Você está na página 1de 92

FACULDADE DE DIREITO

Título
Cooperação internacional e desenvolvimento das indústrias culturais e
criativas em Moçambique: uma análise do programa DIVERSIDADE no
período entre 2020-2021

Dissertação apresentada à Faculdade de


Direito da UEM para aprovação no Curso de
Mestrado em Cooperação e Desenvolvimento

Autor: Zeca Alfredo Tsamba


Orientador: Prof Doutor Luca Bussotti

Maputo
2023
FACULDADE DE DIREITO

Título
Cooperação internacional e desenvolvimento das indústrias culturais e
criativas em Moçambique: uma análise do programa DIVERSIDADE no
período entre 2020-2021

Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da


UEM para aprovação no Curso de Mestrado em
Cooperação e Desenvolvimento

Autor: Zeca Alfredo Tsamba


Orientador: Prof Doutor Luca Bussotti

Maputo
2023

ii
Faculdade de Direito

Cooperação internacional e desenvolvimento das indústrias culturais e


criativas em Moçambique: uma análise do programa DIVERSIDADE no
período entre 2020-2021

O Juri
Dissertação para obtenção do grau de mestre em Cooperação e Desenvolvimento

Orientador: Prof. Doutor Luca Bussotti


Presidente: Prof Doutor Teodosio Waty
Oponente: Prof. Doutor Edumundo Macuácua

Zeca Alfredo Tsamba

Maputo, 21 de Abril de 2023

iii
Declaração de honra

Eu, Zeca Alfredo Tsamba, declaro por minha honra que este trabalho de pesquisa com o título
“Cooperação internacional e desenvolvimento das indústrias culturais e criativas em
Moçambique: uma análise do programa DIVERSIDADE no período entre 2020-2021”,
nunca foi apresentado para obtenção de qualquer grau académico e resulta da minha investigação
pessoal, estando incluídas no texto e na bibliografia final as fontes utilizadas. Esta dissertação é
apresentada em cumprimento parcial dos requisitos para obtenção de grau de Mestre em
Cooperação e Desenvolvimento pela Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane.

O autor

____________________________
Zeca Alfredo Tsamba

iv
Dedicatória

Dedico este trabalho


Ao Azekiwe Tsamba, pela inspiração e
compreensão;
À Márcia da Graça Venância, por tudo e mais
alguma coisa;
Ao meu pai, Alfredo Tsamba (em memória)
À minha mãe, Helena Mahumane;
Aos meus irmãos;
A todos professores e colegas do curso de Mestrado
em Cooperação e Desenvolvimento;
A todos profissionais culturais e criativos,
especialmente a todos gestores dos projectos
subvencionados pelo DIVERSIDADE.

v
Agradecimentos
Agradeço a Deus pelo dom da vida.
Ao professor e orientador Prof. Doutor. Luca Bussotti pelos valiosos ensinamentos e
contribuições. À Universidade Eduardo Mondlane pela bolsa de estudo. Agradeço, igualmente, a
coordenação, aos docentes e colegas do Curso de Mestrado em Cooperação e Desenvolvimento
que, de alguma maneira, contribuíram para a culminação dos módulos curriculares em tempo útil
e conclusão deste trabalho.
Agradeço a minha família pelo apoio, companheirismo e suporte durante todo período de
formação. Ao meu filho Azekiwe Tsamba e a minha esposa Márcia da Graça Venância pela
compreensão durante as minhas ausências ao longo da formação e redação deste trabalho.
Agradeço a minha mãe Helena Mahumane e o meu pai Alfredo Tsamba (in memoriam) por todo
apoio prestado. De igual modo, agradeço a todos meus irmãos pelo carinho e encorajamento.
Os meus apreços estendem-se a todos profissionais culturais e criativos moçambicanos,
especialmente aos gestores dos projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE. À gestora do
PROCULTURA em Portugal, Mercedes Pinto pela abertura e colaboração. À Filipa Corte Real
da Delegação da União Europeia em Moçambique. Ao João Pignatelli, Director do Instituto
Camões de Maputo, entidade gestora do DIVERSIDADE em Moçambique; À Diana Manhiça,
assistente do DIVERSIDADE em Moçambique; Ao Ministério da Cultura e Turismo na pessoa
de Eugénio Santana.
A todos aqueles que, não pude mencioná-los por nome, mas que, directa ou
indirectamente contribuíram para que este trabalho se materializasse, vãos os meus profundos
agradecimentos.

vi
Lista de Tabelas
Tabela 1: Projectos subvencionados ……………………………………………………………54
Tabela 2. Ficha de avaliação do projecto 1. …………………………………………………….61
Tabela 3: Ficha de avaliação do projecto 2……………………………………………………...63
Tabela 4: Ficha de avaliação do projecto 3……………………………………………………...64
Tabela 5: Ficha de avaliação do projecto 4……………………………………………………...65
Tabela 6. Ficha de avaliação do projecto 5. …………………………………………………….66

vii
Resumo
As acções de cooperação internacional para o desenvolvimento visam promover o
desenvolvimento equilibrado e justo das partes envolvidas. No domínio das indústrias culturais e
criativas, a cooperação internacional para o desenvolvimento visa fortalecer o sector e promover
a sua participação no desenvolvimento socioeconómico do país beneficiário. A partir de um
estudo de caso do programa DIVERSIDADE implementado em Moçambique, co-financiado
pela União Europeia, Fundação Gulbenkian e gerido pelo Instituto Camões em Maputo, a
dissertação analisa a relação entre os programas de cooperação internacional e o
desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique. Especificamente, analisa os
resultados dos projectos subvencionados e sua relação com o desenvolvimento do sector cultural
e criativo, com ênfase especial para a criação de empregos. A metodologia adoptada é do tipo
qualitativo, fazendo uma exploração do tema através de revisão bibliográfica, pesquisa
documental e entrevistas. Os resultados revelam que o programa DIVERSIDADE está alinhado
com as políticas e prioridades do sector cultural e criativo nacional. O seu contributo para o
desenvolvimento das indústrias culturais e criativas em Moçambique é modesto, sobretudo para
criação de empregos duradouros. O programa contribuiu para a estruturação e capacitação do
sector cultural e criativo local, porém, a sustentabilidades dos empregos criados e promovidos
pelos projectos subvencionados constitui um desafio, assim como é o envolvimento de actores
locais na definição e gestão dos programas de cooperação internacional e desenvolvimento.
Palavras-chave: Cooperação Internacional, Desenvolvimento e Indústrias Culturais e Criativas.

viii
Abstract
Summary
International development cooperation actions aim to promote balanced and fair development for
the parties involved. In the field of cultural and creative industries, international development
cooperation aims to strengthen the sector and promote its participation in the socio-economic
development of the beneficiary country. Based on a case study of the DIVERSITY program
implemented in Mozambique, co-funded by the European Union, the Gulbenkian Foundation
and managed by the Institute Camões in Maputo, the dissertation analyzes the relationship
between international cooperation programs and the development of the cultural and creative
sector in Mozambique. Specifically, it analyzes the projects subsidized by the program and their
relationship with its management, taking a look at the results of the subsidized projects and their
relationship with the development of the cultural and creative sector, with special emphasis on
the creation of jobs. The adopted methodology is qualitative type, making an exploration of the
theme through bibliographic revision, documentary research and interviews. The results reveal
that the DIVERSIDADE program is aligned with the political and priorities of the cultural and
creative sector. Its contribution to the development of cultural and creative industries in
Mozambique is modest, mainly in terms of creating lasting jobs. The program contributed to the
structuring and empowerment of the local cultural and creative sector, however, the
sustainability of jobs created and promoted by subsidized projects is a challenge, as is the
involvement of local actors in the definition and management of international cooperation and
development programs.
Keywords: International Cooperation, Development and Cultural and Creative an organizational

ix
Índice
CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1
1.2. Justificativa....................................................................................................................... 4
1.3. Problematização ............................................................................................................... 5
1.4. Objectivos......................................................................................................................... 9
1.5. Hipóteses da pesquisa....................................................................................................... 9
1.6. Metodologia ..................................................................................................................... 9
1.6.1. Natureza da pesquisa................................................................................................. 9
1.6.2. Classificação da pesquisa quanto ao nível .................................................................. 10
1.6.3. Classificação da pesquisa quanto à finalidade ............................................................ 10
1.6.4. Técnicas e instrumentos de recolha de dados ............................................................. 10
1.6.5. Amostragem................................................................................................................ 12
1.6.6. Técnicas de análise e interpretação de dados ............................................................. 13
2. CAPÍTULO 2: REVISÃO DA LITERATURA .................................................................... 14
2.1. Cooperação internacional para desenvolvimento: breve historial e pressupostos teóricos 14
2.2. Cooperação internacional e o desenvolvimento do sector cultural e criativo ................ 19
2.3. O lugar da cultura na agenda política nacional e da cooperação cultural internacional 23
2.4. Avaliação de projectos de cooperação internacional para o desenvolvimento .............. 31
2.5. Quadro conceptual ............................................................................................................. 33
2.5.1. Cooperação Internacional para o Desenvolvimento ............................................... 33
2.5.2. Desenvolvimento .................................................................................................... 35
2.5.3. Indústrias Culturais e Criativas................................................................................... 36
2.5.3.1. Indústrias Culturais ............................................................................................. 36
2.6. Quadro teórico ................................................................................................................ 40
2.6.1. Realismo político ......................................................................................................... 40
2.6.2. Teoria da modernização............................................................................................... 41
2.6.3. Construtivismo............................................................................................................. 42
CAPÍTULO 3: APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETACÃO DE RESULTADOS .... 45
3.1. DIVERSIDADE: contextualização, requisitos de candidatura, gestão do programa e
projectos subvencionados .......................................................................................................... 45
3.1.1. PROCULTURA: contextualização e objectivos ..................................................... 45

x
3.1.2. Actividades do PROCULTURA ............................................................................. 48
3.1.3. Objectivos e enquadramento do DIVERSIDADE nas prioridades políticas locais 49
3.1.4. Critérios de elegibilidade do DIVERSIDADE ....................................................... 51
3.1.5. Gestão do DIVERSIDADE..................................................................................... 52
3.1.6. Projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE em Moçambique ....................... 54
3.2. Relação entre a gestão do programa DIVERSIDADE e dos projectos subvencionados ... 58
3.3. Avaliação dos resultados dos projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE no
desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique ............................................... 61
3.3.1. Avaliação de alguns projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE ....................... 61
3.3.2. Programa DIVERSIDADE e sua relação no desenvolvimento do sector cultural e
criativo em Moçambique ....................................................................................................... 69
CAPÍTULO 4. CONCLUSÕES.................................................................................................... 73
5. Referências Bibliográficas ..................................................................................................... 76

xi
xii
CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO
As acções de cooperação internacional para o desenvolvimento, sejam por via de
projectos em sectores específicos, ou direcionados ao orçamento do Estado, visam promover o
desenvolvimento equilibrado e justo das partes envolvidas. A cooperação internacional para o
desenvolvimento surge atrelada ao discurso de solidariedade internacional que apela a
necessidade de utilização dos recursos internacionais para promover o progresso social e a
melhoria dos padrões de vida da população mundial.1
No domínio das indústrias culturais e criativas, a cooperação internacional para o
desenvolvimento é encarada como aquela capaz de fortalecer o sector e promover a sua
participação socioeconómica. A luz da Declaração dos Princípios da Cooperação Cultural2
Internacional, as acções de cooperação internacional no domínio da cultura e da criatividade
devem ser desenvolvidas num espírito de reciprocidade, visando benefícios mútuos das nações
envolvidas.
Todavia, o quadro teórico no qual se fundamenta a cooperação internacional para o
desenvolvimento revela cenários e resultados díspares.
De acordo com o realismo político e o neorrealismo, as relações internacionais
desenvolvem-se num campo de “constantes lutas de poder entre seus membros que vivem em
uma sociedade anárquica e actuam de maneira racional e egoísta para alcançar seus interesses
nacionais”3. Nessa perspectiva, as acções desenvolvidas pelos parceiros de cooperação
internacional em nome do desenvolvimento dos países do dito terceiro mundo, como
Moçambique, podem consubstanciar um disfarce, pois visam, em primeiro lugar, servir os
interesses dos doadores.
Numa outra linha de análise, considera-se que na relação entre os parceiros de cooperação
internacional e os países beneficiários dos recursos internacionais, gera-se uma relação de
subordinação dos segundos pelos primeiros, considerando que aos parceiros de cooperação
internacional lhes é reconhecida formas superiores de organização social, política e económica
em detrimento dos países em desenvolvimento4. Essa subordinação leva a que os parceiros de

1
MANCINI, Giulia (2013) Cooperação internacional para o desenvolvimento: mecanismos, história e eficácia, p. 2.
2
UNESCO, Declaração dos Princípios da Cooperação Cultural Internacional, 14.ª sessão, a 4 de novembro de 1966.
3
MANCINI, Op.cit., p. 6.
4
NIPASSA, Orlando. Ajuda Externa e Desenvolvimento em Moçambique: Uma Perspectiva Crítica. 2009. P.22. In
IESE, II CONFERENCIA DO IESE, “DINÂMICAS DA POBREZA E PADRÕES DE ACUMULAÇÃO EM

1
cooperação internacional para o desenvolvimento exerçam maior influência sobre as políticas e
instituições dos países beneficiários, reduzindo o espaço político destes últimos5.
A título elucidativo, vários autores6 afirmam que a ideia de Moçambique deixar o sistema
socialista adotado logo após a Independência Nacional, foi imposta pelos parceiros de
cooperação internacional que, tendo retido ajuda, o país se viu obrigado a aderir ao sistema
capitalista baseado na economia do mercado.
Após vários anos de maior intervenção do Estado no domínio da cultura e da criatividade,
argumenta-se que, a adesão de Moçambique ao sistema capitalista implicou menor intervenção
deste, passando a ser mais legislador e promotor, permitindo a atuação da comunidade
internacional e do sector privado interno no apoio ao desenvolvimento cultural e criativo 7.
Porém, Meigos (2018) argumenta ser a partir deste período que os subsídios estatais para
promoção da acção cultural começaram a escassear.
Moçambique tem estado a receber apoios da comunidade internacional em nome da
cooperação internacional para o desenvolvimento, inclusive para o desenvolvimento do sector
cultural e criativo. Surpreendentemente, os resultados têm sido moderados, havendo estudos que
consideram que, apesar de enorme potencial, o sector cultural e criativo nacional encontra-se
fragilizado e fragmentado8.
É nesse contexto que emerge o presente estudo com o propósito de compreender a relação
entre os programas de cooperação internacional e o desenvolvimento do sector cultural e criativo
em Moçambique a partir de um estudo de caso do DIVERSIDADE, um programa de apoio
técnico e financeiro em implementação em Moçambique, co-financiado pela União Europeia,
Fundação Gulbenkian e Instituo Camões.

MOÇAMBIQUE”. 2009. disponível em


https://www.iese.ac.mz/~ieseacmz/lib/publication/II_conf/CP36_2009_Nipassa.pdf. cessado no dia 11/06/2021
5
CASTEL-BRANCO, Carlos Nuno (2017) Crises económicas e estruturas de acumulação de capital em
Moçambique. Maputo. In IESE (2017) Desafios para Moçambique, pp. 108 e 109.
NIPISSA, op.cit., CASTEL-BRANCO, Op.cit., MEIGOS, Filimone (2018) Dinâmicas das Artes Plásticas em
Moçambique. Tese, Doutoramento, Universidade da Beira do Interior.
6
NIPISSA, op.cit., CASTEL-BRANCO, Op.cit., MEIGOS, Filimone (2018) Dinâmicas das Artes Plásticas em
Moçambique. Tese, Doutoramento, Universidade da Beira do Interior.
7
BUSSOTTI, Luca & GUNDANE, Reginaldo. Políticas Culturais em Moçambique entre Identidade Nacional e
Instâncias Locais (1975-2009), Realis, Jul-Dez, 2019, v.9.
8
Ibidem e BASTOS, Mónica González (2016) Estudo das áreas temáticas no Domínio Prioritário 1 – Criação de
Emprego no âmbito do Programa Indicativo Plurianual da Cooperação PALOP e Timor-Leste com a União Europeia
(PALOPTL/UE).

2
Para tal, a pesquisa irá analisar os projectos subvencionados no âmbito do programa
Diversidade e avaliar os seus resultados no desenvolvimento do sector cultural e criativo.
O programa Diversidade foi concebido dentro de um projecto maior denominado
PROCULTURA com objectivo de contribuir para o emprego em actividades geradoras de
rendimento no sector da cultura nos PALOP e Timor-Leste através do reforço de competências
dos recursos humanos e do financiamento para o sector, nos seis países, com concentração nas
áreas da música, artes cénicas e literatura infanto-juvenil. O PROCULTURA também oferece
subvenções a projectos ligados as áreas retro citadas.
O Diversidade é instrumento do PROCULTURA criado com o objetivo de oferecer apoio
técnico e financeiro para promoção e desenvolvimento de pequenos projectos e acções que
contribuam para a diversidade cultural, cidadania e identidade através da cultura, ao mesmo
tempo que promovem a criação do valor económico no sector cultural nos PALOP e Timor-
Leste9. A diferença entre o Diversidade e PROCULTURA está nos montantes das subvenções a
conceder a cada projecto financiado. O DIVERSIDADE subvenciona projectos pequenos cujos
montantes variam entre 2 mil a 20 mil euros, ao passo que o PROCULTURA apoia projecto de
grande dimensão, com os montantes a circular entre 20 mil a 1 milhão de euros10.
O PROCULTRA em geral, e o DIVERSIDADE em especial, avivou as espectativas da
classe cultural dos PALOP e Timor-Leste, Moçambique em particular, com a promessa de
alavancar o sector cultural e criativo nacional, com enfoque para a área da música, artes cénicas e
literatura infanto-juvenil, incluindo o financiamento de bolsas de estudo. Esses pressupostos
foram determinantes para escolha deste programa para a realização do estudo. Outrossim, a
escolha do DIVERSIDADE em relação ao PROCULTURA está relacionada ao facto de os
projectos subvencionados no âmbito daquele programa encontrarem-se terminados, o que vai
permitir ter acesso a informação completa para a nossa análise. Maior parte dos projectos
subvencionados pelo PROCULTURA encontram-se na fase inicial de implementação, o que
dificultaria a análise dos seus resultados.
O estudo compreende o período entre 2020 e 2021. Pesou para escolha deste período, o
facto de ter sido em 2020 que foi lançada a primeira chamada de projectos para o
DIVERSIDADE, sendo a partir deste momento que várias associações da sociedade civil que

9
Informação tirada do regulamento e convite de apresentação de propostas do programa DIVERSIDADE lançado
em Fevereiro de 2020
10
Informação tirada do convite para apresentação de propostas ao PROCULTURA lançado em Setembro de 2020.

3
actuam no domínio da cultura e da criatividade receberam financiamento e implementaram seus
projectos. É nesse contexto que se revela importante compreender a relação entre o
DIVERSIDADE através dos projectos financiados e o desenvolvimento do sector cultural e
criativo em Moçambique.

1.2. Justificativa
O trabalho tem seu cerne nas percepções dos vários atores sociais, incluindo os do sector
cultural e criativo sobre a relação entre os programas de cooperação internacional e o
desenvolvimento dos países beneficiários, de forma particular do programa DIVERSIDADE
para o desenvolvimento das indústrias culturais e criativas em Moçambique.
O tema é relevante, pois, mais do que nunca, a cultura tem estado a conquistar um lugar
de destaque na agenda do desenvolvimento e das relações internacionais, merecendo por isso
apoio de vários organismos nacionais e internacionais. Todavia, nota-se escassez de estudos que
reflictam sobre a relação entre os programas de cooperação internacional e o desenvolvimento do
sector cultural e criativo em Moçambique, e muitos menos sobre o contributo destes para
desenvolvimento do sector.
O estudo oferece uma visão geral sobre a cooperação internacional e desenvolvimento, e
de forma específica sobre a relação entre os programas de cooperação internacional e o
desenvolvimento do sector da cultura e criatividade, sendo que os resultados do mesmo oferecem
subsídios necessários para uma melhor definição e gestão dos programas de cooperação
internacional virados ao desenvolvimento do sector, quer por parte dos parceiros de cooperação
internacional, quer por parte dos países beneficiários.
Em termos científico-académicos, o estudo abre espaço de debate sobre as implicações da
cooperação internacional no desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique, ao
mesmo tempo que enriquece o acervo bibliográfico sobre o assunto.
Para além de cumprir um requisito académico para culminação de estudos no curso de
Cooperação e Desenvolvimento, a pesquisa é um contributo para a anterior área de formação e
de trabalho do proponente, formado em Gestão e Estudos Culturais e docente nos cursos de
Licenciatura em Música, em Teatro e em Gestão Cultural na Escola de Comunicação e Artes
(ECA) da Universidade Eduardo Mondlane (UEM) e no Instituto Superior de Artes e Cultura
(ISArC).

4
1.3. Problematização
O trabalho analisa a relação entre cooperação internacional e desenvolvimento das
indústrias culturais e criativas em Moçambique. As indústrias culturais e criativas integram um
conjunto de actividades que tem em comum a utilização da criatividade, do conhecimento
cultural e da propriedade intelectual para a produção de bens e serviços com significado cultural
e social, abarcando a música, dança, teatro, espetáculo, audiovisual e cinema, livro, artes visuais,
artesanato, design, gastronomia, instrumentos musicais e o turismo, conforme as áreas
prioritárias indicadas na Política das Indústrias Culturais e Criativas e Estratégias 11 de sua
Implementação de Moçambique.
Diversos autores12 são unanimes que, o conjunto dessas actividades tem potencial de
criação de riqueza e emprego, estimulando o crescimento de outros sectores da economia, como
o de turismo e o comércio local.
Todavia, vários estudos apontam que, em muitos países em desenvolvimento, sobretudo
os de continente africano, o sector cultural e criativo encontra-se fragmentado, com instituições
precárias e fracas habilidades profissionais, o que limita a possibilidade de um sector robusto e
desenvolvido13.
As acções que entidades públicas e privadas de um ou mais países desenvolvem com o
objectivo de promover o crescimento equilibrado e justo14, pode jogar um papel importante para
o progresso dos países em desenvolvimento como Moçambique, oferecendo recursos necessários
para dinamização de sectores vitais e integral do país.
Moçambique vem recebendo apoio da comunidade internacional para o desenvolvimento
do sector cultural e criativo desde a Independência Nacional, tendo inicialmente, recebido a
ajuda dos países do bloco socialista. Meigos afirma que logo depois a Independência Nacional:
(…) vários acordos foram assinados entre países como Cuba,
Jamaica, China, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), Tanzânia, Zimbabwe, entre outros, que resultaram em
intercâmbios artístico-culturais nacionais e daqueles países,

11
Política das Indústrias Culturais e Criativas e Estratégia da sua Implementação aprovada pela Resolução n.º
34/2016.
12
BASTOS, op.cit.; NAÇÕES UNIDAS (2010) Relatório sobre economia criativa: uma opção viável para o
desenvolvimento, São Paulo; NAÇÕES UNIDAS (2011) Fortalecendo as indústrias criativas para o
desenvolvimento em Moçambique. Nova Iorque e Genebra; e DUISENBERG, Edna dos Santos (2008) Economia
Criativa: uma opção do desenvolvimento viável?
13
NAÇÕES UNIDAS (2010 e 2011), op.cit., BASTOS, op.cit.
14
SANCHES (2002) apud MANCCINI (2013), op.cit., p.2.
5
incluindo a vinda de professores cubanos que apoiaram a instalação
da Escola Nacional de Música, Escola Nacional de Artes Visuais e
Escola Nacional de Dança, assim como a ida de estudantes
moçambicanos para aqueles países frequentarem cursos médios e
de nível superior15.
Por volta da década de 80, Moçambique atravessou uma série de crises no seu tecido
social e económico que forçaram o país a deixar o sistema de economia centralmente planificada
(socialista) e aderir a economia do mercado, abrindo-se para o sistema das relações
internacionais mais holístico, integrando os organismos de cooperação internacional para o
desenvolvimento como Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, de onde passou a
obter ajuda necessária para promover o seu desenvolvimento integral16.
Em termos culturais e criativos, essa saída teve um impacto mais significativo, pois, o
Estado deixou de ser um actor exclusivo na dinamização da actividade cultural e criativa,
passando a ser regulador e promotor. O Estado Moçambicano mudou profundamente no que diz
respeito as políticas culturais, tendo passado de um Estado produtor, promotor e “controlador” da
acção cultural para um Estado “facilitador e legislador”17. Meigos18 (2018, p. 81) sustenta que o
Estado Moçambicano “restringiu-se a formular políticas na área cultural e criativa, adequando-as
ao modelo do Washington Consunsus”, privilegiando a perspetiva do sistema de mercado
baseado na procura e oferta.
Bussotti e Gundane acrescentam que, o Estado moçambicano ao reduzir o seu papel
interventivo no sector cultural e criativo, permitindo a ajuda dos parceiros de cooperação
internacional, fez com que as políticas culturais fossem inspiradas com base nos anseios dos
doadores, sem nenhuma relação com as singularidades locais19.
Francisco vai mais longe, afirmando que, com a forte intervenção dos doadores nos
vários estratos sociais e económicos, o planeamento de cima para baixo é substituído pelo
planeamento de fora para dentro, o que põe em causa a questão de apropriação dos programas de
cooperação internacional para desenvolvimento e consequentemente o seu impacto no
desenvolvimento dos países beneficiários20.

