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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ

UNIVERSIDADE DE FORTALEZA – UNIFOR


Centro de Ciências da Saúde - CCS
Graduação em Psicologia

A ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL NA PSICOLOGIA


CLÍNICA
Relatório de Estágio Básico I

Nícolas Ambrosio Carrera - 2322000


Taís Teixeira Guerra - 2321999

Fortaleza
Novembro de 2023
1. INTRODUÇÃO

A investigação sobre a atuação do profissional em Psicologia tem grande relevância


desde os primeiros semestres da graduação, como forma de melhor relacionar os
conhecimentos teóricos com a perspectiva prática da profissão, intrinsecamente ligados no
trabalho dos profissionais. Tendo em vista um maior conhecimento sobre as diferentes áreas
de atuação dos psicólogos, realizamos a disciplina de Estágio Básico I, na qual pesquisamos
sobre a área de atuação da Psicologia Clínica e entrevistamos profissionais desse campo.

É ampla a variedade de possibilidades de atuação em Psicologia e essa disciplina visa


nos colocar em contato com a prática profissional em sua diversidade. Mas, apesar das
diferenças, podemos unificar a função do profissional em Psicologia, de modo simplificado,
como a atuação com a subjetividade humana de modo científico com o fim, direta ou
indiretamente, no bem-estar integral do ser humano.

No que diz respeito à Psicologia Clínica, que é o campo de atuação mais clássico e
ainda hoje mais aderido, esse trato com a subjetividade da pessoa humana tem um caráter
ainda mais central de escuta clínica e aplicação de técnicas, intervenções e tratamentos no
âmbito psicoterapêutico, seja na perspectiva da mente propriamente dita, do comportamento,
da cognição, do inconsciente ou das questões de qualidade mais existencial, para as quais as
abordagens guiarão cada psicoterapeuta.

Como indicado, na clínica são diversas as abordagens aprovadas pelo Conselho


Federal de Psicologia (CFP), das quais citamos a análise comportamental e a
cognitivo-comportamental, com foco nos padrões de comportamento e pensamento
estabelecidos na interação do indivíduo com o ambiente; a humanista-fenomenológica, na
qual a intersubjetividade da experiência do sujeito tem valor central; a psicoterapia breve; a
gestalt-terapia, que tem foco no presente e na visão holística sobre o sujeito; e a psicanálise,
que “se interessa pelas leis e estruturas do inconsciente do sujeito” (Souza, 2021, p. 16).

Esses e outros caminhos seguidos na clínica constituem hoje os meios pelos quais o
processo psicoterapêutico ocorre. Ainda que, essencialmente, seja originada dos esforços
humanos de auxílio e cura ainda na antiguidade, a psicoterapia como atividade profissional é
possível ser definida como

um método de tratamento que utiliza meios psicológicos, em especial a


comunicação verbal, mediante os quais um profissional treinado – o terapeuta –
busca deliberadamente influenciar um cliente ou paciente, que o procura com a
finalidade de obter alívio para um sofrimento de natureza psíquica (Cordioli, 2019,
p. 25).

Considerando esta área de atuação, esse trabalho visa realizar uma apresentação da
Psicologia Clínica em sua generalidade, como também algumas questões relacionadas à sua
prática que refletimos a partir das entrevistas com os profissionais, como as diferenças com
relação às abordagens, as motivações teóricas e pessoais para o trabalho psicoterapêutico e a
educação continuada.

A área de atuação na clínica possui, portanto, várias nuances que merecem uma
atenção mais demorada com o fim no melhoramento de nossa formação e futura atuação
profissional. É tendo em vista tais assuntos e, de modo mais específico, a relação entre as
abordagens teóricas e empíricas, além das teorias psicológicas, com a prática clínica de
diferentes profissionais, que realizamos esta pesquisa, já que essa relação parece ser
fundamental para o desenvolvimento fazer clínico de cada psicólogo e, consequentemente,
para a qualidade do atendimento.

2. MÉTODO

Para elaboração deste relatório realizamos uma pesquisa qualitativa que consiste em o
investigador se deslocar para o local de pesquisa com o intuito de compreender o fenômeno
de estudo a partir da óptica das pessoas envolvidas, levando em consideração todas as
perspectivas pertinentes. Diversas formas de informação são reunidas e avaliadas para
adquirir uma compreensão abrangente do fenômeno (Godoy, 1995). Para isso, relacionamos a
teoria e a prática dos temas abordados na escrita deste texto.

Além da pesquisa bibliográfica e entrevistas, participamos dos encontros semanais da


disciplina e de grupos de estudo dirigido nos quais tivemos orientações e supervisões sobre as
entrevistas e o relatório, e também de rodas de conversa com profissionais que
compartilharam suas experiências nas áreas de atuação, instigando algumas reflexões sobre a
prática em Psicologia.

Elaboramos também um roteiro de entrevista semi-estruturada que se concentra em


um tópico para o qual elaboramos um guia contendo perguntas fundamentais, além de incluir
outras questões que surgem de acordo com as circunstâncias específicas da entrevista. Esse
método de entrevista tem a capacidade de revelar informações de maneira mais espontânea, e
as respostas não estão restritas a opções predefinidas (Manzini,1990/1991).

Essas entrevistas foram realizadas com três profissionais e foram marcadas de forma
presencial e a distância via whatsapp, foram gravadas e transcritas para permitir a análise dos
dados. Neste devido relatório os chamaremos de Psicóloga X, Psicólogo Y e Psicólogo Z para
que suas identidades permaneçam sigilosas. A primeira é professora universitária e atua na
clínica por meio das teorias cognitivas, neurociências e epigenética; o segundo é psicólogo
clínico com experiência em psicanálise, em transição para a TCC, mas cujo fundamento
filosófico está na psicologia tomista; o terceiro, apesar do contato com diferentes abordagens,
tem como principal abordagem a logoterapia de Viktor Frankl.

As questões trabalhadas nas entrevistas visavam conseguir informações sobre as


motivações para a área de atuação, a visão dos psicólogos sobre a área e como eles a
praticam, suas formações, rotina e considerações sobre a psicologia clínica. Como entrevista
semi-aberta, apesar da estrutura das questões planejadas, como mencionamos, em vários
momentos cada entrevista se encaminhou para assuntos que os próprios psicólogos traziam,
como forma de melhor aproveitamento da conversa, tendo em vista os seus fins.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Por meio das entrevistas e das leituras realizadas, podemos entender, de modo geral,
as principais atribuições do profissional em Psicologia Clínica e melhor relacionar a prática
da profissão com as teorias que a fundamentam, de acordo com o modo pelo qual cada
psicólogo trabalha. Os entrevistados trouxeram em suas falas, assuntos e perspectivas que
contribuem para as discussões que aqui propomos realizar, no que diz respeito às motivações
e escolhas, à formação, às condições e rotina e as perspectivas e especificidades de cada
profissional.

3. 1 Motivações e escolhas: a área, o público-alvo e a abordagem

Apesar dos diferentes caminhos tomados dentro da psicologia clínica pelos três
profissionais, por meio de distintos motivos e escolhas, algo parece ser de comum acordo: a
busca por acolher a pessoa, não seu comportamento ou doença. Os caminhos para atingir esse
fim são diversos, mas tal fim ético surge nas respostas dos entrevistados, demonstrando uma
preocupação humanista que orienta a prática profissional.

A psicóloga X indica essa perspectiva quando diz “Eu vejo a pessoa e não a doença”,
ou o psicólogo Z quando diz “Eu não olho só ‘pro’ comportamento da pessoa. Eu olho pra
pessoa que me chega”. O psicólogo Y demonstra essa visão com as seguintes palavras:

“Eu procuro exercer a profissão da psicologia de uma maneira muito humana,


vendo que quem está ali diante de mim – lembrando até mesmo da psicologia do
humanismo – é uma pessoa que sente como eu sinto, que pensa como eu penso,
então eu olho para a pessoa não como uma doença, não como um diagnóstico
quando ela chega até mim com algum diagnóstico, eu olho para ela realmente como
um ser humano, uma pessoa.”

Parece comum, portanto, independente da abordagem, a busca pela compreensão da


experiência fenomenológica do indivíduo que vivencia as situações não de modo
fragmentado, mas humano, ou seja, integrado. Isso implica um traço fundamental da escuta
clínica que é o de ir além do fenômeno psicológico em si mesmo, mas buscar aquilo que ele
indica do sujeito em sua dimensão ontológica (Figueiredo, 1995 apud Dutra, 2004, p. 384).

Dessa maneira, tal visão demonstra uma perspectiva crítica quanto ao reducionismo
em Psicologia, de modo que, com o entendimento da complexidade desse conhecimento e de
seu objeto de estudo, os profissionais tendem a utilizar dos aparatos psicoterapêuticos, mas
adaptá-los às realidades de cada caso.

As diferenças são mais perceptíveis quando ouvimos os enfoques de cada profissional


que se relacionam às escolhas pelas abordagens e público-alvo. A psicóloga X percebeu o
quanto o desenvolvimento psicológico pode ser afetado desde antes mesmo do nascimento do
indivíduo, por isso, toma a decisão de trabalhar em intervenções o quanto antes na vida do
paciente. Diz ela:

Agora, o meu foco maior sempre foi com crianças e bebês, porque a partir do
pressuposto, e quanto mais precoce a intervenção, você está evitando os
sofrimentos. Então, assim, como é que eu vou atuar nisso? (...) Então, essa foi a
minha escolha.

Já no caso do psicólogo Y, percebemos uma motivação centrada na ressignificação da


vida do paciente, tendo uma atenção aos traumas e sofrimentos, - “Muitas realidades que
estão feridas, que precisam de uma ressignificação. Existem situações de pessoas que
precisam encontrar até mesmo um sentido para suas vidas (...)” - e às mudanças que uma
possível cura pode levar às suas condições.
O psicólogo Z tem um enfoque parecido com o do anterior, mas se orienta mais para o
autoconhecimento e ao melhoramento do paciente como um todo, ressaltando o lugar de
acompanhamento da transformação da pessoa que o psicólogo tem a oportunidade de exercer.
Deseja, segundo ele, aumentar o nível de consciência de suas realidades, se dedicando
principalmente a casos que envolvem auto-sabotagem, insegurança e ansiedade.

Percebe-se que as abordagens escolhidas pelos entrevistados são tentativas de


respostas às questões que os motivam à clínica. O olhar sobre o desenvolvimento do ser
humano orienta a atenção da psicóloga X para percepção, memória e crenças que modelam a
vivência e visão de mundo do paciente, ou seja, para aquilo que é o foco das terapias
cognitivas em conjunto com as neurociências (Peres; Nasello, 2005).

A orientação do psicólogo Y para a ressignificação das vidas, com uma percepção


voltada ao sofrimento por traumas é típico do objetivo da clínica psicanalítica que, desde os
primórdios, esteve atenta ao uso da linguagem pelo paciente para acessar mais do que aquilo
que inicialmente se propôs a falar em seu discurso, de modo que a postura do psicanalista se
parece com aquela descrita por Y de acolhimento por meio da escuta clínica (Macedo;
Falcão, 2005).

Já o psicólogo Z ressalta a influência de Viktor Frankl em sua escolha que indica uma
identificação com a visão do neuropsiquiatra austríaco sobre a dignidade humana e como ela
influencia um fazer psicoterapêutico frente ao sofrimento das pessoas. O valor do ser humano
é algo que perpassa as falas do entrevistado e o desenvolvimento e objetivo da Logoterapia
que, segundo o seu fundador, é ajudar as pessoas a fazerem melhor uso de seus recursos
espirituais para resistir às adversidades (Frankl, 2019).

3. 2 Formação
3. 2. 1 Formação dos entrevistados
Embora ambos os 3 entrevistados tenham obtido a mesma graduação universitária, é
fascinante perceber a distinção de suas motivações e princípios nesse percurso acadêmico.
Suas perspectivas individuais sobre como essa formação específica contribuiu para moldar
sua atuação como psicólogo revelam nuances significativas. Além disso, destaca-se a
singularidade intrínseca no direcionamento e no trajeto que cada um escolheu, conferindo
uma riqueza de experiências para a profissão. Essa diversidade de visões e trajetórias
enriquece não apenas a compreensão da formação em si, mas também ressalta a vastidão de
possibilidades que se desdobram a partir de uma base comum.
Nossa primeira entrevistada, a psicóloga X, já na faculdade entrou em um projeto de
pesquisa em um hospital universitário onde ela realizava um trabalho sobre o
desenvolvimento de bebês com o dia a dia da relação mãe-bebê. Assim que concluiu a
graduação ela já se direcionou ao curso de mestrado onde trabalhava junto com um
neurologista, e, sua pesquisa consistia na avaliação neuropsicológica de crianças com
epilepsia. Ela tinha a intenção de traçar um perfil para esses pacientes e descobrir qual era o
melhor teste psicológico para aquela área ambulatorial. Foram utilizados a escala WISC e o
SON-R. Mais adiante, a profissional realizou seu doutorado na Alemanha sobre estresse na
prematuridade, medindo cortisol e atualmente ela é neuropsicóloga e trabalha como
professora na graduação e na pós-graduação, além de trabalhar na clínica e com pesquisa.
A Psicóloga X considera que sua formação foi de suma importância para seu
desempenho na psicologia clínica, ela fala que as pesquisas em sua formação proporcionaram
uma base sólida para atuar na clínica e em ambientes hospitalares. Além disso, ela enfatiza
que a pesquisa foi fundamental, superando até mesmo a experiência prática na clínica. Ao
participar de um projeto de pesquisa e estágio, adquiriu habilidades práticas e teóricas,
contribuindo significativamente para seu desenvolvimento. A participação em congressos
durante a faculdade e o mestrado, assim como a oportunidade de estudar na Alemanha, foram
experiências marcantes. Com o contato com profissionais de diversas áreas internacionais,
sua formação foi enriquecida e isso foi fundamental para sua trajetória profissional atual. Até
hoje, a professora investe em formações continuadas:

Eu não paro. Eu estou todo o tempo fazendo curso. Congresso também. Todo ano eu
vou para o congresso. Porque a neurociência muda muito rápido. É a minha base
principal nas neurociências. Então, eu tenho que estar me atualizando o tempo todo.

