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Miriam Debieux Rosa

• Introdução da perspectiva de aplicar a psicanálise à clínica social, destacando a influência de Lacan, seguindo os
passos de Freud.

• Ênfase na ideia de que o inconsciente vai além dos traumas individuais, incluindo aspectos não ditos e proibidos
nas relações familiares e sociais.

• Possibilidade de uma "clínica do social" para detectar preconceitos e padrões prejudiciais em práticas
institucionais e o papel da psicanálise - proporcionar uma compreensão mais crítica das dinâmicas sociais.

• O foco principal do livro está na intervenção psicanalítica em contextos marcados por conflitos sociais e
culturais. A psicanálise pode ajudar a compreender as dinâmicas entre o sujeito e o ambiente sociopolítico.

• A clínica psicanalítica está intrinsecamente ligada ao ambiente social, político e cultural no qual os sujeitos vivem
e se constroem, portanto, a compreensão do papel do sujeito nesses contextos é crucial para a prática clínica.
Laço social e clínica psicanalítica:

• Relação entre Laço Social e Clínica Psicanalítica: Os laços sociais são construídos através da linguagem e de esferas
relacionais, afetivas, libidinais e políticas, e como esses laços muitas vezes mascaram conflitos subjacentes.

• Conflitos no Laço Social e sua Relação com a Política: Os conflitos no laço social estão ligados à política e podem criar
impasses na relação do sujeito com os outros e com seu próprio desejo. Isso envolve instâncias políticas e várias
formas de violência.
• Desamparo Discursivo e Máscaras Políticas: traz o conceito de "desamparo discursivo" e como o discurso social e
político muitas vezes mascara sua verdadeira natureza, capturando o sujeito. Isso é usado para analisar fenômenos
sociais e efeitos subjetivos, incluindo a influência do discurso no capitalismo e na globalização.

• Cenas de Violência como Manifestações Políticas: As cenas de violência são manifestações visíveis de conflitos político-
culturais. Essas obscurecem as tramas subjacentes e limitam a reflexão política.

• Contribuição da Psicanálise à Compreensão dos Desafios Contemporâneos: A psicanálise não busca substituir outras
análises nos campos social e político, mas contribuir para a compreensão dos desafios contemporâneos, incluindo
questões como imigração, refúgio e a problemática adolescente.

• Ética e Política na Psicanálise: A ética não está acima da política, mas está fundamentada nela.
A clínica psicanalítica diante do desamparo social e discursivo: impasses e direção do tratamento

• Desafios na Clínica Psicanalítica em Contextos de Desamparo Social e Discursivo: a clínica psicanalítica enfrenta
desafios frente a esse contexto, havendo casos que variam desde crianças com dificuldades de aprendizagem até
adolescentes agressivos, imigrantes em situações precárias e vítimas de diversas formas de violência. O objetivo é
compreender como a psicanálise pode intervir eficazmente nessas situações, enfatizando abordagens como a
psicanálise implicada, a clínica do traumático e a prática clínico-política.

• Concepções Lacanianas de "Outro" e Linguagem: a autora explora as concepções lacanianas relacionadas ao "Outro",
que não se limitam a uma única definição, mas envolvem conceitos como "outro" (outro sujeito), "Outro" (campo dos
significantes) e "discurso do outro". A linguagem desempenha um papel fundamental na busca de identificação com os
outros, ao mesmo tempo em que pode evitar o reconhecimento da diferença. Jacques Lacan enfatiza a ambiguidade
inerente à linguagem, que nos conecta ao "Outro" enquanto nos impede de compreendê-lo completamente.

• Papel da Palavra e da Fala na Constituição do Sujeito: A importância da palavra e da fala na constituição do sujeito. Isso
ocorre por meio da mediação do "Outro primordial", muitas vezes associado à função materna, que fornece
significantes que marcam o corpo como pulsional e introduzem a criança no campo da linguagem. A palavra
desempenha um papel crucial ao registrar a história e fundar o fato. Além disso, é fundamental distinguir entre fala
(que opera no sujeito) e enunciado (que ocorre na sequência temporal do discurso).
• Inconsciente e Discurso do "Outro" na Perspectiva Lacaniana: O inconsciente é compreendido como história e
dimensão política. Discute-se como discursos sociais se transformam em um "discurso do Outro", que busca impor
suas próprias verdades ao sujeito, silenciando-o e deslocando seu lugar de fala. Essa dinâmica afeta profundamente o
desejo e o gozo do sujeito.

• Abordagem dos Dispositivos e Direção do Tratamento na Clínica Psicanalítica: Ênfase na necessidade de


intervenções que considerem o papel do discurso que governa o laço social, bem como estratégias clínicas coletivas.
A instância política na clínica não deve ser ocultada, mas sim explicitada, para uma compreensão mais profunda das
dinâmicas sociais e subjetivas.

O não dito: articulação do sintoma da criança ao discurso dos pais

• Sobre a Transmissão do Não Dito: o não dito nos leva a questionar o poder das palavras. Ela destaca que o poder das
palavras está conectado ao silêncio, à alienação, à ideologia, à história e ao que é mal dito. O foco muda da palavra
para o "significante".
• O Significante e Sua Amplitude: O significante, ao contrário das palavras, não está restrito a indivíduos específicos e
atravessa gerações e grupos sociais. Ele é transmitido pelos pais para os filhos e marca o sujeito. Esses significantes
são transmitidos pela tradição familiar e moldam a singularidade do sujeito.
• Os Efeitos do Não Dito: Alguns significantes podem ser omitidos no discurso, o que leva a sua repetição de forma não
explicita. Isso pode bloquear a articulação de outros significantes e causar efeitos na constituição do sujeito, como
inibições e sintomas. O que não é dito pelos pais retorna nas fantasias e ações da criança.
• O Não Dito e a Repetição: O não dito age como um imperativo e opera por meio da repetição e identificação. Isso pode
afetar a relação entre o ser, o fazer e o dizer. A criança pode se identificar com o que não foi dito pelos pais,
transformando-o em repetições literais ou sintomas.
• Efeitos do Não Dito na Clínica: Na clínica, dois efeitos do não dito são observados. Primeiro, o não dito da história pode
causar atrasos no desenvolvimento e empobrecimento ideativo. Segundo, o não dito dos pais pode ser repetido pela
criança em sua ação. Isso leva à estranheza do sujeito diante de seu próprio comportamento.
• A Análise do Discurso do Outro: Para compreender o sintoma da criança, é essencial analisar o discurso do Outro, que é
influente na formação do sujeito. Isso envolve entender como o discurso dos pais afeta a criança e buscar estratégias
clínicas para promover a separação desse discurso.
• Reencontrando a Verdade no Não Dito: A verdade pode ser encontrada no que não foi dito, e isso pode ser revelado por
meio de diferentes formas, como no corpo, nas memórias de infância, na evolução semântica, nas tradições e nos rastros
deixados ao longo do tempo.
• Aplicação na Clínica com Crianças: A clínica com crianças ajudou a identificar como o discurso dos pais influencia os
sintomas das crianças e como isso está relacionado a atrasos de desenvolvimento, atos antissociais e outros problemas.
Essa abordagem permitiu avançar na compreensão e no tratamento clínico.
UMA ESCUTA PSICANALÍTICA DAS VIDAS SECAS E A RESISTÊNCIA DO PSICANALISTA
O sujeito excluído do modelo neoliberal: o silenciamento e o traumático