15
MEIGOS, op.cit., p. 77.
16
Ibidem e CASTEL-BRANCO, op.cit.
17
BUSSOTTI e GUNDANE, op.cit.
18
MEIGOS, op.cit., p. 81.
19
BUSSOTTI e GUNDANE, op.cit., pp. 194 e 195.
20
FRANCISCO (2000) apud MEIGOS, op.cit., p. 89.

6
A Organização das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD),
reunida na sua XI conferência sob lema “indústrias criativas e desenvolvimento” em Junho de
2004 na cidade de São Paulo, reconheceu a dimensão de desenvolvimento das indústrias
culturais e criativas, assim como a importância da cooperação internacional para o
desenvolvimento do sector e dos países. Na sequência instou a comunidade internacional a
apoiar os esforços dos países em desenvolvimento para que possam aumentar a sua participação
no comércio internacional através dos sectores dinâmicos da economia, fortalecendo e
promovendo suas indústrias criativas21.
Embora Moçambique já vem recebendo ajuda de vários parceiros da cooperação
internacional, com apelo da UNCTAD, o sector cultural e criativo tem estado a merecer atenção
e apoio de vários parceiros de cooperação internacional, incluindo agências de cooperação
multilateral. Por exemplo, entre 2006 e 2009 foi promovido um programa de desenvolvimento de
instituições culturais em Moçambique com apoio da UNESCO. Ao mesmo tempo e com apoio
também da UNESCO foi realizado o programa de capacitação para profissionais, gestores,
administradores do Programa Cultural no Ministério da Educação e Cultura. Entre 2009 e 2011
foi, com o poio da UNCTAD, realizado o programa conjunto para o fortalecimento das indústrias
culturais e criativas para o desenvolvimento em Moçambique, só para citar alguns (Nações
Unidas, 2011).
Estudos mostram que as indústrias culturais e criativas em Moçambique se encontram
fragilizadas e fragmentadas. O estudo de Bastos encomendado pela União Europeia refere que as
indústrias culturais criativas em Moçambique enfrentam problemas de vária ordem, destacando a
pouca qualificação dos recursos humanos, fraca planificação das actividades e acesso ao
financiamento22.
Em 2016, a União Europeia aprovou o PROCULTURA, Programa do Emprego nas
Actividades Geradoras de Rendimento no Sector Cultural nos PALOP e Timor Leste, cujo
objectivo é de “contribuir para aumentar o emprego e o potencial gerador de rendimento do
sector cultural nos PALOP e em Timor-Leste, através do reforço de competências dos
profissionais do sector, de produtos e serviços culturais e de oportunidades de difusão e
comercialização”. O programa orçado em cerca de 19 milhões de euros, repartidos por seis

21
UNCTAD (2004) Consensos de São Paulo.
22
BASTOS, op.cit., p 7.

7
países previa a “criação de um instrumento de apoio financeiro e técnico com a finalidade de
promover o desenvolvimento de pequenos projectos e acções que contribuam para a diversidade
cultural, cidadania e identidade através da cultura, ao mesmo tempo que contribuam também
para criar valor económico, nos seis países que se designou chamar DIVERSIDADE”23.
O DIVERSIDADE previa o financiamento de pequenos projectos com montantes que
variam entre 2.000 euros a 20.000 euros. O programa suscitou muita esperança no seio da
comunidade cultural e criativa moçambicana que, perante a escassez de recursos no cenário
nacional, via uma luz verde para realizar os seus projectos e contribuir para o desenvolvimento
do sector.
Não obstante, olha-se para programas do género como um mecanismo usado pelos
parceiros de cooperação internacional para influenciar a maneira de pensar e agir dos agentes
culturais sobre o que devem produzir. Afirma-se também que, uma vez definidos os temas sobre
os quais deve incidir o processo criativo nesses programas, está também limitada a liberdade
criativa dos agentes culturais e criativos24.
Numa oficina organizada pela Kuzula Produções em parceria com a Escola de
Comunicação e Artes (ECA) da Universidade Eduardo Mondlane (UEM) sobre Técnicas e
Processos Criativos de composição musical, o conceituado músico Stewart Sukuma referiu que
músicos e universidades estrangeiras vinham a Moçambique, por exemplo, em nome de
intercâmbio com o falecido mestre de Timbila Venâncio Mbande com o objectivo de explorar o
vasto e rico conhecimento autóctone de que o velho era detentor para fortalecer os seus
processos criativos, diversificando os seus produtos culturais e criativos ao mesmo tempo que
asseguravam a internacionalização dos seus artistas e produtos25.
A esses debates prós e contra, adiciona-se o facto de haver poucos estudos que analisam a
relação entre os programas de cooperação internacional e o desenvolvimento do sector cultural e
criativo em Moçambique, e particularmente do DIVERSIDADE, o que realça a importância
desta pesquisa. Perante este cenário, o estudo procura responder à seguinte questão de partida:
qual é a relação entre o programa DIVERSIDADE e o desenvolvimento do sector cultural e
criativo em Moçambique?

23
Informação tirada do Regulamento e convite de apresentação de propostas do programa DIVERSIDADE lançado
em 2020.
24
MEIGOS, op.cit., p. 40.
25
Stewart Sukuma in Oficinas, I, 2022, Maputo, Técnicas e Processos Criativos de composição musical, Khuzula
Investimentos.

8
1.4. Objectivos
Geral: Compreender a relação entre os programas de cooperação internacional e o
desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique;

Específicos:
 Analisar os projectos subvencionados pelo programa DIVERSIDADE em Moçambique;
 Analisar a relação que se estabelece entre a gestão do programa DIVERSIDADE e os
gestores dos projectos subvencionados;
 Avaliar os resultados dos projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE no
desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique, com ênfase especial para
a criação de empregos;

1.5. Hipóteses da pesquisa


O programa DIVERSIDADE ajudou de forma pontual no desenvolvimento do sector
cultural e criativo de Moçambique, mas sem criar condições para a sua estabilização.

1.6. Metodologia
Esta secção descreve os procedimentos metodológicos seguidos na realização da pesquisa.
Descreve o tipo de pesquisa na qual se insere o trabalho, classificando a pesquisa quanto ao nível
à finalidade. Apresenta também os métodos e instrumentos de coletas de dados, tipo de
amostram e amostra, incluindo os procedimentos de análise e interpretação de dados.
1.6.1. Natureza da pesquisa
A presente pesquisa é de tipo qualitativo. A pesquisa qualitativa descreve e compreende os
processos e os fenómenos de forma completa e profunda, considerando o contexto que envolve a
problemática estudada26. Incorpora a participação dos sujeitos pesquisados, analisando com eles
a percepção que tem sobre a realidade e das suas vivências. No estudo, a pesquisa qualitativa
possibilitou analisar e avaliar, juntos com os principais actores dos projectos financiados pelo

26
ALVARENGA, Estelbina Miranda (2012). Metodologia de Investigação Qualitativa e Quantitativa: Normas
técnicas de apresentação de trabalhos científicos. Tradução de Cesar Amarilhas, 2ª edição, Assunção, Paragaui.

9
Diversidade, os resultados destes projectos no desenvolvimento do sector cultural e criativo em
Moçambique.

1.6.2. Classificação da pesquisa quanto ao nível


No que toca ao nível de pesquisa, o trabalho combina a pesquisa exploratória e a descritiva.
Pesquisas sobre programas de cooperação internacional e desenvolvimento do sector cultural e
criativo são escassos no cenário nacional, por isso, a pesquisa exploratória permite proporcionar
maior familiaridade com o tema, objectivando ampliar a compreensão do assunto em pesquisa e
melhor formulação da problemática e das hipóteses para pesquisa futuras. A pesquisa descritiva
permitiu a descrição dos resultados dos projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE e da sua
27
relação com o desenvolvimento das indústrias culturais . A importância da combinação das
duas modalidades de pesquisa está no facto de permitir, a partir da descrição dos resultados dos
projectos subvencionados pelo programa DIVERSIDADE, análise da relação dos programas de
cooperação internacional e o desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique.

1.6.3. Classificação da pesquisa quanto à finalidade


Quanto à finalidade, a pesquisa é aplicada, pois, para além de conhecer os resultados dos
projectos financiados pelo Diversidade e sua relação com o desenvolvimento das indústrias
culturais e criativas, pretende-se valer do conhecimento/resultados da pesquisa para contribuir no
fortalecimento da gestão dos programas de cooperação internacional em prol do
desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique. Aliás, é papel da pesquisa
aplicada, a utilização e aplicação prática do conhecimento gerado numa realidade circunstancial.

1.6.4. Técnicas e instrumentos de recolha de dados


A recolha de dados obedeceu a dois mementos diferentes, por um lado, a recolha de
dados secundários, e por outro, a recolha de dados primários. Constituem dados secundários as
informações que já receberam um tratamento analítico científico, podendo ser livros, artigos e
apresentações em eventos científicos. Para estes dados foi útil a pesquisa bibliográfica. A
pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos científico28. Para o trabalho, a pesquisa bibliográfica para além

27
GIL, António Carlos (2008) Métodos e Técnicas de Pesquisa Social, 6ª edição, Atlas, São Paulo.
28
GIL (2008), op.cit.

10
de ter permitido acesso a publicações que abordam sobre o assunto em estudo, possibilitou a
construção do nosso arcabouço teórico e conceptual.
A recolha de dados primários foi com recurso ao diário do pesquisador, pesquisa
documental e entrevistas. O diário do pesquisador é uma técnica narrativa da qual o pesquisador
se vale para registar as observações, reflexões, interpretações e explicações do dia-a-dia da
pesquisa. O diário possibilita um tipo de reflexão própria do acto de escrever, permitindo a
exposição das experiências cotidianas, fragilidades e dificuldades concretas vivenciadas no
percurso de pesquisa29 (Borges e da Silva, 2020). Esta técnica foi útil no sentido de permitir o
registo de observações, reflexões e interpretações dos vários intervenientes do sector cultural
criativo, incluindo do próprio autor durante a pesquisa, informações que foram uteis para o
delineamento lógico da pesquisa e do processe de escrita.
A pesquisa documental foi igualmente útil no processo de colecta de dados primários.
Esta técnica vale-se de materiais que ainda não receberam nenhum tratamento analítico, ou que
podem ser reelaborados de acordo com os objectivos da pesquisa30. Neste trabalho, a pesquisa
documental consistiu na consulta de vários documentos de âmbito institucional e de gestão dos
projectos financiados pelo Diversidade, podendo destacar o regulamento e convite para
apresentação de propostas ao Diversidade, a ficha do PROCULTURA e as fichas dos projectos
subvencionados no âmbito do DIVERSIDADE.
Por fim, foram usadas as entrevistas mais profundas ou detalhadas. Esta modalidade de
entrevista caracteriza-se por ser aberta, não estruturada e menos padronizada, procurando
explorar as interpretações que os entrevistados fazem sobre o assunto estudado, inclusive suas
experiências. Durante o processo de entrevista, é pertinente esclarecer o que o entrevistado
realmente quer dizer, assim como a colocação de perguntas que possam estimular sobre
acontecimentos passados e importantes para o estudo31. A entrevista detalhada foi realizada com
várias individualidades ligadas ao ecossistema cultural e criativo moçambicano, sendo uma
gestora do projecto PROCULTURA do Instituto Camões em Lisboa, um representante da
Delegação da União Europeia que cuida dos assuntos culturais em Moçambique, o Director do
Instituto Camões em Maputo, uma assistente do programa Diversidade em Moçambique, um

29
BORGES, Flavio Adriano & DA SILVA, Alexandre Rodrigo Nashiwaki. O diário de pesquisa como instrumento
de acompanhamento da aprendizagem e de análise de implicação do estudante/pesquisador, Interface (Batucatu),
2020, 190869.
30
GIL (2008), op.cit.
31
ALVARENGA (2012), op.cit.

11
representante do Ministério da Cultura e Turismo e 10 representantes dos projectos financiados
pelo Diversidade.
As entrevistas forma feitas em formato hibrido, sendo a entrevista com a gestora do
PROCULTURA foi feita em formato remoto com recurso plataforma google teams e com os
representantes dos projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE que se encontram fora de
Maputo, recorreu-se a chamadas telefónicas. Ao passo que com os restantes entrevistados foi em
pessoa.

1.6.5. Amostragem
Dado ao facto de autor do trabalho ser parte integrante do ecossistema cultural e criativo
e participante de vários circuitos culturais e criativos, conhecendo por isso boa parte dos actores-
chave, os entrevistados foram selecionados na base da amostragem por tipicidade ou intencional.
A amostragem intencional é uma amostragem não probabilística que consiste em selecionar um
subgrupo da população com base nas informações disponíveis32. Porém, requer considerável
conhecimento da população e do subgrupo selecionado.
Com base nessa modalidade de amostragem foi selecionada uma amostra constituída por
pessoas que detém informação relevante sobre o DIVERSIDADE e os projectos subvencionados.
Foram entrevistados as seguintes pessoas: Mercedes Pintos, gestora do PROCULTURA; Filipa
Corte Real, representante da Delegação da União Europeia em Moçambique para Assuntos
Culturais; João Pignatelli, Director do Instituto Camões em Maputo; Diana Manhiça, assistente técnica
do DIVERSIDADE em Moçambique; Eugénio Santana, Chefe do Departamento das Indústrias Culturais
e Criativas no Ministério da Cultura e Turismo.
Igualmente, foram entrevistados 10 gestores dos projectos subvencionados pelo DIEVRSIDADE,
dos quais destacam-se os seguintes: Hélio Nguane do projecto Radio Diversidade; Aguacheiro e Tina
Krueger, ambos do Empy Room; Horácio Mbande do projecto Galeria de Timbila; Amina Cássimo em
representação dos projectos “Maquina de fabricar sonhos e Criação do webiste da Associação dos
Pequenos Empresários de Hotelaria e Turismo da Ilha de Moçambique”; Bernardo Guiamba em
representação dos projectos “Festival Raiz (DIVERSIDADE ESPECIAL WOMEX - Worldwide Music
Expo) e Legalização e website da Converge Mais”; Beny Maunze do projecto “Arte Yagaya - Plataforma

32
GIL (2008), op.cit.

12
Online”; Lucas Macuácua do projecto “Legalização e fortalecimento da Federação das Associações
Culturais de Moçambique”.

1.6.6. Técnicas de análise e interpretação de dados


O processo de análise e interpretação de dados consistiu na organização de dados com
base nos objectivos do trabalho, seguido de triangulação dos dados primários e secundários,
visando obter inferências e significações.

13
2. CAPÍTULO 2: REVISÃO DA LITERATURA

O presente capítulo apresenta os pressupostos teóricos da Cooperação Internacional e


Desenvolvimento e sua relação com o desenvolvimento das indústrias culturais e criativas. O
capítulo é composto por duas partes, sendo que a primeira é dedicada a contextualização da
Cooperação Internacional para Desenvolvimento e sua relação com o desenvolvimento dos
países em desenvolvimento. A segunda analisa a relação entre Cooperação Internacional e o
desenvolvimento do sector cultural e criativo.

2.1. Cooperação internacional para desenvolvimento: breve historial e pressupostos


teóricos
A ideia da cooperação internacional para o desenvolvimento busca descrever o conjunto
de acções que têm por objectivo a promoção de um desenvolvimento equilibrado e justo do
mundo por meio de transferência de conhecimentos tecnológicos e estruturais, organização de
acções especializadas em locais assolados por guerras e catástrofes naturais, doação de
alimentos, instrumentos e medicamentos e também concessão de empréstimos em condições
mais favoráveis do que as oferecidas por bancos privados”33.
Faria34 sustenta que a cooperação internacional para o desenvolvimento surge como um
mecanismo dos países desenvolvidos para com os países menos desenvolvidos, principalmente
as ex-colónias que após vários anos de guerra e subjugação se encontram em situação
degradante. Mancini35 acrescenta que a Cooperação Internacional para o desenvolvimento está
atrelada ao discurso de solidariedade internacional que apela à necessidade de utilização dos
recursos internacionais para promover o progresso social e melhorar os padrões de vida da
população mundial.
Todavia, alguns estudos da área de cooperação internacional para o desenvolvimento
revela resultados díspares. Mártir36 baseando-se nos resultados da sua dissertação de mestrado
cujo objectivo era de analisar o efeito da ajuda externa na promoção do desenvolvimento, para

33
MANCINI, op.cit., p. 3.
34
FARIA, Raquel. (2011) A cooperação multilateral no âmbito da União Europeia: O caso Português. Centro de
Estudos sobre Africa e do Desenvolvimento (CEsA), Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade
Técnica de Lisboa, p. 6.
35
MANCINI, op.ci., p. 4.
36
MÁRTIR, Paulo Alexandre. (2014). Promove a ajuda externa o crescimento económico dos países em via de
desenvolvimento? Dissertação de Mestrado em Economia, Ciências Sociais e Humanas, Universidade da Beira
Interior, 2014.

14
um conjunto de 35 países subdesenvolvidos no intervalo entre 1996 e 2011, usando o estimador
retificativo do erro padrão, revela que a ajuda externa tem um efeito de maldição no
desenvolvimento dos países beneficiários, pois, este não constitui um factor automático de
desenvolvimento. O autor argumenta que, quanto maior for a dependência da ajuda externa,
maior será a resistência ao desenvolvimento.
O estudo sobre discurso e antecedentes do ProSAVANA em Moçambique demostra que,
apesar da publicitação que o programa teve sobre pretexto de ser um exemplo promissor de
assistência ao desenvolvimento promovido pelo Japão em parceria com o Brasil, o mesmo foi
concebido sem envolvimento das populações visadas, constituídas por agricultores da zona norte
de Moçambique, e por isso sem nenhuma ligação com o contexto. A autora considera
problemática a assistência do Japão ao desenvolvimento e particularmente a agricultura, por ter
sido “egocêntrica, desrespeitosa com relação aos agricultores e a sociedade civil e sem
preocupação com meio ambiente”37.
A falta de consideração de actores locais na definição dos programas de cooperação
internacional para o desenvolvimento, conforme demonstrou Classen através do ProSAVANA
revela a predominância do modelo tradicional de cooperação, no qual os programas, incluindo os
métodos de trabalhos são definidos, exclusivamente pelos doadores. Esse modelo foge da ideia
principal da cooperação, a de perseguir um objectivo comum e contribuir para a construção de
uma comunidade justa e equilibrada, ao dar primazia aos interesses dos doadores, o que contribui
para o fracasso dos programas e projectos de cooperação internacional para o desenvolvimento.
Em 2020 o governo moçambicano declarou por encerrado o programa ProSAVANA,
juntamente com os seus parceiros de cooperação internacional, o Japão e Brasil, como resultado
da campanha “Não ao ProSAVANA” levada a cabo pelas organizações da sociedade civil
ligadas aos camponeses, com a liderança da União Nacional dos Camponeses (UNAC), em
colaboração com as organizações da sociedade civil internacional sediadas nos países
envolvidos38. Os autores sustentam que, as organizações da sociedade civil tem estado, ao longo
do tempo, a alcançar a maturidade em vários aspectos, incluindo na organização dos movimentos
de protestos, tomando como exemplo, a campanha “Não ao ProSAVANA” que privilegiou uma

37
CLASSEN, Soyata Funada (2013) Análise do Discurso e dos Antecedentes do Programa ProSAVANA em
Moçambique –enfoque no papel do Japão, p. 36.
38
BUSSOTTI, Luca e NHAULEQUE, Laura António, Social movements in rural África: how and why
Mozambican state closed the prosavana program, Routledge, 2022, DOI: 10.4324/9781003177371-7, p. 122.

15
manifestação pacífica, isto é, sem violência, nem tumultos tal como é habitual em campanhas do
género, e pelo estabelecimento de alianças internacionais.
No seu artigo sobre Ajuda Externa e Desenvolvimento em Moçambique, Nipassa sustenta
que na relação entre os parceiros de cooperação internacional e os países beneficiários, gera-se
uma relação de poder que resulta do facto de, aos parceiros de cooperação internacional ser-lhes
reconhecida formas superiores de organização social, política e económica em detrimento da dos
países em desenvolvimento39. É nesse quadro que, os parceiros de cooperação internacional para
o desenvolvimento, sobretudo as agências multilaterais de cooperação internacional, a exemplo
do Fundo Internacional Monetário (FMI) e do Banco Mundial, exercem maior influência sobre
as instituições e políticas dos países recipientes da ajuda no que respeita ao desenho de políticas
macroeconómicas, criando políticas rígidas e reduzindo o espaço político dos beneficiários de
ajuda40. Outrossim, as políticas inspiradas nos anseios dos doadores são desfasadas do contexto
para o qual são implementadas, o que contribui de certa forma para seu fracasso.
Numa entrevista concedida ao Nuno Andrade Ferreira do jornal Cabo verdeiano Expresso
das Ilhas, o sociólogo moçambicano Elísio Macamo faz uma análise crítica dos Objectivos do
Desenvolvimento Sustentável (ODS) que os considera como uma forma de “infantilização dos
países africanos”. Macamo argumenta que os ODS foram negociados em situação de
desigualdade, onde os parceiros de cooperação internacional, na tentativa de satisfação dos seus
interesses, “vendem soluções fantásticas aos líderes dos países africanos que os compra sem a
devida reflexão”. O autor vai mais longe, afirmando que o fraco desenvolvimento de muitos
países africanos tem a ver com a forma como o mundo funciona, sobretudo o sistema de
cooperação entre os ricos e pobres que coloca a pobreza como problema e não a relação entre
pobre e rico que tende a produzir pobreza.
Em 2022 durante um estágio curricular realizado na KULIMA, uma organização não-
governamental virada para o desenvolvimento socio-económico integrado, o autor deste trabalho
observou uma situação em que o Fundo do Desenvolvimento Sustentável lançou um concurso de
licitação para os serviços de “Delimitação de comunidades e planeamento básico do uso da terra
e emissão dos certificados”, no âmbito de um projecto “Terra Segura” financiado pelo Banco
Mundial. Sucede que, os termos de referências vinham em inglês e as propostas deviam também

39
NIPASSA, Orlando. Ajuda Externa e Desenvolvimento em Moçambique: Uma Perspectiva Crítica. 2009. P.22. In
IESE, II Conferência do IESE, “dinâmicas da pobreza e padrões de acumulação em Moçambique”. 2009.
40
Ibidem, p. 19.

