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DISLEXIA

DESCOMPLICADA
DISLEXIA
DESCOMPLICADA

RENATA BRINGEL

@RENATACBRINGEL

WWW.RENATABRINGEL.COM.BR

2020
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 05
CAPÍTULO 1 07

CAPÍTULO 2 20

CAPÍTULO 3 31
CAPÍTULO 4 39

CAPÍTULO 5 44

REFERÊNCIAS 50
04
Introdução

Nesse primeiro capítulo queremos discutir e refletir sobre aspectos

importantes para uma melhor compreensão sobre esse transtorno, para um

melhor entendimento. Que aspectos são esses? O primeiro deles é

entender um pouco sobre como o cérebro aprende para que em seguida

possamos comparar esse funcionamento esperado de um indivíduo com

desenvolvimento normal, com o funcionamento do cérebro disléxico.

Entender o que deveria estar ocorrendo durante os processos de

aprendizagem e os motivos de não estar.

Entender que os transtornos de aprendizagem faz com que os indivíduos

tenham um processamento de informações diferente e que a aprendizagem

é possível contando que se promova os estímulos corretos.

Nesse contexto, como saber qual a melhor maneira de intervir em casos

como esse? Um dos caminhos possíveis é entendendo como esse cérebro

aprende!

Entender como o cérebro aprende é uma questão que caminhou comigo

durante toda minha formação pedagógica, havia essa necessidade

intrínseca de saber como essa ferramenta tão magnifica e tão espetacular

chamada cérebro transformava aquilo que vejo, escuto e sinto em

conhecimento. Como que isso que você está lendo aqui está se

transformando em conhecimento aí na sua cabeça? Conhecimento válido,

útil e funcional, uma vez que aprender tem o poder de transformar.

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E porque eu tinha essa necessidade de saber isso? Porque eu acreditava e

ainda acredito que saber e entender como ocorre esse processo chamado

aprendizagem, é um subsídio para ensinar muito melhor uma vez que

desse modo se torna possível analisar, selecionar e organizar com maior

assertividade quais estímulos funcionam melhor em cada caso, porque não

existe receita de bolo ou fórmula mágica quando se trata de

desenvolvimento humano e aprendizagem, considerando que cada ser é

único e que cada um tem uma maneira de aprender independe de qualquer

transtorno.

Desse modo, saber o que ocorre ali naquela mente ou o que não ocorre

(no caso dos transtornos e deficiências) no momento das minhas

intervenções seja na escola ou na clínica vai refletir diretamente naquilo

que devo planejar e propor em termos de intervenção para esses

indivíduos.

Ao longo dos anos muitos teóricos debruçaram-se sobre as questões

relacionadas ao aprender e ao não aprender, mas eu sempre senti falta

nelas dessa abordagem, da compreensão do funcionamento dessa

ferramenta chamada cérebro, nesse processo, no processo de

aprendizagem, e então, os estudos das neurociências aplicadas a educação

trouxeram luz a essa questão.

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CAPÍTULO 1
ENTENDENDO A DISLEXIA
Neurociências e Aprendizagem
Com a abordagem das neurociências tornou-se possível compreender com

mais clareza o funcionamento do cérebro e suas funções tais como as

funções cognitivas e as executivas, também a anatomia cerebral, a função

de cada uma das suas partes, os processos que ocorrem em cada área e o

mais importante: como isso está ligado a aprendizagem e, que a

aprendizagem envolve vários processos cerebrais como o processamento

auditivo e o processamento visual por exemplo e que déficits em algumas

regiões afetam o processo de aprender.

A neurociência tem como principal propósito auxiliar no esclarecimento

do que acontece no cérebro humano desde a sua formação até o

envelhecimento. Desse modo, utilizando como suporte essas importantes

informações sobre a mente humana, é possível aplicar técnicas específicas

que podem auxiliar nos processos inerentes a educação.

Então como é que o cérebro aprende afinal de contas? Não é o propósito

desse material o aprofundamento na anatomia cerebral, então vamos

abordar aqui de modo básico essa temática, trazendo apenas alguns

elementos necessários e suficientes a compreensão do que nos propomos

nesse capítulo, que é entender como o cérebro aprende para a partir desse

enfoque compreender o que acontece nos casos de não aprendizagem.

O cérebro é composto de várias partes mas para essa discussão aqui

vamos nos ater apenas aos hemisférios e lobos.

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Nosso cérebro está dividido em duas metades que são chamadas de

hemisférios:

HEMISFÉRIO DIREITO/HEMISFÉRIO ESQUERDO

E também está dividido em quatro partes que são chamadas de lobos

cerebrais:

LOBO FRONTAL, PARIETAL (MEIO DA CABEÇA), OCCIPITAL (ATRÁS DA CABEÇA) E TEMPORAL.

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Cada um desses lobos tem uma função como por exemplo a função

cognitiva ou a função motora e o nosso cérebro aprende de modo contínuo

desde a gestação, aproximadamente a partir do quarto mês, até a morte,

salvo se o indivíduo for acometido de alguma doença degenerativa.

Não existe dentro do nosso cérebro uma área única, responsável apenas

pela aprendizagem escolar, a aprendizagem de uma habilidade como a fala

por exemplo, envolve várias áreas, como a área executiva, a motora e a de

linguagem. Nesse contexto, quais as funções de cada um dos nossos lobos

cerebrais?

O Lobo Frontal é responsável por todo processo de funções executivas.

Também é esse lobo que organiza, decide, seleciona e sequencia. É o lobo

que prevê e também percebe erros, corrige imperfeições e é ele quem faz

todo o processo de combinação e harmonização de todo o cérebro. Ele que

coordena todas as outras funções dos outros lobos sendo desse modo

responsável pelos mais simples movimentos físicos, como também pelas

funções do aprendizado, do pensamento, da memória e da fala.

O nosso Lobo Parietal é responsável pela percepção espacial e pelas

informações sensoriais de dor, calor e frio etc. É ele que faz as relações

espaciais figura/fundo, direita/esquerda, o processamento dos nossos

pensamentos e é ele que faz a gente se localizar no ambiente, por isso ele é

também conhecido como nosso GPS natural.

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O Lobo Temporal Localizado na base do parietal, até a altura dos

ouvidos é responsável pelo processamento auditivo e também o

processamento da linguagem. É aqui que são identificados os sons das

letras, onde se processa a estruturação das palavras.

