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Direito Constitucional II

1º Ano - 2º Semestre
Turma A
2015/2016

Baseado nos Sumários Desenvolvidos de Direito Constitucional


Regência: Professor Carlos Blanco de Morais
Realizado por: Mafalda Maló
DIREITO CONSTITUCIONAL I
CAPÍTULO II. Estrutura e Morfologia Normativa da Constituição de 1976.
1. A Constituição como um complexo estruturado de disposições preambulares, princípios e regras: A
Constituição, que durante o Estado Liberal se traduzia na definição de direitos civis e políticos e da organização
política e territorial do Estado, depois da Constituição de Weimar, passou a consagrar (na generalidade europeia),
adicionalmente, direitos sociais e princípios de organização económica. Surgiu, assim, o paradigma da
Constituição do Estado Social de Direito. Na estrutura normativa, a precedência dos direitos, liberdades e
garantias sobre os direitos sociais, afirma o modelo do Estado Constitucional de Direito – a pessoa como centro
da preocupação do Direito (difere da ideologia marxista-leninista, que faz preceder a organização económica aos
direitos, liberdades e garantias).

2. O preâmbulo.
2.1. Noção: documento que precede a Constituição e que tem o escopo de a situar histórica e
politicamente. Sendo alvo de grande controvérsia, o preâmbulo pode, em certos casos, revestir uma natureza sacra
(o povo interioriza-o – é o caso americano), noutros invocar o nome de Deus (situação Alemã de 1949 e Brasileira
de 1988) e, ainda, dispor de força jurídica (caso francês de 1958 – recetor de normas do seu antecessor, em 1946,
que incorporavam a DUDH) ou dispor de carácter poético e ideológico (caso português, CRP de 1976). A regência
desconsidera, salvo raras exceções, a força normativa do preâmbulo.
2.2. Conceções relativas à relevância dos preâmbulos. A relevância jurídica preambular pode assumir
três variantes: a irrelevância jurídica (não se afirma como parâmetro de constitucionalidade ou como instrumento
de interpretação), a relevância jurídica plena (dispõe de estatuto semelhante à Constituição, pelo que vincularia
o direito inferior) e a relevância jurídica indireta (os princípios operam como instrumento de interpretação).
2.3. A irrelevância jurídica do preâmbulo da Constituição portuguesa de 1976. A regência entende que,
na Constituição de 1976, impera a irrelevância jurídica do preâmbulo, dispondo este de uma função meramente
histórica.
A. Argumentos. O texto literário é da autoria de um poeta, Manuel Alegre, logo dispõe de caráter
utópico e proclamatório, pelo que não deve condicionar a organização e os direitos do Estado. Os princípios
enunciados não são autónomos, porque ou não dispõem de correspondência (caducaram) ou são reproduzidos
com maior concretização e densidade na ordem constitucional. A matriz socialista e dirigista do preâmbulo
contrasta com as alterações produzidas pelas revisões constitucionais, que formaram uma Constituição de matriz
democrática e pluralista, logo conceder relevância jurídica ao preâmbulo significa contradizer o próprio
preceituado. O preâmbulo é juridicamente irrelevante e opera como um elemento de divisão e não de
integração.

3. Normas Constitucionais ou Preceituado.


3.1. As regras e os princípios: regras como mandatos de definição e os princípios como enunciado
jurídico de valores e interesses qualificados, pautados por um elevado grau de generalidade e indeterminação.
A. Regras ou Normas Jurídicas. São critérios de decisão que vinculam os poderes públicos e
certas relações jurídicas privadas, produzindo efeitos jurídicos. As normas, em termos substanciais, consistem em
disposições ou preceitos, enunciados textuais estruturados em orações, dos quais resultam comando(s) jurídicos.
Os preceitos e as normas não são, pois, realidades independentes: o preceito pode conter uma pluralidade de
normas, pode contar sentidos diferentes e alternativos entre si ou pode conjugar-se com outros, por forma a
extrair uma norma.
B. Evolução histórica.
C. Tipologia das normas constitucionais.
a) Critério Funcional. As normas constitucionais desempenham funções diversas.
Segundo propõe Herbert Hart, no que toca à função estruturante, as normas podem ser primárias (aplicam-se
diretamente às relações institucionais e aos direitos, liberdades e garantias) ou secundárias (aplicam-se à produção
e validade de outras normas – normas sobre normação). No que toca à matéria que disciplinam, podem ser
substanciais (relativas à identidade do Estado – regime político e direitos fundamentais) ou organizativas,
subdividindo-se em quatro espécies: normas de competências (estabelecem poderes funcionais), normas
estatutárias dos titulares dos órgãos (as regras respeitantes ao exercício de cargos), normas de forma ou de processo

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(revelação de atos jurídicos, nomeação de cargos, tomada de decisões) e normas de qualificação (forma e atributos
de atos jurídicos).
b) Critério da Determinabilidade. As normas podem ser princípios ou regras. Os
princípios são enunciados jurídicos de valores, dotados de elevado grau de indeterminação e dirigidos à
prossecução de fins - afirmam-se como mandatos de optimização (HUMBERTO ÀVILA: são normas parciais,
não geram regras específicas, pelo que devem ser complementados). As regras são mandatos de definição que
determinam condutas imperativas.
i) Relação entre princípios e regras. Em princípio, como normas
constitucionais, dispõem de igual hierarquia. De uma forma geral, afirma-se a recondução das regras a princípios
e estes a valores de ordem moral (uma norma contrária a um princípio seria, então, inválida). Importa referir,
contudo, que: os princípios baseiam-se em valores, que têm caráter indeterminado e que sofrem mutações
interpretativas, logo deles resultam inúmeros subprincípios; assim, há concordância entre regras e princípios, no
entanto o princípio não é precedente à regra (apenas esclarece o seu significado). ALEXY defende a prevalência
da regra em relação em princípio, que concorda com a posição anteriormente proposta por HUMBERTO
ÁVILA. A regência defende, pois, a prevalência da regra em relação ao princípio, de acordo com regra da norma
especial prevalecer sobre a norma geral.
c) Abertura das normas constitucionais. Existe, no geral, uma margem de
discricionariedade na interpretação das normas constitucionais, assumindo esta abertura três vertentes: axiológica
(HART: as normas constitucionais podem incorporar valores, pelo que, nas situações em que ocorra essa
incorporação, as normas são permeáveis no que toca à recepção de argumentações filosóficas e políticas), externa
(há uma constante comunicação entre a ordem constitucional nacional e sistemas externos, nomeadamente no
caso dos países membros da união europeia – há casos de prevalência clara de tratados e de decisões europeias) e
morfológica (as normas contêm, muitas vezes, conceitos indeterminados que permitem a criação das práticas
jurídicas e constitucionais e que permitem, por isso, a evolução da Constituição, ainda que não ocorra uma revisão
expressa).
3.2. Normas preceptivas e programáticas.
A. As normas preceptivas: normas de aplicação direta pela administração e pelos tribunais
(artigos 24º a 57º da CRP).
B. As normas programáticas: regras de conteúdo indeterminado não exequíveis por si próprias
que fixam fins, tarefas e programas públicos cuja concretização implica, em regra, a necessidade de emissão de
leis, atos da administração e prestação materiais e financeiras, dispondo o legislador ordinário de uma apreciável
liberdade conformadora para lhes conferir aplicação, ao abrigo da “reserva possível”. O legislador dispõe, assim,
de elevada discricionariedade. (artigos 60º, 64º e nº2 do artigo 63º).
3.3. Normas exequíveis e não exequíveis por si próprias.
A. Normas exequíveis por si próprias como normas percetíveis autoaplicativas e de eficácia
imediata (nº2 do artigo 24º, nº1 do artigo 29º, nº2 do artigo 37º e artigo 54º da CRP): consistem em normas
constitucionais aptas para se aplicarem de forma plena, direta e imediata em todas as suas dimensões, sem
carecerem de normas ordinárias para a sua efetivação.
B. Normas não exequíveis por si próprias como normas que carecem de complementação legal
para disporem de plena aplicabilidade.
a) Normas preceptivas não exequíveis por si próprias: dispõem de uma aplicabilidade
direta, mas não imediata, já que carecem de condições jurídicas para serem aplicadas. É necessário, desta forma,
um ato legislativo ordinário de complementação. Têm, assim, uma dimensão positiva (princípios e direitos para
o exercício) e outra negativa (conseguem ser aplicadas diretamente quando violadas, não carecendo na situação
de condições jurídicas). Localização: nº1 do artigo 35º e nº6 do artigo 29º.
b) Normas programáticas: são normas não exequíveis por si próprias, já que carecem de
outras condições, para além de jurídicas, para a sua aplicabilidade. Como na esmagadora maioria consistem em
princípios de ordem social, carecem de condições financeiras e políticas e, ainda, de um sistema gestionário (como
é o caso da segurança social ou do serviço nacional de saúde). Distinguem-se em normas de ordem geral e normas
qualificadas, mais detalhadas e com maior aderência à realidade social.
C. A problemática da aplicabilidade imediata das normas que regulam direitos, liberdades e
garantias e direitos sociais.

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3.4. Normas de organização do poder político e normas de definição de direitos: trata-se dos tipos de
normas que regulam as duas dimensões medulares da Constituição material (remissão).