16
ser apresentadas em inglês, num país em que a língua oficial é português. Mesmo que se trate de
um concurso internacional, há várias questões que se colocam, tais como: não terá sido essa uma
obrigação do financiador do projecto para que os termos de referências e as propostas fossem
apresentados em inglês, neste caso, o Banco Mundial?; havia necessidade de obrigar entidades
nacionais a ter que apresentar as propostas em inglês?; não seria ideal fazer com que as
organizações internacionais adaptem-se com a língua oficial de quem está contractar os
serviços?; não seria esta, uma forma estratégica de fazer com que as organizações internacionais,
munidos de equipamentos tecnológicos sofisticados em matéria de delimitação e demarcação de
terra, porém, sem nenhum conhecimento da cultura e do contexto local, ganhem o projecto?.
Essas questões não são respondidas neste trabalho, mas ficam para reflexão sobre a relação entre
os parceiros de cooperação internacional e os países em desenvolvimento como Moçambique, e
sua implicação no desenvolvimento desses últimos, conforme apresentou Macamo.
41
Nipassa sustenta que, quanto mais dependente de ajuda um país for, mais será a
imponência dos doadores e legitimação destes para exibirem o seu poder sobre os beneficiários,
que se manifesta por uma série condicionalismos. A título ilustrativo, conforme afirma o autor,
nos anos 80, os doadores retiveram a ajuda alimentar por duas vezes, deixando o povo
moçambicano na penúria, para obrigar Moçambique a juntar-se às instituições de Bretton
Woods. E, em 1986, para pressionarem o governo no acordo ao programa de reajustamento
estrutural. Em 1995 foram as indiscutíveis orientações do Banco Mundial que impuseram a
liberalização do caju e a privatização da banca, debaixo da ameaça explícita de cortar a ajuda.
Sobre pretexto da maior influência da comunidade internacional nas dimensões políticas,
culturais, económicas, incluindo na dimensão científica, há, nos dias que correm, estudos sobre
pós-colonial ou decolonialidade que questionam os modelos de pensamento e de
desenvolvimento concebidos sobre uma perspetiva ocidental, procurando dar “voz aos que
anteriormente estavam englobados/fagocitados nos impérios coloniais e, portanto, circunscritos
ao discurso colonial hegemónico”42. Para fundamentar a supremacia do ocidente na produção do
conhecimento De Beukelaer43 refere que o conceito das indústrias culturais e criativas usado em
maior parte dos países africanos foi transposto da realidade ocidental sem nenhuma

41
NIPISSA (2009), op.cit., p. 13.
42
MEIGOS, op.cit., p. 62.
43
DE BEUKELAER, CHRISTIAAN. Toward an “African” take on the cultural and creative industries? SAGE.
Media, Culture & Society. 2017, Vol. 39(4) 582-591.

17
contextualização, havendo necessidade de ser revisto, visando respeitar a realidade da maioria
dos artistas, gestores, produtores, organizadores, editores africanos e assim por diante.
Na sua tese de doutoramento, Nipissa44 rebate a ideia de que muitas organizações da
sociedade civil moçambicanas dependem da ajuda externa e servem os interesses dos doadores.
O autor afirma haver muitas organizações da sociedade civil que não dependem de
financiamento externo. Ademais, afirma haver provas de que “a dependência não implica
subserviência, pois há exemplos de organizações de sociedade civil que demostram autonomia e
protagonismo em disputas contra interesses de estruturas governamentais e de agências
doadoras”.
Para fundamentar a sua tese, Nipissa45 cita vários exemplos em que as associações da
sociedade civil desencadearam acções de pressão, advocacia e lobby, visando pressionar o
governo, incluindo algumas multinacionais envolvidas na exploração dos recursos minerais para
atenderem as demandas sociais e os direitos humanos. Um dos exemplos é a campanha levada a
cabo pelas associações da sociedade civil em 2007, visando pressionar o governo a publicar os
contratos da indústria extrativa, na qual o governo veio a ceder em 2013.
Pese embora a cooperação internacional tenha como objectivo primordial a promoção de
um desenvolvimento equilibrado e justo entre os atores envolvidos, estudos revelam resultados
contraditórios, com tendência de recrudescimento de desigualdades entre países desenvolvidos e
em desenvolvimentos. Moçambique, por exemplo, já foi considerado, pelos doadores, um
“donor darling”, recebendo assistência internacional significativa. Todavia, os dados do
Inquérito sobre Orçamento Familiar (IOF 2014/15), que mede a pobreza em termos do consumo
apontam que cerca de 49,2% da população moçambicana se encontram no limiar da pobreza46. O
relatório do PNUD sobre o Desenvolvimento Humano de 2015 posicionou Moçambique no
fundo do grupo dos países com desenvolvimento humano baixo, estando na posição 181ª no
universo de 188 países classificados47.

44
NIPASSA, Orlando Júlio André (2016) Autonomia e dependência da sociedade civil no processo de
desenvolvimento humano em Moçambique. Tese, Doutoramento, Instituto Universitário de Lisboa.
45
NIPISSA (2016), op.cit., p. 6.
46
MAQUENZI, Jerry. Pobreza e desigualdades em Moçambique: um estudo de caso em seis distritos. Observatório
Rural, n. 113, Maio, 2021, p. 22.
47
Ibidem

18
Como se pode depreender, os dados acimas mostram resultados modestos, pese embora, o
crescimento dos programas de cooperação internacional, realçando a importância de estudos
académicos que focam na relação entre esses programas e projectos e o desenvolvimento do país.

2.2. Cooperação internacional e o desenvolvimento do sector cultural e criativo


A relação entre cultura e cooperação internacional para o desenvolvimento é recente, em
razão de ter sido, durante vários anos, marcada por afastamento.
A cooperação internacional está ancorada nas teorias do desenvolvimento, ou seja, na
necessidade de promover o desenvolvimento. Ora, o desenvolvimento e a cultura foram, ao
longo de anos, vistos em termos de oposição. Essa oposição deriva, por um lado, dos próprios
conceitos de cultura e desenvolvimento que emergem de áreas distintas, sendo o primeiro das
áreas das ciências sociais, antropologia, filosofia e sociologia, e o segundo das ciências
económicas48. Por outro, deriva do facto de as teorias desenvolvimentistas, incluindo os
programas de cooperação internacional para o desenvolvimento, terem ignorado aspectos
relacionados à cultura e criatividade, a favor do crescimento económico. Lima considera
tradicionais tais teorias, englobando nelas, as teorias de modernização, as estruturalistas e as
neoclássicas, sentenciando que:
(…) possuem em comum a ideia do desenvolvimento como
crescimento econômico, ao qual o enriquecimento (econômico) se
torna palavra chave quando se fala de desenvolvimento nessas
teorias, deixando em segundo plano outros critérios como cultura,
etnia, liberdades individuais etc. Essas teorias tradicionais sofrem
forte crítica por estarem baseadas unicamente no crescimento
econômico e deixando em segundo plano outros critérios como
cultura, etnia, liberdade etc49.
Para Martinell50, os modelos de desenvolvimentos inspirados nessas teorias deixaram de
lado a vida cultural dos povos, as necessidades sociais e básicas. De facto, a cultura esteve

48
LEITE, Pedro Pereira (2015) Cultura e Desenvolvimento? Informal Museology Studies nº 11, p. 9.
49
18. LIMA, Luciano Barbosa, Teorias do desenvolvimento e a cooperação internacional. Uni. Rel. Int., Brzilia,
v. 8, n. 1, pp. 73-90, jan./jun. 2010, p. 82.
50
MARTINEEL, Alfons (coord. 2010) Cultura y desarrolo: um compromisso para la libertard y el bienestar.
Fundación Carolina, Siglo, Madrid.

19
ausente nessas teorias do desenvolvimento, considerada desnecessária e desvalorizada pelos
programadores internacionais que preferiam outras áreas como saúde e educação51.
Dado o fracasso dos programas de cooperação internacional concebidos na perspectiva
dessas teorias, a concepção e os modelos de desenvolvimento começaram a mudar, sendo que o
próprio conceito do desenvolvimento passou a ser visto de forma mais holística, englobando as
necessidades globais do ser humano52, incluindo os aspectos culturais.
Para Martinell, a incorporação dos aspectos culturais nos debates e teorias de
desenvolvimento emerge no contexto internacional, como resultado da visão comum de que a
cultura se conecta com as necessidades de desenvolvimento, sensível e respeitadora das
múltiplas identidades culturais, que coexistem com mais ou menos respeito no interior dos
Estados-nação, sendo por isso eixo inevitável do desenvolvimento53.
A Fundação, em 1945, da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e
Cultura (UNESCO) com objectivo de promover a paz, a segurança, a solidariedade mundial e
intelectual da humanidade através da Educação, Ciência e Cultura representa, em parte, o
reconhecimento da importância da cultura para o desenvolvimento e o compromisso da
comunidade internacional pelo desenvolvimento cultural54. Aliás, há relatos de que, durantes os
primeiros anos da sua existência, a organização ajudou na reconstrução de escolas, museus e
bibliotecas que haviam sidos destruídos durante a Segunda Guerra Mundial. Outrossim, o
trabalho que a UNESCO vem desenvolvendo na promoção do diálogo inter-cultural e de
políticas culturais que visam a manutenção da diversidade cultural e a contribuição desta para o
desenvolvimento sustentável, é disso um exemplo.
A Convenção da UNESCO sobre Protecção e Promoção da Diversidade de Expressões
Culturais para além de reconhecer o papel da cultura e da criatividade para o alcance do
desenvolvimento sustentável, procura influenciar o papel da política cultural, especialmente para
alcançar um fluxo mais equilibrado dos produtos culturais entre o Norte e o Sul, incrementar a

51
DE SANTOS, Elena Val (2011) Cooperación cultural para el desarrollo. Nuevo camino de la Agencia Española
de Cooperación Internacional para el Desarrollo ensu política hacia América Latina. Cuadernos de Investigación.
Universidad Complutense de Madrid, Facultad de Ciencias Políticas y Sociologia.
52
ALONSO, Lozano e Prialé (2004) apud De SANTOS (2011), op.cit..
53
MARTINELL (2010), op.cit.
54
https://d1p480y8ywg81t.cloudfront.net/media/signorelli/colegio/unesco/outros-documentos2.pdf

20
mobilidade artística e o tratamento preferencial para os países em desenvolvimento, através do
Fundo Internacional para a Diversidade Cultural55.
A cultura é, também, reconhecida como importante veículo na promoção das relações
externas, no quadro da diplomacia cultural. Nesse âmbito, os recursos culturais são usados nas
relações internacionais para a prossecução dos objectivos nacionais, que muita das vezes
transcendem o campo cultural, perpassando a política, a economia e o comércio. A diplomacia
cultural assume o estatuto de poder suave (soft power), em contraste à diplomacia tradicional que
privilegiava o poder coercivo.
A União Europeia também reconhece a importância da diplomacia cultural nas relações
internacionais, considerando-a estratégica para promoção da resiliência social através do
aprofundamento do trabalho na educação, cultura e juventude para promover o pluralismo, a
coexistência e o respeito. Na sua agenda para as relações culturais internacionais, a cultura
aparece como vetor do desenvolvimento social e económico sustentável, através do
fortalecimento das indústrias culturais e criativas, como meio de promover o diálogo inter-
cultural, a diversidade, e as relações inter-comunitárias pacíficas, e pelo reforço da cooperação
ao nível do património cultural56. Na sequência dessa agenda, a União Europeia desenvolve
vários programas e projectos que apoiam a cooperação internacional no domínio das indústrias
culturais e criativas, entre países da região de África e de outros continentes. Tendo em conta o
quadro teórico nebuloso, não se sabe se, esse apoio tem resvalado em ganhos mútuos, conforme
o preconizado no discurso do qual emerge e se desenvolve a cooperação internacional para o
desenvolvimento em geral, e na Declaração dos Princípios de Cooperação Cultural Internacional,
em particular.
Todavia, Domont57 afirma que a persistência do fraco desenvolvimento em países
beneficiários de ajuda mesmo com o recrudescimento de programas de cooperação internacional
deve-se à falta de políticas capazes de promover o desenvolvimento dentro desses países, não
tendo nada a ver com as políticas dos doadores ou da cooperação internacional. Castel-Branco58

55
FARINHA, Cristina e MUOCHA, Matilde (2022) Diagnostico e proposta de estratégia para a cooperação cultural
da União Europeia em Moçambique.
NYE (2011) apud JUNIOR, Pedro Nhacota (2012) Diplomacia cultural e seu papel à política externa: reflexões
sobre Moçambique, p. 3.
56
UNIÃO EUROPEIA (2016) apud FARINHA e MUOCHA (2022), op.cit., p. 18.
57
DOMONT (1962) apud NIPASSA (2009), op.cit., p. 9.
58
CASTEL-BRANCO, Carlos Nuno. (2011). Dependência de Ajuda Externa, Acumulação e Ownership:
contribuição para um debate de economia política. In IESE. (2011). Cadernos do IESE no 7, Maputo.

21
defende que a fragilidade e a fragmentação das instituições e políticas públicas dos países
beneficiários da ajuda externa são, em parte, resultado da dependência da ajuda, interferência dos
doadores e preferência destes por um Estado mais frágil e fragmentado, e a combinação dos
interesses dos grandes investidores estrangeiros.
Um olhar atento sobre o lugar da cultura na agenda política africana e moçambicana em
particular mostra que, a cultura tem tido apoio dentro dos países do continente e nas
organizações regionais. A cultura assumiu papel importante no processo de libertação dos países
africanos da opressão colonial. Mondlane59 sustenta que a resistência e os movimentos
independentistas das nações africanas tiveram “uma expressão puramente cultural”, por ter sido,
inicialmente, nas artes onde a minoria intelectual que na altura encontrava-se na diáspora,
encontrou espaço para denunciar a opressão colonial e exigir a liberdade. Por isso, após a
independência os países africanos deram/dão grande apoio a cultura.
Diversos tratados e agendas africanas sobre a cultura também reconhecem a importância
da cultura no desenvolvimento sustentável. No rol desses tratados, o destaque vai para a
Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamada pela Assembleia Geral das Nações
Unidas a 10 de Dezembro de 1948 que, nos números 1 e 2 do artigo 27 reconhece como direito
humano fundamental a participação livre da comunidade na vida cultural e a protecção dos
direitos morais e materiais decorrentes da criação artística, literária e científica.
Ao nível de África, o Manifesto Pan-Africano, realizado na Argélia em 1969 afirma que a
cultura desempenha um papel crucial para o desenvolvimento social e económico do continente.
A Declaração da Conferência Intergovernamental sobre Políticas Culturais em África, realizada
em Accra em 1975 e a Carta Cultural para África de 1976, ambos reafirmam o papel da cultura
no desenvolvimento pleno60.
A Comissão da União Africana através da sua Estrutura Estratégica de 2004-2007 disse
que (…) “a cultura está, e deve permanecer, no início e no fim do desenvolvimento”61. No que
toca às indústrias culturais e criativas, a União Africana, com o apoio da UNESCO realizou uma
série de consultas regionais que culminaram com a adoção, em Julho de 1992, do Plano de
Acção de Dacar para o Desenvolvimento das Indústrias Culturais em África, um documento que

59
MONDLANE, Eduardo (1995) Lutar por Moçambique. 1ª edição, colecção Nosso Chão, Centro de Estudos
Africanos, p. 91.
60
KOVÁCS, Máté (2008) A economia criativa e a erradicação da pobreza na África: princípios e realidades.
61
Ibidem, p. 97.

22
para além de conceptualizar o que se entende por indústrias culturais, faz uma revisão dos
sectores de actividades, apontando potencialidades, fragilidades e recomendações62. Esse plano
veio a ser revisto com a aprovação, em Dezembro de 2005, do Plano de Acção de Nairobi para as
Indústrias Culturais em África durante a realização da Conferência da União Africana de
Ministros da Cultura.
Um marco importante e de reconhecimento da importância estratégica da cultura para o
desenvolvimento, foi o compromisso de alocação, ao sector da cultura, de 1% do orçamento de
cada Estado-membro da União Africana acordado na Trigésima Terceira Sessão Ordinária da
UA, realizada em Fevereiro de 202063.
Como se pode depreender, o tema sobre cultura e de indústrias culturais e criativas tem
estado a circundar as agendas e o epicentro de decisões políticas continentais e regionais sobre o
assunto, o que à partida, expressa a vontade política de desenvolver o sector.

2.3. O lugar da cultura na agenda política nacional e da cooperação cultural


internacional
A cultura sempre ocupou um lugar de destaque no projecto político de Moçambique bem
antes da Independência Nacional. O projecto de construção de uma nação moçambicana através
da luta de libertação colonial teve um surto cultural, com os poemas de Noémia de Sousa, José
Craveirinha e das pinturas de Malangatana que denunciavam a opressão colonial e clamavam
pela libertação64.
A célebre frase “cultura, sol que nunca desce”, de Samora Machel, primeiro presidente
de Moçambique é um exemplo claro do reconhecimento da importância da cultura e do apoio
alocado ou que se pretendia conferir às artes e cultura como componentes essenciais na (re)
construção identitária e da moçambicanidade que, a colonização tentou desvirtuar durante os
anos de colonização.
Dentro de uma economia centralmente planificada (socialista), o Estado moçambicano
colocou-se à dianteira do sector cultural, concentrando tudo a si mesmo, planificando,

62
OUA e UNESCO (1992) Plano de Acção de Dakar sobre Industrias Culturais para o desenvolvimento em África.
63
FARINHA e MUOCHA (2022), op.cit., p. 20.
64
MONDLANE (1995), op.cit.

23
produzindo e financiando as artes e cultura. De Abreu65 afirma que a própria Constituição da
República aprovada em 1975 atribui ao Estado o papel determinante de intervir nos sectores
económicos e sociais. De acordo com as Directivas Económicas e Sociais do 4º Congresso do
Partido FRELIMO66, o Estado tinha, no sector cultural, de forma exclusiva, o papel de proceder
com o levamento sistemática do património cultural da nação; apoiar e estimular os artistas
talentosos e promover a formação dos moçambicanos neste domínio; e multiplicar as realizações
recreativas populares através de espetáculos, festivais, feiras; concursos, e outras formas de
entretimento, bem como a promoção de conferências, palestras e debates.
A primeira Constituição da República Popular de Moçambique de 1975 reservava um
lugar especial à cultura, integrando-a nos objectivos fundamentais descritos no artigo 4, no qual
afirma-se que a República Popular de Moçambique tem, entre outros objectivos, “a edificação de
uma economia independente e a promoção do progresso cultural e social”. O Estado
moçambicano propunha-se a promover o desenvolvimento cultural e personalidade nacionais e a
disseminação internacional da cultura moçambicana.
Um ano após a proclamação da Independência Nacional é criado o Grupo Nacional de
Canto e Dança que mais tarde ficou mais conhecido como Companhia Nacional de Canto e
Dança. Este grupo resultou da experiência tida durante o período colonial, integrando artistas não
profissionais que representavam quase todas as regiões do país, interpretando danças, cancões e
poesias moçambicanas com teor revolucionário, dentro da ideia Samoriana de construção do
homem novo67.
Nesse período a cultura foi encarada numa perspectiva ideológica, de construção do
homem novo, com privilégio dado a algumas manifestações cultuais em detrimento de outras que
eram associadas às práticas obscurantistas. Conforme afirmam Bussotti e Gundane:
Se por um lado se afirmava que se reconhecia o peso da
importância das tradições nas vidas das pessoas, por outro lado se
combatia de várias formas e selecionava-se apenas os valores
ligados à modernidade, assim as práticas como o alcoolismo, a

65
DE ABREU, António Pinto, Financiamento à cultura: desafios e oportunidades. Conferência Nacional da Cultura
de 2009.
66
Directivas Económicas e Sociais do 4º Congresso do Partido FRELIMO (1983) apud DE ABREU (2009), op.cit.,
9.
67
FERNANDO, António Fernando (2013) Promoção cultural externa: uma análise da Companhia Nacional de
Canto e Dança de Moçambique, monografia, licenciatura, Instituto Superior de Artes e Cultura.

24
poligamia, o lobolo, o curandeirismo eram vistas como contrárias
ao espírito do progresso68.
Apesar de, inicialmente, os movimentos em torno das artes e cultura terem tido um
carácter eminentemente ideológico e uma perspectiva filosófica e sociológica, onde a cultura era
vista no seu sentido mais amplo como forma de ser, estar e pensar de um povo, ignorando o seu
papel para o desenvolvimento, tiveram seu mérito no sentido de içar a cultura moçambicana no
panorama nacional e internacional.
Nos meandros da cooperação, Moçambique abriu-se ao mundo logo nos primórdios da
independência nacional, cooperando com o bloco socialista e não só. No artigo 22 da
Constituição da República Popular de Moçambique 1975 está bem patente que:
A República Popular de Moçambique consolida e desenvolve a
solidariedade com os países socialistas, seus aliados naturais,
solidariedade forjada na luta pela independência nacional.
A Republica Popular de Moçambique estabelece e desenvolve
relações de amizade e cooperação com todas as forças democráticas
e progressistas do mundo.
As duas linhas acima ilustram que, pese embora a abertura para o mundo, tal processo foi,
inicialmente, reservado aos países socialistas. No domínio da cultura e da criatividade,
Moçambique celebrou vários acordos:
(…) vários acordos foram assinados entre países como
Cuba, Jamaica, China, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), Tanzânia, Zimbabwe, entre outros, que resultaram em
intercâmbios artístico-culturais nacionais e daqueles países,
incluindo a vinda de professores cubanos que apoiaram na
instalação da Escola Nacional de Música, Escola Nacional de Artes
Visuais e Escola Nacional de Dança, assim como a ida de
estudantes moçambicanos para aqueles países frequentarem cursos
médios e de nível superior69.
O regresso dos moçambicanos que beneficiaram de bolsas de estudos no âmbito dos
acordos de cooperação é descrito por Meigos como tendo trazido uma dinâmica diferente e de
realce ao sector cultural nacional, introduzindo, no campo das artes plásticas, “as discussões
sobre arte contemporânea, estilos, materiais e perspectiva teóricas”70.
A Companhia Nacional de Canto e Dança, por exemplo, um agrupamento artístico
cultural criado pelo Estado moçambicano logo após a independência Nacional fez e continua a

68
BUSSOTTI e GUNDANE (2019), op.cit., p. 178.
69
MEIGOS (2018), op.cit., p. 77.
70
Ibidem.

25
fazer várias apresentações no mundo fora, sendo que nos primeiros anos participou em países
festivais internacionais em países como Cuba, Jamaica, URSS, RDA, Bulgária, Roménia,
Jugoslávia, Hungria, Gana, Nigéria, Tanzânia, Zimbabwe, só para citar alguns. Essas
participações contribuíram para que esta agremiação conquistasse o estatuto de embaixador
artístico cultural71.
Como demonstrado acima, por volta da década 80, Moçambique viu-se obrigado a
aderir as instituições de Bretton Woods face a uma série de incondicionalismos que lhe foram
impostos para obter o apoio da comunidade internacional para financiar a economia que se
encontrava numa crise tremenda72. No âmbito da cooperação, a adesão de Moçambique ao
sistema do mercado significou sua maior abertura, passando a manter relações com quase todos
os países do mundo, sem se preocupar com o sistema político vigente73.
A Constituição da República aprovada em 1990 demonstra a abertura de Moçambique
nas relações com outros países do mundo. Com a adesão às instituições de Bretton Woods e
consequentemente ao sistema do mercado (capitalismo), a Constituição da República de 1975 foi
revista e aprovada uma nova em 1990 que através da alínea j) do artigo 11 estabelece como um
dos objectivos fundamentais o “estabelecimento e desenvolvimento de relações de amizade e
cooperação com outros povos e Estados.” Esse objectivo é reforçado pelo no 1 do artigo 17,
capítulo 2 referente a política externa e direito internacional que preceitua o seguinte:
A República de Moçambique estabelece relações de amizade e
cooperação com outros Estados na base dos princípios de respeito
mútuo pela soberania e integridade territorial, igualdade, não
interferência nos assuntos internos e reciprocidade de benefícios.
No que diz respeito a cultura, o mesmo documento prescreve no seu o artigo 115 que:
1. O Estado promove o desenvolvimento da cultura e personalidade
nacionais e garante a livre expressão das tradições e valores da
sociedade moçambicana.
2. O Estado promove a difusão da cultura moçambicana e desenvolve
acções para fazer beneficiar o povo moçambicano das conquistas
culturais dos outros povos.
É no quadro dessas prescrições que o Estado moçambicano foi se lançando nas relações
internacionais e na cooperação internacional. Filimone Meigos assevera ter sido a partir desse
período em que a abordagem do Estado em relação a cultura mudou, passando a adotar uma

71
JOAQUIM CHISSANO e DAVID ABILIO apud FERNANDO (2013), op.cit., pp. 41 e 45.
72
CASTEL-BRANCO (2017), op.cit.
73
MEIGOS (2018), op.cit.

