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ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

Seção do Estado do Rio de Janeiro


Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas
Av. Erasmo Braga, 115 – 3º andar Corredor D – Sala 310

Excelentíssimo Senhor Presidente do Tribunal de Justiça


Estado do Rio de Janeiro

“Não se confunde a denunciação


caluniosa com a conduta de quem
solicita à autoridade que apure e
investigue delito, fornecendo os
dados que dispõe (JSTJ, 1/1417).”

ORDEM DOS ADVOGADOS DO


BRASIL – SEÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, JANEIRO
autarquia especial com sede à Av. Marechal Câmara, 150 –
Centro, Rio de Janeiro – RJ, CEP 20020-080, vem,
respeitosamente a Vossa Excelência, impetrar, com fulcro no art.
5º, LXVIII, da Carta Federal, e, na forma dos artigos 647 e 648, I
do CPP, a presente ordem de

HABEAS CORPUS
com pedido de liminar

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em favor do advogado ***, brasileiro, separado, advogado, inscrito


na Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do estado do Rio de
Janeiro sob o nº ***, com escritório na ***, Petrópolis, nesse estado,
apontando, por imperativo legal, como autoridade coatora, o
juízo da 2ª Vara Criminal de Petrópolis, que recebeu denúncia contra
o paciente, apadrinhando ação penal carente de justa causa (Doc.
1), conforme se demonstrará a seguir.

I — PREVENÇÃO.

Encontra-se prevento para o julgamento


do feito a Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, em
vista do julgamento do habeas corpus nº 2006.059.04672, de
relatoria desembargadora Dra. Leila Albuquerque, motivo pelo
qual se requer seja o mesmo distribuído àquela relatoria.

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I — INTRODUÇÃO.

1. Porque em sede de remédio heróico (e tão-


só por isto) e para evitar se diga estar a impetrante a exigir profundo
exame de provas, o presente é instruído unicamente com a denúncia
combatida, e alguns documentos do processo civil, palco do fato
tido por criminoso pela írrita denúncia, somente para que possam os
magistrados melhor conhecer o contexto em que os fatos se deram.

I — FATOS.

2. O paciente patrocina os interesses de


credor de título executivo extrajudicial em demanda executiva
que tramita perante a 1ª vara cível da comarca de Petrópolis
(Doc. 2). Em tortuosa senda processual, viu-se o causídico frente
a devedor que frustrava a execução; citado, não pagava o débito
tampouco nomeava bens à penhora.

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3. Com o caminhar da execução, penhorou-


se o estabelecimento do executado, um restaurante. Ao cumprir o
mandado, a oficiala de Justiça deparou-se com o restaurante
tocado por uma nova administração. O devedor transferira a
propriedade de seu restaurante, prejudicando a execução (Doc.
3).

4. Frustradas algumas tentativas, e após


oficiar a JUCERJA por duas vezes, requereu-se a substituição
daquela pela penhora dos móveis e utensílios que compõem o
estabelecimento comercial, vindo o juízo a deferir a substituição
(Doc. 4).

5. Nesta nova diligência, as oficialas de


Justiça procederam ao início da penhora dos bens, mas aceitando
como verdadeiros os valores crivados pelo tino e fé do preposto
do próprio executado!

6. Aqui, abra-se um parêntese.

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7. Por certo que na data da realização


daquela penhora, 10 de fevereiro de 2005, não havia a inclusão
do inciso V no art. 143 do Código de Processo Civil, que define
as incumbências do oficial de Justiça. O inciso V, que prevê ao
oficial efetuar avaliações, foi incluído pela Lei nº 11.382/2006.
Naqueles idos, avaliações de tal natureza haviam de ser
realizadas por avaliadores oficiais ou, na falta destes, peritos
nomeados pelo juízo, segundo rezava a redação do art. 680 da Lei
Civil de Ritos, pela escrita da Lei nº 8.953/1994.

