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15 . MODELOS DE ATENÇÃO À
SAÚDE NO BRASIL

Jairnilson Silva Paim

Um sistema de serviços d e saúde é formado por componentes e


funções principais: infra-estrutura, organização, gestão, financiamento
e prestação da atenção (Kleczkowski, Roemer & Werf, 1984). Neste último
componente , abri gam -se as noções de m odelo de atenção ou modelo
assistencial , r eferi ncin ••::c · .-. , i,;•(;:do . à assistência. à intervenção, às ações
ou às práticas d e E,,:; .. • , , ,Jder di •;Lillgu ir modelos assistenciais e
modelos de atenç~ <. • · • - - <: t• : •., ;H, >pósito des taca r a dimensão
técnica ou tecn ok . · 1<. :,·;.idL, ;; ,;id a que co nsiderando o
desenvolvim en to i,, · :i·:; ,_ t:, ,:: .::h c rgan ização dos serviços
corresponden te s. /1. ~;: · ,_,;;n,:·a ( ,~ {.Um o 'co nteúdo' do sistema
de serviços d e saú d e { r ; >. • · .- · . i ~: s~ üde) e não com o seu 'continente'
(infra-estrutura, o r ga ni zaçú,, gestão e fin a n ciamento), abordado nos
capítulos 3, 12 e 13.
Inicialmente , são discutidos os significados do termo ' modelo' no
senso comum e no campo científico, ressaltando-se a relevância de
identificar os traços fundamentais dos modelos de atenção à saúde
predominantes no Brasil e certas racionalidades que orientam algumas
propostas alternativas. No tópico seguinte, procura-se contextualizar a
reflexão sobre modelos empreendida pela saúde coletiva. A partir daí,
realiza-se uma revisão crítica das concepções sobre modelos de atenção ,
inclusive de cenas propostas alternativas identificadas na literatura ,
indicando algumas conclusões provisórias.
568 Po ·

--
LI TICAS E S_i ~ ~ ~ E 5 Aú DE_NO BRASIL

Para refleti r ·stas à articul ação ou à integração


ue
. . . . poderiam ser 111enc1.o1rnd'1
m1ciat1vas '
s com v1 , - d . •1,
Q · · b 111 como e 111 relação as açoes
d
e v1g1,meia
b a li1ador t
as ações dos programas espen a1s, e · b' tal sa úde o tra
d . . , . úd e am ie 11 ' J
ep1demiológica, vi gilância sa1
. .11ta n a, ·c1pal
s~ e 1ocaP.
promoção da saúde nos âmbitos muni

C O NSI DERAÇÕ ES FINAI S


rna sistematização dos principais
No Quadro 1, encontra-se u d e discutidos no presente
- , , d apresenta os
modelos de atençao a sau e - da atenção: demanda ou
, · da prestaça 0
l
capítulo, de acordo com as ogteas m os modelos de atenção
oluna aparece
d
necess idade s. Na segun. ª c mas' propostas alternativas.
hegemônicos e, na terceira, a 1gu

. t s alternativas
ão modelos hegemôrncos e propos
- d a a t enç '
ª
Q ua d ro 1 p restaçao Propostas alternativas
Modelos hegemônicos
Prestação d a atenção Oferta organizad a
MODELO MÉDICO HEGEMÔNJCO Acolhime n to
Demanda Modelo médico-asssistencial privatista
Modelo d a atenção gereociada ---
Ações progr;:i,1,1..íricas em saúde
MODELO SANITARISTA Vigilância d ; .-·;de
Necessidades Campanhas sanitárias d e da família
Estratégi:1 d "
Programas especiais Promoção t ;<' .J c (políticas
Vigilância sanitária públicas sa ul:. ,~ e cidades
,_·
Vigilância epidemiológica
saudáveis)
Pacs/PSF

Pode-se concluir que o modelo médico h egemô nico , centrado


no atendimento de doentes (demanda espontâ n ea o u induzida pela
oferta), apresenta sérios limites para uma a tençã o comprometida com
a efetividade, a eqüidade e as necessidades prioritá rias em saúde , ainda
que possa proporcionar uma assistência de qualidade em determinadas
situações. Já o modelo sanitarista (campanhas sanitárias , programas
especiais, vigilância epidemiológica, vigilância sanitária etc.) , voltado
Para conhecer conceitos para o atendimento de necessidades , tem enfrentado dificuldades para
de eqüidade, consulte o a promoção e proteção da saúde , bem como na prestação de uma
capítulo I 3, sobre
financiam ento. aten~ã~ c~m qualid~de.' integralidade, efetividade e eqüidade. Daí ª
pertmenoa e relevancia das propostas alt ernatl· vas que cons tarn na
terce ira coluna do quadro.
- -1