O psicólogo Y deu início à sua formação em psicanálise durante a graduação,


concluindo-a simultaneamente ao curso universitário. Atualmente, está imerso em uma
segunda especialização em Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), já possuindo uma
especialização em psicologia tomista. Além disso, investiu em conhecimentos específicos,
como uma formação em atendimento infantil, apesar de não atuar diretamente com crianças,
psicologia positiva e atendimento a idosos. Essa ampla gama de formações demonstra o
comprometimento do psicólogo Y com o contínuo aprimoramento de suas habilidades e o
desejo de diversificar suas competências na área psicológica. Ele ressalta também o
aproveitamento nos estudos ainda durante a graduação e a dimensão vivencial destes:
Até aquele trabalho que é uma visita em algum local, por exemplo, e você na clínica
no futuro vai lembrar que foi lá naquele local, fazendo tal coisa, que você aprendeu a
lidar com aquela situação. Porque é vida. Você vai estar diante de um ser humano que
tem uma vida, então você vai se deparar com mil e uma coisas, é muito legal isso.

Seus planos futuros incluem a realização de uma pós-graduação em TCC,


consolidando assim um percurso profissional diversificado e voltado para a constante
expansão de suas competências na área da psicologia, já que ele considera que sua formação
foi de suma importância, o deixando preparado para sua atuação na clínica, no entanto,
ressalta o entrevistado, “o ser humano é algo tão complexo que nenhuma abordagem é capaz
de abraçar”.
O terceiro entrevistado, o psicólogo Z, ostenta uma formação sólida, sendo graduado
e especializado em logoterapia e análise existencial. Além disso, ele enriqueceu seus
conhecimentos por meio de diversos cursos e atividades de extensão, evidenciando um
compromisso constante com o aprimoramento profissional. Apesar de sua notável bagagem
educacional, o psicólogo Z expressa uma perspectiva crítica em relação à aplicabilidade de
sua formação na prática clínica. Em suas próprias palavras durante a entrevista, ele
compartilha: "A formação na minha universidade exerce uma influência significativa apenas
na psicologia social. Tudo o que busquei para a clínica, tive que procurar externamente."
Apesar do desejo de realizar outra especialização no futuro, o psicólogo Z enfrenta
desafios de tempo e logística que impedem essa decisão no momento. Assim, a trajetória do
psicólogo Z destaca não apenas suas conquistas acadêmicas, mas também a necessidade
contínua de adaptação e busca ativa por conhecimento. Diz ele:
“Eu não leio só psicologia, eu leio literatura. Enfim, amplio o imaginário, leio sobre
abordagens técnicas, leio sobre diversas coisas, além de cursos de extensão, se eu
precisar fazer um curso disso, eu vou fazer. Para aprender sobre isso. Mas o estudo,
ele é contínuo.”

3. 2. 2 Formação na psicologia clínica


A formação de um psicólogo clínico é um processo dinâmico e diverso que vai além
da graduação tradicional. A busca ativa por conhecimento, a diversificação das experiências,
a prática constante e a consciência da complexidade humana são elementos fundamentais
para a construção de um profissional competente e preparado para enfrentar os desafios da
prática clínica,“uma atuação que não toma a demanda como objeto de trabalho crítico, presta
um desserviço à psicologia enquanto profissão” (Neto, 2004). Uma graduação sólida
proporciona os fundamentos essenciais, como observado nos entrevistados. No entanto, a
diversificação da formação é crucial, pois a clínica abraça uma ampla gama de experiências
humanas.
Neste sentido, os profissionais podem buscar especializações e cursos
complementares. Como observado pelo psicólogo Z, é crucial reconhecer as limitações da
formação acadêmica e buscar conhecimento externo para suprir essas lacunas. A vivência
prática é inestimável na formação de um psicólogo clínico. Estágios em ambientes diversos,
como hospitais, clínicas, ou instituições específicas, permitem aos estudantes aplicar teorias
aprendidas em contextos reais. A psicóloga X, por exemplo, destacou a importância de seu
projeto de pesquisa em um hospital universitário durante a graduação como uma experiência
precursora para sua atuação clínica.

3. 3 Rotina e condições

A entrevistada X possui uma rotina bem desgastante, pois ramifica seu tempo
desempenhando diversas atividades, sendo elas a sua atuação como professora tanto na
graduação quanto na pós-graduação, e o desenvolvimento de trabalhos na área da pesquisa e
também na clínica.

Na clínica, a psicóloga trabalha no período da tarde e da noite, realizando avaliação


psicológica e fazendo psicoterapia, de modo intercalado. A entrevistada relata que costuma
atender desde crianças até idosos, sendo a criança mais nova de 4 anos. Um ponto muito
interessante é que o número de pacientes idosos diminui consideravelmente depois da
pandemia e com o advento da mesma o número de pacientes homens cresceu drasticamente, a
psicóloga acredita que

Os homens passaram a procurar mais ajuda profissional. Por um preconceito da


sociedade, muitos não procuravam porque são criados do tipo... Homem não pode
chorar, não pode assumir a fragilidade. Homem... a nossa sociedade infelizmente é
assim. Ele não pode mostrar a fragilidade. Tem que ser sempre forte, tem que ser
sempre cru. E não é assim. E aí, eu acho que com a pandemia mudou um pouco isso.

Sobre o mercado de trabalho, avalia que a psicologia clínica está muito em alta.
Apesar de não fazer marketing do seu trabalho em redes sociais, ela acredita que fazer um
trabalho bem feito e ter um networking é fundamental. A entrevistada consegue muitos dos
seus clientes por indicação de outros profissionais, inclusive no início de sua carreira, recebia
muitos clientes que eram indicados pela neurologista com quem trabalhava em um projeto de
pesquisa. A neuropsicóloga também realiza muitas palestras e ministra alguns cursos onde
tem seu trabalho muito indicado.
Atuando profissionalmente apenas como psicólogo clínico, de forma presencial e
online, o entrevistado Y costuma sempre fazer anotações após as consultas sobre as coisas
mais importantes e pontos a serem trabalhados, como também planejar atividades para serem
realizadas com o paciente. Diariamente via de regra ao chegar na clínica ele lê suas anotações
sobre todos os pacientes do dia.

O psicólogo Y, devido sua situação como consagrado religioso e não trabalhar na


clínica em tempo integral, não soube ao certo dizer o que pensa sobre o mercado de trabalho
na sua área. Ele atende apenas nas segundas pela tarde e na terça e quinta pela tarde e noite.
Sobre o marketing, relata que no começo fazia algumas postagens mas atualmente consegue
seus clientes pelo “boca a boca” de seus pacientes.

O psicólogo Z atua como psicólogo clínico com atendimento online e presencial, ele
possui também uma empresa que trabalha com educação online, auxiliando outros
profissionais da saúde a transmitir seus conhecimentos da melhor forma. Na clínica ele
atende às terças, quartas e quintas pela manhã e nas sextas a tarde e ele acha importante frisar
que:

Eu sempre digo, hoje a minha rotina é em vista da minha perspectiva de trabalho, na


minha leitura, é impossível a pessoa atender com qualidade mais do que seis clientes
no dia. Sabe? Com qualidade. Por quê? Porque cada pessoa é única. Não é que ela te
suga. Mas é porque ela demanda de você. Ela demanda atenção e tudo mais.

O entrevistado comenta sobre o mercado de trabalho para psicólogo clínico e diz que
é “o melhor dos mundos”, a procura aumentou muito desde a pandemia e que antes disso ele
participou ativamente de uma campanha chamada Janeiro Branco que tinha como slogan
“Quem Cuida da Mente Cuida da Vida”.

Atualmente o psicólogo Z utiliza como principal estratégia para se colocar no


mercado, a produção de conteúdo na internet e ele expõe a importância da mesma para um
psicólogo:

Porque a relação terapêutica tem como pilar fundamental a confiança, a identificação.


Então, com a internet tudo se facilitou. Porque se eu produzo um canal no YouTube,
se eu produzo vídeos para o Instagram, se eu faço um podcast, eu estou distribuindo
esse conteúdo para o maior número de pessoas do mundo inteiro, não só da minha
cidade, não só da minha região. Então, eu estou dando oportunidade para que as
pessoas se conectem comigo.
3. 4 Perspectivas e especificidades em Psicologia Clínica

Ao tratar do setting terapêutico, a professora universitária, pesquisadora e psicóloga X


faz a analogia com um jogo de xadrez em que o psicólogo tem as técnicas, mas deve jogar
conforme cada paciente e seus interesses. Por isso, o profissional deve, segundo ela,
desenvolver a flexibilidade cognitiva, a inteligência emocional, a criatividade e saber colocar
bem em prática os conhecimentos que tem. Tudo para que possa melhor trabalhar as
demandas do paciente e sua psicoeducação.

Para o psicólogo Y, cuja realidade de atuação profissional é um caso especial, tida


como um meio para a ajuda ao próximo fora do âmbito religioso do qual faz parte, o
consultório é lugar de ressignificação, de busca e encontro de sentido por parte do paciente e
escuta e acolhimento por parte do psicólogo que deve transmitir segurança e receber sem
julgamentos a pessoa que chega.

O psicólogo clínico Z, que também possui uma empresa de educação em saúde no


meio digital, parte de uma visão ampliada da psicologia, destacando as suas origens
filosóficas. Na clínica, essa perspectiva se coloca como uma atividade reflexiva junto à
pessoa que chega ao consultório que deve ser acolhida e escutada pelo profissional que tem
como meta ajudá-la a viver melhor por meio da intervenção psicoterapêutica.

Estas são três das inúmeras maneiras de atuação profissional que encontramos em
Psicologia Clínica. São realidades que envolvem o lugar que ela ocupa nas vidas de cada um
dos profissionais que, por sua vez, influencia na forma como atuam com as intervenções
realizadas no setting terapêutico com os pacientes.

4. CONCLUSÃO

Em síntese, mesmo com uma grande quantidade de artigos sobre as abordagens, não é
alto o número de produções sobre a Psicologia Clínica em específico. Contudo, o trabalho
desdobrou-se de uma ótima maneira, beneficiando-se da abundância de profissionais na área
da psicologia clínica. A alta disponibilidade de psicólogos nos proporcionou a oportunidade
de conduzir três entrevistas de boa qualidade. Os insights obtidos por meio desses diálogos
destacaram a notável diversidade que existe nessa esfera, revelando uma multiplicidade de
abordagens e metodologias. É evidente que, independentemente de suas perspectivas teóricas
específicas, os profissionais entrevistados demonstraram habilidade em adaptarem-se às
demandas singulares apresentadas em seus respectivos consultórios.
Podemos perceber também que a clínica como área de atuação possui grandes pontos
positivos, como o fato de ter a possibilidade de ter mais autonomia ao gerenciar seus
horários, permitindo ao psicólogo desta área ter flexibilidade para desempenhar outras
atividades em paralelo, como vimos no caso da entrevistada X que além da clínica trabalha
como professora e pesquisadora.
Devemos compreender portanto que, para a Psicologia Clínica é de suma importância
ter uma ótima formação acadêmica e complementá-la com cursos e especializações. O
aspirante a essa profissão deve se manter conectado e atualizado e manter um estudo contínuo
mesmo após a graduação. Um cliente ou paciente lhe trará no consultório uma vida inteira e o
profissional precisa sempre estar o mais preparado possível.
Quanto à profissão na sociedade, apesar da percepção do senso comum quanto à
psicologia, é uma área que está em ascensão e vem crescendo a cada dia, principalmente após
o advento da pandemia, quando a demanda de psicólogos clínicos aumenta e a profissão vem
se estabelecendo bem no mercado de trabalho.
Por fim, por meio desta pesquisa passamos a compreender de modo mais próximo o
que, de fato, o profissional exerce no dia-a-dia de sua área e como os conhecimentos teóricos
se alinham às práticas profissionais, fundamentando, juntamente com as histórias de vida de
cada entrevistado, as perspectivas sobre a clínica como lugar de acolhimento, escuta,
psicoeducação e transformação.
Lembramos que o que foi exposto neste relatório designa o viés pelo qual se decidiu
abordar as falas dos entrevistados sobre os temas mencionados, mas que não se esgota em si
mesmo, podendo motivar pesquisas sobre, por exemplo, o lugar da psicologia clínica na vida
dos profissionais da área ou a crítica ao reducionismo da Psicologia entre os psicólogos
clínicos e as implicações na prática clínica.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CORDIOLI, Aristides V.; GREVET, Eugenio H. Psicoterapias: abordagens atuais. Porto


Alegre: Grupo A, 2019. E-book. ISBN 9788582715284. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582715284/. Acesso em: 30 out. 2023.

