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TEXTUALIDADE

AULA 5

Prof. Jeferson Ferro


CONVERSA INICIAL

Olá! Nesta aula, vamos investigar a respeito das classificações que


damos a diferentes tipos de texto. Isso nos ajuda a pensar no que os textos
fazem, quais são suas intenções e como esses objetivos se organizam em
modelos que são convencionados.
Os temas que abordaremos são:

1. Tipos textuais;
2. Gêneros textuais 1;
3. Gêneros textuais 2;
4. O roteiro;
5. O texto acadêmico.

CONTEXTUALIZANDO

O que um texto quer? É possível dizer que o texto tem uma intenção?
Sim, é possível, e essa intenção se manifesta no seu gênero e na tipologia
empregada. Por exemplo: um texto argumentativo quer nos convencer de
alguma ideia ou conceito; já um texto narrativo quer contar uma história.
Narrar, descrever e argumentar são as “ações” que os textos executam,
e essas ações indicam sua tipologia. Além disso, nossa cultura organiza os
textos em categorias mais abrangentes, conjuntos de textos que fazem
determinados usos desses recursos da linguagem para atingir seus propósitos
comunicativos: um conto, por exemplo, deve narrar e descrever – mas não é
provável que ele desenvolva uma argumentação, certo?
Portanto, ao longo desta aula, vamos pensar a respeito dos diferentes
tipos de texto e das maneiras como eles se organizam em gêneros. Isso significa
compreender suas intenções, sua estrutura interna e a relação que eles
estabelecem com o contexto social e cultural.

TEMA 1 – TIPOS TEXTUAIS

A tipologia textual demarca características linguísticas de um texto que


podem ser facilmente identificadas na sua estrutura. Essa classificação em
língua portuguesa apresenta alguma variação de nomenclatura, mas em geral

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podemos dizer que há cinco tipos textuais mais facilmente identificáveis:
narrativo, descritivo, argumentativo, expositivo e injuntivo. Também é possível
encontrar textos que misturam essas tipologias, portanto, é mais útil pensar nelas
como “coisas que os textos fazem” do que como rótulos que identificam os
textos, sendo que eles podem fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo. O que
vale, nesse caso, é definir qual é a intenção do texto. Vejamos como funcionam
esses cinco tipos.

1.1 Narrativo

Trata-se de uma tipologia fortemente ligada aos gêneros literários da


prosa, mas não apenas. Usamos a narrativa quando contamos algum fato para
um amigo, quando descrevemos um acidente num boletim de ocorrência,
quando narramos o desenrolar de uma partida de futebol etc. São muitos os
eventos da vida que nos levam a empregar essa tipologia. Vejamos exemplos:

a) A equipe começou tocando a bola com velocidade e partiu para o ataque.


Logo aos cinco minutos de jogo, Leo foi à linha de fundo após receber
lançamento de Juninho e cruzou para uma cabeçada perigosa de Marcão,
que acertou o poste esquerdo do goleiro Juca.
b) “Benedito arrasta os pés de tanto correr estrada e pular arame farpado.
Dá boa-noite à mulher, com a panela no fogo. Entre gemidos, senta diante
da gamela para lavar os pés. Esfrega nos dedos as manchas secas de
sangue e enxuga num trapo qualquer” (Trevisan, 2014).
c) Nesse dia, ela me disse que não queria mais ver minha cara na frente, me
bloqueou no WhatsApp e no Facebook. Nunca mais falei com ela.

Narrar implica descrever uma sequência de ações que se sucedem no


tempo. Por isso, além de ações (verbos) propriamente, o texto narrativo faz uso
de palavras que marcam o passar do tempo, como “logo aos cinco minutos”,
“nesse dia”, “nunca mais”.
Outro aspecto importante desse tipo de texto é a voz narrativa, ou seja,
quem narra: trata-se de um texto em primeira pessoa (eu) ou em terceira (ele,
ela)? No primeiro exemplo, o texto fala de uma equipe de futebol (terceira
pessoa); no segundo, de um personagem, Benedito (terceira pessoa); no último,
temos uma mistura de “eu” e “ela” (primeira e terceira pessoas).

