERVENIÊNCIA DE DOENÇA MENTAL


Art. 79. A conexão e a continência importarão unidade de processo e julgamento, salvo:
I - no concurso entre a jurisdição comum e a militar;
II - no concurso entre a jurisdição comum e a do juízo de menores.
§ 1o Cessará, em qualquer caso, a unidade do processo, se, em relação a algum co-réu, sobrevier o caso previsto no art.
152.
§ 2o A unidade do processo não importará a do julgamento, se houver co-réu foragido que não possa ser julgado à
revelia, ou ocorrer a hipótese do art. 461.

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Outra hipótese que determina a separação dos processos. Cidadão ficou doente no curso do processo. Art. 79
determina que se separem os processos, ver art. 152 do CPP, para efeito de segurança jurídica e para garantir
celeridade: não pode responder ao processo doente, tem que se curar.
Art. 152. Se se verificar que a doença mental sobreveio à infração o processo continuará suspenso até que o acusado se
restabeleça, observado o § 2o do art. 149.
§ 1o O juiz poderá, nesse caso, ordenar a internação do acusado em manicômio judiciário ou em outro estabelecimento
adequado.
§ 2o O processo retomará o seu curso, desde que se restabeleça o acusado, ficando-lhe assegurada a faculdade de
reinquirir as testemunhas que houverem prestado depoimento sem a sua presença.
Não confundir isso com inimputabilidade por doença mental, são coisas diferentes. Aqui estamos falando que
sobreveio a doença mental depois que cometeu o crime, não é inimputável. Inimputável em razão de doença mental, o
critério é, ao tempo do crime, já estar assim. Tanto que precisa ser analisado para saber se ao tempo tinha discernimento
ou não. Fica no mesmo juízo, mas autos distintos, outro processo distinto do originário, não serão reunidos, haverá
cisão obrigatória da fase em que se encontrar. No julgamento também.

CORRÉU FORAGIDO
Que não possa ser julgado à revelia. 79 do CPP. Para isso, precisa dizer que existem formas de comunicação
processual: a regra, é a comunicação/intimação/citação pessoal, por oficial de justiça. Se a pessoa não foi encontrada, duas
situações se apresentam: ou não foi encontrada porque está se escondendo de má-fé, ou está foragida, ninguém sabe o
paradeiro. Na primeira hipótese, justifica-se a citação por hora certa: oficial de justiça vai até o local por duas vezes, na
segunda diz que vai voltar na terceira e, se não encontrar, vai citar na pessoa de quem encontrar. No caso de má-fé, vai
pressupor que o cidadão está se escondendo.
É diferente de foragindo/paradeiro ignorado: citação por edital, editalícia. 366 CPP.
Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o
curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se
for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. (Redação dada pela Lei nº 9.271, de
17.4.1996)
A má-fé você sabe onde é, tanto que o oficial vai ao local – o oficial precisa se cercar de elementos que induzam
que o citando está se escondendo de má-fé para não ser citado. Citação por edital: suspende prescrição e processo.
Num caso de concurso de agentes ou reunião de pessoas, que porque uma é foragida as outras fiquem prejudicadas. Daí a
necessidade de separar os processos: mesmo juízo, mas um processo para o foragido, outro para os outros.

RECUSAS IMOTIVADAS
Art. 468. À medida que as cédulas forem sendo retiradas da urna, o juiz presidente as lerá, e a defesa e, depois dela, o
Ministério Público poderão recusar os jurados sorteados, até 3 (três) cada parte, sem motivar a recusa.(Redação dada
pela Lei nº 11.689, de 2008)
Parágrafo único. O jurado recusado imotivadamente por qualquer das partes será excluído daquela sessão de instrução
e julgamento, prosseguindo-se o sorteio para a composição do Conselho de Sentença com os jurados remanescentes.
(Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
Art. 469. Se forem 2 (dois) ou mais os acusados, as recusas poderão ser feitas por um só defensor. (Redação dada
pela Lei nº 11.689, de 2008)

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§ 1o A separação dos julgamentos somente ocorrerá se, em razão das recusas, não for obtido o número mínimo de 7
(sete) jurados para compor o Conselho de Sentença. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 2o Determinada a separação dos julgamentos, será julgado em primeiro lugar o acusado a quem foi atribuída a
autoria do fato ou, em caso de co-autoria, aplicar-se-á o critério de preferência disposto no art. 429 deste Código.
(Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
Do júri, no caso. Aqui tem que analisar 468 e 469, do CPP.
São as hipóteses de recusa imotivada júri. Existe uma fase de formação do conselho de sentença, por sorteio,
presentes pelo menos 15 jurados no dia do julgamento haverá sorteio para formar o conselho que deve ser formado por 7
jurados. A medida que os nomes vão sendo lidos, o juiz fala, “diga a defesa”, se recusar, recusou. Cada parte tem direito
a até três recusas imotivadas: recusar o jurado sem declinar o motivo. Ex.: caso de feminicídio, defesa recusa jurada
mulher. Partes tem conhecimento dos possíveis jurados antes? Sim, anualmente há listagem com nomes dos jurados,
pessoas convocadas. São convocadas 25, no dia tem que estar presente pelo menos 15. Todos esses atos de
convocação/intimação a acusação e defesa tem ciência. Há tempo para pesquisar quem são. Só não dá para garantir quem
vai ser sorteado no dia. Aí pode preparar recusa motivada ou imotivada.
São três recusas imotivadas para cada parte. São três recusas imotivadas para cada acusado. Um mesmo
conselho de sentença pode julgar mais de uma. Se tem 15 jurados, começou a sortear, conforme os acusados vão
recusando não sobram 7: nessa hipótese, separamos os processos. Recusas imotivadas em que não se alcança o
quorum mínimo de 7 jurados para julgar a causa. Será separado o julgamento, nessa hipótese.
Há formação de outro conselho de sentença. Um julgado no mesmo dia, outro julgado posteriormente. Só se
houver esse conflito.

CISÃO FACULTATIVA
Art. 80. Será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de
tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e para não Ihes prolongar a prisão
provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação.
Juiz pode cindir os processos quando, nas circunstâncias de tempo e lugar distintos quando da prática do
crime, ou quando um dos corréus estiver preso, ou por qualquer motivo que o poder judiciário repute relevante
para poder cindir os processos. É uma carta em branco, na verdade. Um cheque em branco para o poder judiciário.
Resquício de autoritarismo no judiciário, superpoderes ao juiz. É deixar a critério da discricionariedade fundamentada
do poder judiciário, nesse caso.

PRORROGAÇÃO DE FORO E LIMITE PARA REUNIÃO (ARTS. 81 E 82 DO CPP)


Art. 81. Verificada a reunião dos processos por conexão ou continência, ainda que no processo da sua competência
própria venha o juiz ou tribunal a proferir sentença absolutória ou que desclassifique a infração para outra que não se
inclua na sua competência, continuará competente em relação aos demais processos.
Parágrafo único. Reconhecida inicialmente ao júri a competência por conexão ou continência, o juiz, se vier a
desclassificar a infração ou impronunciar ou absolver o acusado, de maneira que exclua a competência do júri, remeterá
o processo ao juízo competente.
Art. 82. Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição
prevalente deverá avocar os processos que corram perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva.
Neste caso, a unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas.

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Prorrogação de foro ou perpertuatio jurisdiciones, consiste no juízo perante o qual os processos foram
reunidos, se manter até o julgamento final da causa. Parte do pressuposto de que o juiz não era originariamente
competente para um processo, mas se tornou: sua competência foi prorrogada para outra causa que não era
inicialmente da sua competência. Isso se mantém mesmo se esse juízo absolver ou desclassificar um crime que era
inicialmente da sua competência, ainda será competente para julgar o outro que nao era de sua competência.
Ex.: crime federal, contra autarquia federal, e um crime contra sociedade de economia mista. Reunião de
processos na JF, súmula 122 se aplica, e regras do 68 do CPP. O 81 diz que, ainda que a JF absolva o crime ferverão ou
desclassifique para outro, continuará competente para julgar o contra a sociedade de economia mista. Isso é a perpetuatio
jurisdiciones. É a perpetuação do foro, sua prorrogação.
No caso de desclassificação de crime doloso contra a vida, há exceção a perpetuação de foro. Se o juiz
presidente desclassifica um crime doloso contra a vida para outro que não é da competência do júri, a
consequência é encaminhar os autos para juízo competente. Procedimento do júri é bifásico, primeira e segunda fase.
A primeira fase ocorre perante o juiz de direito/federal, juiz togado, presidente do júri, vara do júri. Toda instrução ocorre
perante esse juiz, ainda não tem 7 jurados. No momento final, esse juiz pode adotar determinadas providências:
1) pronunciar (estou submetendo o sujeito ao conselho de sentença);
2) impronunciar (não está convencida de que houve crime doloso contra a vida, quem vai decidir isso é o juiz
natural, não está convencida da materialidade, não faz coisa julgada, MP pode reunir mais provas e oferecer nova
denúncia, decisão passível de apelação);
3) absolver (melhor que impronunciar, porque decide o mérito: caso da chacina do cabula, TJ BA);
4) desclassificar (não foi homicídio doloso tentado, que seria do júri, foi lesão corporal dolosa consumada, não é
júri, encaminha os autos ao juízo competente, não é ele que vai julgar a causa e não haverá prorrogação do foro).