8. Em menoscabo do que a lei processual


regra, no entanto, as oficialas de Justiça certificaram que:

“procedemos ao início da penhora conforme


determinação e Auto em anexo. Ressaltamos que
a diligência foi acompanhada pelo funcionário
André Ricardo e o Gerente Elias Vieira que,
inclusive, atribuiu valores aos bens
penhorados para que chegássemos ao valor
aproximado da execução.”
(Grifo e itálico no original). (Doc. 5)

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9. A certidão atesta que os valores dos bens


penhorados foram atribuídos pelo preposto do sucessor do
executado. É amarrar cachorro com linguíça!

10. Fecha-se o parêntese.

11. Evidente que disso redundaria prejuízo ao


credor e à entrega da prestação jurisdicional...

12. Natural e lícito o reclame (que se viu


posteriormente) do advogado do exequente, ora paciente.

13. Dessarte, na defesa dos interesses do seu


constituinte, o paciente apresentou peça escrita juntando provas
(referências de preços) de que alguns bens foram avaliados em
valores consideravelmente acima da média do mercado.

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14. Na peça, o paciente teceu críticas à forma
pela qual as oficialas realizaram as diligências e a avaliação dos
bens penhorados, afirmando entender estar provado que
prevaricaram, requerendo fosse aberto procedimento “adequado à
espécie”.

15. Ante tal requerimento e diante de tais


provas, a juíza de Direito (arrolada como testemunha na inepta
denúncia) em exercício julgou ser devido determinar a abertura
de sindicância (na qual restaram inocentadas) em face dos
servidores mencionados.

16. Tempos após, as oficialas de Justiça


representaram ao Ministério Público acusando o advogado da
prática do delito de denunciação caluniosa, em virtude do que
foi oferecida e recebida denúncia (transcrita na nota de rodapé
abaixo) contra o advogado, vindo a mesma a ser cassada
através de ordem concedida em habeas corpus impetrado perante
o Superior Tribunal de Justiça (HC nº 66.195/RJ).1
1
A exordial primitivamente oferecida era inepta. Tanto assim que a
Ministra Maria Thereza de Assis Moura, em seu voto condutor, observou:

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17. Passados mais de dois anos da


apresentação da primeira denúncia, o Ministério Público
apresentou nova denúncia (Doc. 1), em substituição àquela, mas
praticamente idêntica, dela gêmea univitelina, tão sem justa causa
e inepta quanto.

18. Fazendo às vezes de nova vestibular,


encetou um processo que tramita capenga e natimorto mantendo-
se, da mesma maneira, sem justa causa, pelos mesmíssimos

“Pela leitura da exordial, a inépcia exsurge de maneira clara e, de


tão manifesta a imprestabilidade da peça inaugural, não é
possível sequer chegar a um juízo de tipicidade sobre o
comportamento.
Para bem ilustrar, transcreve-se a narração da incoativa:
‘Conforme consta dos autos, no dia 05 de agosto de 2005, às
13:41:52h o ora DENUNCIADO, de modo livre e consciente,
protocolou (fl. 38) sob o n. (...) petição na qual requereu a
instauração de procedimento administrativo contra as oficialas
de justiça FATIMA FIGUEIREDO DA COSTA e SOLANGE
MARIA DE AZEVEDO GONZALES imputando-lhes o crime de
prevaricação – art. 319 CP (fl. 40), do qual sabia que eram
inocentes.
Assim agindo, o ora denunciado encontra-se incurso nas sanções
do artigo 339 do Código Penal’.
Assim, como não é possível sequer divisar em que condições
fáticas ter-se-iam ocorrido as elementares do delito imputado,
não é factível proceder ao exame sobre a tipicidade.”

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motivos: não descreve conduta criminosa a ser imputada ao
defendente.2

19. Após o inicial recebimento da denúncia, e


apresentada resposta escrita, o juízo entendeu por recebê-la e dar
início ao processo penal contra o paciente, designando-se

audiência para início da prova de acusação, com a oitiva da juíza


de Direito Cláudia Wider, na qualidade de testemunha, para o dia
9/11/2009, às 13h (Doc. 1).

20. Estes os fatos.

II – MÉRITO.

a) Do elemento subjetivo do tipo do art. 339 do Código Penal.