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Na publicidade, a narração é empregada quando se faz o uso de
personagens, por exemplo: “Maria queria comprar uma casa, mas não tinha
dinheiro. Até que um dia, conversando com seu gerente do banco XYZ,
descobriu que era possível…”.

1.2 Descritivo

A descrição frequentemente se mistura com a narração. No segundo


exemplo mencionado acima, lemos que Benedito se senta “entre gemidos” e que
enxuga as manchas “secas de sangue”. De fato, é muito difícil encontrarmos um
texto narrativo que não use a descrição em alguma medida.
A descrição é bastante usada na publicidade também, já que é necessário
descrever as qualidades dos produtos. Veja este exemplo:

• A Pipoqueira XYZ é a forma mais saudável de preparar sua pipoca. Isso


porque ela prepara até 100 gramas em aproximadamente 3,5 minutos,
sem utilizar uma gota de óleo! Basta colocar o milho que o ar quente
transformará os grãos em uma deliciosa pipoca que sai quentinha direto
para a tigela! Com a tampa dosadora, você vai preparar as pipocas na
quantidade ideal. Os pés antiderrapantes oferecem muito mais
segurança; e o porta fio, mais facilidade para guardar.

Os adjetivos são fundamentais no texto descritivo: saudável, quente,


deliciosa, ideal. Mas também podemos entender que um texto que “pinta um
cenário” é de natureza descritiva, como nesse roteiro para um comercial fictício:

• Homem branco, de aproximadamente 40 anos, vestindo um paletó e


segurando uma mala executiva chega em casa cansado e desaba no
sofá. Ele levanta a cabeça e enxerga a garrafa de whisky XYZ na
cristaleira. Imediatamente se abre um sorriso no seu rosto e entra o
slogan.

1.3 Expositivo

Chama-se texto expositivo aquele em que se transmite alguma


informação de forma direta. É o caso dos verbetes de dicionário e de
enciclopédia, por exemplo. Esse tipo textual está fortemente ligado à área da

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ciência, em que se faz a exposição de dados ou mesmo a definição de termos;
e também ao jornalismo, especificamente nos textos de caráter informativo, já
que o texto expositivo é aquele que se concentra na tarefa de transmitir uma
informação. Por exemplo:

• “Em mais uma edição inédita na manhã de sábado (20), o Ciência é Tudo
apresenta a tecnologia por trás dos satélites e de que forma eles facilitam
a comunicação global por sinais de TV, internet e telefone. O programa
vai ao ar às 8h30, na TV Brasil” (TV Brasil, 2020).

1.4 Argumentativo

Argumentar significa defender uma ideia e tentar convencer seu


interlocutor de que você tem um ponto de vista válido, certo? Para isso, pode-se
contar uma história, descrever um cenário, expor fatos e dados etc. Mas o que
caracteriza o texto argumentativo sob o ponto de vista da linguagem?
Há certas construções retóricas bastante comuns na argumentação.
Vejamos algumas delas:

a) Relações de causa e consequência: “como o governo não deu a atenção


necessária ao problema no início do ano, hoje ele se tornou tão grande
que não é mais possível resolvê-lo de forma simples.”
b) Afirmações categóricas: “estamos vivendo o pior dos cenários possíveis.”
c) Formulação de hipóteses: “se o país retomar as reformas, poderá crescer
até 5% no segundo semestre, pois criará um ambiente de otimismo no
mercado”.
d) Chamado à ação: “precisamos agir agora, antes que seja tarde. Todos
aqueles que entendem a gravidade do problema têm a obrigação moral
de assumir uma posição clara neste momento”.
e) Conclusões: “por causa disso, nossa única alternativa agora é aguardar”.

Entre os textos argumentativos clássicos, estão os ensaios e artigos de


opinião. Na publicidade, a argumentação utiliza abordagens mais sutis, de forma
indireta, como nas sugestões, por exemplo: “você não vai querer perder a melhor
chance do mercado, não é?”. O convencimento na linguagem da propaganda é
feito por meio de uma combinação de elementos verbais e não verbais, que
normalmente recorre ao apelo emocional.