LIMITE PARA A RENIAO DE PROCESSOS (ART. 82)


Só pode reunir antes da sentença final. Só pode reunir enquanto um não foi julgado. É exceção a reunião de
processo por efeito da conexão e da continência. Mesmo estando presentes os critérios de conexão e continência, não
vai ser mais. Ex.: era para reunir na JF, não aconteceu, os processos tramitaram na JF e JE. Juiz federal não avocou o
processo na JE, pois, se ele constatar que é conexão e continência e a sua justiça prevalece em relação a outra, deveria
avocar os autos. Não fez: um foi julgado, não tem mais como ter reunião.
O limite temporal para reunião dos processos é a sentença. Se houver sentença em pelo menos um dos
processos, a reunião só é possível para efeito de execução penal posterior, somatório de penas para a execução penal.
Só na execução penal esses processos serão reunidos para estabelecer a forma de execução da pena.
O limite para reunião de processos por efeito da conexão e continência é antes da sentença final: se um dos
processos já foi julgado, já tem sentença, não dá mais para reunir. Cada um faz a sua dosimetria e a vara das execuções
penais vai somar e decidir como essa execução vai ser cumprida, decidir quanto a progressão de regime, etc. No processo
civil é similar.
AULA 20 – 12/11

LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO (ART. 1 CPP)


Art. 1o O processo penal reger-se-á, em todo o território brasileiro, por este Código, ressalvados:
I - os tratados, as convenções e regras de direito internacional;

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II - as prerrogativas constitucionais do Presidente da República, dos ministros de Estado, nos crimes conexos com os do
Presidente da República, e dos ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de responsabilidade (Constituição,
arts. 86, 89, § 2º, e 100);
III - os processos da competência da Justiça Militar;
IV - os processos da competência do tribunal especial (Constituição, art. 122, no 17);
V - os processos por crimes de imprensa. (Vide ADPF nº 130)
Parágrafo único. Aplicar-se-á, entretanto, este Código aos processos referidos nos nos. IV e V, quando as leis especiais
que os regulam não dispuserem de modo diverso.
Precisa saber o limite, o âmbito de incidência, da lei processual penal. É algo estudado em direito penal,
territorialidade e extraterritorialidade: aqui, é diferente. A lei processual penal brasileira só se aplica dentro território
nacional, ou seja, ainda que a lei penal material se aplique fora do país, o processo será regido dentro dos limites
do território nacional pela lei processual penal brasileira.

“LEX FORI” (PRINCÍPIO DA ADERÊNCIA)


Essa é a regra que baliza a aplicação da lei processual penal no espaço: lei do foro, locus regit actum, ou,
princípio da aderência ao território nacional, isso está expressamente previsto no art. 1 do CPP. O direito penal diz o
que é território nacional, o que se entende: é por equiparação, navios e aeronaves, considerações a respeito das 12 milhas
náuticas (mar territorial), espaço aéreo correspondente, é algo a se revisar, mas a lei processual penal e o CPP se aplicam
dentro do território nacional.
O sistema processual penal não se resume ao CPP – este é o núcleo, mas ao redor dele há outros diplomas
processuais penais, outras leis com conteúdo de matéria processual penal, tal qual Maria da Penha, ECA, lei 9.099,
10.741, CF no meio de tudo. Assim, lei processual penal abarca todo o sistema processual penal. O CPP é o núcleo e
acaba irradiando os seus princípios e valores.

OBS.: CONTRAVENÇÃO (ART. 2)

Art. 2º A lei brasileira só é aplicável à contravenção praticada no território nacional.


Só pode punir as contravenções praticadas dentro do território nacional. Art. 2 do decreto lei 3.688/41, lei de
contravenções penais. Só são punidas praticadas em territórios nacionais. Questão dos cassinos em cruzeiros, abertos após
sair do mar territorial.
O próprio CPP cria exceções para permitir que outras leis se apliquem também no território nacional. Ou seja:
não é só o CPP que rege o processo penal dentro do território nacional.

TPI – ART. 5, §2, CF


Estatuto de Roma, 1998, ratificado em 2002 pelo Brasil, se aplica no caso de crimes graves. A CF no art. 5, §2,
traz essa possibilidade de aplicação para o caso de crimes graves em caráter subsidiário: guerra, genocídio. É uma
exceção, portanto.
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por
ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.

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NORMAS INTERNACIONAIS
Constituem outras exceções a aplicação de normas processuais no território nacional. Ex.: convenção de
Montego Bay, direitos do mar, permite a aplicação de normas internacionais quanto ao que é mar territorial no território
nacional. Outra é a Convenção de Viena, para dizer quanto a relações diplomáticas. Convenção de Beijing, regras, tratam
sobre a doutrina da proteção integral para crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. As de Beijing inspiraram o
ECA, com base na doutrina da proteção integral: não é política paternalista, são enxergados como sujeitos de direitos.
Convenção de Palermo, trata do tráfico de drogas e pessoas. Convenção de Bangkok: mulher presa, encarcerada. Ou seja:
influência de normas internacionais em território nacional, exceção prevista no próprio CPP. O rol é meramente
exemplificativo, até porque surgem leis esparsas todo o tempo.

PRERROGATIVAS FUNCIONAIS
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os
Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos
com aqueles; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 02/09/99)
II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do
Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes
de responsabilidade; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Presidente da República, ministros (crimes de responsabilidade conexos com presidente), governadores,
etc. Art. 52 CF, presentes na lei 1.079/50, que pune o crime de responsabilidade cometido pelo PR. São normas extra
código de processo penal que trazem disposições processuais: são exceções previstas expressamente no art. 1 do CPP – as
prerrogativas funcionais do presidente da república, ministros de estado, do STF, nos crimes de responsabilidade em
conexão com o presidente, tem previsão constitucional, art. 52 e lei 1079/50. Decreto lei 201/67, crimes de
responsabilidade de prefeitos. São prerrogativas funcionais nos crimes de responsabilidade, que apesar desse nome
não são exatamente crime, mas infração política administrativa, tanto que a sanção não é penal.
Crime de responsabilidade lato senso: engloba de funcionários públicos, corrupção passiva, peculato, etc.
Crime de responsabilidade em sentido estrito: infração político administrativa. É questão de direito constitucional,
de matéria politico administrativa.

CRIMES DE RESPONSABILIDADE
Revisão constitucional.

JUSTIÇA MILITAR
Decreto lei 1.001/69, existe também código de processo penal militar. Decreto lei 1.002/69. O CPP é a principal
lei processual penal do Brasil, mas existem crimes processados e julgados na justiça militar seguindo o rito do processo
penal militar. Tem previsão expressa no art. 1 do CPP.

TRIBUNAL ESPECIAL E CRIMES DE IMPRENSA (EXTINTOS)


OBS.: ADPF 130 (LEI 5250/67)

IV - os processos da competência do tribunal especial (Constituição, art. 122, no 17);


V - os processos por crimes de imprensa. (Vide ADPF nº 130)
Esse artigo faz referência a dois dispositivos extintos: tribunal especial (não existe mais, processava e julgava
crimes contra a segurança nacional) e crimes de imprensa.

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A lei de imprensa (5250/67) foi extinta. Está prevista no art. 1 do CPP como exceção a aplicação do CPP no
território nacional: aplica-se no território nacional o CPP, mas, aplicam-se também os dispositivos da lei de imprensa –
mas foi revogada, não recepcionada pela CF/88, de modo que não existe mais. STF, julgando a ADPF 130, entendeu
que a lei de imprensa não foi recepcionada pela nova ordem constitucional de 1988. STF entendeu que a lei era uma ode à
censura. 2009: STF julgou essa ADPF dessa forma e também entendeu que para ser jornalista não precisa de diploma de
nível superior. Ou seja: tendência a ampliar a liberdade de imprensa. Profissional de imprensa continua respondendo,
mas por crimes previstos no CP comum. Ver o voto do ministro Marco Aurélio nessa ADPF.
Existem outras leis esparsas, ainda. Lei Maria da Penha (por ex.: art. 16, retratação pode ser feita até o
recebimento da inicial acusatória em audiência específica com o MP, isso é matéria processual). ECA, estatuto do idoso
(art. 94: aplica-se o procedimento do JECRIM, comum sumaríssimo, nos crimes como pena máxima de ate 4 anos). Ao
falar de lei processual penal, não se fala unicamente do CPP, embora ele talvez seja a lei principal. Há uma gama
de leis com aplicabilidade no território nacional.

LEI PROCESSUAL NO TEMPO (ART. 2 CPP)


Art. 2o A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei
anterior.
O tempo do crime é no tempo da ação ou da omissão, art. 4 da lei penal. Não confundir, porque aqui, em lei
processual penal, a ideia é que tempus regit actum.

TEMPUS REGIT ACTUM


Se antes, lei processual penal no espaço, a máxima era locus regit actum, agora é tempus regit actum: a lei
processual penal tem aplicação imediata. Ex.: processo A tramitando, denúncia, audiência de instrução e julgamento,
debates, esperando a sentença. Esse processo está tramitando sob a vigência de uma lei x, até os debates. Neste exato
momento dos debates a lei x foi revogada por uma lei y. De acordo com a regra, tempus regit actum, a lei y tem incidência
imediata, então passa a regular o processo a partir dali. O tempo rege o ato: o tempo da lei rege o ato. Se foi a partir da
sentença, vai ser a partir dela. Lei passa a viger de imediato, a partir do ato. Os atos subsequentes serão regidos pela lei y.
Isso é o tempus regit actum. Está em sintonia com o sistema do isolamento dos atos processuais.

SISTEMAS
Existem três sistemas para lei processual penal no tempo:
1) sistema da fase processual;
Para esse sistema, que não é adotado no Brasil, uma vez iniciada uma fase, a lei tem que concluir toda essa
fase. Se sobreveio outra lei no meio da fase, não interessa: tem que concluir com a lei anterior aquela fase, que a iniciou.
Ex.: júri bifásico, uma lei que iniciasse essa fase, sumariante, deveria viger até a pronúncia. Mas não é adotado no Brasil,
é doutrina.
2) sistema da unidade processual;
Para o sistema da unidade processual, a lei que iniciou o processo vai viger até o final do processo. Até o final
da unidade processual. Não é adotada no Brasil. Ex.: se adotássemos esse sistema, então a lei x ia ficar até o final do
processo.
3) sistema do isolamento dos atos processuais.
O Brasil adota esse, vide lei de introdução ao código penal brasileiro. Se coaduna com a máxima tempus regit
actum.

