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RELIGIÃO ROMANA

O ceticismo religioso chegou a ser uma atitude predominante na sociedade


romana em face das guerras e calamidades, que os deuses, apesar de todas as
cerimônias e oferendas, não conseguiam afastar. O historiador Tácito
comentou amargamente que a tarefa dos deuses era castigar e não salvar o
povo romano.
A índole prática dos romanos manifestou-se também na política de conquistas,
ao incorporar ao próprio panteão os deuses dos povos vencidos. Sem teologia
elaborada, a religião romana não entrava em contradição com essas deidades,
nem os romanos tentaram impor aos conquistados uma doutrina própria.
Durante a república, no entanto, foi proibido o ensino da filosofia grega,
porque os filósofos eram considerados inimigos da ordem estabelecida. Os
valores dominantes da cultura romana não foram o pensamento ou a religião,
mas a retórica e o direito.
Com as crises econômicas e sociais que atingiram o mundo romano, a antiga
religião não respondeu mais às inquietações espirituais de muitos e, a partir do
século III a.C., começaram a se difundir religiões orientais de rico conteúdo
mitológico e forte envolvimento pessoal, mediante ritos de iniciação,
doutrinas secretas e sacrifícios cruentos.
Nesse ambiente verificou-se mais tarde a chegada dos primeiros cristãos, entre
eles os apóstolos Pedro e Paulo, com uma mensagem ética de amor e salvação.
O cristianismo conquistou o povo, mas seu irrenunciável monoteísmo chocou-
se com as cerimônias religiosas públicas, nas quais se baseava a coesão do
estado, e em especial com o culto ao imperador. Depois de sofrer numerosas

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perseguições, o cristianismo foi reconhecido pelo imperador Constantino no
ano 313

Antecedentes históricos
Por ocasião do aparecimento do cristianismo, toda a região do mar
Mediterrâneo estava sob o poder de Roma. A Palestina, desde a divisão
entre o reino do norte (Israel) e o do sul (Judá), ocorrida após a morte do
rei Salomão, vinha se enfraquecendo política e socialmente, num processo
que culminou com a queda de Samaria, capital do reino do norte, em 722
a.C. O reino de Judá permaneceu independente até a conquista babilônica,
em 605 a.C. De 586 a 539, os judeus permaneceram em cativeiro na
Babilônia, mas ao ascenderem ao poder os persas promoveram a
restauração, permitiram a manutenção dos costumes religiosos e culturais
dos judeus e autorizaram a volta de muitos deles para Judá. Depois do
cativeiro na Babilônia a região de Judá passou a ser chamada de Judéia.
Em 333 a.C., os gregos, com Alexandre o Grande, subjugaram os persas e
incluíram a Palestina nos domínios macedônicos. Após a morte de
Alexandre, em 323, o vasto império foi dividido entre seus generais e
surgiram, após vários anos de luta, quatro grandes reinos ou impérios, dos
quais os mais importantes eram o Egito e a Síria. A Palestina, situada entre
os dois, servia como passagem estratégica durante as freqüentes campanhas
militares. A Judéia, cuja existência social, política e religiosa se
concentrava na cidade de Jerusalém, pagava tributos ao Egito e à Síria. No
ano 198 a.C., o rei selêucida Antíoco III tomou toda a região, passando a
Judéia ao domínio da Síria.
Em 175 a.C., subiu ao trono sírio Antíoco Epífanes, filho de Antíoco III,

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que se envolveu quase de imediato numa guerra com o Egito, da qual
nunca saiu completamente vitorioso, sobretudo pelo apoio que os líderes
religiosos judeus, principalmente os escribas, davam aos egípcios. Religião
e política estavam unidas na Judéia, onde o sumo sacerdote presidia tanto
os sacerdotes no grande templo quanto os anciãos no sinédrio, tribunal que
julgava as questões criminais ou administrativas. Resolvido a castigar os
judeus, Antíoco avançou sobre Jerusalém, derrubou seus muros e saqueou
o templo, levando os vasos sagrados. Para acabar com a religião judaica,
um obstáculo à submissão dos judeus, proibiu todas as formas de culto a
Iavé e deu início a perseguições. O templo de Jerusalém foi profanado com
a construção de um altar pagão sobre o altar dos holocaustos.
Contra essa profanação revoltaram-se os macabeus (ou asmoneus), assim
como todos os judeus devotos, que se reuniram nas montanhas para
organizar a luta contra os sírios. O movimento se generalizou e a guerra
religiosa se transformou rapidamente numa série de triunfos. Jerusalém foi
retomada e o templo reconsagrado em dezembro de 165 a.C. Quatro anos
mais tarde, no entanto, um poderoso exército sírio derrotou os macabeus,
que apenas puderam manter-se, como pequeno grupo rebelde, em
Micmash.
Esse grupo aos poucos recuperou a confiança dos judeus e estendeu sua
influência e poder, principalmente sob João Hircano, e chegou a dominar
quase toda a Palestina, exceto o norte da Galiléia, conquistada mais tarde
por Aristóbulo, filho de Hircano. Os saduceus apoiavam os rebeldes, mas
os fariseus, ou separatistas, desaprovavam a política de Hircano por causa
dos acordos que fez com Roma. Contra a ascensão de Alexandre Janeu,
que acumulou os cargos de rei e sumo sacerdote, os fariseus se revoltaram,
provocando violenta guerra civil, que durou vários anos, ora com a

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supremacia destes, ora dos saduceus. A luta somente terminou com a
tomada de Jerusalém por Pompeu, em 63 a.C., o que tornou os judeus
súditos de Roma.
Pompeu nomeou o edomita (descendente de Esaú) Antípatro procurador da
Judéia. Sucedeu-lhe o filho Herodes o Grande (47 a.C.), que, para
conquistar a simpatia do povo, reconstruiu com grande esplendor o templo
de Jerusalém. Jesus teria nascido durante seu reinado, provavelmente no
ano 6 da era cristã. O massacre dos inocentes, em Belém, ocorreu sob
Herodes.
O reino de Herodes foi dividido, em testamento, entre três de seus filhos:
Arquelau (Judéia e Samaria), Herodes Antipas (Galiléia e Peréia) e Filipe
(Ituréia e Traconítides). Arquelau exilou-se no ano 6 de nossa era e seu
território passou a ser administrado por procuradores romanos, dos quais o
quinto seria Pilatos. Herodes Antipas governou até o ano 39, quando foi
destituído e desterrado, e Filipe morreu sem herdeiros em 34. Herodes
Agripa I, neto de Herodes o Grande e protegido de Calígula, conseguiu
reunificar o reino do avô

Entre as religiões monoteístas, o cristianismo é, sem dúvida, a que conta com


maior número de fiéis e a que está mais difundida em todo o mundo. Nascida
dos ensinamentos de Cristo como prolongamento e superação do judaísmo, no
curso de sua evolução histórica viu dela se formarem três grandes ramos: a
Igreja Católica, as igrejas protestantes e as igrejas ortodoxas. Embora divirjam
em importantes aspectos doutrinários, essas três vertentes permanecem
irmanadas por sua crença no caráter divino da revelação de Jesus, na
existência de um Deus único em três pessoas, iguais em natureza e dignidade,
que criou o mundo do nada, e nos princípios essenciais da cristandade: amor a