DUTRA, Elza. Considerações sobre as significações da psicologia clínica na


contemporaneidade. Estudos de Psicologia, 2004, 9(2), p. 381-387.

FRANKL, Viktor. O sofrimento humano: fundamentos antropológicos da psicoterapia. São


Paulo: É Realizações, 2019.

GODOY, Arilda Schmidt. Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de


administração de empresas, São Paulo, v. 35, n.3, p, 20-29 Mai./Jun. 1995. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rae/a/ZX4cTGrqYfVhr7LvVyDBgdb/?format=pdf&lang=pt . Acesso
em: 02 nov. 2023.

MACEDO, Mônica Medeiros Kother. FALCÃO, Carolina Neumann de Barros. A escuta na


psicanálise e a psicanálise da escuta. Psychê v.9 n.15 São Paulo jun. 2005.

MANZINI, Eduardo José. A entrevista na pesquisa social. Didática, São Paulo, v. 26/27, p.
149-158, 1990/1991. Disponível em:
https://www.marilia.unesp.br/Home/Instituicao/Docentes/EduardoManzini/Entrevista_na_pes
quisa_social.pdf Acesso em: 02 nov. 2023.

PERES, Julio Fernando Prieto. NASELLO, Antonia Gladys. Psicoterapia e neurociências: um


encontro frutífero e necessário. Rev. bras.ter. cogn. v.1 n.2 Rio de Janeiro dez. 2005.

SOUZA, Alberto Carneiro Barbosa de. Introdução à psicologia clínica. Fortaleza: Editora
Saraiva, 2021. E-book. ISBN 9786589881742. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786589881742/. Acesso em: 30 out. 2023.

Ferreira Neto, J. L. (2004). A formação do psicólogo: clínica, social e mercado. São Paulo,
2004
APÊNDICES

Apêndice 1: Roteiro da entrevista semiaberta

1. Por que você decidiu seguir nessa área?

2. Para você, o que é a psicologia clínica?

3. Qual o seu papel como profissional da saúde?

4. Qual seu público-alvo e abordagem psicoterapêutica?

5. Porque a escolha por esse recorte e por essa abordagem?

6. Seus valores e princípios de vida tem alguma relação com sua atuação nessa área e
abordagem?

7. Você realiza alguma outra atuação profissional além da atuação como psicólogo
clínico?

8. Você considera que sua formação na graduação em Psicologia lhe concedeu um bom
aparato teórico e prático para sua profissão?

9. Para além da graduação, quais as formações que você procurou ter para que melhor
pudesse atuar profissionalmente?

10. Quais cursos ou especializações você pretende fazer para agregar no seu trabalho?

11. Quais as características e habilidades que devem ser prioritariamente desenvolvidas


por um profissional em psicologia clínica?

12. Poderia descrever sua rotina em um dia comum?

13. Você trabalha online e/ou presencial?

14. Quais os materiais e meios dos quais você se utiliza para a realização de seu trabalho
(internet, livros, testes, jogos, etc)?

15. Quais as principais demandas que chegam ao consultório?

16. Quais são as dificuldades da sua área?

17. Como você avalia o mercado de trabalho para o psicólogo clínico hoje?

18. Quais as estratégias que você tem para melhor se colocar no mercado de trabalho?

19. Para você qual a importância de desenvolver um trabalho interdisciplinar?

20. Gostaria de acrescentar algo a mais?


Apêndice 2: Transcrição das entrevistas

Transcrição da Entrevista I com a Psicóloga X, em 09 de outubro de 2023

Psicóloga X: Na Universidade de Brasília, eu já comecei a trabalhar com pesquisa, entrei


dentro de um programa, um projeto belíssimo, no Hospital da Universidade de Brasília, em
que a gente trabalhava com o dia a dia de mãe-bebê, para o desenvolvimento desses bebês, e
fortalecimento, por meio do fortalecimento do vínculo mãe-bebê, e a gente usava o método
Canguru, avaliava essas crianças, como era para a pesquisa, a gente podia usar a escala
Bayley, que era uma escala internacional, hoje ela já tem aqui para o Brasil, já foi traduzida
para o Brasil, então a gente analisava o desenvolvimento desses bebês e fazia o trabalho,
desde a UTI neonatal também, fazendo fortalecimento dessa dia de mãe-bebê. Quando eu
concluí, eu já entrei no meu mestrado, em que eu fui trabalhar junto com um neurologista, em
que a pesquisa consistiu na avaliação neuropsicológica de crianças com epilepsia, e a gente
queria ver a efetividade também de dois testes, se eles se correlacionavam ou não, a gente
queria traçar um perfil, existia um perfil, a nossa pergunta era, existia um perfil dessas
crianças com epilepsia, e qual é o melhor teste para avaliação nessa área ambulatorial? Então,
a gente fez a correlação entre um dos mais usados, que era o WISC, e a gente quis comparar
com outro que estava sendo validado para o Brasil, que era o SON-R. E aí, trabalhando com
crianças prematuras neste projeto, fortalecimento da dia de mãe-bebê, e trabalhando com
crianças com epilepsia, eu vi a necessidade de estudar estresse, porque eu vi o quanto as
crianças prematuras eram mais estressadas, e eu vi o quanto as crianças com epilepsia
também, quanto mais estresse, mais crises. Então, eu queria estudar estresse, como é que o
estresse afetava a memória, afetava a aprendizagem, aumentava a suscetibilidade no número
de crises, como é que o estresse na prematuridade pode trazer consequências a longo prazo. E
aí, eu comecei com o projeto, primeiro com a epilepsia, e depois eu resolvi mudar para a
prematuridade. E aí, eu queria estudar estresse, só que eu queria estudar estresse medindo
cortisol, e o pessoal daqui não mensurava cortisol, estudava só com questionários, e não se
falava estresse em criança, praticamente você não tinha artigos. E aí, eu resolvi estudar na
Alemanha, que tinha um grupo que trabalhava fortemente com essa área de estresse, e aí eu
fiz meu doutorado na Alemanha, na Universidade de Bochum. Hoje, eu trabalho [local],
como professora, trabalho na pós-graduação também, [local] e de outras universidades,
trabalho na clínica, e com pesquisa.
Entrevistadora: Por que a decisão pela psicologia clínica, por atuar na clínica?

Psicóloga X: Eu sempre, a minha decisão maior, eu atuei na clínica e atuei na área hospitalar.
Primeiro, na área hospitalar, como pesquisa, dando apoio a essas mães e o desenvolvimento
desses bebês. Agora, o meu foco maior sempre foi com crianças e bebês, porque a partir do
pressuposto, e quanto mais precoce a intervenção, você está evitando os sofrimentos. Então,
assim, como é que eu vou atuar nisso? Tanto em hospitais, quanto na clínica, entende? Então,
essa foi a minha escolha. E a escolar, na minha época, não se falava muito. Era muito pouco.
Até hoje, eu acho muito precário o número de psicólogos que tem na área escolar. Eu acho
que isso tem que mudar. Já tivemos grandes avanços. E aí, também, esse foi um dos motivos
que eu fui, que era como eu estava fazendo essa estimulação precoce. Tanto na área
hospitalar, quanto na clínica. Meu objetivo era trabalhar ali com crianças, mas hoje eu
trabalho com crianças, com adolescentes, com adultos e com jovens. Até porque eu uso
muitas neurociências e eu vejo que eu tenho que trabalhar o desenvolvimento como um todo.

Entrevistadora: A área de atuação da clínica, como é que você vê, assim, como profissional?
O que é que seria a psicologia clínica pra você?

Psicóloga X: A psicologia clínica é você trabalhar exatamente as potencialidades e as


dificuldades do teu paciente. Então, você trabalha autoconhecimento, a gente trabalha e lida
muito com autoconhecimento. Eu tô falando da psicoterapia. A gente trabalha muito a
questão da resiliência, das funções executivas. Eu sempre uso na clínica o lidar com o
estresse, o alcançar os seus objetivos, traçar objetivos, etc. E eu sempre lido, a gente vai ter
que voltar a história de vida, conhecer toda a história de vida da pessoa, ver as causas daquele
comportamento. Então, eu sempre uso neurociências e epigenética. E a gente trabalha muito
com o princípio da educação. Trabalha com as crenças, com os pensamentos disfuncionais,
com as estratégias compensatórias que são utilizadas. E sempre quando eu vou trabalhar, eu
trabalho de uma forma muito lúdica. Tanto com crianças, adolescentes e adultos. E a
avaliação neuropsicológica é fundamental pra gente mapear quais são as potencialidades e as
dificuldades daquele indivíduo. Então, eu também trabalho com avaliação neuropsicológica,
trabalho com as duas.

Entrevistadora: Acho que você já iniciou esse assunto, mas como é que seria, o que você diria
sobre seu papel como profissional da saúde?

Psicóloga X: É fundamental. A gente tem que trabalhar com prevenção. E muito do nosso
adoecimento, ela vem de crenças, pensamentos disfuncionais, comportamentos disfuncionais.
Entende? Da falta de autoconhecimento. Na hora que você trabalha isso e você trabalha a
resiliência, porque o estresse sempre vai existir. O problema sempre vai existir. A questão é
como você lida com isso. Não tem como a gente dizer, não, aquela pessoa vai vivenciar sem
estresse. Não. Até porque o estresse também tem o seu lado bom, que é o eu-estresse, né, que
a gente chama. E tem um de estresse que é o estresse ruim. Agora, o que eu faço com isso?
Como eu encontro as soluções? Eu vou ser uma pessoa que vai quebrar diante daquela
situação estressante? Ou seja, não vou ter resiliência, o termo resiliência vem da física, né,
vem da engenharia. Ou eu vou me moldar aquilo ali, me transformar e saber lidar com aquela
situação sem quebrar, sem fissurar. Entende? Então a gente trabalha muito com o
desenvolvimento das potencialidades, o trabalhar com as dificuldades, pro crescimento do
nosso paciente. Para isso precisa ter inteligência emocional, precisa ter autoconhecimento,
autocontrole, empatia. Né? Autorregulação. Que são funções executivas aí. Flexibilidade
cognitiva.

Entrevistadora: É, então, assim, só pra gente ter mais clareza… Sobre o público alvo e
também qual a abordagem psicoterapêutica?

Psicóloga X: Terapias cognitivas, terapias cognitivas como um todo. Não só a TCC, a TCC é
uma delas. Neurociências, que é uma ciência, não é uma abordagem. Aí dentro da abordagem
das neurociências, principalmente neurociências cognitivas e neurociências sociais, que eu
uso muito, e epigenética, que é outra ciência. Então eu utilizo duas ciências, né, mais a
abordagem da psicologia, que são as terapias cognitivas. E o público-alvo? Público-alvo é
bem... Assim, é bem variado, né? Eu trabalho, como eu falei, com bebês, crianças, adultos,
adolescentes e idosos, mas o meu foco maior hoje na clínica, a grande maioria dos meus
pacientes, são adolescentes e crianças. Certo. Hoje o foco maior são crianças e adolescentes.

Entrevistadora: E por que a escolha por esse público-alvo e pela abordagem?