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Para o sistema do isolamento dos atos processuais, que consiste em enxergar cada ato do processo isoladamente,
na superveniência de uma lei processual penal ela vai viger daquele ato para frente. Mesmo que o ato tenha sido
designado sob a lei antiga, vai ser regulado pela lei nova.

NORMAS PROCESSUAIS PURAS X MISTAS


OBS.: STF 611

Existem normas processuais puras, e existem normas processuais mistas. Na classificação das normas processuais
existem esses dois gêneros. As mistas também são chamadas de híbridas. Uma norma processual penal pura é aquela
estritamente processual, só tem dispositivo de caráter processual, e fica mais claro em contraposição com a lei
processual mista. Lei processual penal mista é aquela que reúne em si mesma uma parte processual e uma parte de
direito penal material. Ex.: proibição de aplicar pena alternativa (Cesta básica, pena pecuniária); não aplicação do rito
sumaríssimo do JECRIM, norma processual híbrida – é processual, mas tem caráter material, lei Maria da Penha.
Material: atinge diretamente a liberdade individual do cidadão. Sempre que houver norma processual
penal que atinge diretamente a liberdade ambulatorial de alguém, liberdade de locomoção, a norma processual
será chamada híbrida – norma processual que aumenta ou diminui a prescrição do crime, traz medidas cautelares
diversas da prisão, diz que a partir dali o tempo para oferecer queixa crime ou representação é maior, etc. É uma norma
processual que diz respeito ao silêncio do acusado, direito de mentir no interrogatório, norma processual que dita que
prisão preventiva só pode ser decretada com base em necessidade e adequação, que coloca o interrogatório como ultimo
ato da instrução criminal. Muito embora tenham natureza processual, e muitas delas estão em leis processuais, tem
aspecto de direito material que atinge a liberdade de locomoção de alguém.
Lei 13.257, estatuto da primeira infância, que altera o CPP para dizer que a partir dali qualquer gestante passa a
ter direito a prisão domiciliar. Essa norma não é só processual, mas influencia também na liberdade de locomoção da
mulher presa. Essa lei é uma forma que amplia a possibilidade de liberdade de uma mulher no Brasil. Interrogatório
como último ato: amplia o contraditório e a ampla defesa.
Lembrar que híbrido é o dispositivo, não a lei. É o artigo.
Norma puramente processual: norma que diga “agora o prazo processual vai ser contado para o MP não mais em
dobro”, “agora a carta rogatória para ser cumprida precisará passar pelo crivo de outra autoridade não prevista no CPP”,
“ao invés de 20m para debates orais, serão 30m”, não há aumento de contraditório aqui porque são 30m para MP e para
defesa. Nem sempre que se tratar de prazo será norma puramente processual, pode falar de prescrição e
decadência, que atinge a extinção da punibilidade, algo positivo para a liberdade de locomoção.
Lei 12.403/11, art 319, CPP – diversas medidas cautelares distintas da prisão.
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
(Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o
indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; (Redação dada pela
Lei nº 12.403, de 2011).
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o
indiciado ou acusado dela permanecer distante; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou
instrução; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
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V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e
trabalho fixos; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo
receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os
peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
(Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do
seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
IX - monitoração eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 4o A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com
outras medidas cautelares. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
Antes, prisão preventiva era medida cautelar por excelência do Brasil, sujeito praticava fato possivelmente
criminoso, era preso. Em 2011, o CPP foi alterado para prever medidas cautelares mais brandas, prisão domiciliar,
proibição de se ausentar da comarca sem autorização judicial, fiança, ou seja: há diversas possibilidades que o poder
judiciário precisa analisar antes de decretar prisão preventiva. Resquícios inquisitoriais.
Toda essa discussão de normas processuais puras e híbridas culmina em uma obrigação: as normas processuais
mistas se submetem a disciplina das normas penais no que tange a lei penal no tempo. As híbridas, são dotadas de
dupla extra-atividades: ultra-agem e retroagem quando forem mais benéficas. As puramente processuais, sistema
de isolamento dos atos processuais, dali para a frente, sem retroatividade, as mistas/híbridas quando mais
benéficas para o acusado retroagem e ultra-agem. Ou seja: a síntese é que se aplica as regras de lei penal no tempo,
as normas processuais mistas. Quando uma norma processual for mista se comporta como lei penal, é exatamente isso.
Lembrar que a norma penal mais benéfica retroage e ultra-age.
A norma penal mais benéfica retroage e ultra-age. Ex.: lei 13.641, se ao invés de trazer agravantes para a lei maria
da Penha, trouxesse causa de diminuição de pena. É norma penal mais benéfica, retroage e ultra-age, portanto. É falar de
direito penal. Leis processuais penais mistas ou híbridas seguem a mesma regra de direito penal: retroagem e
ultra-agem para beneficiar. Todos os exemplos mencionados: ampliar possibilidade de prisão domiciliar para mulheres
gestantes, retroage – é lei processual mista e benéfica.
Na prática, retroagir significa que, num processo em que a prisão domiciliar foi decretada antes da vigência de
uma lei, vem lei que diz que qualquer gestante pode ter prisão domiciliar, se seguisse a regra de lei processual penal no
tempo o que aconteceria é que a mulher não seria beneficiada nesse caso. Porém, a norma ostenta o caráter também de
direito material porque amplia direitos e garantias fundamentais da mulher investigada ampliando as suas chances
de liberdade de locomoção. Assim, embora a norma seja vigente posteriormente, a alcançará e a juíza irá revisar
para que se aplique a ela. A análise é casuística, nesse sentido. A retroatividade dessa lei processual penal mista, para
beneficiar essa mulher, ocorre. Gera efeitos para trás.

PROTESTO POR NOVO JÚRI

ART. 90 LEI 9099/98, ADI 1719-9

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA - FACULDADE DE DIREITO - 2018.2
MARIANA SOARES SANTOS
NORMAS HETEROTÓPICAS
(Faltei aula 21 - 14/11)

HERMENÊUTICA PROCESSUAL PENAL

AULA 22 – 19/11/2018
ART. 90-A. Controle quanto a interpretação conforme.
Art. 3, analogia.

FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL


FORMAIS
É a lei. Lei pode ser entendido em sentido amplo: engloba lei propriamente dita, produto do CN, que passa por
processo legislativo constitucionalmente previsto, stricto sensu, mas inclui regimento interno dos tribunais, leis de
organização interna dos tribunais, legislação estadual, legislação de procedimentos penais, também se enquadram
em lei em sentido amplo. Logo, a fonte formal é a lei. Dentro da lei, existe ainda competência privativa da União para
legislar sobre processo. Art. 22, I, CF. União tem competência privativa para legislar sobre processo, logo, a lei
processual penal tem como fonte imediata, primordial, a lei federal com base no art. 22, I, CF.
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
Há fonte genuína no direito processual penal que é a lei federal. A lei em sentido estrito, lei federal como fonte
primordial, principal, do direito processual penal, que cria normas processuais penais. A própria CF permite que os
estados legislem sobre procedimentos penais, quando fala sobre competências dos entes. Processo e procedimento não
se confundem, processo está para o quê enquanto procedimento está para como. Procedimento é forma assumida
pelo processo. Processo: representação do ofendido, quando não presente, muda a ordem, irmão vem antes de ascendente.
É norma processual, mas procedimento para essa troca pode ser legislado pelo estado em omissão de lei federal, que é
norma/fonte genuína primordial do direito processual penal. Sede disso: art. 22, I, CF. Fonte imediata/formal: lei, que se
comporta como fonte formal e imediata do direito processual penal, segundo a doutrina.

MATERIAIS
O direito processual penal não é formado só pela lei, é complementado por fontes mediatas, também
chamadas de fontes materiais. O direito processual penal é criado pela fonte formal e imediata e é complementado pelas
fontes mediatas materiais. São fontes que não são lei, mas que trazem um conteúdo para o direito processual penal,
e, portanto, nessa medida, acabam complementando/enriquecendo o direito processual penal. São três, segundo a
doutrina:

DOUTRINA
Fonte material mediata porque complementa o direito processual penal, na medida em que a doutrina ( opinio
doctoris) é interpretação da lei por quem tem o conhecimento técnico científico para produzir teses . USP, faculdade
de direito, edita súmulas de processo penal. Logo, há um espaço de liberdade, autonomia científica da academia. Assim,
doutrina, cria teses. Ex.: teoria dos jogos no processo penal (Alexandre morais da Rosa). Acaba influenciando na
fundamentação das decisões, nas criações das leis.
Ex.: Afrânio Silva Jardim, ex membro do MP-RJ, desenvolveu tese de que havia uma quarta condição da ação
penal (a priori, se fala em três: legitimidade de causa, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido): justa causa
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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
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MARIANA SOARES SANTOS
para ação penal. Toda doutrina começou a se posicionar nesse sentido, de que haveria uma quarta condição de ação penal
a ser implementada sob pena de rejeição da inicial acusatória (desafia recurso em sentido estrito pelo MP). Essa quarta é
um binômio: indício suficiente de autoria ou de participação + prova da materialidade delitiva. Em 2008, o CPP foi
reformado para inserir essa justa causa. Alguns chamam de lastro probatório mínimo.