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Deus sobre todas as coisas, traduzido necessariamente no amor ao próximo, e
a fé na chegada do reino de Deus.
Além disso, o cristianismo em seu conjunto se distingue das demais religiões
monoteístas por ser a única que proclama a realidade de um homem-Deus,
Jesus Cristo, Deus ele mesmo, encarnado em forma humana para realizar a
vinculação mística e real de toda a humanidade com o Criador.
Os três ramos do cristianismo têm também um mesmo livro sagrado, a Bíblia,
e acrescentam ao Antigo Testamento judaico o Novo Testamento, que
compreende os Evangelhos e outros livros posteriores ao nascimento de Jesus.
Convém assinalar, não obstante, que a Igreja Católica reconhece um maior
número de livros canônicos no Antigo Testamento em relação ao texto
protestante, que coincide praticamente com o hebreu. Desde o princípio do
século XX, porém, iniciou-se um vigoroso movimento ecumênico, destinado
em princípio a estreitar os laços entre as diversas igrejas protestantes, que não
tardaria a despertar o interesse e o crescente apoio das igrejas ortodoxas e da
Igreja Católica.
O termo "igreja", de origem bíblica, tem um significado original de
comunidade, mas alude de forma especial à realidade transcendente da união
de todos os crentes num só corpo com o Cristo ressuscitado. Sua fundação,
anunciada por Jesus em suas palavras a Simão Pedro -- "Tu és Pedro e sobre
esta pedra edificarei minha igreja" (Mateus 16:18) -- remonta tradicionalmente
ao dia de Pentecostes. Quando, depois da ressurreição de Cristo, o Espírito
Santo desceu sobre os apóstolos, inspirou neles sua graça e lhes concedeu
dons excepcionais, como o conhecimento de línguas estrangeiras, para que
percorressem o mundo e pregassem a palavra divina do Evangelho.
A pregação dos discípulos, segundo se relata nos Atos dos Apóstolos e nas
epístolas de São Paulo, um dos apóstolos, estendeu-se paulatinamente pelo

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mundo hebreu, pelo leste do Mediterrâneo e, no final, a todo o Império
Romano e à própria Roma, cuja primeira comunidade cristã foi presidida por
Pedro. A figura de Paulo foi decisiva nesse período, pois a ele se deve a
elaboração de uma filosofia cristã do mundo, a organização das primeiras
igrejas e a insistência no ecumenismo ou universalidade da mensagem cristã,
dirigida a todos os homens e não só ao povo hebreu.
Apesar das condenações e perseguições levadas a cabo pelos governantes
romanos, a mensagem de fraternidade do cristianismo, sua invocação a uma
vida simples e moral, e sua promessa de imortalidade favoreceram a rápida
expansão da nova religião, julgada a princípio apenas como mais um dos
credos salvacionistas orientais que se disseminavam pelo Império Romano.
No final do século I, o Novo Testamento já estava escrito e os fundamentos
básicos da igreja cristã, em particular a universalidade e a exigência de
unidade doutrinária, orgânica e sacramental, se encontravam fixados

O medo do desconhecido e a necessidade de dar sentido ao mundo que o cerca


levaram o homem a fundar diversos sistemas de crenças, cerimônias e cultos
-- muitas vezes centrados na figura de um ente supremo -- que o ajudam a
compreender o significado último de sua própria natureza. Mitos, superstições
ou ritos mágicos que as sociedades primitivas teceram em torno de uma
existência sobrenatural, inatingível pela razão, equivaleram à crença num ser
superior e ao desejo de comunhão com ele, nas primeiras formas de religião.
Religião (do latim religio, cognato de religare, "ligar", "apertar", "atar", com
referência a laços que unam o homem à divindade) é como o conjunto de
relações teóricas e práticas estabelecidas entre os homens e uma potência
superior, à qual se rende culto, individual ou coletivo, por seu caráter divino e
sagrado. Assim, religião constitui um corpo organizado de crenças que

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ultrapassam a realidade da ordem natural e que tem por objeto o sagrado ou
sobrenatural, sobre o qual elabora sentimentos, pensamentos e ações.
Essa definição abrange tanto as religiões dos povos ditos primitivos quanto as
formas mais complexas de organização dos vários sistemas religiosos, embora
variem muito os conceitos sobre o conteúdo e a natureza da experiência
religiosa. Apesar dessa variedade e da universalidade do fenômeno no tempo e
no espaço, as religiões têm como característica comum o reconhecimento do
sagrado (definição do filósofo e teólogo alemão Rudolf Otto) e a dependência
do homem de poderes supramundanos (definição do teólogo alemão Friedrich
Schleiermacher). A observância e a experiência religiosas têm por objetivo
prestar tributos e estabelecer formas de submissão a esses poderes, nos quais
está implícita a idéia da existência de ser ou seres superiores que criaram e
controlam o cosmos e a vida humana.
Aquelas características, que de certa forma não distinguem uma religião de
outra, levaram ao debate sobre religião natural e religião revelada, o que
recebeu significação especial nas teologias judaica e cristã. O americano
Mircea Éliade, historiador das religiões, denominou "hierofania" a essa
manifestação do sagrado, ou seja, algo sagrado que é mostrado ao homem.
Seja a manifestação do sagrado uma pedra ou uma árvore, seja a doutrina da
encarnação de Deus em Jesus Cristo, trata-se sempre de uma hierofania, de um
ato misterioso que revela algo completamente diferente da realidade do mundo
natural, profano.
Por mais que a mentalidade ocidental moderna possa repudiar certas
expressões rudimentares ou exóticas das religiões primitivas, na realidade a
pedra e a árvore não são adoradas enquanto tais, como expressões de algo
sagrado, que paradoxalmente transforma o objeto numa outra realidade. O
sagrado e o profano configuram duas modalidades de estar no mundo e duas

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atitudes existenciais do homem ao longo de sua história. Contudo, as reações
do homem frente ao sagrado, em diferentes contextos históricos, não são
uniformes e expressam um fenômeno cultural e social complexo, apesar da
base comum.
Embora não seja fácil elaborar uma classificação sistemática das religiões,
pode-se agrupá-las em duas categorias amplas: religiões primitivas e religiões
superiores. Nessa divisão, o qualificativo superior refere-se ao
desenvolvimento cultural e não ao nível de religiosidade
O período do Iluminismo (séculos XVII-XVIII) proclamou o culto à deusa
razão e a revolução francesa ajudou a organizá-lo.
As religiões monoteístas professam a crença num Deus único,
transcendente -- distinto e superior ao universo -- e pessoal. Um dos
grandes problemas do monoteísmo é a explicação da existência do mal no
mundo, o que levou diversas religiões a adotarem um sistema dualista, o
maniqueísmo, fundado nos princípios supremos do bem e do mal.
As grandes religiões monoteístas são o judaísmo, o cristianismo -- que
professa a existência de um só Deus, apesar de reconhecer, como mistério,
três pessoas divinas -- e o islamismo

Fim da República Romana mancha imagem de Pio IX


Agência France Presse
ROMA – A implacável destruição da República Romana (fevereiro-
julho de 1849) pelas tropas francesas, que foram chamadas por Pio
IX, escolhido como sumo pontífice em 1846, aparece como uma
mancha sangrenta no seu pontificado.
Pelo menos mil patriotas italianos das tropas republicanas dirigidas por
Giuseppe Garibaldi, entre os quais Goffredo Mameli, autor do hino

