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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais


Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

OBS: Na jurisprudência citada, sempre que não houver indicação do tribunal,


entenda-se que é do Superior Tribunal de Justiça.

Índices
Ementas – ordem alfabética
Ementas – ordem numérica
Índice do “CD”

Tese 433
HOMICÍDIO – QUALIFICADO – PAGA OU PROMESSA DE
RECOMPENSA – COMUNICAÇÃO AO MANDANTE.
A qualificadora da paga ou promessa de recompensa (artigo 121,
§2º, inciso I, primeira parte, do Código Penal) comunica-se ao
mandante.
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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE


DA SEÇÃO CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO
ESTADO DE SÃO PAULO

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO,


nos autos da Apelação Criminal n. 0007264-93.2013.8.26.0590, da
Comarca de São Vicente, em que é apelante F. F. L. , vem perante
Vossa Excelência, com fundamento no artigo 105, III, alíneas “a” e
“c”, da Constituição da República, artigo 1.029, caput, e § único do
Código de Processo Civil e artigo 255, § 2o, do RISTJ, e interpor
RECURSO ESPECIAL para o Colendo Superior Tribunal de Justiça,
contra o v. acórdão de fls. 466/472, da 16ª Câmara Criminal do E.
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, pelos motivos adiante
aduzidos:

1. RESUMO DOS AUTOS

F. F. L. foi pronunciado por infração ao artigo 121, §


2º, I, do Código Penal, porque no dia 19 de março de 1995, na cidade
de São Vicente, concorreu, como mandante e mediante prévio
pagamento em dinheiro, para o homicídio praticado por José da Silva
Martiniano Filho contra a vítima Valdemir Pereira Lopes.
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Segundo o apurado, F. F. L. encomendou a morte da


vítima, pagando antecipadamente ao executor José da Silva
Martiniano Filho a quantia de R$ 450,00, bem como fornecendo-lhe
a arma para a execução do crime.

O acusado recorreu da decisão de pronúncia, tendo a


C. 16ª Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, por
votação unânime, acolhido o voto do relator, Des. Otávio de Almeida
Toledo, e negado provimento ao recurso, mantendo a decisão
recorrida, inclusive a qualificadora (fls. 353/357).

Levado a julgamento pelo Tribunal do Júri, o Conselho


de Sentença o condenou por infração ao artigo 121, § 2º, I, do Código
Penal, tendo o Juízo fixado a pena de 12 anos de reclusão, no regime
inicial fechado (fls. 426/427).

Inconformado, o acusado apelou pleiteando a


anulação do julgamento porque a decisão do Conselho de Sentença é
manifestamente contrária à prova dos autos (fls. 438/445).

A mesma C. 16ª Câmara de Direito Criminal do E.


Tribunal de Justiça de São Paulo, por votação unânime, deu
provimento ao recurso para "afastar a qualificadora, anular o
julgamento e determinar a realização de outro, por homicídio
simples" ao argumento de que a qualificadora da paga ou promessa
de recompensa não se comunica entre o mandante e o executor do
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homicídio, em acórdão que foi relatado pelo Des. OTÁVIO DE


ALMEIDA TOLEDO, ora transcrito:

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0007264-
93.2013.8.26.0590, da Comarca de São Vicente, em que é apelante FLAVIO
FAGUNDES DE LIRA, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO
PAULO.
ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de
Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao apelo defensivo
para anular o julgamento do Tribunal do Júri a fim de que outro seja realizado por
homicídio simples, afastada, no caso, a qualificadora do motivo torpe. v.u.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores
OTÁVIO DE ALMEIDA TOLEDO (Presidente), OSNI PEREIRA E BORGES
PEREIRA.
São Paulo, 14 de fevereiro de 2017.
OTÁVIO DE ALMEIDA TOLEDO
RELATOR
Assinatura Eletrônica

Apelação nº 0007264-93.2013.8.26.0590
Apelante: Flavio Fagundes de Lira
Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo
Corréus: Jose da Silva Martiniano Filho, Jose Luiz Victorino e Antonio Jose Silva
Martiniano
Comarca: São Vicente
Voto nº 27.081

JÚRI. Homicídio qualificado pelo motivo torpe, praticado


mediante paga. Imputação de participação do apelante como
suposto mandante. Execução por terceiro. Conduta de
encomendar a morte do desafeto, pagando R$450,00 e fornecendo
a arma ao autor dos disparos. Pretendida anulação do julgamento
por ser o veredicto manifestamente contrário à prova dos autos.
Denúncia e pronúncia por motivo torpe, consistente no
pagamento de recompensa em dinheiro. Qualificadora de
natureza subjetiva. Cabimento em relação à conduta do executor,
não contra o mandante. Maior reprovabilidade da conduta pelo
motivo mercenário. Motivo torpe não abrangido pela imputação
dirigida ao apelante. Ausência de descrição de circunstância
qualificadora em desfavor do corréu FLÁVIO. Apelo provido
para anular o julgamento e determinar a realização de outro, em
que a imputação restringe-se a homicídio simples.

1. F. F. L. (RG nº 24.271.183-2-SSP/SP) foi pronunciado e, ao final


do julgamento no plenário, condenado, pela 1ª Vara do Júri da Comarca de São Vicente,
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por infração aos artigos 121, § 2º, inciso I, do Código Penal, à pena de 12 (doze) anos de
reclusão, no regime inicial fechado, porque, no dia 19 de março de 1995, por volta de
meia-noite, na rua Caetano Cartamove, na comarca sobredita, teria concorrido, como
mandante, para o homicídio de Valdemir Pereira Lopes, praticado por terceiro (corréu
José da Silva Martiniano Filho), mediante disparos de arma de fogo, tendo este sido
denunciado, inclusive, pela qualificadora do motivo torpe, porque praticou o delito
mediante paga, já que FLAVIO ter-lhe-ia encomendado a morte da vítima pagando-lhe
antecipadamente R$450,00, bem como fornecendo-lhe a arma de fogo.
Inconformado com a r. sentença de fls. 426/427, apelou, com base no
artigo 593, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal, pugnando pela anulação
do julgamento. Sustenta, em razões apresentadas por Defensor dativo, que a decisão dos
jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, pois não haveria prova
testemunhal a infirmar a negativa de participação do acusado no delito praticado por
terceiro. Alega, ainda, que o veredito apoia-se tão somente em boatos e que o artigo 155
do mencionado código veda a condenação com base em prova colhida exclusivamente no
inquérito policial (fls. 439/445).
O recurso foi contrariado a fls. 447/450.
A douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer subscrito pela Drª.
Claudia Aparecida Jack Garcia Nunes de Souza, manifestou-se pelo desprovimento (fls.
455/458).
É o relatório.
2. De rigor a anulação do julgamento, mas não pelos argumentos
invocados pelo Defensor nomeado.
A materialidade do crime restou demonstrada pelo laudo de exame
necroscópico de fls. 51/v e pelos documentos de fls. 124/126, consistentes na ilustração
das regiões em que o corpo da vítima foi atingido pelos disparos de arma de fogo.
A arma também foi apreendida (auto de fls. 27) e devidamente
periciada (laudo de fls. 87/88).
No que diz respeito à participação de FLÁVIO como um dos
mandantes do delito a imputação atribui-lhe a conduta de encomendar a morte da vítima
do crime a prova é a mesma quando da prolação da decisão de pronúncia, pois nenhuma
testemunha foi ouvida em plenário e o próprio apelante encontrava-se foragido e não
compareceu para ser interrogado.
A imputação se funda, basicamente, na confissão do corréu João Luis
Victorino na fase de inquérito, oportunidade em que delatou o apelante. FLAVIO negou
participação, embora tenha admitido, também na polícia, que tinha ciência de que os
executores tomariam uma providência drástica em relação à vítima após os relatos das
desavenças que envolviam sua pessoa, ora apelante, e o corréu João Luis. FLAVIO,
foragido, se tornou revel em juízo.
Não houve testemunha presencial.
Alguns familiares da vítima e moradores do bairro foram ouvidos e
disseram que o comentário na época era no sentido de que os mandantes seriam FLÁVIO
e João Luis, que mantinham entre si relação homoafetiva e pretendiam se vingar da
vítima, razão porque teriam contratado o corréu José da Silva Martiniano Filho,
denunciado como o autor dos tiros, para matar Valdemir.
Duas testemunhas, Luciano da Conceição e Carlos Eduardo Lima, a
primeira também no sumário de culpa, afirmaram ter ouvido do corréu João Luis, depois
do crime, numa discussão, que já havia mandado matar um no bar onde ocorreram os
fatos e não lhe custaria fazer de novo (fls. 25/v, 103/v e 208/211).
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Diante desse conjunto probatório, não obstante a coexistência das


versões acusatória e defensiva, o Conselho de Sentença optou por uma delas, a que
entendeu mais aceitável, aquela, na verdade, que, com maior credibilidade, emerge do
conjunto probatório produzido ao longo da persecução penal.
Não há, pois, nessa hipótese, afronta à evidência dos autos.
Decisão manifestamente contrária à prova produzida, que justificaria,
em tese, a anulação do julgamento, é apenas aquela proferida em completo desabrigo de
qualquer interpretação razoável, o que não ocorreu na espécie.
O veredicto do Júri, lastreia-se, portanto, em prova ou indícios
concretos colhidos, inclusive, durante o sumário de culpa, não se aplicando, portanto, a
regra do artigo 155 do Código de Processo Penal.
Verifico, no entanto, irregularidade insanável no julgamento ora
combatido.
Extrai-se da denúncia a imputação contra José da Silva Martiniano
Filho, consistente na execução do homicídio qualificado pelo motivo torpe, tendo em
vista a motivação mercenária, já que foi contratado para matar a vítima e o fez
estimulado pelo pagamento prévio de R$450,00, valor complementado pela arma
utilizada no assassinato, que lhe foi fornecida a título definitivo. Ele, José, sim, foi
denunciado por infração ao artigo 121, § 2º, inciso I, do Código Penal, pelo motivo torpe,
repita-se, mercenário.
Já contra FLÁVIO e João Luiz Victorino, diferentemente, ao que se
percebe da narrativa inicial, acolhida na pronúncia, não consta qualquer circunstância
qualificadora adicional, não podendo eles, ou FLÁVIO, ora apelante, responderem pelo
homicídio mercenário, atribuível apenas a quem recebe o dinheiro para matar, não a
quem paga. O mandante, imputação que pesa contra FLÁVIO, pode ou não estar
motivado pela torpeza ou outra motivação reprovável. No caso, a denúncia não imputa
nem a pronúncia reconhece formalmente algum motivo torpe ou fútil, nem mesmo outra
circunstância qualificadora de natureza subjetiva ou objetiva.
Houve, portanto, evidente excesso ou equívoco na imputação.
Segundo Luiz Regis Prado, “para reconhecimento da qualificadora exige-se que a paga
ou promessa de recompensa seja o motivo que desencadeou a resolução delitiva, embora
não seja necessária a efetiva obtenção da vantagem visada. Predomina o entendimento
segundo o qual a recompensa deve ter, para a configuração da qualificadora, conteúdo
econômico”. Prossegue afirmando que “a paga ou a promessa de recompensa requerem
a existência de dois sujeitos: aquele que oferece o pagamento ou recompensa e aquele
que executa o delito por tais motivos. A ratio da qualificadora é o móvel de lucro,
considerado especialmente reprovável. Logo, incabível a aplicação da qualificadora
àquele que oferece paga ou recompensa, visto que o agente atua imbuído de motivação
diversa, sendo possível, inclusive, que o faça por motivo nobre” (in “Comentários ao
Código Penal”, Ed. RT, 9ª edição, 2014, p. 489).
Enfim, a anulação do julgamento é medida de rigor por não constar da
denúncia ou mesmo da pronúncia a descrição explícita de qualquer circunstância de
natureza objetiva ou subjetiva que qualifique o homicídio supostamente praticado pelo
apelante.
Registro que não há falar em, na espécie, em desclassificação,
providência cabível apenas quando a imputação abarca efetivamente alguma
qualificadora e ela não resta comprovada. Houve, no caso, evidente excesso ou equívoco,
pois a qualificadora do motivo torpe por paga não se comunica entre o mandante e o
executor do homicídio.
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3. Por tais fundamentos, pelo meu voto, dou provimento ao apelo