É comum na investigação sobre possíveis transtornos de desenvolvimento

ou de aprendizagem o médico solicitar avaliação do funcionamento do

processamento auditivo que é realizado pelos profissionais da

fonoaudiologia. O Processamento Auditivo Central (PAC) avalia uma

série de operações mentais que o indivíduo realiza ao lidar com

informações recebidas via sentido da audição, avalia como o cérebro

processa às informações que o indivíduo escutou.

O que é processar as informações nesse caso? É a habilidade cerebral de

analisar e interpretar essas informações. Existem habilidades que

desenvolvemos ao longo do tempo como, por exemplo, localização

sonora, discriminar e reconhecer sons e memorizá-los em sequências, e

isso são algumas das habilidades que estão envolvidas nesse processo, no

processamento auditivo. Essas

alterações de processamento auditivo central podem ocorrer mesmo em

pessoas com audição normal, o que significa que não tem necessariamente

haver com ouvir mas com compreender o que está ouvindo. Nessa

perspectiva a criança pode não estar aprendendo por conta de um

transtorno no processamento auditivo e não porque ela tem dificuldades

de aprendizagem por exemplo e conhecer esse fato vai trazer luz ao

momento de planejar intervenções ou implementar ações visando auxiliar

na aprendizagem desse indivíduo, uma vez que existem técnicas e

métodos específicos para cada caso.

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Anatomicamente falando, o Lobo Occipital é o menor dos quatro lobos e

está localizado na parte detrás da cabeça. É responsável por receber e

processar as imagens visuais, visão, percepção visual, é ele que dá a forma

àquilo que vemos, as cores, o espaço.

O processo de aprendizagem.

Com base nas informações que temos até aqui sobre como é a

“máquina” da aprendizagem, que é o nosso cérebro, e para explicar e

ilustrar como nosso cérebro aprende, lançaremos mão de uma analogia,

nesse sentido, vamos imaginar que nosso cérebro é uma grande empresa e

os lobos cerebrais são os departamentos. Cada lobo um departamento e

cada um responsável por determinadas funções (como vimos acima as

funções de cada uma dessas áreas em nosso cérebro), assim, para o bom

funcionamento dessa grande empresa (o nosso cérebro), os seus

departamentos (os lobos cerebrais) devem funcionar de forma integrada,

cada um com suas funções mas interagindo uns com os outros. Porém,

para que ocorra essa integração é necessário que exista entre eles uma

comunicação e essa comunicação entre esses departamentos é realizada

por uma célula chamada neurônio. Os neurônios dentro dessa analogia são

o telefone ou a rede de internet dentro dessa grande empresa, promovendo

essa integração, essa interação.

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Os neurônios são as células do nosso sistema nervoso, são os

responsáveis por receber, processar e transmitir as informações. Estima-se

que temos 86 bilhões de neurônios e eles se comunicam por meio de

sinais elétricos.

Na imagem as luzes piscando são os neurônios trabalhando. Levando,

processando, armazenando e trazendo informações. O estímulo recebido

se transforma em um impulso elétrico formando redes neurais como se

fosse uma grande rede elétrica.

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Além de conduzir esses sinais eles também fazem combinações cujo

resultado final são as aprendizagens. Você pode estar se perguntando:

como assim? Nosso cérebro, essa grande empresa com vários

departamentos (lembra da nossa analogia inicial?) é o órgão central do

processo de informações. E de onde vem essas informações? Dos nossos

sentidos! Visão, audição, paladar, tato, olfato....

Todas as vezes que recebemos algum estímulo ocorre um processo para

que esse estímulo se torne uma informação e esta chegue até o seu

“departamento” (o lobo ou os lobos cerebrais responsáveis) no nosso

cérebro.

Vamos imaginar aquela brincadeira popular da nossa infância chamada

telefone sem fio. Vocês se lembra como é essa brincadeira? Uma pessoa

fica no inicio da fila, ela recebe uma informação e passa para a próxima

pessoa da fila que fará a mesma coisa e assim sucessivamente até que a

mensagem chegue ao seu destino final que é a última pessoa da fila; e

então essa pessoa vai decidir o que fazer com essa informação. Ela pode

guardar para ela (memórias), ela pode dar uma resposta ou ela pode

executar uma ação. Lembrando que tudo é estímulo independente de ser

bom ou ruim, intencional ou não. O seu computador onde você lê esse e-

book agora é um estímulo e esse envolve vários processos. Você está

utilizando visão, atenção e concentração, reflita sobre quantos processos e

quantos lobos estão trabalhando nesse momento para que você aprenda o

que está escrito nessa página, para que isso se transforme em

conhecimento válido e útil.

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Trazendo isso para outros contextos, e para ficar ainda mais claro,

vamos utilizar o velho e bom exemplo do choque na tomada onde o

indivíduo vai colocar o dedo na tomada e vai levar um choque. Choque

igual a estímulo! E o que vai acontecer aqui? Como essa aprendizagem,

que colocar o dedo na tomada da choque vai ser construída? Basicamente

essa informação vai ser transmitida de neurônio a neurônio (lembra do

telefone sem fio?) Até chegar onde? No lobo parietal, que é também

responsável dentre outras coisas pela dor e então nesse lobo essa

informação será processada, ou seja, analisada e interpretada, e então ela

vai gerar uma resposta instantânea que vai retornar também através das

correntes elétricas neuronais e o indivíduo vai fazer o que? Tirar o dedo!

E essa informação também vai gerar uma memória, uma aprendizagem,

uma rede neuronal, uma combinação de informações cuja tradução é: não

toque: dá choque, e esse aprendizado é válido e útil por toda a vida.

O processo de aprendizagem é complexo e envolve muitas funções,

células e partes diferentes do nosso cérebro porém, se os departamentos da

minha “grande empresa” estão trabalhando bem, de forma integrada e a

comunicação não está ocorrendo com falhas, eu tenho ótimos resultados e

sucesso, ou dito de outro modo e trazendo para o contexto educacional, eu

estou aprendendo! Mas e se ocorrer falhas na comunicação ou os

departamentos da empresa (os lobos cerebrais) não estiverem trabalhando

de forma integrada?

O que vai acontecer com o produto final (aqui vamos pensar na

aprendizagem) que deve ser entregue pela empresa ao final de cada ação?