Psicóloga X: Pela questão de trabalhar com prevenção, de evitar os efeitos duradouros, né, de
determinados eventos que a pessoa passou, experiências que a pessoa passou ao longo da
vida. Então se eu já posso intervir antes com bebês e com crianças, então, por exemplo, um
bebê que nasceu prematuro, a gente sabe que passa por inúmeras situações estressantes, e isso
que vão ter consequências biopsicossociais. O que eu vou esperar, tá certo? Para poder fazer
intervenção, se eu já posso começar desde cedo. E eu gosto também dessa questão de usar a
ludicidade, que a gente utiliza muito com crianças. É um desafio maior ainda. Como eu
trabalho em todas as áreas, o tratamento de crianças e adolescentes é mais desafiador do que
com adultos. E eu gosto de desafios também. Porque as terapias cognitivas. Inclusive quando
eu estagiei, eu estagiei inclusive em psicanálise também. Então eu estagiei na psicanálise,
estagiei na psicobiologia, que era esse trabalho no hospital. Estagiei, que depois virou o
departamento de neurociências, né, e lá eles trabalhavam também muito com as terapias
cognitivas. Então eu fui estagiando as duas em paralelo para decidir e, para mim, fez mais
lógica você, essa área das neurociências, juntamente aí com as terapias cognitivas. E a
epigenética eu descobri ela em 2009. Então muitas lacunas que as neurociências deixavam,
eu supri. Porque eu via, por exemplo, um bebezinho que já nascia mais estressado, mas que a
gestação foi tranquila. Eu perguntava, por que esse bebê é mais estressado se a gestação foi
tranquila? E aí quando você via a história de vida da mãe, quando adolescente, repleta de
eventos estressores, né, e aí quando eu conheci a epigenética, eu comecei a entender que o
comportamento da mãe, mesmo antes dela estar grávida, influencia essa futura geração, vai
influenciar os filhos pela epigenética. E aí respondeu muita coisa pra mim, e incorporei
também o trabalho da epigenética na clínica. Eu tenho acesso desde 2009. Foi um privilégio
que eu tive.
Entrevistadora: Bom, seguindo mais nessa lógica, nesse assunto que você estava falando, os
seus valores, os seus princípios de vida, eles têm alguma relação com essa escolha pela
atuação, nessa área, nessa abordagem, com esse público?

Psicóloga X: Sim, tem, claro, sim, porque eu sempre procurei facilitar o processo de
desenvolvimento de um indivíduo. Sempre procurei trabalhar na área da saúde. Inclusive, eu
comecei na Odonto, porque eu queria trabalhar exatamente a prevenção das cáries de criança.
Só que eu comecei a estagiar e falei, não é isso que eu quero. Até chegar na psicologia foi um
percurso. Então, influenciou, sim.

Entrevistadora:Agora, sobre a sua graduação em psicologia, se você considera que ela te deu
um bom aparato teórico e prático para a sua profissão?

Psicólogo B: Demais, demais. Tanto a graduação, quanto o mestrado, e principalmente o


doutorado. Aprendi muita coisa, porque na graduação eu já comecei a entrar em pesquisa, já
tive a oportunidade de entrar nesse projeto, foi fantástico, que abriu muitas portas para mim,
esse projeto dos bebês prematuros. Até hoje eu trabalho com o pessoal dos bebês prematuros,
abriu muita porta de pesquisa, fez eu me apaixonar a ponto de entrar no mestrado, no
doutorado. As pesquisas me deram muita base para a clínica, o trabalho na área hospitalar,
então nem se fala. Eu digo que deu mais base para a clínica, inclusive, do que a própria
clínica. Eu também estagiei na clínica. Porque eu lidava com muitas pessoas, com histórias
de vidas diferentes, histórias de muita vulnerabilidade. Foi uma experiência incrível.

Entrevistadora: Então, você diria que é mais a questão da pesquisa que ajudou mais essa
experiência?

Psicóloga X: Não a pesquisa, mas a prática. A prática fazendo esse projeto, porque a gente
não só pesquisa, mas a gente é montado com várias... Então, a pesquisa é uma das melhores
formas de aprender. E a prática, as intervenções que a gente fazia com essas mães, porque
não era só pesquisa, era um projeto de pesquisa, mas um projeto de estágio também. E, fora,
comecei cedo esse projeto. Então, assim, foi incrível. Me deu muita habilidade prática,
teórica, tudo. A minha faculdade foi essencial para o meu desenvolvimento e para o alcance
que eu estou hoje. Na faculdade, eu já participei de congressos, eu sempre pegava coisas por
fora, me envolvia muito. No mestrado, então, era um congresso direto. Aí que eu participei
mais, mandava trabalhos. Então, foi isso. E a minha ida para a Alemanha foi perfeita. Foi
fantástica. A experiência que eu tive, tanto de pesquisa quanto de prática, contato com outros
profissionais de diversas áreas. O Instituto lá era internacional e tinha gente da engenharia,
tinha gente da medicina, tinha gente da psicologia, da enfermagem, outras áreas da saúde.
Então, com vários profissionais do mundo inteiro, porque eles recebiam convidados, né?
Então, minha gente do mundo inteiro, Estados Unidos, outras áreas da Europa. Então, foi um
privilégio a minha formação. Contribuiu muito para o que eu sou hoje.

Entrevistadora: Esse contato com outras culturas também…

Psicóloga X: Com outras culturas, exatamente. Eu tinha colegas de diversos países e


profissionais que iam dar palestras e a gente conversava, trocava ideias. E eles davam
sugestões no projeto e tudo mais. Então, foi fantástico. Apresentação em diversos países
também.

Entrevistadora: Você já fala do mestrado e do doutorado, mas, assim, quais outros cursos e
especializações você fez?

Psicóloga X: Eu não fiz especialização... Eu já fui direto para o mestrado, mas eu fiz projeto
de extensão na área hospitalar. Já fui direto para o mestrado, doutorado, etc. E fiz outros
cursos também. Minha vida inteira foi fazendo curso.

Entrevistadora:Você pretende ainda fazer outros cursos?


Psicóloga X: Eu não paro. Eu estou o tempo todo fazendo curso. Congresso também. Todo
ano eu vou para o congresso. Porque a neurociência muda muito rápido. É a minha base
principal nas neurociências. Então, eu tenho que estar me atualizando o tempo todo. Então,
todo ano eu vou para o Brain, vou para o congresso fora. Já fui para o congresso no Japão,
apresentar trabalho. Na Alemanha, nos Estados Unidos. Com os Estados Unidos, eles me
bancaram. Eu gostava tanto da minha pesquisa que me chamaram para dar uma palestra lá.
Então, o tempo todo eu estou viajando e participando de congressos.

Entrevistadora: Agora mais específico sobre a Psicologia Clínica, quais as características e


habilidades que devem ser prioritariamente desenvolvidas por um profissional na Psicologia
Clínica?

Psicóloga X: Flexibilidade cognitiva, inteligência emocional, porque a gente lida com muitos
conflitos, muitas dificuldades, escuta, criatividade, principalmente quem vai trabalhar com
crianças e adolescentes, tem que ter muita criatividade, mas com adultos também, uma
grande velocidade de processamento, linkar as ideias rapidamente e bastante conhecimento.

Entrevistadora: O que significa linkar as ideias?

Psicóloga X: Linkar as ideias, a teoria, a prática, porque vai ter coisas, por exemplo, você vai
usar ali uma determinada técnica que com aquela pessoa não funciona, e aí você vai ter que
linkar rapidamente. Linkar, o que eu posso fazer agora? Eu já usei todas as que aquela pessoa
não funcionou. Qual é essa que eu posso estar usando agora que eu acho que vai funcionar
para ela? Tem que ter muita flexibilidade cognitiva, eu digo que é como um jogo de xadrez,
você tem as técnicas, você tem a jogada, mas você não vai fazer aquilo ali de forma rígida,
porque cada paciente é um paciente. Você vai fazer de acordo com a jogada que ele fizer, aí
você vai saber qual técnica usar, e sempre partir dos interesses do paciente, de forma de
acessão. Então, você não pode ser muito rígido, senão você... a terapia não flui. Tem que ter
muita flexibilidade cognitiva.

Entrevistadora: Você poderia descrever um dia comum, seu, na psicologia clínica?

Psicóloga X: Um dia comum? Nunca um dia comum. Você diz em que sentido?

Entrevistadora: A rotina… de manhã, o que você faz de tarde, se você atende à noite
também?

Psicóloga X: Eu atendo à tarde e à noite. Eu tenho pacientes tanto de avaliação psicológica


quanto de psicoterapia. Eu geralmente procuro intercalar para não ficar tão cansativo. E para
mudar um pouquinho o foco. Então, para mim fica melhor nesse sentido. Como eu falei, eu
tenho crianças ali de 4, às vezes até... Hoje, estou... a criança mais nova que eu tenho é 4 anos
de idade. E tenho também adolescentes e adultos. Então, é um trabalho diferente quando você
trabalha com 4 anos de idade e quando você vai trabalhar com um adulto. Idosos hoje eu não
estou, não. Eu tinha muito idoso antes da pandemia. Depois da pandemia... Diminuiu um
pouco. Agora, o que aumentou a demanda foi de adolescentes a homens. A maioria do meu
público antes da pandemia eram mulheres. Depois da pandemia, a maioria do meu público
hoje é adolescentes homens.

Entrevistadora: Então, você tem alguma hipótese sobre isso?

Psicóloga X: Os homens passaram a procurar mais ajuda profissional. Por um preconceito da


sociedade, muitos não procuravam porque são criados do tipo... Homem não pode chorar, não
pode assumir a fragilidade. Homem... a nossa sociedade infelizmente é assim. Ele não pode
mostrar a fragilidade. Tem que ser sempre forte, tem que ser sempre cru. E não é assim. E aí,
eu acho que com a pandemia mudou um pouco isso.
Entrevistadora: E é só presencial ou você atende online?

Psicóloga X: Presencial. Hoje eu tô só com presencial. Já atendia online, mas hoje eu tô só


com presencial.

Entrevistadora: E os materiais e os meios que você utiliza?

Psicóloga X: Jogos, testes... Testes privativos do psicólogo, que só o psicólogo pode usar.
Padronizados, validados aqui pro Brasil. Hoje a gente só pode usar os validados pro Brasil. E
muitos jogos, jogos que eu crio. Material que eu crio também. E escalas, né? Que não são
privativas do psicólogo, mas são validadas pro Brasil. Mas qualquer profissional da
universidade pode usar também. Então, varia muito. Desenhos, trabalho com desenhos.

Entrevistadora: E as principais demandas que chegam ao consultório?

Psicóloga X: Na maioria dos casos, TDAH. O que vem mais pra mim é TDAH. O principal é
o TDAH, depois o autismo. A maioria dos meus pacientes chegam com caso de TDAH. E
autismo. Tanto para avaliação, quanto para psicoterapia.

Entrevistadora: E quais as dificuldades, as principais dificuldades dessa área de atuação pra


você?

Psicóloga X: Às vezes o trabalho com os pais. Porque quem trabalha com criança ou
adolescente tem que trabalhar com os pais. É desafiador. Mas eu tenho que trabalhar, tem
dado super certo. A gente trabalha muito com a psicoeducação. E a questão do tempo. Eu
queria ter mais tempo.
Entrevistadora: E sobre o mercado de trabalho para psicólogo clínico hoje?

Psicóloga X: Tá em alta. Tá em alta, a gente precisa ampliar. É essencial para prevenção de


psicopatologias, pro desenvolvimento. Para a pessoa ter uma boa qualidade de vida.
Lembrando que a gente olha a pessoa, não a doença, tá? Então, não tem nenhum paciente que
eu... Os dois têm TDAH. Um tratamento é totalmente diferente do outro. Até porque os
interesses são diferentes. Então, não é o mesmo tratamento. Eu vejo a pessoa e não a doença.
Eu não vou tudo, não vejo a doença. Então, assim, para promoção da qualidade de vida é
fundamental a psicoterapia. Certo? Independente se a pessoa já manifestou ou não o
distúrbio. Eu acho que você não deve esperar ter uma depressão pra você procurar um
psicoterapeuta. Porque o autoconhecimento é fundamental para você lidar com as situações
da vida. Se é o dia pra você buscar seus objetivos, você buscar qualidade de vida. Então,
quanto mais cedo, melhor. Porque muitos alinham, né? Infelizmente, eu acho que psicoterapia
é só pra quem está doente. O pior, a sociedade fala que psicoterapia é pra doido. O pior ainda.
É um preconceito terrível.

Entrevistadora: Quais as estratégias que você mais utiliza para se colocar no mercado de
trabalho?

Psicóloga X: Fazer o meu trabalho com qualidade. Porque nem marketing eu utilizo. Nunca
utilizei. O que eu tenho é do Sinapses, que é do nosso grupo. Mas não, eu nunca precisei
utilizar. Vai passando de boca a boca. Quando eu comecei, a neurologista me passava os
pacientes. Então, eu tenho vínculos muito com outros profissionais que me passam paciente.
Esse foi o segredo de como eu comecei. E depois, quando eu mudei pra cá, eu não abri a
clínica logo, eu dei um tempo. Até porque o pessoal não me conhecia. E eu comecei a dar
aula, fui ficando conhecida. Os pacientes vão chegando. Não pode. E qual é o teu marketing?
Fazer o trabalho bem feito, vai passando de boca a boca. Você fazer o seu trabalho bem feito,
vai passando de boca a boca. Uma amiga vai indicando pra outra amiga, que vai indicando
pra outra, que vai indicando pra outra. E quando eu também dou muitos cursos, participo
muito de congresso, o pessoal vê as apresentações e vão procurar também. Esse é o
marketing. Só posso dizer que é um marketing que você faz. Mas não tem rede social. Nada
disso não. Não faço divulgação.

Entrevistadora: E o trabalho interdisciplinar, a importância dele?