• Consequências da Pobreza e Exclusão Social: Apatia, solidão e emudecimento, reprodução da violência e da pobreza
emocional e intelectual como formas de encobrir traumas.
• O Silenciamento como Reação ao Trauma: reação ao trauma causado pela consciência da impotência diante de uma
sociedade que nega oportunidades. O sujeito cria uma barreira, silenciando-se, como uma proteção necessária para sua
sobrevivência psíquica.
• Ruptura do Contrato Narcísico e o Traumático: A exploração e exclusão social podem reforçar fantasias de rejeição, ódio e
despossessão, resultando na irrupção do traumático, que quebra os fundamentos do contrato social.
• Especificidades na Escuta Clínica: deve considerar sua exclusão dos bens e modos de gozo da cultura. Antes de
diagnósticos ou estruturas, é fundamental ouvir o sujeito em condição traumática.

• Diferentes Respostas à Exclusão: Diferentes indivíduos reagem de diferente formas à exclusão, alguns submissos, outros
fechados em si mesmos. A escuta deve romper barreiras e resgatar a experiência compartilhada com o outro.

• A Resistência do Analista na Escuta: Aborda o papel do analista na resistência ao lidar com violências. A escuta
psicanalítica envolve a presença do outro desejante e a compreensão dos limites da resistência ao lidar com o sofrimento
alheio.
• O Lugar do Sujeito na Estrutura Social: Ressalta a importância de considerar o lugar do sujeito na estrutura social,
especialmente na lógica discursiva do mercado. A identificação do sujeito como "dejeto" dificulta seu
posicionamento na trama de saber.

• A Ética e a Transformação Social: Enfatiza a ética e a necessidade de promover mudanças nas estruturas sociais e
políticas que sustentam a exclusão social. Sugere a construção de discursos que revelem os custos do
funcionamento do modelo neoliberal e o desenvolvimento de metodologias clínicas para a transformação do laço
social.

Escuta e resistência do analista


• A autora descreve experiências práticas no atendimento de famílias em situação de miséria e adolescentes
internados em instituições correcionais, como a antiga Febem, que enfrentaram denúncias de maus-tratos. Ela
destaca a ausência de literatura e experiência disponíveis na época sobre esse assunto, o que a levou a desenvolver
uma perspectiva única.

• Essa perspectiva baseia-se na compreensão do "desamparo social" e do "desamparo discursivo". O desamparo


social refere-se à falta de apoio e recursos para os sujeitos em situações vulneráveis, enquanto o desamparo
discursivo envolve a desqualificação do discurso desses sujeitos e sua exclusão do diálogo social.
• Referência à teoria freudiana, relacionando o desamparo à segunda teoria da angústia e à dimensão do traumático. O
desamparo está ligado à experiência inicial do bebê, que é completamente dependente dos cuidados de outros para
sobreviver e entrar na linguagem.

• No processo de constituição subjetiva, o sujeito constrói "bordas" em torno do real, que são formadas a partir do
desejo do Outro e da transmissão cultural pela linguagem.

• A exposição traumática é destacada como um elemento importante, com sujeitos constantemente expostos à violência
e recursos limitados para lidar com o trauma, resultando em desubjetivação.

• A autora também aborda a resistência do psicanalista à escuta desses sujeitos devido à sua própria posição de classe
social, o que pode dificultar a compreensão dos sujeitos em situações de desamparo.

• Destaca a necessidade de uma abordagem ética e política na psicanálise, que rompa com o pacto de silêncio do grupo
social ao qual o analista pertence e reconheça o sofrimento e a verdade dos sujeitos em situações de exclusão social. A
escuta psicanalítica é considerada transgressora em relação aos fundamentos da organização social e requer um
posicionamento ético do analista para superar os impasses na clínica e na sociedade.
• A autora menciona a questão da responsabilização injusta dos sujeitos como um dos impasses na escuta
psicanalítica. Ela observa que, muitas vezes, há uma tendência de culpar os sujeitos em situações de miséria e
violência, supondo que eles têm total controle sobre suas circunstâncias e decisões. Essa responsabilização
injusta pode dificultar o reconhecimento desses sujeitos como desejantes e a compreensão de suas
determinações inconscientes.

• Trauma e violência na imigração forçada: a dimensão sociopolítica do sofrimento

• Contexto e Parceria com a Casa do Migrante: O texto introduz o tema do trauma e da violência e menciona a
parceria com a Casa do Migrante, uma instituição que acolhe imigrantes e refugiados em São Paulo. O objetivo é
desenvolver intervenções para essa população, ajudando a reconstruir laços sociais e vínculos afetivos.
• Processos de Suspensão das Elaborações: Presença de angústia, culpa, vergonha e superação das violências em
alguns imigrantes atendidos. Inicialmente, a maioria era de latino-americanos fugindo da pobreza.
• Precariedade e Desafios dos Imigrantes: Descreve as condições precárias de muitos imigrantes, incluindo
estrangeiros de outros estados do Brasil, com baixa formação escolar e cultural, falta de referências culturais e
históricas, depressão, alcoolismo e sonhos não realizados.
• Violência na Imigração: Aborda a questão da violência na imigração e a distinção entre imigrantes e refugiados.
Refugiados são definidos pela Convenção de 1951 como pessoas que fogem de perseguição, enquanto imigrantes
por motivos econômicos ou naturais não são automaticamente considerados refugiados.

• Imigração Forçada: O texto propõe o termo "imigração forçada" para incluir o peso da violência nas situações de
exclusão social e econômica. Isso amplia a clínica para outros contextos de violência e a condição dos sujeitos
contemporâneos desgarrados de suas tradições e história.

• Migração como Busca de Diversidade: Enfatiza que a imigração não é patológica, mas sim um movimento de busca
da diversidade e de transformação do indivíduo. Faz referência ao conceito de desejo errante de Lacan.

• Diferenciação dos Tipos de Migração: Distingue entre migração voluntária e migração forçada e errante, que
representa a condição de excluídos destinados a vagar sem destino devido à imposição de outros.
Imigrantes, migrantes e refugiados e a condição errante do desejo

• Duas modalidades de imigração: a busca pela descoberta e a errância.