defensivo para anular o julgamento do Tribunal do Júri a fim de que outro seja realizado
por homicídio simples, afastada, no caso, a qualificadora do motivo torpe.
OTÁVIO DE ALMEIDA TOLEDO
Relator

Ao afastar a qualificadora do motivo torpe (paga)


imputada ao mandante, que pagou quantia em dinheiro ao
executor, ao argumento de que ela não se comunica ao mandante, a
douta Turma Julgadora (que havia mantido a qualificadora na decisão
confirmatória da pronúncia – fls. 353), além de contrariar o disposto
no artigo 121, § 2º, I, do Código Penal, divergiu da orientação do
Colendo Superior Tribunal de Justiça, autorizando, pois, a
interposição deste recurso, com amparo nas alíneas “a” e “c” do
permissivo constitucional, com a seguinte tese jurídica: A qualificadora
da paga ou promessa de recompensa (art. 121, § 2º. I, primeira parte), é
elementar do delito e comunica-se ao mandante.

2. NEGATIVA DE VIGÊNCIA DE LEI FEDERAL (art. 121, § 2º, I,


do Código Penal).

Segundo conhecida lição do saudoso Ministro


ALIOMAR BALEEIRO, perfeitamente ajustável à hipótese em exame:
"denega-se vigência de lei não só quando se diz que
esta não está em vigor, mas também quando se decide em sentido
diametralmente oposto ao que nela está expresso e claro" (RTJ
48/788).
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Ou, no mesmo sentido, “... equivale negar vigência o


fato de o julgador negar aplicação a dispositivo específico, único
aplicável à hipótese, quer ignorando-o, quer aplicando outro
inadequado” (REsp 63.816, RTJ 51/126).

Dispõe o artigo 121 do Código Penal:

Homicídio simples

Art. 121. Matar alguem:

(...)

Homicídio qualificado

§ 2° Se o homicídio é cometido:

I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por


outro motivo torpe;

(...)

Comentando sobre a natureza das qualificadoras do


homicídio, ensina NELSON HUNGRIA:

"No § 2º do art. 121, apresenta-se como indica a respectiva


rubriga lateral, o homicídio qualificado, isto é, o homicídio
acompanhado de alguma dentre certas circunstâncias
agravantes que a lei, no tocante a essa entidade criminal, toma
em especial consideração, para o efeito de majoração a priori
da pena, dado o maior grau de criminosidade que revelam. Não
se dá mudança do título do crime, nem da espécie ou qualidade
da pena; mas esta é independente (cominada dentro de novos
limites) e quantitativamente superior à pena ordinária ou
editada in abstracto para o homicídio simples. De simples
accidentalia dos crimes em geral, tais circunstâncias passam a
ser essentialia ou elementos constitutivos do homicídio, na
sua forma qualificada. Chamadas agravantes qualificativas ou
elementares, estão elas alinhadas nos incisos ns. I a V do
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parágrafo acima citado" (Comentários ao Código Penal,


Forense, vol. V, 1958, p. 163).

No mesmo sentido, a lição de GUILHERME DE SOUZA


NUCCI:
"19. Homicídio qualificado: é o homicídio praticado com
circunstâncias legais que integram o tipo penal incriminador,
alterando para mais a faixa de fixação da pena" (Código Penal
Comentado, 7. ed., RT, 2007, p. 546).

E, sendo as qualificadoras elementares do crime,


comunicam-se a terceiros, nos termos do artigo 30 do Código Penal.

Comentando sobre a qualificadora da paga ou


promessa de recompensa ser aplicada ao contratante e contratado,
afirma NEY MOURA TELES:

"Discute-se se qualificadora alcançaria tanto o autor executor


do procedimento típico, quanto o autor intelectual, o que
promete a recompensa ou que efetua o pagamento, dizendo
uma parte da doutrina que sim, uma vez que tanto a conduta
de um quanto a do outro merecem a mesma reprovação social
(...) A descrição típica do inciso I do § 2º do art. 121 não deve
ser lida apenas em relação ao executor, mas também ao
mandante, independentemente de se considerá-la, ou não,
circunstância elementar do tipo de homicídio. É que, ao
descrevê-la como "mediante paga ou promessa de
recompensa", a norma buscou alcançar a totalidade de um
contrato bilateral que, por sua própria natureza jurídica,
envolve direitos e obrigações para ambas as partes, e não
apenas uma motivação pessoal esclusive do contratado. O
escopo da norma não é, simplesmente, o de reprovar mais
severamente o fim de lucro que moveu o executor, mas,
também e antes, a conduta de ambos, executor e mandante:
celebrarem um pacto cujo objeto é a destruição de uma vida
humana. Ou seja, um contrato entre duas pessoas que visa à
destribuição do bem jurídico mais importante. Um porque
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encomendou a morte de um homem, o outro porque aceitou a


encomenda. Ambos, igualmente, tiveram motivação torpe,
abjeta, repugnante. O primeiro porque, dispondo de dinheiro,
sentiu-se à vontade para buscar alcançar a destruiçpão de uma
vida humana, por mãos alheias. O outro porque, simplesmente
por dinheiro, não teve qualquer condescendência com a
existência de um semelhante. Se a vontade da lei fosse a de
considerar qualificada apenas a atitude do executor, não
utilizaria a expressão "mediante paga ou promessa de
recompensa", mas escolheria outra fórmula específica,
exclusiva ou própria do executor, como "para (ou com o fim de)
obter paga ou promessa de recompensa". A expressão
mediante significa aquilo que medeia. O verbo mediar significa
ficar no meio de dois pontos, no espaço, ou de duas épocas, no
tempo. Assim, ao utilizar essa expressão, a lei vinculou as duas
partes, o mandante e o executor. A paga ou a promessa de
recompensa é o elo que liga as duas pessoas, é o que medeia as
duas vontades e suas motivações. Logo, o que medeia duas
condutas a ambas se agrega, razão porque ambos praticam
homicídio qualificado" (Direito Penal, v. II, Ed. Atlas, 2004, p.
62-64, grifos no original)

No mesmo sentido:

"A paga difere da promessa de recompensa. Na paga, o


recebimento é prévio, o que não ocorre na promessa de
recompensa. Os dois sujeitos respondem pela forma
qualificada: o que executou a conduta e o que pagou ou
prometeu a recompensa (DAMÁSIO E. DE JESUS, Direito Penal,
2. v., Parte Especial, Saraiva, 2005, p. 67).

“Reclama, isso sim, como crime de concurso necessário que é, o


concurso de pelo menos duas pessoas, uma que oferece ou
promete o prêmio ou recompensa, e outra que mata para
recebê-lo. A circunstância qualificadora alcança a ambos.
Homicídio qualificado: a comissão do homicídio mediante paga,
sendo elemento do tipo qualificado, é circunstância que não
atinge exclusivamente o accipiens, mas também o solvens ou
qualquer outro coautor: precedentes” (RT 722/578; no mesmo
sentido, RT 807/588, 811/612)” (JOSÉ HENRIQUE PIERANGELI,
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Código Penal comentado artigo por artigo. Atualizado por


Maria Aparecida Pierangeli Borelli Thomaz, 1. ed. Editora
Verbatin, 2013, p. 272/273).

"Responde pelo crime qualificado não só quem recebe, mas


também o mandante, o que paga ou promete a recompensa"
(JÚLIO FABBRINI MIRABETE; RENATO N. FABBRINI, Manual de
Direito Penal, v. II, 25. ed., Atlas, 2007, p. 37).

" Respondem pelo crime qualificado o que praticou a conduta e


o que pagou ou prometeu a recompensa" (CEZAR ROBERTO
BITENCOURT, Tratado de Direito Penal, Parte Especial, v. 2, 7.
ed., Saraiva, 2007, p. 54).

Nesse sentido a jurisprudência do C. Superior Tribunal


de Justiça:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.


RECURSO DO ACUSADO. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INDEFERIMENTO DE INTERROGATÓRIO DE CORRÉUS.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PREJUÍZO NÃO
DEMONSTRADO. RECURSO DESPROVIDO. 1. O interrogatório
judicial é uma peça de defesa, não se podendo sujeitar o
interrogado às perguntas de advogado de corréu, no caso de
concurso de agentes, por falta de amparo legal e sob pena de
criar constrangimento para os interrogados. Precedentes. 2.
No processo penal vigora o princípio geral de que somente se
proclama a nulidade de um ato processual quando há efetivo
prejuízo, nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal
e do enunciado da Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal, o
que não ficou demonstrado na hipótese. 3. Recurso
especial de Ricardo Abdulmassih desprovido.
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL.
COMUNICAÇÃO DA QUALIFICADORA DE PROMESSA DE
PAGA AO AUTOR INTELECTUAL DO DELITO. POSSIBILIDADE.
AFASTAMENTO DA REFERIDA QUALIFICADORA PELO
TRIBUNAL DO JÚRI. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO. NULIDADE
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INEXISTENTE. PREJUÍZO À DEFESA NÃO DEMONSTRADO.


