Você está na página 1de 8

UNIVERSIDADE METODISTA DE ANGOLA

FACULDADE DE CIÊNCIA JURÍDICAS E SOCIAS

CURSO DE DIREITO

DIREITO DO COMÉRCIO INTERNACIONAL

As Cláusulas de Força Maior e de Hardship nos Contratos de Comércio


Internacional

Integrantes:

Catarino Segunda da Silva – 35114

Delma Maria Salvador João – 32192

Elisandra Melo Quico – 34134

José Gime Eduardo – 35373

Suzelmo Mateus – 20385

Luanda,

2023∕2014
Introdução

O comércio internacional, hoje, é, para um país, uma das maiores fontes de movimentação
da economia. Ele gera a venda de excedente de produção de materiais de um país e, ao mesmo
tempo, possibilita que seu mercado interno tenha acesso a mercadorias de outros países
(DICIONARIO FINANCEIRO, 2023).

A utilização do direito estrangeiro em contratos teve início com o comércio internacional e


foi se desenvolvendo ao longo dos anos, sendo praticado desde os primórdios por diversas
populações. Nos dias actuais, a especificidade dos contratos internacionais se apresenta tanto sob a
visão jurídica quanto sob a visão econômica. Definindo que qualquer movimentação, seja de bens
ou serviços através de fronteiras internacionais, é um indicador econômico da internacionalidade do
contrato (KEINER, 2014).

Actualmente, o comércio internacional exige, cada vez mais, conhecimento e preparo dos
profissionais envolvidos no processo, uma vez que as diversificações dos ordenamentos jurídicos,
das técnicas empregadas no processo de cooperação, da evolução das normas comerciais das nações
tornaram o comércio internacional uma manifestação social de elevada complexidade, que necessita
de cada vez mais atenção em sua aplicação (SPOLAOR, 2014).

Com este estudo, pretendemos abordar a necessidade e os benefícios da inclusão das


cláusulas de força maior e hardship no contexto dos contratos comerciais internacionais. Essas
cláusulas se destacam como mecanismos essenciais para a adaptação dos contratos a alterações
profundas na base do negócio. Exploraremos as fontes normativas comumente aplicáveis a essas
cláusulas, delineando seu papel na mitigação de riscos e na promoção da estabilidade contratual em
cenários imprevisíveis. Além disso, examinaremos a perspectiva angolana em torno de tais
cláusulas, considerando como o sistema jurídico local as interpreta e integra nos contratos
comerciais internacionais.

Este estudo visa não apenas elucidar a importância dessas cláusulas, mas também contribuir
para uma compreensão mais ampla de como as práticas contratuais podem ser adaptadas de maneira
eficiente e justa em um contexto globalizado e sujeito a mudanças rápidas.

2
Como sabemos, os contratos de comércio internacionais pelo facto de entrarem em contacto
com diferentes ordenamentos jurídicos, apresentam uma estrutura complexa. Existe, por isso, um
factor de incerteza no momento de conclusão do contrato, por estes se encontrarem expostos às
circunstâncias supervenientes que os possam vir a afectar, tais como: o decorrer do tempo, o
contexto político e social e a conjuntura económica entre outros. Desde modo, estes contratos
requerem cláusulas com vista a obter uma “previsão do futuro”, ainda que realizada no presente,
que consiste na necessidade de um planeamento e de uma antecipação.

Por conseguinte, passaremos sumariamente, a análise de duas destas cláusulas


especificas frequentes na contratação comercial internacional:

CLÁUSULA DE FORÇA MAIOR

Através da cláusula de force majeure, é facultada a uma das partes a possibilidade de


exonerar-se do cumprimento das suas obrigações quando a sua execução se torne impossível,
definitiva ou temporariamente, devido a um determinado evento alheio imprevisível, extraordinário,
irresistível, (GOMES, 2003).

Os casos de força maior são, tipicamente, eventos imprevisíveis que escapam ao controlo da
vontade das partes e que impedem a execução do contrato, que não poderiam ter sido razoavelmente
previstos aquando da negociação e conclusão do contrato. Elas modelam ou regulam os impactos de
certos e determinados eventos que, em normalidade de circunstâncias, escapam ou não se reflectem
directamente na matriz de risco normal assumida pelas partes no contrato. Ou seja, são cláusulas
respeitantes à ocorrência de eventos que perturbam a dinâmica contratual acordada e criam uma
verdadeira impossibilidade de prestar, (PENA e ARNAUT, 2020).