• Dimensão trágica do migrante, comum a todos, e utiliza a errância do desejo como metáfora para a condição humana de
busca constante.
• Freud sobre a errância e o nomadismo do desejo, destacando que a experiência analítica envolve a aventura de se exilar
de si mesmo.
• A clínica do traumático em relação à imigração forçada, enfocando os processos de deslocamento psíquico e territorial.
• Relação entre deslocamento e metonímia, enfatizando a ligação da imigração com as condições sociais e a busca pelo
desejo.
• Importância de considerar tanto o deslocamento territorial quanto o psíquico na análise da imigração, evitando separá-
los artificialmente.
• Os processos de deslocamento podem resultar em desenraizamento ou cristalização identitária do sujeito, com destaque
para o desenraizamento causado pela migração forçada devido à violência e miséria.
• A imigração não é nem uma maldição nem uma bênção, mas uma possibilidade do sujeito que pode estabelecer uma
abertura ao Outro. É um processo complexo com motivações sociais, políticas, econômicas e subjetivas, com ênfase nas
manipulações e abusos que podem ocorrer.
• Questão política: é abordada, especialmente no contexto de pessoas em situação irregular agindo por urgência, o que
leva à suspensão das certezas simbólicas e imaginárias do Eu.

A dimensão sociopolítica do sofrimento e a transmissão da história


• O texto explora a dimensão sociopolítica do sofrimento em situações de imigração forçada devido a guerras e
violências, incluindo a angústia e a violência, bem como a transmissão dessas experiências aos filhos, usando o filme
"Incêndios" como exemplo.

• O filme "Incêndios" é apresentado como um exemplo que aborda a história de Nawal, uma mulher que passou por
diferentes papéis e experiências ao longo da guerra e imigração, incluindo o luto, militância política, maternidade e
imigração. Ela perdeu seus filhos durante uma guerra civil no Líbano.

• No contexto do texto e do filme "Incêndios", a autora está explorando como as experiências de sofrimento de Nawal,
uma mulher que passou por várias adversidades devido à guerra e à imigração forçada, são transmitidas aos seus
filhos.

• A relação entre a dimensão sociopolítica do sofrimento e a transmissão da história é que as experiências traumáticas
de Nawal, como a perda de seus filhos durante a guerra civil, têm um impacto significativo em sua vida e na vida de
seus filhos. Essas experiências são parte integrante da história da família e de sua identidade cultural.
• O filme "Incêndios" mostra como as revelações sobre a história de Nawal, incluindo a verdade sobre o destino de seus
filhos, têm o poder de reabrir a trama da história e permitir que os filhos ressignifiquem suas próprias experiências à luz
dessas revelações. Isso ilustra como a história e o sofrimento de uma geração podem ser transmitidos para a próxima,
afetando a forma como os indivíduos entendem a si mesmos, suas raízes culturais e seu lugar no mundo.

• Assim, a dimensão sociopolítica do sofrimento, em particular as consequências de eventos sociais traumáticos,


desempenha um papel fundamental na forma como a história de uma família e de uma comunidade é transmitida e
compreendida ao longo do tempo. Através dessas histórias compartilhadas, as gerações subsequentes podem aprender
sobre os desafios enfrentados por seus antepassados e encontrar maneiras de se relacionar com essas experiências em
seu próprio contexto.

Do imaginário traumático às intervenções clínico-políticas


• Diferenciação clínica entre o trauma do sujeito e o acontecimento violento, problematizando a aplicação do conceito de
trauma, como o "Stress Pós-Traumático", em imigrantes e refugiados recém-chegados.
• Crítica se concentra na abordagem que enfatiza os efeitos da violência, despolitizando o acontecimento e reduzindo o
sujeito à condição de vítima.
• A partida de seu país de origem é uma escolha que envolve deixar para trás laços afetivos, compromissos pessoais e
políticos, história e língua, o que pode gerar angústia intensa.
• As situações de imigração forçada também podem envolver culpa relacionada à sobrevivência em relação aos familiares e
desencadear crises de angústia e tentativas de suicídio, exigindo intervenções específicas.
• Alguns indivíduos conseguem encontrar um propósito para sobreviver, seja para testemunhar o ocorrido ou dar
continuidade à trajetória da família, enquanto outros enfrentam abalos psíquicos estruturais e dificuldades de
reorganização.

• O diagnóstico desses casos não deve presumir uma estrutura psicótica prévia, pois isso desconsideraria os efeitos
disruptivos das situações traumáticas.

• Em alguns casos, o exílio forçado leva o sujeito a uma errância sem fim, e a intervenção clínica busca separar a violência
do acontecimento da dimensão traumática do sujeito.

• Lacan é referenciado para distinguir entre o acontecimento traumático e a dimensão do trauma

• A intervenção clínica permite ao sujeito retomar sua causa e articular angústia e desejo, formulando uma narrativa que
o situe em sua história e na história da comunidade. A abordagem clínica busca reconhecer a complexidade dessas
situações e promover a ressignificação do sujeito em seu contexto histórico e cultural.

• A psicanálise deve se concentrar na especificidade do processo em casos de imigrantes e refugiados. A violência possui
uma força imaginária que impacta a verdade subjetiva política, transformando a contingência em verdade última e
reduzindo o sujeito. O trauma ocorre quando o sujeito recua diante do desamparo, lançando-o no impedimento do
esquecimento e na manifestação de imagens ou manifestações de loucura.
• A prática psicanalítica deve diferenciar os tempos na construção da narrativa e do trabalho de luto, com foco na
recuperação da escolha do sujeito para sustentar a partida. A escolha revela a divisão do sujeito e sua pulsão, indicando
um além das identificações sociais e uma transgressão das fronteiras culturais.

• Alienação e a separação: a ignorância caracteriza-se pelo excesso de significado, enquanto a separação evoca uma
vontade de sair e de saber o que se é além das inscrições do Outro.

• Processo de escolher a partida ou a fuga, o desejo de saber supõe o insabido, exigindo um percurso e um trabalho. Algo
se parte, e a escuta do processo de escolha é essencial para despotencializar a violência e permitir que o sujeito retome
seu lugar na cena. Por isso, eles oferecem uma escuta com características peculiares, incluindo visitas à moradia do
sujeito na Casa do Migrante, para promover o laço social.

• O trabalho clínico proposto visa construir a posição de testemunha e transmissora da cultura, transformando o trauma
em uma experiência compartilhada.

• Diferentes dimensões estão presentes nas narrativas, como o endereçamento, a posição enunciativa, a referência às
perdas, uma escolha, uma partida, um esquecimento, o reconhecimento e seus rastros, e um tempo posterior.

• O processo de construção da narrativa é dividido em três tempos: o momento de partir, o tempo de esquecer e o
tempo de contar, cada um com sua abordagem específica. A narrativa inicialmente se concentra na partida forçada e
nas escolhas, sendo ressignificada posteriormente na transmissão.
• O trabalho clínico enfrenta desafios como a dificuldade de expressão em língua não materna, questões de
desigualdade, diferenças culturais, a atuação em campo multidisciplinar, o desconhecimento das práticas de
psicologia/psicanálise por parte dos refugiados, questões de gênero, demandas objetivas e urgentes, e a desconfiança
em relação a qualquer laço.
• A presença dos profissionais permite que os abrigados organizem narrativas sobre suas histórias, motivos de saída do
país e reflitam sobre como os processos políticos, sociais e subjetivos os afetam. O foco está na dialetização das
demandas, no manejo da angústia e do luto para a construção de narrativas e na promoção de laços sociais, apesar das
diferenças culturais e das experiências de violência vividas.