4. Princípios Constitucionais.
4.1. Noção: enunciados de valores e interesses públicos qualificados com relevo constitucional, dotados
de conteúdo aberto e indeterminado e que operam como mandatos jurídicos de harmonização e otimização do
ordenamento.
4.2. Princípios normativos e regras jurídicas: critérios distintivos.
A. Essencialidade axiológica: a axiologia é a grande distinção entre princípios e regras, já que os
primeiros se caracterizam por bens jurídicos que se traduzem numa grande dominância dos interesses públicos e
dos valores, enquanto as regras mantêm uma linguagem e conteúdo funcionais.
B. Generalidade e abstração: a generalidade e abstração constantes dos princípios resultam do
seu caráter mais finalístico, que procuram um status ideal (quase utópico), logo não tão imediatos como as regras,
que impõem condutas permissivas, obrigatórias ou proibidas.
C. Indeterminabilidade: ao contrário das normas, caracterizadas por um elevado grau de
determinabilidade, os princípios são substancialmente mais indeterminados, devido à generalidade e abstração
maiores, que levam a um conteúdo mais disperso, vasto e pouco concreto.
4.3. Operatividade dos princípios.
A. Os princípios como parâmetro da constitucionalidade das normas jurídicas
infraconstitucionais (o nº1 do artigo 277º da CRP).
B. Os princípios como medidas de valor de interpretação e integração das normas
constitucionais.
a) Métodos e técnicas de interpretação e concretização dos princípios.
b) Princípios e conceitos jurídicos indeterminados.
C. A força de irradicação dos princípios constitucionais.
D. As conceções de irradiação dos princípios constitucionais.
4.4. Breve tipologia.
A. Princípios axiológicos fundamentais: determinam a natureza e a identidade da República
Portuguesa como um Estado de direito democrático e soberano.
B. Princípios estruturantes do estatuto do poder político: enunciado das máximas orientadoras
da organização e funcionamento do poder.
C. Princípios estruturantes do sistema de direitos fundamentais: princípios que operam como
garantia do complexo ordenado de direitos fundamentais declarados na Constituição.
D. Princípios da ordem programática: mandatos específicos de comportamento ativo nos
domínios económico, social e cultural, dirigidos primariamente ao legislador.

5. A interpretação constitucional: introdução e remissão.

6. Fundamentos do Estado de Direito Democrático.


6.1. Enquadramento histórica: nos finais do século XVIII, com o sucesso das revoluções americana e
francesa, surge um novo conceito de Estado, que procura efetivar uma organização, limitada juridicamente, que
tenha em vista a proteção dos direitos dos cidadãos. Surge, assim, o Estado de Direito. Segundo a analogia
proposta por JORGE REIS NOVAIS, o Estado pretendia-se semelhante à mão invisível de Adam Smith, um
livre funcionamento da sociedade com a mínima intervenção possível do Estado. Já mais tarde, na transição do
século XIX para o XX, começa a questionar-se todos estes pressupostos liberais, propondo o Estado Social e
Democrático de Direito (um Estado com atuações sociais, que interviesse na sociedade e que organizasse e
limitasse o poder político). É, assim, a partir deste momento, que surge a importância dos princípios do Estado
de Direito Democrático (um princípio fundamental, que se desdobra noutros tantos).
A. Origens e desenvolvimentos.
6.2. Princípios estruturantes (paradigma português).
A. Vertente do Estado de Direito.

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a) Princípio da soberania: faculdade de os poderes do Estado se imporem coercivamente
a todos os governados e de os mesmos poderes poderem assumir a plenitude da representação dos interesses do
Estado no plano internacional os atributos medulares desses poderes (artigo 1º e nº1 do artigo 3º, alínea a) do
artigo 288º da CRP). Este princípio, que surge do princípio da independência nacional, tem uma dimensão
interna (imposição a todos os governados) e externa (imposição dos seus interesses no plano internacional). A
soberania é una e indivisível.
b) Princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º da CRP): um valor antropológico
(o homem biológico) e espiritual (o homem como ser único) inerente à condição de ser humano carente de
proteção jurídica, em termos de respeito pela sua autodeterminação individual, da abolição de vínculos que o
sujeitem a situações degradantes e da garantia prestacional de um mínimo de existência condigna. É um princípio
base, vago e com múltiplos significados e interpretações, contudo é-lhe reconhecida uma aceitação universal,
devido à Declaração Universal dos Direitos do Homem. Constitui um direito sobre direitos, na medida em que
é a base, o fim e o limite dos direitos fundamentais. Este princípio é pouco invocado para decisões de
inconstitucionalidade. Como esclarece JORGE REIS NOVAIS, é um dever ser jurídico que vincula a atuação do
Estado, a nível da atribuição de tarefas e da limitação da sua atividade. A pessoa é considerada como um fim em
si mesmo (KANT), sendo por isso indispensável para os direitos fundamentais. As decisões que se baseiem na
dignidade humana, pela complexidade que comportam, resultam sempre de uma ponderação entre
liberdade/autonomia e paternalismo.
c) Princípio da proteção constitucional reforçada dos direitos, liberdades e garantias.
Instituição de um regime jurídico especial de salvaguarda dos direitos civis e políticos de caráter fundamental, já
que estes envolvem a proteção mais reforçada da dignidade humana, da autodeterminação e da liberdade. A
proteção adicional deve-se ao facto de serem indispensáveis para o Estado de Direito, mas também à circunstância
da sua efetividade ganhar no plano jurídico, e não devido a condições financeiros ou políticas. (artigo 18º e artigos
278º a 283º da CRP).
d) Princípio da segurança jurídica (no princípio do Estado de Direito Democrático
enunciado no artigo 2º da CRP): é um princípio absolutamente fundamental para os cidadãos poderem garantir
a autonomia, segurança e organização dos seus planos de vida. Visa, assim, garantir a durabilidade, certeza e
coerência da ordem jurídica, de forma a permitir aos membros da sociedade, organizarem a sua vida individual,
conforme um mínimo exigível de bem-estar, calculando comportamento e consequências. Tem dimensão objetiva
e outra dimensão subjetiva e subdivide-se no princípio da confiança. A dimensão objetiva tem que ver com a
fórmula de garantia aos cidadãos de condições para organizarem a sua vida com um certo grau de previsibilidade
normativa relativamente ao comportamento e às consequências.
i) Princípio da confiança: desenvolvido pela jurisprudência alemã e adaptado
para o sistema português, o princípio da confiança é, por sua vez, a dita dimensão subjetiva do princípio da
segurança, aplicado aos direitos fundamentais, protegendo as expectativas das pessoas quanto à estabilidade do
sistema jurídico. Ao contrário do princípio da segurança, não está positivado na Constituição. O artigo 18º, º3,
restringe a retroatividade em leis de direitos, liberdades e garantias. É um princípio que, apesar de não positivado,
está implícito no artigo 2º da CRP (Estado de Direito Democrático -> Segurança Jurídica -> Confiança).
ii) Critérios/testes subjacentes ao princípio da confiança: o Estado ter
desenvolvido comportamentos que criem expectativas da sua continuidade; as expectativas criadas serem fundadas
e justificadas em boas razões; tem de haver uma situação de tutela da confiança (situação de confiança, imputação
da confiança, investimento da confiança e danos); os cidadãos terem feito planos de vida tendo em conta a
continuidade do comportamento; aplica-se o critério da proporcionalidade para averiguar o que terá mais peso (a
alteração do comportamento ou o respeito pela confiança dos cidadãos).
e) Princípio da igualdade: é um princípio que garante a justiça e que funciona como um
eixo dos direitos fundamentais. Em termos conceptuais, consiste na necessidade de, nas relações entre os poderes
públicos e as pessoas, se tratar igualmente o que é igual e desigualmente o que é desigual, na medida da diferença.
Caracteriza-se, ainda, por uma dimensão negativa, que proíbe a descriminação infundada, e por uma dimensão
positiva, que envolve o tratamento igual do que é igual e diferente do que é diferente, resultando por vezes na
necessidade de diferenciação e de compensação pela desigualdade.

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f) Princípio da constitucionalidade: consiste na subordinação do Estado e dos atos
jurídico-públicos à Constituição, sendo esta conformidade determinante para averiguar a validade (nº 3 do artigo
3º da CRP).
g) Princípio da legalidade: supõe a subordinação à lei dos atos promanados das funções
secundárias do Estado-Ordenamento (nº2 do artigo 3º, artigo 203º e nº2 do artigo 266º da CRP). É igualmente
importante reconhecer o conceito de legalidade qualificada das leis com valor reforçado, para situações que exijam
maiorias mais qualificadas (artigo 280º e 280º da CRP).
h) Princípio da proporcionalidade: é um principio fundamental, que visa proibir o
excesso e o arbítrio nas decisões do poder público, constituindo por isso uma componente da justiça. Subdivide-
se em três critérios/princípios: da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. O
principio da adequação consiste na mobilização de meios propícios para alcançar o fim desejado. O principio da
necessidade afirma-se no meio mais suave e mais eficiente para atingir o fim, ou seja, o que permite menos danos
com a maior eficiência. Por fim, o principio da proporcionalidade em sentido estrito é o mais vago, por forma a
permitir apurar um equilíbrio - os fins, as restrições e os meios para atingir os fins devem ser os mais adequados.
i) Princípio da independência nacional (artigo 2º, CRP): ao refletir a independência da
Nação portuguesa, afigura-se como o princípio de maior importância. Assim, afirma o Estado português como
soberano e como coletividade independente. É uma realidade em constante movimento, sendo, aliás, limitada
pelo próprio Estado Português, por ser membro da União Europeia e obrigado a limitar a sua soberania (aplicação
do direito europeu na ordem portuguesa - nº3 e 4 do artigo 8º da CRP).
j) Princípio de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva: consiste num
direito sobre direitos, desdobrando-se numa panóplia vasta de direitos, sendo frequentemente utilizado para se
declarar a inconstitucionalidade de normas (integra, não só os tribunais estaduais, mas também os tribunais
arbitrais).
i) Direitos emergentes do princípio: direito ao acesso a tribunais, direito ao
patrocínio judiciário, direito ao advogado, direito ao segredo da justiça, direito a decisão em prazo razoável, direito
a um processo equitativo, direito a procedimentos judiciais célebres e prioritários para garantir uma tutela efetiva
de direitos, liberdades e garantias.
B. Vertente política.
a) Princípio pluralista: respeito pela autodeterminação individual no plano civil, político
e social, nomeadamente com a garantia efetiva de uma diversidade de modos de vida, liberdade de expressão,
formação de diferentes correntes de opinião e de criação de opções políticas concorrentes ao exercício do poder
(artigo 2º, nº1 do artigo 25º, artigos 37º e seg., artigo 45º, artigo 46º, artigo 51º e artigo 114º da CRP).
b) Princípio da separação de poderes: necessidade de cada órgão constitucional do
Estado a quem é atribuído o núcleo essencial de uma atividade jurídico-pública se dever conter nos limites das
competências que lhe sejam constitucionalmente cometidas; critério reitor: o modelo de repartição de funções por
distintos órgãos deve observar na sua titularidade e exercício, exigências de desconcentração político-institucional
(inadmissibilidade de ao mesmo órgão ser atribuído o núcleo fundamental de duas funções distintas do Estado),
de essencialidade na distribuição de poderes (o núcleo do poder legislativo compete aos parlamentos, os governos são
os órgãos superiores na administração pública e os tribunais dispõem do exclusivo da função jurisdicional) e de
responsabilidade efetiva (necessidade de consagração de mecanismos de controlo do exercício do exercício de poder
cometido a um órgão, por parte de outros órgãos de poder, envolvendo sempre e necessariamente órgãos jurisdicional
independentes); o enunciado do princípio da separação com interdependência de poderes; (artigo 111º da CRP).
c) Princípio democrático: consiste numa ideia fundamental do Estado de Direito
Democrático, afirmando que os governados devem escolher os governantes mediante consentimento expresso em
eleições de sufrágio universal, livre, competitivo (com programas diversos), secreto, igual, periódico (possibilidade
de a oposição também chegar ao poder) e com equivalência de opções (igualdade dos candidatos). Exprime-se,
assim, através da democracia representativa (a escolha dos representantes) e referendária (situações em que o
referendo é mobilizado para aferir a posição do eleitorado), funcionando como um fundamento do regime político
vigente, que representa o valor da democracia (artigo 2º, alínea c) do artigo 9º e artigo 10º da CRP).
d) Princípio do Estado Unitário: a ideia fundamental é a unidade da ordem jurídica
interna, havendo logicamente uma única Constituição. Este princípio constitui um limite material da revisão
constitucional e reporta para as formas de estado - no caso português, Estado Unitário com Regionalização Parcial.