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1.5 Injuntivo

Esta tipologia textual se refere à ideia de ordem, comando. É o que


encontramos em normas, regulamentos, receitas de culinária e também na
publicidade. Injunções são, portanto, determinações, exigências.
O texto injuntivo é marcado pela utilização dos verbos imperativos. Por
exemplo, numa receita de bolo: “junte os ovos com a farinha e bata até criar uma
massa homogênea”. Também é o caso da utilização dos verbos no infinitivo,
para descrever condições que devem ser observadas. Como num regulamento:
“o candidato deve ser maior de 18 anos e ter carteira de habilitação”. Na
publicidade, o imperativo é também bastante comum: “não compre agora, espere
até o próximo final de semana”.

Saiba mais

Acesse o livro Análise linguística nos gêneros textuais, de Teresa Cristina


Wachowicz. Leia o capítulo 3: “Da composição às sequências textuais” (p. 49).

TEMA 2 – GÊNEROS TEXTUAIS 1

Ao falarmos sobre os tipos textuais, vimos como os textos empregam


certas construções linguísticas que servem a determinados propósitos, ou seja,
as suas intenções. Agora, falaremos sobre os gêneros textuais, que são modelos
estabelecidos por convenções culturais, rótulos que definem conjuntos de textos
definidos por seus usos e características formais.
O linguista Luiz Antônio Marcuschi (2007, p. 22-23) define que gêneros
textuais são os “textos materializados que encontramos em nossa vida diária e
que apresentam características sociocomunicativas definidas por conteúdos,
propriedades funcionais, estilo e composição característica”. Esses rótulos
costumam ser objeto de discussão e as fronteiras entre os gêneros muitas vezes
se confundem. Ainda assim, os gêneros servem bem a propósitos comunicativos
na medida em que representam conjuntos de textos cuja construção e propósito
seguem convenções. Sabemos distinguir automaticamente entre um e-mail, um
anúncio, um conto de terror, um relatório, uma receita médica, uma conversa no
WhatsApp etc.

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Podemos pensar na publicidade como um grande gênero textual cujo
principal representante é o anúncio publicitário. Na publicidade, o texto é livre
para empregar qualquer recurso comunicativo que o ajude a atingir seu objetivo:
convencer. Observe o anúncio abaixo, publicado em uma revista brasileira há
quase um século.

Figura 1 – Anúncio da marca Lacta na revista Ilustração Paranaense, de


novembro de 1927

Fonte: Revista Ilustração Paranaense, nov. 1927.

Entre as características definidoras deste gênero, estão:

• o uso de linguagem mista: verbal e não verbal;


• a brevidade do texto: um anúncio deve ser lido em poucos segundos;
• o apelo emocional: o anúncio evoca um sentimento, uma emoção, como
em “o divino Lacta”; o uso criativo da linguagem: como nos slogans, que
buscam criar uma expressão formal exclusiva para se referir ao produto,
ou na poesia empregada no anúncio do chocolate reproduzido acima.

Sobre este último aspecto, destaca-se o uso poético da linguagem: um


slogan precisa criar uma expressão linguística única, inconfundível, que se liga
ao produto de forma definitiva. Também é bastante comum na linguagem
publicitária o uso da função conativa (vide aulas anteriores), em que o texto “dá
uma ordem” ao leitor: vá, compre, faça, seja etc.

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A publicidade certamente usa recursos da linguagem literária. Na
literatura, por sua vez, podemos distinguir dois grandes conjuntos: a prosa e a
poesia. O gênero poético é aquele em que a forma de expressão, o como se diz
algo, está em evidência. Compare os dois textos reproduzidos abaixo:

É o amor
Que mexe com minha cabeça [...]
(Trecho de É o Amor, de Zezé di Camargo)

Amor é fogo que arde sem se ver,


é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;


é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;


é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor


nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor.
(Luís Vaz de Camões)