Traumas, heróis e resistências e psicanalistas

• Papel do Psicanalista em Contextos de Violência: O texto discute o papel do psicanalista em situações de conflito e
violência, destacando as experiências de Márcio Gagliato, um psicólogo que trabalhou em regiões afetadas por guerras e
conflitos. Gagliato questiona a eficácia da escuta do sofrimento em auxiliar aqueles que enfrentam situações extremas.
• Experiências de Márcio Gagliato na Somália e no Sudão: O texto apresenta duas cartas de Márcio Gagliato descrevendo
sua experiência de trabalho em regiões de conflito, como a Somália e o Sudão. Ele destaca a importância de lidar com as
condições emocionais da equipe e a necessidade de permitir que as pessoas expressem suas experiências traumáticas.
• Dilema na Abordagem do Sofrimento: O texto levanta questões sobre como abordar o sofrimento em contextos de violência,
destacando o dilema entre encorajar a expressão do sofrimento e evitar a retraumatização. A discussão se concentra na
necessidade de encontrar estratégias de intervenção adequadas para auxiliar as pessoas afetadas e as equipes que trabalham
nesses cenários desafiadores.
• Estratégias de Intervenção Sensíveis: O texto ressalta a importância de estratégias de intervenção sensíveis às necessidades
individuais e culturais das pessoas afetadas. Isso envolve o uso de técnicas terapêuticas apropriadas e o treinamento
adequado das equipes de apoio.
• O Conceito de "Heróis" em Contextos Humanitários: O texto discute o conceito de "heróis" atribuído aos profissionais de
ajuda humanitária e como isso pode ser problemático. Ele destaca a necessidade de promover uma cultura de cuidado e
apoio emocional para esses profissionais, reconhecendo seu impacto emocional e desafiando estereótipos prejudiciais.

Resistência
• Resistência Política e Ética: O direito à resistência política é considerado uma forma de desobediência civil e está
relacionado à ética na política. Implica a capacidade de criar uma ordem jurídica revolucionária em substituição aos regimes
opressivos, baseada em princípios e normas substantivas.
• Destaque Atual da Resistência: A resistência política à opressão ganhou destaque recentemente em ações e discussões
filosóficas. A resistência é vista como uma experiência de subjetivação e autonomia, enfraquecendo o opressor e forçando-
o a recuar.
• Etienne de la Boétie e Ação Individual: A ação individual na transformação política - questionamento da servidão voluntária
e destacou a importância da ação individual na mudança política.
Resistência Em Psicanálise
• Evolução do Conceito na Psicanálise: De uma conotação de resistência contra o tratamento analítico para uma defesa do eu
contra traumas e repetições, protegendo o eu do conflito pulsional e permitindo que ele lide com a realidade de forma mais
tolerável.
• A Importância da Resistência do Analista: Lacan enfatiza que a resistência mais significativa na análise é a do analista, que
deve ouvir o paciente sem censura. A resistência do analista em ouvir é fundamental para o processo analítico.

• Resistência em Situações Extremas: Por exemplo, em campos de concentração, envolve a capacidade de manter uma
atitude de reserva diante do poder opressor do Outro, destacando a importância dos ideais políticos e religiosos na
resistência física e psíquica.

• A Ética da Psicanálise e o Ato Ético: Envolve o encontro com o real pulsional e a constatação de que o objeto do desejo não
existe na realidade. Isso leva ao luto, à perda de sentido e à necessidade de reconstruir uma sustentação fantasmática
mínima para dar sentido ao real. O ato ético na psicanálise desafia a moral tradicional e é um ato comprometido,
responsável e político, resistindo à instrumentalização social do gozo.
CENA SOCIAL: GOZO E EXPERIÊNCIA

• Foca na relação entre a clínica psicanalítica e o contexto sociopolítico. O objetivo principal é revelar como os sujeitos são
influenciados por estratégias de poder e os desafios que enfrentam em tempos difíceis. A contribuição da psicanálise
nesse contexto não visa esgotar a compreensão dos fenômenos sociais e políticos, mas sim destacar a dimensão
inconsciente presente nas práticas sociais que não pode ser abordada apenas de forma lógica.

Sujeito e sociedade: o inconsciente nas práticas sociais

• Relação entre o sujeito e a sociedade dentro do contexto da psicanálise.


• Enfatiza a singularidade epistemológica da psicanálise em relação a outras disciplinas.
• A aplicação da psicanálise em questões sociais complexas, como imigração, atos infracionais, movimentos sociais e
toxicomania. Ele destaca a necessidade de um método psicanalítico para abordar esses fenômenos.
• Relação entre teoria e prática na psicanálise - a prática clínica gera ideias que se desenvolvem por meio da construção de
conceitos. A autora destaca a importância de manter uma base teórica sólida.
• Freud via a psicanálise não apenas como um método de investigação e tratamento, mas também como um corpo teórico
que sistematiza o funcionamento humano. Isso é ilustrado por um episódio envolvendo Freud durante uma viagem aos
Estados Unidos.
• A retomada da psicanálise por Lacan nos anos 1950 e sua crítica à direção que a teoria e a prática estavam tomando. Sua
expulsão da Sociedade de Psicanálise Francesa em 1964 é mencionada, e ele destaca a importância de conectar a clínica
com outras disciplinas, como o estruturalismo.
• A relação entre a psicanálise e o campo sociopolítico, destacando a necessidade de desmistificar discursos que silenciam a
experiência. Ele menciona figuras sociais estigmatizadas, como os "muçulmanos" dos campos de concentração e os
toxicômanos.
• Estrutura biopolítica presente em diferentes experiências políticas modernas e contemporâneas. Ele enfatiza a resistência
do sujeito a formas de governo e normatização, bem como a dimensão ética da psicanálise. Modalidades de resistência que
promovem a mudança do gozo para o desejo e a reabilitação do espaço público são indicadas

Métodos: cena social e sujeito

• Análise focada na abordagem do campo sociopolítico na psicanálise. Isso envolve a importância de esclarecer o método e a
concepção de sociedade que guiam essa análise, com o objetivo de considerar o mal-estar como um indicativo da
necessidade de repactuação social. O campo social é visto como uma cena que inclui elementos de fantasia e gozo.
• O campo social é compreendido como constituído por discursos que mascaram a inconsistência e os antagonismos da
sociedade para impor uma identidade sociossimbólica. O método de análise não se limita à situação de análise, uma vez
que o inconsciente está presente em diversas manifestações humanas, culturais e sociais, e o sujeito do inconsciente
influencia todos os discursos.
• Prática extensiva da interpretação como legítima, permitindo trabalhar com discursos presentes em depoimentos,
entrevistas e outras fontes, além das associações livres. Freud já havia incluído a investigação de fenômenos
socioculturais e políticos em sua construção da psicanálise, demonstrando como a psicanálise dialoga com diferentes
campos de conhecimento e contribui para questões políticas e sociais.
• Envolvimento de Lacan em questões institucionais e sua articulação da psicanálise com o pensamento de Karl Marx.
Ele relaciona o conceito de "mais-de-gozar" à mais-valia e sugere a substituição da energia freudiana pela economia
política. Lacan também enfatiza a dimensão histórica conformada às exigências estruturais e a importância do
materialismo histórico.

