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Superior Tribunal de Justiça

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 104.307 - SP (2009/0053641-3)

RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ


AUTOR : RODRIGO ROSSI LINHARES
ADVOGADO : JOSE MARQUES DE SOUZA ARANHA
RÉU : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA DE ITAPEVA - SP
SUSCITANTE : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
SUSCITADO : JUÍZO DE DIREITO DA 3A AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR
DE SÃO PAULO - SP
EMENTA

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. HOMICÍDIO


CULPOSO. SOLDADO MILITAR EM SERVIÇO. DEVER DE AGIR
CONFIGURADO. OMISSÃO. CRIME CASTRENSE. ART. 9.º, INCISO II,
ALÍNEA C, DO CÓDIGO PENAL MILITAR.
1. A suposta omissão de policial militar no exercício de sua função e em
unidade sob a administração militar evidencia a existência de crime castrense, já
que estão presentes os pressupostos exigidos pelo art. 9.º, inciso II, alínea c, do
Código Penal Militar.
2. Conflito conhecido para declarar a competência da Justiça Castrense.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA


SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a
seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito
da 3ª Auditoria da Justiça Militar de São Paulo, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
Votaram com a Sra. Ministra Relatora os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Maria Thereza
de Assis Moura, Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do
TJ/SP) e Nilson Naves.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Felix Fischer e Napoleão Nunes
Maia Filho.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo Gallotti.

Brasília (DF), 24 de junho de 2009 (Data do Julgamento)

MINISTRA LAURITA VAZ


Relatora

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CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 104.307 - SP (2009/0053641-3)

AUTOR : RODRIGO ROSSI LINHARES


ADVOGADO : JOSE MARQUES DE SOUZA ARANHA
RÉU : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA DE ITAPEVA - SP
SUSCITANTE : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
SUSCITADO : JUÍZO DE DIREITO DA 3A AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR
DE SÃO PAULO - SP

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:


Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo em face do Juízo de Direito da 3.ª Auditoria da Justiça Militar de São Paulo
- SP.
Consta dos autos que foi instaurado inquérito militar para apurar a conduta do
soldado militar RODRIGO ROSSI LINHARES, que estava de serviço e deixou de enviar
viaturas em razão de telefonema dado pela civil Luiza Nei Machado (fl. 16), possibilitando a
morte de Rafael Antônio de Oliveira.
O Juízo de Direito da 3.ª Auditoria da Justiça Militar de São Paulo - SP, acolhendo
o parecer ministerial, declinou da competência para a Justiça Comum, sob o argumento de que a
conduta não se configuraria crime militar (fl. 17).
O feito foi encaminhado para o Juízo de Direito da 1.ª Vara da Comarca de
Itapeva/SP, que concedeu vista ao Ministério Público Estadual.
Assim, o Parquet ofereceu denúncia contra o soldado da Polícia Militar
RODRIGO ROSSI LINHARES, sob a acusação de não ter evitado, não obstante a sua
obrigação, o suicídio de Rafael Antônio de Oliveira, estando, portanto, incurso no art. 121, § 3.º,
c.c. o art. 13, § 2.º, alínea a, ambos do Código Penal.
Segundo a exordial acusatória, o soldado militar acusado era o responsável por
controlar e despachar as ligações recebidas pelo telefone de plantão n.º 190, o denominado
Centro de Atendimento e Despacho de Ocorrência - CAD, quando a mãe da vítima ligou e
avisou acerca de seu estado etílico e sua pretensão de se matar. Todavia, o denunciado não
realizou diligências. Posteriormente, após, a tentativa de enforcamento, o soldado teria
encaminhado uma viatura policial, no entanto, a vítima veio a falecer.
Ao receber os autos, o Juízo de Direito da 1.ª Vara da Comarca de Itapeva/SP
recebeu a denúncia e determinou a citação do réu (fl. 38).

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A defesa, por sua vez, impetrou habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, alegando a incompetência da Justiça Comum para processar e julgar o
feito.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deferiu a liminar, sobrestando o
andamento do processo até a decisão final.
Posteriormente, decidiu por suscitar o presente conflito, porquanto o crime teria
sido perpetrado por militar no exercício de sua função, enquadrando-se nas hipóteses do art. 9.º
do Código Penal Militar.
A Douta Subprocuradoria-Geral da República manifestou-se às fls. 57/58,
opinando pela competência da Justiça Castrense, em parecer assim ementado:
"CONFLITO DE COMPETÊNCIA. HOMICÍDIO CULPOSO.
SUPOSTA CONDUTA DELITUOSA CAPITULADA TANTO NA LEI PENAL
COMUM COMO NO CÓDIGO PENAL MILITAR E PRATICADA POR
MILITAR NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES POLICIAIS E EM UNIDADE
SOB A ADMINISTRAÇÃO MILITAR. REQUISITOS QUE EVIDENCIAM
TRATAR-SE DE CRIME CASTRENSE. PRECEDENTES DA SUPREMA
CORTE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR." (fl. 57)

É o relatório.