Os dois textos falam do amor e são construídos com métrica (estrutura


que repete o número de sons/sílabas por verso) e rimas. No caso de Camões, a
métrica fixa do soneto decassílabo; já na letra da canção, há uma métrica própria
(5, 15, 15, 15). Ambos recorrem à linguagem figurada — “fogo que arde sem
ver”, “veio como um tiro certo no meu coração” —, criando assim sentidos
metafóricos. São criações que buscam uma construção própria de linguagem
(pode-se discutir em que medida) para tratar do tema escolhido.
Isso não significa, no entanto, que os dois textos dizem a mesma coisa,
ou que se equivalem artisticamente — aí entraríamos numa discussão de mérito
artístico, que não nos cabe fazer aqui. Ainda assim, podemos entender que tanto
Camões quanto Zezé di Camargo buscam em sua inspiração poética construir
uma forma de expressão original para o problema do amor. E essa motivação
também existe na publicidade, especialmente no caso dos slogans, que
precisam ser criações únicas — um slogan que parece cópia de outro já existente
nunca vai funcionar, não é mesmo?
A poesia moderna (especialmente a partir do século XX) se afastou da
métrica e da rima e se aproximou da linguagem da prosa. Um dos grandes

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poetas modernos da língua portuguesa foi Fernando Pessoa (1888-1935), que
escrevia poemas como este, que já foi adaptado pela publicidade e também para
um roteiro de novela:

Poema em linha reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.


Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem
pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
[…]
(Álvaro de Campos – pseudônimo de Fernando Pessoa)

Na prosa, os dois gêneros principais são o conto e o romance. O conto é


uma narrativa curta, centrada em um conflito que envolve alguns personagens e
que deverá ser resolvido até o final da narrativa. Observe os trechos de abertura
e fechamento do conto Curriculum Vitae, do escritor brasileiro Rubem Fonseca:

Eu estou sentado na cama enquanto, de costas para mim, sentada em


frente a um espelho, ela penteia os cabelos. Daqui a pouco ela vai
embora, mas isso já não tem mais a importância que tinha antes. Ela
sempre demora um tempo enorme penteando os cabelos.
[…]
Ela responde: e depois, o que aconteceu?, mas sem o menor interesse,
a nossa brincadeira já terminou e é hora de ir para casa. (Sem saber a
verdade.) Digo para a mulher: a menina de dezessete anos esqueceu
o rapaz, e ele também esqueceu a mocinha. (Não, não, ele não
esqueceu a mocinha, mas devia tê-la esquecido: todo homem é uma
ilha, vamos deixar de poesia.)

Podemos perceber que o texto tem um narrador em primeira pessoa (um


personagem da história que narra algo que acontece com ele) e que a ação se
desenvolve na interação entre dois personagens apresentados já no começo. O
conto é uma narrativa curta, de impacto, e por isso precisa prender a atenção do
leitor logo de início, apresentando o conflito que vai mover a narrativa, que

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caminha em direção à sua conclusão, sem digressões ou derivações em
narrativas paralelas.
O romance, por sua vez, é uma forma narrativa longa, mais complexa,
que se desenvolveu ao longo dos séculos – considera-se Dom Quixote, de
Miguel de Cervantes, 1605, seu modelo fundador –, alcançando seu momento
de maior proeminência entre os séculos XIX e XX. Assim como no conto, não há
uma extensão padrão para o romance, mas ele será uma narrativa que
apresenta vários conflitos e personagens, geralmente cobrindo um espaço
temporal longo (como a vida inteira de uma pessoa). Grandes romancistas da
literatura universal escreveram obras que foram essenciais ao desenvolvimento
da cultura de seus países, ampliando a compreensão sobre sua realidade e
construindo literariamente uma nova forma de entender a subjetividade humana.
Entre esses artistas, podemos citar o brasileiro Machado de Assis, a inglesa Jane
Austen, o francês Gustav Flaubert, o norte-americano Mark Twain, o russo
Fiódor Dostoiévski e o alemão Thomas Mann.
O pesquisador inglês Ian Watt (2000) identifica no romance moderno, que
se consolida no movimento realista do século XIX, uma nova estética centrada
em dois elementos, a caracterização dos personagens e a descrição do cenário:
“o romance certamente se distingue de outros gêneros e formas anteriores da
ficção pela grande atenção que dedica sistematicamente à individualidade de
seus personagens e à detalhada apresentação do ambiente” (Watt, 2000, p. 17-
18). Podemos dizer que esse interesse pelo indivíduo, marca central do
romance, é uma característica definidora das sociedades capitalistas em que
vivemos. Algo que se exacerbou ainda mais nas últimas décadas, quando
nossos projetos de vida se tornaram projetos de construção de uma identidade,
especialmente evidente na duplicação de nossas existências no ambiente virtual.
A publicidade, por sua vez, se constrói em grande medida a partir desse desejo
que todos temos de nos sentirmos únicos.
Ao longo do século XX, o romance perderia gradualmente sua relevância
como forma narrativa na sociedade na medida em que o cinema assumia esse
papel. Hoje, com a ascensão das séries de TV e de outros conteúdos
audiovisuais, a prosa literária ocupa um espaço ainda mais restrito na vida das
pessoas. No entanto, não devemos nos esquecer de que a literatura de ficção
continua sendo a gênese de grande parte do conteúdo ficcional que