• Política em Lacan, particularmente em seu Seminário 16, onde ele relaciona a psicanálise com o pensamento de Karl
Marx e aponta Marx como o inventor do sintoma. A relação entre a psicanálise e outras ciências afins, bem como a
articulação entre o sujeito e o campo sociopolítico, são aspectos presentes tanto em Freud quanto em Lacan,
permitindo uma abordagem clínica e crítica social integradas à constituição subjetiva e ao sofrimento humano.

• Teoria dos discursos de Lacan como uma ferramenta ainda não completamente explorada para intervenções clínico-
políticas no discurso que rege a sociedade. A proposta de elaboração coletiva do trauma é apresentada como uma
direção futura de pesquisa, sugerindo novas possibilidades de abordagem do sofrimento humano e das questões
sociopolíticas por meio da psicanálise.
Laço e transformação social

• O texto aborda a transformação da sociedade e as resistências individuais e coletivas contra práticas alienantes. Ele
destaca a importância de reconhecer o aspecto sociopolítico do sofrimento para reposicionar o sujeito em relação ao
seu discurso, luto e voz.
• A análise social não é apenas descritiva, mas visa revelar o desconhecimento que sustenta sintomas e gozo do sujeito,
buscando a dissolução desses sintomas.
• A teoria dos discursos de Lacan é usada como chave de análise, destacando casos de toxicomania e do Movimento
dos Trabalhadores Sem Terra (MST) como exemplos de impasses do sujeito contemporâneo e suas relações
problemáticas com ideais e violência.
• A fragilização da experiência e a incidência na lógica do poder/violência são discutidas, com ênfase na figura do
"muçulmano" como exemplo de instrumentalização social do gozo.
• As consequências do capitalismo avançado, como a relativização da existência compartilhada e a fragilização da
experiência, são exploradas, juntamente com elementos de resistência, como a recuperação da experiência, o laço
singular e coletivo, o humor e o encontro com o contemporâneo.
A criança e o adolescente e o lugar do pai: transmissão e transformação social
• Necessidade de examinar a família tradicional para compreender como as transformações sociais afetam a formação do
sujeito e os laços sociais, com foco no papel do pai, da sexualidade e da transmissão na formação subjetiva.
• Mudanças trazidas pelo capitalismo avançado, neoliberalismo e globalização após os anos 1950, caracterizando essas
mudanças como resposta a palavras-chave da era, como tecnologia, ciência e globalização.
• Os impactos: sentimentos de desenraizamento cultural e sobrecarga de informações, além de mencionar práticas
medievais ou fundamentalistas como respostas a essas mudanças.
• Implicações sociais dessas transformações, incluindo problemas crônicos como pobreza e desigualdade, bem como novos
desafios, como violência, exploração infantil e terrorismo.
• Mudanças na estrutura familiar em resposta às transformações sociais, incluindo questionamentos sobre o papel do pai, da
mulher e as relações entre casais, com ênfase nos impactos sobre crianças e adolescentes.
• Imaginário social como ferramenta para analisar a relação entre cultura e formação subjetiva, definindo-o como um
conjunto de significados e normas que moldam a subjetividade. O imaginário social pode desafiar a visão de universalidade
e verdade no discurso social sobre a criança, enfatizando a necessidade de diferenciar o imaginário social do discurso
Outro.
• A queda do papel do pai na sociedade, explorando como as mudanças no imaginário social afetam a constituição subjetiva,
incluindo as implicações no sintoma individual e coletivo. Continua a exploração da queda do pai, discutindo a importância
de identificar quem enuncia os enunciados fundamentais sobre a criança, destacando como as mudanças no imaginário
social afetam a formação subjetiva e o sintoma, especialmente quando o pai é substituído por outros saberes sociais, como
pediatras e psicólogos.
Gozo e política na psicanálise: o caso da toxicomania

• Relação entre a psicanálise, a política e a produção de verdades, destacando a importância de analisar como a produção
de verdade em discursos sociais muitas vezes está dissociada do fenômeno real.

• Toxicomania como um exemplo de como o discurso social cria uma figura, o toxicômano, que induz a certo tipo de
relação com o outro. A toxicomania apresenta desafios para a psicanálise, especialmente em tempos de capitalismo
avançado.

• A problemática do sujeito toxicômano que busca acesso direto ao objeto de gozo, sem a mediação do laço social, é
explorada, assim como a dimensão política do gozo do toxicômano, relacionada a termos como gozo, lei, vida, nome,
anonimato, dívida, sacrifício e mercado.

• Análise da toxicomania requer um exame das fantasias e dos lugares ocupados pelos agentes no discurso, uma vez que o
sentido de um discurso é determinado pelo lugar de onde é proferido. É importante considerar o desejo do sujeito em
relação ao desejo do Outro e como isso o posiciona no laço social.

• Além disso, o texto explora a figura construída em torno do toxicômano e como muitos indivíduos buscam modalidades
de gozo alternativas ao serviço de bens, desafiando o mercado e outros discursos que tentam silenciá-los.
Ética e política – os ideais
• Interligação de Ética, Política e Violência Contemporânea: Ética, política e violência contemporânea estão intrinsecamente
ligadas e são temas cruciais para o debate social. A psicanálise é uma ferramenta para analisar esses fenômenos - pode
fornecer uma perspectiva única para entender a interseção entre questões éticas e políticas na sociedade moderna.
• Relação entre Gozo, Laço Social e Dimensão Política: A psicanálise pode oferecer um método de análise que nos permite
compreender como o prazer e o sofrimento estão conectados ao contexto social e político, sugerindo que a política pode
afetar a experiência individual e coletiva desses aspectos.
• Estudo de Caso: MST e Representação Midiática: Um editorial de jornal que critica o MST, um movimento social no Brasil.
Ela destaca como esse editorial retrata o MST de maneira negativa, retratando-o como um grupo com ideias antigas,
oposição ao lucro e intenções radicais. Isso levanta questões sobre como os movimentos sociais são retratados na mídia e
como a retórica política pode influenciar a percepção pública. MST é frequentemente retratado de maneira negativa na
mídia, o que pode moldar a opinião pública e influenciar o debate político.
• Rotulação Política de Movimentos Sociais: Outro artigo que caracteriza o MST como uma forma de fascismo social-
religioso. Isso destaca como os movimentos sociais são rotulados e estigmatizados com base em retórica política.
• Perspectivas Divergentes sobre a Política Agrícola no Brasil: A política agrícola recente é bem-sucedida e que não há
concentração fundiária. Isso sugere uma perspectiva diferente sobre a situação agrária no Brasil e levanta questões sobre
como os dados podem ser interpretados seletivamente para apoiar argumentos políticos.
• Narrativas Divergentes e Papel da Mídia: Artigo que oferece uma perspectiva diferente sobre o MST, descrevendo uma
visita a um acampamento do movimento. Isso destaca como diferentes narrativas podem surgir com base na observação
direta e como a mídia desempenha um papel na formação da opinião pública.