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nacional Fratelli d’Itália, morreram nos combates contra o exército
francês do general Nicolas Oudinot, em junho de 1849.
Assim, o papa Pio IX, que havia se exilado voluntariamente em Gaeta
(na época, reino de Nápoles) em novembro de 1848, por medo da
insurreição popular, pôde voltar a mandar em Roma.
Durante mais de 20 anos protegido pela França, Pio IX lutou com
todas as suas forças contra a unidade da Itália. Finalmente, em 20 de
setembro de 1870, as tropas italianas entraram em Roma e a
proclamaram capital da Itália.
Considerando-se “prisioneiro no Vaticano”, Pio IX seguiu reclamando
até sua morte, em 1878, a restauração do poder temporal do papa,
incentivando os católicos de todo o mundo a lutar contra a jovem Itália,
fundada em 1861.
Para o dia 3 de setembro, data escolhida para a sua beatificação,
estão previstas várias manifestações em memória à destruição da
República Romana em 1849. O senador Stelio de Carolis convocou
uma manifestação em frente à prisão de Forli (centro), “onde os
patriotas garibaldinos foram fuzilados por ordem de Pio IX

João e Pio: épocas e perfis bem diferentes


por Nara Lúcia
Da Editoria de Cidades
Os papas Pio IX e João XXIII eram muito diferentes. Pio IX, cujo
pontificado de 32 anos é o mais longo da Igreja, era tido como
fechado. João XXIII, eleito com 77 anos, só ficou no cargo cinco anos.
Nesse curto período surpreendeu o mundo ao convocar o Concílio
Vaticano II, de 1962 a 63, que abriu a Igreja para a modernidade ao

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aprovar liturgia mais simples e popular, maior comunicação com o
povo, aproximação com outras religiões, preocupação com a solução
dos problemas socioeconômicos, entre outras diretrizes.
“O papa buono (bondoso), aberto, com o coração grande e acolhedor,
modelo dos vigários e que amava os fiéis”, assim dom Irineu Roque
Scherer, bispo de Garanhuns, define João XXIII. “Tido como papa de
transição, pela idade avançada quando eleito, terminou ficando
conhecido como o papa da abertura, por ter convocado o Vaticano II,
que renovou a Igreja. Não se esperava dele esse gesto”, diz. dom
Irineu frisa que os discursos de João XXIII, na Praça de São Pedro, no
Vaticano, eram uma catequese de pai para filho.
O bispo de Floresta, dom Adriano Vasino Ciocca, também destaca em
João XXIII a convocação do Vaticano II. “Foi, com certeza, um ato
profético que proporcionou uma Igreja mais aberta para a realidade
atual”, Era uma pessoa carismática, de grande espiritualidade”,
observa. O bispo aponta como qualidades do papa o carisma, a
grande espiritualidade e a comunicação com as pessoas.
Para frei Aloísio Fragoso, superior dos franciscanos no Nordeste, João
XXIII foi um papa simples, simpático, humano. “Abriu a Igreja para o
mundo moderno com o Concílio Vaticano II, acontecimento mais
importante deste século para a Igreja”, diz.
O teólogo Inácio Strieder, chefe do Departamento de Filosofia da
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), vê João XXIII como
responsável pelo fim de uma Igreja burocratizada, longe do povo, e
início de uma Igreja inserida no meio popular. “Ele se preocupava com
os sinais dos tempos. Gostava de ter contato direto com as pessoas,

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de participar da vida social. Não foi somente o papa de transição. Foi o
papa que deu o ponto de partida para uma nova forma de ser Igreja”
Pio IX, para dom Irineu, era um santo de Deus, que sofreu demais por
ter seu pontificado atravessado uma época de grandes tensões. “Era o
início da abertura para o modernismo, da revolução industrial, época
em que o homem era muito explorado. Pio IX foi envolvido pela
independência da Itália, processo que levou à perda de territórios da
Igreja. Ele queria o retorno das terras e terminou se exilando para não
morrer. Tornou-se uma pessoa acuada, depressiva, mas era aberto
para a época”, conta.
“O contrário de João XXIII em termos de mentalidade”, é como frei
Aloísio vê Pio IX. “Fechou as portas da Igreja para a modernidade.
Tanto é assim que exigia juramento antimodernista de todos os
candidatos ao sacerdócio, antes da ordenação. Foi o responsável pelo
dogma da infalibilidade papal, durante a realização do Concílio
Vaticano I. Transformou a Igreja em fortaleza quanto aos avanços do
modernismo”.

CAPÍTULO XIV
Situação da Igreja no Oriente antes de Carlos Magno.
Querelas a respeito das imagens.
Revolução de Roma iniciada.
Que os usos da Igreja grega e da latina tenham sido diferentes como suas
línguas; que as liturgias, que os vestuários, os ornamentos, a forma dos
templos, a da cruz não tenham sido os mesmos; que os gregos orassem de pé,
e os latinos de joelhos não é o que eu examino. Esses diferentes costumes não
levaram a um confronto entre Oriente e Ocidente; eles serviam unicamente a

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alimentar a aversão natural das nações que se tornaram rivais. Os gregos
sobretudo, que jamais aceitaram senão o batismo por imersão, mergulhando
nas cubas dos batistérios, odiavam os latinos, que, a favor dos cristãos
setentrionais, introduziram o batismo por aspersão. Essas oposições, porém,
não suscitaram nenhuma desordem.
O poder temporal, esse eterno motivo de discórdia no Ocidente, foi
desconhecido às Igrejas do Oriente. Os bispos sob os olhos do soberano
permaneceram súditos; mas outras querelas não menos funestas foram
provocadas ali por essas disputas intermináveis nascidas do espírito sofístico
dos gregos e de seus discípulos.
A simplicidade dos primeiros tempos desapareceram sob o grande número de
questões que concebeu a curiosidade humana; pois o fundador da religião não
tendo jamais escrito nada, e os homens querendo saber tudo, cada mistério fez
surgir opiniões, e cada opinião custou sangue.
É uma coisa muito notável que, das quase oitenta seitas que haviam
atormentado a Igreja desde seu nascimento, nenhuma tivera um romano por
autor, a excetuar-se Novaciano, que ainda mal podemos considerar como um
herético. Nenhum romano, nos cinco primeiros séculos, foi contado, nem entre
os pais da Igreja, nem entre os heresiarcas. Parece que eles não foram senão
prudentes. De todos os bispos de Roma, houve um único que favoreceu um
desses sistemas condenados pela Igreja: foi o papa Honório I. Ele ainda é
acusado, todos os dias, de ter sido monotélita. Imagina-se por aí desonrar sua
memória; mas se nos dermos o esforço de ler sua famosa encíclica pastoral,
em que atribui apenas uma vontade a Jesus Cristo, perceberemos um homem
muito equilibrado. «Nós confessamos», ele diz, «uma única vontade em Jesus
Cristo. Não constatamos que os concílios nem a Escritura nos autorizem a
pensar de outra forma; saber, porém, se, por causa das obras de divindade e de

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humanidade que estão nele, devemos entender uma operação ou duas, é o que
eu deixo aos gramáticos, e é o que interessa pouco.»
Talvez nada exista de mais precioso em todas as missivas dos papas do que
essas palavras. Elas nos convencem de que todas as disputas dos gregos eram
disputas de palavras, e que deveriam ter sido abafadas essas querelas de
sofistas cujas conseqüências foram tão funestas. Se tivessem