Ausência de mínima demonstração de que o agente agiu com
2
Por esse motivo, suscitou o ajuizamento da Reclamação nº 3.417/RJ,
pendente de julgamento no Superior Tribunal de Justiça; o objeto daquele
writ é diverso deste, pois ali se pugna pela anulação da incoativa (sob o
entendimento de que a nova denúncia é repetição da primeira que fora
anulada por decisão daquela Corte), e aqui se pugna por pedido mais
extenso, pela concessão da ordem para trancar a ação penal.

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consciência da suposta falsidade da imputação para que se
inicie a ação penal. Inépcia. Atipicidade. Ausência de Justa
Causa para a ação penal. Hipótese de trancamento.
Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

21. A sucintíssima denúncia aduz contra o


paciente que:

No dia 05 de agosto de 2.005, por volta das


13:41 horas, nesta Comarca, o DENUNCIADO,
livre e conscientemente, deu causa à instauração
de procedimento

administrativo contra as Oficiais de Justiça,


Fatima Figueiredo da Costa e Solange Maria de
Azevedo Gonzales, imputando-lhes crime de
prevaricação do qual sabia serem inocentes,
conforme cópia de petição de fls. 40 e cópia de
decisão de fls. 72/77.
Assim agindo, encontra-se o denunciado incurso
nas penas do art. 339 do Código Penal.

22. Todavia, para a demonstração da


realização da conduta prevista no art. 339 do Código Penal exige-
se mais do que isso posto na inicial acusatória. Exige-se a
demonstração inequívoca de que o agente agiu com consciência

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da falsidade da imputação. E a denúncia, como se pode constatar
da leitura logo acima, não se desincumbiu minimamente desse
mister.

23. Em hipóteses tais, o Supremo Tribunal


Federal palmilha o bom caminho da jurisprudência no sentido de
que para que se configure o delito do art. 339, é preciso se
demonstrar de forma clara o dolo direto do agente, ou seja, que
tinha consciência da inocência de quem acusou perante a
autoridade, conforme se depreende do seguinte voto do ministro
Sepúlveda Pertence:

Não há que se falar, portanto, em crime de


denunciação caluniosa, por não estar
estampado, de maneira cristalina, que os

indiciados agiram dolosamente, tendo o


perfeito conhecimento de que a imputação era
falsa, pois para caracterizar-se o delito
previsto no art. 339 do CP exige-se o dolo
direto em relação ao conhecimento da
inocência do acusado, consoante firme
jurisprudência do STF (...). É mister que o
agente saiba que é inocente o acusado. Isto é,
que tenha agido com dolo direto, não bastando

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o dolo eventual, pois o agente precisa saber,
sem dúvida, que o imputado é inocente." (RT
568/352) Daí porque a vontade de realização da
justiça choca-se com o desejo de ver punidos
inocentes. Não fosse assim, sentir-se-ia o
cidadão inibido de um dever fundamental: o
de levar a eventual notícia de crime ao
conhecimento da autoridade competente,
solicitando sua investigação(...).
(STF, Inq. nº 2.094. 18/5/2005). (Grifamos).

24. Recentemente o Supremo Tribunal


Federal trancou, por unanimidade, ação penal por falta de justa
causa, no recurso ordinário em habeas corpus nº 85.023-5, de
relatoria do ministro Joaquim Barbosa, demonstrando a
imprescindibilidade da

denúncia demonstrar o dolo direto quando se tratar de crime de


denunciação caluniosa, aplicável ao caso como luva:

“O presente Recurso de Habeas Corpus visa ao


trancamento da ação penal de origem, tendo por
fundamento a ausência de justa causa em razão
da atipicidade da conduta e da existência de
excludente de antijuridicidade.

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Sr. Presidente, este Tribunal já firmou o
entendimento de que a configuração do crime de
denunciação caluniosa (art. 339, do Código
Penal)

exige o dolo direto quanto ao conhecimento da


inocência do acusado. Portanto, para a
configuração do tipo penal é imprescindível a
demonstração inequívoca da consciência do
agente quanto à falsidade da imputação, sendo
insuficiente a presença de mero dolo eventual.

Assim, tem o Ministério Público o ônus de, já


na denúncia, aduzir um lastro probatório
mínimo que evidencie, com suficiente
plausibilidade, o elemento subjetivo do tipo
penal em questão, qual seja, o dolo direto de
provocar investigação policial, processo judicial,
investigação administrativa, inquérito civil ou a
ação de improbidade administrativa, mediante
imputação de crime a alguém cuja inocência seja
inequivocamente conhecida pelo agente.
(...)