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consumimos. É o caso de séries muito populares, como O conto de Aia, assim
como franquias de cinema como Jogos mortais, que nascem como romances
para depois ganhar as telas e os milhões de fãs pelo mundo.

Saiba mais

Que tal assistir à cena em que o ator Osmar Prado interpreta o poema de
Álvaro de Campos, como uma fala de seu personagem na novela O clone
(2002)? Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=lti9RLys-48>.
Você pode ouvir o conto Curriculum vitae, na íntegra, nesta edição do
programa “Nocaute por Escrito”. Disponível em:
<https://www.uninter.com/radio/nocaute-por-escrito1>. Acesso em: 15 jul. 2020.

TEMA 3 – GÊNEROS TEXTUAIS 2

Vamos agora dedicar um pouco de atenção a gêneros típicos do mundo


da imprensa. Se a literatura é uma fonte de inspiração para a publicidade, o
âmbito do jornalismo é o espaço em que a publicidade circula no seu dia a dia,
pois os veículos e canais da imprensa são também aqueles em que a publicidade
vive. Se por um lado esses dois campos da grande área da comunicação
trabalham com objetos distintos – o jornalismo com a realidade, a publicidade
com os desejos –, é inegável que eles se cruzam em diversos momentos, pois a
publicidade também tem um papel informativo, e mesmo quando não tem, não
pode viver alheia à realidade.
Podemos dividir os gêneros jornalísticos em dois grupos: informativos e
opinativos. Essa divisão é em grande medida aproximativa, já que na maioria
dos casos os dois grupos se misturam. Assim, podemos entender que a notícia
e a nota são textos essencialmente informativos, enquanto os artigos e editoriais
são textos opinativos. Reportagens, resenhas e entrevistas são textos mistos,
que podem ser mais informativos ou opinativos, dependendo do caso. Vejamos
alguns exemplos:

Enquanto a indústria nacional amargou uma queda de 18,8% na


produção em abril, a fábrica de medicamentos Vitamedic, de Anápolis
(no estado de Goiás, a 60 km da capital), trabalhou 24 horas por dia
para dar conta das encomendas de seu produto mais popular: a
ivermectina, usado tradicionalmente contra vermes, sarna e piolho. A
fábrica responde pela produção de mais de 80% do remédio no Brasil.
E, nessa fábrica, produzir 24 horas por dia não é força de expressão:
ela contratou mais empregados, comprou equipamentos e instituiu o

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terceiro turno de oito horas. Mesmo assim, não consegue suprir a
demanda desde que o remédio começou a ser associado ao
tratamento da covid-19. Tem encomendas para os próximos dois
meses, mantido o ritmo atual de produção, sem parar. (Lobato, 2020)

O texto de Elvira Lobato é uma reportagem. A exposição de dados e


informações é seu aspecto dominante, o que lhe confere um caráter informativo
dominante. No entanto, a reportagem constrói uma interpretação da realidade
que busca retratar, apontando para a conclusão de que o uso de medicamentos
contra o coronavírus, sem comprovação científica de eficácia, rendeu dividendos
políticos a alguns agentes públicos.
Mesmo quando um texto não apresenta em sua superfície marcas típicas
da opinião pessoal do autor, como o uso de adjetivos, por exemplo, a
organização e disposição das informações já representam uma dada
interpretação da realidade. Poderíamos questionar a jornalista sobre as escolhas
que ela fez, o que decidiu mostrar e o que preferiu deixar de lado após seu
trabalho de apuração, por exemplo. Mas isso não quer dizer que, mesmo sendo
em alguma medida parcial, seu texto não tenha valor informativo e interpretativo.
Vejamos um outro exemplo, dessa vez de um artigo de opinião:

