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Alexandre Mariotti, Mestre e
Doutor em Direito pela Faculdade
de Direito da UFRGS, Professor de
Direito Constitucional da PUCRS.
1. MEMBROS DA FEDERAÇÃO.
O federalismo, entre nós, é princípio fundamental (art.
1º) e cláusula pétrea (art. 60, § 4º, I). É no art. 18, entretanto, que
encontramos o texto normativo que melhor o explicita:
Art. 18. A organização político-administrativa da
República Federativa do Brasil compreende a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos
autônomos, nos termos desta Constituição.
1 O presente texto foi elaborado a partir de anotações de aula. Sua publicação não pretende,
pois, “fazer doutrina”, mas disponibilizá-lo, como material didático de apoio, aos
acadêmicos da Faculdade de Direito da PUCRS. Todos os artigos citados são da
Constituição da República Federativa do Brasil, editada em 05.10.1988, com exceção
daqueles expressamente referidos a outros texto normativos. As referências bibliográficas
constam das notas de rodapé.
2 Exemplo dos primeiros é Celso Ribeiro Bastos (BASTOS, Celso Ribeiro. “Curso de
Direito Constitucional”. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 258). Entre os últimos, José
administrativo-territoriais da União – isso se forem criados novos territórios,
já que, no momento, não existe nenhum: dos que existiam até 1988,
Roraima e Amapá foram transformados em Estados (art. 14 do ADCT) e
Fernando de Noronha foi extinto, sendo seu território incorporado pelo
Estado de Pernambuco.3
Resta claro que a ordem constitucional vigente admite a
criação de Territórios, valendo lembrar que essa figura surgiu à margem da
Constituição – quando o Brasil adquiriu o Acre da Bolívia, através do
Tratado de Petrópolis, de 1903 – e que o art. 12 do ADCT, segundo
ALEXANDRE DE MORAES,4 indica a possibilidade concreta de criação
de novos Territórios Federais.
Aos membros da Federação – União, Estados, Distrito
Federal e Municípios – se aplicam as vedações de natureza federativa do
art. 19, que têm o objetivo de manter o equilíbrio das relações estabelecidas
entre eles:5
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas,
subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou
manter com eles ou seus representantes relações de
dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a
colaboração de interesse público; (o Brasil é um estado
laico, o mesmo devendo valer para os membros da
Federação. Ver art. 150, VI, b).
II - recusar fé aos documentos públicos; (os
documentos públicos de um membro da Federação
devem ser reconhecidos pelos outros)
III - criar distinções entre brasileiros ou preferências
entre si. (independentemente da residência ou do local
de nascimento, a nacionalidade é uma só, devendo ser
aplicado o princípio da igualdade do art. 5º; da mesma
Afonso da Silva (SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19. ed. rev.
e atual. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 105 e 476-477).
3 Chega a ser curioso, pois, que a Constituição gaste tempo dispondo sobre entidades que
não existem, como faz no § 2º do art. 18 e no art. 33.
4 MORAES, Alexandre. “Direito Constitucional”. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 272.
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Devendo ficar claro que, do ponto de vista formal, não há hierarquia entre os membros da
Federação – sem prejuízo de se reconhecer que, na prática, a União tende a se impor em
relação aos demais membros, como já destacamos em obra didática anterior (MARIOTTI,
Alexandre. “Teoria do Estado”. Porto Alegre: Síntese, 1999, p. 88-89).
forma, é vedado aos membros da Federação
distinguirem entre si. Ver art. 150, VI, a).
1.1. UNIÃO.
Na boa definição de JOSÉ AFONSO DA SILVA, é a
entidade federal formada pela reunião das partes componentes,
constituindo pessoa jurídica de direito público interno, autônoma em
relação às unidades federadas, e a quem compete exercer as prerrogativas
da soberania do Estado brasileiro.6
Convém relembrar que esse exercício das prerrogativas
da soberania decorre das competências que a Constituição da República
atribui à União (art. 21, I a IV, especialmente) e não faz com que a União se
confunda com o todo – a República Federativa do Brasil, que é quem tem
personalidade jurídica de Direito Internacional. Não é realmente a União
que aparece nos atos de Direito Internacional, mas o Brasil – do qual, mal
comparando, a União atua como representante.
Aliás, esclarece o mesmo autor, embora a ordem
jurídica estabelecida pela União se aplique a todo o território nacional, ela é
menor que a ordem jurídica estatal, que engloba todas as ordens jurídicas
vigentes no território – a Federal, as Estaduais, as Municipais e a do Distrito
Federal.7
No plano do Direito Interno, a União é uma pessoa
jurídica, titular de direitos e obrigações, como se vê, desde logo, no art. 20
da Constituição da República, que enumera os bens da União. Também é
responsável por seus atos e tem a sua sede na Capital Federal. Para fins
processuais, entretanto, a Constituição estabelece regras de foro especiais,
conforme a União seja autora ou ré.
1.2. ESTADOS.8
1.3. MUNICÍPIOS.
Os Municípios também são pessoas jurídicas de direito
público interno, com a particularidade de que sua autonomia é exercida em
relação a uma determinada parcela do território do Estado federado onde
esteja localizado.
A Constituição é expressa em considerar que os
Municípios compõe a Federação, e sua autonomia (art. 29), como a dos
Estados, desdobra-se em auto-organização, através da elaboração de Lei
Orgânica Municipal, espécie de “Constituição municipal”, cujo conteúdo
2. DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIAS.
Composto por pessoas jurídicas dotadas de autonomia,
o Estado Federal tem no sistema de distribuição de competências o seu
ponto central. Salienta FERNANDA ALMEIDA que a decisão tomada a
respeito da repartição de competências é que condiciona a feição do Estado
federal, determinando maior ou menor grau de descentralização.14
2. 1. COMPETÊNCIAS.