IRREGULARIDADE NÃO SUSCITADA NO MOMENTO
OPORTUNO. PRECLUSÃO. RECURSO ESPECIAL DO
MINISTÉRIO PÚBLICO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA
PARTE, PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta
Corte, no homicídio mercenário, a qualificadora da paga
ou promessa de recompensa é elementar do tipo
qualificado e se estende ao mandante e ao executor. 2.
Não há falar em contradição das respostas dadas pelos jurados
com entendimento jurisprudencial ou doutrinário. Já decidiu
esta Corte que a rejeição pelos jurados da qualificadora
de promessa de recompensa não afasta a conclusão do
Conselho de Sentença de que o paciente concorreu para a
prática do delito como mandante (HC 122.983/MG, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma,
julgado em 23/08/2011, DJe 08/09/2011). 3. Eventuais
irregularidades da quesitação devem ser arguidas no
momento oportuno, sob pena de preclusão. Precedentes. 4.
Recurso do Ministério Público Estadual parcialmente conhecido
e, nessa extensão, provido, para afastar a nulidade
reconhecida e a necessidade de submissão do acusado a novo
julgamento, determinando que o Tribunal a quo julgue o
mérito das apelações como entender de direito (REsp
1201548/MG, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA
FONSECA, QUINTA TURMA, Data do Julgamento, 22/11/2016,
DJe 07/12/2016).

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. SENTENÇA DE


IMPRONÚNCIA. SURGIMENTO DE NOVAS PROVAS. 1)
REABERTURA DAS INVESTIGAÇÕES. NULIDADES. SUPRESSÃO
DE INSTÂNCIA. 2) CONDENAÇÃO BASEADA EXCLUSIVAMENTE
EM DEPOIMENTO PRESTADO NA ESFERA POLICIAL E
RETIFICADO EM JUÍZO. INOCORRÊNCIA. 3) AUTORIA E
MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. DESCONSTITUIÇÃO
INADMISSÍVEL. NECESSÁRIO REVOLVIMENTO FÁTICO-
PROBATÓRIO. 4) QUALIFICADORAS. CRIME MEDIANTE PAGA.
ELEMENTAR DO TIPO. COMUNICAÇÃO AO AUTOR
INTELECTUAL. DELITO DE EMBOSCADA. COMUNICABILIDADE
QUE DEPENDE DA ESFERA DE CONHECIMENTO DO MANDANTE.
DESCONSTITUIÇÃO QUE EXIGE REVOLVIMENTO FÁTICO-
PROBATÓRIO. ORDEM DENEGADA. - As alegações de diversas
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nulidades trazidas aos autos, especialmente o depoimento de


testemunha colhido na esfera policial e juntado aos autos sem
o conhecimento da defesa, a realização de perícia sem
intimação para que a defesa apresentasse quesitos e a quebra
do sigilo telefônico sem decisão judicial fundamentada não
foram levadas à apreciação do Tribunal a quo. Assim, não cabe
a este Superior Tribunal de Justiça conhecer das referidas
matérias, não analisadas pela Corte de origem, sob pena de se
incidir em indevida supressão de instância. - O Tribunal de
origem, ao concluir que a autoria do paciente estava
demonstrada, utilizou-se não apenas do depoimento prestado
em sede policial e retificado em Juízo, mas também de outros
elementos de prova que deram respaldo à condenação, não
havendo falar, portanto, em afronta ao art. 155 do Código de
Processo Penal - CPP, que veda a condenação baseada
exclusivamente em depoimento prestado em sede
inquisitorial, não repetida em juízo e não submetida ao crivo do
contraditório e ampla defesa. - Tendo o Tribunal de origem,
com base no acervo probatório colhido, concluído de forma
concretamente fundamentada que restaram demonstradas
tanto a autoria quanto a materialidade delitivas, não cabe a
esta Corte Superior a desconstituição da referida condenação,
ante o necessário revolvimento fático-probatório inadmissível
na via estreita do habeas corpus. - A qualificadora do
homicídio mediante paga é elementar do tipo penal,
estendendo-se também ao mandante do delito. Assim, não há
falar em existência de constrangimento ilegal na comunicação
ao paciente, autor intelectual do crime, da qualificadora
prevista no inciso I, do § 2º do art. 121 do Código Penal - CP.
- Quanto à qualificadora da emboscada, o posicionamento
desta Corte é no sentido de que, tratando-se de circunstância
objetiva que diz respeito à forma de execução do delito, pode
ou não se comunicar entre os agentes, a depender da entrada
na sua esfera de conhecimento. Nesse contexto, a análise da
esfera do domínio do fato do paciente, quanto à referida
qualificadora, exigiria o revolvimento fático-probatório, sendo,
portanto, inadmissível seu conhecimento na via estreita do
remédio constitucional. Ordem denegada (HC 291604/PI,
Relator Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, Julgamento
01/10/2015, DJe 22/10/2015).
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

No mesmo sentido, a posição do C. Supremo Tribunal


Federal:
E M E N T A - I. Homicidio: qualificativa de cometimento do
crime mediante paga ou promessa de recompensa que,
embora relativa ao mandatario, se comunica ao mandante. II.
Júri: quesitos: pretensa nulidade que, se existente, nenhum
prejuizo causou a defesa, pois relativo o quesito impugnado a
segunda qualificadora do homicidio, cuja pena foi fixada no
minimo legal. III. Júri: quesito não obrigatorio: menor
importancia da participação de co-réu, não alegada pela defesa
(HC 69940 / RJ - Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE,
Julgamento: 09/03/1993, Primeira Turma, DJ 02-04-1993
PP-05621 EMENT VOL-01698-06 PP-01127).

Assim, ao decidir pelo afastamento da qualificadora do


artigo 121, § 2º, I, do Código Penal em relação ao mandante do
crime, que pagou quantia em dinheiro para que o delito fosse
executado, o v. acórdão recorrido negou vigência ou mesmo
contrariou citado preceito infraconstitucional.

3. DO DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no


sentido de que, no homicídio, a qualificadora da paga ou promessa
de recompensa é elementar do delito e, por isso, se comunica ao
contratante.

Confira-se:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO


ESPECIAL. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE.
INOCORRÊNCIA. DUPLO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. NÃO
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

VINCULAÇÃO DA CORTE AD QUEM. COMUNICAÇÃO DA


QUALIFICADORA DE PROMESSA DE PAGA AO AUTOR
INTELECTUAL. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA
DA DISSIMULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA OBJETIVA. CABIMENTO.
INGRESSO NO ESPECTRO DE CONHECIMENTO DO COAUTOR.
NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO PROBATÓRIO.
INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE
NEGA PROVIMENTO. 1. Não há se falar em ofensa ao
princípio da colegialidade quando o não provimento do agravo
de instrumento, de forma monocrática, encontra-se dentro
das atribuições do relator, e não causa qualquer gravame
àquele que responde ao processo criminal. 2. O juízo de
admissibilidade do recurso especial está sujeito a duplo
controle, razão pela qual a aferição de seus requisitos pela
instância ordinária não vincula esta Corte 3. No homicídio
mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de
recompensa é elementar do tipo qualificado e se estende ao
mandante e ao executor. 4. A qualificadora referente à
dissimulação, por ser circunstância objetiva referente ao modo
de execução do crime, pode se comunicar ao corréu, desde
que tenha entrado em sua esfera de conhecimento. Análise
que demanda revolvimento do arcabouço probatório.
Incidência do enunciado nº 7 desta Corte. 5. Agravo
regimental a que se nega provimento (AgRg no REsp 912491/DF
Relator Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, Julgamento 09/11/2010, DJe 29/11/2010).

HOMICÍDIO MEDIANTE PAGA. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORAS.


INVIABILIDADE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA.
COMUNICABILIDADE. RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A
DEFESA DA VÍTIMA. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-
PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. No homicídio mercenário,
a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é
elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao
executor. 2. Para se excluir a qualificadora do recurso que
impossibilitou a defesa da vítima é indispensável o
revolvimento do material fático-probatório, o que é vedado na
via do habeas corpus. 3. Ordem denegada (HC 99144/RJ
Relator Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, Julgamento
04/11/2008, DJe 09/12/2008).
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

3.1. DECISÃO PARADIGMA

No julgamento do Recurso Especial n. 1.262.706/MG,


rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª Turma, j. 22.11.2016,
DJe 07.12.2016, acórdão ora ofertado como paradigma, decidiu o C.
Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.262.706 - MG (2011⁄0069661-9)


RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
RECORRENTE : JOSÉ DOS SANTOS COUTINHO
ADVOGADO : NILVIO DE OLIVEIRA BATISTA E OUTRO(S) - MG008260B
RECORRIDO : OS MESMOS

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO DO


ACUSADO. CERCEAMENTO DE DEFESA. TRIBUNAL DO JÚRI. NULIDADE DE
QUESITO. CONTRADIÇÃO OU PERPLEXIDADE INEXISTENTES.
IRREGULARIDADE NÃO SUSCITADA NO MOMENTO OPORTUNO.
PRECLUSÃO. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO.

1. Este Superior Tribunal de Justiça é firme na compreensão de que as possíveis


irregularidades na quesitação devem ser arguidas no momento oportuno, devendo constar
em ata de julgamento, sob pena de preclusão, nos termos do artigo 571, inciso VIII, do
Código de Processo Penal.

2. No processo penal vigora o princípio geral de que somente se proclama a nulidade de


um ato processual quando há efetivo prejuízo, nos termos do art. 563 do Código de
Processo Penal e do enunciado da Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal, o que não
restou demonstrado na hipótese.

3.Recurso especial de José dos Santos Coutinho desprovido.

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO DO


MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. COMUNICAÇÃO DA QUALIFICADORA DE
PROMESSA DE PAGA AO AUTOR INTELECTUAL DO DELITO. POSSIBILIDADE.
AFASTAMENTO DA REFERIDA QUALIFICADORA PELO TRIBUNAL DO JÚRI.
AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO. NULIDADE INEXISTENTE. PREJUÍZO À
DEFESA NÃO DEMONSTRADO. IRREGULARIDADE NÃO SUSCITADA NO
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

MOMENTO OPORTUNO. PRECLUSÃO. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO


PÚBLICO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, PROVIDO.

1.Nos termos da jurisprudência desta Corte, no homicídio mercenário, a qualificadora da


paga ou promessa de recompensa é elementar do tipo qualificado e se estende ao
mandante e ao executor.

