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ARTIGOS

A "EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA ATIVA" COMO ESTRATÉGIA


CONTEMPORÂNEA DO PROGRAMA NEOLIBERAL DA TERCEIRA VIA
“EDUCATION FOR ACTIVE CITIZENSHIP" AS A CONTEMPORARY STRATEGY
FOR THE NEOLIBERAL PROGRAM OF THE THIRD ROUTE

Elma Júlia Gonçalves de Carvalho1


Jeferson Diogo de Andrade Garcia2

Resumo: O objetivo central deste artigo é analisar os fundamentos e a função social da proposta de
“educação para a cidadania ativa” no campo educacional, enquanto uma proposta vinculada à perspectiva
política da Terceira Via. A discussão é encaminhada com base em três conceitos centrais: novo Estado
democrático, sociedade civil ativa e cidadania ativa. Os resultados mostram que a proposta de educação para
a cidadania ativa faz parte das estratégias de disseminação de valores éticos e morais que favoreçam a
construção de um novo consenso sobre os padrões de comportamento adequados à nova forma de
sociabilidade necessária à reprodução capitalista, pautada na ampliação da participação social e na maior
responsabilização dos indivíduos pela solução dos problemas sociais.
Palavras-chave: Educação. Cidadania ativa. Terceira Via

Abstract: The main goal of this article is to analyze the foundations and social function of the proposal of
"education for active citizenship" in the educational field, as a proposal linked to the political perspective of
the third route. The discussion is guided by three central concepts: a new democratic state, active civil society
and active citizenship. The results show that the proposal of education for active citizenship is part of the
strategies of dissemination of ethical and moral values that favor the construction of a new consensus on the
behavior patterns appropriate to the new form of sociability necessary for capitalist reproduction, based on the
expansion of social participation and greater accountability of individuals for the solution of social problems.
Keywords: Education. Active citizenship. Third Route

1
Professora da Área de Políticas Públicas e Gestão da Educação do Departamento de Teoria e Prática da Educação e do Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá. E-mail elmajulia@hotmail.com
2
Professor na rede Municipal de Educação de Maringá e Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Estadual de Maringá. E-mail: jefersondiogogarcia@gmail.com

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


62 A "educação para a cidadania ativa" como estratégia contemporânea do programa neoliberal da Terceira Via

INTRODUÇÃO A PROPOSTA DE FORMAÇÃO PARA A


CIDADANIA ATIVA NOS DOCUMENTOS
A educação para a cidadania não é uma DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
perspectiva nova, pois remonta, pelo menos, ao
final do século XIX. Assim, é interessante A cidadania implica “saber-se membro de
refletir sobre o fato de que, desde a segunda uma comunidade mais ampla e de que os
metade da década de 1990, tem sido revigorada indivíduos devem portar-se como cidadãos em
nos encaminhamentos das políticas todas as suas atividades, quer sejam políticas,
educacionais que se pretendem inovadoras e econômicas, sociais, culturais, públicas ou
democráticas. particulares” (TONET, 2013, p.140). Por
Observamos que “a reforma educacional conseguinte, formar para a cidadania abarca
brasileira encaminhada a partir dos anos 1990 formar uma determinada moral, incutir no sujeito
se auto referenciou com o slogan „educação certas normas de convivência humana adequadas
para a cidadania‟” (FALLEIROS, 2005, à relação social capitalista em seus diferentes
p.209). Mais do que isso, de acordo com as estágios, forjar determinados traços de caráter e
novas exigências sociais, políticas e criar certos hábitos sociais.
econômicas do capitalismo, colocou sobre a A formação para a cidadania ativa vem
escola “a tarefa de ensinar as futuras gerações ganhando expressividade no cenário educacional
a exercer uma cidadania de „qualidade nova‟” contemporâneo, implicando a formação de valores
(FALLEIROS, 2005, p.211), que passou a ser e o desenvolvimento de atitudes fundamentais
denominada de cidadania ativa. necessários às novas exigências sociais
Nos documentos orientadores (GARCIA, 2015).
formulados por organismos internacionais, Um dos principais documentos norteadores
particularmente pela Organização das Nações da reforma educacional a partir dos anos de 1990
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura é o Relatório Jacques Delors, intitulado
(UNESCO) e pelo Banco Mundial (BM), a Educação: um tesouro a descobrir, Relatório para
formação para a cidadania tem sido enfatizada a UNESCO da comissão internacional sobre
como uma proposta renovada que possui Educação para o século XXI, publicado em 1996.
aspectos singulares e tem uma função social No que se refere ao enfrentamento dos
específica no atual contexto. desafios do final do século XX, o Relatório os
No presente artigo, tendo em vista essa relaciona ao quadro da sociedade atual, descrito
ênfase, pretendemos abordar os fundamentos como um mundo globalizado, marcado, de um
da proposta e a função social atribuída à lado, pelos avanços expressivos dos recursos
formação para a cidadania ativa pelas políticas tecnológicos e da comunicação universal e, de
educacionais a partir da década de 1990, bem outro, pela fome, pelos conflitos e pela violência.
como suas finalidades. Em um primeiro Caracterizando esse cenário pela “crise das
momento, considerando que as orientações das relações sociais” (DELORS, 2006, p.52), atribui-
organizações internacionais influenciaram a se à educação um relevante papel no
política educacional brasileira, redefinindo as enfrentamento dos problemas globais. “A sua
práticas educativas no que diz respeito à maior ambição passa a ser dar a todos os meios
difusão dos conteúdos, habilidades e valores necessários a uma cidadania consciente e ativa,
ligados à formação de um “novo padrão que só pode realizar-se, plenamente, num contexto
de sociabilidade” (FALLEIROS, 2005; de sociedades democráticas” (DELORS, 2006,
NEVES, 2013), analisaremos os documentos p.52).
internacionais e nacionais, buscando identificar No Relatório Delors, advoga-se uma
tais orientações e também as finalidades concepção de educação em que a escola deve se
atribuídas à atual política educacional. Em responsabilizar, mas não de forma exclusiva, pela
seguida, buscamos compreender a necessidade tarefa de preparar o cidadão para uma participação
histórica da proposta, relacionando-a à social consciente, responsável e ativa. Essa
perspectiva política da Terceira Via. Por fim, educação, que deve ocorrer ao longo de toda a
teceremos algumas considerações sobre os vida, é entendida como “[...] uma construção
desdobramentos sociais da proposta de continua da pessoa humana, do seu saber e das
educação para a cidadania ativa. suas aptidões, mas também da sua capacidade de

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discernir e agir” (DELORS, 2006, p.106). desenvolvimento do entendimento, da


Assim, as pessoas poderiam ser capazes de solidariedade e da tolerância entre indivíduos e
resolver os problemas individuais e coletivos entre grupos étnicos, sociais, culturais e religiosos
de forma autônoma. Nos termos do e nações soberanas. Afirma-se que, além disso, a
documento: educação deve promover conhecimentos, valores,
atitudes e aptidões favoráveis ao respeito aos
Mas a educação ao longo de toda a direitos humanos e a um comprometimento ativo
vida, no sentido em que a entende a com a defesa desses direitos e com a construção
Comissão, vai mais longe ainda. Deve da democracia e da cultura de paz, favorecendo o
fazer com que cada indivíduo saiba desenvolvimento da capacidade de resolver
conduzir o seu destino, num mundo
conflitos por meios não violentos.
onde a rapidez das mudanças se
conjuga com o fenômeno da Em outro relatório, intitulado Nossa
globalização para modificar a relação diversidade criadora, elaborado pela Comissão
que homens e mulheres mantêm com o Mundial de Cultura e Desenvolvimento, sob
espaço e o tempo. As alterações que supervisão de Javier Pérez Cuéllar, publicado pela
afetam a natureza do emprego, ainda UNESCO em 1995, aponta-se: “A busca mundial
circunscritas a uma parte do mundo, de soluções para seus problemas pode ganhar
vão, com certeza, generalizar-se e levar muito com as contribuições diretas dos
a uma reorganização dos ritmos de indivíduos. O envolvimento direto deles poderá
vida. A educação ao longo de toda a abrir novas perspectivas e melhorar a qualidade e
vida torna-se assim, para nós, o meio
eficácia dos resultados desejados” (CUÉLLAR,
de chegar a um equilíbrio mais perfeito
entre trabalho e aprendizagem bem 1997, p.50). Sugere-se ainda que a habilidade para
como ao exercício de uma cidadania resolver problemas seja inserida também nas
ativa (DELORS, 2006, p.105, grifo relações produtivas, pois “[...] uma força de
nosso). trabalho ativa, competente, educada, bem nutrida,
saudável e motivada constitui o recurso mais
A proposta de educação para a cidadania produtivo de uma sociedade” (CUÉLLAR, 1997,
ativa já havia sido apresentada na Declaração p.33).
de Genebra, intitulada Declaração e Plano de Considerando que um dos problemas que
Ação Integrado sobre a Educação para a Paz, exigem criatividade é a incerteza que permeia o
os Direitos Humanos e a Democracia, mundo atual, os autores do documento dedicam
aprovada pela Conferência Geral da UNESCO um capítulo específico a esse aspecto, intitulado
em sua 28ª sessão em Paris, em 1994. Os “Criatividade, Capacitação e Autonomia”, no qual
vários ministros da educação, reunidos na 44ª se destacam os atributos do cidadão em um
sessão da Conferência Internacional sobre contexto de incertezas e rápida mutação: “[...] não
Educação, adotaram essa declaração na apenas para se referir à produção de novas obras
expectativa de que os Estados-membros e a ou formas artísticas, mas para buscar soluções de
UNESCO integrassem, no âmbito de uma problemas em todas as áreas possíveis” e também
política coerente, a educação para a paz, para para “[...] transformar sua realidade por meio da
os direitos humanos e para a democracia, na inciativa e da imaginação criadoras” (CUÉLLAR,
perspectiva do desenvolvimento sustentável. 1997, p.102). O discurso é de que o indivíduo
Nesse documento não foi empregada a deve: “[...] ter habilidade para lidar com o
expressão cidadania ativa, mas nele são desconhecido, com a vulnerabilidade e a
indicados os valores, as aptidões e as instabilidade e, caso não seja bem-sucedido, deve
competências próprios dessa formação, tais ser capaz de mudar o „jogo‟ e lidar com o
como: consciência de responsabilidade fracasso” (CARVALHO, 2012, p.31-32).
pessoal, autonomia, capacidade de lidar com Na V Conferência internacional sobre a
situações difíceis e incertas, solidariedade e educação de adultos: Declaração de Hamburgo:
compromisso cívico para, em associação com agenda para o futuro, realizada em 19973, as
os demais, solucionar problemas da
comunidade (UNESCO, 1995). 3
Essa conferência, realizada na Alemanha em 1997, foi
Conforme o documento, as políticas organizada pela UNESCO, com apoio do Sistema das
educacionais têm contribuído para o Nações Unidas, por meio, especialmente, das seguintes