JURISPRUDÊNCIA
É o entendimento reiterado dos tribunais. Para ter jurisprudência, tem que ter esse entendimento reiterado –
não há jurisprudência quando é fato isolado. Por vezes, gera súmula. A nossa jurisprudência brasileira tem inovado no
direito processual penal complementando-o – às vezes para o bem, às vezes para o mal. Ex.: execução provisória da
pena, HC 126.292/2016 STF. A partir de então passa a ser possível que condenação na primeira instância e recurso
improvido na segunda comece de imediato a cumprir a pena. Aspecto favorável: se o cidadão está preso preventivamente,
isso será abatido do tempo de pena – se permitir a execução provisória da pena não é o mesmo que manter
preventivamente e abater do tempo de pena? Mas ainda é ofensa a presunção de inocência.
Prisionização: quando quem está respondendo ao processo tem introjetada em si a noção de que não merece
liberdade, benefício, não tem porque recorrer, etc. Reforma de 2011: prisão preventiva é ultima ratio das cautelares – tem
que demonstrar que tem risco de fuga, coloca em risco a investigação, etc. Não é presunção de inocência: é presunção
de não culpabilidade. 2009: STF tinha precedente inverso (não cabe execução provisória da pena no Brasil em nome do
princípio da presunção de inocência). Como reforçar a cultura de precedentes no Brasil?
Ex.: STF retirou caráter hediondo do tráfico privilegiado. Retirar caráter hediondo é minimizar a severidade:
passa a admitir fiança, tempo de prisão temporária é o mesmo, tem repercussão na execução penal.
Flexibilização do regime inicial para os crimes hediondos, em termos de execução e cumprimento de pena. Lei
8072 não permitia a progressão de regime. Com o julgamento de um HC em 2006, passou-se admitir a progressão de
regime em crimes hediondos. Lei foi alterada para dizer que admitia a progressão, mas o regime deveria ser fechado. STF:
tem que flexibilizar, se o sujeito tem os requisitos subjetivos e objetivos, tem que ser o semiaberto.

COSTUMES
Ex.: recesso judiciário de 20 de dezembro a 20 de janeiro. Suspende-se os prazos durante esse período: é de
costume. Direito consuetudinário tem que ser provado; se invoca costume, tem que ser provado. Tem uma nesse
sentido que envolve a questão indígena: tribos que matam crianças gêmeas, prática eugênica. É uma analogia que se faz
do processo civil e do processo penal.

INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR
CONCEITO
O inquérito policial deve ser sigiloso, a priori. Criminologia midiática, Zaffaroni.
Primeira fase da persecução penal, que é bifásica – investigação preliminar e fase do processo penal
propriamente dito. Essa primeira fase é para construir a materialidade delitiva e os indícios suficientes de autoria ou
participação, ou seja, a justa causa para uma ação penal.
É o expediente que visa a reunião de elementos (materialidade delitiva e indícios de autoria ou participação)
para viabilizar o processo penal.

LEGITIMIDADE
No Brasil, quem tem legitimidade para tanto é o delegado de polícia e o MP. Art. 144, CF, diz que a polícia tem
essa legitimidade. Os co-legitimados a realizar essa investigação são: polícia, por excelência, judiciária. A polícia
judiciária é aquela dirigida por delegado de polícia civil ou federal. Essa é a polícia judiciária que atua

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repressivamente. Investiga crimes quando já aconteceram, ou seja, atuação repressiva. Por excelência, quem tem
atribuição primordial, principal, para realizar essa investigação preliminar no Brasil, é a polícia judiciária. Art. 4 do CPP
prevê o mesmo, junto com o 144, CF.
Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e
terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. (Redação dada pela Lei nº 9.043, de 9.5.1995)
Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja
cometida a mesma função.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da
ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
[...] § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou
de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão
interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
Polícia militar também pode realizar investigação criminal quando ocorre crime envolvendo alguém da
cooperação, que é uma polícia administrativa e tem atuação mais ostensiva/preventiva, ao contrário da judiciária,
que é repressiva. Polícia militar pode investigar e instaurar inquérito policial militar. Quando crime praticado militar,
inquérito paralelo ao inquérito da polícia civil.
MP pode investigar criminalmente, tem atribuição para realizar investigação preliminar, através de
procedimento investigatório preliminar (PIP). Esteve no centro da discussão da PEC 37 (PEC da impunidade), houve
briga histórica entre MP e delegados de polícia, por defesa de território. Se discutia a possibilidade de o MP realizar
investigação criminal. Forças contrárias diziam que o MP estaria usurpando função da polícia, art. 144. A PEC foi
arquivada: se quem pode mais, que é deflagrar processo e realizar denúncia, porque não poderia menos, investigar?
O MP tem a atribuição constitucional de exercer o controle externo da polícia, tanto sim que na maioria da Europa,
Colômbia e México, a polícia é subordinada ao MP, embora aqui não o seja. Os órgãos, instituições, tem que trabalhar em
harmonia. Na prática, quase não se exerce a função de controle externo da polícia. Súmula 234, STJ. Membro do MP
que acusou não está impedido de atuar no processo, reforça que o MP pode realizar a investigação preliminar.
Súmula 234, STJ - A Participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu
impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.
Investigação defensiva, privada: para reunir elementos que possam viabilizar a deflagração de um
processo. Ex.: detetive particular. Uma investigação paralela a da acusação.
Comissão parlamentar de inquérito: também tem atribuição constitucional de realizar investigação
criminal.
Investigação preliminar não é exclusividade da polícia.

NOTÍCIA DO CRIME
Noticia criminis, ou notícia do crime. A autoridade policial judiciária, que é quem detém atribuição legal
para conduzir a investigação criminal por excelência, embora não seja a única, junto com MP e o poder judiciário,
começa com a noticia criminis, por óbvio.

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DE COGNIÇÃO DIRETA (OBS.: “DENÚNCIA” ANÔNIMA)
É a informação/ciência às autoridades sobre o acontecimento de uma conduta delitiva. Existem três espécies
de noticia criminis, de cognição direta, espontânea ou imediata.
Também conhecida como espontânea ou imediata. Ocorre quando a própria polícia, realizando as suas
diligências de praxe, tem conhecimento de que um crime aconteceu ou está acontecendo. A própria polícia se depara,
no curso de sua atuação rotineira, com a prática de um crime – ninguém levou a polícia ao crime, é de ofício, a polícia
toma conhecimento diretamente, sem ninguém levar. Toma conhecimento do fato a partir da sua própria atuação
rotineira.
Termo utilizado de forma atécnica, denúncia é a petição inicial do MP. A anônima ou apócrifa é admitida
na investigação, igualada à de cognição direta, é como se a polícia espontaneamente tivesse investigado e chegado a
conclusão/fato, sendo equivalente a essa. Denúncia anônima é admitida no Brasil nesses termos.

DE COGNIÇÃO INDIRETA (OBS.: “DELATIO CRIMINIS”)


Também chamada de mediata, é contrário da anterior. Ocorre quando alguém identificado reporta o fato a
autoridade policial, e a partir disso ela investiga. Esse alguém pode ser vítima ou terceiro que não tem nada a ver
com o crime. Terceiro, que não é vítima, leva o fato tendo outrem como ofendido: delatio criminis. Se aproxima da figura
do whistleblower, reportante do crime. Remunerar alguém porque entregou o outro. Lei 13608/18.

COERCITIVA
Noticia criminis coercitiva ocorre quando acontece prisão em flagrante delito. Caso de prisão em flagrante.
As outras não são de prisão em flagrante, essa exige auto de prisão em flagrante enquanto as outras exigem
portaria.

INQUÉRITO POLICIAL
Inquérito policial pode ser instaurado mediante portaria da autoridade policial ou mediante auto de prisão
em flagrante. Vai ser instaurado por portaria quando não for caso de flagrante. Ex.: há notícia de que alguém foi
morto com 12 facadas em 7/10 e não se conhece suspeito. Uma semana depois, alguém informa que o suspeito é x. Não é
mais flagrante. Agora tem indício, materialidade, instaura inquérito como portaria. Flagrante: art. 302, CPP.
Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la;
III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser
autor da infração;
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

NATUREZA JURÍDICA (OBS.: VÍCIOS (STJ HC 137.349)


Inquérito policial é o expediente de investigação para as infrações de maior potencial ofensivo. Nas de
menor potencial ofensivo o expediente é outro, não é inquérito policial, é um resumo de inquérito policial mais
simplificado (termo circunstanciado de ocorrência policial). O TCO é um inquérito policial mais simples, lei 9.099/95.
Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará
imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais
necessários.