Modelos de Atenção à Saúde no Brasil 569


Al ém das propostas . _ .
- d • d
moçao a sau e, com de . Ja descnt r
as, 1oi incluíd .
'cidades saudáveis' A _staque Para as 'políticas a_ n~ste quadro a pro-
1
. · P omoçã 0 d · , · publicas saudáveis' e as Bases legais para a
cam, essenc1ahnente à meth . ª saudc envolve medid . . promoção da saúde
. . .' · ona das co . . - _ as qu e se ap 11•
grupos populaoona1s espec'fi ndiçoes e dos estilos d ·d · d E11 con1 ra-se na
_ I tcos , apo· d . . e v1 ,1 e Co nst itui ç~o da
de educaçao e comunicação . ~an o-se amplamente em atividades
. __ . . ·. • , . ern saude Re públi ca a co nce pçfto
inte1 seto1 ia1s nas varias esf e na formulação de políticas d e sat'rde co mo direito
. . I D eras de gov socia l: "A saúde é direit o
mu111c1pa • o mesmo modo . erno - nacional, estadual e el e tod os e d eve r do

visão ampliada da gestão
'ª P•oposta d ·c1 d
_ e ci a e saudável implica uma Estado, garant.ido
· go,,ernarnental · · med iante políti cas sociais
cidadania e o envolviment .· . ' • que 111clu1 a promoção da
o c11at1v 0 d . _ e eco nômi cas que visem
planejamento e na execuçã d _ _ . e organizaçoes comunitárias no à recl uçfo cio ri sco d e
. o e açoes 111 ter t . . d. . . , . doença e el e outros
das condições de vida e sa, d (.,... . . se onais mg1das a melhoria
. u e 1e1xe1ra, 2002). agravos e ao acesso
Diversas conferências int . . universal e igu alitário às
Sido realizadas nas d ,1• ernac1ona1s sobre p romoçao - d a sau' d e tem
• ações e serviços para sua
uas u limas dé d • , promoção, proteção e
para o 1orta
e lec1mento
. desse m · ca as e mumeras publicações apontam recuperação" (art. 196).
encontram-se nos dispositivo ovimento l · "(Buss,
. .2003). No caso brasileiro ' A lei n. 8.080/90
s ega1s rei:erencias explícitas às acões de também dispõe sobre as
promoção da saúde. , ações de promoção ela
saúde. Na mesma linha ,
Um ano após a OMS instalar a Comissão sobre Determinantes cumpre mencionar
Sociais, o Brasil foi o primeiro país do mundo a constituir a sua Comissão iniciativas recentes como
o Pacto pela Vicia
Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS). Este fato sinaliza (portaria/CM n. 399, d e
para as potencialid ades da formulação d e políticas públicas saudáveis, 22/2/2006) , a criação da
Comissão Nacional dos
bem como para a viabilização da ação intersetorial e de modelos de atenção Determinantes Sociais
mais integrais e efeti\ •,s. Do mesmo modo, as reflexões e experiências da Saúde (decreto
sobre cuidado em ~~•u.d,_• ,Ko lhimcnto e humani zação da atenção realizadas presidencial el e 13/3/
2006) e a formalização
no país nos ú ltin .·, ;,n·· 1 efo rc;am as possibilidades de mudança dos ela Política Nacio nal ele
modelos de aten ç: · _'. _ ,~, .r iiun tes no país , no sentido da qua lidade, da Promoção ela Saúde
(portaria n. 687, de
ética e de 'projct r'~ (:, ,' \1ci dadc' (Ay rcs, 200-1). Em 2004, a rev is~a Sc~úde 30/3/ 06).
e Sociedade d ed icou un, i;i,círnlo ao tema '·Jntcgrahd ad e, humamzaçao e
cu1'd a d o em sau'd e ·• 1·•._, clJ'
, ,<-'ria l, 2004) enquanto a revista Ciência
_ "&, Saúde