Ela não vai ocorrer ou vai acorrer de modo insatisfatório, com déficits. E

isso implica em que? A aprendizagem tem funções vitais na vida do

indivíduo, logo ele apresentará desajustes em várias áreas da vida.

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Como funciona o cérebro disléxico?

A imagem possui duas figuras, uma de um cérebro disléxico e outra de

um cérebro não disléxico. Na figura do cérebro não disléxico há três

marcações, uma amarela, uma violeta e uma verde e cada delas em lobos

diferentes. A área amarela, conhecida occipito temporal é o local onde

ocorre a interpretação dos grafemas e das letras que vão na área violeta (a

região parieto temporal) se juntar e resultar nos sons dos fonemas, e toda

essa informação que o indivíduo adquiriu após a leitura (momento em

que entrou em contato com o estímulo – no caso o livro, as letras, o texto),

é processada nessa região onde há um círculo verde, conhecida como área

de broca que é a área encarregada de produzir a linguagem e está

localizada no interior do lobo frontal, no hemisfério esquerdo. Desse

modo, um processo de aprendizagem de leitura de um indivíduo com

desenvolvimento típico, ocorre em três etapas, em três regiões diferentes

do cérebro.

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E no cérebro disléxico, como é esse processo? Observe que na imagem

correspondente ao cérebro disléxico há apenas uma área em destaque, e

não três como no cérebro não disléxico. Nesses indivíduos, as áreas

occipito teporal e parieto temporal não funciona de forma adequada, logo

sabendo da importância dessas duas áreas no processo de leitura é fácil

deduzir que esse indivíduo irá apresentar um déficit nas habilidades de

leitura uma vez que esse processo, que deveria ocorrer em três etapas e

em três regiões diferentes, vai acontecer apenas no lobo frontal que ficará

sobrecarregado e então a informação não será processada corretamente ou

será processada com muita dificuldade.

Sabemos até aqui da importância dessas informações para a atuação

junto a esses indivíduos, e nesse sentido qual seria o segredo de um bom

planejamento seja ele clínico ou educacional? Oferecer propostas

multissensoriais! Propostas que envolvam e estimulem todos os sentidos,

porque desse modo a informação vai chegar por várias vias e será

processada de diversas formas. Isso significa dizer que todo mundo é

capaz de aprender, cego, surdo, autista, tdah, disléxico ou indivíduos com

qualquer outro comprometimento que venha afetar de algum modo os

processos cognitivos.

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Qual prática devemos adotar quando a criança apresenta transtornos ou

dificuldades? A prática da inclusão! Adaptando currículos, criando planos

educacionais individualizados, planos e protocolos de intervenção clínica,

considerando que existem várias vias de construção da aprendizagem, e

que existem vias “alternativas” possibilitadas pela capacidade plástica que

nosso cérebro possui. E o que isso significa? Resumidamente, significa

que nosso cérebro está em constante transformação com o fim de se

adaptar melhor as situações e as aprendizagens.

Em neurociências esse fato é conhecido como neuroplasticidade. E

como isso ocorre? O que é neuro? Neuro tem a ver com nosso sistema

nervoso, nossos neurônios, e plástico tem a ver com maleabilidade,

flexibilidade, como exemplo vamos pensar nas artes plásticas. Porque são

artes e são plásticas? Porque trabalham com as formas, criando formas.

Imagine uma escultura de barro, o artista começa com um pedaço

disforme de matéria prima e vai moldando-o, modulando-o. O mesmo

ocorre com nossas funções cerebrais, isso é a aprendizagem.

A aprendizagem modifica nosso cérebro, ela vai acomodando novas

conhecimentos e isso vai nos formando também, fazendo com que nos

tornemos quem nós somos.

A neuroplasticidade é maior na infância onde o número de conexões

também é maior, por isso a estimulação precoce é tão importante. Nesse

sentido a educação infantil é também primordial, e deve se explorar nessa

fase ao máximo, atividades multissensoriais, para que as crianças

desenvolvam várias formas de aprender também.

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Tudo isso que foi abordado até aqui é referente a aprendizagem sob o

ponto de vista neurobiológico mas nós sabemos que a aprendizagem

também envolve outros fatores e a visão ampliada e conjunta de todos os

processos e contextos que envolvem a aprendizagem auxilia na

compreensão da diferença existente entre transtornos de aprendizagem e

dificuldades de aprendizagem.

A aprendizagem envolve, além das questões neurobiológicas comentadas

anteriormente, também aspectos sociais, emocionais, econômicos,

nutricionais, qualidade dos estímulos recebidos, ambiente etc, nesse

sentido a dificuldade de aprendizagem é causada por fatores externos ao

indivíduo, não tem origem orgânica, então geralmente, quando o professor

ou outros profissionais vão investigar essas dificuldades se deparam com

problemas de ordem emocional como separação dos pais, bulyng,

dificuldades socioeconômicas, privações de alguma natureza dentre

outras. Enquanto que o transtorno de aprendizagem está intimamente

ligado a questões neurobiológicas. Na dislexia por exemplo há um padrão

diferente de funcionamento do cérebro no indivíduo.

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CAPÍTULO 2
O QUE É A DISLEXIA?
Segundo a Associação Internacional de Dislexia (2002):

A Dislexia é um transtorno específico de aprendizagem de origem

neurobiológica, caracterizada por dificuldade no reconhecimento preciso

e/ou fluente das palavras e pela baixa habilidade de decodificação e

soletração. Essas dificuldades geralmente derivam de um déficit no

componente fonológico da linguagem, muitas vezes surpreendente,

quando comparado a outras habilidades cognitivas e ao acesso à

aprendizagem. Consequências secundárias podem incluir dificuldades na

compreensão de texto e pouca experiência de leitura, podendo impedir o

desenvolvimento do vocabulário e do conhecimento geral.

E o que isso significa? Primeiro que esse transtorno não afeta a

inteligência. Esse indivíduo vai ser capaz de aprender sem nenhuma

dificuldade inúmeras outras habilidades, e nós veremos um pouco mais a

frente que inclusive para ser diagnosticado com dislexia o indivíduo não

pode ter nenhum transtorno de ordem cognitiva, como Deficiência

Intelectual por exemplo.

Então a dislexia é considerada um transtorno específico de

aprendizagem porque os seus sintomas geralmente afetam o desempenho

acadêmico da pessoa e não existe nenhuma outra alteração (neurológica,

sensorial, cognitiva ou motora) que justifique as dificuldades observadas

(o diagnóstico é feito por exclusão).