Psicóloga X: É fundamental. Às vezes é difícil fazer. Na área hospitalar, eu faço muito. Na


clínica é um pouquinho mais complicado. A gente faz o multidisciplinar. Então, são vários
profissionais que a gente vai indicando. A gente tem os profissionais de confiança. Então,
temos neurologista de confiança, que a gente vai... Nós dois estamos com a mesma paciente,
vamos atender naquele caso. Nutricionista de confiança. Isso tem. O ideal seria todos ali, com
aquele paciente, no mesmo local físico. Isso eu ainda não consegui fazer. No hospital, eu
faço. Mas na clínica é multiprofissional. Então, eu vou indicando. E aí os outros profissionais
vão indicando e a gente vai discutindo os casos. Mas eu digo assim, no mesmo ambiente
físico, atendendo mesmo... Ainda não consigo.

Entrevistadora: Então, acho que a gente chegou ao fim das questões. Se a professora quiser
dizer mais alguma coisa…

Psicóloga X: Mensagem final, invistam mesmo. Bebam de todas as fontes, enquanto vocês
estiverem na graduação. Não liguem para essa disputa de abordagem. Vocês sabem. Criem a
autenticidade de vocês. Veja o que mais interessa para vocês. E façam um trabalho muito bem
feito. Desde a graduação. E vocês vão ser reconhecidos pelo trabalho e pronto. Aí a procura
vem como consequência. Eu digo que nota, o dinheiro que você vai ganhar depois. Tudo isso
é consequência de um trabalho bem feito. Se você faz um trabalho bem feito, você vai ser
valorizado. Se você não faz, depende do seu entendimento. E aguardem o processo. Porque
muitas pessoas já querem ver o resultado. Você precisa primeiro plantar, regar. E curtir o
processo. Comemorar cada fase do processo. Dá mais energia para continuar. E pronto. Aí
você vai colher as consequências do seu trabalho. E a psicologia é importantíssima. Está
crescendo cada vez mais. Lá fora as neurociências são muito valorizadas. Aqui já passa a ser
valorizada também. Mas ainda lá fora. Aqui ainda está engatinhando. Em relação a isso.
Invista no trabalho de vocês. E pronto. Independente de qual abordagem você venha a seguir.
Eu posso dizer que a neurociência pode ser usada em todas as abordagens. E ter um
diferencial, sabe? Então assim. Busquem o caminho de vocês. E olhem para o processo.
Resultado é consequência do processo. E todas as áreas são muito boas. E digo mais, vai
crescer ainda mais. Vai crescer ainda mais. Porque as pessoas estão ficando cada vez mais
adoecidas. Por uma série de fatores, infelizmente. Então a demanda na clínica está alta.

Transcrição da Entrevista II com o Psicólogo Y, em 13 de outubro de 2023

Entrevistadora: De início, se você puder falar algumas informações iniciais como quando foi
realizada a graduação, as suas formações na área, desde quando trabalha com a psicologia
clínica...

Psicólogo Y: Eu me formei em 2020, seria no primeiro semestre, mas devido à pandemia


ficou para o segundo. E desde então atuo na área. Terminei a graduação em outubro, em
dezembro já comecei na clínica. Só que quando eu estava no oitavo semestre, comecei a fazer
uma formação em psicanálise que eu terminei quase que no mesmo tempo da graduação.

Entrevistadora: E por que você decidiu seguir nessa área da psicologia clínica?

Psicólogo Y: Bom, porque pelo fato de eu atender muitas pessoas na comunidade [religiosa],
na própria questão da escuta, então eu vi que seria muito útil. Era algo que eu gostava, que eu
me identificava, mas que seria muito benéfico também para as pessoas que eu fosse atender,
porque seria algo científico.

Entrevistadora: Certo, então foi para melhorar o que você já fazia?

Psicólogo Y: Sim. Quando eu entrei na faculdade, o intuito foi justamente tentar melhorar
aquilo que eu já fazia, só que diante de tudo que eu fui vendo da psicologia, eu vi que eu me
encontrava mais na psicologia clínica, justamente pelo fato de já exercer um trabalho
parecido na escuta de pessoas.

Entrevistadora: E para você, o que é a psicologia clínica?

Psicólogo Y: Para mim, é uma oportunidade de levar as pessoas à possibilidade de


ressignificar. De ressignificar suas vidas... Talvez eu possa usar também a palavra “curar”.
Muitas realidades que estão feridas, que precisam de uma ressignificação. Existem situações
de pessoas que precisam encontrar até mesmo um sentido para suas vidas, então eu vejo que
na psicologia clínica, principalmente ali no setting terapêutico, é possível levar a pessoa a ir
descobrindo o sentido da vida dela.

Entrevistadora: Você já começou a falar sobre isso quando falou de cura, mas como você vê o
seu papel como um profissional da área da saúde?

Psicólogo Y: Bem, o meu papel eu acredito que é justamente aquele de acolher, de escutar,
mas, acima de tudo, estar ali disponível para o meu paciente. Eu procuro exercer a profissão
da psicologia de uma maneira muito humana, vendo que quem está ali diante de mim –
lembrando até mesmo da psicologia do humanismo – é uma pessoa que sente como eu sinto,
que pensa como eu penso, então eu olho para a pessoa não como uma doença, não como um
diagnóstico quando ela chega até mim com algum diagnóstico, eu olho para ela realmente
como um ser humano, uma pessoa.

Entrevistadora: Aquela frase do Jung, não é?

Psicólogo Y: Isso mesmo. Posso conhecer todas as teorias, mas ao tocar uma pessoa, no caso,
é uma alma que eu estou tocando.

Entrevistadora: Qual o público-alvo e a abordagem?

Psicólogo Y: Bem, eu comecei com a psicanálise, só que chegou em um determinado


momento em que eu comecei a perceber que existiam situações de pacientes que precisavam
de algo que fosse mais além e aí eu comecei a fazer uma formação em terapia
cognitivo-comportamental que, na realidade, estou começando agora, mas como eu tive o
conhecimento lá na faculdade, então eu fui revisar os meus estudos e eu já pude ajudar muitas
pessoas expandindo um pouco mais, não ficando ali na psicanálise, embora existem situações
que chegam até mim que não tem como descartar: tem que ser pela psicanálise, na minha
concepção.

Entrevistadora: Público-alvo não tem especificamente? Você atende todos (crianças,


adolescentes, jovens...)?

Psicólogo Y: Eu atendo adolescentes, jovens, adultos e idosos, mas crianças não.


Entrevistadora: Sobre a abordagem, normalmente se diz que uma abordagem tem muito a ver
com a visão de ser humano que determinada teoria compreende. Como você lida com essas
duas visões que parecem ser diferentes da psicanálise e da TCC?

Psicólogo Y: A psicanálise vê, na realidade, o homem real como o inconsciente, já a TCC vê


toda a realidade também do psíquico, mas também toda a questão do corpo. Eu fiz
especialização em psicologia tomista. Aí entra algo que não é uma abordagem da psicologia,
mas é uma filosofia que, para mim, fez muito sentido porque ela iluminou, porque o ser
humano não é só corpo, não é só inconsciente: nesse ser humano existe também uma alma.
Então para mim fez muito sentido olhar para o ser humano com essa visão. Embora
trabalhando com certas realidades dessas abordagens, olhar para o ser humano como aquilo
que ele é, como uma pessoa humana, para mim, fez muito sentido, porque ali existe uma
unidade, existe uma alma.

Entrevistadora: Bom, por que a escolha pela abordagem ou pelas abordagens, no caso?

Psicólogo Y: No meu caso, a TCC, que é aquela que eu venho ultimamente começando o
processo de formação veio justamente porque eu comecei a perceber que a psicanálise vai até
um certo ponto, mas que há uma necessidade de algo mais e esse algo mais a TCC conseguiu
responder no processo terapêutico com os pacientes.

Entrevistadora: E antes, por que a escolha pela psicanálise?

Psicólogo Y: Antes, primeiro porque eu me senti bastante cativado pela forma como a
professora apresentou a psicanálise e isso me encantou. E, pelo fato de ser da comunidade, e
trabalhar com pessoas principalmente a questão da cura interior, das feridas interiores e de
ver o quanto os traumas realmente influenciam a vida de uma pessoa, eu vi que Freud
conseguia me dar resposta para eu entender muitas coisas que eram as causas, as origens de
inúmeras feridas que vinha de certa forma tratando no plano espiritual, na realidade da fé,
com as pessoas. A psicanálise me ajudou a entender isso.

Entrevistadora: Os seus valores, seus princípios de vida, têm alguma relação com a
abordagem que você escolheu ou a atuação, de maneira geral, na psicologia clínica?

Psicólogo Y: Eu tenho os meus valores e, quando eu comecei na psicanálise, foi muito uma
questão do encantamento com a professora, uma excelente psicóloga, psicanalista, então me
cativou muito, mas com o tempo eu fui percebendo que psicanálise me deixava a desejar em
algumas coisas. Como também me deixa a desejar a própria TCC que eu estou em formação.
O que eu percebo é: o ser humano é algo tão complexo que nenhuma abordagem é capaz de
abraçar.

Entrevistadora: E você como que se utiliza do conhecimento da psicologia tomista para tentar
uma unidade que você não encontra em nenhuma abordagem?

Psicólogo Y: Isso. A psicologia tomista ilumina essas abordagens. Contudo, eu não levo
propriamente toda a filosofia da psicologia tomista, mas para mim, como ela, de certa forma,
me leva a perceber que vai de acordo com os meus valores, então para mim fez muito
sentido.

Entrevistadora: Certo. Você realiza alguma outra atuação profissional além da psicologia
clínica ou realizou em algum momento?

Psicólogo Y: Não.

Entrevistadora: Você considera que a sua formação na graduação em psicologia lhe concedeu
um bom aparato teórico e prático para a sua profissão?

Psicólogo Y: Sim, considero sim. Pelo menos na questão clínica, eu considero realmente,
totalmente. Algumas pessoas falam que ficou alguma deficiência, já ouvi muitos psicólogos
comentarem isso, que a faculdade não ajudou, mas não foi o meu caso. Eu já saí da faculdade
muito seguro, com um bom embasamento, tanto que eu terminei em outubro, comecei em
dezembro e não tive nervosismo, medo ou insegurança, fui muito seguro.

Entrevistadora: Além da graduação, quais as formações que você procurou ter para que
melhor pudesse atuar profissionalmente? Você falou da sua formação em psicanálise e está
iniciando a de TCC, é isso?

Psicólogo Y: Fiz a psicanálise, estou na formação da TCC, fiz especialização em psicologia


tomista, uma formação em atendimento infantil, embora eu não trabalhe com crianças, e fiz
uma pequena formação em trabalho com idosos, e psicologia positiva. É uma mistura. Porque
gosto muito da questão do conhecimento. E, assim, eu vejo o ser humano como algo muito
complexo e, por mais que eu siga uma abordagem, vai chegar o momento em que eu vou
precisar lidar com aquele paciente de uma forma que eu possa ajudá-lo.
Entrevistadora: E quais os cursos ou especializações que você ainda pretende fazer para
agregar no seu trabalho?

Psicólogo Y: Eu pretendo fazer, quando terminar essa formação da TCC, uma pós-graduação
em TCC.

Entrevistadora: Pós-graduação latu sensu?

Psicólogo Y: Isso.

Entrevistadora: Quais as características e habilidades que devem ser prioritariamente


desenvolvidas por um profissional em psicologia clínica?

Psicólogo Y: Para mim é a capacidade de acolher, o transmitir segurança, confiança e,


realmente, acolher de uma forma sem julgamentos, onde a pessoa se sinta segura, à vontade
de falar sem medo de ser julgada diante do que ela está falando.

Entrevistadora: Você considera que essa sua visão tem muito a ver com a psicanálise, no
sentido de deixar a pessoa falar...?

Psicólogo Y: Sim. Sim.

Entrevistadora: Você poderia descrever a sua rotina em uma dia comum? Você chega no seu
consultório, o que é que você faz, se você revisa o que foi feito antes...

Psicólogo Y: Sim. Quando eu chego, sempre dou uma olhada nas minhas anotações dos
pacientes que vou atender naquele dia. Sempre gosto de escrever após cada sessão com os
pacientes aqueles pontos que foram os mais importantes, como também sempre planejo, levo
algo para ir trabalhando com o paciente. Claro, de acordo com o que ele vai me trazer
naquele dia, algo novo, mas eu também procuro levar algo para trabalhar com ele aquilo que
ele trouxe na semana anterior. Seja, por exemplo, na questão de dar uma orientação, uma
folha para preencher para trabalhar uma questão da autoestima, uma pequena tarefa... Como a
TCC normalmente trabalha.

Entrevistadora: Certo. E você anota durante as sessões ou depois?

Psicólogo Y: No primeiro dia que a pessoa vai, aquilo que é o básico, como nome completo,
data de nascimento, eu anoto na hora. Mas normalmente é quando a pessoa sai que eu faço as
anotações daquilo que foi o mais importante e que eu vejo que eu preciso trabalhar nas
sessões seguintes com a pessoa.

Entrevistadora: Entendo. E é só presencial ou online também?