Coletiva publi cou um nú mero especial sobre a ques tao da fa1~a e


humamzaçao· - " (M m' .a) -0 , 2004) · Esta ·
revista voltou
. _
ao tema no- ano segumte,
· _d
,
com um numero contem p a n . 1 d° a "Humamzaçao e produçao de cmda os
em saúde" (Deslandes & Ayres, 2 oo 5 ).
_
Assim as msat1s . façoes_ em relação aos modelos de , atenção
d . t, . e a cnse . d e 1eg1.t.I mação das práticas de saude . tornam
pre omman es . 1b ·ão de propostas alternativas para a
, l esforço na e a oraç d
compreens1ve o b . - de um pesquisador da área a
- D í a arguta o sei vaçao .
sua reconstruçao. a · . • .· em -issistência médica em uma
saúde coletiva, com extens a expenencia '
unidade de atenção pnmana · , · a' saúde: '
Modelos de Atenção à Saúde no Brasil
571

• As ag ências_ das Nações Unidas


. deve,11 te1. os. me10s
· necessários
• e se compromete- ·
rem com açoes melhores e mais ágeis;
• A solidariedade e responsab!lidade globais são essenciais para que se faça frente
ao en~rme ?es~fio de g.arantir que todo ser humano possa viver sua vida com
respeito e digmdade, cnando, desta forma, um futuro melhor para as próximas
gerações.
Rio de Janeiro, de 21 a 25 de agosto de 2006.

Com base nas reflexões desenvolvidas neste capítulo, é possível


ressaltar algumas conclusões provisórias. Em vez de insistir em contrapor
0 modelo hospitalocêntrico ao modelo da atenção primária, ao da vigilância
da saúde ou, ainda, ao da promoção da saúde, trata-se de aceitar o desafio
de investigar qual a combinação de tecnologias e abordagens mais
adequadas para a solução de problemas derivados de diferentes perfis
epidemiológicos e para o atendimento integral de necessidades de saúde,
individuais e coletivas , nos distintos territórios do país. Dessa perspectiva,
não faz muito sentido pronunciar-se sobre um modelo de atenção único
para o SUS, dad a a hetero geneidade das situações que compõem a
realidade de saú d e 11,F rlife ren te s r egiões, cidades e territórios do país.
Portanto, nwrl •. ;,y : ·•., is ten ciais ou mode los de aten çáo representam
tecnologias estru li ( i ,; , ,,, l •. •nçáo de p roblemas d e saúd e (danos e riscos)
de uma popula ( i ;• )' s,, a vez , cxp r,: si: a m ncce~sid ades sociais,
· historicamente d ,.: · ; o s:c:io ncrrna '.; nem exemplo~ a serem seguidos ,
mas formas de a1 -, :·; das relações e n tre sujeitos (t:-J b;ilh ado re s de
saúde e usuários) ,fr , ; -. .:.i as por Lecnologias (materia is e não- materiais)
utilizadas no proces su c1e 1ra ba ih o e m saúd e . Náo se reduzem às formas
de organização d os sçrv iços d e saúde nem aos modos de administrar,
gerenciar ou gerir um sistema de saúde, ainda que possam interagir,
sinergicamente, com as dimensões gerencial e organizativa de um sistema
de serviços de saúde nas estratégias de transformação. Constituem, enfim,
racionalidades diversas que informam as intervenções técnicas e sociais
sobre as complexas necessidades humanas de saúde.
Eliana Ribeiro GranJa
Formatação
Maria Inês Vaz Genoese
Apoio administrativo
Luis Cláudio Guimarães da Silva
Catalogação na fonte
Centro de Informação Científica e Tecnológica
Biblioteca da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
G512p Giovanella, Lígia (org.)
Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. / organizado por Lígia
Giovanella, Sarah Escorei, Lenaura de Vasconcelos Costa Lobato, et ai. -
Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2008.
1112 p. il., tab., graf.
1. Política de Saúde. 2. Sisten1as d e Saúde. 3 . Nível de Saúde .
4. Iniqüidade Soci a l. 5 . Ciência. 6. Tecno l o gia. 7. Pesquisa.
8. Serviços de Sa úd e. 9. 3::eci.;:.-·v :: ~J }Iu rna n o s e m Saúde.
10. Sistema Únic o d e:)~:~. 't. _:i.~ _:i·:,ç ão d e Recursos.
0
12. Cobertura de Serviçc,s '.J '"- . . , ::· · ;. . -~' '. ·:" l 5 . Atencão à Saúde.
- J
14. Vigilância Epidemiol ógtt ..-, ·: · ·. ·.;:;~'.'.t ·~ 1 ia. I. Escorei, Sarah
(org.). II. Lobato, Lenaura cu:: '._:'.,. · _., · ' . . · ~:.~ ,. org.) . III .Título.
- - - - - - - - - - - - - -- -- -------------- '~,:.: LJ - 22.ed . - 362. 10981
_____ ___-- ----·- -- -
.,
2009
EDITORA FIOCRUZ
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