Ele afeta o processamento fonológico, uma vez que há grande

dificuldade de decodificar o estímulo escrito ou o símbolo gráfico, e afeta,

principalmente, o processo de alfabetização, e é nesse período, de início

da escolarização, que os sintomas se tornam mais evidentes. Então quais

as dificuldades que esse indivíduo vai apresentar?

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Associar o som que ele está emitindo a letra que ele está lendo, como

por exemplo, ele leu a palavra bola mas ele não associa o que ele disse as

letras que ele está soletrando, ou dito de outro modo, ele lê mas não

compreende o que foi lido. É comum crianças com dislexia ao serem

perguntadas sobre o que acabaram de ler responderem que não sabem ou

que não lembram, então ela leu (com dificuldade, disléxicos geralmente

não tem fluência na leitura, leem silabando) e não sabe o que estava

escrito. Para esses indivíduos é mais fácil aprender ouvindo, quando

alguém lê para o disléxico, ele entende melhor porque ler envolve

decodificação e quando ele está lendo ele tem que decodificar, quando ele

está ouvindo já vem decodificado.

Qual a etiologia, a origem desse transtorno e como é feito o seu

diagnóstico? Sobre suas possíveis causas, o que se sabe até agora, é que a

dislexia é causada por uma alteração cromossômica hereditária que

acomete de 0,5% a 17% da população mundial. Dado a grande quantidade

de indivíduos que apresentam o transtorno é comum ter muitos casos nas

escolas e nos consultórios. Os sintomas tornam-se mais evidentes durante

a fase da alfabetização, como já dito. E ainda de acordo com a Associação

Brasileira de Dislexia, o transtorno pode persistir na vida adulta.

Para além da hereditariedade, a dislexia também pode ser adquirida por

danos nas regiões responsáveis pelo processamento da leitura escrita. E

como pode ocorrer esses danos? Por traumatismos ou lesões cerebrais

como por exemplo um AVC (acidente vascular cerebral), ou no

nascimento por causas como anoxia perinatal que é a diminuição ou

ausência de oxigênio no cérebro durante o nascimento ou algum outro tipo

de sofrimento fetal como a hipoxia neonatal por exemplo.

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O diagnóstico é feito por exclusão, geralmente por equipe

multidisciplinar composta por psicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo e

neurologista. Antes de afirmar que uma pessoa é disléxica, é preciso

descartar a ocorrência de deficiências visuais e auditivas, déficit de

atenção, escolarização inadequada, problemas emocionais, psicológicos e

socioeconômicos que possam interferir na aprendizagem. Para ser

considerado dislexia não deve haver outros fatores que possam estar

causando dificuldades na aprendizagem, nesse sentido é comum que seja

solicitado pelo médico exames complementares, como: Audiometria,

Processamento Auditivo, Processamento Visual, Avaliação Neurológica,

psicológica e psicopedagógica. Assim como em outros transtornos não é

recomendado que apenas um profissional feche o diagnóstico de dislexia.

Esse diagnóstico e essas avaliações são feitas também com base nos

critérios diagnósticos de dois sistemas internacionais de classificação de

transtornos mentais e de comportamento, a CID 10, que é a Classificação

Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a

Saúde, adotada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2007; e do

DSM, o qual já se encontra na sua quinta versão onde ocorreram

mudanças quanto a dislexia.

O que é o DSM? É a sigla em inglês referente ao Manual diagnóstico e

estatístico dos transtornos mentais. Esse manual é um sistema de

classificação voltado aos problemas de saúde mental, desenvolvido pela

Associação Americana de Psiquiatria, e muito utilizado em diversos

países. Ele contém uma lista de critérios diagnósticos para cada transtorno

psiquiátrico reconhecido pelo sistema de saúde dos EUA. É usado tanto

em situações clínicas (ambulatórios, hospitais, clínicas e atenção básica),

bem como em amostras populacionais (ou seja, utilizado nas pesquisas

também). É um instrumento largamente utilizado por profissionais em

uma ampla variedade de contextos incluindo psiquiatras, psicólogos,

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assistentes sociais, enfermeiros, terapeutas ocupacionais e de reabilitação,

bem como por outros médicos e pesquisadores de muitas orientações

diferentes. A última revisão do manual ocorreu em 2013 e culminou no

DSM-5 que é a quinta versão e trouxe algumas atualizações, baseadas em

estudos científicos publicados nos últimos anos. A primeira versão

ocorreu por volta de 1940 e vem sofrendo atualizações de tempos em

tempos, conforme surgem novas informações nas pesquisas sobre esses

temas.

Mas por que classificar um transtorno mental? Porque Para compreender

tudo o que um transtorno pode acarretar, nós precisamos de informações

sobre como ele é e como afeta o funcionamento do indivíduo, para que

dessa forma possamos entender todas as dimensões do transtorno e

definir o diagnóstico, e isso deve ser feito com validade e reconhecimento

em diversas culturas. Já imaginou a dislexia ser diferente em cada lugar?

O tdah? O autismo? É preciso essa unificação e padronização e ainda,

essas informações são importantes para encontrar as possíveis causas

genéticas ou epigenéticas, a heterogeneidade dos sintomas, os fatores e

risco e as comorbidades. Podemos concebê-lo como um referencial.

Como é feita essa classificação das características que o individuo

deve apresentar para ser considerado de risco para a dislexia assim como

também outros transtornos? Qual a definição? O que diz o DSM 5 sobre a

dislexia e quais são os critérios?

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Enquanto para o CID 10, a dislexia é considerada um transtorno

específico de leitura, o DSM 5 vai amplificar esses critérios e a dislexia

dentro dessa perspectiva desse manual, está classificada na categoria de

transtornos ou Dificuldades específicas de aprendizagem¹ o que inclui um

conjunto de habilidades acadêmicas e não apenas a leitura mas também a

expressão escrita e a matemática, o que na versão anterior, no DSM IV,

era definido como Dislexia, disgrafia e discalculia. Nessa última

atualização que culminou na versão 5 do DSM, tudo isso passa a ser

definido como Dificuldade Específica da Aprendizagem abarcando três

domínios ou especificadores que são a leitura, a expressão escrita e a

matemática. Isso significa basicamente que os sintomas e as

características que esse indivíduo vai apresentar, se manifestarão em

diferentes graus nessas três habilidades.