26
postura na qual a cultura é apreendida na perspetiva de negócio, sobretudo a de indústrias
culturais e/ou criativas. O termo indústrias culturais viria a ser empregue, pela primeira vez, em
um documento de orientação política, isto é, na Política Cultural de Moçambique e Estratégia da
sua Implementação aprovada através da resolução n.º 12/97 de 10 de Junho, porém, sem que seja
esclarecido o seu significado e abrangência.
Essa política também realça a importância da cooperação, particularmente da cooperação
cultural internacional, por isso o Governo se propôs, através desse documento, a promover o
reforço dos laços com todos os países, independentemente dos sistemas políticos e localização
geográfica.
Nessa nova acepção da cultura, o Estado adotou uma política de ausência74, de pouca
intervenção no sector cultural e criativo75, abrindo espaço para o sector privado e a comunidade
internacional. Porém, salvaguardando a soberania nacional, integridade territorial, não
interferência nos assuntos internos e reciprocidade de benefícios conforme plasmado no artigo 17
da Constituição da República de 1990 e de 2004. Aliás, em complemento, foi aprovada em 1994
a Lei nº 4/94 de 13 de Setembro, lei que estabelece os princípios básicos que permitem estender
a acção das pessoas jurídicas, singulares ou colectivas, públicas ou privadas, que desenvolvem
actividades comerciais em diversos sectores, para apoiar, financeira e materialmente as artes,
letras, ciência, cultura e acção social, vulgarmente conhecido como lei de mecenato.
Contudo, Meigos considera “falacioso” o principio de reciprocidade de benefícios e de
não interferência nos assuntos internos, argumentando que:
Se, por um lado, em Moçambique, os parceiros diplomáticos abrem
as suas instituições de diplomacia cultural (Portugal, Centro
Cultural Português; Alemanha, Centro Cultural Goethe; Estados
Unidos da América, Centro cultural Martin Luther King; Brasil,
Centro cultural Brasil-Moçambique; França, Centro cultural
Franco-moçambicano, só para citar alguns), Moçambique não pode
retribuir nas suas missões diplomáticas no estrangeiro ou, pelo
menos, nos citados países76.
No novo quadro de apreensão da cultura (indústrias culturais e/ou criativas), o Estado
passa a contar com a ajuda de parceiros internacionais no financiamento da acção cultural”77.
Paradoxalmente, Meigos refere que, a partir deste momento, o bolo orçamental alocado pelo

74
RUBIM, António Albino Conelas (2016) Teses sobre financiamento e fomento à cultura no Brasil.
75
BUSSOTTI e GUNDANE (2019), op.cit.
76
MEIGOS (2018), op.cit., pp. 80 e 81.
77
Ibidem, p. 81.

27
Estado, ao sector cultural começou a escassear. Em contrapartida, os projectos/programas de
cooperação internacional direcionado ao desenvolvimento das indústrias culturais e criativas
agudizavam em direcção ao desenvolvimento de políticas e capacidades de gestão. Instituições
como UNESCO, UNCTAD, União Europeia, só para citar algumas, oferecem apoio técnico e
financeiro ao Ministério que superintende a cultura e aos profissionais do sector.
Uma iniciativa designada “programa conjunto para o fortalecimento das indústrias
culturais e criativas e políticas de inclusão em Moçambique” (F-ODM) (Fundo para a realização
dos OMD do PNUD/Espanha) foi implementada em Moçambique. O programa tinha o objectivo
de promover a contribuição das indústrias culturais e criativas para um desenvolvimento social e
económico em Moçambique, através do fortalecimento de políticas estratégicas e quadros legais
e regulamentares, bem como o acesso a dados de qualidade sobre o sector, a sua importância e
desafios de desenvolvimento. O mesmo integrou duas componentes. A primeira esteve sob
coordenação da UNESCO em colaboração com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e
o Centro Internacional de Comércio (CCI) e visou promover a contribuição das indústrias
culturais e criativas para o desenvolvimento social e económico. A segunda componente foi
levada a cabo pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e a Agricultura (FAO) em
coordenação com a UNESCO, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados
(ACNUR) e com o Fundo da População das Nações Unidas (FNUAP), com objectivo de
assegurar a inclusão de aspectos culturais nas políticas e estratégias de desenvolvimento. Um
elemento central do programa foi a capacitação de parceiros nacionais e locais de forma a
assegurar a sustentabilidade dos resultados78.
A implementação desse projecto esteve em linha com o Plano Estratégico da Educação e
Cultura (2006-2011), documento no qual o conceito de indústrias culturais aparece definido
como “compreendendo todos os empreendimentos e sectores de produção de bens culturais, indo
desde os espetáculos, cinema e audiovisual, os estúdios de gravação musical, o fabrico de
instrumentos musicais, o livro, entre outros”79 .
Mais um outro projecto de cooperação internacional para o desenvolvimento do sector
cultural, denominado “Desenvolvimento das Instituições Culturais de Moçambique” foi
implementado pela UNESCO, no período entre 2006-2009, com foco no fortalecimento dos

78
NACÕES UNIDAS (2011), op.cit.
79
Plano Estratégico da Educação e Cultura (2006-2011).

28
museus, monumentos e casas de cultura. As suas actividades incluíram: o reforço dos museus
(acessibilidade, melhoramentos da qualidade, materiais promocionais, etc.), abordagem de
problemas de preservação, a promoção do património cultural e na formação profissional
cultural80.
Um terceiro projecto que merece destaque é referente à “capacitação para profissionais,
gestores, administradores do Programa Cultural no Ministério da Educação e Cultura”,
implementado também pela UNESCO no mesmo período de 2006-2009 cujo objectivo era de
fortalecer a capacidade dos funcionários públicos em gestão e administração de programas
culturais, aos níveis centrais, provinciais e distritais e melhorar a comunicação entre os diferentes
sectores de cultura.
O quarto programa é o projecto multi-agências, Fortalecendo as Indústrias Criativas em
cinco países selecionados de África, Caraíbas e Pacifico (ACP) através do emprego e expansão
do comércio foi implementado em parceria com OIT, CNUCED/UNCTAD e UNESCO durante
o período 2008-2011 e que resultou no relatório das Nações Unidas que temos vindo a citar. Este
relatório faz uma análise das políticas, do lugar das artes e cultura na agenda nacional, incluindo
os programas de cooperação internacional de apoio ao sector cultural e criativo, apontando
algumas fragilidades que minam o desenvolvimento do sector, ao mesmo tempo que avança
algumas recomendações. Tal como afirmamos acima, o relatório mostra que, desde a
Independência Nacional, a cultura ocupa um lugar de destaque na agenda política nacional,
havendo esforços de criação de instituições e políticas que dinamizem e orientem o
desenvolvimento do sector. O documento também reconhece o empenho da comunidade
internacional no apoio ao sector cultural e criativo nacional.
Contudo, o mesmo documento reconhece que o lugar da cultura na agenda nacional tem
sido bastante oscilante, facto que é revelado pelas metamorfoses que a cultura tem estado a
verificar na máquina administrativa estatal. Ora vejamos, de 1975-1983, a cultura esteve
acoplada à educação, Ministério da Educação e Cultura; em 1983 instituiu-se a Secretaria de
Estado para a Cultura que prevaleceu até 1987; de 1987 a 1992 a cultura continuou autónomo
por via do Ministério da Cultura; 1992-1996, Ministério da Cultura e Juventude; 1996-2000,
Ministério da Cultura, Juventude e Desportos; 2000-2005, Ministério da Cultura; de 2005 a
Cultura esteve sob a tutela do Ministério da Educação e Cultura; em 2010 voltou a ocupar um

80
NAÇÕES UNIDAS (2011), op.cit.

29
lugar de destaque com a criação do Ministério da Cultura e, de 2015 a 2022 a cultura está junto
com o turismo, Ministério da Cultura e Turismo. Pese embora, tenha havido muitas realizações,
incluindo a criação de políticas e instituições ligadas ao sector cultural, essas metamorfoses
denunciam, em parte, a falta de priorização da cultura como um sector estratégico para o
desenvolvimento.
A CNCED/UNTACD recomendaram para que Moçambique adotasse uma abordagem
política que tivesse em conta o impacto socio-económico da cultura, isto é, de economia criativa.
Para tal, era importante a instituição de um Comité de Direcção Interministerial sobre Economia
Criativa que agiria em consonância com as associações profissionais no desenvolvimento e
consolidação de políticas para reforçar o papel das indústrias culturais para o desenvolvimento.
Em Maio de 2009 foi realizado a segunda conferência Nacional sobre Cultura. Dentre os
viários painéis e temas, houve um painel sobre a dimensão socio-económica da cultura que
debateu três temas, nomeadamente: indústrias e mercados culturais; o papel do conhecimento
local como referencial cultural e factor de desenvolvimento e, turismo cultural e
desenvolvimento sustentável.
Curioso e coincidentemente, o Ministério da Cultura instituído em 2010, introduziu, pela
primeira vez, a Direcção Nacional de Promoção das Indústrias Culturais, que hoje ostenta o
nome de Direcção Nacional das Indústrias Culturais e Criativas cujas atribuições passam pela
elaboração e gestão de políticas atinentes as indústrias culturais e criativas. Em 2016 foi
aprovada a Política Nacional das Indústrias Culturais e Criativas e estratégia de sua
Implementação. E, em 2019, através do Decrecto no 23/2019 de 23 de Março, é criado o Instituto
Nacional das Indústrias Culturais e Criativas, órgão executivo tutelado pelo Ministério da
Cultura e Turismo, vocacionado a promoção das indústrias culturais e criativas.
A assistência técnica, sobretudo em forma de formulação de políticas incluindo a
financeira através de subvenções de ONGs internacionais é considerada por Meigos como uma
forma de influenciar as agendas artístico-culturais nacionais no quadro do imperialismo
ocidental.
(…) “tipicamente, as agendas artístico-culturais são concebidas em função dos
financiamentos/patrocínios que se oferecem nos meandros das ONGs e outros
potenciais compradores/utilizadores/patrocinadores/financiadores da arte que,
tipicamente, primam, salvas as excepções, por um exotismo e um surrealismo que

30
já não existe ou, pelo menos, não nos moldes concebidos a partir do mito do
progresso ocidental”81.
Considerando o quadro acima descrito, há uma tentativa de adequar o quadro estrutural e
organizacional do sector da cultura e criativo nacional aos moldes do ocidente.
Como se pode perceber, os projectos de cooperação internacional que tem vindo a ser
implementados em Moçambique multiplicam em anos. O que permanece são as fragilidades
atinentes ao sector cultural e criativo que, mesmo com esforço nacional e internacional, o
desenvolvimento das chamadas indústrias culturais e criativas continuam uma miragem. O facto
preocupante é a escassez de estudos científicos que abordam o contributo e as implicações dos
projectos de cooperação internacional no desenvolvimento das indústrias culturais e criativas.

2.4. Avaliação de projectos de cooperação internacional para o desenvolvimento


A divergência de modelos, princípios e práticas que caracteriza a cooperação
internacional para o desenvolvimento, proporciona resultados e impactos divergentes. Quando se
esperava que os projectos de cooperação internacional promovessem o desenvolvimento
equilibrado e justo, os resultados revelam um desenvolvimento desigual (Samir Amin82), onde os
doadores, regra geral, parceiros de cooperação internacional saem em vantagem em comparação
com os menos fortes, com altos níveis de pobreza e desigualdades.
Em reconhecimento da ineficiência e ineficácia de assegurar um efetivo progresso social
e económico dos países beneficiários dos programas de cooperação internacional para o
desenvolvimento, várias discussões tem sido levadas cabo pelas próprias agências de cooperação
internacional para o desenvolvimento, como também pelos académicos interessados. O Fórum
sobre a Eficácia da Ajuda realizado em Roma, em 2003, a Declaração de Paris sobre Eficácia de
Ajuda ao Desenvolvimento, aprovada em 2005, a Agenda Para a Acção de Acra, em 2008, são
parte dos compromissos assumidos em debates de alto nível visando assegurar maior eficácia da
cooperação internacional e seu impacto no desenvolvimento dos países recipientes. Umas das
componentes essenciais desses compromissos é o reforço dos mecanismos de monitorização e
avaliação.

81
MEIGOS (2018), op.cit., p. 92.
82
AMIN, Samir (1976) Imperialismo e desenvolvimento desigual. Tradução de Eneida Araújo (1987), São Paulo.

31
A ideia é de que a avaliação “pode tornar o desenvolvimento mais eficaz, pois permite
gerar evidência ao indicar o que funciona, sobre quais condições, para quem, como e porquê,
medindo os resultados e identificando as intervenções que levaram a esses resultados”83.
De acordo com OECD/DAC84 a avaliação é:
“uma apreciação sistemática e objectiva de um projecto, programa ou política, em
curso ou terminado, quanto à sua concepção, execução e resultados. O propósito é
determinar a pertinência e o grau de cumprimento dos objectivos, a eficiência em
matéria de desenvolvimento, a eficácia, o impacto e a sustentabilidade. Uma
avaliação deve fornecer informações credíveis e úteis permitindo integrar as lições
da experiência nos processos de decisão dos beneficiários e dos doadores.
Avaliação também se refere a um processo de determinar o valor ou a importância
de uma actividade, política ou programa (tradução nossa).
Para efeitos desta pesquisa interessa, a avaliação da pertinência, visando aferir a
relevância do projecto tendo em conta as políticas e prioridades do contexto e do sector no qual
estão inseridos85. Assim, será avaliada a pertinência, quer do DIVERSIDADE, quer dos
projectos subvencionados no âmbito daquele programa em relações às políticas e prioridades do
sector da cultura e da criatividade. Em seguida a avaliação foca nos resultados efetivamente
alcançados e sua relação com o desenvolvimento do sector cultural e criativo. Interessa ainda a
avaliação da sustentabilidade, centrada na avaliação da continuidade dos impactos e resultados
gerados pelo projecto, procurando analisar se os beneficiários estão disponíveis reúnem
condições técnicas, financeiras ou de mobilização de recursos e institucional para assegurar a
continuidade das acções e dos resultados do projecto86.
A avaliação tem a finalidade de ver o que correu bem ou mal, para quem e, em que
circunstâncias87. Para o presente estudo, a avaliação dos resultados visa tirar ilações, promover a
aprendizagem e o aperfeiçoamento na condução dos projectos/programas de cooperação
internacional virados para o sector cultural e criativo.

83
KHAGRAM et al, 2009; THOMAS & TOMINAGA (2010) apud De ASSIS, Renata Vieira (2021) Avaliação e
eficácia das ONG: o projeto Cáritas Lusófonas em Rede: inovar para o impacto”. Dissertação, Mestrado,
Universidade Lisboa, p. 7.
84
OECD/DAC (2002) apud MILBUN, Jaqueline Barumen (2010) Monitoreo y Evaluación de Proyectos. Cuadernos
de Cooperación para el Desarrollo No. 3: Especialización en Cooperación Internacional para el desarrollo, p. 39.
85
MILBUM (2010), op.cit.
86
Ibidem
87
ROGERS & PEERSMAN (2014) apud De ASSIS (2021), op.cit.

32
A avaliação cumpre uma função de relevo na gestão de projectos de desenvolvimento,
podendo informar as diversas partes envolvidas e interessadas sobre a eficácia de um projecto e
seu impacto para o desenvolvimento.

2.5. Quadro conceptual


Esta secção apresenta e discute os conceitos fundamentais para a compreensão do estudo.
Inicialmente apresenta e discute-se o conceito de cooperação internacional para o
desenvolvimento, seguida do conceito de desenvolvimento e de indústrias culturais e criativas.

2.5.1. Cooperação Internacional para o Desenvolvimento


Perante as desigualdades sociais que caracterizam a população mundial, a cooperação
internacional para o desenvolvimento ganha maior relevância. Considerando que o conceito de
cooperação internacional para o desenvolvimento é amplo e comporta variedade de princípios e
práticas, a sua compreensão não tem sido uma tarefa fácil, porém, de extrema importância.
Muitas vezes confunde-se a cooperação internacional para o desenvolvimento como uma
acção de caridade que deriva, unicamente, da vontade dos países ricos para com os países pobres,
ou como uma imposição de modelos e práticas pelos primeiros aos segundos88. A cooperação
internacional para o desenvolvimento deve ser vista como um mecanismo da concretização do
princípio de solidariedade internacional entre os povos assente na justiça e na responsabilidade
partilhada de assegurar um desenvolvimento equilibrado.
A cooperação internacional para o desenvolvimento:
“consiste no esforço levado a cabo conjuntamente por países
desenvolvidos e países em desenvolvimento, com a finalidade de combater as
dificuldades económicas e sociais dos últimos de forma sustentável e duradoura.
A cooperação significa envolver as populações na definição, planificação e
criação do seu próprio futuro, capacitando as pessoas e comunidades para
intervirem e liderarem o seu próprio processo de desenvolvimento”.89

88
FERREIRA, Patrícia Magalhães. (2011). Uma agenda de desenvolvimento global pós-2015: Arquitectura e
eficácia da ajuda em perspectiva. in ONGD (2011). A eficácia de ajuda e do desenvolvimento. Plataformas
Portuguesa de ONGD, Lisboa.
89
Ibidem, p. 44.

33
Por seu turno, Sanches90 define a cooperação internacional para o desenvolvimento como
sendo o “conjunto de acções direcionadas e executadas por agentes públicos e privados de
diferentes países, que em conjunto buscam a promoção de um mundo mais justo e equilibrado”.
A autora acrescenta que a cooperação internacional para o desenvolvimento ultrapassa a ideia de
ajuda e de doação, pese embora, sejam partes integrantes. Ela abarca a transferência de
conhecimentos tecnológicos e estruturais, organização de acções especializadas em locais
assolados por guerras e catástrofes naturais, doação de alimentos, de instrumentos e
medicamentos e também a concessão de empréstimos em condições mais favoráveis do que as
oferecidas por bancos privados, cujo único objectivo é a obtenção de benefícios económicos
particulares.
O conceito de cooperação apresentado por Manccini está assente na ideia de que os
problemas locais são ao mesmo tempo globais ou podem evoluir para um contexto global, sendo
obrigação de todos mitigá-los. Este facto encontra melhor explicação no que Manzini apelidou
de SLOC Scenario. Para este autor SLOC significa, Small (pequeno), Local (local), Opens
(aberto), Connected (conetcado), onde o pequeno e local estão abertos e conectados formando o
global. Mazini avança que:
(…) “o global é uma “rede de locais” – isto é, uma malha de sistemas locais
conectados, cuja pequena escala torna-os compreensíveis e controláveis por
indivíduos e comunidades. Não há esperança de implementação de soluções
sustentáveis sem considerar essas localidades no quadro das transformações
contemporâneas – ou seja, sem considerar que, na sociedade globalizada em rede,
o local e o pequeno estão ao mesmo tempo abertos e conectados”91.
É dentro dessa rede de locais que se forma o global que a cooperação internacional para o
desenvolvimento se faz necessária para corrigir as distorções sociais e económicas que
caracterizam o mundo, sobretudo nos países em desenvolvimento e que muitas delas foram
causadas pela própria comunidade internacional através da colonização e da exploração
desenfreada do ambiente que hoje causa graves problemas catastrófico ao nível global, com
maior estragos nos países em desenvolvimento.

90
SANCHES (s/d) apud MANCCINI (2013), op.cit., p.2.
91
MANZINI, Enzo, Small, Local, Opens, and Conected: Design for social innovation. The journal for designs
strategies, n. 1, v. 4. Pp. 7-14, 2010, pp. 8 e 9.

34
2.5.2. Desenvolvimento
O conceito de desenvolvimento suscita vários debates no seio da academia e nas
organizações de cooperação internacional para o desenvolvimento. Esses debates giram em torno
de, primeiramente o desenvolvimento ter sido apreendido numa dimensão reduzida ao
crescimento económico, negligenciando assim vários domínios da vida humana. Conceituações
recentes mostram que o desenvolvimento deve significar a expansão das liberdades substantivas
que permitam:
“a satisfação das necessidades humanas materiais e imateriais (necessidade
de expressão, de criatividade, de igualdade, de convivência e de
compreensão para dirigir seu próprio destino); que seja fruto do coração de
cada sociedade, com seus próprios valores e visão de futuro;
autossuficiente, baseando-se no principio de que cada sociedade deveria e
deve valorizar suas próprias forças e recursos, energias dos seus membros
e seu meio ambiente natural e cultural; ecologicamente solvente: utilização
racional dos recursos da biosfera, consciência do potencial dos
ecossistemas locais e globais; e baseado em transformações estruturais:
requisito nas relações sociais, económicas e espaciais para a
autoadministração e a participação, sem as quais as metas de cima não
poderiam ser alcançadas92.
Essa linha de pensamento mostra que, o desenvolvimento deve ser encarado de forma
holística, abarcando principalmente a componente humana como elemento essencial para
dinamizar as mudanças sociais, políticas, económicas, culturais, ambientais necessárias para a
satisfação das necessidades humanas, materiais e imateriais da melhor forma possível,
espeitando as singularidades internas de cada local.
Para o presente estudo, o desenvolvimento de indústrias culturais criativas deve ser
encarado como a possibilidade da escolha do que fazer, como fazer e a capacidade de o fazê-lo
de forma autónoma e contínua, mesmo quando a assistência dos parceiros da cooperação
internacional tiver cessada, pressupondo que os programas de cooperação internacional para o

92
NEFRIM (1997) apud LIMA (2010), op.cit., p. 83.

35
desenvolvimento devem ser capazes de criar capacidades dentro do sector cultural e criativo
local para que este seja sustentável.

2.5.3. Indústrias Culturais e Criativas


O conceito de indústrias culturais e criativas é vasto e de difícil conceituação. Abarca
vários conceitos num só, o de indústrias culturais e o de indústrias criativas que foram sendo
construídos ao longo do tempo no mundo. Esses conceitos são usados de forma separada,
indústrias culturais, indústrias criativas e de forma combinada, indústrias culturais e criativas. As
razões da variação no manuseamento desses conceitos são várias, porém, não cabem nesse
trabalho por não constituírem o centro do debate.
2.5.3.1. Indústrias Culturais
O primeiro conceito a ser elaborado é o de indústria cultural no singular, cunhado em
1947, pelos teóricos da Escola de Frankfurt, Thedor Adorno e Max Horkheimer em sua obra
“Dialética do esclarecimento” em substituição da expressão até então usada – cultura de massa.
O conceito de indústria cultural foi usado no sentido comparativo e denunciador daquilo que,
para esses autores, era contrária à obra de arte considerada única e irreprodutível a sua
comercialização.
Os teóricos da escola de Frankfurt eram contra a comercialização de produtos culturais,
considerando tal processo um atentado contra os valores poético, artístico e estético que os
caracterizam. A produção de produtos culturais em moldes industriais, como regra - padronizada
e em série, foi vista pelos críticos da escola de Frankfurt como um mecanismo de assegurar a
acessibilidade de produtos culturais para as massas, visando distrai-los das suas lutas de
classes93.
Numa obra que reúne uma coleção de textos de Theodor Adorno intitulada “Indústria
cultura e sociedade”, o autor afirma que (…) “o cinema e o rádio não têm mais necessidade de
serem empacotados como arte. A verdade de que nada são além de negócios lhes serve de
ideologia”94. Esta colocação demostra claramente que o conceito de indústria cultural cunhado
pelo Adorno tinha um sentido depreciativo, por estar a ser submetido aos desígnios do mercado e
usado pela classe aristocrata e política para distrair as massas. De acordo com a visão

93
HARTLEY, John (2005) Creative Industries. Blackwell Publishing, p. 11.
94
ADORNO, Theodor, Indústria Cultural e Sociedade: Tradução de Juba Elisabeth Levy et al. (2002), Ed Paz e
Terra, São Paulo, p. 6.