• Discurso Político Incisivo e Hostilidade: No oitavo parágrafo, o autor descreve o discurso do editorial como incisivo e
baseado em dados numéricos, mas também aponta a hostilidade presente no discurso. Isso levanta questões sobre
como os discursos políticos são construídos e como a retórica pode ser usada para persuadir e influenciar a opinião
pública.

Estratégias de resistência: o caso "mulçumano“


• A figura do "muçulmano" e sua associação com prisioneiros em estado de desespero e desumanização
• Importância de desmistificar os discursos que desumanizam o "muçulmano" e resistência como forma de preservar a
identidade subjetiva.
• A condição dos "muçulmanos" nos campos de concentração é explorada, levantando questões sobre exclusão social.
• A condição de "morto-vivo" dos "muçulmanos" pode ser uma estratégia de resistência.
• reconstrução da experiência, destacando a importância da memória e da narrativa.
• Importância da psicanálise e da escuta empática como modalidades de resistência e apoio a indivíduos em situações
extremas.
Quem são os meus contemporâneos em tempos sombrios? A fragilização da experiência e as
resistências
• O texto explora a relação entre experiência e resistência em tempos contemporâneos sombrios, citando pensadores como Michel
Foucault e Felix Guattari. Ele começa questionando quem são os contemporâneos de alguém e como a experiência compartilhada
define essa contemporaneidade.
• Impacto do poder no contexto do capitalismo avançado, que busca controlar o desejo humano em busca do gozo, muitas vezes à
custa da fragilização da experiência.
• O discurso do capitalismo cria anonimato na vida e na morte, desestabilizando os laços sociais.
• Felix Guattari - o capitalismo contemporâneo reconfigura constantemente os espaços existenciais, levando a uma busca incessante
pela afirmação subjetiva. O discurso do capitalismo, apesar de emitido por pessoas identificadas, representa vozes anônimas
poderosas.
• Relação entre o discurso do capitalismo e o discurso científico, que objetiva a vida, reduzindo-a à dimensão biológica e
desestabilizando as insígnias do sujeito. Isso leva à perda da direção de vida e à adaptação, em vez de criação de projetos futuros.
• A distinção grega entre zoé (vida natural) e bios (vida civilizada) é explorada, apontando como a redução da vida à dimensão
orgânica abala a experiência compartilhada. Hannah Arendt e Giorgio Agamben são mencionados por sua análise do poder e da
vida em tempos sombrios.
• Importância de resgatar a experiência compartilhada como forma de resistência ao poder e à fragilização da experiência.
Necessidade de reabilitar o espaço público e construir redes de amizade e experiências compartilhadas como uma forma de
transformar a sociedade e reinventar os arranjos culturais contemporâneos.
Responsabilização do sujeito e do campo social o adolescente e os discursos sociais e jurídicos

Nesta parte do livro, aborda-se a necessidade de considerar os contextos que levam a relações sociais violentas nas práticas
clínico-políticas. Especial atenção é dada aos adolescentes em conflito com a lei, particularmente aqueles que vivem em áreas
empobrecidas das grandes cidades. O texto explora como as intervenções nesse grupo são influenciadas pelos discursos sociais
e pelo sistema jurídico, e discute a responsabilidade individual à luz da psicanálise, destacando a importância de incluir a
responsabilidade coletiva nas políticas públicas para a adolescência e juventude.

Desconstruindo a lógica da vitimização

• Explora como as narrativas de vitimização são construídas em situações de violência e seu impacto nos sujeitos.
•Importância de considerar o contexto social e político das situações de violência e como os discursos sociais e jurídicos
influenciam a abordagem da violência.
•Crítica à abordagem binária do discurso jurídico, que tende a retratar uma vítima fraca e um agressor a ser punido,
argumentando que isso pode levar à vitimização e à judicialização dos conflitos sociais.
• Proposta - uma abordagem baseada na responsabilidade em vez da vitimização, examinando como a construção da vítima
ocorre na posição subjetiva e no discurso jurídico.
• Perigos de fixar uma identidade de vítima, que pode limitar a capacidade de ação das pessoas que sofreram violência.
•A psicanálise é apresentada como uma ferramenta útil para compreender esses processos e apoiar o desejo dos sujeitos.
• Importância de uma abordagem mais abrangente que leve em consideração a complexidade das situações e inclua a
responsabilidade coletiva em vez de respostas simplistas por meio do discurso jurídico.

Responsabilização e responsabilidade na psicanálise


•O trabalho de Maria Cristina Vicentin no campo da infância e adolescência busca redefinir a fronteira entre subjetividade
e direito, contribuindo para parâmetros ético-políticos nas intervenções psi-jurídicas.

•A noção de responsabilidade surge como um ponto central nas interações entre psicologia, psicanálise e direito, mas é
interpretada de maneira distinta em cada um desses campos.

•Nas práticas de atendimento socioeducativo a adolescentes infratores, a responsabilização frequentemente se baseia em


simplificações como obediência ou desobediência, ignorando sua complexidade.

•O texto explora a perspectiva psicanalítica da responsabilidade e responsabilização, que oferece insights para o
tratamento e a interlocução entre psicanálise e direito.

•Essa abordagem propõe uma teoria da responsabilidade baseada na teoria do tempo lógico de Jacques Lacan,
enriquecendo o debate sobre a adolescência em conflito com a lei no campo jurídico.
Responsabilização e sua interface com o dever jurídico
• Responsabilidade não significa simplesmente concordância passiva com as normas sociais ou culpa automática por
transgressões, mas está enraizada na interação entre as demandas culturais e a subjetividade única do sujeito.
• Freud, em "O Mal-Estar na Civilização," oferece uma perspectiva sobre a civilização que envolve a subordinação das
disposições pessoais às normas culturais. Isso cria uma tensão entre as regras sociais e as inclinações individuais,
resultando em um "mal-estar" na relação entre família, Estado e sociedade.
• Diferença entre enfatizar a obediência à lei como um limite superegoico que ativa a culpa individual e promover a
capacidade de colocar-se no lugar do outro, o que leva a uma moral intersubjetiva.
• A responsabilidade é apresentada como um sensor interno que pode ser influenciado por uma lei exterior ou exercido
de forma intersubjetiva para reconhecer a alteridade. Isso forma a base para acordos que contêm excessos, como o
pacto original baseado nas ideias de Freud em "Totem e Tabu."
• Além disso, a responsabilidade está ligada à construção da lei por meio de um pacto social que deve levar em
consideração a igualdade na distribuição do gozo. Caso contrário, a observância da lei servirá principalmente para
preservar a normatividade social, reprimindo críticas ou transformações sociais em detrimento do bem-estar da
sociedade.
• Portanto, a conformidade com a lei resulta da compatibilidade do sujeito com a versão específica de civilização que essa
lei representa. O processo civilizatório implica o assentimento subjetivo e envolve a inserção e experiência de cada
indivíduo nesse campo sociopolítico específico.
Responsabilidade, culpa e assentimento subjetivo: construindo disjunções