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e) Princípio do Estado Social/Socialidade: a ideia subjacente é a garantia da democracia
social, cultural e económica e que, consequentemente, apresenta uma panóplia de direitos e deveres sociais. A
regência entende que há alguns direitos sociais (respeitantes à saúde, educação e à segurança social), que
constituem limites à revisão constitucional, embora tal não esteja previsto no artigo 288º. A sua alteração causaria
uma transição constitucional, por serem identitários do Estado Português.

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DIREITO CONSTITUCIONAL II
PARTE I. A atividade legislativa como função primária do Estado-ordenamento.
CAPÍTULO I. Ordenamento jurídico e sistema normativo.
1. Lei, atividade legislativa e ordenamento jurídico.
2. Construções doutrinais sobre o conceito de ordenamento jurídico.
A. O institucionalismo.
B. As correntes suprapositivistas: jusnaturalismo, constitucionalismo moralmente reflexivo e
neoconstitucionalismo.
1. Jusnaturalismo: é uma das mais velhas construções e a mais primitiva, remontando à era jónica
(antiguidade grega), tendo vindo a sofrer alterações até à atualidade;
a) Contradição: legitimou, tanto monarquias absolutas, como declarações de direitos
fundamentais nas constituições liberais e como o Estado de direito democrático e social;
b) Axiologia: sustenta a existência de um direito natural, que fornece ao direito uma
ordem natural e intangível de valores; nas demais conceções é notória uma clara ligação aos valores de origem
divina;
c) Poder Constituinte e limites: o poder constituinte está limitado por valores
suprapositivos de origem divina, que prevalecem sobre o direito natural - há, assim, o primado da ordem natural;
d) Caracterização da Constituição: consiste numa ordem de valores fundamentais,
baseada na dignidade humana, que delimita o estatuto jurídico dos cidadãos e os seus direitos, formando uma
sociedade livre, justa e solidária;
e) Funções e fins da Constituição: a função da Constituição seria a de integrar a
diversidade pessoal, funcional e material numa ordem estadual;
f) Estrutura das Normas Constitucionais: as normas constitucionais seriam abertas, por
forma a integrar valores, princípios e manifestações da sociedade, permitindo que a Constituição crescesse e
evoluísse, através da interpretação, da concretização e da ponderação;
g) Interpretação Constitucional: há duas posições distintas - uma ligação entre o
jusnaturalismo e o institucionalismo e o positivismo, o que leva a aceitação do método interpretativo; uma ligação
com a teologia, em que os tribunais seriam os interpretes das normas;
2. Constitucionalismo moralmente reflexivo: definido como um jusnaturalismo laico, tendo
como pressupostos valores éticos e morais, ligados ao princípio da justiça e aos direitos fundamentais;
a) Axiologia Pré-Constitucional e Poder Constituinte: todo o processo de formação
constitucional é precondicionado por uma ordem de valores éticos, pelo que o poder constituinte não seria
soberano e ilimitado;
b) Noção de Constituição e funções: consistiria um elemento de limitação do poder;
consiste num conjunto de regras e princípios, contidos numa lei de hierarquia superior, que garante a separação
de poderes e a proteção dos direitos fundamentais; teria uma função integrativa, na medida em que integraria
valores, factos extrajurídicos, princípios e a diversidade pluralista da sociedade;
c) Estrutura normativa - ordem aberta de regras e princípios: mantém-se a
decomposição entre regras e princípios; é importante, para além disso, salientar o foco conferido à abertura das
normas como meio que facilitaria a evolução da Constituição e a sua adaptação à evolução;
d) Justiça Constitucional e Interpretação: refere-se, em termos gerais, a insuficiência do
método dogmático para a interpretação e a necessidade de incorporação de valores na atividade do intérprete
constitucional;
3. Neoconstitucionalismo: Ideias Fundamentais: centra-se no moralismo constitucional e no
dirigismo (na Constituição como dirigente);
a) Conceito de Constituição: seria, para além da organização jurídica do poder político,
uma Carta de Direitos Fundamentais, que definiria funções do Estado, acabando por assumir uma função
dirigente (relaciona-se, um pouco, com os ideais marxistas, da forte intervenção na vida privada);
b) Estrutura das normas: a constituição seria aberta a valores de ordem moral,
enunciados nos princípios da igualdade, da justiça e da dignidade da pessoa humana, sendo a próprio
Constituição limitada pelos mesmos valores supraconstitucionais. Defende, adicionalmente, que as normas se
decompõem em princípios e regras, prevalecendo os princípios (estes são parâmetros de interpretação das regras

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que, em caso de falta de sintonia, prevalecem os princípios); as normas relativas a direitos fundamentais teriam,
sempre, eficácia interna;
c) Interpretação da Constituição: exige-se uma sociedade de interpretes que se
comprometam a realizar as funções da Constituição; os neoconstitucionalistas relevam o papel dos tribunais
ordinários e a insuficiência do método de interpretação do defendido pelo positivismo, o que faria surgir um novo
método (há uma especial proeminência da adoção do método da ponderação);
C. O positivismo normativo e as suas mutações: a lógica básica do positivismo é a visão da Constituição
como direito decidido ou posto. Há, contudo, várias ramificações.
1. uns definem a Constituição como uma norma sobre produção de normas e cujo fundamento
se encontra numa norma imaterial, transcendente e jus-internacional (KELSEN); outros entendem a Constituição
como uma decisão política fundamental, criadora de uma ordem jurídica (SCHMITT);
2. uns configuram a Constituição como regra superior, imune a valores morais (KELSEN), outros
admitem que a Constituição pode incorporar valores morais (HART);
3. uns procuram um conceito neutro de Constituição, de norma sobre normação e de limitação
e organização do poder (CRISAFULLI e PALADIN); outros apenas admitem a ideia de Constituição quando haja
ligação à democracia (HABERMAS);
4. teoria dos sistemas: uns caracterizam o sistema constitucional como aberto a um conjunto de
procedimentos e a outros sistemas (HABERMAS) e outros como um sistema fechado, que liga o político ao
jurídico (LUHMANN);
a) O Poder Constituinte: para os positivistas, é uma realidade soberana, não sujeita a
limites que lhe sejam superiores e que deriva da legitimidade popular. Para KELSEN, a Constituição autolimita-
se, estando sujeita a uma norma fundamental hipotética de origem internacional, logo admite limites
heterónimos. Para HABERMAS (positivismo sociológico), a Constituição remete para o conceito de democracia
- caso não o faça, não é Constituição.
b) Conceito de Constituição: consiste numa norma destinada a reger a produção de
outras normas, a estabelecer regras de organização e limitação do poder e a assegurar a garantia dos direitos
fundamentais. Para SCHMITT, distingue-se Constituição de Lei Fundamental, sendo a primeira uma decisão
política e a segunda a norma que é produto dessa decisão; a regência rejeita e considera que a distinção existe
entre poder constituinte (decisão política) e Constituição/Lei Fundamental, a referida norma resultante da
Constituição;
c) Relação com a Moral: atualmente, é quase generalizada a aceitação da proposta de
HART; o decisor pode, por vontade própria, incorporar valores da ordem moral, nas normas constitucionais,
passando estes a dispor de força normativa. Contudo, a não incorporação não determina a invalidade das normas.
Para KELSEN (normativismo), rejeita-se a ligação à moral; não há uma conceção válida da moral, já que na
sociedade coexistem várias conceções, não podendo o direito agarrar-se a uma dessas conceções. Para PALADIN
(positivismo eclético), não deve haver recondução das normas constitucionais a valores, sendo estes fortemente
subjetivos; a Constituição é soberana, não podendo sujeitar-se a valores pré-existentes; admite-se, contudo, a
existência de princípios fundamentais, aos quais se permite a ligação a valores que possam ter relevância
constitucional;
d) Estrutura normativa: a larga maioria entende que as normas constitucionais assumem
caráter aberto e decompõem-se em princípios e regras. Para KELSEN, embora se aceite a existência de princípios,
desconsidera-se o peso dos mesmos; as normas, para o autor, são regras; aliás, apesar de reconhecer a existência
de princípios, sugere a não integração na Lei Fundamental, sob pena de plantar um elevado subjetivismo na
aplicação do direito. Para HART, as normas decompõem-se em regras primárias e regras secundárias, situando-se
nestas segundas a regra de reconhecimento (fonte da validade).
e) Interpretação Constitucional: há uma aceitação geral da proposta de Savigny, no que
respeita ao positivismo historicista. Entende-se, ainda assim, que a proposta é insuficiente. Reconhece-se que este
método não preenche os requisitos dos princípios constitucionais, pelo que se salienta o papel do juiz e da Justiça
Constitucional/Tribunal Constitucional. KELSEN e HART defendem que os juízes dispõem de espaço para,
recorrendo à criatividade, integrarem lacunas, sem nunca deturparem/se sobreporem à liberdade do legislador.
Para FORSTHOF, o autor adaptou o método dogmático à interpretação Constitucional, afirmando que este
deveria ser interpretada como as restantes normas. Para outros autores, distinguem-se de KELSEN e admitem a