36
frankfurtiana, a produção cultural ao ser submetida à indústria, deixava de seguir o modelo de
planificação de baixo para cima, a favor do de cima para baixo, em que a classe aristocrata, na
sua maioria, proprietários dessas indústrias pensavam e produziam o que lhes
convinham/convém a mente para o consumo das massas.
O conceito de indústria cultural foi uma “extensão direta das novas indústrias de
reprodução e distribuição em massa que começaram na virada do século XIX – cinema, gravação
de som, jornais de grande circulação, impressos populares e, posteriormente, radiodifusão”95.
Porém, mais tarde, por volta dos anos 60, um conjunto de teóricos franceses, dentre eles
Bernard Miége96 e Edgar Morin97, se opõe ao conceito de indústria cultural no singular,
propondo indústrias culturais no plural. A ideia central é de que, o conceito no singular tem uma
tendência universalizante, ignorando as especificidades dos diferentes sectores de produção da
cultura. O conceito de indústrias culturais reconhece a existência de diferenças processuais
dentro dos diferentes sectores de produção de mercadorias culturais. O que remete a existência
de várias indústrias e não de uma, como por exemplo, a indústria da música, do cinema, do livro,
entre outras98.
O conceito de indústrias culturais descreve um conjunto de actividades ou sectores que se
dedicam a produção de “bens e serviços culturais segundo critérios comerciais e industriais, ou
seja, uma produção em série, destinada ao mercada e orientado por estratégias de natureza
prioritariamente económica”99.
Mais tarde, o conceito de indústrias culturais foi adotado por vários países, incluindo
organismo internacionais como a UNESCO, associando-o às políticas públicas de promoção da
cultura para o desenvolvimento. África também, não esteve alheia a esse debate, pois, tal como
mostramos acima, vários encontros foram realizados, reunindo ministros de cultura de quase
todos países do continente e da região da África Austral, onde Moçambique faz parte. Nesses
encontros vários documento de orientação política foram aprovados sobre a matéria, podendo

95
OʼCONNOR (2011) apud DE BEUKELAER, Christiaan. Toward an “African” take on the cultural and creative
industries? SAGE. Media, Culture & Society. 2017, Vol. 39(4) 582-591, p. 584.
96
BERNARDO MIÉGE (2000) apud SANTOS, Rogério (2009) Indústrias Culturais, Imagens, Valores e Consumo.
Edições 70, Portugal, Lisboa.
97
MORIN, Edgar (2002) Cultura de massa no seculo XX, tradução de SARDINHA, Maria Ribeiro, 9ª edição,
Forense Universitária, São Paulo.
98
CARONE, Iray, Industria Cultural e Industrias Culturais: alguns apontamentos, impulso, v. 23, n. 57, mai.set.
2013, p. 9-17.
99
SANTOS (2009), op.cit., 17.

37
destacar o Plano de Acção de Dakar sobre Industrias Culturais para o Desenvolvimento de
África.
Em Moçambique, o debate conceitual e político sobre indústrias culturais iniciou
tardiamente. O conceito aparece, pela primeira vez, empregue na Política Cultura e Estratégia da
sua Implementação aprovada em 1997, porém, sem definição do real significado e abrangência.
A definição de indústrias culturais viria a acontecer em 2006 no Plano Estratégico da Educação e
Cultura (2006-2011), documento no qual o conceito de indústrias culturais é defendido como um
“conjunto de empreendimentos e sectores de produção de bens culturais, indo desde os
espetáculos, cinema e audiovisual, os estúdios de gravação musical, o fabrico de instrumentos
musicais, o livro, entre outros”. Com a criação e entrada em funcionamento do Instituto Superior
de Artes e Cultura (ISrC), a discussão académica sobre o conceito ganhou relevância no solo
pátrio. Todavia, enquanto o debate político e académico sobre indústrias culturais ia ganhando
terreno ao nível de África, e em Moçambique em particular, o mundo fora, com destaque para
Europa, ia debatendo o conceito de indústrias criativas.

2.5.3.2. Indústria Criativas


O conceito de indústrias criativas surge por volta de 1990, associado ao projecto
australiano, Creative Nation100. Porém, foi no Reino Unido durante o governo do então Primeiro-
ministro britânico Tony Blair que ganhou destaque ao associar o conceito a uma agenda política
económica que visava responder a crise económica registada nesse país ocasionada pela
decadência industrial101. Tony Blair criou uma equipa conjunta e multidisciplinar (task force)
que realizou um mapeamento com o objectivo de identificar actividades de maior expressão
económica no contexto da decadência industrial.
Desse mapeamento foi identificado um conjunto de actividades cuja característica
comum, é o uso intensivo de conhecimento, criatividade, talento individual e aliada à
conectividade proporcionada pela internet, com potencial para criação de emprego e riqueza.
Para o caso específico do Reino Unido foram agrupadas 13 sectores, nomeadamente publicidade,
arquitectura, mercado de artes e antiguidades, artesanato, design, design de moda, cinema,

100
REIS (2008), op.cit.
101
BENDASSOLLI et al.. Indústrias Criativas: definição, limites e possibilidades. RAE, v. 4, n. 1, jan/mar, 2009,
São Paulo.

38
software, softwares interativos para lazer, música, artes performativas, indústria editorial, rádio,
TV, museus, galerias e as actividades relacionadas às tradições culturais102.
De acordo DCMS103 o conceito de indústrias criativas descreve um conjunto de
actividades que “têm sua origem na criatividade, habilidade e talento individuais e que
apresentam um potencial para a criação de riqueza e empregos por meio da geração e exploração
de propriedade intelectual”. A autora prossegue, esclarecendo que o conjunto de actividades que
integram as indústrias criativas varia de região ou país, considerando o seu potencial impacto na
balança de pagamentos, no trabalho e no comércio internacional.
O conceito de indústrias criativas não veio substituir o de indústrias culturais, mas sim
ampliar a abrangência deste último, por um lado, e por outro, fugir da conotação que esteve,
inicialmente, associado. A reconceptualização de indústrias culturais para indústrias criativas não
foi resultado dos atores praticantes, mas assim dos decisores políticos dos países que queriam
obter ganhos económicos a partir do boom das tecnologias de informação e comunicação (TICs)
e da realidade mercadológica dos anos 1990104.
Como dito acima, os conceitos de indústrias culturais e indústrias criativas podem ser
encontrados na diversa literatura académica e política, usados de forma separada ou combinada.
Moçambique, por exemplo, manuseia o conceito de indústrias culturais e criativas de forma
combina. O país conta com uma política de Indústrias Culturais e Criativas aprovada em 2016
que elenca como parte das indústrias culturais e criativas as seguintes actividades: a música,
dança, teatro, espetáculo, audiovisual e cinema, livro, artes visuais, artesanato, design,
gastronomia, instrumentos musicais e o turismo.
Essas actividades são multidimensionais, pois, para além de, a sua produção ter como
base a cultura, valorizam e promovem valores simbólicos, crenças e identidades, com impactos
intangíveis na governança democrática; na economia local e geração de empregos; e como
complemento ao desenvolvimento de outros sectores de actividades como turismo e
comunicação105.

102
REIS (2008), op.cit., pp. 24 e 25.
103
DCMS (2005) apud Reis, op.cit., 17.
104
HARTLEY (2005) apud MUOCHA, Matilde et al. (2020) Indústrias Culturais e Criativas: O que são? Como
gerir? 2ª ed. Kyswayle, Maputo, p. 32.
105
MARTINEEL (2010), op.cit., pp. 10 e 16.

39
De Beukelaer106 refere que o conceito das indústrias culturais e criativas usado na maior
parte dos países africanos foi transposto da realidade ocidental, sem nenhuma contextualização à
realidade africana.

2.6. Quadro teórico


A presente secção apresenta as teorias que oferecem elementos interpretativas do assunto
em pesquisa. Trata-se do realismo político e construtivismo, duas teorias que oferecem bases
para a análise das relações internacionais, da cooperação internacional para o desenvolvimento
em particular.
2.6.1. Realismo político
O realismo político é uma das correntes de pensamento que analisa as relações
internacionais que surgiu no fim da primeira Guerra Mundial, tendo seu auge o período da
Segunda Guerra107. Dentre vários teóricos julgados realistas, destaca-se Edward Carr e Hans
Morgenthau.
O realismo político ou realismo contrapõe-se ao idealismo ou liberalismo que admite a
cooperação entre os actores internacionais. Define-se como uma visão da política internacional
que enfatiza o lado competitivo e conflituoso nas relações internacionais. Os realistas
argumentam que os principais actores das relações internacionais, os Estados estão preocupados
com a sua própria segurança, agindo em busca de seus interesses particulares e em constante
disputa108.
O realismo político e o neorrealismo são teorias que analisam as relações internacionais
como um campo de “constantes lutas de poder entre seus membros que vivem em uma sociedade
anárquica e actuam de maneira racional e egoísta para alcançar seus interesses nacionais” 109. No
quadro destas teorias, a cooperação internacional para o desenvolvimento afasta-se do seu
discurso de génese, o de “solidariedade internacional e da necessidade de promover um
desenvolvimento igualitário e justo, para servir os interesses exclusivos dos doadores”.

106
De BEUKELAEL, Christiaan. Toward an “African” take on the cultural and creative industries? SAGE. Media,
Culture & Society. 2017, Vol. 39(4) 582-591.
107
SIGAKI, Hugo Leonardo Ogasawara (2006) A teoria do realismo político nas relações internacionais,
monografia, bacharel, Universidade Federal do Paraná, p. 19.
108
KORAB-KARPOWICZ (2010) apud OLIVEIRA, Fernandes Nunes (2016) Realismo Político e Cooperação
Internacional: Valores internacionais e Consenso Sobreposto como Alternativa de Estabilidade, dissertação,
doutoramente, Universidade Católica do Rio Grande do Sul, p. 25.
109
TORRES (2011) apud LEITAO, Simão Cardoso, Apontamentos sobre o Sistema de Cooperação para o
Desenvolvimento a partir de dados do caso de Moçambique, s/d, Fundação Fé e Cooperação em Moçambique, p. 6.

40
Hans Morgenthau110, um dos principais teóricos do realismo, equipara “a ajuda
internacional com os subornos aos governos receptores, os quais são utilizados pelos países
desenvolvidos para obter benefícios que atendam aos seus interesses particulares”. Para
fundamentar, o autor explica que, o próprio Plano Marshal, tido como um programa que marcou
o início da cooperação internacional para o desenvolvimento, foi usado pelos EUA para a
satisfação dos seus interesses políticos e comerciais, destacando-se a necessidade de conter a
expansão do comunismo a favor do capitalismo e de assegurar a expansão de mercados para os
seus excedentes produtivos.
A teoria realista ainda prevalece em alguns programas de cooperação internacional e
desenvolvimento, apontando-se o caso da União Europeia, que desenvolve programas de
cooperação internacional para o desenvolvimento como forma de “assegurar laços com suas ex-
colônias a fim de reafirmar a presença europeia em escala mundial e garantir que os novos países
adotem a economia de mercado e tenham como principais parceiros os países europeus,
facilitando a internacionalização de suas empresas”111.

2.6.2. Teoria da modernização


A modernização é uma corrente teórica demarcada por um conjunto de teorias que
analisam a questão do desenvolvimento e do subdesenvolvimento. Os teóricos da modernização
explicam a questão do desenvolvendo e o subdesenvolvimento a partir de dois tipos de
sociedade. Uma sociedade tradicional caracterizada pela estabilidade ao longo do tempo, com
predomínio de práticas tradicionais na esfera política, económica e social. A base do
desenvolvimento é uma agricultura tradicional que não assegura maior produtividade, sendo uma
das causas do subdesenvolvimento. A segunda sociedade é a moderna cujas características
representam uma ruptura com as práticas tradicionais. A organização política, económica e social
muda continuamente, com a prevalência de actividades de maior produtividade, sendo por isso
sociedade desenvolvida112.
Um dos teóricos de maior destaque da modernização é Walt Rostow com a sua teoria de
estágios de desenvolvimento económico. Rostow vê o desenvolvimento como um processo linear

110
HANS MORGENTHAU apud MANCINI, op.cit., p. 7.
111
HANS MORGENTHAU apud MANCINI, op.cit., p 7.
112
MACHADO, Lia Pinheiro. Alcance e limites das teorias de modernização, revista de Administração de
Empresas, Jul/Set, 1970, p. 170. Disponível em
https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rae/article/download/40506/39236

41
para todos. Os países em desenvolvimento deviam seguir as mesmas etapas pelas quais os já
desenvolvidos passaram, transitando de uma sociedade tradicional alicerçada na produção da
terra para uma sociedade dominada pela industrialização que permitirá a diversificação da
produção e consequentemente o surgimento de uma sociedade de consumo. Todavia, este
modelo teórico é largamente criticado por ignorar as singularidades locais dos países em
desenvolvimentos, o que em última instância tem empurrado muitos programas e projectos de
cooperação internacional ao fracasso113.

2.6.3. Construtivismo
A teoria construtivista nas relações internacionais surge por volta de 1980, buscando
explicar a “essência dos processos de construção mútua dos pilares do saber e do agir
internacionais”114. David Chandler sentencia que:
As teorias construtivistas que se desenvolveram nas relações
internacionais no início dos anos 1990 desafiaram as perspectivas
teóricas centrais na disciplina acadêmica das relações
internacionas. Durante a Guerra Fria e durante a maior parte da
história das relações internacionais, a agenda de pesquisa foi
dominada por abordagens racionalistas que subordinavam a
moralidade aos interesses do poder. A estrutura construtivista
desafia essa ênfase no poder e procura demonstrar que, ao invés do
poder, são as normas e valores que moldam o comportamento da
maioria dos estados. Os Estados ainda podem exercer o poder em
termos de poder militar e coercitivo, mas o uso desse poder não é
guiado apenas por interesses estatais imorais. Em vez disso, na
estrutura construtivista, o poder é limitado e os interesses do Estado
remodelados por meio de estruturas normativas internacionais
criadas pelas múltiplas interações de atores estatais e não estatais
na sociedade civil global realmente existente115.

A teoria construtivista defende que as estruturas da política internacional são basicamente


sociais e não dependem das relações de poder. Os atores internacionais realizam suas acções
fundamentadas por uma série de interesses e valores através de determinados meios e

113
TORRES (2011) apud LEITAO, Simão Cardoso, Apontamentos sobre o Sistema de Cooperação para o
Desenvolvimento a partir de dados do caso de Moçambique, s/d, Fundação Fé e Cooperação em Moçambique, p. 3.
114
CASTRO, Thales (2012) Teorias das relações internacionais, Fundação Alexandre de Gusmão, Brasília, p. 385.
115
CHANDLER, David (2004) apud 115 CASTRO, Thales (2012) Teorias das relações internacionais, op.cit., p. 387-
388.

42
capacidades definidas pela estrutura social, a qual não corresponde a mero interesse nacional e
egoísta, mas sim considera outros elementos importantes como a ética116.
Para o construtivismo, a cooperação é um mecanismo de efetivação do princípio de
solidariedade internacional, e até de correcção das distorções causadas pela própria comunidade
internacional através da colonização. Os construtivistas advogam que, os actores internacionais
podem contribuir para construção de mundo pacífico e equilibrado através da cooperação, uma
vez que, suas acções são desenvolvidos considerando valores e interesses construídos ética e
mutuamente.

As três teorias acima apresentadas oferecem lentes para a leitura e interpretação dos
fenómenos que ocorrem nas relações internacionais, sobretudo nas acções de cooperação
internacional para o desenvolvimento. O realismo político adverte sobre a supremacia dos países
desenvolvidos que fazem de tudo para satisfazerem os seus próprios interesses. Nesses termos,
acções de cooperação internacional são, muitas vezes, usados pelos países desenvolvidos como
mecanismo de manter a sua imponência sobre os países pobres e satisfazerem seus próprios
interesses egoístas. Nessa lógica, há toda uma necessidade dos países pobres prestarem atenção
nos programas e projectos de cooperação internacional para o desenvolvimento para que, de
facto, atendam aos interesses comum e não apenas dos países desenvolvidos.
A teoria de modernização ensina sobre a necessidade de consideração do contexto
político, económico e cultural de cada país no desenho e implementação dos programas de
cooperação internacional para o desenvolvimento, evitando a ideia de one size fits all (o que
serve a um, serve para todos ou seja, o que serviu para os países ricos deve ser replicados pelos
países pobres para alcançar o desenvolvimento) que predomina nas acções de cooperação. Os
países em desenvolvimentos precisam estar atentos à imposição de modelos de desenvolvimento
a luz dos países ricos, devendo ser adequados à realidade contextual.
Do construtivismo a lição é de que é possível o desenvolvimento dos países pobres
através das acções de cooperação internacional para o desenvolvimento. Os construtivistas
defendem que as relações entre ao actores internacionais são conduzidos levando em
consideração os valores, interesses e o contexto do país de implementação das acções de

116
MANCINI, op.cit., p. 7.

43
cooperação. No trabalho, a teoria vai permitir ver se o programa DIVERSIDADE está sendo
conduzido dentro do espírito construtivista ou não.

44
CAPÍTULO 3: APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETACÃO DE
RESULTADOS
O presente capítulo apresenta os resultados da pesquisa de campo e está organizado por 3
secções. A primeira secção faz a contextualização do surgimento do programa DIVERSIDADE,
seu enquadramento e objactivos. Analisa os requisitos de elegibilidade, o processo de gestão e,
por fim indica os projectos subvencionados no âmbito do DIVERSIDADE. A segunda secção
analisa a relação entre a gestão do DIVERSIDADE e dos projectos subvencionados. A terceira e
última avalia-se os resultados dos projectos subvencionados, com enfase na criação e promoção
de emprego.

3.1. DIVERSIDADE: contextualização, requisitos de candidatura, gestão do programa e


projectos subvencionados
O DIVERSIDADE é uma actividade do programa PROCULTURA PALOP-TL, que consiste
em prestar assistência técnica e financeira com a finalidade de promover o desenvolvimento de
pequenos projectos e acções que contribuam para a diversidade cultural, cidadania e identidade
através da cultura, ao mesmo tempo que contribui para a criação do valor económico, nos seis
países, nomeadamente, Moçambique, Angola, Guiné- Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe
e Timor-Leste.
Para melhor entendimento do contexto que norteou a criação do DIVERSIDADE, é
importante fazer um breve enquadramento do programa mãe, o PROCULTURA.

3.1.1. PROCULTURA: contextualização e objectivos


O PROCULTURA, onde o DIVERSIDADE é parte integrante, é um projecto que surge
em resposta aos elevados índices de desemprego nos PALOP e Timor-Leste (42.7% em
Moçambique) e da diversidade cultural e do potencial dos recursos culturais e criativos
abundantes nesses países, associado ao reconhecimento cada vez crescente de que cultura é uma
componente essencial do desenvolvimento por abarcar a preservação, valorização e promoção da
identidade e civilizações dos povos, o sistema de valores culturais considerado fundamental para
a compreensão e respeito mútuo, o valor económico integrado nas actividades culturais e
criativos e sua relação com o comércio e o turismo117.

117
Para mais detalhe consultar a breve descrição do projecto PROCULTURA.

45
Em entrevista concedida no âmbito da pesquisa, a representante da União Europeia em
Moçambique, disse que o programa surge, também, em resposta a solicitação dos governos dos
países abrangidos, de um apoio no sector das artes e cultura.
Um estudo de base foi realizada em cada país com o objectivo de analisar a estrutura e
organização das indústrias culturais e criativas, identificando prioridades e similitudes capazes de
permitir a definição de um programa comum. Em Moçambique, o estudo foi realizada por uma
consultora espanhola, Mónica González Bastos, com o título “Estudo das áreas temáticas no
“Domínio Prioritário 1 – Criação de Emprego” no âmbito do Programa Indicativo Plurianual
da Cooperação PALOP e Timor-Leste com a União Europeia (PALOP-TL/UE) ”.
O estudo em referência aponta que, apesar dos esforços que o Governo, a sociedade civil
e os profissionais criativos vem empreendendo, visando tornar factível a relação entre cultura e
desenvolvimento através de políticas que reconhecem e encorajam a apreensão económica da
cultura e da criatividade, ainda persistem desafios no que tange a estruturação e organização do
sector, com maior parte dos empreendimentos no sector informal118. No rol dos desafios, consta
também o acesso ao financiamento, numa situação em que o financiamento público está cada vez
mais a escassear perante a redução do bolo orçamental alocado para o sector pelo Estado e da
dificuldade de financiar a cultura pela banca pelo contexto de incerteza que reina nos negócios
culturais e criativos119 e do fraco domínio da linguagem de negócios por parte da classe criativa.
Um outro desfio apontado pela consultora no estudo prende-se com a dificuldade de apurar os
quantitativos de empregos gerados ou criados no sector.
Joffe120 esclarece que, a dificuldade de obter dados estatístico do sector cultural e criativo
em África resulta do facto de, maior parte dos negócios e profissionais atuarem no sector
informal.
Pese embora possa ter havido um estudo de base que fundamentou a definição do
programa, Lucas Macuácua121, presidente da Federação das Associações Culturais (FACUM),
contemplado pelo DIVERSIDADE disse não ter sido ouvido aquando da realização do estudo.
Mesmo assim, considera que o programa é de grande valia no sentido em que possibilita a

118
BASTOS (2016), op.cit.
119
TOLILA, Paul (2007) Cultura e economia: problemas, hipótese e pistas. Tradução Celso M. Pacionik,
Iluminuras: Itaú Cultural, São Paulo.
120
Joffe, Avril, The cultural and creative economy in Africa: challenges and innovations, Creative Economy, 2013.
121
Entrevista com Lucas Macuácua realizada no dia 26 de Outubro de 2022 na cidade de Maputo.

46
concretização de suas iniciativas e consequentemente contribuir para o desenvolvimento do
sector cultural e criativo em Moçambique.
Outrossim, Eugénio Santana122, representante do Ministério da Cultura e Turismo
lamentou o facto de o estudo que norteou a definição do PROCULTURA ter sido conduzido por
uma consultora estrangeira que, não obstante domine a metodologia de realização de estudos de
género, desconhece as singularidades do contexto, o que pode ter sido limitante para ter acesso a
fontes, colocando em questão todo programa e o seu resultado. Porém, o entrevistado disse que
há indícios de mudança, apontando o exemplo do envolvimento de uma consultora nacional,
Matilde Muocha, no segundo estudo encomendo pela União Europeia, apresentado em 2022,
para a definição de mais um programa de cooperação para o sector cultural e criativo.
O PROCULTRA está em linha com a Agenda Europeia para a Cultura de 2007 que
contempla a cultura nas relações internacionais, reconhecendo como “desafio a perseveração da
diversidade cultural assim como a oportunidade para uma ordem mundial baseada na paz, na
compreensão mútua e no respeito por valores partilhados”123. O programa também está alinhado
com a nova Agenda da União Europeia para a Cultura 2018 que associou a cultura à educação,
reconhecendo o seu potencial transformador rumo ao desenvolvimento, comprometendo-se a
apoiar a criação de emprego nos países da ACP, com destaque para a tecnologia digital que
favorece novas formas de criação artística; de acesso mais abrangente e democrático à cultura e
ao património; novos meios de acesso, consumo e monetização do conteúdo cultural.
No breve documento de apresentação do PROCULTURA a que se teve acesso aparecem
destacados 5 Objectivos do Desenvolvimento Sustentável, particularmente os objectivos 5 sobre
igualdade de género; 8 referente ao trabalho digno e crescimento económico; 10 atinente a
redução das desigualdades; 16 ligado a paz, justiça e instituições eficazes; e 17 referente às
parcerias para a implementação de objectivos. O que pressupõe que o PROCULTURA, e o
DIVERSIDADE em particular estão, igualmente, alinhados com os Objectivos do
Desenvolvimento Sustentável.
Aliás, constitui objectivo do PROCULTURA contribuir para o emprego em actividades
geradoras de rendimento no sector da cultura nos PALOP e Timor-Leste através do reforço de
competências dos recursos humanos e do financiamento ao sector cultural, especificamente nas

122
Entrevista realizada em Maputo no dia 04 de Novembro de 2022.
123
Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de Abril de 2008, sobre uma agenda europeia para a cultura num
mundo globalizado publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 15/10/2009.

47
áreas da música, artes cénicas e literatura infanto-juvenil124, ao mesmo tempo que promove a
cooperação cultural entre os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa e Timor-Leste e as
trocas comerciais entre si e a Europa, reforçando a mobilidade de artistas e o comércio
internacional de produtos culturais e criativos.
No geral, o PROCULTURA foi orçado em 19.040.000,00 EUR financiado pela União
Europeia com 17.750.000,00 EUR, co-financiados e geridos pelo Camões I.P com 1.200.000,00
EU, e co-financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian em 900.000,00 EUR. Todavia, o
DVERSIDADE, enquanto uma das componentes do PROCULTURA, estava orçado em
100.000,00 EUR para cada país beneficiário.
O Director do Instituto Camões de Maputo e a responsável pela cultura na Delegação da
União Europeia em Moçambique afirmaram, em entrevista no âmbito da presente pesquisa, ser a
primeira vez que a União Europeia concede um financiamento grande especificamente para o
sector cultural e criativo ao nível dos POLOP-TL.