Trata-se de uma excepção à regra do princípio de força obrigatória nos contratos (pacta sunt
servanda), porque cria a possibilidade da alteração do contrato quando as circunstâncias da época
do acordo se alterarem no decorrer da execução contratual, prejudicando uma parte e beneficiando a
outra (PINTO, 2015).

Os elementos principais para um evento acarretar o acionamento de tal cláusula, devem ser
auferidos por dois elementos clássicos: imprevisibilidade e impossibilidade de se cumprir o que foi
acordado. Além destes citados, é necessário também que tal evento seja inevitável, isto é, que a
parte afetada não tenha uma opção viável para cumprir o que foi acordado ou evitar o evento
ocorrido (SPOLAOR, 2014).

Caso um evento imprevisto venha a fazer com que uma das partes não consiga cumprir o
acordado, como estipulado na cláusula, diante da efectiva verificação do evento considerado

3
prejudicial, tem se, com frequência, adoptado a rescisão do contrato em andamento, isentando de
responsabilidade o devedor que foi prejudicado pelo evento em questão, ou seja, impedido de
cumprir com sua parte no que fora acordado. Actualmente, o contrato tem definido que a não
responsabilidade deverá ser precedida de uma notificação da parte impossibilitada de prestar, em
prazo fixado dentro do próprio contrato, estipulado previamente pelas partes, permitindo assim ao
credor cooperar nos esforços pela costumeira normalidade e a preservação do que for possível e
necessário (SPOLAOR, 2014).

Vale destaque às previsões internacionais para se delimitar a matéria pertinente à Cláusula


de Força Maior, inicialmente quanto ao artigo 7.1.7./1 dos Princípios do UNIDROIT de 2010, sob
epígrafe Força Maior: “Não responde pelas consequências do seu incumprimento o devedor que
provar que o inadimplemento, é devido um impedimento que escapa ao seu controle e que não lhe
podia ser razoavelmente exigido, tê-lo levado em conta ao tempo da formação do contrato, ou ter-
lhe evitado ou superado as consequências”. No mesmo sentido prevê o art.º 79/1 da Convenção de
Viena de 1980 sobre a compra e venda internacional de mercadorias: “uma parte não é responsável
pela inexecução de qualquer das suas obrigações se provar que tal inadimplemento foi devido a
motivo alheio à sua vontade, que não era razoável esperar que ela tomasse em consideração no
momento da conclusão do contrato, ou que fosse evitado ou superado, ou ainda, que fossem
evitadas ou superadas suas consequências.

Conclui-se, portanto a necessidade de três requisitos chaves para a consagração da situação


de Força Maior: a imprevisibilidade, a inevitabilidade e a exterioridade em relação à vontade das
partes, de que resulta a impossibilidade de ser cumprida a obrigação.

O efeito da verificação de uma situação de força maior é a exoneração do cumprimento, quer


seja temporária ou definitivamente, como bem ilustra o n.º 2 do artigo supra da UNIDROIT.

Ainda no âmbito do direito do comércio internacional a International Chamber of


Commerce (ICC), no quadro dos seus objectivos, disponibiliza também modelos estandardizados
utilizados para redigir uma cláusula de força maior no âmbito dos contratos, o que influencia
diretamente sobre qual o escopo e a interpretação a fazer da própria cláusula.

No domínio legislativo interno, pese embora a cláusula de força maior não se encontre
expressamente consagradas na lei, constituem um instrumento contratual de uso bastante
generalizado, cuja aplicação se deverá ter, ainda que a título meramente subsidiário, compaginar
com o regime da impossibilidade consagrado no Código Civil (artigos 790.º e ss.).

O facto de os contratos internacionais cruzarem várias ordens jurídicas torna vantajosa a


previsão e consagração da force majeure como cláusula contratual.

4
CLÁUSULA DE HARDSHIP

As cláusulas de hardship obrigam um dever de as partes renegociarem as condições do


contrato sempre que, durante a execução deste se verifique uma modificação das circunstâncias em
que se contratou que perturbem o equilíbrio global contratual, tornando o cumprimento contratual
das obrigações originais extremamente oneroso para uma das partes. Será como uma válvula que
permite distribuir entre os contratantes os prejuízos decorrentes do desequilíbrio contratual,
prejuízos estes que não sejam próprios do contrato, e dessa forma, tornar o contrato novamente
equilibrado, não acarretando, por isso, a exoneração da responsabilidade contratual, (Brochado
Rebelo, 2022)

A questão permanece em perceber quais as circunstâncias que poderão estar dentro do