Cap. XIV - 83
sido deixadas aos gramáticos, como o deseja esse pontífice judicioso, a Igreja
teria ficado em uma paz inalterável. Mas desejou-se saber se o Filho era
consubstancial com o Pai, ou apenas da mesma natureza, ou de uma natureza
inferior; o mundo cristão foi dividido, uma metade perseguiu a outra, e foi por
ela perseguida. Desejou-se saber se a mãe de Jesus Cristo era a mãe de Deus
ou de Jesus; se o Cristo possuía duas naturezas e duas vontades em uma
mesma pessoa, ou duas pessoas e uma vontade, ou uma vontade e uma pessoa;
todas essas disputas, nascidas em Constantinopla, em Antioquia, em
Alexandria, excitaram sedições. Um partido anatematizava o outro; a facção
dominante condenava ao exílio, à prisão, à morte e às penas eternas após a
morte, a outra facção, que se vingava por sua vez com as mesmas armas.
Desordens semelhantes não tinham sido conhecidas na antiga religião dos
gregos e dos romanos, que chamamos de paganismo; a razão disso é que os
pagãos em seus erros grosseiros não possuíam dogmas, e que os sacerdotes
dos ídolos, ainda menos os seculares, jamais se reuniram juridicamente para
disputar.
No oitavo século, discutiu-se nas igrejas do Oriente se convinha prestar culto
às imagens: a lei de Moisés o proibira claramente. Essa lei nunca havia sido
revogada; e os primeiros cristãos, durante mais de duzentos anos, também

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nunca toleraram imagens em suas reuniões.
Pouco a pouco, o costume de trazer consigo crucifixos penetrou em toda parte.
Em seguida, conservaram-se os retratos verdadeiros ou falsos dos mártires ou
dos confessores. Não havia ainda altares erigidos aos santos, nem missas
celebradas em seu nome. Simplesmente, à vista de um crucifixo e da imagem
de um homem de bem, o coração, que sobretudo nesses climas tem
necessidade de objetos sensíveis, incitava à devoção.
Esse uso penetrou nas igrejas. Alguns bispos não o adotaram. Percebe-se que,
em 393, Santo Epífânio arrancou de uma igreja da Síria uma imagem diante da
qual se orava. Ele declarou que a religião cristã não permitia esse culto; e sua
severidade não causou cisma.
Enfim, essa prática piedosa degenerou em abuso, como todas as coisas
humanas. O povo, sempre grosseiro, não distinguiu entre Deus e as imagens:
logo chegou-se a lhes atribuir virtudes e milagres: cada imagem curava uma
doença. Foram confundidas até com os sortilégios, que quase sempre seduziu
a credulidade do vulgo; não digo somente o vulgo do povo, mas o dos
príncipes, e ainda o dos eruditos.
Em 727, o imperador Leão o Isauriano quis, por persuasão de alguns bispos,
desenraizar o abuso; mas, por um abuso talvez maior, ele mandou apagar
todas as pinturas; demoliu as estátuas e as representações de Jesus Cristo com
as dos santos. Subtraindo aos povos assim, de uma só vez, os objetos de seu
culto, ele os levou à revolta: pessoas desobedeceram, e ele as perseguiu;

Cap. XIV - 84
tornou-se tirano por haver sido imprudente. É vergonhoso para nosso século
que haja ainda compiladores e declamadores como Maimbourg, que repetem
essa antiga fábula, que dois judeus tinham predito o império a Leão, e exigido

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dele que abolisse o culto das imagens, como se houvesse importado a judeus
que os cristãos possuíssem ou não figuras em suas igrejas. Os historiadores
que acreditam que se pode dessa forma predizer o futuro são bem indignos de
escrever o que é passado.
Seu filho Constantino Coprônimo mandou transformar-se em lei civil e
eclesiástica a abolição das imagens. Dirigiu em Constantinopla um concílio de
trezentos e trinta e oito bispos, que proscreveram em voz comum esse culto,
aceito em diversas igrejas, e sobretudo em Roma.
Esse imperador teria desejado abolir tão facilmente os monges dos quais
sentia horror, e que não chamava senão de abomináveis; porém não o pôde
conseguir: esses monges, já muito ricos, defenderam mais habilmente seus
bens do que as imagens de seus santos.
Os papas Gregório II e III, e seus sucessores, inimigos secretos dos
imperadores, e abertamente discordantes de suas doutrinas, não aplicaram
todavia essas espécies de excomunhão, depois tão freqüente e delicadamente
empregadas. Mas fosse que esse velho respeito pelos sucessores de César
ainda contivesse os metropolitanos de Roma, fosse antes que percebessem
quanto essas excomunhões, essas interdições, essas dispensas do juramento de
fidelidade seriam menosprezadas em Constantinopla, onde a igreja patriarcal
se igualava pelo menos à de Roma, os papas realizaram dois concílios, em 728
e em 732, em que se decidiu que todo inimigo das imagens seria
excomungado, sem nada além disso, e sem falar do imperador. Eles pensaram
desde então mais em negociar do que em disputar. Gregório II se tornou
senhor dos negócios em Roma, enquanto que o povo sublevado contra os
imperadores não mais pagava os tributos. Gregório III se conduziu segundo os
mesmos princípios. Alguns autores gregos posteriores, desejando tornar os
papas odiosos, escreveram que Gregório II excomungou e depôs o imperador,

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e que todo o povo romano reconheceu Gregório II por seu soberano. Esses
gregos não pensavam que os papas, que eles desejavam fazer considerar como
usurpadores, teriam sido desde então os príncipes mais legítimos, que teriam
obtido seu poder dos sufrágios do povo romano: e teriam sido soberanos de
Roma com mais fundamento que muitos imperadores. Mas não é nem
verossímil nem exato que os romanos, ameaçados por Leão o Isauriano,
constrangidos pelos lombardos, tivessem eleito seu bispo como único senhor,
quando tinham necessidade de guerreiros. Se os papas houvessem possuído
desde essa época direito à ordem dos Césares, eles não teriam, depois,
transferido esse direito a Carlos Magno

Cap. XX - 104
CAPÍTULO XX

Da religião da época de Carlos Magno.


Se nós começarmos atualmente a considerar os males que os homens
suscitaram ao fazer da religião um instrumento de suas paixões, os usos
consagrados, os abusos desses usos, a querela dos iconoclastas e dos
iconólatras é, de início, o que apresenta o maior tema.
A imperatriz Irene, tutora de seu desventuroso filho Constantino
Porfirogeneto, para abrir para si o caminho do império, lisonjeia o povo e os
monges, aos quais o culto das imagens, proscrito por tantos imperadores
depois de Leão o Isáurio, agradava ainda. Ela própria lhe era afeita, porque
seu marido lhes tinha horror. Persuadiram Irene de que, para governar seu
esposo, era necessário colocar sob a cabeceira de seu leito as imagens de
certos santos. A credulidade também entra nos espíritos políticos. O
imperador, seu marido, punira os autores dessa superstição. Irene, após a
morte de seu marido, deu livre curso a seu discernimento e ambição. Eis aqui
o que reúne, em 786, o segundo concílio de Nicéia, sétimo concílio
ecumênico, iniciado primeiro em Constantinopla. Ela fez eleger por patriarca
um leigo, secretário de estado, de nome Taraise. Houvera outrora alguns
exemplos de seculares elevados assim ao bispado sem passar pelos outros
degraus; mas, à época, esse costume não subsistia mais.
Esse patriarca abriu o concílio. A conduta do papa Adriano é muito notável:
ele não anatematizou esse secretário de estado que se fazia patriarca; protestou

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simples e modestamente, em suas cartas a Irene, contra o título de patriarca
universal; mas insiste que se lhe dêem os patrimônios da Sicília. Reclama
altivamente esse pouco de bens, ao passo que extirpava, assim como seus
antecessores, o domínio útil de tantas terras magníficas que ele assegura
haverem sido doadas por Pepino e por Carlos Magno. Enquanto isso, o
concílio ecumênico de Nicéia, ao qual presidem os legados do papa e esse
ministro patriarca, restabelece o culto das imagens.
É um fato reconhecido por todos os sábios críticos que os padres desse
concílio, que eram em número de trezentos e cinqüenta, relataram ali muitos
documentos evidentemente falsos, muitos milagres cuja narração causaria
escândalo em nossos dias, muitos livros apócrifos. Esses documentos falsos
não prejudicaram os verdadeiros, segundo os quais foram tomadas as decisões.
Quando, porém, foi necessário fazer aceitar esse concílio a Carlos Magno e às
igrejas de França, qual não foi o embaraço do papa! Carlos se havia declarado
francamente contrário às imagens. Ele acabava de mandar escrever os livros
que se chamam Carolinos, nos quais esse culto é anatematizado. Esses livros
estão escritos em um latim bastante puro; eles deixam ver que Carlos