3.1.2. Actividades do PROCULTURA


De acordo com ficha do projecto fornecida pela gestora do PROCULTURA, Mercedes
Pinto, as actividades do programa podem ser agrupadas em três eixos principais a saber: o
primeiro eixo refere aos recursos humanos e centra na qualificação das competências criativas e
técnicas dos profissionais do sector. Esse eixo abarca, resumidamente, as seguintes actividades:
1. Fortalecimento e criação de novos cursos em áreas críticas de competências técnicas e de
gestão para os sectores culturais e criativos em todos os PALOP-TL. Com base nesta actividade,
o PROCULTURA se propunha a oferecer apoio financeiro e técnico para a revisão dos cursos
técnicos profissionais ligados aos sector e, eventualmente, apoiar a concepção e introdução de
novos, com foco em matéria de gestão e produção cultural;
2. Conceção de bolsas de estudos para a frequência de cursos superiores, pós-graduação ao nível
internacional, incluindo residências artísticas nas áreas da música e artes cénicas;
3. Apoiar programas de intercâmbio de estudantes dos curos ligados ao sector cultural e criativo
entre instituições de ensino superior dos PALOP-TL e dos países do Programa Erasmus+;
4. Desenvolvimento de polos de criação contemporânea e de acolhimento de residências
artísticas nos domínios da música e/ou artes cénicas nos PALOP-TL.

124
Regulamento e convite de apresentação de propostas do programa DIVERSIDADE.

48
5. Formação dos funcionários públicos, organizações da sociedade e empreendedores que
operam nas indústrias culturais e criativas em matéria de acesso ao financiamento e para
inovação na economia cultural e criativa; e
6. Financiamento de pequenas iniciativas e projectos que contribuam para a diversidade cultural,
cidadania e identidade – Fundo DIVERSIDADE.

O segundo eixo é referente ao sector da música e das artes cénicas e focou na melhoria da
difusão e criação de oportunidades de comercialização de produtos da música e das artes cénicas,
incluindo seus criadores nos mercados nacionais, regionais e internacionais. Este eixo contempla
as seguintes actividades:
1. Atribuição de subvenções e prestação de assistência técnica para projectos de investimento
com capacidade de criação de emprego e rendimento sustentáveis nos sectores da música e artes
cénicas ao nível nacional e internacional. e
2. Desenvolvimento de campanha publicitária internacional “Cultura PALOP-TL”,
especialmente dedicada à valorização da música e artes cénicas, visando promover o
conhecimento amplo da identidade cultural e mudar a percepção dos produtos culturais destes
países no sentido de criar condições favoráveis para a sua valorização e consumo.

O terceiro e último eixo diz respeito a literatura infanto-juvenil, e destinou-se a


impulsionar a criação, publicação e difusão da literatura infanto-juvenil ao nível nacional e
regional. Esse eixo incluiu as seguintes actividades:
1. Atribuição de subvenções e apoio técnico para realização de projectos regionais de criação,
publicação, difusão ou comercialização de literatura infanto-juvenil dos PALOP-TL a nível
regional e internacional. e
2. Formação de educadores e professores em matéria de utilização da literatura como recurso
didático-pedagógico.

3.1.3. Objectivos e enquadramento do DIVERSIDADE nas prioridades políticas locais


O DIVERSIDADE é uma actividade do PROCULTURA que se enquadra no primeiro
eixo, visando reforçar as competências técnicas e profissionais do sector cultural e criativo dos
PALOP-TL através de um fundo para o financiamento de pequenas iniciativas e projectos que

49
contribuam para diversidade cultural, cidadania e identidade. Prossegue os objectivos do
PROCULTURA, particularmente os de contribuir para “a construção de um mundo seguro e
pacífico.
Enquanto parte integrante do PROCULTURA, responde, em parte, aos desafios que o
sector cultural e criativo dos PALOP e Timor Leste apresenta, como também a filosofia de
actuação da própria União Europeia que, nos últimos anos incorpora a cultura no centro da sua
política externa, atrelado ao poder suave a ela associada e a capacidade de promover o diálogo
inter-cultural e o desenvolvimento económico e social através das indústrias culturais e criativas.
Quer o DIVERSIDADE, quer o PROCULTURA estão alinhados com as premissas
plasmadas no Plano Estratégico da Cultura 2012-2022 que contempla no rol das suas prioridades
a “cultura como factor de geração de rendimento”, propondo para o efeito melhorar a formação e
capacitação dos profissionais do sector; apoiar a estruturação e valorização económica das
actividades culturais e criativas; e apoiar os mecanismos de financiamento e assistência técnica
aos sectores culturais e criativos.
Estão, igualmente, alinhados com a Política das Indústrias Culturais e Criativas e
Estratégia da sua Implementação aprovada pela Resolução no 34/2016 de 12 de Dezembro,
curiosamente poucos meses depois de apresentação do estudo base que norteou a definição do
PROCULTURA.
Outrossim, o Plano Quinquenal do Governo 2020-2025, no seu Objetivo Estratégico III
pretende promover a participação da sociedade, em especial da juventude, nas actividades
socioculturais, desportivas e económicas. Em termos concretos, no domínio da cultura, propõe:
a) Capacitar os fazedores das artes e cultura em matérias de gestão e marketing de
negócios dos bens culturais;
b) Promover e divulgar a circulação, comercialização e consumo de bens culturais
do País;
c) Apoiar as iniciativas e projectos artístico-culturais de entidades, associações,
grupos e agentes culturais e artistas individuais;
d) Promover intercâmbios e troca de experiências entre artistas e grupos culturais a
nível nacional e internacional;
e) Promover a pesquisa, a preservação, valorização e divulgação do património
cultural material e imaterial moçambicano; e
f) Fortalecer a posição de Moçambique no Mapa cultural Mundial através da
candidatura de Chigubo e Mapiko a Património Mundial da Humanidade.

50
À partida, e de acordo com o critério de pertinência, pode-se afirmar que o
DIEVRSIDADE é pertinente, pois, para além de ter sido, em parte, solicitado pelas autoridades
governamentais dos PALOP-TL, em particular moçambicanas, responde aos desafios do sector
cultural e criativos identificados por um estudo de base, estando entrelaçado com as prioridades
políticas do contexto. Aliás, o discurso e a praxis política do dia carrega a filosofia de um sector
cultural e criativo orientado para criação de riqueza e emprego, onde a capacitação técnica quer
de gestor públicos do sector, quer dos agentes culturais constituem actividades privilegiadas.

3.1.4. Critérios de elegibilidade do DIVERSIDADE


O regulamento estabelecia como critérios de elegibilidade os seguem abaixo:
a) Pessoas singulares que tenham residência fixa e permanente num país do grupo PALOP/
Timor-Leste há pelo menos dois anos, à data de candidatura;
b) Pessoas coletivas de direito público de um dos países do grupo PALOP/ Timor-Leste,
designadamente entidades públicas estatais e outros organismos da administração pública
regional, municipal ou local;
c) Pessoas colectivas de direito privado, designadamente associações, cooperativas,
empresas e outras organizações da sociedade civil, com ou sem finalidade lucrativa,
desde que registadas e com actividade efectiva num dos países do grupo PALOP/ Timor-
Leste há pelo menos dois anos, à data de candidatura;
d) Parcerias, associações e consórcios, desde que todos os requerentes cumpram os critérios
de elegibilidade definidos acima e definam um requerente principal para coordenar o
projecto ou acção.
De forma geral, os profissionais criativos entrevistados no âmbito do estudo, consideram
legítimos e justos os critérios de elegibilidade. Aliás, o primeiro requisito é descrito, até certo
ponto, como inovador na política de subvenções da União Europeia, pois, não costuma ser
prática desta entidade financiar projectos ou iniciativas de pessoas singulares. Aliás, são poucos
doadores internacionais, pelo menos os que actuam no sector da cultura, que apoiam projectos de
pessoas singulares. A tónica tem sido de financiar pessoas colectivas, quer do domínio público,
quer do privado.
Todavia, outro aspecto que merece atenção e que levanta muitas reclamações no seio de
alguns profissionais que actuam no sector cultural e criativo tem a ver com a exigência de pelo

51
menos 2 anos de existência legal e de efectiva actuação no momento da candidatura. Entende-se
que, este requisito seria dispensável, pelo menos, para fundos pequenos de até 2 000 EUR, pois
permitiria que estas associações ganhassem experiência de gestão que muitas das vezes é
requerida para aceder a fundos maiores.

3.1.5. Gestão do DIVERSIDADE


Em Moçambique, a gestão do DIVERSIDADE é feita pelo Instituto Camões em Maputo
em estreita colaboração com a rede de Institutos Nacionais da Cultura da União Europeia
(EUNIC) presentes em Moçambique. O Director do Camões em Maputo que lidera a gestão do
DIVERSIDADE é assistido por dois assistentes, uma assistente geral, e uma para área financeira.
O Ministério da Cultura e Turismo, representante do Governo moçambicano que,
segundo foi dito, em conjunto com os restantes países dos PALOP-TL, que solicitou apoio à
União Europeia, é pouco envolvido na gestão do programa. Numa entrevista, o Chefe do
Departamento das Indústrias Culturais e Criativas do Ministério da Cultura e Turismo, Eugénio
Santana afirmou que, o Ministério integra, apenas, a equipa de monitoria e avaliação dos
projectos subvencionados. A considerar pelo nível de conhecimento dos projectos efectivamente
subvencionados e/ou em implementação, mostra haver pouco envolvimento e até pouca
articulação com o Instituto Camões, entidade gestora do Diversidade em Moçambique.
O Ministério da Cultura e Turismo, como conhecedor do contexto cultural e criativo
moçambicano e responsável pela formulação e gestão das políticas do sector, incluindo a
definição de prioridades para o desenvolvimento do mesmo, não faz parte do processo de
selecção dos projectos prioritários subvencionados pelo DIVERSIDADE. De acordo com o
Director125 do Camões em Maputo e com o chefe126 do Departamento das Indústrias Culturais e
Criativas, a exclusão do Ministério no processo de selecção dos projectos deve-se ao facto de
haver algumas instituições públicas, tutelas ou subornadas pelo Ministério da Cultura e Turismo
que apresentaram candidaturas ao DIVERSIDADE, o que levantaria conflitos de interesses se o
Ministério fizesse parte da avaliação.

125
Entrevista com o Director do Instituto Camões em Maputo, João Pignatelli, realizada no dia 21 de Setembro de
2022 em Maputo.
126
Entrevista com Eugénio Santana, chefe do Departamento das Indústrias Culturais e Criativas no Ministério da
Cultura e Turismo realizada no dia 04 de Novembro em Maputo.

52
Embora o represente do Ministério da Cultura e Cultura, ouvido no âmbito da pesquisa,
reconheça a legitimidade do argumento da sua exclusão no processo de selecção e respeita a
soberania institucional da União Europeia e de todas instituições parceiras, admitiu que o
Ministério se sente um pouco fora dos processos de gestão do DIVERSIDADE, argumentando
que como conhecedor das prioridades de desenvolvimento do sector, era expectável que
estivesse por perto.

53
3.1.6. Projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE em Moçambique
A presente secção faz a triagem dos projectos/iniciativas, subvencionados pelo programa DIVERSIDADE entre 2020 e 2021.
Os projectos são descriminados na tabela abaixo que, para além do beneficiário, integra o título do projecto/iniciativa, o montante
atribuído em euros, o sector em que acção se enquadra nos sectores culturais e criativos e por fim a província de implementação do
projecto.
De referir que, a meta prevista no âmbito do DIVERSIDADE era de beneficiar 400 iniciativas, repartidos de forma equilibrada
pelos seis países, com espectativa de 50% serem mulheres. O regulamento do Diversidade alude que, em cada país seriam
subvencionados, pelo menos, 20 projectos de até 2.000,00 EUR, no máximo oito projectos entre 2.001 EUR e 10.000,00 EUR e dois
projectos até 20.000,00 EUR.
Tabela 1: Projectos subvencionados
Ord Beneficiário Título da proposta Montante atribuído Sector de Província de
em EUROS enquadramento actuação
nas ICCs
1 Associação Josina Olaria, nossa arte e sustento 8 687,67 Artesanato Inhambane
Machel
2 Isabel Jorge Contos tradicionais em rádio para 10 000,00 Maputo
crianças
3 David Aguacheiro Empty Room 9 945,00 Cinema Maputo
4 Associação Positivo Galeria Timbila 9 992,94 Música Inhambane
Moçambique
5 Smile Moçambique E.I. Arte Yagaya - Plataforma Online 2 000,00 Inhambane
6 Hélio Nguane Programa de rádio Diversidade 18 666,50 Rádio Maputo
7 André Bahule Documentário “Manas” 2 000,00 Cinema Maputo
8 Associação dos Pequenos
Empresários de
Hotelaria e Turismo da Criação do site da APETUR 9 892,00 Turismo cultural Nampula
Ilha de Moçambique
(APETUR)

54
9 Companhia de Artes Festival de Teatro de Rua - Ku 2 000,00 Teatro Maputo
Makwerho Phanda
10 Associação Casa Velha Arte Cultural no âmbito da prevenção Niassa
e combate ao COVID-19127
11 Arlinda Florência Legalização e website da Converge 1 971,00 Artes cénicas Maputo
Américo Matusse Mais
12 Associação Cultural Legalização e fortalecimento da 2 000,00 Artes Maputo
Warethwa Federação das Associações Culturais
de Moçambique - FACUM
13 Elcides Carlos Armando Bookings & Bandas 2 000,00 Música Maputo
14 APDICC - Associação Mapeamento, Pesquisa e Divulgação 2 000,00 Maputo
para o Desenvolvimento do Xigovia Investigação
das Indústrias Culturais cultural
15 Timbila Café Capacitação de Artistas Circenses 2 000,00 Maputo
para eventos infantis
16 Bernardo Guiamba Festival Raiz (DIVERSIDADE 2 000,00 Eventos culturais Maputo
ESPECIAL WOMEX - Worldwide
Music Expo)
17 Associação Cultural Renovação do Palco do Cinema 2 000,00 Equipamento Inhambane
Scala Tofo128 cultural
18 Special Children Building Futures Youth 1 600,00 Inhambane
Inclusion Organization
19 Associação Moçambicana Bekissa129 2 000,00 Cinema Maputo
de Cineastas
20 Carlos de Lina Cabo Delgado é Moçambique 2 000,00 Cabo-Delgado
21 Associação dos Pequenos Máquinas de fabricar sonhos 2 000,00 Corte e costura
Empresários de Nampula
Hotelaria e Turismo da

127
O projecto não recebeu a subvenção pelo facto de os gestores do mesmo não terem conseguido entregar os documentos necessários para assinatura do
contracto.
128
De acordo com a assistência do Diversidade, o palco do Cinema Tofo foi destruído, após sua reabilitação por conta da chuva que caiu no dia seguinte. Os
gestores do projecto prometeram voltar a reabilitar com recursos próprios, no entanto, sem avançar datas.
129
Este projecto também não recebeu a subvenção por falta dos documentos exigidos para a assinatura do contracto.

55
Ilha de Moçambique
(APETUR)
22 Hermenegildo Macamo Captação para Finalização do 2 000,00 Cinema Maputo
documentário Zama N'tombi130
23 Spipasti Networking Administrativo131 2 000,00 Maputo
24 Estevão Amisse ReciclART132 2 000,00 Artesanato Cabo Delgado
25 Dércio Gomate Escuta MZ133 2 000,00 Música Tete
26 Festa da Mbira 2 000,00 Música Maputo
27 GACIM Educação Patrimonial e Ambiental: 2 000,00 Património e Nampula Ilha
Ilha de Moçambique ambiente de Moçambique
28 Escola de Comunicação e Lab e Campanhas Teatro 2 000,00 Teatro
Artes (ECA-UEM)
Total: 98 755,11
Fonte: Autor com base nos dados da pesquisa.
Dados fornecidos pela assistente técnica do DIVERSIDADE, Diana Manhiça134, indicam que Moçambique recebeu um total de
171 projectos, apenas 28 projectos foram aprovados. Mesmo sem avançar números, em entrevista, a representante da União Europeia,
Filipa Corte Real135 e o Director do Camões em Maputo, João Pignateli foram unânimes em afirmar que Moçambique recebeu maior
número de candidaturas e consequentemente maior número de projectos subvencionados em relação aos outros países dos PALOP-
TL.
Porém, dos 28 projectos aprovados em Moçambique, até ao momento da realização do estudo, apenas 22 tinham sido
implementados. Segundo a assistente técnica do Diversidade, dois (2) projectos solicitaram o reagendamento das suas actividades,
sem avançar datas para o seu arranque.

130
Ainda não foi implementado, pois, os gestores do mesmo reagendaram o seu início.
131
Idem.
132
Desistiu por dificuldades de tramitação da documentação necessária para assinatura do contrato.
133
Idem.
134
Entrevista com a assistente técnica do DIBVERSIDADE, Diana Manhiça realizada no dia 11 de Dezembro em Maputo através da plataforma Zoom.
135
Entrevista com a representante da Delegação da União Europeia em Moçambique para assuntos culturais, Filipa Corte Real, realizada em Maputo no dia 30 de
Setembro de 2022.

56
Quatro (4) projectos aprovados desistiram por conta de dificuldades de reunir a
documentação exigida para a assinatura do contrato de subvenção. Um dos documentos que é
considerado como calcanhar de Aquiles pelos desistentes é a Certidão de Quitação das Finanças
que segundo eles o processo da sua emissão pelas Finanças tem sido moroso, dificultando o
cumprimento dos prazos estabelecidos pelo financiador.
A distribuição dos projectos ao nível do país revela-se desigual. Mais de metade dos
projectos (15) subvencionados estão baseados em Maputo, seguido de Inhambane com cinco (5)
iniciativas, Nampula com três (3) projectos, Cabo-Delgado com dois (2), Tete e Niassa com uma
iniciativa cada.
De acordo com o Director do Instituto Camões em Maputo, a distribuição de projectos
pode ser explicado pela desenvoltura e dinamismo do sector cultural e criativo em Maputo,
quando comparado com as outras províncias. Aliás, por ser a capital política e económica do
país, Maputo alberga maior cluster criativo136 que dada a sua proximidade permite a cooperação
e desenvolvimento de talentos e projectos culturais e criativos, contribuindo para a atração e
retenção de talentos vindos de outras províncias, e de outros países.
Essa desigualdade também abre outra hipótese que se prende com o acesso desigual de
informação. O edital do DIVERSIDADE foi difundido com recurso a várias plataformas de
comunicação como websites, redes sociais, incluindo reuniões, porém, um número ínfimo da
população moçambicana tem acesso a internet, onde os grandes centros urbanos concentram
maior número de utilizadores de internet e com a população maioritariamente estudada. Dados
do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que, de uma população de um puco mais de
vinte quatro milhões de habitantes que Moçambique possui, apenas 6.6% tem acesso a internet, e
maior parte dessa população (1 260 809 habitantes) vive em centros urbanos137.
A assistente técnica do DIVERSIDADE corroborou com a possibilidade ter havido
acesso desigual à informação por parte das outras províncias, considerando a limitação de
divulgação do Camões enquanto gestor do programa nas províncias onde não está presente em
Moçambique

136
De acordo com Poter (1980) apud Brasil, Fundação Serralves (2008) Estudo Macroeconómico –
Desenvolvimento de um cluster da indústria criativa na região do Norte, p. 40, cluster criativo é a concentração
geográfica das empresas interconectadas, fornecedores especializados, prestadores de serviços, instituições e
empresas associadas em indústrias relacionadas.
137
Moçambique, Instituto Nacional de Estatística (2017) População por uso de internet nos últimos três meses.

57
No que concerne aos sectores das indústrias culturais e criativos nas quais os projectos
estão inseridos, encontramos a música, teatro, dança, artesanato, eventos culturais, cinema, corte
e costura atrelado a indústria do design de moda, produção de programas radiofónicos inserido
no sector da rádio, turismo cultural, reabilitação de equipamento de apoio à produção e consumo
cultural, e investigação cultural.

3.2. Relação entre a gestão do programa DIVERSIDADE e dos projectos subvencionados


Esta secção apresenta e analisa a relação entre a gestão do DIVERSIDADE e dos
projectos subvencionados em Moçambique. A relação foi descrita pelas duas partes envolvidas
(gestão do DIVERSIDADE e dos projectos subvencionados) e analisada dentro do quadro
teórico das relações internacionais.
As relações que se desenvolvem entre os parceiros de cooperação internacional para o
desenvolvimento e os beneficiários dos programas tem sido marcadas por uma heterogeneidade.
De modo geral, os gestores dos projectos subvencionados consideram haver de
complementaridade entre eles e a gestão do DIVERSIDADE. Dos 10 entrevistados, 80%
afirmaram existir uma relação de complementaridade que, para além da colaboração no sentido
de permitir a observância dos princípios de gestão, comunicação e visibilidade da União
Europeia e dos outros co-financiadores, e a materialização das suas iniciativas por meio do
financiamento concedido, possibilitou uma aprendizagem recíproca.
A partir das experiências que tiverem na relação com a gestão do DIVERSIDADE, os
gestores dos projectos subvencionados desenvolveram e fortaleceram as suas capacidades de
domínio do processo de gestão de fundos provenientes de doadores internacionais e de gestão de
projectos. Para Hélio Nguane138, coordenador do projecto Rádio Diversidade, em implementação
em Maputo, a relação entre a gestão do Diversidade e eles é humanista, pois, a comunicação
constante com a assistência do DIVERSIDADE permitiu detectar possíveis desvios e encetar
accões correctivas em momento oportuno.
Não obstante, a apreciação positiva das relações entre o DIVERSIDADE e os
beneficiários acima mencionada, dois gestores dos projectos subvencionados (correspondente a
20% dos entrevistados) admitiram ter tido uma relação menos amigável. O excesso de

138
Entrevista realizada em Maputo no dia 19 de Outubro de 2022.

58
procedimentos e da documentação exigida para assinatura de contratos de subvenção, associada
ao facto de a assistência do programa não ter conseguido comunicar numa única vez todos
documentos e procedimentos necessários, é tido pelos entrevistados como a que contribuiu para
uma relação pouco amigável. Amina Cássimo139 da Associação dos Pequenos Empresários de
Hotelaria e Turismo da Ilha de Moçambique (APETUR), coordenadora de dois projectos, um de
2 000 euros e outro na categoria de 10 000 euros, disse que as exigências variavam em função do
montante de subvenção. A entrevistada considera ter havido excesso de exigências no projecto
dos 10 000 euros em relação ao de 2 000 euros. Na sua perspectiva, a relação tornou-se mais
azeda à medida que a documentação exigida lhe era comunicada parcialmente, quando, numa
única comunicação podia se alistar toda documentação e procedimentos necessários. Na
conversa, Amina Cássimo declarou:
(..) Pensamos em desistir, (…) meus colegas não querem saber mais nada do
DIVERSIDADE.
Todavia, tal como os outros, admite terem aprendido muito dessa interação, sentindo-se
capazes para a preparação de dossiers de candidaturas a outros financiamentos internacionais, e
de observarem os fundamentos de gestão aplicados aos projectos de género.
Bernardo Guiamba140, coordenador do projecto do Festival Raiz que visava sua
participação num programa de intercâmbio no estrangeiro, afirmou que a modalidade de
financiamento do DIVERSIDADE não era compatível com os projectos de intercâmbio
internacional, razão pela qual teve várias dificuldades para justificar a utilização dos fundos que
lhe foram atribuídos, estando, pelo menos até a data da realização da entrevista, com dívida para
fechar a conta do projecto. Outrossim, Guiamba argumentou que, graças a interação com a
equipa de assistência do programa, medidas foram encontradas para que pudessem acomodar os
projectos do género, o que permitiu que submetesse mais um projecto que, igualmente, foi
contemplado pelo financiamento.
Esse facto, não só mostra a abertura da gestão do DIVERSIDADE para poder aprender da
relação que mantem com os gestores dos projectos subvencionados, revela, à luz da teoria
construtivista, que é possível desenvolver uma relação de reciprocidade que considera os
interesses, valores e ideologias das partes. Ao ajustar a modalidade de funcionamento do

139
Entrevista realizada via chamada telefónica no dia 17 de Outubro.
140
Entrevista realizada em Maputo no dia 20 de Setembro de 2022.