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Para as infrações de maior potencial ofensivo, inquérito policial, natureza jurídica de procedimento
administrativo, portanto. Não é um processo, é um procedimento administrativo por natureza jurídica. Isso quer dizer
que para a doutrina mais conservadora não cabe contraditório e ampla defesa no inquérito policial porque não é
processo.
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Art. 5, LV, CF, diz que cabe contraditório e ampla defesa em qualquer processo indicial ou administrativo
– mas inquérito policial não é processo, é procedimento administrativo. A corrente garantista, por outro lado, diz
que procedimento é parte de processo. É uma corrente mais constitucionalizada, e acredita que o procedimento serve a
um processo, é parte de um processo administrativo ou judicial, tanto que o inquérito policial vai acompanhando a
denúncia, muito embora não devesse, com previsão expressa do CPP. Para Misael, é reminiscência inquisitorial e não
pode.
É direito ao defensor ter acesso aos elementos de prova já concluídos no inquérito. Vem lei que repete o mesmo,
dizendo que a autoridade policial pode responder civil, penal e administrativamente se não fundamentar. Se as garantias
fossem observadas logo na parte de inquérito, não haveria sobrecarga na parte de prestação jurisdicional.
AULA 23 – 21/11/2018
Quanto aos vícios, é preciso compreender que o inquérito policial tem regularidade, existe no CPP a partir do art.
4 dispositivos que disciplinam a instauração e a condução do inquérito policial. Art. 6/7 – diligências a serem adotadas
pela autoridade policial diante da notícia do crime.
Art. 5o Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado:
I - de ofício;
II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem
tiver qualidade para representá-lo.
§ 1o O requerimento a que se refere o no II conterá sempre que possível:
a) a narração do fato, com todas as circunstâncias;
b) a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de convicção ou de presunção de ser ele o
autor da infração, ou os motivos de impossibilidade de o fazer;
c) a nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão e residência.
§ 2o Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso para o chefe de Polícia.
§ 3o Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública
poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações,
mandará instaurar inquérito.
§ 4o O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado.
§ 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito a requerimento de quem
tenha qualidade para intentá-la.
Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

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I – se possivel e conveniente, dirigir-se ao local, providenciando para que se não alterem o estado e conservação das
coisas, enquanto necessário; (Vide Lei nº 5.970, de 1973)
I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos
peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
II – apreender os instrumentos e todos os objetos que tiverem relação com o fato;
II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada
pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;
IV - ouvir o ofendido;
V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro,
devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura;
VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;
VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;
VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de
antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica,
sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para
a apreciação do seu temperamento e caráter.
X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o
contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa. (Incluído pela Lei nº
13.257, de 2016)
Art. 7o Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial
poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.
Existem documentos a serem assinados, que não podem ser delegados, e é possível que ocorra, principalmente
diante do modelo cartorial, irregularidades e vícios. A ideia é que surgindo vício/irregularidade, isso não contamina o
processo penal. Um documento a ser assinado pelo delegado de polícia e não foi, ou autoridade policial não estava
presente no levantamento cadavérico, ou alguém, na condição de investigado, foi compelido a participar de algo que não
queria. Isso não contamina o processo penal, há jurisprudência pacífica nesse sentido.
Os vícios do inquérito policial não contaminam o futuro processo penal, são meras irregularidades a serem
resolvidas no âmbito da administração pública, sancionando os responsáveis e não interferindo na sorte do
processo, até porque eventual vício que ocorra na fase investigativa poderá ser sanado mediante contraditório e
ampla defesa judicial. Se, por ventura, alguém confessou mediante tortura na fase policial, pode novamente ser
interrogado e desdizer o que disse, sobre o crivo do contraditório e ampla defesa. A forma de sanar isso efetivamente é
submetendo os responsáveis às respectivas sanções administrativas, inclusive crime, se for abuso de autoridade e tortura.
Do ponto de vista de garantir a não contaminação do juiz, é difícil. As provas ilícitas devem ser
desentranhadas dos autos, mas isso não garante absolutamente nada: o mesmo juiz que teve contato com a prova
ilícita e determinou o seu desentranhamento continuará na causa. Paragrafo quarto do art. 347 foi vetado, e trazia o
instituto de descontaminação julgado – hoje, juízes responsáveis, após ter contato com a prova ilícita, saem do processo,
mas a lei permite que o juiz que teve contato continue no processo.
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CARACTERÍSTICAS
ESCRITO (ART. 9)
Art. 9o Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste
caso, rubricadas pela autoridade.
É um procedimento escrito. Significa dizer que todas as diligências empreendidas pela autoridade policial
devem ser reduzidas a termo para compor documento escrito ao final do procedimento, chamado de relatório de
encerramento do inquérito policial, a ser encaminhado ao dominus lide, titular da ação penal.
Apreender instrumentos, documentos e objetos utilizados no crime após liberados pela perícia, ouvir a vítima,
ouvir testemunhas, interrogar o suspeito/investigado, indiciar o suspeito – indiciamento é sem disciplina no CPP. CPP
não diz o que é nem como fazer. Indiciar alguém significa formalizar a suspeita sobre aquela pessoa, significa dizer
que oficialmente a pessoa passa a ser suspeita de um crime, está indiciado pela prática de um delito . Como não tem
disciplina legal, tem que ficar atento: ao receber comunicação, deve-se desconfiar e ir acompanhado de um advogado.

INSTRUMENTAL (OBS.: RECURSO ADMINISTRATIVO – ART. 5)


Reúne elementos para viabilizar o futuro processo penal. Está a serviço do processo penal, é instrumento
para que se efetive a segunda fase da persecução penal, a fase judicial. O caráter instrumental do inquérito policial
está aí: serve ao processo penal no sentido de reunir elementos da materialidade delitiva e indícios de autoridade e
participação para viabilizar a abertura do processo. O processo penal instrumentaliza o direito penal.
Art. 5: recurso administrativo endereçado ao chefe de polícia, secretario de segurança publica, delegado chefe, das
omissões/negativas da autoridade policial em não adotar diligências e não instaurar inquérito policial, cabe recurso
administrativo para o chefe de polícia. Não é processo, mas sim procedimento, mas isso não impede que se valha de
recurso administrativo. É preciso atentar para a realidade fática: frequentemente faz mais sentido e é mais útil conversar
com a autoridade policial ao invés de recorrer.

SIGILOSO (ART. 20)


Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da
sociedade.
Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar
quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes. (Redação dada pela Lei nº
12.681/2012)
Inquérito policial é procedimento sigiloso e esse sigilo deve ser garantido para que haja elucidação do fato e
proteção do interesse da sociedade. É do interesse, além disso, do investigado, afinal é pessoa presumidamente inocente.
O art. 20 silenciou quanto a isso, é reminiscência inquisitorial de 1941.
Assim, vem a reforma de 2012 e inseriu o parágrafo único dizendo que, nos atestados de antecedentes
criminais, as autoridades não podem mencionar inquéritos policiais em curso. Quem expede é a autoridade policial, e
por força do parágrafo único do art. 20 não pode constar inquérito policial naquela pessoa nos atestados de antecedentes
criminais: tentativa de constitucionalização e garantia de presunção de inocência dos acusados. Vide sumula 444,
STJ – dosimetria da pena, não pode considerar ações penais em curso para aumentar a pena base.
Súmula 444, STJ - É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.

DISPENSÁVEL (ART. 27, 4)


Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação
pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de
convicção.
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DIREITO PROCESSUAL PENAL I – MISAEL DA FRANÇA
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Briga entre ministério público e polícia militar no Brasil. O inquérito é uma espécie de investigação
preliminar, existem diversas outras, tanto que o CPP diz que é procedimento dispensável pelo titular da ação
penal. Se o MP não quiser inquérito policial, não precisa ter, pode dispensar: ele próprio pode realizar investigação por
meio do PIC – dessa forma, é possível dizer que existem outras formas, próprio art. 4.
Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e
terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.
Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja
cometida a mesma função.
A leitura deve ser feita em conjunto. CPI, MP, PM, tribunais em foro por prerrogativa de função, a própria
investigação privada. Caso alguém faça representação diretamente no MP, narrando fato em tese criminoso, MP
pode instaurar PIC ou, facultativamente, requisitar a instauração de inquérito policial. Se a materialidade delitiva
e os indícios de autoridade ou participação ja surgiram no PIC, não tem porque instaurar inquérito.

INQUISITIVO (OBS.: 107, CPP, 14, CPP)


Art. 107. Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se
suspeitas, quando ocorrer motivo legal.
Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada,
ou não, a juízo da autoridade.
Dizer que o inquérito policial é inquisitivo significa dizer que nele estão presentes as características do
sistema inquisitorial que estudamos anteriormente: indivíduo como objeto, busca da verdade, figura da autoridade
que administra a prova, autoridade policial conduz a investigação e ordena providencias de diligência . É preciso
rever essa característica a luz de um processo penal constitucionalizado.
Procurando obter informações para formar seu entendimento sobre a materialidade e os indícios: fazendo isso o
indivíduo se aproxima mais de um objeto de investigação do que de um sujeito de plenos direitos. Estamos diante de
procedimento recepcionado pela CF/88, que diz que a dignidade da pessoa humana é um dos princípios fundamentais da
república: seria irresponsável dizer que o inquérito policial é procedimento apenas inquisitório. É preciso enxergar a
pessoa como sujeito de direitos, não permitindo espetacularização da sua imagem, por ex., protegendo a investigação
decretando sigilo para proteger interesses da sociedade e garantir a presunção de inocência, garantindo ao investigado o
direito de permanecer em silêncio e não produzir prova contra si mesmo, observando a sumula vinculante 14 (é uma
parceria entre advocacia e polícia: é imprescindível entender isso).
Súmula 14, STF - É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam
respeito ao exercício do direito de defesa.
A própria CF, em diversos dispositivos, prevê o mesmo, inclusive art. 1, art. 5.

INFORMATIVO
A finalidade do inquérito policial é informar ao titular da ação penal sobre os dados que foram colhidos,
reunidos sobre a materialidade delitiva e os indícios de autoria ou participação em um crime. Caráter instrumental
informativo: são informações para o titular da ação penal e para a autoridade policial que preside a investigação ,
se cerca de informações para levar as informações para o titular e para ela também. Hoje se pode oferecer quesitos, de
forma que é um ensaio de homenagem a ampla defesa.

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OBRIGATÓRIO
Obrigatório para a autoridade policial. A autoridade policial tem obrigação de instaurar inquérito, casos de
ação pública incondicionada. Nos de ação penal pública condicionada a representação e de iniciativa privada a
autoridade policial fica travada, nada pode fazer se não houver representação do ofendido ou solicitação para
abertura do inquérito.