São quatro os critérios e conforme o DSM5 todos devem ser

observados no indivíduo:

[1] NA LITERATURA EXISTENTE SOBRE ESSE TEMA TAMBÉM HÁ REFERÊNCIAS A ELE COM A
SIGLA DEA – DIFICULDADE ESPECÍFICA DA APRENDIZAGEM.

25
Critério A

Refere-se às características-chave das DEA (pelo menos um dos seis

sintomas de dificuldades de aprendizagem, que têm de persistir por, pelo

menos, seis meses, apesar ter sido proporcionada ajuda extra ou instrução

específica). O indivíduo deve apresentar pelo menos 1 dos seguintes

sintomas:

1. Leitura lenta, difícil e imprecisa de palavras. (como seria isso? E alto,

com entonação incorreta, muito lento ou hesitante;

2. Dificuldade em perceber o significado do que se está lendo (por ex.:

poderá apresentar uma leitura correta, mas não perceber a sequência,

as relações, as inferências, ou os significados do que está lendo);

3. Ortografia pobre (por ex., podem adicionar, omitir ou substituir

vogais ou consoantes);

4. Expressão escrita deficitária (exemplo: múltiplos erros gramaticais ou

de pontuação dentro das frases, falta de clareza na expressão de ideias

escritas, organização pobre de parágrafos ou uma caligrafia ruim);

5. Dificuldade em recordar fatos numéricos;

6. Cálculo aritmético impreciso e lento;

7. Raciocínio matemático ineficaz ou impreciso;

8. Evita e resiste a atividades que impliquem leitura, escrita, ortografia

ou aritmética.

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Critério B

Refere-se à medição dessas características (as habilidades acadêmicas

afetadas são substancialmente e quantificavelmente abaixo do esperado

para a idade e causam dificuldades nas atividades escolares, profissionais

ou quotidianas, aspecto confirmado por medidas de desempenho

padronizadas administradas individualmente e avaliação clínica

abrangente). E aí lá no módulo onde trataremos da avaliação eu vou falar

um pouco sobre esses instrumentos.

Critério C

Refere-se à idade de início dos problemas (durante a idade escolar,

embora possam manifestar-se plenamente apenas na idade adulta, em

alguns indivíduos).

Critério D

Especifica quais são os transtornos (problemas relacionados com défice

Intelectual, acuidade auditiva ou visual não corrigida, outros transtornos

mentais ou neurológicos) ou condições adversas (adversidade psicossocial,

a falta de proficiência na língua de ensino, instrução insuficiente) que

devem ser excluídos antes que um diagnóstico de DEA possa ser

confirmado.

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Traduzindo isso em ações do nosso cotidiano, quais os sinais de risco que

o indivíduo apresenta? O que devem observar os professores e familiares?

Na Pré-Escola, por exemplo.

Ter problemas de aprendizagem de rimas; falta de interesse pelas

rimas; palavras mal pronunciadas; dificuldade em aprender e lembrar

o nome da letra; deficiência em saber o nome das letras de seu próprio

nome.

Falar mais tarde do que a maioria das crianças;

Ter mais dificuldade do que outras crianças ao pronunciar as palavras;

Ser lento para adicionar novas palavras de vocabulário e ser incapaz

de recordar a palavra certa;

Ter dificuldade em aprender o alfabeto, números, dias da semana,

cores, formas, como soletrar e como escrever seu nome;

Demonstrar dificuldade ao tentar rimar palavras e reconhecer letras e

fonemas;

Ser lento para desenvolver habilidades motoras finas. Por exemplo:

seu filho pode levar mais tempo do que outros da mesma idade para

aprender a segurar um lápis na posição de escrever, usar botões e

zíperes e escovar os dentes.

Ter dificuldade em separar sons em palavras e misturar sons para

fazer palavras.

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No Ensino Fundamental, quais características ou sintomas?

Dificuldade em entender que as palavras podem ser divididas em

partes;

Dificuldade em associar letras a sons;

Incapacidade de ler palavras simples;

Reclamações de o quanto é difícil ler;

Histórico de problemas de leitura presente nos pais e irmãos (é

comum nesses casos o pai ou mãe relatar que quando criança também

era assim ou que ainda é);

Tem dificuldade em ler palavras simples que não estão cercadas por

outras palavras;

Podem ser lentos para aprender a conexão entre letras e sons;

Possuem discurso não fluente (pausas ou hesitações frequentes,

muitos “hum”);

Não ser capaz de encontrar as palavras corretas, confundindo as que

tenham a sonoridade semelhante;

Problema ao lembrar datas, nomes, números de telefone, listas;

Medo de ler em voz alta;

Desempenho fraco em testes de múltipla escolha;

Ter dificuldade em terminar provas no tempo estabelecido;

Problemas na leitura dos enunciados dos problemas matemáticos;

Leitura lenta e cansativa;

Apresentar deveres de casa incompletos e intermináveis;

Necessitam de ajuda para ler o enunciado;

Extrema dificuldade para aprender uma língua estrangeira.

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E no Ensino Médio e na Faculdade?

Estudantes no ensino médio e na faculdade podem:

Ler muito lentamente com muitas imprecisões;

Continuar a soletrar incorretamente, ou soletrar frequentemente a

mesma palavra diferentemente em uma única parte de escrita;

Evitar testes que exigem leitura e escrita, e procrastinar em tarefas de

leitura e escrita;

Ter dificuldade em preparar resumos e contornos para as aulas;

Trabalhar intensamente em tarefas de leitura e escrita;

Ter poucas habilidades de memória e completar o trabalho atribuído

mais lentamente do que o esperado;

Ter um vocabulário inadequado e ser incapaz de armazenar muita

informação da leitura.

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CAPÍTULO 3
DEA NA EXPRESSÃO ESCRITA
(disortografia/disgrafia)
DEA NA MATEMÁTICA
(discalculia)
E demais Comorbidades.
Você já deve ter ouvido falar ou até ter atendido indivíduos ou ter tido

alunos com disortografia, disgrafia e discalculia. E como se caracteriza

esses distúrbios? O que é preciso saber sobre disgrafia e disortografia?

Existe diferenças entre elas? Quais são?

Ambas afetam a expressão escrita do indivíduo, mas existem sim

diferenças entre elas. A disgrafia tem relação com problemas perceptivo

motores. Esse indivíduo, vai ter um comprometimento no traçado das

letras e na disposição gráfica.

