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ENTREVISTA

Claudia Carvalho

ERGONOMIA
SUSTENTÁVEL
Novos modelos de trabalho mostram que alinhar os critérios
ESG e os ODS é um caminho promissor para a SST
por Sofia Jucon

C
onscientizar e sensibilizar empresas e pessoas, quanto à importância da manutenção da saúde,
qualidade de vida e bem-estar no ambiente de trabalho e nas atividades de vida diária, é de suma
importância na prevenção e/ou tratamento de possíveis enfermidades ocupacionais. Esta é a missão da
Fisioterapeuta, Técnica de Segurança do Trabalho, Terapeuta Integrativa e especialista em Ergonomia
Claudia Carvalho. Sua atuação em áreas, como Análise Ergonômica do Trabalho, Saúde Integrativa Ocupacional,
Análise da Postura Emocional Ocupacional dos Liderados, Desenvolvimento dos Fatores Humanos dos Líderes,
Assistência Técnica Pericial em LER/DORT/AMERT (Lesões por Esforços Repetitivos, Distúrbios Osteomusculares e
Afecções Musculoesqueléticos relacionados ao Trabalho), Fisioterapia Preventiva e Curativa, Auxílio à Medicina
Ocupacional com relação ao diagnóstico diferencial, ganhou o respaldo técnico de dois temas que estão em
alta no mundo corporativo: os critérios ESG (Ambiental, Social e Governança) e os Objetivos do Desenvolvi-
mento Sustentável (ODS), especialmente o 3 e o 8, que tratam da “Saúde e Bem-Estar” e “Trabalho Decente e
Crescimento Econômico”, respectivamente. Recentemente, a especialista começou a incrementar suas palestras
e treinamentos com esses conceitos e tem provocado um efeito em prol da conscientização que traduz a nova
percepção prevencionista no mundo corporativo em tempos pós-pandemia e que veio para ficar. Confira!

Por que aliar a Ergonomia com os conceitos da o modelo da ergonomia sustentável e contínua nos
sustentabilidade tem sido seu mote profissional? ambientes de trabalho. Com isso, destaco que a Er-
A ergonomia também está passando por várias gonomia associada a Fisioterapia, com Humanologia e
mudanças, principalmente com as novas relações de Sustentabilidade é para todos, portanto, minha missão
trabalho e a maior atenção à saúde mental e emo- é ajudar os empregadores, empregados e gestores de
cional dos colaboradores, o que tem feito com que vidas a neutralizar, diminuir e/ou evitar enfermidades
as aplicações dos conceitos básicos de SST, ESG (com- PsicoFísicoSociais, proporcionando saúde, qualidade de
promissos ambientais, sociais e de governança) e ODS vida e bem-estar no âmbito profissional e pessoal.
(Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, da ONU),
estejam sendo cada vez mais levados para dentro da Como surgiu esse modelo de trabalho?
área ergonômica visando evitar ou neutralizar possíveis A sigla em inglês ESG representa a sustentabilidade
alterações de distúrbios, disfunções e até mesmo doen- ambiental, social e de governança corporativa, com a
ças ligadas ou não ao trabalho. A minha experiência qual, resumidamente, as empresas adotam medidas
na área prevencionista me levou a ter um olhar mais para terem uma operação mais sustentável, consciente
abrangente, chegando ao resultado de poder aplicar e bem gerenciada. O ESG em relação a gestão da saú-

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de e segurança no ambiente de trabalho se enquadra
no “S” do Social, que está cada vez mais crescendo e
ganhando espaço dentro do mundo corporativo. Não
basta a empresa manter-se em dia somente com as
legislações que ditam as normas de saúde e segurança
do trabalho, mas é necessário também garantir efe-
COM AS NOVAS RELAÇÕES DE
tivamente os Objetivos de Desenvolvimento Susten- TRABALHO, OS CONCEITOS
tável, principalmente o ODS 3 que trata da saúde e
bem-estar, que assegura uma vida saudável e promove
BÁSICOS DE SST, ESG E ODS ESTÃO
o bem-estar para todos em todas as idades. Nós tam- SENDO LEVADOS PARA A ÁREA
bém temos que considerar o ODS 8, que é o traba-
lho decente e crescimento econômico, que promove ERGONÔMICA
este crescimento econômico sustentável e inclusivo,
emprego pleno e produtivo e atentando ao trabalho
decente para todos. No meu trabalho estou trazendo

Foto: Divulgação
um pouco de cada um desses conceitos para a área da
ergonomia, aliando essas ferramentas em prol da me-
lhoria contínua na saúde física, mental e qualidade
de vida dos trabalhadores.