âmbito de hardship. Segundo Júlio Gomes, “A dificuldade de (hardship) experimentada há de ser,
portanto, substancial, o que, evidentemente não se pode apreciar em absoluto, mas apenas tendo em
conta o equilíbrio das prestações do contrato concretamente atingido”. A cláusula pauta-se por três
aspetos essenciais: um primeiro, onde se tenta balizar o campo de aplicação, ou seja, circunscrever
as dificuldades susceptíveis de entrar no âmbito de hardship; um segundo, onde se estipula que
método será utilizado para negociar ou adaptar o contrato às novas circunstâncias; e um terceiro,
que definirá os trâmites a seguir caso as negociações não tenham êxito. A sua regulação poderá ser:
executada pelas partes; remetendo o contrato para cláusulas gerais presentes nos instrumentos
internacionais de regulação, destacando-se os Princípios UNIDROIT, a Convenção das Nações
Unidas sobre Contratos para Venda Internacional de Mercadorias e a Cláusula-modelo da Câmara
de Comércio Internacional, prevendo os casos específicos; ou até uma combinação de ambos. Há
quem defenda que este tipo de cláusula é já tão comum que acabou por se tornar parte da lex
mercatoria e dos usos comerciais internacionais. Dessa forma, entendem que a sua inclusão
expressa no contrato passa a ser desnecessária.

De todos os instrumentos internacionais que regulam as cláusulas de hardship, os Princípios


UNIDROIT têm obtido grande adesão por parte dos contratantes internacionais. O artigo 6.2.1,
daqueles princípios apresenta-nos a obrigatoriedade do cumprimento do contrato, reiterando que,
ainda que o cumprimento se torne mais oneroso para uma das partes, este deverá ainda assim
acontecer. Não obstante, a derrogação desta regra encontra-se na disposição imediatamente
seguinte, artigo 6.2.2, intitulada de Definição de Hardship, que dispõe em que circunstâncias nos
encontramos perante uma situação de hardship, (Brochado Rebelo, 2022).

Os Princípios equacionam duas hipóteses para a verificação de uma alteração fundamental


do equilíbrio das prestações. A primeira será um aumento substancial do custo das obrigações e a

5
segunda hipótese terá a ver com uma possível diminuição ou perda total do valor objectivo da
contraprestação, ou então do desaparecimento da finalidade do contrato. Quanto aos seus efeitos, é
no artigo 6.2.3 dos Princípios que se encontram previstos os efeitos da cláusula, nos seguintes
termos: (1) Em caso de hardship a parte lesada tem direito a requerer uma renegociação, devendo o
pedido ser apresentado, sem atrasos injustificados e devidamente fundamentado.

No que toca à Cláusula-modelo da ICC, dispõe este instrumento que as parte do contrato são
obrigadas a cumprir as obrigações previstas no mesmo, ainda que o seu cumprimento se tenha
tornado mais oneroso do que se podia ter, razoavelmente, antecipado ao tempo da sua celebração.
Não obstante, no seu n.º 2 reitera em que circunstâncias poderá ser invocada a cláusula de hardship.
Não obstante, o previsto no n. º1, as partes estão obrigadas, dentro de prazo razoável, a recorrer a
esta cláusula e renegociar o contrato de forma às consequências de o evento conseguirem ser
ultrapassadas. Quanto aos efeitos, nos termos do n.º 3, são dadas às partes três opções de
procedimento, caso a renegociação contratual falhe. Este instrumento de regulação caracteriza-se
pela sua inspiração no Código Civil italiano e no artigo 6.2.2 dos Princípios UNIDROIT.

Convenção das Nações Unidas sobre Contratos para Venda Internacional de mercadorias
prevê, a cláusula de Hardship, no artigo 79º. Porém a aplicação deste artigo a situações de hardship
demonstrou ser uma questão bastante controversa. O principal motivo da controvérsia reside no
facto de a CISG apenas regular regras de isenção para impedimentos que irão além do controle da
parte lesada, não fazendo qualquer tipo de menção específica a situações em que se verifica uma
alteração anormal das circunstâncias que torna o cumprimento para uma das partes extremamente
oneroso. O caráter vago e impreciso do preceito, dá azo a que o juiz ou árbitro, que o aplique,
realize a interpretação do mesmo à luz do seu próprio sistema jurídico, o que prejudicará a
aplicação uniforme da CISG, que é, segundo o artigo 7.º n.º 1, o principal objectivo da mesma.

No tange ao ordenamento jurídico interno, a cláusula de hardship, vem embutida, no regime


da alteração das circunstâncias, é um instituto de direito civil cuja aplicabilidade é transversal em
matéria contratual, encontrando-se previsto no artigo 437.º e ss do Código Civil. Diferentemente
das cláusulas de força maior, a cláusula de é um instituto usualmente associado não a uma
impossibilidade de prestar, mas a uma excessiva onerosidade ou profundo desequilíbrio das
prestações acordadas em função de acontecimentos externos que afetam a dinâmica contratual.