INDISPONÍVEL (ART. 17)


Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito.
Ou seja, uma vez instaurado a autoridade policial não pode arquivar de ofício. Indisponibilidade do
inquérito policial é para a autoridade policial: uma vez instaurado, ele deve seguir até o final. Faz sentido na medida
que é mero instrumento para viabilizar o processo e o dominus lide não é a autoridade policial . Há crítica no sentido
de utilizar o dinheiro público desnecessariamente. Fere, inclusive, o princípio da eficiência, que envolve economicidade.
Uma vez entendendo que a conduta é atípica e não tem mais o que investigar, encerra e encaminha, mas não pode
arquivar.
Se um delegado se depara com noticia criminis que não veicula fato típico, pode ou deve instaurar
inquérito? Não, pois não justificaria precisar ser bacharel em direito para ser delegado. Assim, pelo menos tem que
estar diante da justa causa para o inquérito policial, qual seja, o fato precisando ser pelo menos típico, tem que ter
prova da materialidade delitiva, indícios suficientes de autoria ou participação de fato pelo menos típico.
USP + STF + STJ: fato deve ser ainda punível. Não deve haver nenhuma hipótese de extinção da punibilidade
(prescrição, decadência, morte do agente, abolitio criminis). Fato típico: cabe instauração, outras condições devem ser
observadas no caso de ação penal publica condicionada a representação e ação privada. Nessa tipicidade entra o aspecto
material, ou seja, pode um delegado se negar a instaurar inquérito porque a conduta é insignificante? A tipicidade deve ser
formal: sendo a conduta formalmente típica, cabe a instauração do inquérito, embora não possa haver nenhuma
possibilidade de extinção de punibilidade e ação penal condicionada ou privada.

OFICIAL
Essa característica se deve por ter sido instaurado por uma autoridade oficial, que é o delegado de polícia. Há
casos em que os tribunais determinam a instauração de inquérito de investigação, nos casos de foro de prerrogativa
de função, discutível, pois é judiciário determinando “de ofício”.

VALOR PROBATÓRIO
Inquérito policial é procedimento administrativo que não garante princípios do processo penal. Assim, é fácil
entender o valor probatório do inquérito policial: é um valor probatório relativo. Isso significa que o juiz apenas utiliza
o que foi colhido em sede de inquérito policial quando o que foi colhido é posteriormente submetido ao
contraditório e ampla defesa dentro do processo. O inquérito, sendo anterior ao processo penal (e, às vezes
determinando se o processo vai acontecer ou não), o MP vai receber ou realizar o inquérito e com base nele decide se
oferecerá a denúncia ou não. Oferecida a denúncia, o que foi ali colhido é submetido ao contraditório e ampla
defesa, e só depois disso pode servir de prova no processo e o juiz pode usar aquilo para fundamentar as decisões.
Se o juiz decide condenar com base em informações colhidas em inquérito policial não submetido a contraditório e ampla
defesa depois, está violando esses princípios e essa parte da sentença é nula.
Isso sofreu modificação pelo CPP, que permite ao juiz usar essas informações a partir da inclusão de uma palavra:
Art. 155. No juízo penal, somente quanto ao estado das pessoas, serão observadas as restrições à prova estabelecidas na
lei civil. (Revogado)

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Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas
cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.
(Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
“Exclusivamente”: juiz pode utilizar, se aliado a outras provas submetidas ao contraditório e ampla defesa.
Questão: juiz combina a prova que foi colhida no inquérito policial com outras provas no processo penal, que
foram colhidas e submetidas a contraditório dentro do processo penal. A sentença é válida com base no 155 do CPP.
Outra questão: prova foi colhida no inquérito policial, não foi submetida ao contraditório mas havia dentro do
processo outras provas que deixavam claro que a pessoa foi autora do crime da denúncia, mas juiz usou na sua
fundamentação o que foi colhido no inquérito policial – a sentença não é válida, porque a despeito disso, o que ele usou na
sentença foi aquilo ali que não foi submetido a contraditório e ampla defesa, de forma que a sentença é nula.
Tomar cuidado com essa questão estrutural da questão da prova.
O inquérito policial colheu provas, ofereceu para MP, MP oferece denúncia: dentro do processo penal, essa prova
não foi submetida a ampla defesa. Dentro do processo penal, há colheita de provas outras, instrução completa – essas sim
com respeito ao contraditório e ampla defesa.

ATUAÇÃO DA ADVOCACIA (OBS.: SIGILOSO – STF HC 87725-7)


Por causa da noção de que o inquérito não garante princípios básicos do processo penal, há entendimento que
algumas prerrogativas dos advogados eram pormenorizadas, diluídas. Nem a parte pode se manifestar quanto aquilo,
assim, direitos dos advogados eram tolhidos: advogados não conseguiam ter acesso ao que estava ocorrendo, não
conseguiam oferecer quesitos, etc. Ao longo do tempo isso foi sendo criticado e chegou ao STF para julgamento, STF, no
julgamento do HC, decidiu que, uma vez documentado o que foi colhido a título de inquérito policial, o advogado
não pode ser negado acesso.
Ex.: colheu confissão, não acompanhada do advogado naquele momento. Levando a confissão a termo, o
advogado precisa ter acesso aquilo. Qualquer informação, uma vez documentada, precisa ser fornecida, se
requisitada, ao advogado. Se negar acesso aquilo, se torna nulo. Exceção: se fundamentar, no caso a autoridade
policial, dizer que a informação não está sendo fornecida porque: estão incompletas, o fornecimento pode
prejudicar o andamento de outras investigações em curso, precisa ser fundamentada a recusa, uma vez que a regra
é que uma vez documentado não pode negar acesso.
Se não foi documentado, pode negar acesso. Se não reduziu a termo, a autoridade policial pode negar acesso ao
advogado. Assim, a partir dessa decisão, outras garantias foram sendo alcançadas, como o advogado poder apresentar
quesitos, pois isso importa dentro do inquérito. A parte investigada pode ser ouvida e é inquisitório: “você fez isso?”
“estava lá?” – e isso vai levar ou não ao oferecimento da denúncia, instauração de processo penal. Se for muito
estruturado, robusto, haverá denúncia. Se o advogado está ali oferecendo perguntas e quesitos que podem servir de base
para uma dúvida, isso importa. In dúbio pro réu.
O todo do inquérito policial final ajuda no arquivamento do inquérito policial a depender do desempenho
do advogado nessa parte, poupando muitos esforços. Isso já é algo garantido no inquérito policial hoje. Mesmo assim,
é bem difícil a prática do advogado dentro do inquérito policial. Ainda é algo complexo a atuação do advogado no
inquérito.

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ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL
Colhe as informações, manda para MP, MP olha e vê um lastro mínimo de autoria ou materialidade do crime, se
está vendo isso, vai oferecer a denúncia. O oferecimento da denúncia precisa atender a certos requisitos: quem fez, o que
fez, quando fez, onde fez, etc. tudo para que o enquadramento legal esteja posto na denúncia. Se não enxergar naquele
inquérito policial um lastro mínimo de autoria ou materialidade, pede arquivamento, não vai oferecer denúncia.
O CPP prevê que o juiz, que ainda não está aqui, se entender que naquele caso há lastro mínimo de autoria
e materialidade, pode requisitar ao procurador geral que instaure o processo penal. O procurador geral vai olhar o
inquérito policial, avaliar se há lastro mínimo de autoria e materialidade, caso havendo, vai instaurar o processo penal.
Caso não, o procurador vai arquivar definitivamente.
O problema aqui é a atuação do juiz, que, em tese, deveria ser imparcial. Viola flagrantemente a imparcialidade
no processo acusatório, vai de encontro a estruturação de um processo acusatório, prejudica muito a imparcialidade.
Ou seja: palavra final é do procurador geral, podendo o juiz influenciar na estrutura do processo ao pedir
que não seja o inquérito policial arquivado.
Nesse inquérito policial arquivado, em relação ao mesmo fato, não pode ser reaberto. Mas, havendo fatos
supervenientes ou circunstâncias outras não abordadas ali, capazes de sustentar um outro processo penal, pode criar outro
– mas não desarquivar. [professor diz posteriormente que pode desarquivar sim].

INCOMUNICABILIDADE (ART. 21 – OBS.: 136, §3, IV, CF)


AULA – 28/11/2018
Art. 21. A incomunicabilidade do indiciado dependerá sempre de despacho nos autos e somente será permitida quando o
interesse da sociedade ou a conveniência da investigação o exigir.
Parágrafo único. A incomunicabilidade, que não excederá de três dias, será decretada por despacho fundamentado do
Juiz, a requerimento da autoridade policial, ou do órgão do Ministério Público, respeitado, em qualquer hipótese, o
disposto no artigo 89, inciso III, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei n. 4.215, de 27 de abril de 1963)
(Redação dada pela Lei nº 5.010, de 30.5.1966)
Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar
estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a
paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes
proporções na natureza.
[...]§ 3º Na vigência do estado de defesa:
[...] IV - é vedada a incomunicabilidade do preso.
Advogado não ter acesso ao investigado durante a investigação. Está prevista em dispositivo tacitamente
revogado. Se a CF, no art. 136, quando fala de estado de defesa baniu a incomunicabilidade do preso do ordenamento
jurídico, se no estado de exceção, como o estado de defesa, é garantida a comunicabilidade, muito mais nas condições
normais. Então, significa dizer que não se fala mais em incomunicabilidade do preso no processo penal.