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discussões tiveram o sentido de “definir os oportunidade de obter conhecimento e


papéis a serem atribuídos à educação de desenvolver os valores, atitudes e habilidades”
adultos”, bem como as suas formas de necessários à participação na sociedade e ao
execução e manutenção (SESI/UNESCO, controle de suas vidas (UNESCO, 2001, p.19).
1999, p.9). O documento originário dessa Não obstante, essa formação de valores, atitudes e
conferência, intitulado Declaração de habilidades se refere à “importância da educação
Hamburgo: agenda para o futuro, publicado como direito subjetivo de todas as pessoas e como
em 1999, indica que “a educação de adultos condição insubstituível para o exercício de uma
pode modelar a identidade do cidadão e dar um cidadania ativa” (UNESCO, 2001, p.5).
significado à sua vida” (SESI/UNESCO, 1999, Quanto às orientações internacionais
p.19). Com a mesma orientação dos outros presentes na política educacional brasileira,
documentos da UNESCO, afirmou-se que a podemos afirmar que os Parâmetros Curriculares
formação do cidadão para o século XXI deve Nacionais (PCNs) propõem uma prática
“desenvolver a participação comunitária [...] educativa, na qual o desenvolvimento de atitudes
favorecendo a cidadania ativa” (SESI/ e de valores tenha como finalidade a formação de
UNESCO, 1999, p.32). Nesse contexto, o cidadãos autônomos, críticos e participativos,
cidadão deveria ser preparado para enfrentar capazes de atuar de modo responsável e ético na
um dos principais problemas sociais – a sociedade em que vivem (BRASIL, 1997).
pobreza. Essa nova cidadania é entendida como
sinônimo de maior liberdade: “ser livre, portanto,
É indispensável apelar para a é ser competente para viver o mundo [...] e, como
criatividade e as competências dos isso, requer comprometimento, exige do sujeito
cidadãos de todas as idades para um posicionamento diante de si, dos outros e da
enfrentar o desafio do século XXI, isto vida” (BALLEIRO, 2004, p.132). A formação de
é, atenuar a pobreza, consolidar os
um cidadão que saiba entender o mundo em que
processos democráticos, fortalecer e
proteger os direitos humanos, vive e agir com autonomia e responsabilidade é
promover uma cultura da paz, identificada como o desafio educacional para o
estimular uma cidadania ativa, reforçar século XXI, tal como já havia sido formulado pela
o papel da sociedade civil UNESCO. Dessa forma, “educar para a cidadania
(SESI/UNESCO, 1999, p.32). é, também, despertar nas pessoas a preocupação
para os problemas sociais, oferecendo-lhes
Em 2000, em Dakar, Senegal, foi espaços para a ação” (BARBOSA, 2004, p.51).
realizada uma nova Conferência Mundial de A escola é considerada um local de
Educação, durante a qual, tendo como diretriz transformação dos novos sujeitos, podendo torná-
central a educação para todos os cidadãos, a los mais participativos, solidários e civicamente
UNESCO realizou uma avaliação dos responsáveis, capazes de intervir em sua
progressos educacionais obtidos desde a comunidade. É esse o posicionamento demostrado
Conferência de Jomtien (1990). O resultado foi pelo próprio MEC:
a aprovação do documento Educação para
Todos: o Compromisso de Dakar. Cabe A escola deve favorecer a tomada de
ressaltar que esse documento, apesar de não se consciência política, ensinar cada
ater particularmente à questão da formação da participante de seu dia-a-dia a fazer uso do
cidadania, contém a seguinte afirmação: a conhecimento e da informação na
compreensão da realidade, transformando
todos os indivíduos “[...] deve ser dada a
cada pessoa em um agente de
transformação, um cidadão mais
agências: Organização das Nações Unidas para participativo capaz de intervir em sua
Alimentação e Agricultura (FAO), Organização comunidade, preparado para o exercício da
Internacional do Trabalho (OIT), Organização cidadania (BRASIL, 2009, p.20).
Mundial da Saúde (OMS), Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Fundo das
Nações Unidas para Infância (UNICEF), além da Encontramos orientação semelhante na
participação da União Europeia, Organização para a Resolução nº 2, do CEB de 7 de abril de 1998,
Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) referente às as Diretrizes Curriculares Nacionais
e do Banco Mundial (BM).
para o Ensino Fundamental. Em seus termos, tais

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diretrizes devem ser observadas na marcas são a globalização/mundialização da


organização curricular das unidades escolares economia, a flexibilização produtiva4, a expansão
integrantes dos diversos sistemas de ensino. A e o fortalecimento do capital financeiro, tornou-se
escola, com suas ações pedagógicas, uma questão central no debate da década de 1990.
desempenharia um papel importante na Na perspectiva de seus proponentes, o Estado
formação cidadã, proporcionando meios para deve responder com mais rapidez e eficiência às
que os alunos possam constituir “[...] sua constantes mutações do mercado global e às
identidade como cidadãos, capazes de serem demandas sociais, exercer um papel mais decisivo
protagonistas de ações responsáveis, solidárias na reestruturação produtiva e diversificar as fontes
e autônomas em relação a si próprios, às suas de financiamento.
famílias e às comunidades” (BRASIL, 1998, A reforma é vista como a possibilidade de
p.1). se flexibilizar a ação estatal, liberar a economia,
Observamos, portanto, que, no conduzindo-a a um novo ciclo de crescimento
encaminhamento das políticas educacionais, a econômico, e, ao mesmo tempo, preservar a
formação para a cidadania não só vem sendo governabilidade, no sentido político e econômico,
bastante enfatizada, como também vem em face das exigências contraditórias do processo
adquirindo “novos significados”. Ou seja, vem de acumulação e legitimação do capital. A teoria
sendo vista como uma forma de amenizar o de que as soluções da social democracia e do
impacto da crise, levando os indivíduos neoliberalismo se revelaram inadequadas para
[sociedade civil] a agir na busca de solução responder aos desafios da contemporaneidade
para os problemas de sua comunidade, sem ter conduziu à construção de um novo modelo de
que demandar ações por parte do Estado, bem atuação estatal – a política da Terceira Via.
como renovar e manter a legitimidade social A perspectiva política da Terceira Via5 foi
segundo os fundamentos do capitalismo. Para formulada, principalmente, pelo sociólogo
Falleiros (2005, p.209), o slogan da formação britânico Anthony Giddens 6. Edificou-se na
para a cidadania contido na reforma
4
educacional brasileira contém clara alusão à O contexto de profunda recessão econômica e de
política da Terceira Via como princípio aumento nas pressões competitivas internacionais, a
partir dos anos de 1990, levou as empresas a, de um lado,
orientador: buscar espaços mais amplos de acumulação e, de outro,
reestruturar e reorganizar a produção, introduzindo novas
A reforma educacional brasileira tecnologias no processo produtivo e criando um novo
encaminhada a partir dos anos 1990 se padrão de acumulação capitalista, denominado de
auto-referenciou com o slogan acumulação flexível. Segundo Harvey (2000, p.140), a
"Educação para a cidadania" [...] a acumulação flexível, para superar a rigidez do sistema
direção da proposta educacional como fordista e atender, de forma ágil, a uma gama bem mais
ampla de necessidades do mercado, incluindo as
um todo reflete a clareza de objetivos e rapidamente cambiáveis, apoia-se na “[...] flexibilidade
a coesão que a orquestram no tom dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos
geral do projeto de sociabilidade produtos e dos padrões de consumo. Caracteriza-se pelo
capitalista implantado pela terceira via surgimento de setores da produção inteiramente novos,
no Brasil. novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros,
novos mercados e, sobretudo, taxas altamente
Os fundamentos desses novos intensificadas de inovação comercial, tecnológica e
organizacional”.
encaminhamentos serão abordados a seguir.
5
Analisaremos, especialmente, o programa da Esse não foi o único termo empregado para expressar o
movimento de renovação do projeto neoliberal. Segundo
Terceira Via, que redefine o conceito de Martins (2007), outros foram: centro radical, centro-
cidadania e o papel do cidadão na reprodução esquerda, nova esquerda, nova social democracia, social
social. democracia modernizadora e governança progressista.
6
Anthony Giddens é o principal formulador da teoria
A PROPOSTA DE EDUCAÇÃO PARA A política da Terceira Via. Ele foi assessor do ex-primeiro-
CIDADANIA ATIVA NO PROGRAMA ministro inglês Tony Blair, ocupando, em 1996 ,o cargo
POLÍTICO DA TERCEIRA VIA de reitor da London School of Economics. O construto
teórico da Terceira Via está organizado especialmente em
três obras de Anthony Giddens: Para Além da Esquerda
A reforma do Estado no sentido da e da Direita: o futuro da política radical (1996), A
adequação à nova fase do capitalismo, cujas Terceira Via: reflexões sobre o impasse político atual e o