Diante da natureza fragmentária do direito penal,


não se deve admitir como justificativa idônea
para a instauração da ação penal a mera
afirmação genérica, sem provas, de que o réu

agiu com “intuito exclusivo de atribuir


falsamente a existência de crime”. De fato, o
único elemento fático aduzido na denúncia para
corroborar tal conclusão é a circunstância de que

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a sindicância instaurada para investigar os fatos
concluiu pela improcedência da representação, e
foi arquivada.

Considero que a mera improcedência da


representação não pode ser considerada razão

suficiente para que se conclua, sem mais, pela


existência de crime de denunciação caluniosa. Do
contrário, toda ação penal que venha a ser
julgada improcedente daria origem a outra ação
penal, por denunciação caluniosa.

Na ausência de elementos adicionais, deve-se


supor que o agente atuou sob o manto de
excludente de ilicitude, no “exercício legal de
direito” (o direito de petição aos órgãos
públicos, nos termos do art. 5º, XXXIV, da
Constituição).

Entendimento contrário teria a consequência


nociva de tolher a fiscalização dos poderes
públicos pelo cidadão, aumentando a
probabilidade de este sofrer abusos de variada
natureza.

(...)
O Ministério Público Federal, em sua
manifestação (fls. 238-241), opinou pela
denegação da ordem sob o argumento de que a
matéria objeto do writ diz respeito à análise de
prova, o que não se admite nessa seara.

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Contudo, se a denúncia não traz qualquer
elemento indiciário mínimo de prova de que o
recorrente ofertou a representação
administrativa com o mero intuito de
incriminar uma pessoa inocente, não é
permitido o seu prosseguimento, por evidente
falta de justa causa.

(...)
Do exposto, dou provimento ao recurso e
determino o trancamento, por ausência de justa
causa, da ação penal à qual responde o paciente,
em trâmite na 3ª Vara Criminal da Comarca de
Palmas – TO.
(STF, jul. 8/5/2007. 2ª Turma. un. RHC nº
85.023). (Grifamos e sublinhamos).

25. Como se vê da leitura dos precedentes


acima (sendo que o precedente imediatamente acima foi
proferido contra uma denúncia muitas vezes mais extensa que a
ora tratada), não merece prosperar a ação penal nestes termos.

26. Ausente o elemento subjetivo do tipo, a


ação penal deve ser trancada. Assim entende a Sexta Câmara
Criminal desta Casa, conforme se observa do seguinte julgado, de

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relatoria do desembargador José Augusto de Araújo Neto, no
qual se firma que nem mesmo investigação pode ser iniciada sem
que haja tais elementos:

HABEAS CORPUS. DENUNCIAÇÃO


CALUNIOSA. INSTAURAÇÃO DE
PROCEDIMENTO INQUISITORIAL.
AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DO
TIPO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
CONFIGURADO. TRANCAMENTO E
ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO. ORDEM
QUE SE CONCEDE.
1. Tendo a paciente - por se sentir lesada em
transação imobiliária em que julgava estar
comprando um terreno enquanto lhe fora
prometida, apenas, a cessão de direitos
hereditários - requerido à autoridade policial a
apuração dos fatos, não há que se falar em
denunciação caluniosa, dada a ausência do
elemento subjetivo do tipo, eis que ela, por
considerar o imputado responsável pelo ocorrido,
ao dar causa à investigação policial, não lhe
atribuiu crime de que o sabe inocente,
impondo-se, pois, o trancamento do inquérito
policial em que se passou a objetivar, por
requisição ministerial, a

apuração do crime tipificado no artigo 339 do


Código Penal. 2. Ordem concedida.

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(Habeas corpus nº 2007.059.03162. Des. José
Augusto de Araújo Neto. Julg. 21/6/2007.
Sexta Câmara Criminal).