A onda de protestos que tomou conta dos Estados Unidos nos últimos
dias, motivada pelo assassinato de George Floyd, escancarou uma
janela para o racismo institucional e sistêmico presente na sociedade
norte-americana. Assim como no Brasil, a herança escravista nos
Estados Unidos impôs imensos flagelos à população negra no país
que, mesmo tendo a sua liberdade garantida pela 13ª Emenda, viu
centenas de obstáculos ao exercício pleno da cidadania por um regime
segregacionista que — sob o lema separate but equal — legitimava o
racismo em suas formas mais brutais. (João; Frota, 2020)

Desde a primeira frase do texto já fica claro que se trata de um texto


opinativo. O uso de palavras como onda, escancarou, imensos e centenas de
obstáculos indica uma postura argumentativa de quem faz julgamentos sobre a
realidade que se propõe a discutir. O texto parte, portanto, de uma determinada
leitura do mundo histórico, e não da simples apresentação dos fatos.
Nem sempre é tarefa simples separar fatos de opiniões. Mesmo quando
nos propomos a apenas descrever a realidade, essa descrição terá
inevitavelmente algum viés, alguma indicação de nossa postura diante dos fatos.
Isso não quer dizer que não haja diferenças entre textos opinativos e
informativos. Há, sim, e é importante mantê-las, pois essas duas categorias
indicam intenções distintas por parte dos autores, com resultados distintos nos

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seus textos. Todavia, é preciso lembrar que faz parte das estratégias de
convencimento, tanto no jornalismo quanto na publicidade, naturalizar a
interpretação proposta, ou seja, fazer com que o leitor receba os argumentos
como se eles fossem “fatos da vida”.

Saiba mais

Acesse o livro A arte de escrever histórias. A autora, Esther Proença


Soares, desenvolve estratégias para estimular a criatividade na escrita de textos
de ficção. Leia o capítulo 1, “Onde nasce uma história” (p. 1-6).

TEMA 4 – O ROTEIRO

Nunca se produziu e consumiu tanto conteúdo audiovisual na história


como hoje. Milhares de filmes e séries de diversos gêneros e naturezas são
produzidos anualmente ao redor do mundo. O desenvolvimento tecnológico fez
de todos nós diretores de cinema em potencial ao colocar em nossas mãos
celulares com câmeras e nos dar acesso ao YouTube. Nossa era privilegia a
comunicação audiovisual. No entanto, todo bom filme nasce numa folha de
papel. Quer dizer, antes de filmar, é preciso escrever o roteiro. Isso vale para
filmes de ficção, documentários e filmes publicitários.
Para produções longas, costuma-se trabalhar com um conjunto de três
textos. O primeiro deles é a sinopse, que geralmente terá algo em torno de uma
página. Nesse texto, descreve-se o conflito que move o filme, seus personagens
principais e o desafio que enfrentarão ao longo da história. É algo nesta linha:
“João é um jovem solitário e busca um amor para dar sentido a sua vida. Um dia
conhece Luciana numa festa da firma e se apaixona. Ela não é funcionária, mas
amiga de Carla, uma colega. A garota é diferente: não tem perfil no Facebook
nem no Instagram. Agora, ele vai ter que descobrir como encontrá-la novamente,
mas não pode revelar isso a Carla, porque ela gosta dele”.
O outro texto menor, que dá origem ao roteiro, é o argumento. Ele terá em
torno de 10% da extensão do roteiro. Nele, se faz uma descrição mais detalhada
de todas as ações que compõem a narrativa, incluindo algumas falas importantes
das personagens.
Agora, vamos nos concentrar no roteiro de filme publicitário. Tiago Barreto
(2010) entende que o filme publicitário segue, em linhas gerais, a mesma

