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PORTUGUÊS INSTRUMENTAL - CCJ0129

Título
Caso Concreto - Semana 14

Descrição
Caso Concreto

Desenvolvimento
A Língua coloca à disposição dos falantes uma série de recursos que precisam os
limites dos sentidos da fala e de sua utilização. O emissor pode deixar marcas no discurso
que caracterizem assunção ou isenção de responsabilidade, obrigatoriedade, necessidade,
certeza, hipótese, probabilidade ou possibilidade.
Esses recursos recebem o nome de modalização, e podem se referir tanto ao conteúdo
dos enunciados (o dito), quanto à forma peculiar como o enunciador se coloca frente ao
discurso (o modo). Assim, a análise dos processos de modalização propicia verificar o
posicionamento do enunciador frente à construção do enunciado, bem como também sua
intervenção avaliativa no conteúdo da mensagem.
Muitas são as formas que denunciam marcas da subjetividade do autor no discurso.
Um dos processos gerais de modalização é o emprego dos reformulativos, que, como o
de tantas outras expressões modalizadoras, denuncia a presença do enunciador e serve
para descrever o grau de adesão ao conteúdo de sua mensagem, ou ao próprio modo de
enunciá-la.
Tais expressões exprimem não só o quanto o enunciador acredita no que está
proferindo, como denotam o grau de adesão às teses defendidas.

Os reformulativos podem ser:

a) Retificadores totais- os que retificam radicalmente uma porção anterior do texto: ou


melhor, isto é, aliás, digo, minto...
O encontro é no sábado, ou melhor, no domingo.

b) Retificadores parciais- em que só a parte retificada é vista como inverdade, o que não
inviabiliza parte da asserção.
Na verdade, na realidade, para ser mais exato, são expressões que servem para
indicar graus de adesão de quem fala ou escreve, em relação ao conteúdo proposto.

c) Ratificadores- os que enfatizam o que veio expresso antes, por meio de: de fato, com
efeito, realmente.
A ratificação visa convencer a outrem da veracidade do dito.

d) Explicadores- cujo objetivo é esclarecer o próprio pensamento, numa atitude bastante


?didática? de explanação: Ou seja, isto é, ou expressões que se equivalham a elas.

e) Exemplificadores- há os que se referem a todo o conjunto anterior: a saber; e os que se


aplicam a apenas a alguns elementos: por exemplo; tais como.
Exemplos:.

1- ?A melhor época de comer ?catado?, isto é, carne de caranguejo, é entre maio e agosto
quando o ?playboy? do mangue está mais gordo.?
(O Globo. Caderno Boa viagem,
19/06/2003.

A expressão ?catado? por ser regional, necessitou ser traduzida, em nome da


clareza, como atesta a continuidade do texto, com a expressão isto é. O marcador
explicativo denota a preocupação do enunciador com o entendimento do leitor de seu
texto.

2 - Para falar a verdade, nem chega a haver uma crise específica na vida nacional. [...]
Tampouco o problema de violência é novo, é endêmico, nada tem de epidêmico.

Nos exemplos citados fica evidente que o uso dos modalizadores como estratégias
utilizadas pelo emissor na intenção de adequar-se às situações comunicativas com que
se depara. Ele modaliza seu discurso para a produção de um dado texto que está quase
sempre subordinado à sua recepção.

Como mais um exemplo, trazemos à cena, fragmento do caso concreto de Augusto


Carlos Eduardo da Rocha Monteiro Gallo e Margot Proença Gallo (ELUF, Luiza Nagib.
A Paixão no banco dos réus. Casos passionais célebres: de Pontes Visgueiro a
Lindemberg Alves. 4 ed. São Paulo Saraiva , 2014, p.53):

?No dia em que foi assassinada, Margot trajava blusa de algodão branca e saia
xadrez nas cores verde e vermelho. Sapatinho de salto baixo, parecia uma colegial.
Tinha 37 anos de idade.

No fragmento dado, notamos que a própria descrição da roupa usada por Margot, no
dia do crime, é ambígua, pois na implicatura textual ou por meio do não dito, podemos
ler que Margot procurava aparentar ser bem mais jovem, devido ao modo como se vestia,
pois há toda uma seleção vocabular direcionada para esse efeito de sentido, como
?sapatinho de salto baixo?; ?colegial? etc., que marca o posicionamento do sujeito
enunciador.
A última frase desse fragmento, inclusive, reforça bem esse posicionamento, porque de
forma intencional é omitido um conector ligando as orações para priorizar a construção
intencional de um período simples, bem curto, destacando apenas a idade da vítima - ?37
anos?.

A análise dos modalizadores evidencia como um falante considera seu próprio


enunciado, indicando linguisticamente que o que diz está inteiramente assumido ou que
está limitado a uma relação entre o sujeito e seu discurso.

A modalidade/modalização no discurso pode se manifestar sob diversas formas. Mais


tradicionalmente, é correlacionada ao tempo/modo verbal. Assim, os modos verbais têm
seu emprego ligado aos tipos de atos ilocutórios, ou seja, às ações intentadas quer pelo
emissor quer pelo receptor do discurso:

a) o presente do indicativo reflete estados de coisas reconhecidos pelo locutor como


necessário, obrigatório ou com alto grau de probabilidade e certeza.
Nas assertivas, encontramos expressões como eu afirmo que...; nas interrogações,
eu pergunto se...
Esse uso implica dizer que o enunciado é assumido;

b) o futuro do pretérito do indicativo reflete baixo grau de certeza.