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década de 1990, em meio aos movimentos dos qual se propunha a redefinição de aspectos
"novos democratas", nos Estados Unidos, e no pontuais do plano econômico e político para o
"novo trabalhismo", na Inglaterra, ligados, novo milênio, como estratégia de legitimação do
respectivamente, a Bill Clinton e a Tony Blair. novo padrão de expansão capitalista, de base
Tal programa político estabeleceu-se quando o flexível, bem como do recuo do Estado, sobretudo
projeto ortodoxo neoliberal7 passou a ser na área social. Sobre o contexto que deu origem à
fortemente questionado porque o conjunto de proposta política da Terceira Via, Giddens
suas medidas não tinha conseguido recuperar (2001b, p.7) afirma:
as taxas de crescimento obtidas nos anos do
Welfare State e, assim, teria aumentado a A Terceira Via surgiu logo depois do
pobreza, colocando em xeque a estabilidade ponto alto da crise asiática. Na esteira
das relações sociais tão imprescindível ao daquela crise, a influência do pensamento
projeto capitalista. Conforme podemos de direita sobre a política havia diminuído.
Quase em toda parte, pelo menos por
identificar nas preocupações manifestadas por
enquanto, o conservadorismo está se
Giddens: retraindo. A ascensão da Terceira Via
política é em parte uma reação a esta
[...] as desigualdades podem ameaçar situação, mas também tem de certa forma
a coesão social e podem ter ajudado a ocasioná-la. As energias de
outras consequências socialmente vários membros da esquerda política têm
indesejáveis (como provocar altas há muito se dedicado a resistir aos
taxas de criminalidade) [...] Uma clamores neoliberais ou a uma
sociedade democrática que gera reelaboração defensiva do pensamento de
desigualdade em larga escala tende a esquerda diante deles. Aquelas energias
produzir descontentamento e conflitos podem agora ser canalizadas em uma
generalizados (GIDDENS, 2001a, direção mais positiva. A política da
p.52). Terceira Via [...] estará no cerne dos
diálogos políticos nos próximos anos, da
Portanto, na compreensão dos teóricos mesma forma que o neoliberalismo até
da Terceira Via, era evidente a necessidade de recentemente e a social-democracia de
construção de alternativas políticas e de bases velho estilo antes dele. A política da
ideológicas diferenciadas. Em face da crise de Terceira Via será a perspectiva com a qual
acumulação vivenciada a partir dos anos de outros terão de se engajar.
1970, foi formulada uma nova proposta, na
A análise conjuntural dos teóricos da
futuro da social-democracia (2001) e A Terceira Via
Terceira Via, principalmente Giddens, aponta que,
e seus críticos (2001). em razão das mudanças econômicas e
7 tecnológicas ocorridas em nível mundial, que
Esse projeto foi influenciado pelas contribuições de
teóricos neoliberais da escola austríaca, Hayek e Von incluem toda variedade de problemas relacionados
Mises; dos monetaristas, Friedman, Phelps e Johnson; às questões ecológicas, à família, ao trabalho, à
dos novos clássicos relacionados com as expectativas identidade pessoal e cultural, tanto a esquerda,
racionais, Lucas e Sargent; e da escola da escolha representada pela velha socialdemocracia, quanto
pública, Buchanan, Olson, Tullock e Niskanen. Seu
resultado foi o conjunto de medidas concebidas por
a direita, representada pelo neoliberalismo,
economistas de instituições financeiras, como o FMI, revelam-se insuficientes e inadequadas para
o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro regular e coordenar os processos de
Americano, ou seja, o chamado Consenso de desenvolvimento econômico e social capitalista.
Washington (1989), composto por dez regras básicas Por isso, a Terceira Via é apontada como uma
destinadas, especialmente em países da América
Latina, à promoção do ajustamento macroeconômico. alternativa política diante da nova ordem
Bresser-Pereira (1991, p.6), ao comentar esse globalizada, que cria novos sistemas e forças
conjunto de medidas, observa que elas podem ser transnacionais, ao mesmo tempo em que
resumidas a “[...] promover a estabilização da transforma as instituições e sociedades em que
economia através do ajuste fiscal e da adoção de
políticas econômicas ortodoxas em que o mercado
vivemos:
desempenhe o papel fundamental” e a formas “[...]
diferentes de afirmar que o Estado deveria ser [...] Vou supor que "terceira via" se refere
fortemente reduzido”. a uma estrutura de pensamento e de

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prática política que visa adaptar a periodicamente chefes de governo de diversos


social-democracia a um mundo que se países, conforme pode ser visualizado no quadro
transformou fundamentalmente ao abaixo:
longo das duas ou três últimas décadas.
É uma Terceira Via no sentido de que
Construção da agenda internacional
é uma tentativa de transcender tanto a
da Terceira Via
social democracia do velho estilo
Ano Local Participantes
quanto o neoliberalismo (GIDDENS,
Eleição de
2001a, p.36). Anthony Giddens foi seu
1992 Bill Clinton
assessor.
nos EUA
A nova proposta apresenta-se como uma O Seminário contou com a
nova forma de administrar o capitalismo. As participação do então
mudanças na política e na economia buscam presidente americano, Bill
combinar princípios antagônicos, como Seminário
Clinton, do primeiro-
realizado em
liberalismo de mercado com justiça social, de ministro britânico, Tony
1998 Washington
forma a dar uma face mais humana8 às (Estados
Blair, e do então primeiro-
relações sociais pautada na dominação, na ministro italiano, Romano
Unidos)
expropriação e na exploração. Prodi. O objetivo foi trocar
Para disseminar esse novo projeto experiências para uma
frente política internacional.
político e construir um consenso internacional
A agenda da Terceira Via
em torno dele, foi organizado, em 1999, um foi ampliada, contando com
movimento denominado de Cúpula da 2º reunião
a participação de Bill
Governança Progressista9, destinado a reunir realizada em
Clinton (EUA), Tony Blair
1999 Washington
(Grã-Bretanha), Gerhard
8
De acordo com Mota (2012, p.15), essa “expressão (Estados
Schoroder (Alemanha),
foi inspirada no livro de Bernardo Kliksberg, Por Unidos)
Wim Kok (Holanda) e
uma economia de face mais humana, editado pela Máximo D‟ Alemã (Itália)
UNESCO em 2003”. Na apresentação do documento
Jorge Werthein, representante da Unesco no Brasil, 1ª Reunião - Criação da
destaca: “A presente obra, de Bernardo Kliksberg, Cúpula da Governança
voltada para a busca de um caminho que leve à Progressista
construção de uma economia mais humana [...] Contou com a participação
trabalha um conjunto de proposições que podem de Bill Clinton (EUA),
inspirar, promover ou alavancar mudanças,
Florença
1999 Tony Blair (Grã-Bretanha),
especialmente na América Latina - região que (Itália)
Gerhard Schoroder
registra uma das maiores desigualdades do mundo -, (Alemanha), Wim Kok
que favoreçam a construção de uma sociedade mais
(Holanda) e Máximo D‟
justa, mais igualitária e mais humana. O autor
apresenta, como ponto de partida, a questão da Alemã (Itália) e Fernando
pobreza, da miséria e das grandes disparidades, Henrique Cardoso (Brasil)
fundamenta sua análise em dados estatísticos 2ª Reunião da Cúpula da
produzidos por conhecidas e renomadas fontes, Governança Progressista
altamente especializadas e respeitadas, e mostra que Participaram 14 chefes de
as linhas desenvolvimentistas, lideradas pelas Estado e de governo, dentre
políticas neoliberais predominantes no atual mundo Berlim
2000 eles Bill Clinton (EUA),
globalizado, se tornam inócuas porque desprezam, ou (Alemanha)
Tony Blair (Grã-Bretanha),
até estimulam, os efeitos perversos, gerados por uma
Leonel Jospin (França) e
certa visão da economia de mercado e garantidos pelo
status quo dos países metropolitanos e pelas Fernando Henrique Cardoso
constantes crises socioeconômicas que afetam (Brasil)
cruelmente a vida das populações latino-americanas”
(KLIKSBERG, 2003, p. 7). em certa medida, o fórum foi “uma resposta política à
9 série de eventos e protestos anti-globalização e anti-
Colocando-se no campo político de centro-esquerda, capitalista que reuniram diversas organizações e
segundo Martins (2007, p. 63), a Cúpula da
manifestantes em várias partes do mundo, entre os anos
Governança Progressista foi constituída como “[...] de 1998 e 2001(MARTINS, 2007, p. 63). Até 2002, como
um fórum para trocas de experiências e definição de presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso
agendas comuns - dando conseqüência e organicidade participou de reuniões e articulações internacionais; a
às ações governamentais e de sujeitos políticos partir de então, foi Lula que passou a integrar esse
coletivos preocupados com a reorganização da agrupamento político (MARTINS, 2007).
hegemonia burguesa em todo o mundo”. Para o autor,