2.Não há falar em contradição das respostas dadas pelos jurados com entendimento
jurisprudencial ou doutrinário. Já decidiu esta Corte que a rejeição pelos jurados da
qualificadora de promessa de recompensa não afasta a conclusão do Conselho de
Sentença de que o paciente concorreu para a prática do delito como mandante (HC
122.983⁄MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,
julgado em 23⁄08⁄2011, DJe 08⁄09⁄2011)

3.Eventuais irregularidades da quesitação devem ser arguidas no momento oportuno, sob


pena de preclusão. Precedentes.

4.Recurso do Ministério Público Estadual parcialmente conhecido e, nessa extensão,


provido, para afastar a nulidade reconhecida e a necessidade de submissão do acusado a
novo julgamento, determinando que o Tribunal a quo prossiga no julgamento das
apelações, como entender de direito.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento,
por unanimidade, conheceu do recurso de JOSÉ DOS SANTOS COUTINHO, mas lhe
negar provimento e conhecer parcialmente do recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO DO
ESTADO DE MINAS GERAIS e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer
e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 22 de novembro de 2016(Data do Julgamento)
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA (Relator):

Cuida-se de recursos especiais interpostos por JOSÉ DOS SANTOS COUTINHO e pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS contra acórdão proferido
pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado (e-STJ fl. 2.001):

APELAÇÃO CRIMINAL - TRIBUNAL DO JÚRI - HOMICÍDIO QUALIFICADO -


PRELIMINAR DEFENSIVA - NULIDADE PELA REDAÇÃO DO QUESITO ACERCA
DA PARTICIPAÇÃO DO APELANTE - INOCORRÊNCIA - PRECLUSÃO - REJEIÇÃO -
MÉRITO - CASSAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - VERSÃO EXISTENTE NOS AUTOS ?
INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 28 DO GRUPO DE CÂMARAS CRIMINAIS -
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

INCONFORMISMO MINISTERIAL - APLICAÇÃO DA PENA-BASE - MAJORAÇÃO


IMPOSTA - RECONHECIMENTO DE DUAS QUALIFICADORAS, ALIADO À
DESFAVORABILIDADE DE ALGUMAS DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS -
RECURSOS CONHECIDOS, DESPROVIDO O DEFENSIVO E PROVIDO
PARCIALMENTE O MINISTERIAL, REJEITADA A PRELIMINAR LEVANTADA PELA
DEFESA.

José dos Santos Coutinho, em seu recurso especial, fundado no art. 105, inciso III, alíneas
a e c, da Constituição Federal, alega maltrato aos arts. 484, VI, e 564 do CPP, além de
divergência jurisprudencial.

Sustenta ser nulo o 3º quesito, pois foi usada a expressão pistoleiros, no plural, tratando-
se de apenas um executor, sendo que o outro apenas deu fuga ao primeiro, o que
certamente causou perplexidade aos jurados, pois foram consultados sobre duas situações
(execução e fuga) em apenas um quesito. Afirma que não há falar em preclusão, quando
se trata de nulidade absoluta. Requer a declaração da nulidade do quesito e do
julgamento realizado.

Já o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, amparado na alínea a do permissivo


constitucional, alega que o acórdão impugnado, ao reconhecer a nulidade dos quesitos,
por suposta contradição em razão do afastamento, pelos jurados, da qualificadora do
cometimento de crime mediante paga ou promessa de recompensa, negou vigência aos
arts. 121, § 2º, I, do Código Penal e 564, parágrafo único, do Código de Processo Penal.
Isso porque, a referida qualificadora aplica-se tão somente ao executor do crime e,
tratando-se de circunstância de caráter pessoal, não se comunica ao mandante.

Aduz, ainda, que os quesitos foram redigidos em conformidade com o art. 484 do Código
de Processo Penal, de forma clara e sem causar perplexidade aos jurados, não se
verificando contradição entre eles. Ademais, o Código de Processo Penal consagra o
entendimento de que a nulidade só deve ser declarada quando há algum prejuízo a
qualquer das partes e, na hipótese, não se registra lesão ao direito do recorrido, que, ao
final, teve a qualificadora afastada.

Com contrarrazões (e-STJ fls. 2.068⁄2.071 e 2.084⁄2.089), foi negado seguimento ao


recurso especial interposto pelo réu, por incidência da Súmula 7⁄STJ, e admitido aquele
interposto pelo Ministério Público (e-STJ fls. 2.091⁄2.093).

Foi determinada a conversão do agravo do acusado em recurso especial, para julgamento


conjunto com a insurgência do Ministério Público Estadual (e-STJ fl. 2.157).

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento do recurso do parquet


estadual e desprovimento daquele aviado pelo acusado (e-STJ fls. 2.135⁄2.136 e 2.167).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA (Relator):


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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

José dos Santos Coutinho foi pronunciado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, I,
II e IV, do Código Penal, juntamente com Ricardo Abdulmassih, Ailton Gomes de Souza
e Valdionei Santos da Silva (homicídio cometido mediante paga ou promessa de
recompensa, ou outro motivo torpe, por motivo fútil e mediante recurso que dificultou ou
impossibilitou a defesa da vítima).

Segundo consta dos autos, o réu Ricardo Abdulmassih teria contratado o primeiro
recorrente, que, mediante recebimento de determinada quantia em dinheiro, subcontratou
os demais acusados para assassinarem a vítima Enodes de Oliviera, candidato a Prefeito
da cidade de Tupaciguara⁄MG.

A denúncia narra que, em 7 de setembro de 1992, por volta das 23h, o acusado Ailton
desferiu 3 (três) tiros de revólver, calibre 38, contra o rosto da vítima, levando-o à morte
instantânea.

Apurou-se que o réu Ailton assim agiu a mando do acusado Ricardo Abdulmassih, que o
contratou por meio de José dos Santos Coutinho. O réu Valdionei aderiu à prática
criminosa, na medida em que recebeu de Ricardo a arma do crime, devidamente
municiada, repassando-a a Ailton para que executasse o homicídio e dando-lhe fuga após
o crime.

Segundo, ainda, a denúncia, os réus Ailton e Valdionei foram escondidos pelo acusado
Ricardo nas dependências de Posto de Gasolina de propriedade da família deste último,
fornecendo-lhes, em seguida, a arma e o veículo utilizados na empreitada criminosa.

O crime teria sido cometido por motivo fútil, pelo fato de a vítima ser candidata favorita
às eleições municipais e o tio de Ricardo, que também estaria disputando o pleito, não ter
chances de vitória. Ademais, a vítima fora assassinada à traição e mediante recurso que
lhe dificultou a defesa, pois alvejada de inopino e à queima-roupa (e-STJ fl. 2.003).

Pronunciado nos termos da denúncia e após o desmembrado do feito em relação aos


acusados Ailton Gomes, Valdionei Santos e Ricardo Abdulmassih, o aqui recorrente (José
dos Santo), levado a julgamento perante o Tribunal do Júri, foi condenado por infração ao
art. 121, § 2º, II e IV, c⁄c o art. 29, ambos do Código Penal, ao cumprimento da pena de
13 anos de reclusão, em regime inicial fechado (e-STJ fls. 1.756⁄1.757).

Referido julgamento acabou por ser anulado pela Corte a quo, com o acolhimento da tese
de que os jurados, ao negarem que o crime fora cometido mediante paga ou promessa de
recompensa, incorreram em inegável contradição.

Aprecia-se, primeiramente, a tese de nulidade arguida pelo réu José dos Santos Coutinho.
No que interessa, o acórdão recorrido assim se manifestou (e-STJ fls. 2.004⁄2006).

Preliminarmente, sustentou a defesa que a redação do terceiro quesito, relativo à


participação do acusado José dos Santos Coutinho, teria nulificado o julgamento, na
medida em que teria causado perplexidade nos jurados, que foram indagados sobre duas
situações em uma mesma proposição (execução e fuga). Ainda acerca do mesmo quesito,
afirmou que em nenhuma das peças fontes dos quesitos fez-se menção à contratação por
parte do apelante dos pistoleiros que executaram a vitima, mas tão somente, à
contratação para dar fuga a um destes executores.
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

Da leitura do termo de votação dos questionários, em especial o impugnado terceiro


quesito, não pude vislumbrar qualquer complexidade em sua redação que poderia
sustentar a alegação defensiva de que os jurados teriam sido levados à perplexidade.
Neste tópico, tenho por oportuna sua transcrição:

"(...) O réu JOSÉ DOS SANTOS COUTINHO concorreu para a prática do crime acima
descrito, contratando pistoleiros, sob as ordens de terceira pessoa, para executara
vítima?

Vê-se que a proposição revela-se simples a indagar dos jurados o entendimento acerca
da participação do acusado no crime em exame. Vale destacar aqui que, ao contrário do
que afirmou a defesa, o quesito limitou-se a questionar os jurados se o réu havia
concorrido para o crime ao contratar pistoleiras para sua execução, sob o mando de
terceira pessoa, nada aludindo acerca da mencionada fuga.

Outrossim, também não retrata a realidade dos fatos a alegação defensiva de que em
nenhum momento se teria imputado ao réu a conduta de contratar pistoleiros para
executar a vítima.

Da leitura da exordial (fls. 02⁄06), da pronúncia (fls. 564⁄579), e do libelo acusatório (fls.
697⁄698), peças fontes dos quesitos, verifica-se exatamente o contrário, ou seja, que em
todos os momentos foi-lhe imputada a conduta de contratar pistoleiros, a pedido do autor
intelectual do crime, para matarem a vítima.

Vale dizer, por fim que a defesa também não protestou contra a redação dos quesitos
quando da leitura destes em Plenário (ata de julgamento - fls. 1424⁄1427). Assim sendo, o
inconformismo encontra-se precluso, pois do contrário, a parte poderia silenciar acerca
da redação do quesito e aguardar o resultado do julgamento, e somente em sendo ele
desfavorável, levantar a preliminar de nulidade, exatamente como pretende a defesa no
caso dos autos. E isto não se pode admitir, com a devida vênia do Combativo Defensor.

Assim sendo, hei por bem rejeitar a preliminar.

Esse entendimento não merece ressalva.

Com efeito, o quesito questionado não apresenta qualquer perplexidade, e está de acordo
com a tese acusatória de que o recorrente "subcontratou" os demais acusados para a
execução do homicídio, pouco importando que um tenha atirado e o outro dado fuga,
visto que no mesmo contexto da empreitada criminosa, sendo ambos co-autores.

Em aditamento, deve ser ressaltado que o acórdão recorrido não dissentiu da orientação
desta Corte, que já se pronunciou no sentido de que eventuais irregularidades na
quesitação devem ser suscitadas no momento oportuno e registradas na ata da sessão de
julgamento do Tribunal do Júri, sob pena de preclusão. Nesse sentido, confiram-se os
seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL.