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EMENTA

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. HOMICÍDIO


CULPOSO. SOLDADO MILITAR EM SERVIÇO. DEVER DE AGIR
CONFIGURADO. OMISSÃO. CRIME CASTRENSE. ART. 9.º, INCISO II,
ALÍNEA C, DO CÓDIGO PENAL MILITAR.
1. A suposta omissão de policial militar no exercício de sua função e em
unidade sob a administração militar evidencia a existência de crime castrense, já
que estão presentes os pressupostos exigidos pelo art. 9.º, inciso II, alínea c, do
Código Penal Militar.
2. Conflito conhecido para declarar a competência da Justiça Castrense.
VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA):


A questão em análise é definir a competência para processar e julgar a conduta,
em tese, perpetrada por soldado da polícia militar, que no exercício de sua função de despachador
e controlador das ocorrências obtidas pelo número de telefone 190, teria sido omisso, ocasionando
a morte de civil.
Eis o que consta do relatório do inquérito penal militar, in verbis:
"Consta que em 23 de maio de 2007, por volta das 14h e 18 min, no
município de Itapeva/SP, o Sd PM RE 119536-A Rodrigo Possi Linhares, do
1.º Pel/PM, da 1.ª Cia/PM, do 54.º BPM/I, quando em serviço no Centro de
Atendimento e Despacho de Ocorrência - CAD, ao receber a solicitação via
fone 190 da Senhora Luiza Nei Machado, para conter seu filho Rafael
Antônio de Oliveira, que, embriagado, prometia tentar contra a própria vida
utilizando de uma corda para se enforcar, não despachou viatura para o
local, tampouco cientificou o Comandante de Grupo de Patrulha, somente
despachando a viatura quando por volta das 16 h e 00 min da mesma data,
após receber outra ligação da solicitante, informando que o suicídio havia
se consumado." (fl. 62)

Depreende-se do relatório que o soldado da polícia militar estava de serviço e


teria deixado de praticar atos, que lhe eram inerentes ao exercício de sua função de responsável
pela triagem das inúmeras ligações recebidas pelo Centro de Atendimento e Despacho de
Ocorrência - CAD e, em razão da omissão, o militar teria ocasionado o resultado danoso - morte
de vítima civil.
Conforme o art. 9.º, inciso II, alínea c, do Código Penal Militar, consideram-se
crimes militares, em tempo de paz, os perpetrados por militar em serviço ou atuando em razão da
função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à

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administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil.
Observa-se, portanto, que a conduta delituosa seria omissiva imprópria, conforme
o preconizado no art. 29, § 2.º, do Código Penal Militar:
"Art. 29. O resultado de que depende a existência do crime somente
é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão
sem a qual o resultado não teria ocorrido.
[...]
§ 2º A omissão é relevante como causa quando o omitente devia e
podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem tenha
por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; a quem, de outra
forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; e a quem, com
seu comportamento anterior, criou o risco de sua superveniência."

Do texto legal transcrito, vê-se que a omissão é penalmente relevante quando o


omitente devia e podia agir para evitar o resultado. Observa-se, portanto, que a conduta em
comento enquadraria-se, em tese, no disposto no art. 206, § 1.º, c.c. o art. 29, § 2.º, ambos do
Código Penal Militar, já que o soldado da polícia militar apresentava-se como garantidor, isto é,
devia agir para evitar o resultado, em virtude de ser o controlador e despachador das ligações
advindas do CAD. Entretanto, permaneceu omisso na função de deslocar as viaturas aos
chamados, o que, segundo os autos, teria ocasionado a morte de um civil.
Dessa forma, com base no relatório do inquérito militar e no fato de o denunciado
estar no exercício de sua função de controlador e despachador do CAD, evidencia-se a
competência da Justiça Militar, nos termos do art. 9.º, inciso II, alínea c, do Código Penal Militar,
para apurar o possível crime de homicídio culposo.
Ante o exposto, CONHEÇO do conflito e DECLARO competente o Juízo de
Direito da 3.ª Auditoria da Justiça Militar de São Paulo - SP.
É como voto.

MINISTRA LAURITA VAZ


Relatora

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA SEÇÃO

Número Registro: 2009/0053641-3 CC 104307 / SP


MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 1712008 2700120080020244 495642007 990081862000

EM MESA JULGADO: 24/06/2009

Relatora
Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro PAULO GALLOTTI
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. JULIETA E. FAJARDO C. DE ALBUQUERQUE
Secretária
Bela. VANILDE S. M. TRIGO DE LOUREIRO

AUTUAÇÃO
AUTOR : RODRIGO ROSSI LINHARES
ADVOGADO : JOSE MARQUES DE SOUZA ARANHA
RÉU : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA DE ITAPEVA - SP
SUSCITANTE : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
SUSCITADO : JUÍZO DE DIREITO DA 3A AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR DE SÃO
PAULO - SP

ASSUNTO: Penal - Crimes contra a Pessoa (art.121 a 154) - Crimes contra a vida - Homicídio ( art. 121 ) -
Culposo

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitado,
Juízo de Direito da 3ª Auditoria da Justiça Militar de São Paulo, nos termos do voto da Sra.
Ministra Relatora.
Votaram com a Sra. Ministra Relatora os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Maria
Thereza de Assis Moura, Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado
do TJ/SP) e Nilson Naves.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Felix Fischer e Napoleão Nunes Maia Filho.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo Gallotti.

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Superior Tribunal de Justiça

Brasília, 24 de junho de 2009

VANILDE S. M. TRIGO DE LOUREIRO


Secretária

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