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Segundo CARACIKI (2006), existem dois tipos de disgrafia: motora e

perceptiva. Na motora a criança vê a figura gráfica mas não consegue

realizar o movimento; na perceptiva, a criança não faz uma relação entre o

sistema simbólico e as grafias que representam os sons, as palavras e as

frases.

Nesse tipo é possível perceber algumas características bem marcantes:

Esse indivíduo vai escrever muito devagar, com muita lentidão... se

ele for copiar algo do quadro né... da lousa... por exemplo... ou de um

livro ele geralmente vai copiar letra por letra...

Vai apresentar letra ilegível, com escrita desorganizada e traçados

irregulares (geralmente traços ou muito fortes ou muito fracos);

Há também uma desorganização geral no espaço, na folha... e isso

ocorre devido à falta de orientação espacial... então esse texto não

respeita margem, para antes do final da página do caderno, escrevem

torto, ultrapassam linhas (tipo subindo ou descendo... não tem? A

criança começa no inicio da linha e no final ela subiu... e amontoam as

palavras no final frase quando a linha está terminando;

Letras, malfeitas, retocadas (que é quando a criança não apaga e faz

uma reforma ali... naquilo que ela errou... escreve por cima do erro);

Letras atrofiadas, ou muito grandes ou muito pequenas. Omissão de

letras, números, formas destorcidas e espaçamento irregular.

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E a disortografia? Como se apresenta?

A disortografia tem relação maior com o ato intelectual da escrita,

portanto alguns dos seus sintomas são parágrafos inconsistentes e frases

sem sentido. Devido a falhas na memorização, se apresenta como um

emaranhado de letras o que acarreta em erros ortográficos. Isto acaba

afetando a auto estima da criança, inibindo a escrita e fazendo desse ato

uma tortura para esses indivíduos.

A disortografia se caracteriza por trocas de letras, junção ou separação

indevidas das palavras, confusões de sílabas, omissão e inversão e

dificuldades em perceber sinalizações como parágrafos, acentuação e

pontuação. Não afeta a grafia, a criança não será necessariamente

disgráfica pois o traçado é preservado quanto a sua qualidade. Mas, pode

haver casos com os dois distúrbios associados.

Já na discalculia o indivíduo apresenta dificuldades em entender

conceitos relacionados a números, símbolos ou funções no campo da

aritmética. Muitas vezes não entendem quantidades ou conceitos como o

maior contra o menor por exemplo. Podem não entender que o número 5 é

o mesmo que a palavra cinco, habilidades conhecidas como sentido

numérico, há um déficit no sentido numérico.

Esses indivíduos também vão apresentar dificuldades relacionadas

com a mecânica de fazer matemática, como por exemplo ser capaz de

recordar fatos de matemática. Eles podem por exemplo entender a lógica

por trás da matemática, mas não quando ou como aplicar o que sabem para

resolver problemas.

Manter os números em mente ao fazer problemas de matemática com

várias etapas também se apresenta para esses indivíduos como uma grande

dificuldade e isso está associado a memória de trabalho.

34
E quais as principais características ou sintomas que indivíduos com

discalculia apresentam? Esse transtorno pode afetar toda a vida do

indivíduo nos mais diversos contextos, incluindo habilidades cotidianas

como a interação social e o gerenciamento do tempo mas aqui vamos nos

deter a abordar como esses sinais se apresentam no contexto escolar.

Como é na Pré-Escola?

Quais sinais esse indivíduo pode apresentar nessa etapa?

Dificuldade em aprender a contar e para lembrar da ordem correta dos

números;

Dificuldades no reconhecimento de padrões, como por exemplo

menor/maior, alto/baixo;

Problemas para reconhecer símbolos numéricos; dificuldade para

compreender que “7” significa sete), associar a quantidade;

E essas crianças parecem não entender o significado da contagem.

35
E no Ensino Fundamental?

Como esses sinais se apresentam?

Como dificuldades em aprender e a lembrar de fatos matemáticos

básicos, como por exemplo: 2+4 = 6 ou 2+2= 4;

Dificuldades na identificação de +, – ... e também outros sinais, assim

como para usá-los corretamente;

Utilizam muito os dedos para contar em detrimento de usar estratégias

como o cálculo mental por exemplo;

Dificuldade também para entender palavras relacionadas a

matemática, como maior que, menor que.

E no Ensino Médio?

Dificuldade em entender valores;

Problemas para escrever números claramente ou colocá-los na ordem

correta;

Problemas com frações e com medidas;

Dificuldades em acompanhar a pontuação em jogos esportivos, por

exemplo.

36
Sinais na faculdade e vida adulta?

Dificuldades para aplicar conceitos matemáticos ao dinheiro, o que

inclui por exemplo estimar o custo total de uma compra (é comum

aqui errar o troco ou levar quantidade insuficiente de dinheiro);

Dificuldade em entender gráficos ou planilhas, em medir coisas como

ingredientes em uma receita simples ou líquidos em uma garrafa por

exemplo;

Dificuldades também para encontrar abordagens diferentes para o

mesmo problema de matemática. Aqui seria vários caminhos ou

soluções para um mesmo problema;

Dificuldade em compreender o tamanho, medir as distâncias ou a

quantidade de uma determinada substância.

Geralmente a produção escrita desses indivíduos é considerada apenas

uma letra feia, desleixo, por isso é tão importante que profissionais que

trabalham com o desenvolvimento infantil e humano tenham esse

conhecimento para que não venham a colaborar com a negligencia para

com esse indivíduo que precisa de tratamento.

37
E Eles podem ocorrer concomitantemente? Sim e a isso damos o nome

de comorbidades que é a presença de dois ou mais transtornos em um

único indivíduo, são comuns e além dessas, o TDAH (transtorno de

déficit de atenção e hiperatividades) está entre as principais, ocorrendo

segundo informações da associação brasileira de tdah, entre 25% a 40%

nos indivíduos com um ou outro transtorno.

O tratamento é realizado por equipe multidisciplinar com neurologista,

psicopedagogo, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo. O tratamento é

centrado na reeducação da linguagem escrita, abordando todos os aspectos

envolvidos. Segundo a International Dyslexia Society, na dislexia deve ser

observado que as diferenças são pessoais, o diagnóstico é clinico, o

entendimento é científico e o tratamento é educacional.