HOMICÍDIO QUALIFICADO E CORRUPÇÃO DE MENORES. TRIBUNAL DO JÚRI.
CONDENAÇÃO. DECISÃO MANTIDA PELO TRIBUNAL A QUO. OFENSA A
DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE.
COMPETÊNCIA DO STF. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAS. ART. 59 DO CP.
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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

INOVAÇÃO RECURSAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. PRINCÍPIO DA


COLEGIALIDADE. OFENSA. INEXISTÊNCIA. QUESITO REFERENTE À TORPEZA.
PRECLUSÃO. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282⁄STF. DECISÃO DO
CONSELHO DE SENTENÇA. ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO CONTRÁRIO À PROVA
DOS AUTOS. SOBERANIA. ACOLHIMENTO DE UMA DAS TESES. CONJUNTO
PROBATÓRIO. SÚMULA 7⁄STJ.

(...).

5. Eventuais irregularidades na quesitação devem ser suscitadas no momento oportuno e


registradas na ata da sessão de julgamento do Tribunal do Júri, sob pena de preclusão.
Ademais, a alegação de nulidade da quesitação, especificamente em relação ao quesito
referente ao motivo torpe, não foi objeto do recurso de apelação e, consequentemente,
não foi apreciada pelo Tribunal de origem, o que faz incidir a Súmula 282⁄STF, que
obsta o conhecimento do recurso por falta de prequestionamento.

(...).

8. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp. 1.511.865⁄SC, Rel. Ministro


SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 17⁄12⁄2015, DJe
03⁄02⁄2016).

PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DO JÚRI.


HOMICÍDIO SIMPLES. OFENSA AO ART. 381, III, DO CPP. INOCORRÊNCIA.
ACÓRDÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO. CONTRARIEDADE AO ART. 619 DO
CPP. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. INTENTO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA.
IMPOSSIBILIDADE. CONTRARIEDADE AO ART. 458, III, DO CPC. AUSÊNCIA DE
RAZÕES JURÍDICAS DA VULNERAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE.
SÚMULA 284⁄STF. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AOS ARTS. 466, § 1º, E 564, III, "J",
AMBOS DO CPP. INOCORRÊNCIA. QUEBRA DE INCOMUNICABILIDADE DOS
JURADOS. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 483, § 4º, E 564, III, "K",
AMBOS DO CPP. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE QUESITO ESPECÍFICO SOBRE A
TESE DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO CULPOSO. NÃO ALEGAÇÃO NO
MOMENTO OPORTUNO. PRECLUSÃO. DESNECESSIDADE. RESPOSTA
AFIRMATIVA ANTERIOR PELO DOLO NA CONDUTA DO AGENTE. VILIPÊNDIO
AOS ARTS. 156, II, 209 E 497, XI, TODOS DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. PLEITO
EXTEMPORÂNEO DE OITIVA DE TESTEMUNHAS EM PLENÁRIO.
INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. PRECLUSÃO.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF.
VIOLAÇÃO AOS ARTS. 593, III, '"D" DO CPP, E 18, I, DO CP. JÚRI. DECISÃO
MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. REEXAME DE MATÉRIA
FÁTICA. VEDAÇÃO. SÚMULA 7⁄STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. (I) - ART.
255⁄RISTJ. INOBSERVÂNCIA. (II) - ACÓRDÃO PARADIGMA PROFERIDO EM
HABEAS CORPUS. IMPROPRIEDADE. (III) - AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE
DISPOSITIVO DE LEI VIOLADO. RECURSO ESPECIAL COM FUNDAMENTAÇÃO
DEFICIENTE. SÚMULA 284⁄STF. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 59 DO CP.
OCORRÊNCIA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL.
FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. REDUÇÃO DA PENA. MODIFICAÇÃO DO
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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

REGIME. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PARCIAL


PROVIMENTO.

(...).

5. Este Superior Tribunal de Justiça é firme na compreensão de que as possíveis


irregularidades na quesitação devem ser arguidas no momento oportuno, devendo
constar em ata de julgamento, sob pena de preclusão, nos termos do artigo 571, inciso
VIII, do Código de Processo Penal.

(...).

8. Segundo a legislação processual penal em vigor, é imprescindível quando se trata de


nulidade de ato processual a demonstração do prejuízo sofrido, em consonância com o
princípio pas de nullité sans grief, o que não ocorreu na espécie.

(...). (REsp. 1.440.787⁄ES, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 07⁄08⁄2014, DJe 03⁄09⁄2014).

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PLURALIDADE DE ADVOGADOS


CONSTITUÍDOS. INTIMAÇÃO EM NOME DE APENAS UM, POR MEIO DA
IMPRENSA OFICIAL, DA SESSÃO DE JULGAMENTO DA APELAÇÃO.
LEGALIDADE. AUSÊNCIA DE QUESITO ESPECÍFICO SOBRE A TESE DE
LEGÍTIMA DEFESA. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. PRECLUSÃO. HABEAS
CORPUS DENEGADO.

(...).

3. As possíveis irregularidades na quesitação devem ser arguidas no momento oportuno,


devendo constar em ata de julgamento, sob pena de preclusão, nos termos do art. 571,
inciso VIII, do Código de Processo Penal, o que não ocorreu na presente hipótese.

4. Habeas corpus denegado. (HC 187.919⁄MS, Rel. Min. LAURITA VAZ, QUINTA
TURMA, julgado em 25⁄06⁄2013, DJe 01⁄08⁄2013).

Assim, inafastável a incidência da Súmula 83⁄STJ, inviabilizando o recurso por ambas as


alíneas do permissivo constitucional.

No tocante ao recurso do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, a tese é a mesma


suscitada nos autos do REsp. 1.201.548⁄MG, relativo ao corréu Ricardo Abdulmassih, que
também teve o júri anulado em razão do reconhecimento da existência de contradição na
resposta dos jurados, consistente no afastamento, pelos jurados, da qualificadora do
cometimento do crime mediante paga ou promessa de recompensa ao mandante.

Do mesmo modo que para o corréu Ricardo, a Turma a quo entendeu que se a atuação do
imputado José dos Santos se liga justamente à possibilidade de ter contratado terceiros
para a execução material do crime, dando apoio ao indicado mandante, aspecto
inclusive reconhecido no terceiro quesito (f. 1.420), soa-nos contraditório negar
justamente a paga ou promessa de recompensa, conforme resposta à sexta indagação (fl.
1.421) (e-STJ fl. 2.014).
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

A solução para ambos os casos deve ser a mesma, no sentido do provimento do recurso
ministerial.

No homicídio mercenário, não se olvida a existência de pronunciamentos judiciais,


inclusive desta Corte, no passado, que entendiam que as circunstâncias de caráter pessoal,
tal como a qualificadora de ter sido o delito praticado mediante paga ou promessa de
recompensa, são incomunicáveis, ex vi do art. 30 do Código Penal (REsp. 467.810⁄SP,
Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ de 19⁄12⁄2003).

No entanto, a atual jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que a


paga ou promessa de recompensa se comunica tanto ao agente que executa a conduta
descrita no artigo 121 do CP, quanto ao autor intelectual.

O executor do crime é responsabilizado por ter ceifado a vida de outrem mediante o


recebimento de vantagem ou promessa de recompensa, enquanto o autor intelectual é
punido pela sua intenção ao ter dado causa à prática criminosa.

Na doutrina, CÉZAR ROBERTO BITTENCOURT comunga desse mesmo entendimento:


Trata-se, nessa modalidade, de crime bilateral ou de concurso necessário, no qual é
indispensável a participação de, no mínimo duas pessoas; quem paga para o crime ser
cometido e quem o executa pela paga ou recompensa (Tratado de Direito Penal. v. 2, 7ª
ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p.54).

Nessa linha, os seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. [...] 4) QUALIFICADORAS. CRIME


MEDIANTE PAGA. ELEMENTAR DO TIPO. COMUNICAÇÃO AO AUTOR
INTELECTUAL. DELITO DE EMBOSCADA. COMUNICABILIDADE QUE DEPENDE
DA ESFERA DE CONHECIMENTO DO MANDANTE. DESCONSTITUIÇÃO QUE
EXIGE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ORDEM DENEGADA.

[...]

- A qualificadora do homicídio mediante paga é elementar do tipo penal, estendendo-se


também ao mandante do delito. Assim, não há falar em existência de constrangimento
ilegal na comunicação ao paciente, autor intelectual do crime, da qualificadora prevista
no inciso I, do § 2º do art. 121 do Código Penal - CP.

[...]

Ordem denegada (HC 291.604⁄PI, Rel. Min. ERICSON MARANHO, Desembargador


Convocado do TJ⁄SP, Sexta Turma, julgado em 1o⁄10⁄2015, DJe 22⁄10⁄2015).

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.


AFRONTA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. DUPLO JUÍZO
DE ADMISSIBILIDADE. NÃO VINCULAÇÃO DA CORTE AD QUEM.
COMUNICAÇÃO DA QUALIFICADORA DE PROMESSA DE PAGA AO AUTOR
INTELECTUAL. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA DA
DISSIMULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA OBJETIVA. CABIMENTO. INGRESSO NO
ESPECTRO DE CONHECIMENTO DO COAUTOR. NECESSIDADE DE
24
Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

REVOLVIMENTO PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7⁄STJ AGRAVO


REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

[...]

3. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é


elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor.

[...]

5. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no REsp. 912.491⁄DF, Rel. Min.
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 9⁄11⁄2010, DJe
29⁄11⁄2010).

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO MEDIANTE PAGA. EXCLUSÃO DE


QUALIFICADORAS. INVIABILIDADE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA.
COMUNICABILIDADE. RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA.
REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

1. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é


elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor.

2. Para se excluir a qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima é


indispensável o revolvimento do material fático-probatório, o que é vedado na via do
habeas corpus.

3. Ordem denegada (HC 99.144⁄RJ, Rel. Min. OG FERNANDES, Sexta Turma, julgado
em 4⁄11⁄2008, DJe 9⁄12⁄2008).

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE


QUALIFICADO. PRONÚNCIA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. ALEGAÇÃO
IMPROCEDENTE. EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS. PAGA OU PROMESSA DE
RECOMPENSA. COMUNICABILIDADE AO MANDANTE DO CRIME. MEIO
CRUEL E RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA.
REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. EXCESSO DE PRAZO NA
FORMAÇÃO DA CULPA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 21 DO STJ. PRISÃO
PREVENTIVA. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. RÉU QUE RESPONDEU PRESO AO
PROCESSO. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE PRODUÇÃO DE PROVA
(DEGRAVAÇÃO DE CD). CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE.