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3ª Reunião da Cúpula da Inácio Lula da Silva


Governança Progressista (Brasil), Michelle Bachelet
Participaram 13 chefes de (Chile), Tabaré Vázquez
Estado e de governo, dentre (Uruguai), Cristina
eles Fernando Henrique Kirchner (Argentina), Joe
Estocolmo
2002 Cardoso (Brasil), Chrétien Biden (Estados Unidos),
(Suécia)
(Canadá), António Guterres Gordon Brown (Grã-
(Portugal), Gerhard Bretanha) e Jens
Schroeder (Alemanha) Tony Stoltenberg (Noruega).
Blair (Reino Unido) e Fonte: Elaboração própria com base em Martins (2007)
Ricardo Lagos (Chile)
4ª Reunião da Cúpula da Com a perspectiva de criar a “social
Governança Progressista democracia modernizada”, a Terceira Via busca
Estiveram presentes de 15 diferenciar-se do neoliberalismo ortodoxo10. No
chefes de Estado e de entanto, autores como Martins (2007) consideram
governo, além de Tony
que as diferenças entre ambos são apenas de
Blair (Grã-Bretanha) e de
Londres caráter estratégico, já que compartilham os
2003 Lula da Silva (Brasil),
(Inglaterra) mesmos princípios: a flexibilização e a
participaram chefes de
Estado da Argentina, Chile, desregulamentação dos mercados e o crescimento
Canadá, Alemanha, Suécia, econômico como estratégia para a resolução dos
Nova Zelândia, Polônia, problemas sociais.
África do Sul e Coréia do Porém, destacamos uma das principais
Sul. diferenças entre as duas orientações políticas: a
5ª Reunião da Cúpula da relação entre Estado e sociedade civil. No novo
Governança Progressista programa político de reforma, a sociedade civil
Participaram de 14 chefes
deve agir em parceria com o Estado,
de Estado e de governo,
dentre eles Tony Blair (Grã-
compartilhando responsabilidades, mas também
Bretanha), Lula da Silva exercendo um maior controle sobre suas ações.
(Brasil), Gerhard Schröder Portanto, a promoção da sociedade civil ativa é
(Alemanha), Thabo Mbeki um aspecto fundamental da política da Terceira
(África do Sul), Néstor Via, representando um processo de
Budapeste
2004
(Hungria)
Kirchener (Argentina), aprofundamento e de ampliação da democracia.
Ricardo Lagos (Chile), Jean Identificando um declínio cívico na perda
Chrétien (Canadá), do sentimento de solidariedade e de
Vladimir Spidla (República responsabilidade social, o programa político da
Checa), Leszez Miller
(Polônia), Meles Zenawi
10
(Etiópia), Helen Clark O neoliberalismo “propõe que o bem estar humano pode
(Nova Zelândia) e Bill vir a ser melhor promovido liberando-se as liberdades e
Clinton (ex-presidente dos capacidades empreendedoras individuais no âmbito de
uma estrutura institucional caracterizada por sólidos
EUA). direitos à propriedade privada, livres mercados e livre
6ª Reunião da Cúpula da comércio. O papel do Estado é criar e preservar uma
Governança Progressista estrutura institucional caracterizada por sólidos direitos à
Estiveram presentes 14 propriedade privada, livres mercados e livre comércio. O
líderes, entre eles: Tony papel do Estado é criar e preservar uma estrutura
Blair (Grã-Bretanha), Lula institucional apropriadas a essas práticas [...] Deve
Pretória também estabelecer estruturas e funções militares, de
da Silva (Brasil), Meles
2006 (África do defesa, da política e legais requeridas para garantir
Zenawi (Etiópia), Thabo
sul) direitos de propriedade individuais, para assegurar se
Mbeki (África do Sul);
necessário pela força, o funcionamento apropriado dos
Göran Perssson (Suécia), mercados. Além disso, se não existirem mercados (em
Lee Hae-Chan (Coréia do áreas como a terra, a água, a instrução, o cuidado de
Sul) e Helen Clark (Nova saúde, a segurança social ou a poluição ambiental), estes
Zelândia). devem ser criados, se necessário pela ação do Estado [...]
7ª Reunião da Cúpula da As intervenções do Estado nos mercados (uma vez
Vinã del Mar criados) devem ser mantidas num nível mínimo [...]”
2009 Governança Progressista
(Chile) (HARVEY, 2008, p.12).
Estiveram presentes Luiz

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


CARVALHO; GARCIA 69

Terceira Via tem como um de seus pontos Na reconfiguração do papel estatal na


centrais a renovação da sociedade civil: perspectiva da Terceira Via, aparece uma nova
cidadania justificada pela "demanda por
[...] O declínio cívico é real e visível autonomia individual e a emergência de uma
em muitos setores das sociedades cidadania mais reflexiva" (GIDDENS, 2001a,
contemporâneas, não uma mera p.81). A proposta de edificação de uma nova
invenção de políticos conservadores. cidadania, nos termos da remodelagem da
Ele é visto no enfraquecimento do
sociedade civil e de uma atuação mais ativa ou
senso de solidariedade em algumas
comunidades locais e áreas urbanas, participativa por parte do cidadão, ganhou ênfase
nos elevados níveis de criminalidade e mundial na década de 1990. Desde então, com o
na dissolução de casamentos e famílias objetivo de formar os novos sujeitos políticos
[...] Não podemos lançar a culpa da coletivos, condizentes com o projeto da suposta
erosão da civilidade sobre o Welfare "nova social democracia11", houve um movimento
State, ou supor que é possível revertê- internacional de revigoramento das concepções
la deixando a sociedade civil por sua educacionais, formais e não formais, calcadas no
própria conta. O governo pode e deve lema "educação para a cidadania ativa".
desempenhar um importante papel na Na idealização da Terceira Via, a cidadania
renovação da cultura cívica
ativa contribuiria para legitimar aquilo que se
(GIDDENS, 2001a, p.88-89).
fazia imprescindível na reforma do Estado, tal
como será tratado a seguir.
Assim, na busca de rompimento com a
ortodoxia neoliberal, o programa da Terceira
Via propõe a renovação da sociedade civil no O NOVO ESTADO DEMOCRÁTICO E A
NOVA SOCIEDADE CIVIL ATIVA
sentido de se tornar um espaço de colaboração
ou obrigação mútua. O processo exigiria a
Em relação à reforma do Estado no sentido
formação de uma nova cultura cívica, o resgate
de criar condições renovadas para a reprodução do
da solidariedade social perdida; isso levaria as
capital, a Terceira Via tenta se diferenciar dos
comunidades a agir por si mesmas na solução
modelos estatais anteriores: tanto do Estado
dos seus problemas, a se tornar independentes
"máximo", como o Welfare State, quanto do
do Estado, bem como promoveria um pacto
"mínimo", como o dos neoliberais ortodoxos. Em
para que, por meio do diálogo, fossem
seus termos, a “questão não é mais ou menos
encontradas soluções pacíficas para os
governo, mas o reconhecimento de que a
conflitos e meios para promover a coesão
governação, deve se ajustar às novas
social. A educação para a cidadania ativa faria,
circunstâncias da era global; e de que a
portanto, parte da estratégia de formação de
autoridade, inclusive a legitimidade do Estado,
uma nova consciência e conduta social,
tem de ser ativamente renovada” (GIDDENS,
expressa mais na colaboração e menos na
2001a, p.82).
reivindicação de direitos por parte dos
A proposta é remodelar o Estado, redefinir
indivíduos:
suas estruturas, seu papel e forma de atuação,
Ambas as estratégias se destinam visando o aprofundamento e a ampliação da
à construção de novas subjetividades, democracia. Trata-se, então, da formulação de um
visando a preparação de um perfil novo Estado democrático. Na interpretação de
humano que combine a Martins (2007, p.79):
individualização da autonomia com a
abertura para o estabelecimento de [...] A Terceira Via defende que o "novo
laços de cooperação com os mais Estado democrático" estimularia o
próximos para reforçar a conservação. fortalecimento e a flexibilidade do
Com isso [...] atuando em rede rumo mercado, sem o radicalismo dos
à consolidação da coesão cívica de
11
novo tipo e impulsionadas por uma Nas palavras de Giddens (2001, p.16): "Social
nova sociabilidade expressa pela idéia democracia é um termo ainda amplo e mais ambíguo. Eu
de "cidadania ativa" (MARTINS, o utilizo para designar partidos e outros grupos da
2007, p.89). esquerda reformista, inclusive o Partido Trabalhista
britânico".