38
CAPÍTULO 4
CONSIDERAÇÕES
SOBRE
AVALIAÇÃO
A avaliação é o processo mais importante de toda e qualquer

intervenção. Ela é nossa bússola e nosso termômetro. É a bússola porque

nos orienta sobre qual caminho seguir e termômetro porque é ela também

que vai nos ajudar a mensurar o andamento dos nossos processos de

intervenção, seja na escola ou na clínica.

Avaliar é uma ação com várias funções, dependendo do objetivo a que

se destina e do profissional que a está utilizando, ou seja, ela pode ser

utilizada para diagnosticar e então ela terá essa função e a observação

realizada nela será no sentido de identificar sinais de risco, sintomas e

características do transtorno para ao final dar um parecer positivo ou

negativo, um diagnóstico, ou ainda, ela pode ter a função de inventariar

as habilidades do indivíduo, fazer um levantamento do repertório de

desenvolvimento cujos resultados poderão ser utilizados como subsídio e

orientação para a construção das propostas de intervenção.

Observe que nos exemplos citados, a primeira opção traz informações

referentes a causa, do que se trata e isso já vem com inúmeras

características que esse indivíduo irá trazer consigo, ou dito de outro

modo, como é essa pessoa? Para quem eu vou planejar? Para que tipo de

indivíduo? No segundo exemplo de uso e função da avaliação temos um

objetivo diferente, uma prática diferente a partir dela, e o que esse

resultado aqui nesse contexto, de levantamento, proporciona? Dois pontos

importantíssimos: saber o que esse indivíduo já sabe e saber o que não

sabe, e saber isso me remete a um outro lugar, o ponto de partida para toda

e qualquer intervenção que eu queira propor e uma reflexão bem

interessante que gosto de propor aqui é que um não depende do outro.

40
Sem dúvida o ideal é que diagnóstico e intervenção caminhem juntos,

mas muitas vezes isso não é possível por inúmeros motivos e então, se

você professor, psicopedagogo, psicólogo, fono ou outro profissional de

terapia, ou familiar identificou esses sinais no indivíduo, mesmo que ele

não tenha laudo ou enquanto o laudo não é concluído, comece o quanto

antes as intervenções pois são inúmeros os estudos que apontam que a

intervenção quanto antes ocorrer, maior a qualidade de vida do indivíduo e

maior as chances de desenvolvimento. Não é preciso esperar por nada para

intervir, se há sinal deve haver intervenção.

Uma outra função que a avaliação possui é acompanhar o processo de

desenvolvimento desse indivíduo ao longo das intervenções, desse modo,

de tempos em tempos devemos fazer uma reavaliação, um novo

levantamento de habilidades para saber se aquilo que estamos propondo

está dando resultados, se é preciso ajustes e o que já houve de evolução.

Na avaliação multidisciplinar quais os pontos devem ser avaliados, o

que deve ser testado e observado? Não vamos nos aprofundar em cada

prática profissional, mas vamos abordar aqui as noções gerais para que

fique mais claro para nós todos esses processos e etapas até o diagnóstico.

As áreas avaliadas são:

41
Desenvolvimento Emocional;

Linguagem e Funcionamento Psicolinguístico;

Percepção Visual e Auditiva;

Funcionamento Cognitivo;

Psicomotricidade;

Motricidade;

Vocalização;

Decisão Lexical;

Decisão Semântica;

Processamento Auditivo;

Processamento Visual;

Desempenho Acadêmico;

Lembrando que essa avaliação, é composta pela observação de vários

profissionais, cada um dentro do seu campo de atuação com aquilo que lhe

compete e que irá contribuir com o diagnóstico.

Segundo a associação brasileira de dislexia, e com base também na

literatura disponível, que profissionais são esses? neuropsicólogos,

fonoaudiólogos, psicopedagogos clínicos e neurologistas.

42
Na prática seria resumidamente assim: Na avaliação neuropsicológica

por exemplo, deve ser avaliado os problemas de coordenação motora fina,

déficit de memória operacional e lateralidade; a fono vai avaliar o

processamento auditivo e vai aplicar atividades de segmentação e

manipulação fonêmica por exemplo; e a psicopedagoga ou

neuropsicopedagoga? Como seria a avaliação dessa profissional? Ditados,

onde vai se observar trocas fonéticas, dificuldades no uso e nas relações

numéricas e também a leitura de palavras observando se há piores

resultados em palavras de baixa frequência, irregulares, pseudopalavras e

erros sonoros e visuais. E na leitura de texto se lê silabando e se tem

substituição visuo-sonora incompatível com a série/ano em que a criança

se encontra na escola. Outros profissionais também podem compor esse

quadro dependendo da sintomatologia apresentada pelo indivíduo, mas

basicamente são esses.

Algumas áreas como a medicina, a psicologia e a fonoaudiologia por

exemplo, possuem práticas e instrumentos de avaliação restritos ao seu

campo profissional que não serão abordados aqui mas existem

instrumentos de avaliação² com múltiplas funções que podem ser

utilizados sem nenhuma restrição como as Provas de Avaliação dos

Processos de Leitura (PROLEC), o Teste de Desempenho Escolar (TED e

TED II) e o CONFIAS (Consciência Fonológica Instrumento de

Avaliação Sequencial).

Lembrando que um único instrumento de avaliação pode ser utilizado

de formas variadas e com objetivos diferentes, o que é determinado pela

profissão de cada um, por exemplo uns vão avaliar cognição, outros

articulação linguística, outros desempenho acadêmico etc.

[2] NO CURSO ONLINE “DISLEXIA: AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO” ABORDAMOS DE MODO


MAIS APROFUNDADO ALGUNS DESSES INSTRUMENTOS NÃO RESTRITOS.
ASSIM COMO O PROCESSO DE AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO.

43
CAPÍTULO 5
INTERVENÇÃO
Até aqui vimos várias informações importantes sobre esse transtorno e

são essas mesmas informações que vão subsidiar os processos de

intervenção junto aos indivíduos com Transtorno Especifico da

Aprendizagem. Nós já sabemos o que é, quais os sinais de alerta e

sintomas e conhecemos alguns instrumentos de avaliação.

Nós vimos que não só a avaliação para diagnóstico é multidisciplinar

mas também a intervenção, desse modo, existem várias abordagens que

podem ser utilizadas para esse fim, dependendo do seu campo de atuação

e da sua profissão.