27. Este é também o posicionamento da


Oitava Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, ao reconhecer
que só há crime de denunciação caluniosa quando consciente da
inocência do acusado, conforme a ordem concedida no writ nº
2005.059.06121, julgado em 19/12/2005, tendo por relator o
desembargador Valmir Ribeiro, conforme abaixo:

(...) Por sua vez, o crime de denunciação


caluniosa, para que se configure, exige que o
agente tenha a consciência da inocência do
acusado e que a sua ação tenha desencadeado, de
forma adequada e eficiente, a constrição sofrida
pela sedizente lesada.
(G.n.).

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28. E no presente feito, não há mínimo lastro,
não há o mais raquítico indício ou traço — como se depreende da
leitura da franciscana inicial acusatória: não se é possível
distinguir na acusação de que forma o agente teria
consciência do equívoco de seu reclame!

29. É ler!

30. Essa mera dedução, fruto da criação


mental do parquet, é rechaçada com veemência por nossos
Tribunais.

31. Conforme narra a írrita denúncia, o


paciente teria dado causa à instauração de procedimento
administrativo contra as oficialas de Justiça, sabendo-as
inocentes. Assim agindo, teria cometido a conduta prevista no art.
339 do Código Penal, o delito de denunciação caluniosa.

32. Todavia, não basta para a acusação dizer


que o paciente agiu “sabendo-as inocentes”.

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33. Tampouco pode, a acusação, abrir mão de


fundamentar seu pedido, fazendo menção a folhas do processo.

33. É preciso mais. É preciso muito mais que


isso para submeter um cidadão ao calvário do processo penal em
uma sociedade que se pretende democrática.

34. A decisão que recebeu a denúncia (Doc.


1), apesar de ter sido fundamentada no tocante aos elementos
objetivos do fato, deixou de fundamentar-se de forma
minimamente razoável no que diz respeito ao dolo direto, cuja
existência precisa — e os precedentes acima já deixaram isso
evidenciado — estar demonstrada, de forma cristalina, na
denúncia.

35. Neste ponto, a decisão que recebeu a


denúncia (pela segunda vez) peca e passa ao largo da questão.
Isso para não dizer da inépcia gritante da denúncia, que não
poderia ser recebida. Além de inepta, ela é abusiva (pois posta

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em termos tão sucintos que todos os requisitos exigidos em lei
para a elaboração de uma denúncia foram abandonados). O seu
recebimento, por certo, configura nítida coação ilegal.

36. A decisão que recebeu a denúncia faz


menção também aos documentos citados na incoativa, sem, no
entanto, valorá-los, o que mostra que, no ponto central tratado
neste writ — ausência de demonstração do dolo direto, sem
prejuízos de outras questões suscitadas e as de ordem pública —
o juízo não logrou se desincumbir satisfatoriamente de seu
mister.

37. É ônus do parquet demonstrar, ainda que


de forma concisa, como o paciente sabia que eram (analisando de
forma individualizada, em relação a cada uma das supostas
vítimas) inocentes (isso porque não se está nem mesmo a julgar
se eram inocentes).

38. Mas não. Comodamente e desrespeitando


as regras mínimas que regem o processo penal no tocante aos
requisitos da inicial acusatória, apenas se lança a afirmação solta

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na curtíssima denúncia de que o paciente sabia da inocência
daquelas oficialas que criticou perante o juiz nos autos do
processo civil.

39. Observa-se que o paciente apenas


apresentou os fatos que considerava irregulares ao juízo, no
processo de execução cível, requerendo a abertura do
procedimento “adequado à espécie”, deixando ao sereno alvedrio
do juízo o entendimento do que seria adequado à espécie, sendo,
assim, atípica a conduta.

40. Ademais, é inepta a incoativa ao omitir-se


de imputar conduta penalmente relevante, deixando de descrever
ato típico, não realizando, portanto, a exigência imposta pelo art.
41 do Código de Processo Penal. A denúncia omite-se em
demonstrar quando e como o paciente saberia da inocência das
pessoas contra as quais reclamou perante o juízo.

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41. No caso em vista não se consegue
vislumbrar que benefício obteria o advogado em dar causa a
sindicância administrativa em relação às oficialas de Justiça,
tampouco é possível imaginar minimamente de que forma o
agente saberia da inocência (e em que grau e especificidade) das
imputadas (e de forma individualizada, por certo, ou seja, em
relação a cada uma das duas oficialas de Justiça).