59
DIVERSIDADE, acolhendo os interesses e ideias vindas de um coordenador do projecto
subvencionado, a assistência do programa confirma a essência da teoria construtivista de que “as
estruturas da política internacional são, fundamentalmente, sociais que influenciam os
governantes e condicionam os interesses, valores, ideologias e as perceções dos atores
internacionais”141.
Não obstante, a luz dos pressupostos teóricos de Gramsci, em particular do seu conceito
de hegemonia, quer parecer que a actuação da União Europeia visa manter a sua posição de
liderança e hegemonia, exercida por meio de consentimento intelectual, moral e cultural dos
profissionais culturais e criativos nacionais e das políticas do sector, sem necessariamente usar a
coerção142. Aliás, essa forma de actuação encontra eco na diplomacia cultural, que vale-se do
charme que a cultura e a criatividade possuem para a satisfação dos seus interesses que podem
estar além do plasmado nos programas de cooperação.
Em suma, constata-se uma relação co-construção entre a gestão do DIVERSIDADE e os
gestores dos projectos subvencionados, pois, esses últimos enquanto profissionais criativos
estiveram livre e com relativa autonomia de executarem os seus projectos tal como foram
planificados, sem nenhuma interferência do doador/financiador, desde que observassem os
princípios de comunicação e visibilidade acordados no início.
Aliás, conforme foi dito acima, quer a gestão do DIVERSIDADE, quer os gestores dos
projectos subvencionados aprenderam um do outro, o que lhes permitiu aprimorar as suas
estratégias e competências.
Por exemplo, a gestão do DIVERSIDADE percebeu a necessidade de adaptar o
mecanismo de subvenção para abarcar projectos de intercâmbio internacional, assim como a
necessidade de aprimorar os mecanismos e plataformas de divulgação, visando atingir uma boa
parte dos profissionais que se encontram fora de Maputo. Os gestores dos projectos
subvencionados ampliaram as suas competências de gestão administrativa e financeira dos
projectos do género, porém, ainda há mais que fazer nesse sentido.

141
MANCCINI (2016), op.cit., p. 8.
142
FARIA, Luiz Augusto Estrella, O valor do conceito de Hegemonia para as Relações Internacionais, Austral:
Revista Brasileira de Estratégia e Relações Internacionais, Jan-Jul, 2013, v. 2, no 3, p. 210.

60
3.3. Avaliação dos resultados dos projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE no
desenvolvimento do sector cultural e criativo em Moçambique
A presente secção analisa os resultados dos projectos subvencionados pelo
DIVERSIDADE e sua relação com o desenvolvimento do sector cultural e criativo em
Moçambique. Para melhor compreensão, primeiro, faz-se uma análise particular de alguns
projectos e por último uma análise global. A avaliação incide sobre a pertinência, resultados e
sustentabilidade dos resultados efectivamente alcançados.
A avaliação da pertinência foca na relevância dos projectos subvencionados face as
políticas e prioridades do sector. A avaliação dos resultados objectiva captar os diversos efeitos
que resultam da implementação dos projectos subvencionados. E a sustentabilidade analisa a
existência de capacidades, materiais e de know how, capazes de assegurar a continuidade dos
resultados e/ou do projecto.

3.3.1. Avaliação de alguns projectos subvencionados pelo DIVERSIDADE


Esta secção analisa 5 projectos correspondentes a 20% dos subvencionados. Para facilitar
o entendimento, privilegiou-se a organização da informação em fichas, conforme aparece a
seguir.

Tabela 2. Ficha de avaliação do projecto 1.


Título do projecto: programa Rádio Diversidade Montante alocado: 18 666,50 Euros
Responsável pela Sector das ICC Província de
implementação: Hélio Radio e Televisão, com impacto Implementação:
Nguane em todos sectores das ICC Maputo
Objectivo: contribuir para o desenvolvimento do jornalismo cultural na base da tecnologia
digital, para a promoção do trabalho de jovens artistas de zonas periféricas do sul de
Moçambique, em particular, as mulheres, ao mesmo tempo contribuindo para a formação de mais
jornalistas culturais
Pertinência do projecto face às políticas e prioridades do sector
A aposta na produção de conteúdos para o ambiente digital é estratégico e oportuno, pois, nos
últimos dias, o digital vem conquistando espaço ao nível mundial, impactando na forma de
produção, distribuição e consumo de produtos culturais e criativos, colocando em risco de
insustentabilidade o analógico. Moçambique está numa fase transição do analógico para o digital
sobretudo na área da televisão e rádio. Por isso, o projecto é de extrema importância para o
contexto da digitalização que o país atravessa, vislumbrando-se oportunidades de, facilmente,
conseguir-se parcerias com empresas de media e distribuição de conteúdos em formato digital.

61
O projecto Radio Diversidade ao focar no desenvolvimento do jornalismo cultural e promoção de
iniciativas culturais e criativas enquadra-se na componente de pesquisa e divulgação, uma das
prioridades da Política das Indústrias Culturais e Criativas. Está, igualmente, alinhado com a
alínea e) do III Objetcivo Estratégico do Plano Quinquenal do Governo 2020-2024, que no
domínio da cultura se propôs a “promover a pesquisa, a preservação, valorização e divulgação do
património cultural material e imaterial moçambicano”. Neste contexto, o projecto é pertinente,
pois, está alinhado com as prioridades políticas do sector, estando a contribuir significativamente
para divulgação e promoção de projectos culturais e criativas, incluindo seus profissionais.
Avaliação dos resultados
Com a legalização e criação de condições técnicas para o trabalho, foram promovidos 5 postos de
trabalho fixos. O projecto está, igualmente, a fornecer estágios aos estudantes dos cursos de
comunicação e cinema, estando actulmente com 5 estagiários, sendo 4 da Escola de Comunicação
e Artes da UEM e um do Instituto Superior de Artes e Cultura. Recentemente, o projecto assinou
um memorando de entendimento com a Escola Nacional de Jornalismo através do qual passará a
receber estudantes dessa escola para o estágio. Os estagiários são assessorado em matéria de
produção de conteúdos com maior enfoque na área cultural e criativa, sendo que os ganhos são
animadores, pois, maior parte dos abrangidos conseguem se inserir facilmente no mercado
profissional após o término do estágio.
No âmbito do projecto foram criadas três rubricas nomeadamente, “Conversas ao meio dia”,
“Artista do bairro” e “Mulheres que fazem” que estão a dar um impulso na divulgação das
diversas actividades e dos profissionais culturais e criativos. Desde o início da implementação em
2021, o projecto entrevistou mais de 50 artistas, sendo 25 mulheres empreendedoras no sector
cultural e criativo através da sua rubrica “Mulheres que fazem”, produzindo conteúdos em três
formatos, escrito, podcast e vídeos que são passados através das plataformas digitais do Mbenga
Artes Reflexões que inclui um blogue e um canal de You Tube. Os conteúdos produzidos nas três
rubricas são igualmente passadas na Rádio Cidade, Televisão de Moçambique, e pelo streaming
através de um acordo com a Modigi (Moçambique digital), uma empresa detida pela Khuzula
(editora e organizadora do Festival Azgo), especializada na publicação e distribuição de
conteúdos digitais em plataformas de streaming, permitindo que os conteúdos ganhem um
alcance mundial através de canais como Spotify, Soundcloud, Boomplay e Serinus, esta última,
genuinamente moçambicana vocacionada a disponibilização de conteúdos áudio e chat.
Sustentabilidade
O financiamento concedido no âmbito do DIVERSIDADE permitiu a estruturação legal do
projecto, passando a funcionar dentro das normas estatutárias que regem as empresas de direito
privado em Moçambique, um ganho importante para o desenvolvimento da actividade. Ademais,
os fundos do DIVERSIDADE fortaleceram grandemente o projecto em termos de equipamento
de trabalho, possibilitando que a equipa do projecto continue a fazer o seu trabalho com
profissionalismo.
O coordenador do projecto, Hélio Nguane, assegurou terem sido criadas condições legais e
técnicas capazes de assegurar a continuidade das suas actividades mesmo depois do fim da

62
subvenção. Acrescentou terem conseguido fechar parcerias estratégicas suficientes para o
desenvolvimento do projecto, destacando a parceria com X-Hub, um projecto ambicioso da
Khuzula Produções, com a RTP – África, Rádio Cidade para produção de programas
radiofónicos, sendo ganhos suficientes para assegurar a sustentabilidade dos resultados e do
projecto.
Fonte: autor do trabalho com base nos dados da pesquisa

Tabela 3: Ficha de avaliação do projecto 2.


Título do projecto: Empty Room – Residências virtuais Montante atribuído: 9 945 Euros
Responsável pela Sector de ICC Província de implementação:
implementação: Tina Krueger Diversos Maputo
Objectivo: promover residências artísticas virtuais para desenvolver competências, colaboração e
produção interdisciplinar, e internacional, de artistas, contribuindo para o aumento da difusão das
obras, com impacto na renda dos artistas e formadores participantes, reforçando a identidade do
sector e da dinâmica de colaboração internacional.
Pertinência
A questão da colaboração artística ao nível nacional e internacional, principal objectivo do Empty
Room responde aos desafios levantados no âmbito da Política das Indústrias Culturais e Criativas
e Estratégia da sua Implementação e do Plano Estratégico da Cultura 2012-2022, referentes à
ausência de bons mecanismo para a realização de parcerias entre ONGs e associações da
sociedade civil, falta de cooperação entre entidades públicas e privadas e da profissionalização
dos intervenientes. Outrossim, o projecto está alinhado com o Plano Quinquenal do Governo que
na alínea d) do III Objectivo Estratégico, no domínio da cultura propôs-se a “promover
intercâmbios e troca de experiências entre artistas e grupos culturais a nível nacional e
internacional”.
Assim, o projecto complementa os esforços em curso do governo e seus parceiros nacionais e
internacionais de contribuir para uma maior colaboração entre artistas e sua profissionalização
através de intercâmbio e troca de experiências.
Avaliação dos resultados
O projecto teve impacto na criação de empregos no sector, tendo sido contratados 5 mentores
nacionais que conduziram sessões de mentorias a 8 artistas de 7 países (Nigéria, Egipto, Brasil,
Alemanha, Tailândia, Irão e India). A gestão de projecto esteve a cargo de três profissionais
criativos, sendo dois nacionais (David Aguacheiro, Avelino Assumane) e uma alemã, Tina
Krueger, casada com um nacional. No total, foram criados 18 postos de trabalho. Todavia, apenas
três são fixos e os restantes foram precários.
Os 8 artistas de diferentes disciplinas artísticas, agrupados em dois e acompanhados por um
artista mentor, foram desafiados a desenvolver, no espaço virtual, um trabalho artístico comum
que refletisse sobre o conceito de natureza. Os grupos desenvolveram vários trabalhos de vídeo
arte que se encontram expostos no ambiente virtual, num website criado no âmbito do projecto.
De acordo com os gestores do projecto143, os trabalhos são vistos por curadores, produtores e
apreciadores de todo globo, permitindo maior promoção e divulgação dos artistas e seus

143
Entrevista realizada via chamada telefónica com Aguacheiro e Tina Kueguer no dia 16 de Novembro.

63
trabalhos, ao mesmo tempo que lhes abre espaço para oportunidades de trabalho e colaboração.
Aliás, mesmo sem avançar números, os gestores do projecto afirmaram que os artistas dizem
estarem a receberem solicitações para trabalho e colaborações por parte de pessoas que viram os
seus trabalhos a partir do website, o que realça o impacto do projecto para o desenvolvimento
cultural e criativo e, em particular das carreiras dos artistas envolvidos.
Um dado que julga-se menos positivo tem a ver com o fatco de, dos oitos artistas selecionados,
não haver nenhum artista moçambicano.
Sustentabilidade
Antes de mais, importa referir que, o projecto já vinha sendo desenvolvido por seus mentores,
bem antes de receber o apoio financeiro do DIVERSIDADE, tendo iniciado em 2019. Todavia,
David Aguacheiro reconheceu o impulso que o apoio do DIVERSIDADE veio dar ao projecto, ao
permitir a contractação dos mentores e subsidiar os artistas, elementos que conferiram maior
dinâmica e credibilidade ao projecto.
Em termos de sustentabilidade, Tina Krueger e Aguacheiro dizem que, o projecto não gerou
receitas suficientes de manter os resultados gerados. Porém, ampliou a motivação dos mentores
em dar continuidade tendo em conta o feedback que vem recebendo de vários estratos sociais de
diversas partes do mundo. Aliás, os gestores afirmam que estão a receber solicitações de vários
artistas internacionais que desejam vir a Moçambique para participar das residências artísticas
inseridas no âmbito do projecto, o que lhes encoraja a dar continuidade com projecto.
Para o efeito, David Aguacheiro e Tina Krueger dizem ter adquirido, com fundos próprios, uma
parcela de terra em Marracuene, onde estão construir casas, onde podem acolher artistas de vários
cantos do mundo para colaboração e co-criação artísticas. Na mesma parcela também
desenvolvem uma agricultura orgânica, plantando um pouco de tudo, com destaque para frutas,
milho e vegetais que poderão servir de alimentação para os artistas em residência.
Não obstante, os gestores do projecto dizem que, na sua relação com a equipa de gestão do
DIVERSIDADE, apreenderam e aprimoram certas habilidades que lhes será útil para os próximos
projectos e na sua vida profissional.
Fonte: autor do trabalho com base nos dados da pesquisa

Tabela 4: Ficha de avaliação do projecto 3.


Título do projecto: Galeria Timbila Montante atribuído: 9 992,94
Euros
Responsável pela implementação: Sector das ICC: Província de Implementação
Associação Positivo Moçambique Música Inhambane
Objectivo do projecto:
Promover a divulgação e comercialização da Timbila de modo a alcançar mercados
internacionais, beneficiando os músicos e o turismo cultural local, contribuindo para o
desenvolvimento social e económico da comunidade de Zavala através da criação de website,
produção de um documentário sobre festival M'saho e gravação de vídeos promocionais de
grupos de timbila de Zavala.
Pertinência do projecto
Timbila foi proclamada Património Cultural de Humanidade em 2008 pela UNESCO, sendo a
sua preservação e promoção de interesse do Governo, quanto das comunidades praticantes. Por
isso, o projecto está de acordo com as prioridades políticas nacionais, conforme a indicação dada
através do ponto 1.7. referente as “Áreas Prioritárias” cuja alínea a) aponta a “Pesquisa e
64
Divulgação” como uma das prioridades do desenvolvimento no âmbito da Política das Indústrias
Culturais e Criativas e Estratégia da sua Implementação, e do III Objectivo Estratégico do Plano
Quinquenal do Governo 2020-2024 que, também, propõe para o campo da cultura, na alínea e), a
promoção da pesquisa, a preservação, valorização e divulgação do património cultural material e
imaterial moçambicano.
A produção do filme e gravação de músicas de grupos executantes de timbila que vivem em
zonas onde há carência de oportunidades do género, como o distrito de Zavala, incluindo a sua
colocação em um website, plataforma de comunicação e divulgação de alcance global, é sem
dúvida, uma excelente contribuição para a preservação, promoção e divulgação da Timbila e da
cultura Cope.
Analise dos resultados
No âmbito do projecto foram gravados 7 vídeos de igual número de grupos executantes da
Timbila. Cada grupo era composto por cerca de 15 timbaleiros, totalizando 105 pessoas. Consta
que, cada grupo recebeu um subsídio que foi repartido pelos integrantes do mesmo.
Adicionalmente, cerca de 15 pessoas que estiveram na gestão do projecto também recebido
subsídios.
Um documentário foi gravado, estando a ser usado para divulgar o património timbaleiro do
distrito de Zavala além fronteira.
Os resultados desse projecto foram modestos, não tendo permitido criar postos trabalho dignos de
realce. Um dos ganhos que merece destaque é a criação website que serve como plataforma para
uma maior promoção da Timbila e da cultura Cope ao nível mundial. Todavia, até ao memento
da realização do estudo, era antes do website iniciar a funcionar.
Sustentabilidade
Em entrevista, Horácio Mbande144, coordenador do projecto, disse haver um plano de, em cada
venda de timbila a ser exposto no website, deduzir-se uma percentagem que será usada para
assegurar a manutenção da plataforma.
Todavia, é apenas um plano que depende da entrada em funcionamento do website e da venda de
Timbila. Mediante esses dados, a sustentabilidade do projecto revela-se desafiadora e
improvável.
Fonte: autor do trabalho com base nos dados da pesquisa

Tabela 5: Ficha de avaliação do projecto 4.


Título do projecto: Criação do site da APETUR Montante alocado: 9 892,00 Euros
Responsável de implementação: Sector das ICC Província de implementação:
Associação dos Pequenos Turismo cultural Nampula – Ilha de Moçambique
Empresários de Hotelaria e
Turismo da Ilha de Moçambique
(APETUR)
Objectivo do projecto
Através do website, o projecto propõe dar a conhecer o trabalho desenvolvido pela APETUR
por forma a promover o turismo cultural da região em benefício das comunidades locais.
Pertinência

144
Entrevista realizada via chamada telefónica no dia 28 de Setembro de 2022.

65
O turismo é uma actividade que cresce vertiginosamente ao nível mundial. A Ilha de
Moçambique, local onde o projecto está localizado, por ter sido a primeira capital de
Moçambique e servido de ponto de entrada e, consequentemente influência de várias culturas é
sem dúvida um recurso valioso para o turismo. Ademais, a Ilha de Moçambique foi declarada
Património Cultural Mundial, pela UNESCO, em 1991, sendo por isso, um destino turístico por
excelência, graças ao seu rico e diverso património cultural material e imaterial, ocupando por
isso a 2ª posição das áreas prioritárias de investimento para o desenvolvimento do turismo145. Por
isso, o projecto de criação de webiste, plataforma eletrónica de acesso global, através da qual se
propõe promover o trabalho desenvolvido por diversos intervenientes da cadeia de valor do
turismo, assim como das potencialidades turística da Ilha de Moçambique é de extrema
relevância por estar a concorrer para a materialização dos objectivos e prioridades políticas do
país, e responder aos anseios das comunidades abrangidas pelo projecto.
Ao focar no turismo cultural, o projecto responde a uma das prioridades da Política das Indústrias
Culturais e Criativas que tem a ver com o “Desenvolvimento do Turismo Cultural”.
Avaliação dos resultados
Um dos principais resultados do projecto foi a criação do website, plataforma de promoção das
actividades desenvolvidas pelos vários intervenientes do sector do turismo. O website impulsiona
a promoção e divulgação dos trabalhos de 40 sócios da APETUR, 50 grupos culturais locais,
maioritariamente constituídas por mulheres praticantes de diversas danças típicas daquela zona.
Com a promoção e divulgação dos trabalhos dos intervenientes na cadeia de valor do turismo na
Ilha de Moçambique, amplia-se as oportunidades de trabalho quer ao nível local com a vinda de
turistas e visitantes, como também fora da província e do país, uma vez que, o webiste permite
promover os seus trabalhos ao nível global.
No que toca a geração de emprego, foi contractado um consultor que foi responsável pela criação
do website. Os 40 sócios e os 50 grupos locais receberem subsídios no âmbito do projecto. O
desafio tem a ver com a manutenção desses subsídios, uma vez que, o projecto não gera receitas
directas.
Sustentabilidade
De acordo uma Amina Cássimo, a sustentabilidade do website será assegurada através das quotas
dos sócios da associação e de doações de alguns empreendedores locais. Esse mecanismo revela-
se desafiador, considerando a fraca cultura de quotização por parte de vários grupos profissionais,
o que pode colocar em causa a sustentabilidade da plataforma, não obstante a sua importância.
Fonte: autor do trabalho com base nos dados da pesquisa

145
Moçambique, Ministério da Cultura e Turismo, Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Turismo em
Moçambique 2015 – 2025, p. 18.

66
Tabela 6. Ficha de avaliação do projecto 5.
Título do projecto: Máquinas de fabricar sonhos Montante alocado: 2 000,00 Euros
Responsável pela implementação: Sector das ICC Província de Implementação:
Associação dos Pequenos Empresários de Moda Nampula – Ilha de Moçambique
Hotelaria e Turismo da Ilha de Moçambique
Objectivo do projecto: fortalecer e capacitar os grupos culturais locais constituídos por mulheres,
oferecendo-lhes máquinas de costura para produção de artigos de moda, visando equipar os próprios
grupos e para o comércio.
Pertinência
Não obstante os múltiplos esforços do Governo e de seus parceiros nacionais e internacionais na
adoção de políticas e de outras iniciativas que visam a igualdade de oportunidades entre homens e
mulheres, as estatísticas sobre a situação de homem e mulher produzidas pelo Instituto Nacional de
Estatísticas em 2017, mostram que ainda existe um desequilíbrio na participação de homens e
mulheres nas actividades económicas, sendo as mulheres as que menos participam, sobretudo as
vivem nas zonas rurais. Esse cenário revela que, o empoderamento da mulher ainda está e deve estar
nas prioridades do desenvolvimento do país de forma integral. Por isso, o projecto tem foco no
empoderamento da mulher, visando sua maior participação nas actividades geradoras de rendimento
através do sector cultural e criativo, considerado estratégico por favorecer a inclusão social das
minorias desfavorecidas.
Aliás, o projecto respondeu, de forma holística, o problema dos grupos culturais da Ilha de
Moçambique, pois, por um lado, com as máquinas e capacitação em corte e costura que receberem
no âmbito do projecto, vão produzir indumentária para equipar os próprios grupos e assegurar
melhor aparição em suas performances, e por outro, produzir artigos de moda para venda de modo a
assegurar a sua inserção nas actividades geradoras de rendimento, em linha com o Eixo Estratégico
5, referente aos “Recursos produtivos e emprego” da Política de Género e Estratégia da sua
Implementação146.
Avaliação dos resultados
O projecto beneficiou, de forma directa, 14 mulheres pertencentes a 7 grupos, sendo 2 duas para
cada grupo. As 14 pessoas foram capacitas em matéria de corte e costura e receberam máquinas de
costura. Considerando que as 14 mulheres que beneficiaram directamente do projecto fazem parte de
7 grupos culturais compostos por 25 a 50 pessoas cada, é de se assumir que o projecto beneficiou,
indirectamente a mais de 175 mulheres.
Os resultados são modestos, porém, havendo vontade e visão por parte da gestão do projecto, tem
capacidade de aumentar a sua grandeza ou seu impacto, capacitando os outros membros do grupo e,
com o tempo e com as vendas dos artigos a serem produzidos, aumentar a capacidade de produção
através da aquisição de mais máquinas.
Sustentabilidade
A avaliação da sustentabilidade do presente projecto é desafiador, uma vez que, os seus resultados
recaíram sobre outras pessoa e não da equipa que conduziu o mesmo. Porém, a avaliar pelos
resultados alcançados, é de se considerar que o projecto é sustentável, pois ofereceu capacidades e
equipamento para produção de artigos de moda, o que permite assegurar a continuidade e
multiplicação dos benefícios e dos beneficiários, embora não seja automático, requerendo vontade,
visão e acompanhamento.
Fonte: autor do trabalho com base nos dados da pesquisa

146
MOÇAMBIQUE (2018), Política de Género e Estratégia da sua Implementação.

67
Depois da avaliação de alguns projectos financiados pelo DIVERSIDADE, a secção que
se segue faz uma avaliação global do programa DIVERSIDADE, com base nos resultados
obtidos e sua relação com o desenvolvimento do sector cultural e criativo, com maior enfoque na
criação de empregos em Moçambique.