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possibilidade de se recorrer a cânones e técnicas específicas de interpretação, mormente através da ponderação
(para resolução de conflitos entre princípios);
D. O decisionismo: imputada a CARL SCHMITT, a Constituição é tida como uma decisão soberana
fundamental;
a) Conceito de Constituição: é a decisão política fundamental, exprimindo a vontade política
que funda a ordem estatal. Distingue, deste conceito, o conceito de Lei Fundamental, que consiste na norma
jurídica, resultado da decisão política da Constituição. A Constituição, que resulta do poder constituinte,
corresponde à vontade do povo e não à norma.
b) Estrutura da Constituição: o preceituado constitucional é constituído por um conjunto de
formas normativas, que são instrumentos da vontade soberana (do povo);
c) Constituição e Moral: entende que os valores são formas de validade das condutas,
funcionando com o objetivo de as desqualificar; a sua transposição para o Direito já levanta algumas dúvidas, já
que seriam um fator de incerteza; há, contudo, valores que são transponíveis (dignidade humana, Deus, liberdade
e religião);
d) Garantia da Constituição: defende o conceito de Estado Judicial, é o poder judicial
independente que defende a Constituição e se autonomiza perante o Estado;
E. O positivismo sociológico da teoria dos sistemas: ligada ao positivismo sociológico, a conceção defende
um sistema jurídico geral aberto a realidades sociais. Do sistema social e dos envolventes existem exigências e
apoios ao sistema jurídico (inputs), que o sistema jurídico capta e reage em atos jurídicos que se projetam em
sistemas exteriores (outputs).
a) Oposição: alguns defendem o sistema jurídico como uma realidade fechada, que não se deixam
influenciar por realidades exteriores.
b) Relação entre Moral e Direito: são realidades diferentes, contudo a Moral pode entrar no
sistema jurídico, corrigindo a rigidez inerente ao positivismo normativo de Kelsen. Há valores que são
incorporados pela norma de referência (Constituição) - sendo o diálogo entre moral e direito feito através do
Direito Constitucional. Não há, contudo, ideia de invalidade correspondente à não conformidade (a Moral é uma
realidade variável).

3. Conceção adotada.
A. Um positivismo sistémico, existencialista e inclusivo.
B. O ordenamento jurídico: um sistema jurídico geral composto por um sistema de decisões jurídicas
e um sistema de decisores, articulados em torna de exigências de unidade, coerência, vocação de completude e
relação de pertença. A regência defende uma Constituição que é lei e que, neste sentido, tem hierarquia superior,
sendo uma norma que vincula outras normas e cujo respeito é salvaguardado pelos tribunais - garantes da unidade
e da coerência. Na sua vertente decisionista, entende que o ordenamento jurídico é composto por decisões (as
normas jurídicas e os atos) e por decisores (o poder constituinte, que é juridicamente ilimitado). Nesta medida, a
Constituição baseia-se numa vontade soberana do povo (nasce de um ato de vontade). Em termos conceptuais,
entende a Constituição como a lei suprema de um Estado, que estrutura a ordem jurídica, aprova o estatuto do
poder político e dispõe sobre a relação entre sociedade e poder.
1. Funções da Constituição: a Constituição terá várias funções: integradora da unidade política,
legitimadora do regime e do poder, por forma a garantir a aceitação do poder, organização e limitação do poder,
estruturante, na medida em que é norma sobre normação (avalia a validade e a estrutura do ordenamento),
garantística dos direitos fundamentais e conceptiva das tarefas do Estado, enumerando os fins e as funções do
Estado português.
2. Interpretação Constitucional: A Constituição é lei, pelo que deve ser interpretada como as
restantes normas constitucionais - segundo o método clássico, como defende a regência. Contudo, é certo que,
como reconhece o NOGUEIRA BRITO, há um conjunto de postulados que deve estar na base da interpretação
constitucional, que a difere da interpretação das restantes normas - unidade, identidade, adequação, efetividade
e supremacia.
A. Lição Alemã (Melo Alexandrino - Nova Hermenêutica): o método de interpretação
proposto une o método jurídico, a hermenêutica filosófica e a metódica normativo-estruturante, em sentido
estrito.

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i) Primícias (metódica normativo-estruturante): há uma distinção entre
enunciado (formulação textual) e norma (sentido ou significado da dita disposição); o conceito de norma
constitucional reconduz a uma medida de ordenação expressa e a uma constelação de dados reais; há uma
distinção entre programa normativo (dados linguísticos) e domínio normativo (dados reais), sendo que a
confluência de ambos permite a concretização normativa.
b) Insuficiência dos métodos clássicos: os métodos clássicos afiguram-se
insuficientes para resolver problemas de interpretação das normas constitucionais, pelo que o Tribunal
Constitucional tem apelado para a recorrência a outros critérios complementares - o que leva a disparidades entre
as regras e as decisões.
d) Hermenêutica filosófica: afigurou-se como a chave para solucionar os
problemas da tradicional interpretação, introduzindo o conceito de concretização como a base da interpretação.
Os pressupostos desta interpretação são, então: uma situação de pré-compreensão, em que o interprete só
compreende a norma no contexto histórico; o intérprete relaciona a norma com um problema concreto. Quanto
ao processo de concretização, há que seguir passos: definir os pontos de vista diretivos adequados ao caso; concluir
a premissas adequadas ao caso; definir qual o programa e qual o domínio normativo; recorrer a precedentes de
casos análogos; apurar os pontos de vista oferecidos pelo domínio normativo (realidades); confluir, por fim, o
ponto de vista que resulta do texto e do programa normativo com os pontos de vista da realidade, domínio
normativo.
i) Princípios da interpretação constitucional: permitem orientar e
delimitar os pontos de vista. São eles: princípio da unidade constitucional (as várias partes que formam a
constituição, formam uma unidade, que não deve ser descorada com a interpretação), princípio da concordância
prática (na solução de problemas, ambos os bens devem ser protegidos - impondo limites a ambos), princípio da
correção funcional (não deve, o resultado, ir contra as funções do Estado), princípio do efeito integrador (o
intérprete deve dar preferência a soluções que permitam a unidade política) e princípio da força normativa da
Constituição (deve dar-se preferência às soluções que permitam a maior efetividade das normas).
e) As três Etapas: a interpretação deverá ser realizada em três etapas distintas -
plano das condições de concretização (situação de pré-compreensão, em que a solução é pensada pela intérprete),
plano do procedimento (escolha dos pontos de vista apropriados, percorrendo as várias formas de interpretação)
e o plano dos princípios (em que concilia os vários pontos de vista com os princípios da interpretação).
C. Ordenamento e sistema normativo: o sistema jurídico geral está aberto a realidades sociais, de acordo
com a teoria dos sistemas. Do sistema social e dos envolventes existem exigências e apoios ao sistema jurídico
(inputs), que o sistema jurídico capta e reage em atos jurídicos que se projetam em sistemas exteriores (outputs).

CAPÍTULO II. Lei e ordenamento.


1. A lei no constitucionalismo liberal e no regime corporativo.
A. A lei no constitucionalismo liberal: os modelos liberais, no âmbito das Constituições de 1822, de
1838 e 1911 e da Carta Constitucional de 1826, contribuíram para o constitucionalismo com algumas noções
fundamentais de lei. Entre elas – unidade formal de lei (uma única forma de lei); ideia material de lei, como ato
geral e abstrato; a noção de forma, como superioridade em relação a outros atos legislativos e como imperatividade
perante os destinatários. SCHMITT determinava que a generalidade (pluralidade indeterminada de destinatários)
e a abstração (aplicação sucessível e repetível no tempo) eram qualidade determinantes da lei, derivando do
princípio da igualdade (fundamento do Estado Liberal).
B. A lei no regime corporativo: o regime instituído pela Constituição 1933 viria a introduzir, no entanto,
uma noção eclética de lei, ou seja, que conjugada critérios materiais e critérios formais. Definia-se, assim, a lei
consoante a generalidade e como disposição genérica proveniente dos órgãos estaduais competentes. Acresça-se,
como salienta Marcello Caetano, que força de lei seria uma potência unitária, como superioridade hierárquica e
relacional. Já Jorge Miranda, vem aludir a uma variabilidade desta superioridade hierárquica, que variava em
função do valor, das exigências de forma, da competência e da especialidade.