Psicólogo Y: Eu atendo online.

Entrevistadora: E quais os materiais e meios dos quais você se utiliza para a realização do seu
trabalho (internet, livros, testes, jogos, etc)?

Psicólogo Y: Eu utilizo mais filmes. Eu gosto de orientar filmes. Alguns testes também,
poucos. E pequenas tarefas, por exemplo, uma pessoa com ansiedade tem um excesso de
futuro ou de passado; eu gosto muito de trabalhar com ela trazendo a presentificação. Dou
uma folha e peço para ela que descreva tudo o que ela faz em todas as horas do dia, sem
detalhes e é algo para ela, desde que todos os dias ela procure fazer isso, pois vai
presentificando ela e auxiliando muito na questão da ansiedade e eu percebo o quanto isso é
eficaz. Já existem outras pessoas que não gostam de escrever, não gostam dessa espécie de
tarefa, então nesses casos eu vou trabalhando ali mesmo [no setting terapêutico].

Entrevistadora: Quais as principais demandas que chegam ao consultório?

Psicólogo Y: Ansiedade, depressão e desejo de suicídio, muito forte; nos nossos tempos é
algo que vem prevalecendo muito. Agora, há muitos relatos também de abuso sexual.

Entrevistadora: Quais são as principais dificuldades da sua área?

Psicólogo Y: Para mim, falando aqui por mim, eu já me deparei com uma situação de um
caso muito delicado que envolvia situações complicadíssimas e na hora eu fiquei muito tenso:
“E aí, como é que eu vou fazer? Como eu vou lidar com essa situação?”. E aí no dia seguinte
eu já marquei supervisão, porque envolvia relatos de morte e muitas coisas bem complicadas.
Então, por mais que se estude a teoria, quando você chega na prática é totalmente diferente.
Então, dependendo dos relatos que chegam, para mim, alguns geraram um certo temor.
Porque é algo novo, como é que eu vou reagir diante dessa situação?

Entrevistadora: Certo. Então a principal dificuldade seria quando chega algo mais delicado,
inesperado.

Psicólogo Y: Sim. Para mim foi. Por exemplo, algo muito simples, mas foi quando eu atendi
um rapaz com altas habilidades. Ele me trouxe isso e eu sabia que a pessoa com altas
habilidades tem essas altas habilidades em certos pontos, mas em outros têm dificuldade. E
ele era muito bom em matemática; resolveu uma multiplicação grande imediatamente ali. E,
em um primeiro momento, foi um impacto para mim, porque vem aquele sentimento que não
é verdadeiro (“nossa, então ele sabe... [tudo]”), mas quando eu fui conversando com ele, fui
percebendo o outro lado.

Entrevistadora: Certo. Agora sobre o mercado de trabalho. Como é que você avalia para o
clínico hoje?

Psicólogo Y: Eu nem sei te dizer ao certo, porque, como você sabe, eu sou consagrado e eu
não trabalho no tempo integral. Eu atendo nas segundas-feiras à tarde online, e na terça à
tarde e noite e na quinta também.

Entrevistadora: Mas você se utiliza de alguma estratégia de marketing para conseguir


clientes?

Psicólogo Y: Meu maior marketing são os próprios pacientes. Na medida em que eu fui
começando a atender foi passando. Logo nos inícios ainda fazia algumas postagens, mas hoje
pouco faço, porque sempre tem pessoas esperando para os horários em que eu posso atender.

Entrevistadora: Certo. Sobre o trabalho interdisciplinar ou multiprofissional, o que você diria


da importância desse trabalho? Se você trabalha com outros profissionais de outras áreas ou
não.

Psicólogo Y: Sim. Por exemplo, teve uma pessoa que eu comecei a atender e trabalhei muitas
técnicas da TCC com ela, só que ela tinha grandes melhoras, mas eu percebi que ali havia
uma grande obsessão, dos pensamentos. Ela me levava que tinha certeza que o marido era
100% fiel a ela, mas ela tinha um ciúme doentio e tinha certeza também que ele tinha um
envolvimento com a vizinha. E ela dizia: eu sei que isso é loucura da minha cabeça, eu sei
que isso não é real, mas eu acredito que seja. Era uma obsessão. Embora a terapia tenha
ajudado bastante nas três primeiras semanas, chegou um ponto em que ficou muito claro que
ela precisava de uma ajuda medicamentosa. E aí eu encaminhei ela para o psiquiatra. E
realmente, logo que ela começou, deu boas respostas e superou aquela situação.

Entrevistadora: Então seria mais psiquiatras ou alguma outra profissão?

Psicólogo Y: Depende da realidade da pessoa. Teve uma pessoa que foi a questão do
nutricionista. Ela foi ao nutricionista, fez todo o acompanhamento e depois percebeu a
necessidade de fazer uma bariátrica, então teve todo aquele acompanhamento
multidisciplinar.

Entrevistadora: Pronto. Gostaria de dizer mais alguma coisa sobre a atuação do psicólogo
clínico, o seu trabalho, principalmente alguma orientação ou conselho a quem ainda está na
graduação? Enfim, o que você quiser falar...

Psicólogo Y: O conselho, a orientação que eu tenho a dar é que não tenham medo. É muito
importante estar muito presente nas aulas, realmente estudar, porque foi algo que eu fui
fazendo. Foi muito difícil dar conta, mas eu procurei ser muito presente de estudar cada coisa.
E nada do que você estuda se perde. Pelo menos comigo foi assim. Não existe nada que eu
tenha estudado na graduação que eu não tenha precisado na clínica. Quando você começa a
atender as pessoas, você começa a entender que era preciso, mesmo aquelas coisas que não
parecem muito importantes. Até aquele trabalho que é uma visita em algum local, por
exemplo, e você na clínica no futuro vai lembrar que foi lá naquele local, fazendo tal coisa,
que você aprendeu a lidar com aquela situação. Porque é vida. Você vai estar diante de um ser
humano que tem uma vida, então você vai se deparar com mil e uma coisas, é muito legal
isso.

Transcrição da Entrevista III com o Psicólogo Z, em 24 de outubro de 2023

Entrevistador: Bom, por que você decidiu seguir nessa área de Psicologia Clínica?

Psicólogo Z: Eu sou Z, sou psicólogo, tenho 31 anos, sou graduado pela UFC e desde quando
eu entrei na faculdade eu entrei com o desejo de ser psicólogo clínico. O meu imaginário ele
era preenchido para o psicólogo aquele que faz consultas, como um profissional da área da
saúde que realiza consultas. E quando eu entrei na faculdade, esse desejo permaneceu. Toquei
em várias outras áreas, estagiei na escolar, sabia que existia psicólogo na área escolar, sabia
que existia psicólogo do esporte, só que, por exemplo, até na perspectiva do esporte era
perspectiva clínica. Sabia que tinha psicólogo organizacional, sabia que tinha outras áreas que
o psicólogo estava inserindo e conheci tantas outras. Mas... o meu desejo era ir para clínica.
Eu identificava que essa era a minha habilidade. No setting terapêutico. Quando eu... Como
foi que eu decidi isso? Lá na faculdade, na UFC, a gente tem a partir do... do sétimo semestre,
a gente precisa escolher a ênfase. Que é a ênfase em processos clínicos ou processos sociais.
Alguma coisa assim. Eu escolhi processos clínicos. Eu tinha recém-lido o livro do Viktor
Frankl. Já tinha estudado algumas abordagens, mas... quando eu li o livro do Victor Frankl,
foi quando eu me identifiquei. Porque, por exemplo, ao ler as outras abordagens eu fiquei
assim, cara, será que eu vou querer a clínica mesmo? Foi o momento que eu tive a dúvida.
Mas quando eu li o livro do Viktor Frankl, Em Busca de Sentido, que eu conheci a
logoterapia, eu disse, não cara, é, me encontrei. E foi daí que eu consegui, que eu decidi pela
psicologia clínica. Fiz uns estágios, dois estágios, no IPRED. Passei seis meses no IPRED,
passei seis meses em outro lugar que eu não vou me recordar. E o meu último ano da
faculdade foi atendimento clínico. Atendimento clínico na clínica escola. E também foi o ano
que eu comecei a... Eu tinha um colega que era do Núcleo de Psicologia Clínica que, através
do livro do Viktor Frankl, fazia um grupo de estudos no Núcleo de Psicologia Clínica da
UFC, no NUPLIC. Entrei, me engajei no laboratório lá, enfim, me envolvi pra caramba. E eu
tinha um colega lá que ele tinha aberto uma clínica. Então, o meu último semestre da
faculdade foi, eu abri mão da bolsa da faculdade, da bolsa de extensão, e fui ficar lá fazer
estágio voluntário com ele. Eu percebi como é a dinâmica clínica e isso só confirmou esse
meu desejo de ir pra área clínica. Ótimo.

Entrevistador: Pra você, o que é a psicologia clínica?

Psicólogo Z: Cara, a psicologia clínica é o... a área da psicologia onde nós, profissionais,
temos a oportunidade de contribuir não só pro autoconhecimento daquela pessoa que nos
chega, né, pra que ela possa se conhecer, obviamente, a partir da abordagem da metodologia
que é usada, mas ela é uma oportunidade que nós temos de contato direto de acompanhar o
processo de transformação daquela pessoa. Não somos nós quem transformamos aquela
pessoa. Não é aquilo que eu digo, ah, faça isso, faça aquilo. Eu não trago isso pra uma
perspectiva diretiva. Mas é o contato mais próximo que, na minha leitura, nós temos, dentro
das diversas áreas da psicologia, com o cliente e a oportunidade que nós temos de
acompanhar de perto essa transformação. Essa transformação porque a partir do momento
que a pessoa se conhece, a partir do momento que ela... que nós, profissionais, vamos
jogando luz em algumas áreas da vida delas, ela vai tendo insights, ela vai refletindo, ela vai
tomando novas decisões, essa transformação vai acontecendo. E, naturalmente, essa pessoa
vai se tornando uma pessoa melhor. Ela vai respondendo melhor às situações que a vida
apresenta. E é muito gratificante pra mim ver isso. É óbvio que, por exemplo, você percebe
isso em várias áreas. Quem é da escolar percebe isso de outra maneira, quem é da
organizacional, quem é, por exemplo, do esporte, quem é de tantas outras áreas percebe isso.
Mas a vida clínica é aquele momento tipo um a um. É onde a gente toca naquela história de
vida. É naquela pessoa. Não no comportamento. Que aí é o ponto da minha visão de mundo.
Eu não olho só pro comportamento da pessoa. Eu olho pra pessoa que me chega. Ela é um ser
que chegou até mim e eu acompanho a transformação desse ser.

Entrevistador: Bom, qual é o seu público-alvo e abordagem?

Psicólogo Z: Cara, o meu público-alvo hoje, a nível de divulgação de trabalho. Primeiro, um