Uma vez que esse tema desperta um interesse muito abrangente, nós

vamos abordar na medida do possível aquilo que pode ser utilizado sem

restrições, que pode ser utilizado por todos, professores, psicopedagogos,

neuropsicopedagogos e áreas afins.

A essa altura nós já sabemos quais as principais dificuldades que esses

indivíduos apresentam e com base nisso o que precisa ser estimulado,

desenvolvido e alcançado. Essas informações servem para profissionais e

familiares então você enquanto profissional pode orientar as famílias para

que elas possam colaborar nesse processo, o que vai aumentar as chances

desse indivíduo se desenvolver mais e melhor uma vez que a família é

peça fundamental é preciso que ela esteja envolvida e ativa. Não

ensinando os conteúdos, mas presente, apoiando.

Quais estratégias que podem ser utilizadas nos processos de intervenção?

Ensinar a resumir e a sintetizar os conteúdos, permitir que utilizem

calculadoras, gravadores, utilizar pistas visuais, evitar cópias de textos

longos e também deveres de casa que envolvam leitura e escrita intensa.

45
“As avaliações devem preferencialmente ser realizadas na modalidade

oral ou ter algum auxiliar ajudando a criança na leitura dos comandos.

Evitar a utilização de testes de múltipla escolha, valorizar os trabalhos

pelo seu conteúdo e não pelos erros de escrita, ou seja, não

supervalorizar o erro. Colocar esse individuo em um local tranquilo na

sala de aula, onde inclusive ele possa ser auxiliado com mais facilidade

pela professora³”.

No caso da alfabetização, o método fônico apresenta resultados muito

positivos.

Com relação a matemática, utilizar exemplos concretos que conectam

matemática à vida real, utilizar material concreto. Isso pode ajudar a

fortalecer o sentido dos números para esse indivíduo.

Usar pistas visuais ao resolver problemas. A criança pode desenhar

imagens ou mover objetos, por exemplo. Usar papel milimetrado para

ajudar a manter os números alinhados. Cobrir uma parte da folha da

atividade ou prova pode ajudar também para que no seu campo de visão

apareça apenas uma coisa de cada vez.

No contexto de clínica a intervenção também deve ser baseada nos

princípios básicos da aprendizagem da leitura, no processo de

transformação de grafema- fonema e para isso podemos utilizar as

atividades grafomotoras por exemplo e no reconhecimento global da

palavra.

[3] (DUARTE E SOUZA, 2014)

46
Vale salientar aqui que a ação terapêutica deve ajudar o indivíduo a

desenvolver habilidades de organização verbal dos estímulos visuais e

auditivos para que ele seja capaz de posteriormente fazer essa associação

com significado.

Se a criança ainda não se encontra no processo de alfabetização devem

ser estimuladas as áreas sensório motoras, e isso deve ser feito de modo

mais específico pela terapia ocupacional.

Essa intervenção clínica, seja ela qual for sempre deve ter como

objetivo auxiliar o indivíduo quanto ao estabelecimento de nexo entre a

recepção do estímulo e sua incorporação ao léxico.

Etchepareborda (2002) vai propor um cronograma de tratamento por

ordem de complexidade como uma sugestão a ser seguida na intervenção

de pessoas com dilexia que eu acho bem válida e interessante.

47
1º) Deve ser trabalhada a Estrutura silábica das palavras

• síntese silábica;

• análise silábica;

2º) em seguida a Identificação de sílabas

• segundo a posição que ocupam;

• e segundo natureza delas;

3º) A terceira etapa consiste na Comparação de sílabas

• segundo também a sua posição;

• e segundo sua natureza;

4º) E por último ele recomenda trabalhar a Recombinação fonológica.

Exemplo:

• Omissão de sílaba final. Como seria isso? Por Exemplo: atividades com

a palavra faltando a última sílaba para a criança completar (BONE____);

• Omissão de sílaba inicial; (___DEADO);

• Omissão de sílaba central; (BA___NA);

• Inversão de sílabas; (PATOSA);

• Adição de sílaba final;

• Adição de sílaba inicial.

Segundo o autor essas são as estratégias que podem ser utilizadas nas

intervenções na escola, na clínica e em casa.

48
Método de Intervenção por Protocolos (MIP)®

O método de intervenção por protocolos (MIP)® foi desenvolvido por

Renata Bringel a partir de sua experiência de mais de uma década de

atuação na educação básica, superior e na clínica. O método consiste na

manipulação de uma ferramenta de otimização de implantação de ações e

coleta resultados de intervenção de modo simples e funcional por meio da

utilização de protocolo. Está fundamentado nos pressupostos de Vigotsky

com atuação junto aos indivíduos a partir da zona de desenvolvimento

proximal.

O método está dividido em 7 passos (ALISCRA) guiados por um

protocolo que pode ser utilizado em todos os casos mediante adaptações e

também pode ser usado sem restrições por professores, terapeutas e

familiares.

49
REFERÊNCIAS

CARACIKI, A. Letra feia é desleixo? Curso de oratória: voz e fala, 2006.

CUETOS, F.; RODRÍGUEZ, B.; RUANO, E.; ARRIBAS, D. PROLEC-

R: Evaluación de los procesos lectores revisada. Madrid: TEA Ediciones,

2007.

DOMINGUES, C. S. Dislexia, disgrafia, disortografia e discalculia:

diagnóstico e intervenção psicopedagógica. Monografia apresentada ao

Curso de PósGraduação em Psicopedagogia Clínico-Institucional, Vila

Velha-ES, 2010. Disponível em:

http://www.scielo.br/pdf/pe/v12n3/v12n3a10.pdf. Acesso em: 11/03/2020.

Duarte, A.N., Souza, J.C. Intervenções pedagógicas em alunos com

dislexia. Universidade do Estado do RJ – CAp – UERJ, 2014.

DSM-IV: Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4th ed.

Washington: American Psychiatric Association; 1995.

DSM-V: Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4th ed.

Washington: American Psychiatric Association; 2013.

ETCHEPAREBORDA MC. Detecciónprecoz de La dislexia y enfoque

terapéutico. Rev Neurol34(Suppl1):13-23, 2002.

Papalia DE, Feldman RD. Desenvolvimento humano. 12a ed. Porto

Alegre: AMGH Editora; 2013.

Vygotsky LS. Pensamento e linguagem. Versão para E-Book. [Edição

eletrônica] Ridendo Castigat Mores, editor; 2001. Disponível em:

http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/vigo.pdf

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