2. A aceção de lei na ordem jurídico-constitucional de 1976


A. A tensão entre a atividade legislativa e as demais funções do Estado - a reserva horizontal e vertical:

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a) A natureza totalista da reserva horizontal de lei: não existem limites à reserva horizontal de
lei, o que significa que a lei pode dispor sobre todas as matérias (não há limites materiais).
b) A existência de limites à reserva vertical de lei: existem limites à densidade reguladora de lei,
ou seja, existem limites à reserva vertical de lei. O Tribunal Constitucional reconhece limites à densidade
reguladora de lei no que toca à autonomia privada, ao núcleo essencial da função administrativa (em especial,
aos espaços reservados à administração autónoma) e à função administrativa previamente exercida.
B. Posicionamentos doutrinais sobre a aceção constitucional de lei - construções substancialistas,
ecléticas e formalistas: a Constituição dá critérios positivos e negativos que permitem definir a lei. A Doutrina
procura um conceito de ato legislativo, divergindo em várias posições.
a) Posições substancialistas: proposta a posição por PEREIRA COUTINHO, sugere-se que uma
lei ou um decreto-lei apenas deveriam ser tidos como constitucionalmente válidos se o conteúdo fosse geral e
abstrato, sendo que só excecionalmente se admitiria leis inovadores que não carecessem de um ato administrativo
para as executar. Já JORGE MIRANDA, numa perspectiva mais pragmática, propõe que tendencialmente, a lei
tem carácter geral e abstrato (lei em sentido material); contudo, admitir-se-ia excecionalmente lei individuais e
concretas, desde que se regessem por princípios de generalidade (ainda que, importa referir, se um ato
administrativo emanasse da Assembleia da República, este seria organicamente inconstitucional). Por outro lado,
PAULO OTERO e MANUEL AFONSO VAZ, ainda que reconhecendo a generalidade como característica
natural da lei, admitem a validade de atos administrativos sob a forma de lei, devendo este cumprir os requisitos
constitucionais de ato administrativo.
i) Críticas: há que atender ao que a própria Constituição estabelece, o que significa que,
exceto nas áreas em que a Constituição impõe generalidade e abstração, o conteúdo individual não é proibido, o
que dá liberdade ao legislador para escolher o conteúdo legal fora da reserva material de lei. Para além disso, a
aceitação desse critério implicaria a inconstitucionalidade de inúmeros atos legislativos particulares, o que
implicaria a violação do princípio da segurança (é menos penosa a aceitação de atos legislativos individuais e
concretos). Em último lugar, a capacidade expansiva de uma função primária permite que uma lei constitucional,
de conteúdo individual e exequível por si mesma, possa pré-ocupar o espaço de um ato administrativo (seria
apenas inconstitucional se violasse um limite material).
b) Posições ecléticas: vêm unir critérios formais e critérios materiais.
c) Posições formalistas: GOMES CANOTILHO e MARCELO REBELO DE SOUSA definem
lei pela sua forma e pelo seu conteúdo político - envolve um programa político e uma liberdade conformadora,
que leva à discricionariedade de escolhas e que diz respeito à produção de atos legislativos.
C. Posição adotada - aceção estrutural de lei verticalmente limitada pelos domínios reservados à
Administração.
a) Pré-ocupação legal de domínios da atividade administrativa: a supremacia da função
legislativa permite que a mesma pré-ocupe, em casos específicos, domínios da atividade legislativa (no campo
regulamentar e na emissão de atos administrativos). É certo que na Constituição não se reconhece uma reserva
geral da administração, apenas domínios particulares reservados à Administração. Assim, segundo o princípio
da separação e interdependência de poderes, não são inválidas leis com conteúdo individual e concreto, mas é
inadmissível a intromissão legal na administração direta, integrante do poder de direção do Governo.
b) Domínios circunscritos da reserva regulamentar e da reserva do ato administrativo: a lei
pode dispensar a sua concretização por normas administrativas, exceto quando haja uma reserva necessária de
regulamento (autarquias locais, regiões autónomas e certas autoridades administrativas independentes). Assim, de
acordo com o Tribunal Constitucional (Acórdão 214/2011 e 1/1997), há precisões - o Parlamento não pode
esvaziar a função de administração direta do Governo (autarquias locais, universidades e associações públicas),
não pode revogar um regulamento sem previamente revogar a norma legal que o habilitou e o Governo não pode
ser vinculado, segundo injunções e instruções da Assembleia. De acordo com a Constituição, há ainda domínios
reservados ao Executivo, materialmente identificados - execução orçamental (199º, d). Quanto aos domínios da
administração - direção, superintendência e tutela respetivamente (administração direta - ordens e injunções do
Governo; administração indireta - institutos públicos, fora da pessoa coletiva Estado, embora seguindo interesses
da mesma; administração autónoma, interesses particulares e fora da pessoa coletiva Estado) -, importa referir que
seria inadmissível a entrada da Assembleia da República em funções unicamente atribuídas ao Governo. Cabe à
Assembleia dirigir a administração indireta, o que leva a atos individuais e concretos, logo à emissão de atos

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administrativos. A AR não pode, contudo, dar instruções/injunções à administração pública, havendo assim risco
de intromissão no poder de direção do Governo.
i) Posição da regência: a imposição de revogação prévia da norma legal que habilita o
regulamento é duvidosa, na medida em que, por força das regras hierárquicas, nada impede que a lei revogue um
regulamento (sobretudo se for por juízo de mérito).
ii) Síntese: para a caracterização da lei, deve salientar-se aspetos permanentes, sendo eles
- o conteúdo político, já que há um critério político subjacente à deliberação da lei; a forma varia consoante o
órgão, podendo ser lei, decreto-lei ou decreto legislativo regional; deve dispor de força geral de lei, que exige
uma superioridade hierárquica sobre as demais normas de natureza não política e uma potência de valor.
D. Definição de lei: critério político de decisão produzido e revelado sob a forma de lei pelos órgãos
competentes para o exercício da função legislativa e que prevalece sobre os demais atos jurídico-públicos não
políticos de direito interno.

3. Considerações sobre a reserva de lei.


3.1. A reserva de lei em sentido amplo: um domínio material necessário de legalidade.
A. Prioridade de disciplina normativa: regulação exclusiva e primacial de determinadas matérias
por atos legislativos, com exclusão de operações de deslegalização.
B. Supremacia da lei: necessidade de atos de funções secundárias se fundarem na lei e a esta se
mostrarem conformes, sob pena de ilegalidade.
3.2. Reservas específicas de lei.
A. Quanto ao conteúdo: reserva de lei geral e abstrata (leis restritivas de direitos, liberdades e
garantias - artigo 18º, nº3), reserva de lei geral (relativamente às leis de bases, que definem diretrizes e princípios
a serem desenvolvidos por outras leis - artigo 112º, nº2) e reserva de lei de conteúdo não retroativo (em matéria
tributária, artigo 103º, nº3, em leis restritivas de direitos, liberdades e garantias, artigo 18º, nº3, e em matéria
penal, artigo 29º, nº2).
B. Quanto ao órgão: reserva absoluta (artigo 161º, b, f, g e h; artigo 164º) e relativa (artigo 165º,
onde há poder de livre autorização ao Governo) de competência legislativa da Assembleia de República, reserva
exclusiva do Governo (artigo 198º, nº2) e domínios reservados às regiões autónomas (artigo 227º, 1, l, n e p).
C. Quanto à natureza do ato legislativo: reserva da lei comum e reservas de lei com valor
reforçado (página 246).

4. A tipicidade da lei (o princípio da tipicidade da lei).


4.1 Conceito: a lei assume, exclusivamente, as formas constitucionalmente previstas, não pode criar outras
categorias legais e não pode ser interpretada, integrada, revogada, suspensa ou modificada por atos de outra
natureza, nos termos do artigo 112/5. Assim, o ato jurídico-publico é definido com base no seu conteúdo, na
força (artigo 112/2) e pela forma (artigo 112/1).
A. A problemática da deslegalização: por deslegalização entende-se toda a desgraduação de
preceitos legais – situações, assim, em que a lei confira a atos de natureza regulamentar (ou de hierarquia inferior)
o poder de a alterar, interpretar, suspender, integrar ou revogar. De acordo com o Professor Carlos Blanco de
Morais, a deslegalização só é admissível fora da reserva de lei: leis que respeitem a matérias enunciadas nos artigos
164º e 165º não podem admitir uma operação de deslegalização.
4.2 A força geral de lei: a lei tem o poder de revogar e condicionar outros atos não políticos sem que
possa ser por estes condicionada ou revogada.
4.3 Tipos formais específicos de leis ordinárias: à luz do artigo 112/1, existem três exclusivas formas de
lei – a lei, cuja competência de aprovação pertence à Assembleia da República; o decreto-lei, cuja competência de
aprovação pertence ao Governo; o decreto legislativo regional, cuja competência de aprovação pertence à
Assembleia Legislativa. Como se referiu, é uma enumeração taxativa, pelo que não é admissível a criação de outras
formas de lei.