JUSTA CAUSA PARA INSTAURAÇÃO


Questão da indisponibilidade do inquérito policial. Uma vez instaurado o inquérito, o delegado não pode
mandar arquivar de ofício. Como se trata de um bacharel em direito, essa pessoa precisa saber quando está autorizada a
investigar: quando está diante da justa causa para instauração do inquérito policial. Fato tem que ser pelo menos típico,
isso é a justa causa. É necessário haver reunião da prova da materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria
ou participação, sem hipótese extintivo de punibilidade. Súmula 14, jurisprudência e doutrina: embora a lei não diga
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isso. Doutrina e jurisprudência são fontes complementares do direito processual penal. Quando se fala de materialidade
delitiva e indícios de autoria para instauração do inquérito, isso se associa a conduta ser ao menos típica. Os demais
elementos, que futuramente virão a ser prova, os demais elementos relacionados a perícia, identidade dos suspeitos,
exame do corpo de delito, tudo isso vai formar a materialidade delitiva, complementar essa conduta que precisa ser
anteriormente típica, pelo menos, para viabilizar a deflagração por parte do seu titular (MP ou particular).
É possível que, diante do relatório do inquérito, o MP requeira ao juiz o arquivamento . O arquivamento do
inquérito é possível se o MP não se convencer do lastro probatório, da justa causa para oferecimento de denúncia, e requer
ao poder judiciário que arquive, isso se chama de arquivamento direto. Arquivamento e desarquivamento dependem
de homologação judicial. Desarquivamento: só é possível mediante prova nova, prova que não existia no período
da investigação, ou que já existia mas inova todo o arcabouço fático investigativo. Entendimento sumular do STF.
O inquérito, uma vez arquivado, não impossibilita que a polícia continue a ordenar diligências
investigativas para encontrar prova nova ou elemento novo que permita o oferecimento da denúncia. A primeira
modalidade, portanto, é a de arquivamento direto, quando o MP requer que a autoridade policial arquive porque não se
convenceu. Só pode ser desarquivado mediante o surgimento de prova nova, é o entendimento do MP. Desarquivamento
do inquérito policial consiste no surgimento de uma nova prova.
Inquérito não pode ser instaurado sem implemento da condição nas ações penais públicas condicionadas a
representação do ofendido, só pode ter inquérito se o ofendido representar.
Arquivamento indireto, por sua vez, consiste na possibilidade de o MP declinar de sua atribuição. O MP
recebe as peças de investigação e se convence que aquilo ali não é da sua atribuição e promove o que se chama de
declínio de atribuição. O arquivamento indireto esconde um verdadeiro conflito de competência, se o MP diz que a
atribuição não é dele, quer dizer que o poder judiciário não é competente para julgar a causa. Ex.: MPF se depara com
causa envolvendo sociedade de economia mista. MPF diante dessa hipótese promove um declínio de atribuição. Tem
enunciado da PGR nesse sentido: MPF não atua em causas que envolvam exclusivamente sociedade de economia mista.
Diante disso, a doutrina diz que houve arquivamento indireto do inquérito policial, na medida em que deixou de oferecer
a denúncia e promoveu o declínio para outro membro ou outro órgão. Não é causa de MPE, é causa de MPMU –
declínio de atribuição. Assim, o arquivamento indireto deve ter lugar nessa hipótese.
Arquivamento implícito não é aceito pela jurisprudência brasileira, é criação doutrinária. Consiste em o
MP, recebendo as peças de investigação, deixar de denunciar alguém ou algo. Imaginar que o relatório do inquérito
policial chega ao MP envolvendo três homens, que teriam praticado concurso de três crimes, A, b e C. Se o MP oferece
denúncia só a um, houve arquivamento implícito quanto aos outros dois. Se oferece só em relação a um crime:
houve arquivamento implícito do inquérito policial em relação aos outros crimes. Não é o entendimento da
jurisprudência brasileira.
A denúncia pode ser aditada: diante do princípio da indivisibilidade da ação penal, o MP tem que oferecer
denúncia contra todos os envolvidos e todos os fatos noticiados, isso é inerente ao princípio da obrigatoriedade da ação
penal pública.
Se o poder judiciário observa que algum envolvido ou fato ficou de fora, pode abrir vistas ao MP para que
este adite a denúncia e trague os denunciados/fatos faltantes. No máximo, o poder judiciário pode fazer isso, para que
o MP, querendo, adite a denúncia. Art. 28 do CPP, inclusive nos casos de discordância do MP e poder judiciário, dá
ensejo a invocação desse artigo.
Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito
policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará
remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão

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do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a
atender.
Esse artigo vem a calhar nesse tema: arquivamento do inquérito policial. Esse art. prevê a possibilidade de o
poder judiciário discordar do arquivamento: MP requer ao juízo o arquivamento do inquérito policial e o poder
judiciário discordando disso, esse art. Permite a instância superior do MP seja provocada. Submeter por força do
princípio da obrigatoriedade da ação penal a instância superior para que esta instância superior decida sobre o
conflito, e pode adotar:
1) concordar pelo arquivamento – vincula poder judiciário;
2) designar membro para que este ofereça denúncia nesse caso: esse membro está vinculado, pois está
cumprindo dever de ofício funcional; ele pode, nas alegações finais, pedir absolvição; e,
3) a própria instância superior PGR ou PGJ oferecer a denúncia.
Se o MP não arquivar o inquérito policial, oferecerá a denúncia e inaugurará a segunda fase da persecução penal
que se inicia com o oferecimento da denúncia fazendo com que estudemos agora a ação penal.

AÇÃO PENAL
Direito público subjetivo, autônomo, que pertence, sendo direito público, por excelência, ao Estado. O legitimado
por excelência para promover a ação penal é o estado na figura do MP – Estado acusação. É o direito de pedir ao estado-
juiz que concretize o seu jus puniendi – poder público de punir alguém diante da (suposta) ocorrência de um delito. É o
direito de pedir a concretização do jus puniendi, que além de direito de punir é o dever publico de punir. Direito de punir,
dá ideia de arbitrariedade: estado tem o direito de punir quem cometeu o delito, o que existe é potestati punitiva, direito
quem tem é o indivíduo de ter tutelada a sua liberdade.
O seu fundamento está no art. 5, XXXV da CF.
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
É garantia fundamental, portanto, do indivíduo e da sociedade. Princípio da inafastabilidade da jurisdição que
consagra o direito de ação. É o direito do individuo que tem o direito de ser submetido a sanção penal após a tramitação
do processo devido, que se inicia por ação penal. É, além disso, direito da sociedade, de pleitear a consagração da
potestati punitiva do Estado. É autônomo porque não se subordina ao direito material. O direito de ação não está
subordinado ao direito material.
Em outras palavras: mesmo quando o direito material não é satisfeito, mesmo quando ocorre absolvição a
contragosto do estado acusação, efetivou-se o direito de ação. A ação penal admite duas macro espécies: pública e
“privada” – na verdade, na essência, toda ação penal é pública, em regra. Há hipóteses em que o estado transfere ao
particular a legitimidade para oferecer a inicial acusatória, no caso, a queixa criminis. A lógica que vigora no ordenamento
jurídico brasileiro, principalmente por viés autoritário do processo penal, coloca o estado como principal sujeito do
processo penal, e daí o fato de a ação penal ser publica em regra: mas isso já foi discutido.
Elmir Duclerc: teoria agnóstica do processo, que se contrapõe a ideia de que o estado é senhor do processo, que é
viés autoritário. Quando se diz a ação é pública em regra e o estado é o principal sujeito do processo penal, e que a ação é
pública, se coloca principalmente a vítima em um segundo plano. Daí a proposta de Elmir e Ramalho Jr. em trazer a ação
penal publica condicionada a representação do ofendido como regra: não seria incondicionada a regra, mas sim a
condicionada. Só haveria processo se a vítima autorizasse: isso é forma de resgatar a vítima, que durante muito tempo
assumiu papel secundário na relação processual.

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Não podemos deixar de ver que o reforço da ideia de que o estado é senhor do processo penal reforça ponto de
vista de seletividade, hegemônico, quando se diz interesse publico, interesse do estado, é dizer que é interesse de uma
determinada categoria hegemônica da sociedade. Professor traz reflexão quanto a clientela do processo penal brasileiro. O
combate as drogas é pretexto para combater determinadas parcelas da sociedade, por ex.
Dentro da pública, existe: ação penal pública incondicionada e condicionada. A ação penal privada se divide em
exclusiva, personalíssima e subsidiária.
A petição inicial de uma ação penal pública é denúncia. O denunciante é o MP v. Denunciado. No caso da ação
penal privada, a petição inicial é a queixa, ou queixa crime. No polo ativo, o ofendido, que tecnicamente é chamado de
querelante. No polo passivo, o querelado.
Se sabe a natureza da ação penal no próprio tipo penal, se não tiver nada, ação penal pública incondicionada, essa
é a regra. Para ser condicionada a representação, tem que vir explícito. Se for de ação penal de iniciativa privada, vem
dizendo que só se processa mediante queixa.
No caso da incondicionada e condicionada publica permanece o principio da obrigatoriedade da ação penal
pública. Isso significa que assim como a autoridade policial, delegado, deve instaurar inquérito policial se estiver diante
de crime, em tese, pelo menos formalmente típico, crime de ação publica incondicionado, se o MP estiver diante de justa
causa para denúncia em ação penal pública, deverá oferecê-la. Se o MP estiver diante da prova da materialidade delitiva e
indícios suficientes de autoria ou participação em crime de ação pública, deve oferecer a denuncia. Deve oferecer a
denuncia contra todos os envolvidos: principio da indivisibilidade, sob pena de arquivamento implícito que não é aceito
na jurisprudência.
Por uma questão de política criminal, as vezes o legislador mitiga essa obrigatoriedade, flexibiliza essa
obrigatoriedade. Assim, com base na literatura processual penal, se diz que em alguns casos permanece o principio da
obrigatoriedade mitigada ou regrada. A obrigatoriedade regrada aparece no art. 76 da lei 9099/95: instituto conhecido
como transação penal. Transação penal: MP nos crimes de menor potencial ofensivo, para não ter processo (em troca de
nao oferecer a denuncia), oferece a possibilidade de o autor do fato cumprir pena alternativa. Como o rito da 9099 é mais
célere, rápido, simples, a ideia de que rito simples tende a proteger mais a vítima idosa (aqui, até quatro anos, outros
casos, crime de menor potencial ofensivo é aquele com pena máxima que não supera 2 anos). Isso é manifestação da
obrigatoriedade mitigada da ação penal pública. Aqui, MP está diante dos elementos para oferecer denuncia mas, por
autorização legal, não oferece. Isso é algo que pode ferir o princípio do devido processo legal, e da presunção de
inocência: teoricamente, não pode haver pena sem processo, que é o que ocorre. É mais uma pressão do que autonomia
para o acusado e seu defensor/a: embora tenha que ter aceitação, na pratica não é algo tranquilo. Advogado pode pedir
para anular o ato.
Colaboração premiada é outro caso. Com base na lei 12850, se o investigado revelar onde está a vítima com sua
integridade física preservada, ou revelar quem são e onde estão os outros envolvidos, ou revelar onde está o produto do
ilícito, o MP pode, num acordo, não oferecer a denuncia. Outro caso de obrigatoriedade mitigada. Acordo de leniência
também é, nos crimes econômicos: acordo feito com PJ para mesma finalidade. Outra: sursis processual, que consiste no
mP diante dos crimes cuja pena mínima, suspender o processo por período de 2 a 4 anos, quando a pena em abstrato não
supera 1 ano. É direito publico subjetivo do acusado: ter direito ao sursis processual, isso é para todo e qualquer crime,
não só os de menor potencial ofensivo.
Essas mitigações são faculdades, e não obrigatoriedades. Para quem entende que a transação penal é benefício
para o acusado, o MP deve oferecer a proposta de transação, por fazer parte do procedimento do JECRIM, é instituto
despenalizador da lei 9099, sob pena de o poder judiciário invocar o art. 28 por analogia, caso perceba que a proposta não
foi feita. Sursis: mesmo sentido, o MP deve oferecer a proposta, porque é instituto despenalizador, é direito subjetivo do
acusado. Se o MP não requerer, pode o juiz invocar o art. 28 por analogia.