De que maneira o conceito da Ergono-


Fotos: Divulgação

mia Sustentável pode ampliar os objeti-


vos da SST, considerando aspectos físi-
cos, emocionais e sociais, especialmente
após o impacto da pandemia?
Essa nova ergonomia é a que sustenta e
dá suporte contínuo para que as empresas
promovam realmente a saúde, a qualidade
de vida e o bem-estar dos colaboradores. Vale
lembrar que há muito tempo a ergonomia
não tem sido pensada apenas como instru-
mento para tratar as LER/DORT e afecções da
postura, do corpo e das características psicofi-
siológicas, principalmente agora, com todas as
mudanças que foram acarretadas com o pós-
-pandemia nos ambientes de trabalho. O olhar
para essa ferramenta está sendo ampliado
para tratar o ser humano por completo, na
sua integralidade e realizar uma conexão en-
tre as afecções físicas, as desordens emocio-
nais, as perturbações sociais e respeitar prin-
cipalmente a essência de cada fator humano.
Por isso, quando falamos desta nova ergonomia,
vamos até considerar que é uma ergonomia 4.0,
é a ergonomia propriamente sustentável, pois
é uma ergonomia contínua e que tem um

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olhar global respeitando a individualidade, a diversida-


de e, ao mesmo tempo, a pluralidade do ser humano.

O que mais podemos considerar como impor-


tante no conceito da Ergonomia Sustentável?
Muitos estudos demonstram que a longo prazo,
as empresas que promovem e protegem a saúde, se-
gurança e bem-estar dos trabalhadores estão entre as
mais bem-sucedidas, competitivas, possuem melhor

Foto: Shutterstock
desempenho no mercado financeiro, desfrutam de
melhores taxas de retenção de funcionários e de for-
ma mais sustentável levando em consideração todas
as etapas do design de ambientes de trabalho, design
centrado humano, dos sistemas, das atividades e tare-
fas realizadas, a ergonomia como fator humano alia-
da com a sustentabilidade é importante porque gera
uma conexão entre o ambiente interno e externo ao moção do trabalho, que seja decente e que tenha um
que o colaborador está sendo inserido, e também ter crescimento econômico sustentável, nosso trabalho é
um olhar para a maior qualidade de vida e atividades aprofundar essas ações nas empresas e levá-las a al-
da vida diária, seja na vida profissional e pessoal do cançar resultados que agreguem mais valor preventivo
colaborador, por meio de indicadores, como taxa de nos seus ambientes laborais. Muitas empresas estão
acidentes, número de doenças ocupacionais e faltas despertas e aderindo a esses novos conceitos.
(absenteísmo) que ocorrem dentro dessas empresas.
Qual seria o principal impacto do ESG na se-
Como as empresas estão respondendo a es- gurança e saúde laboral?
ses novos conceitos? Precisamos abordar um pouco mais da parte de
É preciso, realmente, aplicar um processo susten- ergonomia, qualidade de vida e saúde, que é o que
tável e contínuo. Eu tomo como exemplo que muitas está na ODS 3, e uma gestão de segurança e saú-
empresas fazem palestras, treinamentos, elaboram a de que se enquadre no pilar do Social, bem como
AEP e a AET (Análise Ergonômica Preliminar e a Análi- na governança do ESG. Além disso, a inovação da
se Ergonômica do Trabalho) e realizam algumas ações saúde e segurança do trabalho nas empresas, com o
que consistem na compra de alguns equipamentos, viés da governança ambiental, também está inserida
algumas ferramentas e mobiliários, mas, muitas vezes nas metas de desenvolvimento sustentável. Tudo isso
de forma pontual. Acabou aquela ação e pronto! Não
dão continuidade ao propósito da prática sustentável e
contínua como deveria. E não pode ser assim. Estamos
mostrando que atualmente, a SST, no bojo do desen-
volvimento sustentável, exige ações voltadas à promo-
ção da saúde real e da segurança no trabalho integra-
das a vários conceitos, que podem contribuir para que
PRIORIZAR O S DO ESG NA
o nosso país alcance os Objetivos de Desenvolvimento SEGURANÇA E SAÚDE DO
Sustentável atrelados às ODS 3 e 8, por exemplo. O
Brasil é um dos países-membro da Organização das
TRABALHO FAZ A PREVENÇÃO
Nações Unidas (ONU), que compactuou para atingir as VIRAR SISTÊMICA, SUSTENTÁVEL,
metas dos ODS até 2030, e, especificamente quanto
aos objetivos 3 e 8, que são os que se referem à pro- INTEGRATIVA E CONTÍNUA