contexto. Quando eu saí da faculdade, a gente não aprende na faculdade como se divulgar,
como se chegar e tal. Então, você tem aqui pelo menos três tipos de público. Que as pessoas
normalmente sabem. Você tem aquelas pessoas que sabem o que é psicologia e procuram.
Você tem aquelas pessoas que não sabem o que é psicologia e estão passando por algo.
Ouviram de alguém que ela precisa procurar um psicólogo e procuram. E você tem a grande
maioria das pessoas que nem sabem e nem procuram. Que passam por essas questões e nem
sabem e nem procuram. Normalmente essas pessoas levam uma vida funcional. Só que veja,
a psicologia ela é pra todos esses três grupos de pessoas. Então, o primeiro grupo, aquelas
que sabem e procuram. São aquelas pessoas que já estão com um nível de consciência
elevado, tipo assim, preciso me conhecer melhor, eu preciso me trabalhar e tal. Ou então
estou disfuncional, tem algo que não está funcionando. Leu algo, conheceu algo, assistiu uma
palestra, viu um conteúdo, é dessas três que procuram. Esse grupo de pessoas é bem menor.
Então, essas pessoas já procuram um profissional X. Você tem um segundo grupo de pessoas
que são aquelas pessoas que normalmente estão passando por algo. E elas não sabem o que é.
Elas têm ainda um certo receio de procurar o psicólogo e tal. E elas procuram. Normalmente
essas pessoas procuram o profissional pra resolver uma questão pontual. Ela já chega
procurando a abordagem prática. No terceiro grupo de pessoas, passa por situações, pode ser
melhor, mas não sabe como, está num nível de consciência bem reduzido. Não sabe quem
pode ajudá-las, como elas podem ser melhores. E, consequentemente, não procuram. Quando
eu comecei a perceber isso, quando eu saí da faculdade, eu disse assim, cara, tem muita gente
que pode ser alcançada pelo meu trabalho. Porque eu saí como psicólogo generalista da
faculdade. E eu comecei a perceber que, poxa, as vezes a pessoa passa por uma crise no
relacionamento, e o relacionamento dela era bom. Era bom. Só que foi por uma questão
comportamental. Foi por uma questão dela. Se ela compreendesse como é que ela funciona,
onde é que ela pode crescer, onde é que ela pode melhorar, poxa, ela não precisaria passar por
essa crise. Só que ela já passou e ela pode transcender essa crise. Maravilha. E aí, quando eu
comecei a perceber isso, eu comecei a perceber que existem uns nichos de trabalho. E eu
sempre gosto de dizer, não é que o nicho, ele vai reduzir o meu trabalho. Ah, só vou trabalhar
com pessoas que têm problemas de relacionamento. Que eu recebo a pessoa. Eu tenho um
nicho para quem eu canalizo a minha comunicação de trabalho, eu produzo conteúdo, canal
no YouTube, redes sociais. Já fazia antes das redes sociais serem populares. Então, por
exemplo, além de canal no YouTube, Instagram, escrevia textos. Tinha um blog. No início da
minha carreira, eu criei um blog e tudo. Então, essa ideia de agregar valor para as pessoas, de
aumentar o nível de consciência delas. Maravilha. Então, eu recebo a pessoa. Só que eu
utilizo alguns temas. São os temas que eu chamo de porta de entrada. Então, por exemplo,
meu nicho de trabalho, eu trabalho com pessoas que têm certas neuras, como a gente diz no
senso comum. Então, por exemplo, ela lida com auto-sabotagem, ela lida com insegurança,
ela tem aquela ansiedade. Que nenhum desses pontos é disfuncional. Ela está ali num ponto
disfuncional total. Com a saúde completamente prejudicada. Ela tem uma vida funcional, mas
essa vida funcional é prejudicada por essas neuras. Por todas essas questões. Eu digo neuras
não adentrando no termo teórico, técnico da palavra. Da neurose propriamente dito. Mas tem
esses pontos. Auto-sabotagem, insegurança, ansiedade. Em cima disso que eu produzo meu
conteúdo. Mostrando para essas pessoas que é possível você superar as suas neuras. Só que
você supera as suas neuras desenvolvendo a tua personalidade para que você possa enfrentar
os desafios diários. Os desafios diários eles não vão sumir. Aí é a minha abordagem de
trabalho. Respondendo a outra parte da pergunta. Minha abordagem de trabalho é
logoterapia. Uma das coisas que o Viktor Frankl diz é que não somos nós quem questionamos
a vida, mas é a vida que nos apresenta as situações e nós somos chamados a responder da
melhor maneira possível. Então, desenvolver a personalidade para responder as diversas
situações que a vida me apresenta. Então, esse é o meu campo de trabalho. Eu apresento isso
e aí, quando eu me comunico dessa maneira, me chegam pessoas. Minha abordagem de
campo de fundo, de visão de mundo é a da logoterapia. Só que, quem me chega é uma
pessoa. Aí você me pergunta, Z, sua abordagem é da logoterapia? Não. Minha abordagem é a
abordagem de pessoa para pessoa. Porque, para além da leitura na logoterapia, eu tenho
leitura na TCC. Eu tenho leitura na psicanálise. Eu tenho leitura na gestalt. Eu tenho leitura
na análise do comportamento. Eu tenho leitura em todas as outras abordagens. Por quê?
Porque elas são como uma caixa de ferramentas. E a pessoa que me chega, por exemplo, uma
técnica da TCC é eficaz. Só que, quem é que me dá respaldo nisso? A logoterapia. Que me
traz. Que a pessoa, ela é... Não é só o seu campo somático. Ela não é só a sua psique. Mas ela
é uma pessoa. Uma pessoa integral. Que tem uma vontade, que tem as suas faculdades. Que
tem todas essas áreas da vida.

Entrevistador: Muito bem. Por que você fez essa escolha por esse recorte e por essa
abordagem?

Psicólogo Z: Porque... o ponto principal. À medida que eu estudava as abordagens e percebia


cada uma delas, eu percebia que elas eram completamente reducionistas. E eu não vou, como
cliente, chegar e dizer não. Minha crítica, por exemplo, que é a galera só da psicanálise. Que
é a galera da TCC. Por exemplo, quantos clientes eu não recebi aqui na clínica que eu já
venho de um outro profissional, mas eu sinto que ele não aprofundou. Ele ficou... Eu cheguei
pra ele, me passou uns exercícios, ele era da TCC, me passou uns exercícios, ele não
aprofundou comigo. Eu disse assim, cara, o cara conhece a tua história de vida. Ele já te
acompanha. Já tem uma relação terapêutica. Mas ele ficou tão preso à abordagem dele, que
ele não adentrou. Ou seja, já tinha um conflito. O mais difícil. Relação terapêutica. Relação
terapêutica e cliente. O cliente se abriu, partilhou todas as suas questões, só que a terapia não
avançou em questões que o cliente demandava, porque o profissional ficou preso à
abordagem. Quando eu vejo o Viktor Frankl trazer, que é a logoterapia, ela traz esse ponto
que eu preciso olhar pra pessoa como um todo. É justamente isso. Porque quem chega ao
consultório é a pessoa. Não é o comportamento dela. Não é só a cognição dela. Não são as
pulsões dela. E eu percebi que todas essas outras, nas suas visões de mundo, elas eram
reducionistas. Apesar de que elas têm contribuições gigantescas. Então eu peguei as
contribuições delas de intervenção, estudo, mas eu olho pra pessoa.
Entrevistador: Você acha então que muitas vezes os psicólogos se restringem muito em fazer
um trabalho sobre em cima da abordagem, não um trabalho terapêutico em si, visando a
melhora no todo, e sim só praticar a sua abordagem?

Psicólogo Z: É, eu vejo isso. Eu não vejo isso de uma maneira intencional porque os caras
querem fazer isso. Mas é porque é isso que a gente aprende na faculdade. E é isso a questão
que eu trago. Você vai pegar desde o Wundt, quando há todo um processo de desconstrução
da pessoa. Ah, não. Você vai pegar as origens, a epistemologia, todas essas abordagens
terapêuticas, elas olham pro recorte. Ah, não é mente. Ah, é o comportamento. Ah, é só isso.
E aí você vai reduzindo. Você vai reduzindo. E a formação, ela traz essa perspectiva
reducionista e pandeterminista. E aí eu não consigo olhar pra pessoa. Então, eu digo isso.
Acaba que muitos profissionais fazem isso, não porque, entendam, são ruins, não são
capazes. Não, nada disso. É porque a formação, ela traz isso. E, cara, eu te garanto. É...
profissionalmente, é libertador. Quando você olha pra pessoa. É a pessoa que chega. É a
pessoa que tem uma história. Tem um livro que eu gosto muito, que é o Mapa do Mundo
Pessoal, do Julián Marías, e ele vai dizer isso. É a pessoa. É a pessoa que chega. É a pessoa
que tem uma história. Que a gente departamentaliza por questão didática. Ah, agora nós
vamos trabalhar essa área da sua vida. É... Essa área da vida vai ter outros, e outros, e outros.

Entrevistador: Bom, seus valores e princípios de vida têm alguma relação com a sua atuação
nessa área e abordagem?

Psicólogo Z: E aqui entra uma outra questão. Quem atende, cara, é uma pessoa. Eu sou a
minha ferramenta de trabalho. Então eu chegar e dizer assim, olha, eu gosto de usar sapatos
sociais. Entendeu? Óbvio que o sapato social, tem a galera mais do tênis, tem a galera de uma
pegada mais esporte, tem a galera de uma pegada mais social. Você dizer que isso não fala da
tua profissão, é a minha pessoa. A forma como eu me visto traz a minha pessoa, comunica os
meus valores, comunica quem eu sou. Mas aqui eu não estou para ser palco dos meus valores.
Aqui eu estou para acolher aquela pessoa, acolher e escutar primeiro aquela pessoa que
chega. Mas não dá para eu deixar de ser quem eu sou. Isso é uma grande ilusão. Muitos
dizem, ah, você precisa ser, você não vai conseguir, cara. Você não vai conseguir. Agora, não
é um espaço para que eu possa ficar dizendo, você tem que fazer isso, você tem que fazer
aquilo, até porque não vai ser eficaz. Permitam-me usar até esse termo, é burrice o
profissional faz isso. Não é eficaz. Não é eficaz. Mas, eu não vou deixar de ser o Z. O Z que
traz os seus princípios, o Z que traz os seus valores. O Z que, beleza, terminou a sessão.
Digamos que um princípio e valor mesmo, e de fato é. Minha mãe me educou muito, é Z
com todo mundo que você encontrar, diga, com licença, obrigado, por favor. Saúde. Saúde às
pessoas. Isso é da minha pessoa. Aí, beleza, terminou a sessão. Pum. Pô, Y, Boa semana pra
você, cara, tudo de bom. Ah, mas não interessa se na sessão, por exemplo, eu fiz uma
intervenção que o cliente ficou, tipo assim, mexido comigo. O que acontece? Você faz uma
intervenção com o cliente que, pô, ele fica, boa semana, qualquer coisa estamos aqui.
Entendeu? Então, isso também faz parte. Agora as pessoas, elas se prendem muito. Ah, não,
vou me anular, vou deixar de ser quem eu sou.

Entrevistador: Você considera que seus princípios e valores de vida te levaram a ser quem
você é, de ser um psicólogo e de ir pra Logoterapia?

Psicólogo Z: Cara, influenciaram sim. Influenciaram. Mas eu gosto de dizer, eu sou uma
pessoa que gosta de buscar aquilo que é. Eu gosto de contemplar a realidade. E deixar com
que a realidade se mostre pra mim. A realidade é implacável. Então, por exemplo, de início,
só pra você ter ideia, antes de eu conhecer a Logoterapia, eu achei que eu ia ser da AEC,
Análise do comportamento, Análise experimental do comportamento. E aí, eu disse assim,
cara, só que a realidade se impõe pra mim de outra forma. Não é só o comportamento. Você
tá entendendo? Então, não é que eu vou determinar, ah, pronto, sei lá, vou marcar uma pessoa
religiosa. Ah, vai pra Logoterapia. A igrejinha dos profissionais que tem, sei lá, um perfil
mais religioso, vão pra Logoterapia. Não, cara. Não é isso. A realidade se mostra, chega uma
pessoa. E o Viktor Frankl, ele traz um registro da realidade. Assim como os outros
profissionais que tentam trazer os seus registros da realidade. O Viktor Frankl traz o dele. E a
dele bate com o que é a realidade. Chega uma pessoa. Não vou negar aquilo que a pessoa
traz. Entendeu? Não é um ponto de vista. Você tá entendendo? É a realidade que se apresenta.
E não dá pra mudar. Entendi.
Entrevistador: Você realiza alguma outra atuação profissional, além da sua como psicólogo
clínico?

Psicólogo Z: Sim. Tenho uma empresa que trabalha com marketing digital. Não gosto de
dizer marketing digital, porque isso dá a ideia que é apenas divulgação. Mas eu trabalho com
educação online. Então, auxiliando outros profissionais da saúde a transmitirem o seu
conhecimento da melhor forma. Para pessoas do mundo inteiro. Através de treinamentos
online. Através de workshops online. Então, eu tenho esse trabalho. Tanto de estruturação.
Daquele material, daquele trabalho. E de como alcançar as pessoas. Pra que essas pessoas
experimentem desse trabalho. Então, eu tenho uma empresa de educação digital. Não é
educação digital porque não é pra educar pro mundo digital. Mas é uma empresa de
educação. Cujo foco é promover, produzir conteúdo através do mundo digital.

Entrevistador:Você considera que a sua formação na graduação em psicologia lhe concedeu


um bom aparato teórico e prático para a sua profissão?

Psicólogo Z: Não. Não. Porque, primeiro, a formação na minha universidade, na universidade


que eu fiz, ela tem uma influência muito forte somente na psicologia social. Então, tudo que
eu quis da clínica, eu tive que buscar por fora. Primeira coisa. Segunda coisa. Muitos dos
professores, eles esquecem que existe uma psicologia antes do Wundt, e eles anulam isso.
Eles esquecem que a psicologia é filha da filosofia. Tem muita gente que contorce os ouvidos
quando escuta isso. É verdade. Aristóteles estudava psicologia. Ah, mas não é a ciência. E o
que é a ciência? As pessoas não se debruçam nisso. Elas já partem de um ponto como se a
psicologia fosse, sei lá, 1800 e alguma coisa pra cá. E não é assim. Você está entendendo?
Então, a gente estuda na faculdade um recorte. Primeira coisa. E antes de dar um recorte,
estuda de uma maneira generalista demais. Ou seja, tem muita coisa pra se ver. Que eu não
acho que devo retirar, mas acho que pode ser melhor organizado. E aí falta essa perspectiva
mais prática, obviamente. Você percebe que, até porque é uma atuação subjetiva, mas essa
perspectiva mais prática, ela foi chegar pra mim já no final da faculdade, não por promoção
da faculdade. Por mim, eu que fui buscar. Eu fui buscar antes. Eu entrei no Clube Psicologia
e Clínica pra isso. Pra fazer o role play, pra chamar os meus colegas e a gente fazer ensaios
de atendimento, entendeu? Ter outros psicólogos que supervisionavam e tal. Era isso.
Entrevistador:Para você quais formações, cursos, etc. Você procurou ter para que melhor
pudesse atuar profissionalmente?