Cap. XX - 105
Magno tivera êxito em fazer reviver as letras; mas também dão a perceber que
jamais houve disputa teológica sem invectivas. O próprio subtítulo é uma
injúria: «Em nome de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, começa o livro
do ilustríssimo e excelentíssimo Carlos etc., contra o sínodo impertinente e
arrogante celebrado na Grécia para adorar imagens». O livro era atribuído pelo
título ao rei Carlos, como se colocam sob o nome dos reis os editos que eles
não redigiram. É certo que todos os povos dos reinos de Carlos Magno
consideravam os gregos como idólatras.
Esse príncipe, em 794, reuniu um concílio em Frankfurt, ao qual ele presidiu,
segundo o uso dos imperadores e dos reis: concílio composto de trezentos
bispos ou abades, tanto de Itália quanto de França, que rejeitaram por um
consentimento unânime o serviço (servitium) e a adoração das imagens. Essa
palavra equívoca de adoração era a fonte de todas essas divergências, porque
se os homens definissem as palavras que eles empregam, haveria menos
disputas: e mais de um reino foi perturbado por um mal-entendido.
Enquanto o papa Adriano enviava para a França as escrituras do segundo
concílio de Nicéia, ele recebe os livros Carolinos, opostos a esse concílio; e é
incitado em nome de Carlos a declarar heréticos o imperador de
Constantinopla e sua mãe. Percebe-se suficientemente por essa conduta de
Carlos que ele queria fazer-se um novo direito sobre a pretensa heresia do
imperador, para lhe tirar Roma sob pretexto de justiça.

17
O papa, dividido entre o concílio de Nicéia que ele aprovava, e Carlos Magno
que ele manejava, escolheu um temperamento político, que deveria servir de
exemplo em todas essas disputas deploráveis que sempre dividiam os cristãos.
Explica os livros Carolinos de um modo favorável ao concílio de Nicéia, e por
esse meio refuta o rei sem lhe desagradar; consente em que não se preste culto
às imagens, o que era muito razoável entre os germanos mal saídos da
idolatria, e entre os francos, ainda grosseiros, que não tinham nem escultores
nem pintores. Exorta ao mesmo tempo a não quebrar essas mesmas imagens.
Dessa maneira, satisfazia a todos, e deixava ao tempo o confirmar ou abolir
um culto ainda duvidoso. Aplicado em manejar os homens e em fazer servir a
religião a seus interesses, escreve a Carlos Magno: «Não posso declarar Irene
e seu filho heréticos, após o concílio de Nicéia, mas eu os declararei como
tais, se me não restituírem os bens da Sicília».
Nota-se a mesma política interesseira desse papa em uma disputa ainda mais
delicada, e que, sozinha, teria sido suficiente em outras épocas para acender
guerras civis. Tinha-se desejado saber se o Espírito Santo procede do Pai e do
Filho, ou do Pai unicamente.
Havia-se de início, no Oriente, acrescentado ao primeiro concílio de Nicéia
que ele procedia do Pai. Em seguida na Espanha, na França e na Alemanha,
acrescentou-se que ele procedia do Pai e do Filho; era a crença de quase todo
o império de Carlos. Essas palavras do Símbolo atribuído aos apóstolos: qui
ex Patre Filioque procedit eram sagradas para os francos

Cap. XX - 106
mas essas mesmas palavras nunca tinham sido adotadas em Roma.
Constrangeu-se o papa, da parte de Carlos Magno, a se manifestar. Essa
questão, decidida com o tempo pelas luzes da Igreja romana infalível, parecia
então muito obscura. Citavam-se passagens dos padres, e sobretudo a de São
Gregório de Nysse, onde ele diz que «uma pessoa é causa, e a outra vem da
causa; uma sai imediatamente da primeira, a outra sai dela através do Filho,
por meio de quê o Filho se reserva a propriedade de único, sem excluir o
Espírito Santo da relação do Pai».
Essas autoridades não pareceram, naquele tempo, bastante claras. Adriano I
não decidiu nada: ele sabia que se podia ser cristão sem penetrar na
profundeza de todos os mistérios. Responde que não condena o ponto de vista
do rei, mas nada alterou do Símbolo de Roma. Apazigua a disputa não a
julgando, e deixando a cada um seus usos. Trata, em uma palavra, as questões
espirituais como príncipe; e muito príncipes os trataram como bispos.
Desde então a política profunda dos papas estabelecia pouco a pouco seu
poder. Faz-se logo após uma compilação de falsas atas conhecidas hoje sob o

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nome de falsas decretais. Foi, diz-se, um espanhol chamado Isadore Mercator,
ou Piscator, ou Peccator, que as digeriu. São os bispos alemães, cuja boa fé foi
enganada, que as divulgam e fazem valer. Pretende-se que existam hoje
provas incontestáveis de que foram compostas por um certo Algeram, abade
de Senones, bispo de Metz; estão em forma de manuscrito na biblioteca do
Vaticano. Mas que importa quem seja seu autor? Nessas falsas decretais
imaginam-se antigos cânones que ordenam jamais se realizar um único
concílio provincial sem a permissão do papa, e todas as causas eclesiásticas
competirem a ele. Ali, faz-se falar os sucessores imediatos dos apóstolos, e
lhes são atribuídos escritos. É certo que tudo sendo desse mau estilo do século
oitavo, tudo estando repleto de erros contra a história e a geografia, o artifício
era grosseiro; mas eram homens grosseiros que se enganavam. Tinha-se
forjado desde o nascimento do cristianismo, como já o dissemos, evangelhos
falsos, os versos sibilinos, os livros de Hermas, as Constituições Apostólicas,
e mil outros escritos que a crítica sã reprovou. É triste que para ensinar a
verdade tenha-se tão freqüentemente empregado declarações de falsário.
Essas falsas decretais enganaram os homens durante oito séculos; e enfim,
quando o erro foi reconhecido, os usos estabelecidos por eles subsistiram em
uma parte da Igreja: a antigüidade lhes serviu de autenticidade.
Desde essas épocas, os bispos do Ocidente eram senhores temporais, e
possuíam várias terras como feudos, mas nenhum era soberano independente.
Os reis de França elegiam geralmente os bispos; mais audaciosos nisso e mais
políticos do que os imperadores dos gregos e do que os reis da Lombardia, que
se contentavam com intervir com sua autoridade nessas eleições.