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


70 A "educação para a cidadania ativa" como estratégia contemporânea do programa neoliberal da Terceira Via

neoliberais. Ao mesmo tempo, entre público e privado, o que leva à criação do


realizaria as questões sociais, como conceito de público não-estatal. Para Martins
defendido pelos social-democratas (2009, p.79), nessa nova estratégia, os papéis
clássicos, no entanto, por meio de seriam bem definidos:
outros mecanismos. O "Estado
necessário" seria o regulador e
[...] Ao aparelho do Estado, atuando
coordenador de processos de
supostamente em defesa do interesse de
desenvolvimento econômico e social
todos, caberia indicar áreas prioritárias, o
capitalista.
formato do projeto, o tipo de concessão
pública, o tempo de exploração e os
Na nova concepção, cujo princípio incentivos (renúncias) fiscais de estímulo
norteador é a “democratização da democracia” ao investimento de capital privado. Ao
(GIDDENS, 2001a, p.80), o papel da esfera empresariado caberia realizar as obras,
pública deveria ser expandido, de modo que a oferecer empregos, explorar as concessões
sociedade civil fosse transformada em parceria e usufruir os incentivos disponibilizados,
do Estado, compartilhasse suas alavancando o desenvolvimento.
responsabilidades e, ao mesmo tempo,
impusesse limites à atuação e ao controle Além da inciativa privada, o Estado
estatal excessivo. Para Giddens (2001a, p.95), também deve incentivar parcerias com grupos do
"[...] Uma sociedade civil saudável protege o terceiro setor que tenham interesse de, em
indivíduo do poder estatal avassalador". colaboração com a aparelhagem estatal, prestar
Assim, a sociedade civil atuaria como uma serviços sociais. As vantagens dessa parceria são
“espécie de guardiã em última instância da descritas por Giddens:
democracia” (CASTELO, 2013, p.289). Ao
mesmo tempo, considerando que a sociedade [...] se desenvolvidos de maneira eficaz, os
civil também é fonte de tensões e conflitos, grupos do terceiro setor podem oferecer
opções de escolha e capacidade de
cabe ao Estado proteger os indivíduos, o que
resposta na prestação de serviços públicos.
significa que o “[...] Estado não poderia Eles podem também ajudar a promover a
transferir todos os seus poderes à sociedade cultura cívica local e algumas formas de
civil” (GIDDENS, 2001a, p.96), dentre os desenvolvimento comunitário. Para tanto,
quais a tomada de decisões e o planejamento eles precisam ser ativos e empreendedores.
nas áreas consideradas estratégicas. Os empresários sociais podem ser
Para o desenvolvimento do novo estado inovadores muito eficazes no domínio da
democrático, a política da Terceira Via busca o sociedade civil, ao mesmo tempo que
equilíbrio entre Estado, sociedade civil e contribuem para o desenvolvimento
mercado, advogando em favor da criação de econômico. [...] Os grupos do terceiro
setor podem também combinar eficácia
uma nova economia mista, ou seja, de “[...]
nos negócios com o estímulo a programas
uma nova sinergia entre os setores público e sociais (GIDDENS, 2001b, p.86).
privado, utilizando o dinamismo dos mercados
mas tendo em mente o interesse público 12” Nesse sentido, o programa da Terceira Via
(GIDDENS, 2001a, p.109). A base para o prevê claramente uma delimitação da atuação do
desenvolvimento de projetos econômicos e Estado na área social.
sociais comuns seria constituída pelas
parcerias entre Estado e sociedade civil, na [...] As instituições do terceiro setor [...]
qual estão incluídas as organizações não deveriam desempenhar um papel maior no
governamentais, as associações, as fundações, fornecimento de serviços de welfare. A
os institutos e até mesmo empresas. concessão de benefícios de cima para
Redefinem-se, nessa perspectiva, as fronteiras baixo deveria ceder lugar a sistemas de
distribuição mais localizados. De maneira
12 mais geral, deveríamos reconhecer que a
Essa concepção é formulada pelo sociólogo norte
reconstrução da provisão de welfare deve
americano Robert Putnam, para quem, “é a
participação cívica (sociedade forte) que favorece ser integrada a programas para o
uma economia e um Estado fortes e não ao contrário” desenvolvimento ativo da sociedade civil
(MARTINS et al, 2010, p.150). (GIDDENS, 2001a, p.128).

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CARVALHO; GARCIA 71

Nesse processo, o Estado redefine suas comunidades mais pobres que o incentivo à
funções, priorizando a execução dos serviços iniciativa e ao envolvimento locais podem gerar o
públicos fora de sua esfera e, ao mesmo tempo, maior retorno". O argumento empregado para
estimula a responsabilidade social dos justificar esse incentivo por parte dos governos é o
indivíduos13 e o surgimento de novos sujeitos de que essas organizações e associações estão
políticos coletivos, menos dependentes das mais próximas da comunidade local e, portanto,
políticas públicas do Estado e mais envolvido suas ações podem ser mais eficazes e mais
na resolução dos problemas sociais. Na condizentes com suas necessidades.
interpretação de Neves e Sant‟Anna (2005, Ao garantir alguns serviços à comunidade
p.38): ou a populações locais carentes, bem como
fortalecer os laços de convivência pacífica e obter
O apelo à responsabilidade social de a coesão social, a sociedade civil ativa, como uma
cada indivíduo, grupo ou comunidade, esfera autônoma, localizada entre o aparelho do
ponto focal da ideologia burguesa no Estado e o mercado, “[...] seria o espaço de
atual processo de ocidentalização, encontro com o outro e de realização do "eu" no
constitui-se em importante estratégia
sentido da promoção da coesão social. Cada um,
de minimização dos efeitos da
superexploração a que está submetida movido por sua individualidade, entraria em
boa parcela da classe trabalhadora contato com outros indivíduos formando grupos
mundial em conseqüência dos efeitos de diferentes tipos que dialogam entre si”
do desemprego estrutural e dos (MARTINS, 2007, p.72). Assim, levando em
processos de precarização das relações conta a necessidade de encontrar um novo
de trabalho [...] equilíbrio entre o indivíduo e a responsabilidade
para com os outros, “a chamada sociedade civil
O novo Estado democrático, buscando ativa se tornaria o lócus da ajuda mútua, da
partilhar responsabilidades com diferentes solidariedade, da colaboração [para a promoção
sujeitos políticos, deve incentivar a expansão do bem comum] e da harmonização das classes
de uma sociedade cada vez mais reflexiva14, sociais” (LIMA e MARTINS, 2005, p.53),
voltada para a auto-organização e para a assegurando uma maior coesão social e a
renovação comunitária, o que implica maior reprodução das relações sociais capitalistas.
envolvimento voluntário do cidadão nas A proposta da sociedade civil ativa parte da
questões de interesse público e o premissa de que estaria surgindo uma nova cultura
aproveitamento da iniciativa local, sobretudo política. Na interpretação de Giddens, a
em áreas mais pobres. Nas palavras de Giddens globalização e o "fim do socialismo" foram os
(2001a, p.90), "[...] é particularmente em principais responsáveis pela mudança substancial
na estrutura da sociedade civil, especialmente nas
13
relações entre "classes". Para o teórico da Terceira
Nas palavras de Martins (2009, p.82), "[...] essas Via, esse contexto demarca o fim das classes
mudanças exigem que o empresariado assuma uma
nova postura, aceite certas responsabilidades para sociais, permitindo o surgimento de novos sujeitos
com as questões sociais, atuando em projetos de políticos a partir da pluralidade de grupos com
desenvolvimento comunitário e na mobilização de interesses específicos e com impactos na
organizações não-governamentais, associações e sociedade civil. Com efeito, os conflitos e lutas
institutos comprometidos com esses projetos. [...]
Isso significa que a classe empresarial deve se
políticas teriam se desprendido dos antagonismos
renovar politicamente para assumir um novo papel e de classe, vinculando-se a diferenças entre grupos
uma nova conduta na sociedade civil referenciada no com diferentes identidades [étnicas, religiosas,
postulado da "responsabilidade social"". culturais, etc.].
14
Segundo a definição da Terceira Via, entende-se a Considerando essas mudanças e a
reflexibilidade como o “[...] uso da informação sobre necessidade de buscar novos meios para estimular
as condições de atividade como um meio de a renovação dos laços de solidariedade entre os
reordenar e redefinir regularmente o que essa
indivíduos e os grupos com base no equilíbrio
atividade é. Ela diz respeito a um universo de ação
onde os observadores sociais são eles mesmos entre a liberdade individual e a responsabilidade
socialmente observados; e, hoje em dia, ela é coletiva, Giddens destaca a necessidade de o
verdadeiramente global em dia abrangência” Estado conduzir a participação dos indivíduos.
(GIDDENS, 1996, p.101). Destaque-se que sua proposta de cidadania ativa