Verificados os seus pressupostos legais, a alteração das circunstâncias permitirá às partes,


segundo juízos de equidade, modificar o conteúdo do contrato visando o seu reequilíbrio ou, no
limite, a resolução do próprio contrato.

6
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o aumento da globalização o relacionamento entre as nações foram ficando cada vez
mais estreitos e volumosos impulsionado pela de productos ou serviços. Com fluxo intenso de
contratos entre as nações, destacou a necessidade de um controle mais específico nessas
negociações. Além disso, foi imperativo desenvolver mecanismos que proporcionem o máximo
respaldo possível às partes envolvidas nesses contratos, a fim de garantir a segurança e eficácia das
negociações internacionais.

As fontes de direitos internacional são de extrema importância na criação e execução dos


contratos internacionais, pois permitem que as partes envolvidas se equivalham e sejam
consideradas iguais, independentemente de sua soberania, desvinculando o país de suas leis nativas,
assim possibilitando a criação de um acordo único, que funcione bem para as partes, o que traz
maior segurança na relação comercial.

Para se definir o que são Cláusulas de Força Maior e o que são cláusulas de Hardship,
primeiro há a necessidade de diferenciá-las, pois apesar de ambas serem cláusulas excludentes, elas
trabalham cada uma delas com sua especificidade, inclusive podendo constar em um mesmo
contrato internacional.

A cláusula de força maior cuida dos eventos imprevisíveis, aqueles que não podem ser
previstos à época em que o acordo foi selado e que as partes, por sua própria vontade, não podem
evitar. Qualquer evento que, em suma, possa arruinar ou tornar o contrato temporariamente
impossível de ser executado.

A cláusula Hardship, permite uma renegociação dos termos acordados no contrato caso
venha a ocorrer algum imprevisto, como novas incidências fiscais por exemplo, o que tornaria o
contrato desvantajoso para uma das partes, aumentando assim os seus custos e o tornando oneroso
para uma das partes, assim, essa cláusula é utilizada para reestabelecer o equilíbrio econômico-
financeiro entre as partes envolvidas em um contrato.

A utilização das cláusulas, individualmente ou em conjunto, permite uma maior segurança


para os envolvidos, pois nem todos os eventos são previsíveis, mas poder se respaldar das
possibilidades, incentiva a negociação entre as partes vistos que os termos em que se encontram as
cláusulas, costumam ser excepções e não regras.

7
Referências bibliográficas

BROCHADO REBELO, FM (2022). A Cláusula de Hardship nos Contratos Comerciais


Internacionais. (Mestrado em Direito, Faculdade de Direito, Escola do Porto).

PENA, R., & ARNAUT. (2020). Guia Prático: Cláusulas de Força Maior e Alteração das
Circunstâncias. Sociedade de Advogados.

SANTOS, ALRC dos. (2017). Cláusula de Hardship: Uma Solução Possível para Assegurar
Relações Contratuais Internacionais em Tempos de Crise como a Brasileira. Revista de Direito
Internacional e Globalização Econômica

COSTA GOMES, MJ da. (2013). Contratos Comerciais em Geral (Edição: Reimpressão da


edição de 2013). Editora Almedina.

DICIONÁRIO FINANCEIRO. (2018). O que é comércio internacional? Disponível em:


https://www.dicionariofinanceiro.com/comercio-internacional/ . Acesso em: 26 NOV 2023.

KEINER, LR (2014). Contratos Internacionais: definição e princípios. Jusbrasil.com.br.


Disponível em: https://lukeiner.jusbrasil.com.br/artigos/148870542/contratos-internacionais-
definicao-e-principios . Acesso em: 26 NOV 2023.

PINTO, PBF (2015). A Cláusula de Força Maior e a Cláusula de Hardship nos Contratos
Internacionais. Direito Diário. Disponível em: https://direitodiario.com.br/clausula-de-hardship-
contratos-internacionais/ . Acesso em: 22 NOV 2023.

SPOLAOR, D. (ABR 2014). Contratos Comerciais Internacionais – Cláusula de Força


Maior e sua Aplicabilidade nos Contratos Comerciais Internacionais. JUS.COM.BR. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/27606/contratos-comerciais-internacionais-clausula-de-forca-maior-e-sua-
aplicabilidade-nos-contratos-comerciais-internacionais . Acesso em: 25 NOV 2023.

Você também pode gostar