68
3.3.2. Programa DIVERSIDADE e sua relação no desenvolvimento do sector cultural e
criativo em Moçambique
A presente secção faz uma avaliação da relação entre o DIVERSIDADE e o
desenvolvimento do sector cultural e criativo, com destaque para a criação de emprego.
O Diversidade é uma actividade do PROCULTURA que consiste no financiamento de
pequenos projectos e iniciativas que contribuam para a diversidade cultural, cidadania e
identidade, com objectivo de: i) criar emprego adicional e duradouro nos sectores culturais e, ao
mesmo tempo; e ii) reforçar a diversidade cultural e a cidadania através da cultura como valores
sociais147.
Pela publicitação que teve durante o lançamento do programa mãe, o PROCULTURA,
com um orçamento consideravelmente bom, para um contexto de escassez de recursos, mostrou-
se promissor para o desenvolvimento do sector cultural e criativo nos PALOP-TL, Moçambique
em particular. O programa avivou as espectativas dos profissionais culturais e criativos que via
nele oportunidade de materialização dos seus projectos e iniciativas, ao mesmo tempo que o
governo também se mostrava tão optimista no desenvolvimento das indústrias culturais e
criativas nacionais.
A pesquisa revela que o programa DIVERSIDADE teve resultados modestos no
desenvolvimento do sector cultural e criativo nacional, sobretudo no que toca à criação de
empregos duradouro. O programa foi capaz de permitir a materialização de algumas iniciativas
em diversos sectores das indústrias culturais e criativas, com destaque para cinema, música,
artesanato, teatro, investigação cultural, rádio, turismo cultural, eventos culturais, entre ouros.
Todos gestores dos projectos financiados pelo DIVERSIDADE, entrevistados no âmbito da
presente pesquisa (10 gestores), reconheceram o contributo do programa para a materialização
das suas iniciativas e maior parte deles mostraram-se satisfeitos com o mesmo.
Os resultados dos projectos subvencionados tiveram um teor cultural, tendo contribuído
para a promoção da diversidade cultural e da cidadania através da capacitação dos profissionais
quer por via de acções de formações dinamizadas por diversos projectos, quer pela interação com
a gestão do DIVERSIDADE que, conforme os gestores entrevistados, tiveram uma relação que
permitiu aprender e solidificar as suas experiências de lidar com projectos do género. Um total
de quatro (4) projectos desenvolveram acções de capacitação e formação, sendo uma formação

147
Convite e regulamente do DIBVERSIDADE, op.cit.

69
em corte e costura realizada na Ilha de Moçambique pela APETUR no âmbito do projecto
“Maquinas de fabricar sonhos”, beneficiando 14 mulheres. Um workshop em gestão associativa e
planeamento estratégico realizada na cidade de Maputo pela Associação Cultural Warethwa no
âmbito do projecto “Legalização e fortalecimento da Federação das Associações Culturais de
Moçambique (FACUM) ”, beneficiando 13 pessoas, sendo 4 mulheres. As 13 pessoas
beneficiárias da formação em gestão associativa e planeamento estratégico são representantes de
igual número de associações culturais sediadas na cidade de Maputo. Destaca-se também a
formação/mentoria em videografia, fotografia e design gráfico realizada em formato virtual em
Maputo no âmbito do projecto “Empty Room – Residência virtuais interdisciplinares”, tendo
beneficiado 8 artistas de 7 países (Nigéria, Egipto, Brasil, Alemanha, Tailândia, Irão e India).
Consta também uma formação em artes circenses para eventos infantis, porém não foi possível
aferir o número de beneficiários por conta da dificuldade de ter acesso ao contacto do gestor do
projecto. No geral, foram 35 agentes das indústrias culturais e criativas que beneficiaram de
formação/capacitação no âmbito dos projectos financiados pelo DIVERSIDADE, dos quais 18
são mulheres e 8 artistas não moçambicanos.
A formação/capacitação nos vários domínios das indústrias culturais e criativas é de
extrema importância por contribuir para o reforço da capacidade criativa e de gestão que, em
muitos relatórios citados anteriormente, é considerada fraca. Ademais, é um resultado que possui
um impacto de longo prazo e com possibilidade de efeito multiplicador ao nível das associações
onde a maior parte dos beneficiários fazem parte e não só. O facto de a maior parte dos
beneficiários ter sido constituído por mulheres faz jus a ideia segundo a qual as actividades
culturais e criativas promovem a geração de emprego ao mesmo tempo que promove a inclusão
social148, sobretudo de grupos minoritários não absorvidos pela economia formal, tal como
acontece com algumas mulheres que se dedicam à produção e venda de artesanato, corte e
costura e não só.
Outrossim, os resultados mostram que o DIVERSIDADE contribuiu para estruturação de
empresas e associações culturais e criativas, pois alguns fundos foram usados para suportarem os
encargos de legalização e registo (pelo menos três projectos tinham a componente de legalização
que inclui o registo, publicação de estatutos no Boletim da República-BR e elaboração de
instrumentos de gestão como regulamentos e planos estratégicos), elementos fundamentais para a

148
NAÇÕES UNIDAS (2010), op.cit., p. 10.

70
formalização e estruturação dos profissionais do sector, passando a serem reconhecidos pelas
entidades governamentais ao mesmo tempo que podem gozar dos seus direitos e deveres
enquanto entidades culturais legais. A formalização é também um dos requisitos bastante
exigidos nos processos de mobilização de recursos, realçando assim a importância que a
subvenção teve na estruturação e desenvolvimento pelo menos dos projectos subvencionados.
Ademais, alguns gestores conseguiram criar condições de trabalho, adquirindo equipamento
necessário para melhor desempenho das suas actividades, tal como é o caso do projecto Rádio
DIVERSIDADE que, segundo Hélio Nguane, compraram máquina fotográfica, gravadores e
computadores.
Um número considerável de beneficiários (7 projectos) do DIVERSIDADE criou
plataformas online (websites) para melhor divulgação e promoção dos seus trabalhos, facto que
poderá facilitar a visibilidade das associações e dos seus trabalhos, quiçá oportunidades de
trabalho, podendo destacar a criação do website da FACUM (http://facum.org.mz/public/), do
Empty Room (https://emptyroom.art/), da Associação cultural Converge+
(https://convergemais.org), Booking & Bandas (https://bookingsbandas.com/).
Consta ainda dos resultados do DIVERSIDADE, o apoio à produção de festivais, com
destaque para o Festival do Teatro da Rua produzido pela Associação Cultural Makwero em
espaços não convencionais para apresentações teatrais, uma espécie de democratização do acesso
ao teatro aos residentes dos bairros periféricos da cidade de Maputo, onde não existe salas e nem
prática de apresentações teatrais.
No que toca à criação e promoção de empregos, os projectos financiados pelo
DIVERSIDADE, pelo menos os 10 analisados no âmbito do trabalho, promoveram 290 postos
de empregos a igual número de profissionais culturais criativos que tiveram algum subsídio dos
fundos alocados aos projectos. Desse número, apenas 31 postos ocupadas pelos responsáveis
pela gestão dos projectos demostraram capacidade de possível sustentabilidade. Aliás, maior
parte desses projectos já existiam antes do DIVERSIDADE, tendo apenas ganhado alguma
dinâmica com a subvenção atribuída.
Todavia, a distribuição dos projectos pelo país mostra-se desigual. Maior parte dos
projectos subvencionados foram implementados em Maputo, Inhambane, Nampula e Cabo de
Delgado e Niassa, sendo que as restantes províncias não tiveram nenhum projecto, colocando-se

71
em questão a ideia do desenvolvimento das indústrias culturais e criativas nacionais, a favor do
desenvolvimento de sector cultural provinciano, com Maputo sempre a sair vantajoso.
De modo geral, existe uma relação causal entre os resultados dos projectos
subvencionados pelo DIVERSIDADE e o desenvolvimento do sector cultural e criativo
moçambicano, pese embora modesta. Conforme descrito acima, o programa DIVERSIDADE
impulsionou de certa forma o sector cultural criativo ao permitir que os profissionais criativos
pudessem transformar as suas ideias em realidade, contribuindo para a promoção da diversidade
cultural e manutenção de iniciativas culturais. Todos entrevistados foram unanimes em
reconhecer o contributo do programa na materialização das suas iniciativas, não obstante,
afirmarem que os montantes de subvenção previstos e atribuídos não permitem criar e gerar
empregos sustentáveis, por serem financiamentos pequenos e de pouca duração.
Os fundos internacionais como o PROCULTURA, onde o DIVERSIDADE é parte
integrante, constituem complemento aos parcos recursos nacionais na dinamização da acção
cultural e criativa do país que, não obstante os vários desafios que se colocam, se mostra
dinâmico e em franco crescimento.

72
CAPÍTULO 4. CONCLUSÕES
As indagações que moveram a realização do estudo têm a ver com a relação entre
cooperação internacional e o desenvolvimento dos países beneficiários. O estudo constitui uma
contribuição no rol dos debates sobre cooperação internacional e desenvolvimento, em particular
do sector cultural e criativo. Reforça a importância do estudo o facto de haver pesquisas que
denunciam que a cooperação internacional para o desenvolvimento é um mecanismo usado pelos
países desenvolvidos de, de uma forma subtil e suave, manter a sua hegemonia sobre os países
em desenvolvimento perante um sistema de relações internacionais marcado por assimetria e
anarquia que procura a todo custo reduzir o espaço político e fragilizar as instituições locais149.
O estudo focalizou nos programas de cooperação internacional no domínio da cultura e
da criatividade e sua relação com o desenvolvimento do sector na esfera nacional. Para o efeito,
foi necessário fazer uma breve incursão sobre o lugar da cultura e da criatividade no quadro da
cooperação internacional para o desenvolvimento e na agenda política nacionais. Outrossim, foi
necessário visitar o programa PROCULTURA, donde nasce o DIVERSIDADE tendo como
objetctivo contextualizar o seu surgimento, objectivos, projectos financiamentos e sua relação
com o desenvolvimento das indústrias culturais e criativas.
Os resultados da pesquisa mostram que a definição do PROCULTURA, onde o
DIVERSIDADE é parte foi antecedida por um estudo de base realizado em cada um dos países
envolvidos cujo objectivo era fazer um diagnóstico da situação do sector, visando permitir a
definição de prioridades do desenvolvimento através da colaboração entre os parceiros de
cooperação internacional e os actores locais. Em Moçambique, o estudo foi realizado por uma
consultora espanhola que, não obstante conhecer a metodologia de realização de estudos de
género, é considerada desconhecedora do contexto e das características reais do sector cultural e
criativo moçambicano. David Aguacheiro e Tina Kruger, gestores do projecto “Empty Room”
denunciaram, durante a entrevista, terem sido exigidos um documento que, no ordenamento
nacional, não existe durante o processo de execução dos fundos alocados para o projecto pela
gestão do DIVERSIDADE.
A situação acima demostra a prevalência da teoria de modernização, sobretudo do
modelo tradicional de cooperação na qual os métodos e procedimentos de cooperação são
definidos sob maior influência dos doadores.

149
CASTEL-BRANCO (2017), op.cit.; e NIPASSA (2009), op.cit.

73
Contudo, o PROCULTURA e o DIVERSIDADE em especial estão alinhados com as
políticas e prioridades do desenvolvimento do sector cultural e criativo local, assim como com a
visão e filosofia de actuação da União Europeia e seus países membros.
O Ministério da Cultura e Turismo tem pouco envolvimento na gestão do DIVERSIDE.
Sendo óbvias as razões do seu pouco envolvimento, seria desejável que delegasse uma
instituição da sociedade civil para representá-lo.
O programa DIVERSIDADE, através dos projectos subvencionados e implementados em
Moçambique, teve resultados modestos sobre o desenvolvimento das indústrias culturais e
criativas em Moçambique, sobretudo na criação de empregos duradouros. De forma-geral, com o
programa DIVERSIDADE, as indústrias culturais e criativas ganharam uma certa dinâmica, com
a realização de várias acções com destaque para capacitações/formações, legalização e
formalização de associações e empresas culturais e criativas, criação de plataformas de
divulgação, networking e busca de oportunidade de colaboração e trabalho por parte dos agentes
culturais e criativas.
O programa teve um contributo na promoção da inclusão social, sobretudo das mulheres
que, através dos projectos subvencionados, receberam formações e equipamentos para
desenvolveram actividades com capacidade de geração de rendimentos dentro do sector cultural
e criativo, pese embora em número reduzido.
A pesquisa deu ao autor a oportunidade de mergulhar no quadro epistemológico da
cooperação internacional para desenvolvimento. Depreende-se que os programas de cooperação
internacional para o desenvolvimento são de grande valia para o desenvolvimento do sector
cultural e criativo em qualquer parte do mundo, e em Moçambique em particular. Porém,
precisam serem desenvolvidos no espírito construtivista, onde os parceiros de cooperação
internacional e os actores locais são partícipe da definição e da gestão dos mesmos.
A continuidade dos programas de cooperação internacional para o desenvolvimento do
sector cultural e criativo é de extrema importância, em particular o DIVERSIDADE, havendo
necessidade de se adaptar aos desafios do processo.
Todavia, é necessário que os países beneficiários fortifiquem os seus mecanismos de
negociação com os parceiros de cooperação internacional para o desenvolvimento, por forma a
ampliar o envolvimento de actores locais na definição e gestão dos programas de cooperação
internacional virados para o sector cultural e criativo, sobretudo aqueles que actuam no sector.

74
Outrossim, é importante a realização de estudos sobre os programas de cooperação internacional
para o desenvolvimento virados para o domínio das indústrias culturais e criativas, assim como
de um debate público dos resultados desses estudos para maior escrutínio público e recolha de
subsídios que possam contribuir para melhor planificação e gestão dos mesmos.
Como explicado acima, o DIVERSIDADE, foco do estudo, é uma acção de um programa
maior, denominado PROCULTURA com várias actividades já realizadas e outras em curso,
impondo-se a necessidade de um estudo sobre o mesmo, visando debater as suas implicações no
desenvolvimento do sector cultural e criativo local. Ademais, existem outros programas de
cooperação internacional com foco no desenvolvimento do sector cultural e criativo em curso no
país que precisam ser estudados, com destaque para o projecto “construindo com a música” que
está sendo implementado pela cooperação italiana em parceria com o Ministério da Cultura e
Turismo.

75
5. Referências Bibliográficas
ADORNO, Theodor, Indústria Cultural e Sociedade: Tradução de Juba Elisabeth Levy et al.
(2002), Ed Paz e Terra, São Paulo.
ALVARENGA, Estelbina Miranda (2012). Metodologia de Investigação Qualitativa e
Quantitativa: Normas técnicas de apresentação de trabalhos científicos. Tradução de Cesar
Amarilhas, 2ª edição, Assunção, Paragaui.
AMIN, Samir (1976) Imperialismo e desenvolvimento desigual. Tradução de Eneida Araújo
(1987), São Paulo.
BASTOS, Mónica González (2016) Estudo das áreas temáticas no Domínio Prioritário 1 –
Criação de Emprego no âmbito do Programa Indicativo Plurianual da Cooperação PALOP e
Timor-Leste com a União Europeia (PALOPTL/UE).
BENDASSOLLI et al.. Indústrias Criativas: definição, limites e possibilidades. RAE, v. 4, n. 1,
jan/mar, 2009, São Paulo.
BORGES, Flavio Adriano & Da Silva, Alexandre Rodrigo Nashiwaki. O diário de pesquisa
como instrumento de acompanhamento da aprendizagem e de análise de implicação do
estudante/pesquisador, Interface (Batucatu), 2020, 190869, 24 páginas.
BRASIL, Fundação Serralves (2008) Estudo Macroeconómico – Desenvolvimento de um cluster
da indústria criativa na região do Norte
BUSSOTTI, Luca & GUNDANE, Reginaldo. Políticas Culturais em Moçambique entre
Identidade Nacional e Instâncias Locais (1975-2009), Realis, Jul-Dez, 2019, v.9, 27 páginas.
BUSSOTTI, Luca e NHAULEQUE, Laura António, Social movements in rural África: how and
why mozambican state closed the prosavana program, Routledge, 2022, DOI:
10.4324/9781003177371-7.
CASTEL-BRANCO, Carlos Nuno (2017) Crises económicas e estruturas de acumulação de
capital em Moçambique. Maputo: IESE.
CASTEL-BRANCO, Carlos Nuno. (2011). Dependência de Ajuda Externa, Acumulação e Ownership:
contribuição para um debate de economia política. In IESE. (2011). Cadernos do IESE no 7, Maputo.
CASTRO, Thales (2012) Teorias das relações internacionais, Fundação Alexandre de Gusmão,
Brasília.
CARONE, Iray, Industria Cultural e Industrias Culturais: alguns apontamentos, impulso, v. 23,
n. 57, mai.set. 2013, p. 9-17.

76
CLASSEN, Soyata Funada (2013) Análise do Discurso e dos Antecedentes do Programa
ProSAVANA em Moçambique –enfoque no papel do Japão.
DE ABREU, António Pinto, Financiamento à cultura: desafios e oportunidades. Conferência
Nacional da Cultura de 2009.
DE ASSIS, Renata Vieira (2021) Avaliação e eficácia das ONG: o projeto Cáritas Lusófonas em
Rede: inovar para o impacto”. Dissertação, Mestrado, Universidade Lisboa.
DE BEUKELAER, CHRISTIAAN. Toward an “African” take on the cultural and creative
industries? SAGE. Media, Culture & Society. 2017, Vol. 39(4) 582-591.
DE LIMA, LUCIANO BARBOSA. Teorias de desenvolvimento e cooperação internacional.
Jan/Jun, 2010, v. 8 n. 1. p. 73-90.
DE SANTOS, Elena Val (2011) Cooperación cultural para el desarrollo. Nuevo camino de la
Agencia Española de Cooperación Internacional para el Desarrollo ensu política hacia América
Latina. Cuadernos de Investigación. Universidad Complutense de Madrid, Facultad de Ciencias
Políticas y Sociología.
DUISENBERG, Edna dos Santos (2008) Economia Criativa: uma opção do desenvolvimento
viável? In REIS, Ana Carla Fonseca (2008) Economia Criativa como Estratégia de
Desenvolvimento: Uma Visão dos Países em Desenvolvimento. Itaú Cultural: São Pauto.
FARIA, Luiz Augusto Estrella, O valor do conceito de Hegemonia para as Relações Internacionais,
Austral: Revista Brasileira de Estratégia e Relações Internacionais, Jan-Jul, 2013, v. 2, no 3.
FARIA, Raquel (2011) A cooperação multilateral no âmbito da União Europeia: O caso
Português. Centro de Estudos sobre Africa e do Desenvolvimento (CEsA), Instituto Superior de
Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa. 2011. disponível
https://cesa.rc.iseg.ulisboa.pt/RePEc/cav/cavwpp/wp93.pdf. Consultado no dia 11/06/2021
FERNANDO, António Fernando (2013) Promoção cultural externa: uma análise da Companhia
Nacional de Canto e Dança de Moçambique, monografia, licenciatura, Instituto Superior de
Artes e Cultura.
GIL, António Carlos (2008) Métodos e Técnicas de Pesquisa Social, 6ª edição, Atlas, São Paulo.
HARTLEY, John (2005) Creative Industries. Blackwell Publishing.
KOVÁCS, Máté (2008) A economia criativa e a erradicação da pobreza na África: princípios e
realidades. In REIS, Ana Carla Fonseca (2008) Economia Criativa como Estratégia de
Desenvolvimento: Uma Visão dos Países em Desenvolvimento. Itaú Cultural: São Pauto.

77
JOFFE, Avril, The cultural and creative economy in Africa: challenges and innovations, Creative
Economy, 2013
LEITÃO, Simão Cardoso, Apontamentos sobre o Sistema de Cooperação para o
Desenvolvimento a partir de dados do caso de Moçambique, s/d, Fundação Fé e Cooperação em
Moçambique.
LEITE, Pedro Pereira (2015) Cultura e Desenvolvimento? Informal Museology Studies nº 11.
LIMA, Luciano Barbosa, Teorias do desenvolvimento e a cooperação internacional. Uni. Rel.
Int., Brzilia, v. 8, n. 1, pp. 73-90, jan./jun. 2010.
MACHADO, Lia Pinheiro. Alcance e limites das teorias de modernização, revista de
Administração de Empresas, Jul/Set, 1970, p. 170. Disponível em
https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rae/article/download/40506/39236
MANCCINI, Giulia. (2013). Cooperação internacional para o desenvolvimento: mecanismos,
história e eficácia.
MANZINI, Enzo, Small, Local, Opens, and Conected: Design for social innovation. The journal
for designs strategies, n. 1, v. 4. Pp. 7-14, 2010.
MAQUENZI, Jerry, Pobreza e desigualdades em Moçambique: um estudo de caso em seis distritos.
Observatório Rural, n. 113, Maio, 2021.
MARTINEEL, Alfons (coord. 2010) Cultura y desarrolo: um compromisso para la libertard y el
bienestar. Fundación Carolina, Siglo, Madrid.
MEIGOS, Filimone (2018) Dinâmicas das Artes Plásticas em Moçambique. Tese,
Doutoramento, Universidade da Beira do Interior.
MILBUN, Jaqueline Barumen (2010) Monitoreo y Evaluación de Proyectos. Cuadernos de
Cooperación para el Desarrollo No. 3: Especialización en Cooperación Internacional para el
desarrollo.
MONDLANE, Eduardo (1995) Lutar por Moçambique. 1ª edição, colecção Nosso Chão, Centro
de Estudos Africanos.
MOÇAMBIQUE, Ministério de Planificação e Desenvolvimento (2013) Relatório de Segunda
Avaliação da Declaração de Paris.
MORIN, Edgar (2002) Cultura de massa no seculo XX, tradução de SARDINHA, Maria Ribeiro,
9ª edição, Forense Universitária, São Paulo.
MUOCHA, Matilde et al. (2020) Indústrias Culturais e Criativas: O que são? Como gerir? 2ª ed.
Kyswayle, Maputo.

78
NAÇÕES UNIDAS (2010) Relatório sobre economia criativa: uma opção viável para o
desenvolvimento, São Paulo.
NAÇÕES UNIDAS (2011) Fortalecendo as indústrias criativas para o desenvolvimento em
Moçambique. Nova York e Genebra.
NIPASSA, Orlando Júlio André (2016) Autonomia e dependência da sociedade civil no processo de
desenvolvimento humano em Moçambique. Tese, Doutoramento, Instituto Universitário de Lisboa.
NIPASSA, Orlando, Ajuda Externa e Desenvolvimento em Moçambique: Uma Perspectiva
Crítica. 2009. P.22. In IESE, II conferência do IESE, “Dinâmicas da pobreza e padrões de
acumulação em Moçambique”. 2009.
UNCTAD (2004) Consenso de São Paulo.
OLIVEIRA, Fernandes Nunes (2016) Realismo Político e Cooperação Internacional: Valores
internacionais e Consenso Sobreposto como Alternativa de Estabilidade, Tese, Doutoramento,
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
RUBIM, António Albino Conelas (2016) Teses sobre financiamento e fomento à cultura no
Brasil. In Moller, Gustavo e Valiati, Leandro (org, 2016) Economia criativo, cultura e políticas
publicas. 1ª edição, UFRGS Editora, Porto Alegre.
SANTOS, Rogério (2009) Indústrias Culturais, Imagens, Valores e Consumo. Edições 70,
Portugal, Lisboa.
SIGAKI, Hugo Leonardo Ogasawara (2006) A teoria do realismo político nas relações
internacionais, monografia, bacharel, Universidade Federal do Paraná.

Legislação
Constituição da República Popular de Moçambique de 1975;
Constituição da República de Moçambique de 1990;
Constituição da República de Moçambique de 2004
Resolução n.º 34/2016 de 12 de Dezembro que aprova a Política das Indústrias Culturais e
Criativas e Estratégia da sua Implementação.
Decrecto no 23/2019 de 23 de Março que cria o Instituto Nacional das Indústrias Culturais e
Criativas.

79
Lei nº 4/94 de 13 de Setembro, lei que estabelece os princípios básicos que permitem estender a
acção das pessoas jurídicas, singulares ou colectivas, públicas ou privadas, que desenvolvem
actividades comerciais em diversos sectores, para apoiar, financeira e materialmente as artes,
letras, ciência, cultura e acção social.

Outros Fontes
Moçambique, Ministério da Cultura e Turismo, Plano Estratégico para o Desenvolvimento do
Turismo em Moçambique 2015 – 2025
Plano Estratégico da Educação e Cultura (2006-2011);
Plano Estratégico da Cultura (2012-2022);
Conclusões e recomendações da II Conferência Nacional da Cultura (2009);
Regulamento e convite de apresentação de propostas do programa DIVERSIDADE lançado em
Fevereiro de 2020;
Plano de Acção de Dakar sobre Industrias Culturais para o desenvolvimento em África, Junho de
1992.
MOÇAMBIQUE (2018), Política de Género e Estratégia da sua Implementação.
Convite para apresentação de propostas ao PROCULTURA lançado em Setembro de 2020.
Moçambique, Instituto Nacional de Estatística (2017) População por uso de internet nos últimos
três meses.

Sites consultadas
https://www.instituto-camoes.pt/activity/o-que-fazemos/cooperacao/cooperacao-na-
pratica/projetos-com-a-ue/procultura-promocao-do-emprego-nas-atividades-geradoras-de-
rendimento-no-setor-cultural-nos-palop-e-timor-leste.
“Os ODS são parte duma máquina de infantilização dos nossos países” – Elísio Macamo
(geledes.org.br)

80

Você também pode gostar