Cap. XX - 107
As primeiras igrejas cristãs se haviam governado como repúblicas segundo o
modelo das sinagogas. Os que presidiam a essas assembléias tinham tomado
pouco a pouco o título de bispo, de uma palavra grega com que os gregos
chamavam os governadores de suas colônias, e que significa inspetor. Os
velhos dessas assembléias se denominavam sacerdotes, de uma outra palavra
grega que significa ancião.
Carlos Magno, em sua velhice, concedeu aos bispos um direito de que seu
próprio filho tornou-se a vítima. Eles fizeram crer a esse príncipe que no
código redigido à época de Teodósio, uma lei rezava que, se de dois seculares
em demanda, um tomasse um bispo por juiz, o outro seria obrigado a se
submeter a esse julgamento sem poder apelar. Essa lei, que jamais tinha sido
executada, passa entre todos os críticos como falsa. É a última do Código
Teodosiano; está sem data, sem os nomes dos cônsules. Ela excitou uma
guerra civil encoberta entre os tribunais da justiça e os ministros do santuário;

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como nessa época, porém, tudo o que não fosse clero era, no Ocidente, de uma
ignorância profunda, é necessário nos espantarmos de que não se tenha dado
ainda mais autoridade àqueles que, únicos a serem um pouco instruídos,
pareciam, sozinhos, merecer julgar os homens.
Assim como os bispos disputavam a autoridade com os seculares, os monges
começavam a disputá-la com os bispos, que não obstante eram seus dirigentes
pelas regras. Esses monges já eram demasiado ricos para obedecer. Esta
célebre fórmula de Marculfo era com muita freqüência posta em uso: «Eu,
para o repouso da minha alma, e para não ser colocado após minha morte
entre os bodes, eu me dedico a tal mosteiro etc.» Acreditou-se, desde o
primeiro século da Igreja, que o mundo eria acabar; as pessoas se
fundamentavam em uma passagem de São Lucas, que põe estas palavras na
boca de Jesus Cristo: «Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas; as nações se
consternarão; o mar e os rios farão um grande ruído; os homens desfalecerão
de pavor na expectativa da revolução do universo; os poderes do céu serão
abalados, e então verão o Filho do homem vindo sobre uma nuvem com um
grande poder e uma grande glória. Quando virdes acontecerem essas coisas,
sabei que o reino de Deus está próximo. Eu vos digo em verdade, em verdade,
que esta geração não passará sem que essas coisas tenham-se realizado».
Vários personagens piedosos, tendo sempre tomado literalmente essa predição
não ocorrida, esperavam seu cumprimento: eles pensavam que o universo ia
ser destruído, e viam claramente o julgamento derradeiro, em que Jesus Cristo
devia vir sobre as nuvens. Baseavam-se também na epístola de São Paulo aos
de Tessalônica, que diz: «Nós, os que estivermos vivos, seremos levados para
o ar ao encontro de Jesus». Daí todas essas suposições de tantos prodígios
percebidos nos ares. Cada geração acreditava ser aquela que devia assistir ao
fim do mundo, e essa opinião se fortalecendo nos séculos seguintes, doavam-
se terras aos monges, como se eles devessem ser preservados na conflagração
geral. Muitos títulos de doação começavam por estas

Cap. XX - 108
palavras: Adventante mundi vespero. Abades beneditinos, muito tempo antes
de Carlos Magno, eram bastante poderosos para se rebelarem. Um abade de
Fontenelle ousara postar-se à frente de um partido contra Carlos Martel, e
reunir tropas. O herói mandou cortar a cabeça ao religioso, execução que não
contribuiu pouco a todas essas revelações que tantos monges tiveram depois,
sobre o castigo de Carlos Martel.
Antes dessa época, vêem-se um abade de Saint Remi de Reims e o bispo dessa
cidade suscitarem uma guerra civil contra Childeberto, no sexto século: crime
que não cabe senão aos homens poderosos.

20
Os bispos e os abades possuíam muitos escravos. Censura-se ao abade
Alcuíno o haver possuído vinte mil. Esse número não é incrível: Alcuíno
possuía diversas abadias, cujas terras podiam ser habitadas por vinte mil
homens. Esses escravos, conhecidos sob o nome de servos, não podiam-se
casar nem mudar de residência sem a permissão do abade. Eram obrigados a
marchar cinqüenta léguas com suas carroças quando ele o ordenava;
trabalhavam para ele três dias por semana, e ele repartia todos os frutos da
terra.
Não se podia, em verdade, reprovar a esses beneditinos o violarem, por suas
riquezas, seu voto de pobreza, pois eles não fazem explicitamente esse voto:
não se empenham, ao serem admitidos na ordem, senão em obedecer a seus
abades. Devem-se-lhe ainda terras incultas que roçaram com suas mãos, e que
depois fizeram cultivar por servos. Eles formaram pequenos burgos, até
pequenas cidades em redor de seus mosteiros. Estudando, foram os únicos a
conservarem os livros, copiando-os; e enfim, nesses tempos bárbaros em que
os povos eram tão miseráveis, era uma grande consolação encontrar nos
conventos um refúgio seguro contra a tirania.
Na França e na Alemanha, mais de um bispo ia ao combate com seus servos.
Carlos Magno, em uma carta a Frastádia, uma de suas mulheres, lhe fala de
um bispo que combateu valentemente perto dele em uma batalha contra os
avaros, povos descendentes dos citas, que habitavam nas proximidades do país
que se chama atualmente Áustria. Eu constato em sua época catorze mosteiros
que deviam fornecer soldados. Por pouco que um abade fosse guerreiro, nada
o impedia de os conduzir ele próprio. É exato que em 803 um parlamento se
queixava a Carlos Magno do número excessivamente grande de sacerdotes
mortos na guerra. Ele fez proibir então, mas inutilmente, aos ministros do altar
de irem ao combate.
Não era permitido dizer-se clérigo sem o ser, usar a tonsura sem pertencer a
um bispo: tais clérig0s se chamavam acéfalos. Eram punidos como
vagabundos. Ignorava-se essa condição, hoje tão comum, de quem não é nem
secular nem eclesiástico. O título de abade, que significa pai, não pertencia
senão aos dirigientes dos mosteiros.
Os abades tinham desde então a bengala pastoral que traziam os bispos, e que
havia sido outrora a marca da dignidade pontifical na Roma pagã. Tal era a
autoridade desses abades sobre os monges, que eles os
Cap. XXI - 112
gregos, e em quase todas as celebrações de seus mistérios. Marco Aurélio, ao
se associar aos mistérios de Ceres Eleusina, confessou-se ao hierofante.
Esse uso, tão santamente instituído entre os cristãos, depois foi infelizmente
motivo para os mais funestos abusos. A fragilidade do sexo tornou algumas

21
vezes as mulheres mais dependentes de seus confessores do que de seus
esposos. Quase todos os que receberam as confissões das rainhas se serviram
dessa autoridade secreta e sagrada para participar dos assuntos do estado.
Logo que um religioso predominou sobre a consciência de um soberano, todos
os seus confrades tiraram partido disso; e vários empregaram a influência de
confessor para se vingar de seus inimigos. Finalmente, aconteceu que, nas
discórdias entre os imperadores e os papas, nas facções das cidades, os padres
não davam a absolvição àqueles que não eram de seu partido. Foi o que se viu
na França à época do rei Henrique IV; quase todos os confessores se
recusavam a absolver os súditos que reconheciam seu rei. A facilidade de
seduzir pessoas jovens e de levá-las ao crime no próprio tribunal de
penitência, foi ainda uma dificuldade muito perigosa. Tal é a deplorável
condição dos homens, que os remédios mais divinos se transformaram em
venenos.
A religião cristã não se havia estendido ainda no Norte mais longe do que as
conquistas de Carlos Magno. A Escandinávia, a Dinamarca, que se chamava o
país dos normandos, tinham um culto que nós qualificamos ridiculamente de
idolatria. A religião dos idólatras seria aquela que atribuísse o poder divino a
figuras, a imagens; essa não era a dos escandinavos: eles não possuíam pintor
nem escultor. Adoravam a Odin, e julgavam que após a morte a ventura do
homem consistia em beber, na sala de Odin, cerveja no crânio de seus
inimigos. Temos ainda suas antigas canções traduzidas, que exprimem essa
idéia. Havia muito tempo que os povos do Norte acreditavam em uma outra
vida. Os druidas tinham ensinado aos celtas que eles renasceriam para
combater, e os sacerdotes da Escandinávia persuadiam os homens de que eles
beberiam cerveja depois de sua morte.
A Polônia não era menos bárbara nem menos grosseira. Os moscovitas, tão
selvagens quanto o resto da Grã Tartária, mal sabiam o bastante para serem
pagãos; mas todos esses povos viviam em paz em sua ignorância, felizes por
serem desconhecidos a Carlos Magno, que vendia tão caro o conhecimento do
cristianismo.
Os ingleses começavam a aceitar a religião cristã. Ela lhe havia sido
anunciada por Constâncio Cloro, protetor secreto dessa religião, então
oprimida. Ali ela não predominava; o antigo culto do país levou vantagem
ainda por longo tempo. Alguns missionários da Gália instruíram
grosseiramente um pequeno número desses insulares. O famoso Pelágio,
defensor muito zeloso da natureza humana, nascera na Inglaterra; mas ele não
foi educado lá, e convém contá-lo entre os romanos.