5. Relações entre Categorias de Leis na Constituição da República Portuguesa


5.1. Generalidades: a relação entre leis pode gerar antinomias, as quais devem ser resolvidas recorrendo-
se a princípios estruturantes e a enunciados jurídicos de conteúdo ético e político. Antes da análise e da procura

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por soluções às referidas antinomias, é necessário avaliar as condições lógicas, teleológicas ou orgânico formais –
necessidade de se verificar a validade da norma.
A. Antinomias: são situações reais ou aparentes, de contradição total ou parcial entre o conteúdo
de atos legislativos quando os mesmos prosseguem fins idênticos e incidem sobre o mesmo domínio material,
espacial, pessoal e temporal. A necessidade de solução resulta do postulado da unidade do ordenamento jurídico.
a) Antinomias aparentes: quando podem ser solucionadas através de critérios lógicos.
b) Antinomias perfeitas/próprias: quando a colisão não contraria o disposto na CRP,
sendo o caso das revogações tácitas ou da prevalência da lei especial.
c) Antinomias imperfeitas ou impróprias: quando uma norma legal colide com outra,
violando uma norma de procedimento ou de competência.
d) Antinomias totais e parciais: totais quando envolvem, integralmente, o ato legislativo,
e parciais quando se restrinjam a parcelas normativas.
5.2 Princípios estruturantes das relações interlegislativas.
A. Critérios lógicos.
a) O princípio da cronologia: princípio da prevalência revogatória da lei nova sobre a lei
antiga (1º/1 e 2, CC).
i) Objetivos: promove a renovação do direito e o carácter inesgotável da função
legislativa. Impõe-se, assim, que o legislador possa legislar a todo o tempo e que a manifestação mais recente da
sua vontade se sobreponha à anterior. Este critério decorre do princípio democrático, na medida em que a
renovação política exige a execução de programas políticos de acordo com a maioria mais preferida, pelo que a
ideia subjacente será a de evitar que os mortos regulem a conduta dos vivos contra a vontade destes e que as
maiorias do passado não se imponham, assim, às maiorias do futuro.
ii) Pressupostos: sucessão cronológica de duas leis; existência de conteúdo
isomórfico (identidade de fim) e isométrico (identidade de âmbito de aplicação); existência de uma intenção
revogatória expressa na lei mais recente ou de antinomia entre lei, decorrendo uma revogação tácita.
iii) Aplicação: reveste caráter supletivo e resolve antinomias aparentes.
b) O princípio da especialidade: preferência aplicativa da lei especial sobre a lei geral,
salvo se houver intenção revogatória inequívoca da segunda em relação à primeira (7º/3, CC).
i) Objetivo: nas relações de cabimento (lei geral – lei especial), a lei geral é mais
ampla, menos densa e menos detalhada e a lei especial, mais pormenorizada, dispondo comandos de generalidade
e de abstração. Para além disso, a lei especial, por fixar um regime particular, adapta domínios e exprime uma
vontade particularizada, logo que deve prevalecer. Para além disso, é objetivo do Estado de Direito Democrático
a satisfação de exigências de grupos e situações distintas que carecem de tutela específica relativamente à tutela de
classes mais amplas.
ii) Pressupostos: é constituído por pressupostos positivos e pressupostos
negativos. Os positivos respeitam à isomorfia (identidade de fim), isometria (identidade de âmbito de aplicação)
e uma lógica de cabimento lei especial – lei geral. Os negativos respeitam à prevalência deste princípio, se
preenchidos os pressupostos positivos, sobre o princípio da cronologia.
iii) Aplicação: resolve as antinomias perfeitas, próprias e o subtipo total ou
parcial. No entanto, há a notar uma exceção à aplicação – prevalece a lei geral, à luz do art. 7/3, se tal for intenção
inequívoca do legislador.
B. Critérios teleológicos.
a) O princípio da hierarquia: respeita à prevalência de uma lei de grau superior, em
relação a uma lei de grau inferior, pressupondo, à luz dos ensinamentos de Kelsen, uma estrutura piramidal na
organização das normas.
i) Hierarquia formal: pressupõe uma aptidão de uma lei reconhecida pelo
ordenamento como detendo uma hierarquia superior, em poder revogar ou condicionar a validade de outra(s)
lei(s) de grau inferior, sem que o inverso possa ocorrer. Para justificar este fenómeno, ganha imperatividade a tese
da norma de reconhecimento, segundo a qual uma lei afigura-se superior devido ao reconhecimento expresso ou
implícito, por via de norma superior, precisada na Constituição.
1) Exceções: os estatutos político-administrativos de autonomia regional
são a única subcategoria legal elevada e suscetível de ocupar uma posição de norma legal ordinária de hierarquia

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formal superior às restantes (artigo 281º, nº1, alíneas c) e d)). Assim, a sua validade depende unicamente da
conformidade com a Constituição, não sendo possível conceder a sua ilegalidade por colisão com leis reforçadas.
ii) Hierarquia material: consiste na faculdade de certas leis de natureza
subordinante poderem vincular o conteúdo de outras leis que com elas devem coexistir numa posição
subordinada. Em regra, é uma hierarquia parcial, já que a supremacia se exprime no condicionamento por certas
leis-parâmetro do conteúdo – sendo o condicionamento relativo.
2) Consequências: também designado, o fenómeno, por
parametricidade material, leva a que a violação de uma lei subordinante por uma lei subordinada que com esta
deve coexistir gere invalidade da segunda com fundamento de inconstitucionalidade ou ilegalidade.
b) O princípio da competência: consiste na atribuição a um dado órgão, com eventual
exclusão das demais, do poder de aprovar atos legislativos em relação a uma matéria e, se for caso disso, a um
espaço territorial indeterminado e um tempo devido.
i) Objetivos: É um pressuposto do princípio da separação e interdependência de
poderes, na medida em que a edição da lei justifica-se com base na atribuição, a determinado órgão, da
competência respetiva (pode ocorrer que seja num espaço territorial circunscrito e num prazo específico). A
competência, por si só, reveste uma natureza mista – elementos formais, que são os órgãos de poder e as legendas
ou títulos legislativos das normas aprovadas, e elementos materiais, que respeitam à titularidade do poder, à
reserva material e ao âmbito territorial de incidência normativa).
ii) Atributos do princípio da hierarquia.
1) reserva da CRP na delimitação das competências legislativas (os
poderes legislativos entregues a cada órgão dependem de estatuição por parte da Lei Fundamental);
2) uma reserva de densificação total (é interdita a limitação a atos
incompletos, indeterminados ou imprecisos, que pressuponham a completude por outros órgãos);
3) taxatividade constitucional das delegações das competências
legislativas (a autorização a outros órgãos tem de estar prevista na CRP)
4) tempus regit actum (caso as normas de atribuição da competência
sofram revisão constitucional, esta não terá eficácia retroativa – imposição do princípio da segurança jurídica);
5) restrições ao regime de fixação de limites à atividade legislativa (o
exercício da função só pode ser limitado nos termos da CRP);
ii) Aplicação: prevalece sobre os critérios lógicos e sobre o critério da hierarquia,
podendo servir-se do critério do procedimento agravado.
c) O princípio do procedimento agravado: consiste num critério que fundamenta o
regime e a natureza das leis reforçadas pelo procedimento. O procedimento especial consiste num desvio em
relação a um procedimento que a CRP fixa como principal, para o efeito da produção de legislação comum – é
uma exigência formal que implica diretamente a limitação da vontade do legislador. Assim, a tramitação agravada
produz uma decisão política mais intensa do que a comum, exigindo-se uma maior dificuldade na sua obtenção
(maiorias qualificadas, por exemplo). Previsto, o regime, no artigo 112/3.
C. Relações entre critérios. O critério da competência é o princípio estruturante mais forte
(limitando a incidência dos demais). Imediatamente a seguir vem o critério hierárquico, que prevalece sobre os
critérios lógicos, completa o critério da competência e pode combinar-se com o critério do procedimento agravado.
O critério do procedimento agravado procura promover relações de separação e de lateralidade entre categorias
legais atribuídas à competência do mesmo órgão. Por fim, os critérios lógicos revestem natureza supletiva,
prevalecendo o princípio da especialidade sobre o critério da cronologia.
5.3. Qualidades operativas da lei: força de lei e parametricidade material.
A. Força de lei.
a) Força geral e força específica de lei: A força geral de lei está circunscrita às relações
verticais entre leis ordinárias e restantes atos normativos infralegais e reveste um caráter uniforme. Já a força
específica de lei, consiste numa manifestação de prevalência do ato legislativo, que se traduz numa potência
revogatória, alteradora ou suspensiva, e numa resistência à alteração, revogação e suspensão. Tem, assim, caráter
variável, dependendo do valor qualitativo das normas e da relação que entre elas se estabelece – ou seja, tensão é
resolvida casuisticamente