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Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito
policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará
remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão
do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a
atender.
Na ação penal privada, que pode ser exclusiva, personalíssima e subsidiaria, diferenciamos a partir da legitimação
para oferecer a queixa/inicial. Quando a lei permite que o CADI ofereça a inicial no lugar no ofendido, chamamos de ação
penal privada exclusiva. Ofendido não oferece, o direito se transfere ao cônjuge ou companheiro, ascendente, descendente
ou irmão (CADI). É a regra na ação penal exclusiva: quando a vítima não pode, o direito se transfere para os
colegitimados nessa ordem sob pena de nulidade – primeiro cônjuge ou companheira, e dai em diante, isso por opção
legislativa, politica criminal. Quando não puder o CADI oferecer a inicial, é personalíssima: admite somente a vítima
como legitimada, o CADI não pode oferecer a queixa no lugar da vítima, só há um único exemplo no BR disso, a hipótese
do art. 236 do CP. Crime de ocultação de impedimento oficial ou induzimento a erro do casamento: omite impedimento,
induz cônjuge a erro. Esse crime só se processa mediante queixa do cônjuge enganado. Significa dizer que não admite a
colegitimidade do CADI. É a única hipótese de ação penal personalíssima.
Ação penal privada subsidiária da pública ocorre quando a vítima pode oferecer a queixa quando o MP se queda
inerte. Tem lugar na omissão na inércia do MP, que não oferece a denuncia no prazo. Esse prazo é o de 15 dias se solto, e
5 dias se preso. Admite denuncia do 16 dia, 17 dia, aplicando-se razoabilidade e proporcionalidade no caso concreto, mas
a lei assegura que a denuncia tem que ser nesse prazo de 5/15. Se o MP não oferece a denuncia nesse prazo, abre a
possibilidade de o particular oferecer subsidiariamente. Uma aça penal de iniciativa privada em crime de ação publica.
Então é possível queixa em crime de ação penal pública, nessa hipótese. O titular por excelência continua sendo o MP:
essa queixa subsidiaria se submete a decadência impropria. A queixa/representação se submetem a prazo decadencial, se o
prazo se escoa e não for oferecida a representação ou queixa pelo interessado, opera-se a decadência, e a decadência
fulminando o direito, extingue a punibilidade. O prazo é de 6 meses. Essa decadência é contada do momento que se sabe a
autoria do crime. É prazo de natureza material: ou seja, inclui o primeiro dia e exclui o último.
Prazo material x prazo processual. Processo penal: dias corridos, não é afetado pelo NCPC. Queixa crime
subsidiaria: nesse caso excepcional o marco de contagem é a inércia ministerial, a partir do dia que se tornou inerte, o
particular tem 6 meses para oferecer a queixa subsidiaria. A decadência própria é a da queixa exclusiva ou personalíssima,
a subsidiaria se submete a decadência imprópria. Decadência se opera somente para o particular: se a partir do dia que o
MP ficou inerte, omisso, se não ofereço a denuncia em 6 meses, decadência para mim – mas o crime é de ação pública, e
ação penal pública não se submete a decadência, no máximo prescrição. Decadência: extingue punibilidade só na ação
penal privada ou para o direito de representação na condicionada a representação. Por isso, decadência impropria: é uma
decadência suis generis, excepcional, atinge somente o particular na queixa subsidiaria, mas não atinge MP que a qualquer
tempo pode retomar ao processo, aditar queixa, agir com total liberdade, afinal, o crime é de ação pública. Se não houver
prescrição, que é o que atinge MP, o MP pode agir.
O particular acusa ao lado do MP nos crimes de ação pública. Nome dele: assistente de acusação, assistido por
advogado criminalista. Assim, advocacia criminal não é só para defender.
“Condicionada” a quê? Pode ser condicionada a representação ou requisição.
Enquanto o princípio é de obrigatoriedade na ação penal pública, na ação penal privada o princípio é da
disponibilidade: enquanto se o entende que o MP deve oferecer denuncia, é faculdade do particular oferecer queixa, que
pode inclusive dispor desse direito (ficar 6 meses sem fazer nada: decadência, dispôs do direito de ação). A
disponibilidade pode dar ensejo a decadência e a renúncia, que são institutos que também atingem a representação na ação
penal pública condicionada a representação: a situação ainda está na esfera particular, ainda não foi para o MP. Em uma
escala de gravidade, há fatos mais graves justificando a ação penal pública incondicionada. A condicionada vem em
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segundo lugar e, na outra extremidade, a de iniciativa privada. Assim, pesa de forma mais grave, severa, expressiva, o
interesse público, no crimes de ação penal pública de iniciativa incondicionada. Há interesse publico em tudo, mas nas
privadas, o interesse particular se sobrepõe.
Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - pela morte do agente;
II - pela anistia, graça ou indulto;
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;
VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;
VII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
VIII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.
A retratação do direito de representação é possível, art. 25 do CPP, tendo como limite o oferecimento da
denúncia.
Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.
Oferecida a denúncia nos crimes de ação publica condicionada, já foi, não pode mais se retratar, preclusão
temporal. Representar: igual a dizer que quer o processo. Pode se retratar até o oferecimento da denúncia. Entretanto, na
lei Maria da Penha, esse momento processual é outro: lei 11.340/06, art. 16, a mulher vítima de violência pode se retratar
até o recebimento da denúncia, tem mais tempo para se retratar, e inclusive essa retratação só pode ser feita em audiência
específica na presença do MP, que irá opinar.
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a
renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento
da denúncia e ouvido o Ministério Público.
A sequência de atos é: oferecida a denúncia, o poder judiciário recebe. O oferecimento vem antes do recebimento.
Há detalhe: é possível a retratação da retratação? Sim, até o mesmo prazo. E é possível a retratação da retratação da
retratação, tendo como prazo: o mesmo, até o oferecimento da denuncia no caso do CPP e no caso do recebimento quando
é maria da penha. Tem que se atentar para o prazo.
Representação dispensa qualquer formalidade, segundo entendimento jurisprudencial e doutrinário. Registrar
ocorrência policial já se entende como representação. Dispensa qualquer formalidade, inclusive advogado. Na lei Maria
da Penha: todos os crimes são de ação penal pública incondicionada? Não, a lesão corporal, nos casos de violência
doméstica e familiar contra a mulher, por força de entendimento do STJ, é incondicionada independente da especie, leve,
levíssima, grave. Mas existem crimes nesse contexto que dependem de representação, como ameaça. Art. 88 da lei 9.099:
passou a dizer que lesão corporal leve culposa é crime de ação penal pública condicionada a representação. O Supremo,
com situações em que a mulher vítima era submetida a lesões e depois morria, era de ação penal pública a representação, a
mulher ia a audiência e dizia que queria se retratar.

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Requisição: hipótese do ministro da justiça. Quando ouvimos falar em requisição, tem força de ordem. MP
requisitou a instauração do inquérito, poder judiciário requisitou a instauração do inquérito, requisitar informações ao
representado sob pena de responder de crime de desobediência – tem força de ordem, mas aqui, não. A requisição do
ministro da justiça é ato político que se submete aos parâmetros de conveniência e oportunidade do poder executivo, do
ministro da justiça. A requisição, assim como representação, não vincula o MP. MP não está obrigado a oferecer a
denúncia mediante representação do ofendido ou requisição do ministro da justiça. A requisição não tem prazo, mas a
doutrina, mais progressista, defende que o mesmo prazo da representação seja adotado para a requisição. Se a
conveniência é política, a qualquer tempo pode o ministro oferecer a requisição. Extraterritorialidade, contra honra de
chefe estrangeiro, etc. MP tem liberdade de não querer oferecer. Doutrina: seis meses também para requisição. Tem que
tomar cuidado com prova de concurso e OAB: se não dizer nada, aplica lei, que entende que não tem prazo. Se dizer de
acordo com doutrina, aí pode ser que entenda que tem prazo.

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