Cap. XXI - 113

22
A Irlanda, que se chamava Escócia, e a Escócia, conhecida então sob o nome
de Albânia, ou de país dos pictos, tinham recebido também algumas sementes
do cristianismo, sufocado sempre pelo antigo culto que predominava. O
monge Colomba, nascido na Irlanda, era do sexto século; mas parece, por seu
retiro para a França, e pelos monastérios que fundou em Borgonha, que havia
pouco a fazer, e muito a temer por aqueles que procuravam na Irlanda e na
Inglaterra estabelecimentos ricos e tranqüilos encontrados alhures ao abrigo da
religião.
Depois da extinção quase total do cristianismo na Inglaterra, Escócia e
Irlanda, a afeição conjugal a fez renascer ali. Etelberto, um dos reis bárbaros
anglo-saxões da heptarquia da Inglaterra, que tinha seu pequeno reino na
província de Kent, onde fica Canterbury, quis aliar-se a um rei da França.
Esposou a filha de Childeberto, rei de Paris. Essa primeira cristã, que tranpôs
o mar com um bispo de Soissons, estimulou seu marido a receber o batismo,
como Clotilde sujeitara Clóvis. O papa Gregório o Grande enviou Augustinus,
a que os ingleses chamam Austin, com outros monges romanos em 598. Eles
realizaram poucas conversões, porque convém ao menos compreender a
língua do país para mudar sua religião; porém, favorecidos pela rainha, eles
construíram um mosteiro.
Foi propriamente a rainha que converteu o pequeno reino de Canterbury. Seus
súditos bárbaros, que não tinham opiniões, seguiram facilmente o exemplo de
seus soberanos. Esse Augustinus não teve dificuldade em se fazer declarar
primaz por Gregório o Grande: ele teria ainda desejado sê-lo das Gálias, mas
Gregório lhe escreveu que podia-lhe dar jurisdição apenas sobre a Inglaterra.
Ele foi, portanto, primeiro arcebispo de Canterbury, primeiro primaz da
Inglaterra. Deu a um de seus monges o título de bispo de Londres, ao outro o
de Rochester. Não se pode comparar melhor esses bispos senão com os de
Antioquia e de Babilônia, que se chamam bispos in partibus infidelium. Mas
com o tempo a hierarquia da Inglaterra se constituiu. Os mosteiros,
principalmente, eram muito ricos, no oitavo e nono séculos. Eles colocavam
no catálogo dos santos todos os grandes senhores que lhes tinham doado
terras; de onde vem que se encontra entre seus santos dessa época sete reis,
sete rainhas, oito príncipes, dezesseis princesas. Suas crônicas dizem que dez
reis e onze rainhas acabaram seus dias em conventos. É crível que esses dez
reis e essas onze rainhas se fizeram somente vestir em sua morte hábitos
religiosos, e talvez trajar, em suas últimas doenças, em conventos, como se
procedeu em Espanha; mas não que com efeito eles tenham, com saúde,
renunciado aos negócios públicos para viver como cenobitas.

23
CRISTIANISMO

Quase todas as informações sobre a vida de Jesus e as origens do cristianismo provêm de seus
discípulos. A lembrança de suas palavras e ações, transmitidas através dos Evangelhos,
mencionam os dias que Jesus passou na Terra. Os discípulos e seguidores de Cristo concluíram
que o que ele demonstrava ser, através de sua ressurreição, confirmava a sua natureza divina. Os
evangelistas (Mateus, Marcos, João e Lucas) inspiraram-se na linguagem das Escrituras ou Bíblia
hebraica — chamada pelos cristãos de Antigo Testamento — para compor um relato sobre a
realidade de Jesus Cristo. Estes judeus-cristãos, acreditando ser vontade e ordem de Deus que se
unissem para formar uma nova comunidade religiosa, salvadora do povo de Israel, fundaram a
primeira igreja em Jerusalém. Consideravam que aquela cidade era a mais apropriada para a nova
igreja receber o prometido: o dom do Espírito Santo e de uma renovação espiritual.

5. O INÍCIO DA IGREJA
Jerusalém era o núcleo do movimento cristão. A partir deste centro, o cristianismo espalhou-se
para outras cidades e povoados da Palestina e locais ainda mais distantes. No princípio, a maioria
das pessoas que se uniam ao movimento cristão era seguidora do judaísmo, como o próprio
Cristo. Por isto, o cristianismo inicial manifestou-se como uma relação dual da fé judaica: uma
relação de continuidade e ao mesmo tempo de realização, de antítese, e também de afirmação.

Um fator importante que levou o cristianismo a distanciar-se das raízes judaicas foi a mudança na
composição da Igreja, ocorrida mais ou menos no final do século II. Nesta época, os cristãos não-
judeus começaram a superar, em número, os cristãos judeus. O trabalho do apóstolo Paulo teve
grande influência na ruptura definitiva entre judaísmo e cristianismo. As cartas enviadas por
Paulo a Timóteo e a Tito mostram o início de uma organização baseada na transmissão da
autoridade da primeira geração de apóstolos — entre os quais se inclui Paulo — aos bispos
subseqüentes.

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6. PERSEGUIÇÃO O cristianismo teve, em primeiro lugar, que consolidar

sua relação com a ordem política. Dentro do império romano e como seita judaica, a igreja cristã
primitiva compartilhou o status do judaísmo. Mas, antes da morte do imperador Nero, em 68, o
cristianismo já era considerado rival da religião imperial romana. A lealdade demonstrada pelos
cristãos perante seu Senhor, Jesus, era incompatível com a veneração do imperador, encarado
como divindade. Além disso, imperadores, como Trajano e Marco Aurélio, viam no cristianismo
uma ameaça a seus propósitos e decidiram extingüi-lo.