Estabeleça-se desde logo: Competência é a faculdade
juridicamente atribuída a uma entidade, ou a um órgão ou agente do Poder
Público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de
poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas
funções.15 Dito de outra forma, competência é poder, atribuído pela
Constituição para que os órgãos do Estado possam desempenhar os papéis
que a mesma Constituição lhes assinala.
Por essa perspectiva distinguem-se competências
materiais16 e competências legislativas.
Competências legislativas, conforme o nome já indica,
são “poderes de legislar”, referindo-se à partilha do poder de legislar entre
os membros da Federação, constituindo-se, nas palavras de FERNANDA
ALMEIDA, no problema nuclear da repartição de competências na
2. 3. COMPETÊNCIAS NA CONSTITUIÇÃO.
A Constituição adotou um sistema complexo em que
convive a repartição clássica, com atribuição de competências privativas ou
exclusiva para cada um dos membros da Federação, e a repartição
cooperativa, com a previsão de competências comuns e concorrentes a
serem partilhadas por mais de uma entidade federada. Assim:
20 Para José Afonso da Silva, nas competências comuns os entes federados agem em pé de
igualdade, enquanto que nas competências concorrentes existe primazia da União no que
respeita à fixação de normas gerais (op. cit., p. 483). Fernanda Almeida, todavia, entende
que a coordenação e cooperação entre as entidades federadas se dará sob a égide da
legislação federal, conforme resulta do parágrafo único do art. 23 da CF e da sistemática
adotada no art. 24 (op. cit., p. 133-134).
21 Tais delegações devem ser feitas para todos os Estados, sob pena de se ferir o art. 19 da
CRFB, criando preferências entre entes federados. É a posição de Anna Cândida da Cunha
imediatas do Município, que devem ser definidos caso a caso – na
Constituição anterior, era peculiar interesse): arts. 29 e 30;
d. Distrito Federal – além da competência de auto-
organização referida no “caput” do art. 32, acumula poderes dos Estados e
poderes dos Municípios em matéria legislativa, conforme o § 1º do mesmo
artigo. A Constituição, porém, estabelece algumas exceções em favor da
União, como se vê no art. 21, XIII e XIV, e no art. 22,XVII.
Ferraz, endossada por Fernanda Almeida (op. cit., p. 110) e por Alexandre de Moraes (ob.
cit., p. 287).
22 Ver nota 20.
23 FERREIRA FILHO, op. cit., p. 195. Na sua linha de raciocínio, mais fácil é o ângulo
negativo, isto é, indicar os caracteres de uma norma que não é “geral” (p. 195-196).
O primado da legislação da União sobre normas gerais
não impede que Estados e Distrito Federal legislem sobre a matéria, naquilo
em que não contrariar a legislação federal (art. 24, § 2º). Enfim, na ausência
de legislação federal, os Estados e o Distrito Federal exercerão competência
legislativa plena, legislando de forma a atender suas peculiaridades (art. 24,
§ 3º): nesse caso, a superveniência de lei federal sobre normas gerais
suspenderá a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (art. 24, § 4º).
Parece assistir razão a JOSÉ AFONSO DA SILVA
quando diz que competência suplementar abrange a atuação dos Estados e
do Distrito Federal nas hipóteses dos §§ 2º e 3º.24
Registre-se que, embora os Municípios não tenham sido
mencionados pelo art. 24, o art. 30, II, lhes assegura competência para
suplementar a legislação federal e estadual no que couber – essa última
expressão é importante, se formos aceitar a tese de FERNANDA
ALMEIDA, segundo quem trata-se de competência legislativa: para essa
autora, os Municípios exercem competência suplementar em relação à
legislação federal e à estadual nos mesmos moldes previstos no art. 24.25
Parece-nos demasiado generoso esse entendimento, todavia: a competência
suplementar do Município deve passar pelo filtro do interesse local (art. 30,
I), não se equiparando à competência suplementar dos Estados e do Distrito
Federal.
24 SILVA, op. cit., p. 506. FERNANDA ALMEIDA (op. cit., p. 152), por sua vez, diz que
o primeiro caso é de competência complementar e o segundo de competências supletiva – o
que, data venia, parece um detalhamento desnecessário.
através da atribuição de competências legislativas e materiais – e ainda deve
assegurar-lhes meios que possibilitem desempenhar essa funções.
Assim, as competências tributárias se destinam a gerar
rendas que possam sustentar o Estado como um todo, e cada entidade
federada em particular. A rigor, é de tributos que o Estado vive,
independentemente da forma (unitária ou federal) que adota. Característico
do Estado Federal é descentralização tributária, atribuindo-se competências
tributárias próprias a cada membros da Federação. Daí se falar em tributos
federais, tributos estaduais e tributos municipais.
As competências tributárias estão estabelecidas em
separado das competências políticas e obedecem a uma sistemática diversa:
se atribuem competências privativas a cada um dos membros da Federação
(arts. 153 a 156), cabendo à União, além disso, a competência residual (arts.
148, 149 e 154).26 A Constituição ainda estabelece regras para a repartição
das receitas tributárias (arts. 157 a 162), indicando que o produto da
arrecadação tributária não pertence exclusivamente ao titular da
competência para instituir e arrecadar o tributo.