Psicólogo Z: Cara, eu tenho uma formação em logoterapia. Eu não paro de estudar. Meia
hora, dez minutos, duas horas, quatro horas. Eu estudo todo dia. Porque todo cliente me traz
uma perspectivista. Ah, o estudo é trabalho. Não, cara. O estudo faz parte da minha vida. Eu
gosto. Se eu lido com pessoas, eu preciso conhecer pessoas. Essa é uma das coisas que eu
mais bato na tecla com psicólogos. Por que os psicólogos, na grande maioria, são inseguros?
Porque eles vão buscar um curso para responder uma questão pontual. Só que eu lido com
uma pessoa. Ah, se essa pessoa não se encaixa naquela questão pontual que o curso me
ensinou, eu me perco. Entendeu? Então, eu estou todo momento estudando pessoas. Quais
são essas coisas das pessoas? Como é que as pessoas se comportam? Entendeu? Como é que
elas lidam com as situações? Quais são as situações que elas lidam? Então, por isso que eu
não leio só psicologia. Eu leio literatura. Que é relato de pessoas que viveram antes de nós.
Enfim, amplio o imaginário. Leio sobre abordagens técnicas. Leio sobre diversas coisas.
Dentro de cursos, tem vários. Além de cursos de extensão. Mas, já desde o início, eu entendi
que eu não vou procurar um curso de extensão. Ah, eu tenho pessoas que passam por
transtornos X. Ah, eu vou ler. Se eu precisar fazer um curso disso, eu vou fazer. Para aprender
sobre isso. Mas o estudo, ele é contínuo.

Entrevistador:Você pretende fazer algum curso, alguma especialização agora ou futuramente?

Psicólogo Z: De eu fazer especialização, por um momento, não. Eu estava pensando em fazer


uma. Porque a logística de tempo... Eu me considero uma pessoa muito autodidata. Então,
leio muito. E como eu sou um profissional que, tipo assim... E gosto muito de fazer cursos
online. Até por a minha dinâmica de vida. E como, por exemplo, a titulação não é algo que
impactará na minha realidade profissional. O cliente não vai deixar de confiar mais ou menos
em mim. Porque eu sou pós-graduado. Porque eu tenho um mestrado. Quando eu entendi que
não é uma questão da titulação. Que é a questão do conhecimento e da aplicação dele na
prática. Aí eu me abraço mais a cursos online, aos livros. Certo.

Entrevistador:Quais características e habilidades devem ser prioritariamente desenvolvidas


por um profissional de psicologia clínica?

Psicólogo Z: Acolher e escutar. A gente escuta isso na faculdade inteira. Escutamos isso na
faculdade inteira. E muitas pessoas, elas tropeçam sendo diretivas nos seus valores. Ah, mas
eu não... A gente escuta muito isso, criticando os religiosos. Ah, o cara é católico. Ah, o cara
vai impor os valores dele. Ah, beleza. O cara, o que ele for, ele vai impor os valores dele. Por
quê? Porque ele esqueceu que o mais importante é acolher e escutar. Ah, mas acolher e
escutar não gera resultado. Amigo, que resultado? Entendeu? Acolhe e escuta. E essas são as
habilidades mais difíceis. São cinco anos que eu estou ouvindo a mesma coisa. E eu estou
precisando desenvolver essa habilidade de acolher e escutar. Tu souber acolher e escutar, tu
vai saber fazer uma boa intervenção. Tu vai saber, por exemplo, aplicar o exercício
comportamental para ele realizar. Tu vai saber fazer a intervenção certinha, pra que ele tenha
um insight e ele compreenda.

Entrevistador: Poderia falar um pouco da sua rotina?

Psicólogo Z: Hoje eu atendo terças, quartas e quintas pela manhã. E atendo nas sextas à
tarde. Já fui dono de clínica, loquei salas para outros psicólogos. Hoje trabalho somente com
outra psicóloga. Por conta dessa outra empresa que eu criei. Maravilha. E um ponto
importante. Eu sempre digo, hoje a minha rotina é em vista da minha perspectiva de trabalho,
na minha leitura, é impossível a pessoa atender com qualidade mais do que seis clientes no
dia. Sabe? Com qualidade. Por quê? Porque cada pessoa é única. Não é que ela te suga. Mas é
porque ela demanda de você. Ela demanda atenção e tudo mais. Por exemplo, por isso que eu
atendo pela manhã. E isso foi um ponto. Muitas pessoas saem da faculdade dizendo assim.
Ah não, mas o povo é adulto, só vai procurar à noite. Cara, nunca tive problema de fechar
todos os meus horários pela manhã. Nunca tive problema.
Entrevistador:Você trabalha online ou presencialmente?

Os dois, os dois, né?

Entrevistador: Quais materiais e meios dos quais você se utiliza para a realização do seu
trabalho? Tipo, internet, livros, TED, jogos, etc.

Psicólogo Z: Pronto, eu gosto muito de usar alguns testes psicológicos quando necessário. Eu
gosto de ter as ferramentas acessíveis. Como eu digo, eu olho para a pessoa. Então, eu tenho
a minha caixa de ferramentas aqui. Dentro dessa caixa de ferramentas estão as intervenções e
aquilo que as abordagens trazem. Então, jogos, baralhos, testes psicológicos, até recursos da
sala. Tipo, almofada, tapete, essas coisas. Porque utilizo algumas dinâmicas para contribuir
na intervenção com os clientes.

Entrevistador:Muito bem. Quais as principais demandas que chegam aqui no consultório?

Psicólogo Z: Cara, as principais demandas são pessoas trazendo... a gente precisa diferenciar.
Uma coisa é a queixa, aquilo que ela diz. Outra coisa é aquilo que verdadeiramente é.
Quando você vai entender, é uma coisa mais relacionada à história de vida e tal, etc. Mas as
principais queixas que elas trazem são os sintomas. Elas se sentem ansiosas, elas se sentem
inseguras. Muita questão de ausência de sentido de vida. Muitas pessoas imersas num
materialismo, numa vida material que elas não conseguem encontrar sentido. Seja porque elas
não têm aquilo que elas gostariam de ter e se comparam com outras pessoas e vivem uma
vida vazia. Seja porque elas já têm aquilo que elas gostariam de ter e nada disso preencheu a
vida delas. Entende? Entendi.

Entrevistador:E quais as maiores dificuldades da área?


Psicólogo Z: Cara, a maior dificuldade da área... Assim, hoje eu trabalho ajudando as pessoas
a superar isso. Mas eu sei que a faculdade não ensina o profissional a empreender. E
empreender não é ser capitalista. Empreender é colocar a carreira em desenvolvimento. É
você fazer um bom discernimento se você vai ser CLT, se você vai ser carreira mista ou se
você vai ser apenas um profissional autônomo. Se você vai ser CLT, como que você vai lidar
com isso? Se você vai ter uma carreira mista, como que você vai lidar com isso? Se você vai
ser autônomo, como que você vai lidar com isso? Em todas as áreas. Divulgação do seu
trabalho, gestão financeira. Tem um livro, né? Administração Financeira para Psicólogos. Foi
fruto do meu trabalho disso. Então, empreender é isso. É colocar a carreira em
desenvolvimento. Porque se a tua carreira cresce, mais pessoas são alcançadas por ela. É isso
que as pessoas não entendem. Ah, eu não quero aprender nada sobre isso. Meu irmão, tu tá
jogando o conhecimento, tu tá escondendo o conhecimento. Empreender é colocar a carreira
em desenvolvimento. Isso é o que sempre digo para os meus alunos. Então, primeiro ponto, é
isso. E outra dificuldade na parte do atendimento, é você estar constantemente atento. Por
isso que há a organização da rotina. Por isso que compreender os seus limites. É fundamental.
Por quê? Porque o cliente, ele te contrata pra que tu dê atenção plena a ele. Pra que tu esteja
bem ali. Ou seja, que de fato tu possa estar ali disponível pra ele. E esse é um grande desafio.
Pra que, de fato, você faça valer o tempo que você tem ali com o cliente.

Entrevistador:Como você avalia o mercado de trabalho para a clínica?

Psicólogo Z: Cara, o melhor dos mundos. Todo mundo procura. Principalmente depois da
pandemia. Eu participei ativamente da fundação da Campanha Janeiro Branco. Então, eu vi
quando a Campanha Janeiro Branco começou a surgir. A Campanha Janeiro Branco foi com
o slogan Quem Cuida da Mente Cuida da Vida. Idealizada pelo psicólogo Leonardo Abraão,
de Uberlândia. E ele conseguiu colocar na boca do Brasil essa questão de quem cuida da
mente cuida da vida. Eu tinha me formado, eu conheci o Leonardo Abraão um ano, dois anos
depois, e a campanha surgiu. Antes as pessoas achavam, tinha muita aquela imaginação que
psicólogo é coisa só pra louco. Hoje, as pessoas já tem um nível de consciência e as pessoas
dizem abertamente, pô, vai pra terapia. Quem diz, ah, psicólogo é pra louco, já é corrigido
pelos outros colegas assim, não cara, vai ser bom pra ti. Vai pra terapia. Então as pessoas
querem buscar. Então tem mercado. As pessoas querem buscar profissionais. minha agenda é
lotada, cara. Ah, mas por que de fulano não é? Porque a pessoa precisa ser vista.

Entrevistador: Quais estratégias você utiliza para melhor se colocar no mercado de trabalho?

Psicólogo Z: Produção de conteúdo. Produção de conteúdo. Por quê? É isso que as pessoas
precisam entender de uma vez por todas. Veja só. Ah, mas produção de conteúdo veio com a
pandemia com o Instagram. Não, não veio. Veja só. Esquece a internet. Quem ia, por
exemplo, pra programas de rádio? Pra programas de TV? Quem dava palestras em empresas?
Isso é o que, minha gente? Se não produzir conteúdo gratuito e você ainda tinha que se
deslocar, tinha que se arrumar, tinha um tempo limitado cada tempo de televisão, de
entrevista, a pessoa era vista falando sobre aquele conteúdo. Quem assistia, quem lia aquele
texto que saia no jornal, criava uma empatia com aquela pessoa. E aí, já começava a surgir a
prévia, já tinha-se a prévia da relação terapêutica. Porque a relação terapêutica tem como
pilar fundamental a confiança, a identificação. Então, com a internet tudo se facilitou. Porque
se eu produzo um canal no YouTube, se eu produzo vídeos para o Instagram, se eu faço um
podcast, eu estou distribuindo esse conteúdo para o maior número de pessoas do mundo
inteiro, não só da minha cidade, não só da minha região. Então, eu estou dando oportunidade
para que as pessoas se conectem comigo. Não é aquele marketing direto, venha para a terapia,
eu cobro mais, esse não funciona, é burrice esse também. Por isso que a produção de
conteúdo é fundamental. Agora, ela não é uma coisa para amanhã. É o que as pessoas
querem, as pessoas são muito imediatistas, elas querem ir para amanhã. Eu, desde 2018,
produzo vídeos. Já foram mais de mil vídeos publicados. Fora o conteúdo de carreira para
psicólogo. Então, você aperfeiçoa. Ah, Marco, eu não gosto de vídeos. É uma pena.
Entendeu? Eu acho mais fácil superar essa barreira, do que você ter que utilizar de outros
meios para que as pessoas te conheçam, para que elas tenham pontos de contato com você.
Funciona? Funciona espetacularmente. Mas faz parte, é do ofício. O ofício não é só entregar
o serviço, mas é você divulgar também.

Entrevistador:Para você Z, qual a importância de desenvolver um trabalho interdisciplinar?


Psicólogo Z: Essencial. Eu tenho uma psiquiatra que acompanha os meus clientes. Eu tenho
um educador físico que eu encaminho os meus clientes nutricionistas. Às vezes, o cliente
chega com uma demanda nutricional. Ele tem questões de autoestima, ele tem questões, por
exemplo, de ansiedade, que ele não se alimenta bem. Então, eu encaminho o nutricionista. Às
vezes, o cara não sabe fazer exercício. Ele é fraco, ele não tem disposição, o ciclo circadiano
dele está ruim, ele não dorme direito. Às vezes, é uma pessoa que precisa de uma medicação
de psiquiatra. Então, o trabalho interdisciplinar é fundamental.

Entrevistador: A última pergunta é mais aberta, mas se você gostaria de acrescentar alguma
coisa a mais?

Psicólogo Z: Cara, é só agradecer. Obrigado pela entrevista, obrigado pela escolha. Espero
que eu tenha contribuído. E dizer para os profissionais que a nossa profissão é fundamental
para as pessoas. E é fundamental principalmente aqueles profissionais olharem para a pessoa,
não para recortes dela. Quando você olha para a pessoa, você realiza um bom trabalho. E para
aqueles que pensam que o mercado está difícil, tem muita gente procurando. Agora, é preciso
investir também nesse aprendizado.

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