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


72 A "educação para a cidadania ativa" como estratégia contemporânea do programa neoliberal da Terceira Via

tem o individualismo como valor moral radical dos seus interesses e bem estar, mas também
como um de seus princípios políticos. Ou seja, “responsavelmente em relação aos outros”
esse novo individualismo, ao invés de um (GIDDENS, 2002, p.196). Trata-se, portanto, de
“comportamento egoísta do mercado, voltado fazer com que os cidadãos compreendam que eles
para a maximização dos lucros” (GIDDNES, possuem a capacidade de se mobilizar no espaço
2001c, p.318), deve levar em conta o comunitário para solucionar problemas que
comprometimento social, a necessidade de transcendem sua individualidade. Para isso, a
uma atuação responsável em relação aos outros estratégia seria o que Giddens denomina de
independentemente do Estado. Tal atuação se política gerativa, ou seja, uma política que:
materializa na forma de organizações não
lucrativas da sociedade civil, no voluntariado [...] busca permitir aos indivíduos e grupos
ou em organizações empresariais que tenham fazerem as coisas acontecerem, e não
programas de responsabilidade social, aspecto esperarem que as coisas lhes aconteçam,
que analisaremos a seguir. no contexto de preocupações e objetivos
sociais totais. A política gerativa é uma
defesa da política do domínio, mas ela não
A CONCEPÇÃO DA "CIDADANIA se situa na velha oposição entre Estado e
ATIVA" mercado. Ela opera fornecendo condições
materiais e estruturas organizacionais para
O conceito de cidadania ativa relaciona- as decisões de políticas de vida tomadas
se à concepção de cidadãos que não sejam por indivíduos e grupos na ordem social
coagidos por controles externos, advindos mais ampla (GIDDENS, 1996, p.23-24).
supostamente da intervenção estatal ou do
autoritarismo dos governos. Isso seria possível No entanto, analisadas de uma perspectiva
com a criação de uma geração de cidadãos que crítica, a política gerativa e a política de vida
fossem mais suscetíveis de assumir iniciativas podem ser interpretadas como
e decisões, que fossem mais criativos,
autônomos e solidários, com “um elevado [...] estratégias destinadas a disseminar
senso de responsabilidade social” e o individualismo e incentivar o
comprometimento “com a busca de soluções desenvolvimento do "capital social",
remodelando as referências históricas de
para os problemas de sua comunidade”
cidadania. Ambas as estratégias se
(MARTINS, 2007, p.146). destinam à construção de novas
Conforme Martins (2009, p.89), ao subjetividades, visando a preparação de
buscar a renovação das instituições um perfil humano que combine a
democráticas e novas possibilidades de individualização da autonomia com a
participação, a Terceira Via, fundamentada abertura para o estabelecimento de laços
na política de vida e na política gerativa, de cooperação com os mais próximos para
retoma e amplia o princípio neoliberal do reforçar a conservação. Com isso, através
individualismo. Por meio do estímulo ao de processos moleculares, a manutenção
denominado individualismo como valor moral das relações sociais e as relações de
poder no capitalismo seriam sustentadas
radical, da combinação da “individualização
por vários pequenos organismos, atuando
da autonomia com abertura para o em rede rumo à consolidação da coesão
estabelecimento de laços de cooperação com cívica de novo tipo e impulsionadas por
os mais próximos”, sua estratégia é “remodelar uma nova sociabilidade expressa pela
as referências históricas de cidadania”, idéia de "cidadania ativa" [...]
conduzindo-a para uma atuação mais reflexiva (MARTINS, 2009, p.89).
e ativa.
A política de vida “diz respeito a Portanto, a proposta do novo
decisões de vida. Ela é uma política de escolha, individualismo político da Terceira Via,
identidade e mutualidade” (GIDDENS, 2001a, orientado para levar os indivíduos a se associar
p.54). Nesses termos, a meta da política de com outros com base em interesses precisos para a
vida é "libertar" os cidadãos das pressões edificação da sociedade civil ativa e do novo
exercidas pelo excesso de regulamentações por Estado democrático, tem por estratégia “[...]
parte do Estado, para que possam agir em prol desarmar os espíritos para relações mais

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


CARVALHO; GARCIA 73

harmônicas em que a colaboração torna-se Ao mesmo tempo, a ênfase no


referência, desarticulando, conseqüentemente, individualismo vem acompanhada de maior
os organismos sociais (partidos e os sindicatos) responsabilização dos indivíduos diante da
que ainda atuam numa perspectiva de democracia e da sociedade em geral, pois, para a
interesses de classe” (MARTINS, 2007, p.89). Terceira Via, “não há direitos sem
Em um contexto de aprofundamento das responsabilidade” (GIDDENS, 2001a, p.75).
desigualdades, de intensificação dos conflitos Assim, diante da reconfiguração do papel do
sociais, de origem de “novos movimentos Estado e da busca por promover um novo
sociais” e de uma ampla organização da relacionamento entre o indivíduo e a comunidade,
sociedade civil na luta por direitos, o capital propõe-se uma redefinição dos direitos e das
tem buscado estratégias para utilizar os obrigações. Ou seja, “[...] Com o individualismo
esforços desse amplo movimento de em expansão deveria vir uma extensão das
mobilização da sociedade civil convertendo-os obrigações individuais” (GIDDENS, 2001a, p.75).
para suas necessidades. Nesse sentido, com a Isso significa que o Estado, ao fornecer os
finalidade de construir uma sociedade solidária serviços sociais, exigiria uma contrapartida dos
e coesa, busca-se a harmonização social, o cidadãos, que se tornariam menos dependentes
engajamento cívico, de modo que o das políticas sociais e mais responsáveis por suas
confronto/conflito entre as classes sociais ceda vidas (MARTINS et al, 2010). Como exemplo,
lugar à colaboração15 (MARTINS e NEVES, Giddens menciona os auxílios-desemprego que,
2010). segundo ele, “deveriam acarretar a obrigação de
procurar trabalho ativamente” cabendo “aos
15
Essa finalidade pode ser identificada no documento governos assegurar que os sistemas de bem-estar
elaborado pelo Banco Mundial no Brasil com social não desencorajem a procura ativa”
assistência da Unidade da sociedade Civil e de ONGs (GIDDENS, 2001a, p.75).
do Departamento de Desenvolvimento Social do
Banco Mundial. Esse documento, intitulado “Do Segundo a proposta da Terceira Via, a
Confronto à Colaboração: Relações entre a Sociedade globalização cultural, o avanço dos meios de
Civil, o Governo e o Banco Mundial no Brasil” comunicação e a assimilação de novas
(2000), almejando sintonizar as ações do “novo responsabilidades sociais favoreceriam que o
Estado democrático” com os organismos da
indivíduo se envolvesse com um campo mais
sociedade no sentido proposto pela terceira via, busca
estimular uma postura mais participativa por parte da abrangente de temas e de preocupações que
sociedade brasileira. Na introdução, Gobind Nankani, ultrapassariam os horizontes mais imediatos de
Diretor para o Brasil, oferece-nos uma ideia do seu sua convivência. Por isso, a estratégia da
teor. Segundo ele, o Banco Mundial reconhece que o cidadania é enfatizar o novo individualismo, que
Brasil tem uma “sociedade civil vibrante e cada vez
mais influente”, capaz de organizar e promover o tem em si o envolvimento do cidadão nas “[...]
desenvolvimento em nível local. Assim, o estudo „novas responsabilidades‟ com o meio ambiente16,
procura descrever “como outros setores maiores
como as associações comunitárias, movimentos
sociais e associações profissionais desempenham um apresentando “conclusões baseadas em experiências bem
papel importante no denominado “Terceiro Setor” no sucedidas de parcerias, que políticas e estratégias de
Brasil”. O estudo “descreve a agenda social que participação da sociedade civil contribuem para o melhor
desponta no setor privado e, particularmente, as desempenho de projetos de desenvolvimento e como
fundações de empresas e suas crescentes alianças potencializam seus impactos sociais”, finaliza: “apesar
com o governo na forma de projetos inovadores que dos avanços nas relações tripartite, ainda existe um longo
estão sendo implementados pelo Conselho da caminho a ser percorrido no sentido de que todos os
Comunidade Solidária”. Também documenta “os atores - Governo, Sociedade Civil e Banco Mundial -
avanços obtidos nas relações Governo - Sociedade possam efetivamente se unir para promover o
Civil - Banco Mundial nos últimos anos. Muitas desenvolvimento social no Brasil” (GARRISON, 2000,
destas conquistas são pioneiras e demonstram que as p.5).
três partes, especialmente o governo e a sociedade 16
Para Falleiros (2005, p.234): "Uma nova cidadania é
civil, que são os dois principais interlocutores, estão definida pelo projeto capitalista para o século XXI e deve
aprendendo a colaborar de forma construtiva”. O
incorporar uma consciência socioambiental planetária [...]
estudo destaca que “talvez o mais surpreendente seja O "cidadão" torna-se surpreendentemente responsável
observar o elevado grau de projetos financiados pelo pelos destinos do planeta, ainda que – mero detalhe – não
Banco Mundial no Brasil que são canalizados à seja convidado a participar das decisões econômicas e
sociedade civil, via fundos de pequenos projetos políticas controladas pelos grupos hegemônicos nacionais
administrados pelo governo em áreas temáticas como e internacionais".
meio ambiente, saúde e pobreza rural”. Por fim,