1. O Magistrado de primeiro grau procedeu adequadamente e de maneira concreta a


fundamentação acerca da admissibilidade das qualificadoras do crime de homicídio,
contendo a decisão impugnada sucinto juízo de probabilidade em respeito à competência
do Conselho de Sentença, inexistindo, assim, a alegada violação do art. 93, IX, da
Constituição Federal.

2. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é


elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor do crime.
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

3. No que diz respeito às qualificadoras do meio cruel e do emprego de recurso que


dificultou a defesa da vítima, verificar a existência ou não das referidas circunstâncias,
bem como aferir se o paciente, na qualidade de co-autor, tinha conhecimento da forma
de execução do crime, demandaria o reexame da matéria fático-probatória,
procedimento inviável em sede de habeas corpus.

4. A prisão preventiva, mantida em sede de pronúncia, encontra-se razoavelmente


motivada na necessidade da segregação do acusado para se preservar a ordem pública,
em razão de sua periculosidade, evidenciada pelas circunstâncias do crime, bem como
para assegurar a futura aplicação da lei penal.

5. Quanto à alegação de excesso de prazo na formação da culpa, incide, no caso, o


enunciado da Súmula nº 21 desta Corte, impondo-se notar que o julgamento do paciente,
pelo Tribunal do Júri, está marcado para o mês de novembro⁄2008.

6. A integralidade das gravações da prova oral produzida na instrução criminal restou


entregue a todos os acusados, mediante a disponibilização da cópia do respectivo CD-
ROM (reprodução de som e imagem), portanto, não há se falar em cerceamento de
defesa, até porque o art. 405, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Penal, com a redação
dada pela Lei 11.719⁄2008, prevê a adoção desse sistema informatizado.

7. Habeas corpus denegado.

(HC 78.643⁄PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em


21⁄10⁄2008, DJe 17⁄11⁄2008)
Cite-se, ainda, as decisões monocráticas proferidas no REsp. 1.493.196⁄MG, Rel. Min.
JORGE MUSSI, DJe 10⁄2⁄2015 e no REsp. 1.212.176⁄MT, Rel. Min. NEFI CORDEIRO,
Sexta Turma, DJ 24.⁄9⁄2015.
Não é outro o entendimento do Supremo Tribunal Federal, verbis:

"I. Homicídio: qualificativa de cometimento do crime mediante paga ou promessa de


recompensa que, embora relativa ao mandatário, se comunica ao mandante. II. Júri:
quesitos: pretensa nulidade que, se existente, nenhum prejuízo causou a defesa, pois
relativo o quesito impugnado a segunda qualificadora do homicídio, cuja pena foi fixada
no mínimo legal. III. Júri: quesito não obrigatório: menor importância da participação
de co-réu, não alegada pela defesa". (HC 69940, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09⁄03⁄1993, DJ 02-04-1993 PP-05621
EMENT VOL-01698-06 PP-01127).
A propósito, mesmo para aqueles que continuam sustentando a incomunicabilidade
automática a coautores do homicídio, não vislumbram óbice a que tal circunstância se
comunique entre o mandante e o executor do crime, caso o motivo que levou o mandante
a empreitar o óbito alheio seja torpe, desprezível ou repugnante. A título de exemplo,
confira-se:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO


QUALIFICADO.JÚRI. MOTIVO TORPE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA.
CIRCUNSTÂNCIA SUBJETIVA. MANDANTE. COMUNICABILIDADE. ANÁLISE
CASUÍSTICA. RECURSO PROVIDO.
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

1. Não obstante a paga ou a promessa de recompensa seja circunstância acidental do


delito de homicídio, de caráter pessoal e, portanto, incomunicável automaticamente a
coautores do homicídio, não há óbice a que tal circunstância se comunique entre o
mandante e o executor do crime, caso o motivo que levou o mandante a empreitar o
óbito alheio seja torpe, desprezível ou repugnante.

2. Na espécie, o recorrido teria prometido recompensa ao executor, a fim de, com a


morte da vítima, poder usufruir vantagens no cargo que exercia na Prefeitura Municipal
de Fênix.

3. Recurso especial provido, para reconhecer as apontadas violações dos arts. 30 e 121,
§ 2º, I, ambos do Código Penal, e restaurar a decisão de pronúncia, restabelecendo a
qualificadora do motivo torpe, a fim de que o réu seja submetido a julgamento pelo
Tribunal do Júri, pela prática do delito previsto no art. 121, § 2º, I e IV, do Código
Penal.

(REsp 1209852⁄PR, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado
em 15⁄12⁄2015, DJe 02⁄02⁄2016).

Assim, no ponto, a irresignação não prospera. Todavia, tem razão o Ministério Público
quanto aponta para a inexistência de nulidade dos quesitos, pois, tal como redigidos e
apreciados pelo Conselho de Sentença, não encerraram contradição, nem foram capazes
de induzir a erro os jurados, pois vinculados à tese acusatória amplamente debatida em
plenário.

Os quesitos foram elaborados em proposições simples, de modo claro, em total


consonância com os fatos delineados na sentença de pronúncia e relativos à participação
do corréu José dos Santos Coutinho na empreitada criminosa (se concorreu para o crime
contratando pistoleiros, sob as ordens de terceira pessoa, para executar a vítima).

A contradição só foi reconhecida pelo acórdão recorrido em razão da aceitação de uma


das correntes jurisprudenciais possíveis, qual seja, aquela que admite a comunicação da
qualificadora da paga ou promessa de recompensa ao mandante, sendo certo que a tese
nem sempre foi pacífica na doutrina e na jurisprudência.

De qualquer forma, não há falar em contradição das respostas dadas pelos jurados com
entendimento jurisprudencial ou doutrinário.

A propósito do tema, confira-se a orientação jurisprudencial desta Corte:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIMES DE


HOMICÍDIO E DE RIXA QUALIFICADA. ARGUIDA DEFICIÊNCIA DA DEFESA
TÉCNICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. TESE DE BIS IN IDEM. FALTA
DE INTERESSE RECURSAL. DECLARADO PRESCRITO O DELITO DE RIXA PELA
CORTE REGIONAL. QUESITAÇÃO. ARGUIDA NULIDADE. INOCORRÊNCIA.
AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. No Júri, os quesitos devem ser formulados em proposições simples e bem definidas,


para que possam ser respondidos com suficiente clareza, de modo a não causar, nos
jurados leigos, dúvidas ou perplexidade. Assim, quesitos complexos ou com formulação
deficiente geram a nulidade do julgado.
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

2. No caso em apreço, não se detecta nenhuma invalidade no termo de quesitação, uma


vez que sua redação permitiu aos jurados plena ciência das condutas imputadas ao
acusado, não se constatando prejuízo ao Réu.

(...)

6. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp. 1.316.076⁄PE, Rel. Min. LAURITA


VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 03⁄12⁄2013, DJe 19⁄12⁄2013).

JÚRI. NULIDADE. QUESITAÇÃO. RESPOSTA. ALEGAÇÃO DE CONTRADIÇÃO.


DEFESA DA HONRA. AGRESSÃO INJUSTA. SITUAÇÃO A ENSEJAR O REGISTRO
EM ATA DE JULGAMENTO. INEXISTÊNCIA DE APONTAMENTO. CORRELAÇÃO
ENTRE A DENÚNCIA E A DEFESA VERIFICADA. VÍCIO INOCORRENTE.

1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em


prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional e em louvor à lógica do
sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de
revisão criminal.

2. A contradição na resposta aos quesitos dada pelos jurados deve ser examinada ante o
postulado da oralidade que rege o julgamento do Tribunal do Júri, de modo que somente
se concebe nulidade se houve a devida anotação na ata de julgamento.

3. No caso vertente, os quesitos expressamente aceitos pelas partes mantiveram, em tese,


a correlação entre a denúncia e a tese defensiva, motivo pelo qual não se concebe a
existência pura e simples de nulidade.

3. Habeas corpus não conhecido. (HC 290.593⁄SP, Rel. Min. MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 12⁄02⁄2015, DJe 25⁄02⁄2015).
Do procedente relatado pela Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, colho as
seguintes considerações:
Nesse ponto, antes de adentrar no exame da controvérsia, penso que a discussão
proposta não deve subsistir neutra, como algo apurado apenas pelo sentido das palavras
contidas nos quesitos formulados aos senhores jurados, mas jungida a necessidade de se
pontuar os fatos no exato instante em que eles foram produzidos, de modo que exclua da
mente do observador a idéia de que a simples indicação de perguntas resulte desde logo
a existência de confusão na análise de determinada realidade.

Quer-se alertar, neste passo, que a discussão ora promovida reclama uma análise do
contexto, em que os atores principais, acusação, defesa e juízes, construíram um sentido
para o evento penal; ou seja, não se deve emprestar às expressões cambiadas para o
texto dos quesitos total e cega obediência.

Não se pode esquecer que a discussão sobre a verdade dos fatos, na órbita do Júri,
decorre basicamente de um ambiente edificado em torno da oralidade e da troca de
impressões diretas.

(...).
28
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Penso que é em razão da oralidade fundante do Júri, na linha dos ensinamentos do


saudoso mestre, que resultam as fórmulas de nulidade instituídas pelo Código de
Processo Penal.

Entender o mecanismo de apreensão da realidade no julgamento perante o Conselho de


Sentença, por isso, atrai a conjugação de vários fatores, sendo um de especial destaque:
a visão de que o calor dos debates e as representações verbais superam o sentido dos
textos e dos enunciados escritos.

Daí porque ser tão importante aos atores requerer o registro, passo por passo, fase por
fase, de eventuais desproporções em torno da verdade ali produzida e dos obstáculos que
se interpõem, porque a fonte do conhecimento sobre o fato, portanto, sobre o que é a
representação da realidade, funda-se nas apreensões do sujeito que o conhece (jurado),
em sua convicção íntima.

Assim, só se pode ter como certa a contradição para os jurados por meio da constatação
in loco e do registro no mesmo instante da percepção, sob pena de, na dúvida, não ser
possível idealizar, no futuro, pela expressão das palavras, a existência de
comprometimento do raciocínio dos julgadores.

Então, visto o presente caso sob as premissas das teses da acusação e da defesa, não
tenho por certa a decantada nulidade, até porque, na ata da sessão do júri, à fl. 25,
consta que os jurados entenderam bem a quesitação e, por sua vez, as partes nada
tinham a reclamar.

De fato, a construção dos quesitos correspondeu precisamente ao que foi discutido, tanto
pela acusação quanto pela defesa.