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leva também à prevenção dos acidentes diminuindo podem agregar em prol da ergonomia sustentável.
e até neutralizando muitas doenças ocupacionais e a Sabemos que os custos de adoecimento aumentam
promoção de um ambiente mais saudável, que estão consideravelmente aqui no Brasil e no mundo. Por-
inseridos nos indicadores sociais e é uma estratégia tanto, podemos reduzi-los criando um sistema que
para a sustentabilidade do negócio. Os acidentes e envolva a ergonomia e fatores humanos, a qualidade
doenças sendo ou não do trabalho, ou profissionais de vida, o bem-estar e o bem-viver ao ser humano.
ou ocupacionais, podem causar danos irreversíveis na E assim, a atuação prevencionista vira sistêmica, sus-
imagem da empresa e proporcionar um impacto dire- tentável, integrativa e contínua.
to aos seus indicadores socioeconômicos.
Este novo modelo é um caminho promissor
Que outros impactos as empresas podem para a Segurança e Saúde no Trabalho?
considerar neste momento pós-pandemia? Certamente. Ele nos leva a entender, que em prol da
O impacto pode ser identificado através da cons- saúde e segurança, a organização deve alinhar as ações
tante evolução e conscientização promovida pelas e estratégias do seu negócio aos princípios de ESG, dos
práticas que envolvem os critérios de ESG dentro da ODS, com foco na qualidade de vida e bem-estar contí-
saúde e segurança do trabalho, que as tornam reco- nuos. Ao priorizar o S do ESG na SST, por exemplo, esta-
nhecidas como um valor para a empresa. Houve um mos conscientizando as pessoas sobre a perspectiva de
importante e necessário trabalho que as empresas que o mundo se torne um lugar melhor para se viver. E
exerceram de forma intensificada durante a pande- para as empresas, os benefícios são refletidos nos negó-
mia para manter a saúde laboral. Atualmente, esta- cios, na sociedade, diante de um mercado competitivo,
mos trazendo muito dessa experiência para combater em que os produtos e serviços estão dispostos à escolha
os traumas que foram produzidos com a crise pan- do consumidor, do fornecedor. Sob essa perspectiva,
dêmica global e os conceitos ESG vieram para ajudar a empresa que é socialmente responsável, que faz
nesse processo e estão surtindo bons resultados nas a promoção da saúde, proporciona ambientes mais
organizações que os aplicam com o alinhamento ne- seguros e saudáveis mostra um diferencial, que é a
cessário dentro do escopo da SST. essência da sustentação dessas regras e proporcionam
ganhos em diversas esferas e a longo prazo.
O S do ESG veio para ficar na SST?
A dimensão do Social, o S do ESG, também é uma
oportunidade para as empresas inserirem o cuidado
com as pessoas, promovendo a aplicação de elemen-
tos estratégicos e reportarem a real implantação das
ações voltadas para diminuir as doenças ocupacio-
nais, por exemplo, e, assim, tanto para a empresa
como para diversas instituições brasileiras, diminuir a
ocorrência dessas doenças é trazer mais viabilidade
produtiva dentro do mundo corporativo com a valori-
zação da prevenção ocupacional.

Na sua visão, o que mais as empresas podem


esperar com a ergonomia sustentável?
Foto: Shutterstock

As empresas já investem em planos de saúde na


área de saúde ocupacional, e podem potencializar os
resultados positivos ao tratar o tema globalmente e
estrategicamente e não de forma pontual, mas dan-
do continuidade aos preceitos que o ESG e os ODS

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