A oposição à nova religião criou o efeito inverso ao que se pretendia. No início do século IV, o
mundo cristão havia crescido tanto que obrigou Roma a tomar uma decisão: erradicá-lo ou aceitá-
lo. O imperador Diocleciano tentou eliminar o cristianismo, mas fracassou. O imperador
Constantino optou por contemporizar, convertendo-se ao cristianismo como uma manobra
política. Esta atitude acabou criando o império cristão: a nova religião se apossou da infra-
estrutura burocrática romana, utilizou-a para seus propósitos e ritos e se apoderou do mundo. O
sucessor de Constantino, seu sobrinho Juliano, tentou inverter este processo, revalorizando a
antiga religião romana, mas encontrou imensa resistência, falhando em sua intenção. Juliano foi
assassinado durante uma batalha contra os persas, por um cristão contratado para protegê-lo. 1

Um dos atos do imperador Constantino, com maior repercussão no mundo cristão, foi a decisão,
no ano 330, de deslocar a capital do império, de Roma para Bizâncio, na extremidade oriental do
mar Mediterrâneo. A nova capital, Constantinopla (atual Istambul), transformou-se no centro
intelectual e religioso do mundo cristão do Oriente. Enquanto isto, o mundo cristão do Ocidente
experimentava uma centralização progressiva representada por uma pirâmide cujo topo pertencia
ao papa de Roma (ver Papado).

Todos os traços do cristianismo do Oriente contribuíram para seu afastamento do Ocidente, o que
acabou culminando no cisma entre Leste e Oeste. Os historiadores datam o cisma a partir de
1054, quando Roma e Constantinopla trocaram excomunhões. Também é possível afirmar que o
cisma ocorreu em 1204, quando — com o objetivo de arrebatar a Terra Santa do domínio

25
otomano (ver Cruzadas) — os exércitos do Ocidente atacaram e destruíram a cidade cristã de
Constantinopla (ver Império bizantino; Igreja Oriental; Igrejas de rito oriental; Igreja Ortodoxa).

8. O CRISTIANISMO NO OCIDENTE Embora o cristianismo do

Oriente fosse, em muitos sentidos, o herdeiro da primitiva igreja cristã, uma parte do
desenvolvimento mais dinâmico aconteceu na região ocidental do império romano. Roma
mantinha esta posição quando as sucessivas invasões de tribos bárbaras assolaram a Europa. Em
800, quando o papa Leão III coroou o imperador Carlos Magno, nasceu um novo império
soberano no ocidente: o Sacro Império Romano-Germânico.

A cooperação entre a Igreja e o Estado durante a Idade Média — simbolizada pela coroação de
Carlos Magno pelo papa — não deve ser interpretada como uma relação pacífica. Porém, existiu
uma grande cooperação entre a Igreja e o Estado durante as Cruzadas. A conquista muçulmana de
Jerusalém significou a queda de lugares santos em mãos infiéis e as Cruzadas, que já não serviam
para unificar o Ocidente, tampouco lograram restaurar o cristianismo, de forma permanente, na
Terra Santa.

A Igreja medieval obteve um triunfo importante durante este período: o desenvolvimento da


filosofia e da teologia escolástica, principalmente por São Tomás de Aquino, baseando-se em
Aristóles. Ao mesmo tempo, o Grande Cisma do Ocidente, durante o qual houve dois — e, às
vezes, até três aspirantes ao trono papal — ameaçaram a Igreja ocidental. Este litígio durou até
1417, quando o papado voltou a ser reunificado.

9. A REFORMA E A CONTRA-REFORMA Houve

reformistas de várias tendências, como John Wycliffe, João (Jan) Hus e Girolamo Savonarola que
denunciaram o enfraquecimento moral e a corrupção econômica da Igreja e desejaram mudar,
radicalmente, esta situação. O reformista Martinho Lutero foi a figura catalisadora que acelerou o
novo movimento. Sua luta pessoal levou-o a questionar a autoridade da Igreja de Roma. Sua
excomunhão, pelo papa Leão X, foi um passo que culminou na divisão do mundo cristão
ocidental. Eclodiram movimentos reformistas na Suíça que, rapidamente, encontraram apoio e
liderança em Ulrich Zwingli e, especialmente, de João Calvino, cujo pensamento contribuiu para
o surgimento dos huguenotes na França (ver Calvinismo; Luteranismo; Presbiterianismo).

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A Reforma protestante não foi suficiente para esgotar o espírito renovador da Igreja Católica.
Como resposta ao desafio, a Igreja convocou o Concílio de Trento, cuja duração foi do ano 1545
até 1563. A responsabilidade de levar adiante as decisões tomadas no concílio coube à
Companhia de Jesus (ver Contra-Reforma; Reforma).

10. O PERÍODO MODERNO Durante o século XVI, quando aconteceu

a Reforma — mas, principalmente, nos séculos XVII e XVIII — já estava claro que o
cristianismo seria obrigado a se definir em resposta ao crescimento da ciência e filosofia
modernas. A condenação pela Inquisição de Galileu Galilei, acusado de heresia, encontrou seu
equivalente nas controvérsias protestantes sobre a teoria da evolução versus o relato bíblico da
criação.

Como resultado, o cristianismo teve que redefinir sua relação com a ordem civil. Ficara evidente
que era preciso fazer uma reconsideração da interrelação das tradições de diversos grupos cristãos
com outras tradições religiosas. O estudo da transcendência destes dois conflitos desempenhou
um importante papel durante os séculos XIX e XX.

Foi o movimento ecumênico que mais fortemente conseguiu unir os distanciados grupos cristãos.
No Concílio Vaticano II, a Igreja Católica deu importantes passos a favor de uma reconciliação
com a Igreja do Oriente e com os protestantes.

Durante os últimos 25 anos, os movimentos missionários da Igreja têm levado a fé cristã pelo
mundo. As adaptações aos costumes nativos geram problemas teológicos mas, cada vez mais,
atraem novos adeptos.2

BÍBLIA
Bíblia, também chamada Santa Bíblia, livro sagrado ou Escrituras de judeus e cristãos. No
entanto, as Bíblias do judaísmo e do cristianismo diferem em vários aspectos. A Bíblia judaica é

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composta pelas escrituras hebraicas — 39 livros escritos em hebraico —, com exceção de poucas
partes redigidas em aramaico. A Bíblia cristã possui duas partes: o Antigo Testamento e os 27
livros do Novo Testamento. Os dois principais ramos do cristianismo — catolicismo e
protestantismo — estruturam o Antigo Testamento de modo diferente (ver tabela adjunta).

Na versão primitiva, alguns dos livros adicionais foram escritos em grego como, por exemplo, o
Novo Testamento. A tradução protestante do Antigo Testamento limita-se aos 39 livros da Bíblia
judaica. Os demais livros e adições são denominados apócrifos pelos protestantes e
deuterocanônicos pelos católicos.

O termo Bíblia chegou ao latim do grego bíblia ou “livros”, forma diminutiva de byblos, palavra
que significa “papiro” ou “papel”, material exportado do antigo porto fenício de Biblos. Na Idade
Média, os livros da Bíblia eram unificados.

2. ORDEM DOS LIVROS


A ordem e o número dos livros bíblicos são distintos entre as versões judaica, protestante e
católica. A Bíblia do judaísmo divide-se em três partes:

–Torá, ou Lei, também chamada livros de Moisés.

– Profetas ou Neviim, dividida em Profetas Antigos e Profetas Posteriores.

– Hagiográficos ou Ketuvim, que inclui os Salmos, os livros sábios e literatura diversa.

O Antigo Testamento cristão organiza os livros segundo seu conteúdo:

– Pentateuco, que corresponde à Torá.

– Livros históricos.

– Livros poéticos ou sábios.

– Livros proféticos.

O Novo Testamento inclui:

– Quatro Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João).

– Atos dos Apóstolos, que narra a história dos primeiros tempos do cristianismo.

28
– Epístolas ou cartas de Paulo e outros autores.

– Apocalipse ou Livro da Revelação.

Alguns livros identificados como Epístolas, em particular a Epístola aos Hebreus, são, na
verdade, tratados teológicos.3

3"Bíblia," Enciclopédia® Microsoft® Encarta. © 1993-1999 Microsoft Corporation. Todos


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