Assim, a nulidade defendida pelos impetrantes, em face da verificação de possível


contradição nas respostas ao 3º e 4º quesitos (“Essa agressão era injusta?), não se
mostra apurável de pronto, cumprindo reafimar que os questionamentos realizados aos
jurados tiveram por parâmetro, pelo menos é o que se depreende das versões, à mingua
de qualquer contestação no momento oportuno, a condução acusatória e a contestação
da defesa, desde o início do processo penal, de cujo ambiente deve advir a interpretação
do veredicto.

A propósito, a Suprema Corte tem ponderado que a congruência dos quesitos com o que
deliberaram defesa e acusação retira a configuração de nulidades. É exemplo desse
entendimento:

“Direito Processual Penal. Júri. Nulidades. Direito de apelar. Cerceamento de defesa.


Júri. Quesitos. Legitima defesa putativa. Circunstancias qualificadoras do homicidio. 1.
Tomando, o réu, conhecimento da sentença, em plenário do júri, assim como seu
defensor, sem interpor o recurso de apelação e chegando, depois, a pedir revisão
criminal da condenação, admitindo, pois, a existência de coisa julgada, não se pode dizer
que tenha ficado cerceado seu direito de apelar. 2. No quesito relativo a legitima defesa
putativa, não é necessário qualificar-se como "atual" ou "iminente" a agressão que o réu
supõe sofrer. 3. Corretamente formulados os quesitos relativos as circunstancias
qualificadoras do homicídio, nos limites da pronuncia e do libelo, sem risco de
perplexidade dos jurados e de prejuízo para a defesa, não e de se reconhecer nulidade a
respeito. 4. "H.C." indeferido.” (HC 71505, Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES,
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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

PRIMEIRA TURMA, julgado em 08⁄11⁄1994, DJ 10-03-1995 PP-04880 EMENT VOL-


01778-01 PP-00121)

No caso concreto, a compreensão das teses expostas em plenário fica transparente, tanto
que a exclusão da qualificadora decorreu de pedido do Ministério Público, que alertou os
jurados sobre a existência de diferentes entendimentos jurisprudenciais sobre o tema.

Assim, não se admite a existência de contradição em razão do não acatamento, à época do


julgamento, de uma dentre duas teses jurídicas possíveis, se o conteúdo da acusação foi
apreendido e não há dissonância com a tese acusatória ou defensiva, mormente porque, ao
final, a exclusão da qualificadora foi benéfica ao acusado.

Com efeito, não se compreende como a exclusão de uma qualificadora pode ser
prejudicial ao acusado, considerando a ausência de recurso do Ministério Público, e
sem que tenha sido constatada decisão manifestamente contrária à prova dos autos,
a menos que se admita que, em novo julgamento, ela possa ser incluída.

O juízo condenatório da conduta principal do réu feito pelos Jurados não sofreu qualquer
interferência com a exclusão da referida qualificadora pelo Conselho de Sentença,
inexistindo uma relação de prejudicialidade entre eles, porquanto, como dito, à luz do
entendimento jurisprudencial e doutrinário da época, a conclusão pela
incomunicabilidade da qualificadora era perfeitamente possível.

Por fim, não há registro, na ata de julgamento, de impugnação da defesa quanto à redação
dos quesitos ou mesmo em relação à suposta contradição das respostas. É pacífico que
eventuais irregularidades da quesitação devem ser arguidas no momento oportuno,
como antes mencionado.

Estando o acórdão recorrido em desacordo com a orientação jurisprudencial desta Corte,


impõe-se a sua reforma, para o fim de, afastada a contradição reconhecida e,
consequentemente, a necessidade de submissão do recorrido a novo júri, o Tribunal a quo
julgue o mérito das apelações, como entender de direito.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso de JOSÉ DOS SANTOS COUTINHO.


Recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS parcialmente
conhecido e, nessa parte, provido, para afastar a necessidade de submissão do acusado a
novo julgamento, determinando ao Tribunal a quo que prossiga no julgamento das
apelações, como entender de direito.

É como voto.
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Relator
SUSTENTAÇÃO ORAL
SUSTENTARAM ORALMENTE: DR. NILVIO DE OLIVEIRA BATISTA (P⁄RECTE) E
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

CERTIDÃO
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada
nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Após o voto do Sr. Ministro Relator negando provimento ao recurso de JOSÉ DOS SANTOS
COUTINHO e conhecendo parcialmente do recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO
DE MINAS GERAIS e, nessa parte, dando-lhe provimento, pediu vista, antecipadamente, o Sr.
Ministro Felix Fischer."
Aguardam os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik e Jorge Mussi.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: Trata-se de recurso especial interposto por JOSÉ
DOS SANTOS COUTINHO e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
em face de acórdão proferido pelo eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
O processo foi relatado de forma minuciosa pelo em. Ministro Relator, Reynaldo Soares da
Fonseca, dispensando-se maiores divagações.
O em. Ministro Relator negou provimento ao recurso da defesa e deu parcial provimento ao
recurso especial do Ministério Público, para afastar a anulação do julgamento pelo Tribunal do
Júri, determinando o retorno dos autos ao Tribunal de origem para apreciação dos demais
fundamentos dos apelos.
Para melhor analisar o feito, pedi vista dos autos.
Inicialmente, externo minha anuência com o voto do em. Ministro Relator, acompanhando-o na
conclusão, porém divergindo de suas razões, apenas para expor minha contrariedade ao
entendimento de comunicabilidade obrigatória da qualificadora prevista no inciso I do artigo 121
do Código Penal ao mandante do crime de homicídio, consistente em "paga ou promessa de
recompensa", uma vez que mantenho minhas razões contidas no julgamento do HC 78.404⁄RJ,
cuja ementa restou assim definida:

"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO.


JÚRI. QUESITAÇÃO. PRECLUSÃO. INOCORRÊNCIA. NULIDADE ABSOLUTA. SÚMULA 162
DO PRETÓRIO EXCELSO. REDAÇÃO INDEVIDA. PERPLEXIDADE.
I - Em que pese a regra geral determinar devam as nulidades quanto aos quesitos serem arguidas
em plenário sob pena de preclusão, tal entendimento não alcança as chamadas nulidades
absolutas.
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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

II - Verifica-se, in casu, a inobservância da ordem de formulação dos quesitos - in casu as


qualificadoras precederam à indagação acerca da participação do paciente - apta a atrair a
incidência da Sumula 162 do Pretório Excelso "É absoluta a nulidade do julgamento pelo júri,
quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes." III - Os dados
que compõem o tipo básico ou fundamental (inserido no caput) são elementares (essentialia
delicti); aqueles que integram o acréscimo, estruturando o tipo derivado (qualificado ou
privilegiado) são circunstâncias (accidentalia delicti).
IV - No homicídio, a qualificadora de ter sido o delito praticado mediante paga ou promessa de
recompensa é circunstância de caráter pessoal e, portanto, ex vi art. 30 do C.P., incomunicável.
V - É nulo o julgamento pelo Júri em que o Conselho de Sentença acolhe a comunicabilidade
automática de circunstância pessoal com desdobramento na fixação da resposta penal in
concreto.
Ordem concedida" (HC n. 78.404⁄RJ, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe de 9⁄2⁄2009).
Não obstante, melhor oportunidade de se debater a matéria ocorrerá nos autos do Recurso
Especial 1.415.502⁄MG de minha relatoria.
Ante o exposto, acompanho o em. Ministro Relator em sua conclusão.
É o voto.

3.2. DEMONSTRAÇÃO ANALÍTICA

Como se verifica pela transcrição ora feita, é evidente


o paralelismo entre os casos tratados no r. julgado trazido à colação e
a hipótese decidida nos autos: nos dois processos houve decisão
sobre a qualificadora do homicídio mercenário comunicar-se com o
mandante; porém, as soluções aplicadas apresentam-se opostas.

Segundo o teor do v. acórdão impugnado:

"Verifico, no entanto, irregularidade insanável no julgamento


ora combatido.
Extrai-se da denúncia a imputação contra José da Silva
Martiniano Filho, consistente na execução do homicídio qualificado pelo motivo
torpe, tendo em vista a motivação mercenária, já que foi contratado para matar
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Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais
Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

a vítima e o fez estimulado pelo pagamento prévio de R$450,00, valor


complementado pela arma utilizada no assassinato, que lhe foi fornecida a título
definitivo. Ele, José, sim, foi denunciado por infração ao artigo 121, § 2º, inciso I,
do Código Penal, pelo motivo torpe, repita-se, mercenário.
Já contra FLÁVIO e João Luiz Victorino, diferentemente, ao que
se percebe da narrativa inicial, acolhida na pronúncia, não consta qualquer
circunstância qualificadora adicional, não podendo eles, ou FLÁVIO, ora
apelante, responderem pelo homicídio mercenário, atribuível apenas a quem
recebe o dinheiro para matar, não a quem paga. O mandante, imputação que
pesa contra FLÁVIO, pode ou não estar motivado pela torpeza ou outra
motivação reprovável. No caso, a denúncia não imputa nem a pronúncia
reconhece formalmente algum motivo torpe ou fútil, nem mesmo outra
circunstância qualificadora de natureza subjetiva ou objetiva.
Houve, portanto, evidente excesso ou equívoco na imputação.
Segundo Luiz Regis Prado, “para reconhecimento da qualificadora exige-se que a
paga ou promessa de recompensa seja o motivo que desencadeou a resolução
delitiva, embora não seja necessária a efetiva obtenção da vantagem visada.
Predomina o entendimento segundo o qual a recompensa deve ter, para a
configuração da qualificadora, conteúdo econômico”. Prossegue afirmando que
“a paga ou a promessa de recompensa requerem a existência de dois sujeitos:
aquele que oferece o pagamento ou recompensa e aquele que executa o delito
por tais motivos. A ratio da qualificadora é o móvel de lucro, considerado
especialmente reprovável. Logo, incabível a aplicação da qualificadora àquele
que oferece paga ou recompensa, visto que o agente atua imbuído de motivação
diversa, sendo possível, inclusive, que o faça por motivo nobre” (in “Comentários
ao Código Penal”, Ed. RT, 9ª edição, 2014, p. 489).
Enfim, a anulação do julgamento é medida de rigor por não
constar da denúncia ou mesmo da pronúncia a descrição explícita de qualquer
circunstância de natureza objetiva ou subjetiva que qualifique o homicídio
supostamente praticado pelo apelante.
Registro que não há falar em, na espécie, em desclassificação,
providência cabível apenas quando a imputação abarca efetivamente alguma
qualificadora e ela não resta comprovada. Houve, no caso, evidente excesso ou
equívoco, pois a qualificadora do motivo torpe por paga não se comunica entre
o mandante e o executor do homicídio.
3. Por tais fundamentos, pelo meu voto, dou provimento ao
apelo defensivo para anular o julgamento do Tribunal do Júri a fim de que outro
seja realizado por homicídio simples, afastada, no caso, a qualificadora do
motivo torpe.