• Freud estabelece uma disjunção entre culpa e responsabilidade. Ele identifica duas dimensões: a do imperativo
categórico do superego, que está ligado à obediência à norma social, independentemente da responsabilidade do
sujeito, e a anterioridade da culpa em relação aos desdobramentos do ato.
• O sentimento de culpa é construído pelo superego, o que forma a consciência moral e é constitutivo do sujeito. A
consciência moral pode tornar-se dura e cruel em relação ao eu. Freud equipara o superego ao imperativo categórico,
como formulado pela moral kantiana, que é internalizada pelo sujeito.
• No campo jurídico, muitas vezes, a responsabilidade é vista como uma relação causal, em que a culpa é atribuída ao
sujeito com base em uma redução simplista do ato infracional. Isso pode levar a uma desresponsabilização do sujeito,
pois a culpa é colocada antes mesmo do ato.
• A eficácia da punição no sistema jurídico depende do assentimento subjetivo do sujeito às normas sociais e à lei. O
sujeito deve concordar com a validade da lei para que a punição tenha significado. Isso implica uma relação entre o
crime e a lei que exige aceitação e reconhecimento.
• O assentimento subjetivo refere-se ao acordo do sujeito com a ordem civilizatória e simbólica, e não apenas com
normas específicas de uma sociedade. Envolve a aceitação da lei como verdade e sustentação do funcionamento social.
A responsabilidade implica a relação do sujeito com o pacto social proposto.
• A responsabilidade não é apenas uma relação com a lei, mas também com o Outro. O sujeito deve reconhecer a
alteridade e aceitar o pacto social proposto. Isso envolve uma lógica de reconhecimento e de consideração da alteridade,
que vai além da relação causal.

• A responsabilidade também pode ser vista como a assunção da causalidade do próprio desejo. Isso implica não ceder ao
desejo e reconhecer o papel do sujeito na sua própria determinação. A responsabilidade não está apenas na obediência à
lei, mas na relação com o desejo e a sua própria causalidade.

• Mesmo em atos que são considerados desumanos, há uma dimensão sobretudo humana que nos constitui. A
irresponsabilidade não significa uma perda completa do caráter humano. Mesmo no que é visto como desumano, há um
resíduo que nos transforma em direção a respostas singulares na cultura.

Uma teoria da responsabilidade com base na teoria do tempo lógico de Jacques Lacan
• Duas noções de responsabilidade: uma relacionada ao campo do saber e outra vinculada ao assentimento subjetivo.

• Exemplo hipotético - três prisioneiros devem adivinhar a cor de discos nas costas uns dos outros. Em três momentos
cruciais no tempo lógico desse cenário, os prisioneiros passam por diferentes fases de raciocínio e responsabilidade:
"tempo de ver" (baseado na aparência visual), "tempo de compreender" (reflexão sobre a lei e ética), e "tempo de
concluir" (responsabilidade pela própria causalidade).
• A dimensão diacrônica do "momento de concluir" envolve a historicidade do desejo e a singularidade na história dos
desejos desejados. A pressa surge na lacuna entre a verdade e a certeza antecipada, e o sujeito age antes mesmo de
entender plenamente a situação. Antígona é citada como um exemplo paradigmático desse processo de
responsabilização do ato, desafiando as imposições da lei e marcando sua singularidade.

Responsabilidade e adolescência: clínica e política interrogadas pelo ato infracional

• O texto aborda a complexidade da responsabilidade em diferentes fases da vida, com ênfase na adolescência,
destacando a importância de uma abordagem mais ampla que considere aspectos políticos, sociais e subjetivos.

• A responsabilidade não deve ser apenas vista sob a ótica jurídica, mas também como parte fundamental da
transformação humana e social.

• A psicanálise desempenha um papel crucial na compreensão da responsabilidade, especialmente em relação aos atos
infracionais na adolescência.
• A ética da escuta clínica é essencial nesse contexto, e o texto apresenta um estudo de caso clínico para ilustrar como a
psicanálise pode ser aplicada para compreender a responsabilidade na adolescência.

• O caso clínico destaca não apenas o paciente, mas também o papel do analista na escuta, enfatizando as
complexidades envolvidas nos discursos e no campo clínico.

• A narrativa clínica se desenvolve em torno da perda de sentido e da construção de um enigma para o analista, com foco
em três aspectos cruciais: a marca do caso, a construção do caso e sua transmissão por meio da escrita.

Adolescência: espera e angústia: impasses na inscrição

• Caso clínico: "Falando pelos muros: um recorte de acontecimento do caso Shake" - adolescente em um contexto institucional
relacionado à Justiça, destacando os desafios enfrentados pelo analista.
• Este caso expõe a interseção entre a cena psicanalítica e a cena sociopolítica, desafiando a capacidade de sustentação do
trabalho analítico. Questões como adolescência, uso de drogas, tráfico, condições socioeconômicas, discurso jurídico e atos
infracionais são abordadas, ressaltando a importância de considerar aspectos éticos e políticos.
• O caso destaca um incidente em que o adolescente Shake escreveu nas paredes do prédio onde ocorria a sessão de terapia,
tornando-o relevante ao transcender o âmbito privado e adentrar o domínio público e político. A analista enfrenta o desafio
de equilibrar a preservação do espaço terapêutico com a necessidade de responsabilizar Shake por seu ato, sem permitir que
o discurso jurídico domine a narrativa.
• O texto também explora a relação entre espera e angústia, destacando como a angústia atua como um alerta ao sujeito,
indicando que ele está sendo aguardado no encontro entre desejo e gozo. A angústia introduz uma dimensão temporal
na equação, afetando o processo de tomada de decisão.

• O papel do analista nesse contexto envolve permitir que o sujeito inscreva sua singularidade na instituição,
possibilitando que ele deixe de ser meramente rotulado como "infrator" ou "usuário de substâncias" e se torne um
sujeito com uma história de vida própria. A escrita nas paredes é vista como uma forma de expressão subjetiva.

• O "muro da linguagem" é mencionado como um elemento simbólico que insere os sujeitos no campo social por meio da
linguagem. A representação dos adolescentes pela instituição contribui para a construção de suas identidades sociais.
Shake escreve nas paredes como uma tentativa de expressar sua experiência subjetiva, incluindo a angústia em relação à
paternidade.