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


74 A "educação para a cidadania ativa" como estratégia contemporânea do programa neoliberal da Terceira Via

com sua família e com a comunidade” com sua família, bairro e sociedade não
(MARTINS, 2009, p.91). pode ser descarregada no Estado. Se o
Para Giddens (2001a, p.47), “o novo conceito de obrigação mútua é esquecido,
individualismo segue de mãos dadas com o resultado é um declínio no espírito
comunitário, falta de responsabilidade
pressões por maior democratização” e, por
para com os bairros, crime e vandalismo
isso, a participação é decisiva para a solução crescente e um sistema legal incapaz
dos problemas sociais da atualidade. No (BLAIR; SCHROEDER, 1999, p.2).
entanto, para garantir que a sociedade se
transforme em um espaço de colaboração Esse ponto de vista é compartilhado pelo
social, de ajuda mútua e de convivência sociólogo britânico:
democrática, é necessário difundir valores
morais e éticos e, assim, formar uma nova [...] A coesão social não pode ser
subjetividade coletiva, compatível com a nova assegurada pela ação de cima para baixo
sociabilidade capitalista: do Estado ou pelo apelo à tradição. Temos
de moldar nossas vidas de uma maneira
Justiça social, liberdade e igualdade de mais ativa do que fizeram gerações
oportunidades, solidariedade e anteriores, e precisamos aceitar mais
responsabilidade para com os outros: ativamente responsabilidades pelas
estes valores são eternos. A social- consequências do que fazemos e dos
democracia nunca os sacrificará. hábitos de estilo de vida que adotamos
Tornar estes valores relevantes no (GIDDENS, 2001a, p.47).
mundo de hoje requer políticas
realistas e com visão de futuro, capazes Tal compreensão faz parte da ideia que o
de enfrentar os desafios do século XXI Estado do Welfare State não ofereceu ao cidadão a
(BLAIR e SCHROEDER, 1999, p.1). oportunidade de desenvolver seu potencial
solidário e de contribuir para a solução dos
Com a formação dos novos sujeitos problemas sociais, especialmente aqueles
políticos coletivos e a consequente ampliação vivenciados pelos grupos comunitários; pelo
de sua participação na esfera política com base contrário, inibiu seu direito natural de liberdade e
nos novos valores e para além dos muros da sua autonomia de ação. Para fazer melhor uso dos
escola, os indivíduos seriam estimulados a talentos e capacidades de seus cidadãos, o novo
participar, especialmente por meio de Estado democrático deve, segundo Tony Blair e
plebiscitos e referendos, de organizações da Schroeder 17,
sociedade civil não lucrativas, dentre as quais
as ONGs, de corporações empresariais que Oferecer a todo o indivíduo a
promovem programas de responsabilidade oportunidade de desenvolver o seu
social e de trabalhos voluntários. Portanto, o potencial pessoal, combater a exclusão
novo programa político atribui aos cidadãos social e a pobreza, reconciliar progresso
responsabilidades que, no período do Welfare material com sustentabilidade ambiental e
State, eram confiadas ao Estado. Essa é a com nossas responsabilidades para com as
compreensão manifestada por Tony Blair e gerações futuras, combater problemas
comuns que ameaçam a coesão da
Gerhard Schoroeder no documento "Europa: a
sociedade (BLAIR e SCHROEDER, 1999,
Terceira Via - o Novo Centro". p.1).
O equilíbrio entre indivíduo e
Nesse sentido, há um forte incentivo para o
coletivo foi distorcido. Valores
importantes para os cidadãos, como envolvimento de indivíduos em organizações
conquista pessoal e sucesso, espírito locais para superar problemas enfrentados pela
empreendedor, responsabilidade comunidade, tais como: pobreza, geração de
pessoal e espírito comunitário foram
17
muitas vezes subordinados a proteções A afirmação de Tony Blair e Schroeder tem o mesmo
sociais universais [...] Muitas vezes os sentido da de Giddens: "Uma sociedade extremamente
direitos foram elevados acima das desigual está se prejudicando por não fazer o melhor uso
responsabilidades, mas a dos talentos e capacidades de seus cidadãos" (GIDDENS,
2001, p.52).
responsabilidade do indivíduo para

Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 19, n.3, p. 61-78, Setembro/Dezembro 2016


CARVALHO; GARCIA 75

trabalho e renda, assistência social, educação, comunidade autossuficiente, menos dependente


etc. De acordo com Martins (2007, p.220), a das políticas públicas e da aparelhagem estatal"
Terceira Via buscou "legitimar a noção de (MARTINS, 2009, p.83). Por isso, a questão da
voluntariado como expressão contemporânea cidadania é central no projeto da Terceira Via, já
da cidadania ativa e da solidariedade". que esta tem como finalidade formar o cidadão
Portanto, busca estimular o cidadão voluntário, adequado a tais demandas:
altruísta e colaborador que, ao invés de
reivindicar direitos e de esperar a intervenção O objetivo geral da política da terceira via
do Estado, concentre-se em realizar ações em deveria ser ajudar os cidadãos a abrir seu
benefício de terceiros, da comunidade e do caminho através das mais importantes
país, em buscar a resolução dos problemas revoluções de nosso tempo: globalização,
transformações na vida pessoal e nosso
sociais sem a intermediação direta do aparelho
relacionamento com a natureza
de Estado: (GIDDENS, 2001a, p.74).
A pobreza continua uma preocupação
Com base no exposto, compreendemos que
central, especialmente entre famílias
com crianças. Precisamos de medidas a concepção de cidadania ativa possui dois
específicas para os mais ameaçados de pressupostos centrais: primeiro, o da cidadania
marginalização e de exclusão social. liberal clássica, ou seja, o primeiro pressuposto da
Isto também requer uma abordagem formação da cidadania ativa relaciona-se à noção
moderna por parte do governo: O de liberdade e autonomia individual diante de
Estado não deve remar, mas pilotar: todo e qualquer tipo de coerção e de limites
não deve ter tanto controle, mas impostos; o segundo é que a estratégica da
enfrentar desafios. As soluções para os cidadania ativa leva em conta a ênfase no novo
problemas devem ser obtidas com a individualismo, que tem em si o envolvimento do
participação (BLAIR e SCHROEDER,
cidadão no âmbito político-social como algo
1999, p.3).
decisivo para a solução dos problemas sociais da
atualidade. Portanto, a cidadania, em sua
Dessa perspectiva, a desigualdade social
“qualidade nova”, não é caracterizada
não é interpretada como produto da
necessidade de produção e reprodução do exclusivamente pelos direitos, pois ela implica
uma maior ênfase nas responsabilidades.
capital, mas da falta de participação dos
Nessa conjuntura, observamos que, no
cidadãos. Além disso, os autores não deixam
encaminhamento das políticas educacionais, o
dúvida de que a “cidadania ativa" manifesta
tema não só vem sendo bastante enfatizado como
uma concepção de que aquilo que o indivíduo
também tem adquirido “novos significados”. A
faz por si mesmo é superior ao que o Estado
cidadania ativa é vista como uma forma de
realiza.
amenizar o impacto da crise, levando o sujeito [e a
A adesão a essa proposição implica
sociedade civil] a buscar soluções para os
necessariamente a adesão a todo o ideário
problemas locais e cotidianos de forma
político afinado com as necessidades da lógica
individualizada.
capitalista contemporânea. Assim, por detrás
do discurso que defende a liberdade e a
autonomia individual, que apresenta a imagem CONCLUSÃO
do cidadão responsável, está a defesa da
A formação para a cidadania tem sua
liberdade plena para o capital, a qual, muitas
gênese em uma necessidade histórica: as relações
vezes, pode ser "impedida" pela ação do
de produção capitalista precisam disseminar
Estado. Isso significa que, para a reprodução
do capital na atualidade, torna-se necessário valores éticos e morais e, com base nisso,
conformar os sujeitos à sua lógica.
manter a liberdade de mercado pretendida pela
A crise de acumulação iniciada na década
teoria liberal. Contudo, o que a Terceira Via
de 1970 e suas respectivas respostas político-
almeja é apenas uma estratégia diferente para
econômicas, como a globalização/mundialização
atingir esse objetivo. Nesse ponto específico, a
mais acentuada e expansionista do capital, a
compreensão é de que "o desenvolvimento do
reestruturação produtiva e a reforma do Estado
capital social tornaria, portanto, uma