Enquanto para o paradigma:


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Recurso Especial n. 0007264-93.2013.8.26.0590

No homicídio mercenário, não se olvida a existência de pronunciamentos judiciais,


inclusive desta Corte, no passado, que entendiam que as circunstâncias de caráter
pessoal, tal como a qualificadora de ter sido o delito praticado mediante paga ou
promessa de recompensa, são incomunicáveis, ex vi do art. 30 do Código Penal (REsp.
467.810⁄SP, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ de 19⁄12⁄2003).

No entanto, a atual jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que a


paga ou promessa de recompensa se comunica tanto ao agente que executa a conduta
descrita no artigo 121 do CP, quanto ao autor intelectual.

O executor do crime é responsabilizado por ter ceifado a vida de outrem mediante o


recebimento de vantagem ou promessa de recompensa, enquanto o autor intelectual é
punido pela sua intenção ao ter dado causa à prática criminosa.

Na doutrina, CÉZAR ROBERTO BITTENCOURT comunga desse mesmo entendimento:


Trata-se, nessa modalidade, de crime bilateral ou de concurso necessário, no qual é
indispensável a participação de, no mínimo duas pessoas; quem paga para o crime ser
cometido e quem o executa pela paga ou recompensa (Tratado de Direito Penal. v. 2, 7ª
ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p.54).

Nessa linha, os seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. [...] 4) QUALIFICADORAS. CRIME MEDIANTE


PAGA. ELEMENTAR DO TIPO. COMUNICAÇÃO AO AUTOR INTELECTUAL. DELITO DE
EMBOSCADA. COMUNICABILIDADE QUE DEPENDE DA ESFERA DE CONHECIMENTO DO
MANDANTE. DESCONSTITUIÇÃO QUE EXIGE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO.
ORDEM DENEGADA.

[...]

- A qualificadora do homicídio mediante paga é elementar do tipo penal, estendendo-se


também ao mandante do delito. Assim, não há falar em existência de constrangimento
ilegal na comunicação ao paciente, autor intelectual do crime, da qualificadora prevista
no inciso I, do § 2º do art. 121 do Código Penal - CP.

[...]

Ordem denegada (HC 291.604⁄PI, Rel. Min. ERICSON MARANHO, Desembargador


Convocado do TJ⁄SP, Sexta Turma, julgado em 1o⁄10⁄2015, DJe 22⁄10⁄2015).

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AFRONTA AO


PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. DUPLO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE.
NÃO VINCULAÇÃO DA CORTE AD QUEM. COMUNICAÇÃO DA QUALIFICADORA DE
PROMESSA DE PAGA AO AUTOR INTELECTUAL. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA
QUALIFICADORA DA DISSIMULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA OBJETIVA. CABIMENTO. INGRESSO
NO ESPECTRO DE CONHECIMENTO DO COAUTOR. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO
PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7⁄STJ AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA
PROVIMENTO.[...]
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3. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é


elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor.[...]

5. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no REsp. 912.491⁄DF, Rel. Min.
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 9⁄11⁄2010, DJe
29⁄11⁄2010).

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO MEDIANTE PAGA. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORAS.


INVIABILIDADE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA. COMUNICABILIDADE. RECURSO
QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-
PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

1. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é


elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor.

2. Para se excluir a qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima é


indispensável o revolvimento do material fático-probatório, o que é vedado na via do
habeas corpus.

3. Ordem denegada (HC 99.144⁄RJ, Rel. Min. OG FERNANDES, Sexta Turma, julgado em
4⁄11⁄2008, DJe 9⁄12⁄2008).

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO.


PRONÚNCIA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. ALEGAÇÃO IMPROCEDENTE. EXCLUSÃO DAS
QUALIFICADORAS. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA. COMUNICABILIDADE AO
MANDANTE DO CRIME. MEIO CRUEL E RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA
VÍTIMA. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. EXCESSO DE PRAZO NA
FORMAÇÃO DA CULPA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 21 DO STJ. PRISÃO PREVENTIVA.
MOTIVAÇÃO IDÔNEA. RÉU QUE RESPONDEU PRESO AO PROCESSO. INDEFERIMENTO DE
PEDIDO DE PRODUÇÃO DE PROVA (DEGRAVAÇÃO DE CD). CERCEAMENTO DE DEFESA
INOCORRENTE.

1. O Magistrado de primeiro grau procedeu adequadamente e de maneira concreta a


fundamentação acerca da admissibilidade das qualificadoras do crime de homicídio,
contendo a decisão impugnada sucinto juízo de probabilidade em respeito à
competência do Conselho de Sentença, inexistindo, assim, a alegada violação do art. 93,
IX, da Constituição Federal.

2. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é


elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor do crime.

3. No que diz respeito às qualificadoras do meio cruel e do emprego de recurso que


dificultou a defesa da vítima, verificar a existência ou não das referidas circunstâncias,
bem como aferir se o paciente, na qualidade de co-autor, tinha conhecimento da forma
de execução do crime, demandaria o reexame da matéria fático-probatória,
procedimento inviável em sede de habeas corpus.

4. A prisão preventiva, mantida em sede de pronúncia, encontra-se razoavelmente


motivada na necessidade da segregação do acusado para se preservar a ordem pública,
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em razão de sua periculosidade, evidenciada pelas circunstâncias do crime, bem como


para assegurar a futura aplicação da lei penal.

5. Quanto à alegação de excesso de prazo na formação da culpa, incide, no caso, o


enunciado da Súmula nº 21 desta Corte, impondo-se notar que o julgamento do
paciente, pelo Tribunal do Júri, está marcado para o mês de novembro⁄2008.

6. A integralidade das gravações da prova oral produzida na instrução criminal restou


entregue a todos os acusados, mediante a disponibilização da cópia do respectivo CD-
ROM (reprodução de som e imagem), portanto, não há se falar em cerceamento de
defesa, até porque o art. 405, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Penal, com a redação
dada pela Lei 11.719⁄2008, prevê a adoção desse sistema informatizado.

7. Habeas corpus denegado.(HC 78.643⁄PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA


TURMA, julgado em 21⁄10⁄2008, DJe 17⁄11⁄2008)

Cite-se, ainda, as decisões monocráticas proferidas no REsp. 1.493.196⁄MG, Rel. Min.


JORGE MUSSI, DJe 10⁄2⁄2015 e no REsp. 1.212.176⁄MT, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, Sexta
Turma, DJ 24.⁄9⁄2015.
Não é outro o entendimento do Supremo Tribunal Federal, verbis:
"I. Homicídio: qualificativa de cometimento do crime mediante paga ou promessa de
recompensa que, embora relativa ao mandatário, se comunica ao mandante. II. Júri:
quesitos: pretensa nulidade que, se existente, nenhum prejuízo causou a defesa, pois
relativo o quesito impugnado a segunda qualificadora do homicídio, cuja pena foi fixada
no mínimo legal. III. Júri: quesito não obrigatório: menor importância da participação de
co-réu, não alegada pela defesa". (HC 69940, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 09⁄03⁄1993, DJ 02-04-1993 PP-05621 EMENT VOL-01698-
06 PP-01127).
A propósito, mesmo para aqueles que continuam sustentando a incomunicabilidade
automática a coautores do homicídio, não vislumbram óbice a que tal circunstância se
comunique entre o mandante e o executor do crime, caso o motivo que levou o
mandante a empreitar o óbito alheio seja torpe, desprezível ou repugnante. A título de
exemplo, confira-se:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.JÚRI.


MOTIVO TORPE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA. CIRCUNSTÂNCIA SUBJETIVA.
MANDANTE. COMUNICABILIDADE. ANÁLISE CASUÍSTICA. RECURSO PROVIDO.

1. Não obstante a paga ou a promessa de recompensa seja circunstância acidental do


delito de homicídio, de caráter pessoal e, portanto, incomunicável automaticamente a
coautores do homicídio, não há óbice a que tal circunstância se comunique entre o
mandante e o executor do crime, caso o motivo que levou o mandante a empreitar o
óbito alheio seja torpe, desprezível ou repugnante.

2. Na espécie, o recorrido teria prometido recompensa ao executor, a fim de, com a


morte da vítima, poder usufruir vantagens no cargo que exercia na Prefeitura Municipal
de Fênix.
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3. Recurso especial provido, para reconhecer as apontadas violações dos arts. 30 e 121, §
2º, I, ambos do Código Penal, e restaurar a decisão de pronúncia, restabelecendo a
qualificadora do motivo torpe, a fim de que o réu seja submetido a julgamento pelo
Tribunal do Júri, pela prática do delito previsto no art. 121, § 2º, I e IV, do Código
Penal.(REsp 1209852⁄PR, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado
em 15⁄12⁄2015, DJe 02⁄02⁄2016).
Portanto, enquanto para o r. julgado recorrido:
"Houve, no caso, evidente excesso ou equívoco, pois a
qualificadora do motivo torpe por paga não se comunica entre o
mandante e o executor do homicídio"
Já para o v. acórdão paradigma: “

"...a atual jurisprudência desta Corte Superior de


Justiça é no sentido de que a paga ou promessa de recompensa se
comunica tanto ao agente que executa a conduta descrita no artigo
121 do CP, quanto ao autor intelectual".
Nítida, pois, a semelhança das situações cotejadas e
manifesta a divergência de soluções.
Sendo assim, mais correta, a nosso ver, a solução
encontrada pela decisão do Colendo Superior Tribunal de Justiça.

4. DO PEDIDO

Ante o exposto, demonstrados fundamentadamente a


negativa de vigência à lei federal e o dissídio jurisprudencial, aguarda
o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO seja deferido o
processamento do presente RECURSO ESPECIAL por essa Egrégia
Presidência, bem como seu ulterior conhecimento e provimento pelo
Superior Tribunal de Justiça, para que seja cassada a decisão
impugnada, restabelecendo-se a decisão do Conselho de Sentença
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que condenou F. F. L. como incurso no artigo 121, § 2º, I, do Código


Penal por ter, mediante paga a terceiro, concorrido para o homicídio
praticado contra Valdemir Pereira Lopes

São Paulo, 1 de março de 2017.

JORGE ASSAF MALULY


PROCURADOR DE JUSTIÇA

JAIRO JOSÉ GÊNOVA


PROMOTOR DE JUSTIÇA
DESIGNADO

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