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estrutura narrativa padrão usada em muitos filmes de ficção, ainda que de forma
simplificada. Essa estrutura pode ser descrita em três etapas:

1. Exposição do problema/complicação/conflito;
2. Clímax (ponto da virada);
3. Resolução (conclusão).

Observe este exemplo:

Agência: Talent
Cliente: Ipiranga
Produto: Postos Ipiranga
Título: Ambulância

Nos corredores de um pronto-socorro, médicos apreensivos empurram


uma maca com um paciente em estado grave. Eles chegam até uma
ambulância que está sendo lustrada pelo motorista.
MOT: O quê? Colocar ele aqui? Que é isso, gente, acabei de lavar!
Os dois médicos se olham, sem entender.
MOT: Gente, carro branco... sua! Quer que eu chame um táxi?
O paciente solta um gemido de dor.
MOT: Tá vendo? Vai emporcalhar tudo lá dentro.
Corta para imagens de um posto Ipiranga.
Locução em off: Se você é apaixonado por carro como todo brasileiro,
você tem de passar num posto Ipiranga. (Barreto, 2010)

Nesse exemplo, o problema é o paciente que precisa de uma ambulância.


A complicação é quando o motorista da ambulância se recusa a recebê-lo. O
clímax acontece quando o paciente geme, e ainda assim o motorista não cede.
Por fim, a resolução é aquela trazida pela narração em off: a atitude do motorista
se justifica porque ele é “apaixonado por carro”.
Nesse caso, temos um filme do gênero humorístico. Barreto (2010)
considera que a publicidade trabalha com apenas quatro gêneros em seus
filmes: humor, suspense, drama e erotismo. Alguns produtos possuem uma
ligação forte com determinado gênero, como as marcas de cerveja e o erotismo,
ou as empresas de seguro e o drama.

Saiba mais

Neste artigo, Garcia Filho faz uma explanação interessante, com


exemplos práticos, sobre o que é roteiro, argumento, storyline e plot. Disponível
em: <http://cineparanoia.blogspot.com.br/2009/03/o-que-e-rroteiro.html>.
Acesso em: 16 jul. 2020.

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TEMA 5 – O TEXTO ACADÊMICO

Vamos encerrar esta aula falando sobre o texto acadêmico. Na


universidade, são produzidos textos cuja composição obedece a algumas
práticas de escrita consolidadas no âmbito da academia. A escrita científica
costuma ser mais conservadora e rígida do que a da comunicação, pois está
ligada ao campo da ciência, que exige mais rigor, clareza e objetividade em suas
produções.
Quando um professor pede um trabalho de natureza teórica para o aluno,
geralmente ele quer saber se o estudante será capaz de demonstrar que
entendeu as ideias encontradas na bibliografia de estudo, e se é capaz de
articular essas ideias em um texto próprio. O texto acadêmico é, em linhas
gerais, de natureza expositiva-argumentativa. Vejamos um exemplo:

Na atualidade, empresas, indústrias e lojas têm se utilizado de recursos


midiáticos e ações de comunicação para se posicionar como “verde”,
ou seja, utilizar as estratégias do marketing verde. Segundo a pesquisa
realizada em 2009 pela empresa Terra Choice, a publicidade verde
aumentou quase dez vezes nos últimos 30 anos e quase triplicou
desde 2006. Para eles, o marketing verde cresceu aproximadamente
300% entre os anos de 2006 a 2009. Isso pode ser um exemplo do
tradicional greenwashing ou lavagem verde, que é uma definição da
ação publicitária que usa a sustentabilidade ou ações verdes como
forma de apelo ao consumidor. (Guimarães; Gomes Jr., 2020)