Frases como eu afirmaria que... ou eu perguntaria se ... revelam que o enunciado não é
assumido;

c) o imperativo revela que os estados de coisas são reconhecidos pelo locutor como
contingente (eventual).
Divide-se em imperativo (eu ordeno que...) e optativo (eu desejo que...);

d) o modo subjuntivo enuncia que os estados de coisas são reconhecidos pelo locutor
como permitido, facultativo ou contingente.
É o modo da ordem (presente: que eu ordene, que tu ordenes, que ele ordene)...
ou do desejo (se eu ordenar, se tu ordenares, se ele ordenar; quando eu ordenar, quando
tu ordenares, quando ele ordenar).

Observamos, ainda, a modalização nos verbos modais. Algumas formas estão


lexicalizadas, ou seja, constroem-se com outros para modalizar os enunciados. Estes
adquirem estatuto de modalidades ligadas ao conhecimento ou ligadas ao dever. Revelam
a apreciação do enunciador:

a) necessidade ligada ao conhecimento:


Entendo que a indenização deve/deveria ter um caráter de reparação do dano
causado.

b) possibilidade ligada ao conhecimento:


Quando reina a anomia social, qualquer ação criminosa pode se transformar em
discurso pró-ditadura.
Os assassinos deveriam ter, no máximo, quinze anos.

c) necessidade (ligada ao dever): indica obrigatoriedade.


Como juiz, tenho que julgar imparcialmente.
Precisamos atuar junto às comunidades carentes.

d) possibilidade (ligada ao dever):: indica permissão.


O Estado não pode/deve permitir o descontrole social.

Outras formas de modalização denotam a apreciação do enunciador:


a) os advérbios ou locuções adverbiais: naturalmente, visivelmente, com certeza,
obviamente;
b) certas expressões seguidas de que + oração ou justapostos ao enunciado: é claro (que),
é óbvio (que), é evidente (que);
c) os marcadores de foco: até, inclusive, mesmo, também
d) os marcadores de inclusão; só, só mesmo, somente, apenas
e) Marcadores que exprimem restrição ou seleção; é que
f) Expressão que permite um contraste entre uma informação explícita e outra(s)
implícita(s): eis que permite enunciar um fato como algo repentino ou inesperado
g) indica incerteza probabilidade: talvez
h) as conjunções: se, ainda que, já que;
i) os verbos que explicitam o ato praticado pelo falante: estranhar, negar, gostar;
j) a entoação: frase exclamativa, frase interrogativa retórica.

As modalizações denotam, também, os meios de manifestação das intenções e interesses


do interlocutor:

a) os predicados seguidos de infinitivo ou que + oração: é proibido o fumo em ambientes


fechados; é necessário que se faça a revisão dos crimes considerados hediondos;
b) os auxiliares modais: precisar, ter que/de, dever, no sentido de obrigação;
c) os verbos que explicitam o ato praticado pelo locutor: ordenar, afirmar, perguntar,
solicitar;

Por fim, a modalização pode ser observada em diferentes recursos utilizados pelo
emissor/receptor, envolvendo inclusive a mudança de registro para alcançar um
determinado objetivo na interação verbal. Percebemos, com isso, que o texto é construído
com maior ou menor grau de intenção de vetar certas ações e atitudes e impor outras, e
que o estudo da modalização importa diretamente no entendimento dos implícitos do
discurso.

Exercício:

Texto-base :

USUÁRIOS DE DROGAS À SOLTA REALIMENTAM O BANDITISMO.


TRATAMENTO COMPULSÓRIO
OU PRISÃO JÁ?

Como é que os que frequentam as cracolândias conseguem dinheiro para comprar


drogas? Roubando e assaltando, não é? Então, por que deixá-los à solta? A polícia
deveria patrulhar os locais frequentados por drogados e promover arrastões até diários,
levando todos os drogados para a prisão, nem que fosse por alguns dias e para fichá-los a
fim de que não pudessem se organizar para cometer roubos e assaltos.
O drogado deveria ser intimado a se tratar em clínicas de desintoxicação e se fosse
encontrado no mesmo local deveria ser preso por pelo menos um ano inteiro, para lhe
tirar o vício. Só assim é que o banditismo poderia começar a diminuir.
(O texto postado no ano de 2010, em ?Yahoo! Respostas?, um site específico em
que os membros da comunidade fazem perguntas sobre qualquer tema e recebem
respostas de outras pessoas que compartilham fatos, opiniões e experiências pessoais)

Questões:

1. O texto é iniciado com três interrogações. Qual a contribuição do uso desse recurso
para a construção da argumentação?

2. Por que o emprego do termo ?cracolândia??

3. ?Tratamento compulsório ou prisão já?? Com que intenção o autor utiliza o advérbio
já?

4. ?A polícia deveria patrulhar os locais frequentados por drogados e promover arrastões


até diários.? Que noção de sentido as palavras em destaque imprimem ao texto?

5. Explique o uso do gerúndio na expressão ?roubando e assaltando?

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