42. A denúncia não dá uma pista sequer.

43. Dessarte, resta cabalmente demonstrado,


com tais constatações, estar inepta a denúncia ao omitir-se em
imputar conduta penalmente relevante, deixando de descrever ato
típico, não se realizando, portanto, a exigência imposta pelo art.
41 do Código de Processo Penal, além de retirar ao processo a
justa causa exigível para sua existência, nos termos do art. 395, I,
do CPP.

b) Exercício regular da advocacia. Imunidade.

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44. O paciente encontra-se processado


criminalmente em razão do exercício regular da advocacia.
Conforme prevê o Estatuto da Advocacia em seu art. 2º, II:

Art. 2º O advogado é indispensável à


administração da justiça.

(...)§ 2º No processo judicial, o advogado


contribui, na postulação de decisão favorável ao
seu constituinte, ao convencimento do julgador, e
seus atos constituem múnus público.

45. O paciente, advogado, na defesa dos


interesses que lhe foram outorgados por seu cliente através do
regular mandato, postulava em juízo, buscando êxito em
execução civil, e não poderia, em momento algum, deixar passar
qualquer tipo de jaça no processo civil que merecesse, por parte
do juízo, a atenção devida.

46. Neste mister, denunciando aquilo que


acreditou estar havendo de errado no processo, agiu com a
independência e o destemor preconizados pelo Código de Ética
da Ordem dos Advogados do Brasil (art. 2º, II).

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47. Por certo que seria o anti-Direito punir


quem age conforme tais regras deontológicas.

48. Não é por menos que o Estatuto da


Advocacia estabelece, em seu art. 2º, §3º, que “no exercício da
profissão, o advogado é inviolável por seus atos e
manifestações, nos limites desta lei.” É porque o advogado deve
atuar sempre de modo altaneiro e combatente na leal luta pelos
interesses de seu constituinte, porque assim exigem as lides,
porque assim é a vida.

49. O agente atuou, ademais, no exercício


regular de um direito, o direito de petição aos órgãos públicos
(art. 5º, XXXIV, da CRFB). Entendimento contrário significaria
tolher do cidadão seu poder de fiscalização dos poderes públicos,
aumentando a probabilidade de este sofrer abusos de variada
natureza.

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50. Por esses motivos, de igual forma, merece
a ser trancada a ação penal, diante da absoluta falta de justa
causa para seu prosseguimento.

III - PEDIDO LIMINAR.

51. O fumus boni iuris exsurge do corpo


dessa mandamental e consiste no segundo recebimento de írrita
denúncia, dando início ao processo penal sem justa causa contra
o paciente, diante de conduta atípica em exercício regular de
um direito, sob o pálio da imunidade profissional.

52. O periculum in mora reside no fato de


que em 29/9/2009 a autoridade reclamada recebeu a írrita
denúncia, dando início ao processo penal designando audiência
para início da prova de acusação, com a oitiva da juíza de Direito
Cláudia Wider para o dia 9/11/2009, às 13h (Doc. 1).

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53. Presentes os requisitos autorizadores da


cautelar, requer-se a concessão de medida liminar para que se
determine o sobrestamento da ação penal n° 2006.042.004096-2,
em trâmite perante a 2ª vara criminal da comarca de Petrópolis,
estado do Rio de Janeiro, até o julgamento final deste remédio
heróico.

IV – PEDIDO.

54. No mérito, confirmada a medida liminar,


requer-se seja concedida a ordem para o fim de trancar o
processo penal nº 2006.042.004096-2, em trâmite perante a 2ª

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vara criminal da comarca de Petrópolis, estado do Rio de Janeiro,
pelos fundamentos acima expostos.

Pede deferimento.

Rio de Janeiro, 7 de outubro de 2009.

Rodrigo de Oliveira Ribeiro


Adv. OAB-RJ 127.804
Advogado-Delegado da Comissão de Defesa,
Assistência e Prerrogativas da OAB-RJ

Marco Enrico Slerca


Adv. OAB-RJ 22.986
Presidente da Comissão de Defesa,
Assistência e Prerrogativas da OAB-RJ

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