• Importância da abordagem clínico-política na instituição, permitindo que os sujeitos encontrem uma posição de fala e
estabeleçam um novo relacionamento com a linguagem, a instituição e os desafios que enfrentam no contexto dos
muros sociais que os cercam.
A função do semelhante e a responsabilidade em cena o adolescente autor de ato infracional

• O texto aborda a importância das relações interpessoais e da comunicação na construção de laços sociais e na superação de
estigmas associados à vitimização e à criminalização, especialmente no contexto de adolescentes autores de atos
infracionais.
• Os sujeitos não têm fronteiras claras entre seu interior e exterior, e suas representações e identidades variam de acordo com
o reconhecimento e a legitimidade que recebem em diferentes contextos.
• Desde o início da vida, os seres humanos dependem do outro, de seus cuidados e de sua voz para construir seus desejos e
identidades.
• Jacques Lacan adverte que o próximo, ou seja, o semelhante, pode tanto facilitar quanto obstruir a realização dos desejos,
tornando-se uma figura desafiadora em relação ao gozo. Isso levanta questões sobre como o outro atua como suporte para o
bem comum, independentemente de ser um obstáculo ou uma via para alcançar objetivos comuns.
• O texto explora teorias sobre as funções do outro e do semelhante, com base nas ideias de Lacan, usando a análise do
personagem Hamlet como exemplo. Argumenta-se que a realização do desejo de Hamlet não se limita à rivalidade com seu
semelhante, e são apresentadas cenas que ilustram dois tipos de intervenção do outro e do semelhante nesse contexto.
• Destaque pra a importância das relações interpessoais e da compreensão do papel do outro e do semelhante na construção
dos desejos e identidades dos sujeitos, especialmente em contextos complexos como o da adolescência e da delinquência. A
responsabilidade se desenvolve nessas interações e a análise da dinâmica do outro pode auxiliar na compreensão dos
processos sociais e subjetivos.
O semelhante

• O texto aprofunda a importância do reconhecimento do self por meio das relações interpessoais, notadamente
explorando a obra "Hamlet," analisada no contexto do Seminário 6 de Lacan. Em "Hamlet," o protagonista se vê
imerso em um processo que envolve não apenas o desejo, mas também o luto, culminando em ações significativas
em sua jornada.
• No cerne dessa discussão está a noção de que as relações com os outros, em especial aqueles que se assemelham a
nós, desempenham um papel fundamental na construção do desejo e na responsabilização individual.
• O texto vai além da teoria ao apresentar duas situações concretas como exemplos ilustrativos. A primeira envolve um
grupo de adolescentes submetidos a medidas socioeducativas, enquanto a segunda descreve um adolescente
envolvido em um processo de justiça restaurativa após cometer um ato infracional.
• Ambos os casos ressaltam de forma vívida como as interações com os outros têm uma influência significativa na
formação do desejo e na promoção da responsabilização individual.
• Além disso, essas interações desempenham um papel crucial na construção de laços comunitários, realçando assim a
importância das relações interpessoais como alicerces fundamentais na vida dos sujeitos em contextos complexos
como esses.
A função do semelhante em analise das cenas

• Na primeira cena - um grupo de adolescentes submetidos a medidas socioeducativas, que participam de um programa
visando a reflexão sobre suas ações e o estabelecimento de perspectivas para o futuro. No entanto, essa experiência é
marcada por uma atmosfera de hostilidade por parte dos funcionários da instituição, o que, por sua vez, gera
sentimentos de desânimo e desesperança entre os jovens. Nesse contexto, é notável como a hostilidade e a falta de
apoio afetam profundamente a psicodinâmica desses adolescentes.
• À medida que as sessões se desenrolam, os adolescentes começam a destacar elementos de sua identidade, como o
consumo de maconha e o envolvimento em atos transgressores. Entretanto, surge uma oportunidade de construção de
laços entre eles quando começam a refletir sobre como podem ajudar um amigo que está em apuros ou cometendo
erros. Isso abre espaço para a construção de um "ideal do eu" baseado na proteção e no apoio aos amigos, revelando um
aspecto positivo e construtivo em suas interações.
• No entanto, a morte de um amigo rompe abruptamente esse laço emergente, causando um profundo sentimento de
vazio e indiferença entre os adolescentes. O impacto desse evento trágico os retira de uma apatia anterior e gera um
desejo genuíno de construir um destino diferente, afastando-se do uso de drogas. Nesse processo, a presença de uma
psicóloga desempenha um papel fundamental ao testemunhar e apoiar suas tentativas de elaboração do luto e da
transformação.
• Esse processo de transformação pode ser comparado ao drama de Hamlet, no qual o objeto de amor é negligenciado e,
posteriormente, o desejo de cuidar do amigo falecido emerge como uma forma de os outros adolescentes elaborarem o
luto pelo objeto perdido. Isso abre caminho para a formação de novos objetos de amor e desejos.
• Entretanto, é importante notar que a ausência de um suporte discursivo e identificatório adequado na instituição limita o
processo de elaboração dos adolescentes ao campo do imaginário. Isso ocorre devido à hostilidade vivida na instituição,
que impede a articulação de um discurso e identidade mais saudáveis e, consequentemente, dificulta a construção de
laços significativos.
• Na segunda cena, em contraste com a primeira, estamos diante de um cenário que envolve um assalto com uma arma "de
brinquedo." Nessa situação, diferentes redes sociais e afetivas entram em jogo, uma vez que o objeto roubado possui um
valor simbólico considerável. Aqui, a complexidade da relação entre os sujeitos e os objetos torna-se evidente.
• A carta enviada pelo joalheiro ao adolescente, endereçando-o como "um pai para um filho," desempenha um papel
central nessa cena. Essa abordagem desloca o valor do objeto roubado para o valor do próprio sujeito, tratando-o como
uma presença significativa e não apenas como um mero autor de um crime. Isso representa uma mudança importante na
dinâmica entre os sujeitos envolvidos.
• A cena restaurativa subsequente envolve uma reflexão profunda sobre o luto da imagem fálica, e demonstra como a
presença de figuras paternas ou representantes da função paterna pode gerar apoios identificatórios mais profundos e
construtivos. Isso contrasta com a primeira cena, na qual a falta de tais apoios deixou os adolescentes em um estado de
desamparo e indiferença.
• A análise dessas cenas ressalta a importância da construção de laços coletivos e da responsabilização na jornada de
reposicionamento do adolescente em seu processo identificatório e no pacto social. Ela nos lembra que, quando esse
compromisso coletivo não é estabelecido, nenhuma ferramenta ou dispositivo pode sustentar a possibilidade de
responsabilização e transformação. Portanto, a ênfase não deve estar apenas nas ferramentas de trabalho, mas também
no compromisso com a responsabilização coletiva e na construção de laços que apoiam o desenvolvimento saudável dos
sujeitos em situações complexas como essas.
Tempo de concluir
Psicanálise implicada: a dimensão coletiva da elaboração do sofrimento sociopolítico

•A autora destaca a importância de compreender o sofrimento sociopolítico na prática psicanalítica.

•A "psicanálise implicada" enfatiza a escuta do sofrimento em contextos de exclusão e violência.

•É importante considerar a dimensão traumática do sofrimento quando os sujeitos não conseguem construir
um sintoma.

•A autora propõe uma abordagem chamada "clínica do traumático" para lidar com esses casos.

•A psicanálise deve promover a reconstituição de um campo mínimo de significantes para o sujeito.

•A experiência analítica pode ajudar o sujeito a recuperar sua dimensão de desejo e resistir à
instrumentalização social do gozo.

•A "psicanálise implicada" busca trazer a psicanálise para o campo dos conflitos sociais e políticos,
reconhecendo o papel do psicanalista como agente de mudança e resistência.

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