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b) Força ativa e força passiva no contexto da força específica de lei: dentro da força
específica de lei, há que distinguir a força ativa, que consiste na capacidade de uma lei poder revogar outros atos
legislativos, e a força passiva, como resistência, por uma lei, à revogação por outras leis.
A. Parametricidade material: consiste num atributo eventual, só se manifestando na presença de
leis materialmente superiores a outras. Resulta da capacidade, conferida pela constituição, de uma lei condicionar,
em termos de validade, o conteúdo de outra lei (sob pena de ilegalidade).
5.4. As categorias legais: leis ordinárias comuns e leis ordinárias reforçadas na ordem jurídica
portuguesa.
A. Noção.
a) Leis comuns: ato legislativo cuja formação corresponde às regras gerais de produção
ordinária fixadas na Constituição e nas disposições regimentais e cujas normas não disponham de capacidade de
vincular outros atos legislativos.
b) Leis com valor reforçado: consistem em normas legais que, nos termos da
Constituição, se devam fazer respeitar, passiva ou ativamente, por outros atos legislativos, sob pena de ilegalidade
qualificada.
B. Introdução histórico-jurídica.
a) Objetivo: as leis agravadas pelo procedimento, através de maiorias qualificadas,
pretendem valorizar a posição das minorias políticas e, em especial, das oposições. Favorecem, deste modo, o
bloqueio por minorias intensas, na alteração do direito. Assim, valoriza-se o papel dos parceiros minoritários das
coligações e a codecisão entre a banca maioritária e as bancadas oposicionistas. Acentua-se, nestes termos, a
componente parlamentar do sistema de governo, reduzindo o peso individual dos partidos mais representativos e
do Governo, no que respeita à condução do processo legislativo.
C. Génese e tipologia das leis reforçadas.
a) Leis reforçadas pelo procedimento ou leis reforçadas em sentido próprio:
i) Noção: as leis reforçadas pelo procedimento, em sentido próprio, devem o seu
valor normativo a elementos constitutivos (pertencentes à fase constitutiva - procedimento agravado). Assim,
manifestam os seus efeitos através da rigidez (vertente passiva), ou seja, resistem à alteração por outros atos.
ii) Categorias: leis orgânicas e leis aprovadas por maioria de dois terços.
iii) Leis orgânicas: desde a revisão de 1997, as leis orgânicas abarcam várias
matérias – artigo 166º, nº2 e artigo 164º e 255º da CRP): matérias político-institucionais de âmbito nacional (leis
orgânicas relativas à formação da vontade política geral, à segurança nacional e à garantia jurisdicional da
Constituição), disciplina de direitos fundamentais de natureza política, maiorias relativas à autonomia territorial
(domínios de natureza eleitoral, financeira e organizativa). São da reserva absoluta da competência da Assembleia
da República, afirmando-se como reserva de ato.
1) Requisitos formais: é exigido um título formal específico e numeração
privativa (exigências formais no título, lei orgânica, e na numeração).
2) Aprovação: o procedimento agravado e permanente leva a que
disponha de força jurídica passiva – é exigida aprovação, em votação final global, por maioria absoluta dos
deputados em efetividade de funções (artigo 168º, nº5). Na votação na especialidade, em regra, é exigida apenas a
maioria simples, podendo haver exceções.
3) Controlo de mérito: é exigido um processo especial – no caso do PR
vetar politicamente o decreto, a superação do mesmo processa-se mediante confirmação pela maioria de dois
terços dos presentes, desde que superior a maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções (117 ou
mais). Quanto à fiscalização preventiva, há que destacar a abertura do início do processo ao Primeiro-Ministro e
a um quinto dos deputados em Assembleia – devendo o PR, aguardar 8 dias até promulgar.
iv) Leis e disposições aprovadas por maioria de dois terços: O regime está
previsto no artigo 168º, nº6. Assim, há casos em que são as leis, na integra, que carecem de aprovação por maioria
de dois terços (alíneas a) e c) do artigo 168º, nº6). Há, ainda, casos de disposições de leis, nos restantes artigos do
168º, em que só essas disposições carecem de uma aprovação mais agravada.
1) Leis aprovadas por maioria de 2/3: a Constituição, apesar da
referência ao procedimento agravado, não esclarece sobre a fase de aprovação que requer essa maioria qualificada.
A regência entende que essa maioria se aplicará na votação na generalidade, na especialidade e na votação final

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global – apresentando argumentos: a Constituição não isenta qualquer fase dessa maioria qualificada; a
importância da votação na especialidade, como decisiva na génese da lei, não admite o seu afastamento; caso fosse
dispensada uma fase, seria a da votação na generalidade, já que se trata de uma votação que permite apenas admitir
os diplomas a aprovação.
2) Disposições aprovadas por maioria de 2/3: A Constituição não
explicita em que fase da aprovação deve ser tida a aprovação qualificada. A regência entende que esta votação
deve ser exigida na fase da especialidade, apenas no que respeita às normas no artigo 168º, nº6 previstas – as
restantes seriam votadas por maioria simples.
v) A problemática do veto qualificado: há leis aprovadas integralmente pela
maioria de dois terços que não se encontram sujeitas ao veto qualificado – no caso das leis orgânicas aprovadas
em votação final global por maioria absoluta dos deputados efetivos, o artigo 136º exige uma maioria parlamentar
mais onerosa (2/3) para a superação do voto. No entanto, no caso das leis aprovadas por dois terços, a
Constituição não as inclui no nº3, do artigo 136º (não se requer, assim, uma maioria superior para a superação
do veto). A regência entende que, nestes casos, estas leis orgânicas devem ser integradas no regime agravado do
136º/3 da CRP.
b) Leis reforçadas pela parametricidade material ou leis reforçadas em sentido impróprio:
i) Noção: são reforçadas pela parametricidade material, sendo esse atributo
substancial e relativo – depende do termo de comparação -, e podem ser emitidas por diversos órgãos. Por norma,
são preceitos incompletos (ou que carecem de desenvolvimento), exprimindo uma hierarquia pelo lado positivo,
ou seja, vinculando o conteúdo de outros atos.
ii) Categorias: leis de bases, leis de autorização legislativa, leis quadro.
iii) Leis de Bases: em termos genéricos, são leis que contém princípios e diretrizes
gerais, traçando as bases gerais, ou seja, opções políticas e fundamentais de determinado regime jurídico. São
peculiares porque carecem de desenvolvimento por legislação que a elas se encontra subordinada – têm, assim,
caráter incompleto, supremacia hierárquica material e uma função de indirizzo político (normas orientadoras).
1) Competência para aprovação: a Assembleia da República, o Governo
e as Assembleias Legislativas Regionais têm competência para a aprovação de leis de base. Grande parte das leis
de base, contudo, encontram-se na competência reservada da Assembleia (absoluta e relativa).
2) Competência para o desenvolvimento: A doutrina diverge neste
ponto – há uma parte que entende que existe uma reserva de desenvolvimento do Governo e outra que recusa a
respetiva reserva de desenvolvimento do Governo. Em matéria de reserva, há que ter em conta que o
desenvolvimento deve seguir a forma de ato legislativo. Note-se que, no caso de não existir qualquer base geral
sobre a respetiva matéria, os órgãos com competência para o desenvolvimento não dispõem de competência para
a emissão de legislação detalhada sobre a mesma matéria (iria contra o espírito do artigo 112º/2) – as leis de base
seriam atos-condição, para emissão de legislação de desenvolvimento. O Tribunal Constitucional chegou a
entender que seria possível, se fosse também possível extrair do ordenamento diretrizes gerais equivalentes às bases
em falta.

Reserva De Desenvolvimento Matéria Da Reserva Matéria Da Reserva Matéria Concorrencial


Do Governo Absoluta (164) Relativa (165) (161/1/C)
C. Blanco De Morais (1) Sim Sim Não
Paulo Otero Sim Sim Sim
Jorge Miranda (2) Não Não Sim
Tribunal Constitucional (3) Não Não Não

§ 1 - CBM: entende, o professor, que se deve conceder um sentido útil a plural matérias, constante do 161/1/c),
e ao 198/1/b (que vem repetir competência que poderia ser retirada da alínea anterior), pelo que da conjugação
de ambos, deve retirar-se a reserva de desenvolvimento do Governo. Ainda, a prática constitucional e a herança
da Constituição de 1933, que apontam nesse sentido.
§ 2 - JoMi: em matéria concorrencial, a Assembleia cede a sua competência de desenvolvimento (vai contra o
princípio que não permite a renúncia a competências constitucionalmente atribuídas).
§ 3 - TC: do artigo 161/1/c retira-se a competência genérica do Parlamento para, inclusivamente, desenvolver
leis de base. É relevante o acórdão 1/97.

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3) A questão da invocação: de acordo com a posição do Professor Carlos
Blanco de Morais, em matéria da reserva, os decretos-lei de desenvolvimento devem submeter-se à lei de bases que
visam desenvolver e invocar o mesmo desenvolvimento, sob pena de inconstitucionalidade formal. Em matéria
concorrencial, parece decorrer do princípio da competência que, apenas quando seja invocado o desenvolvimento
das bases, se exige conformidades das leis de desenvolvimento com as mesmas. Entende-se que a distinção entre
leis de base e leis de desenvolvimento, em matéria concorrencial, é uma divisão artificial e uma escolha do
legislador – pelo que o legislador posterior poderá optar entre sujeitar-se às mesmas bases ou legislar
inovatoriamente sobre a matéria em causa (inclusive, derrogando parcialmente ou revogando as leis de base). No
caso da doutrina que defende a possibilidade de a Assembleia da República desenvolver leis de base, entende-se
que, de acordo com o princípio da competência (no tocante à emissão de leis de base), às leis parlamentares de
desenvolvimento não exige a invocação do desenvolvimento (tal não
é, igualmente, exigido pela Constituição), podendo ainda legislar em desconformidade com as respetivas bases.
4) Efeitos da alteração da lei de bases na legislação complementar: a
alteração das leis de base ou a respetiva revogação não determina a caducidade das normas da legislação
complementar, por respeito ao princípio da segurança jurídica. Assim, exige-se a sua alteração, de forma a assegurar
a sua conformidade com os parâmetros da lei de bases.
iv) Leis de Autorização Legislativa: são atos legislativos que permitem a
delegação de poderes, operando em matérias da reserva relativa da Assembleia da República. Consistem, assim,
na delegação da Assembleia, da sua reserva relativa, ao Governo e às Assembleias Legislativas Regionais, quando
se trata de matéria do âmbito regional. Permite, assim, que um órgão normalmente competente autorize um órgão
eventualmente competente e a exercer competência legislativa, no que toca à matéria autorizada. AR pode
condicionar o exercício de poderes do órgão eventualmente competente e pode, a todo o tempo, chamar a si os
poderes constitucionais autorizados. Em regra, as autorizações legislativas são feitas a pedido do órgão
eventualmente competente, contudo nada impede que seja um ato livre da Assembleia.
1) Atos legislativos autorizados: não podem ser emitidos antes da
entrada em vigor da autorização legislativa e devem subordinar-se aos limites fixados pelo Parlamento na mesma
autorização legislativa.
2) Parametricidade material: a lei de autorização legislativa delimita a
matéria dos decretos-lei autorizados, devendo definir o objeto, o sentido, a extensão e a duração da autorização.
A não observância do sentido, leva ao vício da ilegalidade (há violação dos pressupostos/limites impostos pela
norma paramétrica). A não observância do objeto e da extensão conduz a uma inconstitucionalidade orgânica,
uma vez que se dá o exercício de atividade legislativa para lá da competência atribuída ao órgão. Não se admitem,
desta forma, autorizações legislativas em branco ou incompletas.
a) Objeto: matérias sobre as quais a autorização incide.
b) Extensão: delimitação do universo dessas matérias.
c) Sentido: delimitação dos fins da autorização.
d) Duração: período de uma legislatura (4 anos).
3) Utilização: a autorização só pode ser utilizada uma única vez, no
entanto, não se prejudica a sua utilização parcial – para posterior utilização, a fim de esgotar a matéria autorizada.
O que não se permite, na verdade, é a competência para legislar sobre determinada matéria autorização duas vezes
– uma vez utilizada a autorização, esta não pode ser posteriormente utilizada.
4) Caducidade: a autorização caduca com a sua utilização, com o termo
do prazo estipulado, com o termo da legislatura da AR (4 anos), com a dissolução da AR, com a demissão do
Governo ou com o termo da legislatura/demissão das Assembleias Legislativas Regionais. Quanto à revogação
expressa da lei de autorização, em nada se prejudica a validade dos diplomas autorizados já aprovados. A revogação
da lei de autorização pode ainda ser tácita, no caso de a lei de autorização aprovar um diploma sobre a matéria
que autorizou. No caso de lei de lei de autorização inconstitucional, do mesmo vício sofrerão os decretos
autorizados.
v) Leis Quadro: são leis paramétricas em termos materiais, podendo estabelecer
vínculos procedimentais e materiais em relação às normas legais que vinculam. Assim, são variáveis – podem
assimilar-se às leis de base ou definir vínculos procedimentais. Podem, no entanto, assumir um caráter mais
pormenorizado que as leis de base.