Trata-se de um artigo científico publicado por uma estudante de


graduação em uma revista acadêmica. Ao longo do texto, a estudante vai
apresentar dados e considerações oriundas de sua análise do objeto (a
publicidade de um shopping center), guiada por princípios teóricos expostos ao
longo do texto, que a levam a uma conclusão final: “é possível também ser
agente de transformação, utilizando a Ecopropaganda para dar embasamento
em suas ações e ao mesmo tempo conscientizar as pessoas que confiam na
marca e se identificam com seus valores” (Guimarães; Gomes Jr., 2020).
Perceba que o texto acadêmico tem um caráter impessoal, ou seja, não
se trata do que eu acho, mas do que é possível dizer a partir de certos princípios
teóricos e das evidências coletadas. Ele tem o intuito de construir uma
argumentação convincente, e por isso o autor do texto deve apresentar dados e
fazer considerações de análise com muita clareza, para que se chegue a uma
conclusão bem fundamentada. A impessoalidade e a objetividade desse gênero
textual implicam, entre outras coisas, na recusa à primeira pessoa do singular

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(nunca escreva “eu analisei os dados”, “eu entendo que…”), e na opção pela
primeira pessoa do plural, ou ainda pelas formas impessoais (“analisamos”,
“entendemos”; ou “analisaram-se”, “entende-se”).
Por fim, devemos comentar o uso da palavra dissertação. A rigor, uma
dissertação é o texto de conclusão de um curso de mestrado. No entanto,
emprega-se frequentemente esse termo para se referir a textos de caráter
acadêmico-científico. Há certa confusão em torno de seu uso, mas, em geral,
entende-se que um texto dissertativo será uma combinação de argumentação e
exposição, feita com profundidade.

Saiba mais

O Intercom é uma organização dedicada à pesquisa e divulgação


científica na área da comunicação, com mais de 40 anos de atividade no Brasil.
Além de organizar congressos regionais e nacionais, o portal publica trabalhos
de pesquisadores de todo o país. Vale a pena conhecê-lo. Disponível em:
<http://www.portalintercom.org.br/>. Acesso em: 15 jul. 2020.

TROCANDO IDEIAS

Já que falamos sobre gêneros literários nesta aula, vamos compartilhar


experiências literárias. Pense em um poema, conto ou romance que te marcou.
Resuma-o e diga por que você o considera especial.

NA PRÁTICA

Que tal trabalhar na produção de um roteiro? Essa atividade tem se


tornado cada vez mais valorizada no meio da publicidade. Então, escolha um
comercial televisivo de 30 segundos e tente escrever o seu roteiro. Pense em
como as três etapas descritas por Barreto são construídas.

FINALIZANDO

Nesta aula, trabalhamos com as noções de tipos e gêneros textuais.


Procuramos entender, com base nesses conceitos e suas classificações, como
os textos manifestam suas intenções comunicativas por meio de características
estruturais.

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Pensamos também a respeito das relações entre diferentes gêneros e a
publicidade. Por fim, analisamos o roteiro do filme publicitário, um modelo de
texto que é a gênese do produto audiovisual, e o texto acadêmico, o gênero
textual da ciência.

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REFERÊNCIAS

BARRETO, T. Vende-se em 30 segundos: manual do roteiro para o filme


publicitário. São Paulo: Senac, 2010.

GUIMARÃES, J. M. de C.; GOMES JR, J. da. S. Ecopropaganda e discursos


verdes: estudo sobre as práticas discursivas nos materiais publicitários e
institucionais do Manauara Shopping. Revista Iniciacom, v. 9, n. 2, 2020.
Disponível em:
<http://portcom.intercom.org.br/revistas/index.php/iniciacom/article/view/3341/p
df>. Acesso em: 15 jul. 2020.

JOÃO, T. D.; FROTA, A. A morte de George Floyd e a onda de protestos nos


EUA. Uninter Notícias, Curitiba, 4 jun. 2020. Disponível em:
<https://www.uninter.com/noticias/a-morte-de-george-floyd-e-a-onda-de-
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LÉON, C. B. Comunicação e expressão. Curitiba: InterSaberes, 2013.

LOBATO, E. Infodemia, crendice e coronavírus. Piauí, São Paulo, 12 jun. 2020.


Disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/infodemia-crendice-e-
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MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: constituição e práticas sociodiscursivas.


São Paulo: Cortez, 2004.

TREVISAN, D. Benedito. In: _____. O beijo na nuca. 2014.

WACHOWICZ, T. C. Análise linguística nos gêneros textuais. Curitiba: Ibpex,


2010.

WATT, I. The rise of the novel. London: Pimlico, 2000.

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