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76 A "educação para a cidadania ativa" como estratégia contemporânea do programa neoliberal da Terceira Via

conforme as orientações neoliberais, cívico, que o confronto vá cedendo lugar à


modificam as bases e valores sobre os quais se colaboração.
assenta a formação para a cidadania. Cabe mencionar que as organizações
Conforme expusemos, a reconfiguração internacionais, como a UNESCO e o Banco
do papel do Estado segundo os preceitos da Mundial, tiveram uma atuação decisiva na difusão
Terceira Via promove uma alteração nas do novo projeto. Essas agências passaram a atuar
relações entre Estado, sociedade civil e na formulação de consensos globais sobre o papel
mercado. Ao reconhecer a necessidade de da educação no século XXI e também sobre o tipo
intervenção social para regular e coordenar o de sujeito a ser formado, tendo em vista as novas
processo de desenvolvimento econômico e exigências do capital monopolista. Por meio da
social e para supostamente dirimir as mazelas análise dos documentos internacionais e
próprias do capitalismo, o novo programa nacionais, pudemos identificar que os princípios
político transfere para a sociedade civil a tarefa que orientam a política educacional brasileira,
de fornecer serviços, especialmente no âmbito com vistas à formação para o exercício da
social, fora da esfera estatal. Assim, à medida cidadania ativa, estão em confluência com as
que as relações econômicas capitalistas exigem orientações dessas organizações.
uma menor atuação estatal no que se refere às Analisando os atuais encaminhamentos da
expressões da questão social (pobreza, política educacional, observamos que vêm
violência, desemprego, etc.), o Estado assume ocorrendo mudanças significativas naquilo que se
a função educadora da sociedade civil (LIMA entende por formação para a cidadania. No
e MARTINS, 2005), buscando construir uma entanto, embora assuma uma nova roupagem por
nova cultura cívica, pautada no senso de meio de um discurso renovado ou ressignificado,
responsabilidade e de dever do cidadão para a nova proposta mantém em seu cerne o mesmo
com a solução dos problemas inerentes ao objetivo moralizante e conformista com a lógica
próprio sistema. capitalista. Podemos afirmar que a formação para
Com base na perspectiva neoliberal da a cidadania ativa, em um contexto de crise e de
Terceira Via – fundamentada nos ideais de um aprofundamento das contradições e dos conflitos
“novo Estado democrático”, de sociedade civil sociais, constitui parte das estratégias
ativa, de reflexibilidade, de novo empreendidas para a produção de uma nova forma
individualismo, dentre outros, atribui-se à de consciência e um novo conformismo social,
educação, particularmente à escola, a função expressão empregada por Gramsci (1981). Tais
de construir uma nova cultura cívica. Baseada estratégias têm por objetivo final a reprodução das
na cidadania ativa, essa é uma das estratégias relações sociais.
da construção de um novo tipo de consenso Ressaltamos que a reestruturação produtiva
sobre os padrões de comportamento adequados levou ao aumento do desemprego, à perda dos
à nova forma de sociabilidade necessária à direitos sociais, à maior exploração de mais-valia
reprodução capitalista. (absoluta e relativa) e ao apassivamento dos
É nessa conjuntura que a formação para movimentos sindicais, além de apelar para uma
a cidadania adquire nova qualidade, sendo maior responsabilização ética dos indivíduos
redefinida como ativa. A cidadania de como importante estratégia para minimizar os
“qualidade nova”, acoplada ao fortalecimento efeitos da superexploração e da exclusão social.
da sociedade civil, passa a ser vista como uma Nesse contexto, a proposta da cidadania ativa leva
forma de diminuir os efeitos da crise os indivíduos não apenas a se considerar
capitalista. A partir de um novo responsáveis pela solução dos problemas, mas
comportamento ético, a sociedade civil em também a acreditar que a situação de pobreza e de
geral e os indivíduos em particular são exclusão social decorre de sua incapacidade de
induzidos a buscar soluções para os problemas encontrar soluções adequadas para seu
locais e cotidianos, sem demandar ações por enfrentamento.
parte do Estado, bem como a encontrar, por A nova proposta de educação para a
meio do diálogo, caminhos para a convivência cidadania ativa, pautada em valores como
pacífica entre os diferentes grupos e para solidariedade, autonomia, participação,
amenizar os confrontos e conflitos sociais. Ou responsabilização social, etc., favorece o
seja, busca-se, por meio do engajamento entendimento de que essa formação é decisiva

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CARVALHO; GARCIA 77

para a solução de problemas históricos http://escoladafamilia.fde.sp.gov.br/v2/Arquivos/Ideias32.pdf


relacionados ao trato da “questão social”, a Acesso em: 13 de jul., 2014.
exemplo da pobreza, desconsiderando sua
BARBOSA, Paulo Alexandre Pereira. A escola da
inerência ao movimento do capital, cujo cidadania. In: FUNDAÇÃO PARA O
processo de acumulação, por um lado, DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO. Diretoria de
concentra riquezas e, por outro, produz Projetos Especiais. Escola da Família. Organização de
miséria, violência e exclusão. Desse modo, faz Adriano Costa [et al.]. São Paulo: FDE, 2004. 280 p.
(Série Ideias; nº 32), p. 25-38. Disponível em:
parte desse processo encobrir as desigualdades http://escoladafamilia.fde.sp.gov.br/v2/Arquivos/Ideias32.pdf
sociais e produzir estratégias para administrar Acesso em: 13 de jul., 2014.
os conflitos delas decorrentes.
A análise da proposta nos leva a concluir BLAIR, Tony; SCHROEDER, Gerhard. Europa: A Terceira
que, ao desconsiderar que é o modo como são Via/O novo centro. 11 de junho de 1999. Declaração
conjunta.
produzidos os meios de subsistência que
determina a existência e a natureza das classes BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
sociais e suas contradições, a Terceira Via curriculares nacionais: introdução aos parâmetros
sugere que as alternativas sejam construídas no curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997.126p.
limite das individualidades com base na Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acesso
própria lógica social do capital. Esta é em: 20 de Ago. 2012.
considerada como a única forma possível e
aperfeiçoável, com capacidade “[...] de inovar, BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Resolução
adaptar e gerir uma produtividade crescente” CEB nº 2, de 7 de Abril de 1998. Institui as Diretrizes
(GIDDENS, 2001, p.14). O posicionamento do Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental.
autor revela assim que, como o capital não Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rceb02_98.pdf.
pode resolver a contradição central que Acesso em 13 de Ago. 2012
permeia sua própria existência, ou seja, a
produção social e a apropriação privada, sua BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Módulo Fundeb:
tendência histórica é promover mudanças Brasília: MEC, FNDE, 2009. 166 p., (Formação pela Escola).
políticas que não alteram a essência das
relações sociais capitalistas. Portanto, o novo BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. A crise da América
Latina: consenso de Washington ou crise fiscal? Pesquisa,
programa político altera somente a forma como Planejamento e Economia, Rio de Janeiro, v. 21, nº1, p. 3-24,
se estabelece o poder de classe, em razão da abr. 1991.
necessidade imprescindível de estruturá-lo de
maneira mais compatível com o capitalismo CARVALHO, E. J. G. Educação e Diversidade Cultural. In:
em sua fase atual. CARVALHO, Elma Júlia Gonçalves de; FAUSTINO,
Rosangela Célia. (Org.). Educação e Diversidade Cultural.
Por fim, cabe destacar que a proposta de 2ªed., Maringá: EDUEM, 2012, p. 17-56.
formação para a cidadania ativa, presente nos
encaminhamentos da atual política CASTELO, Rodrigo. O Social-liberalismo: auge e crise da
educacional, busca eliminar as resistências supremacia burguesa na era neoliberal. 1ed. São Paulo:
sociais por meio da formação de um cidadão Expressão popular, 2013.
que concentre sua atuação na prática
CUÉLLAR, Javier Pérez (Org.). Nossa diversidade
voluntária, apassivada e não reivindicativa de criadora. Campinas, SP: Papirus; Brasília, DF: UNESCO,
direitos, que não conteste as relações de 1997.
exploração e de exclusão social às quais está
submetido. DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. 10ª
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DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO. Diretoria de 209-235.
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Adriano Costa [et al.]. São Paulo: FDE, 2004. 280 p. GARCIA, Jeferson Diogo de Andrade. Política educacional
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