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1) Competência para aprovação: a doutrina diverge. Uma parte,
entende que há reserva parlamentar na emissão de leis de enquadramento. A regência, por outro lado, entende
que a Assembleia da República não dispõe da reserva de edição de leis-quadro, uma vez que no artigo 161/1/c e
no 198/1/a), reforçados pela prática (praxis) legislativa, cabem diversos atos legislativos, inclusiva as leis de
enquadramento – o que contraria a hipótese de existência de reserva parlamentar na edição de leis de
enquadramento. Assim, admite-se leis de enquadramento na reserva absoluta da AR e na esfera concorrencial,
entre o Governo e a AR.
2) Competência para desenvolvimento: quanto à matéria concorrencial,
aplica-se o regime estabelecido e defendido pela regência no tocante ao desenvolvimento das leis de base. Quer o
governo, quer a AR, dispõem de competência para o desenvolvimento das leis-quadro. O regime das leis de base
seria também aplicável às leis-quadro, em matéria da reserva.
3) Efeitos da alteração/revogação da lei: entende-se que há uma
obrigação de modificação imposta aos diplomas dela dependentes, sob pena de ilegalidade superveniente. Há
situações, no entanto, que não exigem essa alteração – é o caso da lei de Orçamento de Estado e da Lei-Quadro
das Reprivatizações. No entanto, se for aprovado uma lei de orçamento retificativo, já se exige a sua conformidade
com as alterações na lei de enquadramento orçamental. (página 375).
c) Leis duplamente reforçadas.
i) Noção: são leis reforçadas, tanto pelo conteúdo (parametricidade material),
como pelo procedimento (rigidez).
ii) Categorias: Estatutos Político-Administrativos, Lei do Orçamento, Lei das
Grandes Opções do Plano e Lei Quadro das Reprivatizações.
iii) Estatutos político administrativos: são reforçadas pelo procedimento e pela
parametricidade material. Funcionam, assim, como uma moldura jurídica, operando a título subconstitucional
na região autónoma, exercendo um papel complementar em relação à Constituição. São as leis mais reforçadas
das leis reforçadas, resistindo à revogação por quaisquer outras. São as mais reforçadas das leis reforçadas.
1) Conteúdo: as matérias que constam do estatuto, previstas
constitucionalmente, são denominadas pelo Tribunal Constitucional como reserva de estatuto. A Constituição
define um conteúdo necessário do estatuto, sendo a ausência de quaisquer matérias determinante para a
ocorrência de uma inconstitucionalidade por omissão, ocorrendo um défice estatutário. As matérias, em termos
de competência legislativa, não previstas nos estatutos não podem, consequentemente, ser matérias de legislação
regional.
2) Cavaleiros Estatutários: nem sempre há precisões no que toca às
matérias contidas nos estatutos, o que causa ambiguidade e, consequentemente, a presença de disciplinas
normativas nos estatutos que, em certos casos, não integram matéria estatutária – designam-se por cavaleiros
estatutários (passam a dispor de um valor reforçado superior ao correspondente à sua natureza). Há duas soluções
possíveis, ambas capazes de pôr em causa a segurança jurídica: como não faz parte do estatuto pode ser livremente
revogada, ao contrário do próprio estatuto; os estatutos são inconstitucionais. Pode ainda ocorrer que esses
cavaleiros estatutários sejam de lei reforçada, ou seja, sobre matérias integradas na reserva de outras leis reforçadas.
Neste caso, não podendo o estatuto ser ilegal, ele enfermará de inconstitucionalidade formal (regula matéria
reservada à lei orgânica, com um processo de formação distinto).
3) Rigidez e a Hierarquia: os estatutos dispõem das qualidades de
rigidez e da hierarquia. Com a hierarquia pressupõe-se que a lei estatutária possa vincular, materialmente, de
acordo com o objeto estatutário, normas do ordenamento (nomeadamente, das Assembleias Legislativas
Regionais). Com a rigidez garantem o seu valor hierárquico, ou seja, impedem uma hipotética revogação da lei
estatutária por leis parlamentares.
4) Iniciativa e aprovação: Apesar de ser uma lei aprovada pela
Assembleia da República, a iniciativa compete exclusivamente às assembleias legislativas regionais, sendo este o
procedimento agravado principal. Consequentemente, no caso de a Assembleia Legislativa Regional pretender
introduzir alterações na lei estatutária – a quando da sua aprovação – há que ter em conta um parecer obrigatório
(cuja vinculatividade pode ser discutida) das assembleias legislativas regionais. Quanto à fase de aprovação, na AR,
há que notar um procedimento agravado nas matérias que digam respeito à competência legislativa (168º/6/f)),
ou seja, a votação na especialidade nestas matérias carece de aprovação por maioria de 2/3 dos presentes (desde

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que superior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções). As restantes votações carecem de
maioria simples.
iv) Lei de Orçamento de Estado: previsto no artigo 105º da CRP, contém um
núcleo mais restrito que as leis das grandes opções do plano. Contém, assim, diretrizes materiais relativas a
despesas e receitas para o ano económico em curso, vinculando materialmente normas que lhes dizem respeito.
1) Autorizações Legislativas: no que toca à matéria fiscal, as autorizações
legislativas só caducam no final do ano económico a que respeitam – de acordo com a estabilidade e a anualidade
orçamental.
2) Procedimento Agravado: o agravamento da lei do orçamento de
Estado reside na reserva de iniciativa do Governo, disposta no artigo 161º, alínea g). A rigidez de que dispõe,
assim, a LOE tem por objetivo evitar a intervenção do poder parlamentar, que pretendesse interferir na fase de
execução. Assim: a lei do orçamento de Estado não pode ser alterada por leis resultantes do Parlamento; a
Assembleia não pode alterar a proposta de Lei do Orçamento de Estado; a existência de uma norma travão, que
proíbe iniciativas de grupos parlamentares/deputados/cidadãos, que visem uma alteração negativa do orçamento
(aumentar despesas e diminuir receitas). Na fase de aprovação originária, contudo, a AR pode propor alterações
a lei do orçamento ou, até mesmo, recusá-la.
3) Lei de Enquadramento Orçamental: a lei de orçamento de Estado
encontra-se vinculada, materialmente, à Lei de Enquadramento Orçamental (106º/1) – que é reforçada, por ser
pressuposto necessário da Lei de Orçamento.
v) Lei das Grandes Opções do Plano: é uma lei que remonta à feitura da
Constituição, mas que dispõe de pouca importância. A bom rigor, deveria ser realizada anteriormente ao
Orçamento de Estado e este em conformidade com a mesma (seria um pressuposto da lei do orçamento). No
entanto, uma vez que já não se aplicam os planos económicos, mas mantém a Lei das Grandes Opções do Plano,
o que ocorre, na praxis, é diferente: o orçamento de Estado é elaborado, sendo a elaboração desta lei posterior e
em conformidade com a LOE.
1) Agravamento: o agravamento principal reside na iniciativa ser vedada
ao Governo. A votação, por sua vez, carece apenas de maioria simples.
vi) Lei Quadro das Reprivatizações: constitui uma lei de grandes reformas
económicas, sendo de natureza reforçada pelo procedimento e pela parametricidade material. Têm em vista o
término do princípio da irreversibilidade das nacionalizações efetuadas após 1976. No seu conteúdo, os
parâmetros são vinculados pela Constituição (de acordo com o artigo 293º). Atua como lei quadro, ditando os
princípios e as diretrizes orientadoras das diversas reprivatizações.
1) Agravamento: a aprovação é agravada e semelhante às leis orgânicas.
Nesta medida, é exigida maioria absoluta.
vii) Classes híbridas de Leis Orgânicas: algumas leis orgânicas possuem um
estatuto duplamente reforçado (pela parametricidade material e pelo procedimento, como lei orgânica pura).
Assim, aliada à rigidez, que deriva do procedimento agravado, assumem igualmente natureza de leis de base ou de
enquadramento, que lhes confere hierarquia material. Assim, como leis orgânicas, resistem à revogação, e como
leis pressuposto, vinculam materialmente o conteúdo de atos legislativos que com elas devam coexistir.

6. A atividade legislativa dos órgãos constitucionais da República: competência, procedimento e Operatividade


dos atos legislativos.
6.1. A atividade legislativa da Assembleia da República.
A. O primado da Assembleia da República no exercício da atividade legislativa.
a) Sentido de primado: o núcleo essencial da atividade legislativa radica na Assembleia
da República na qualidade de instituição parlamentar.
b) Manifestações desse primado (fundamentos):
i) A competência legislativa genérica, que lhe permite legislar, horizontalmente,
sobre todas as matérias não cometidas a outros órgãos.
ii) Uma extensa reserva absoluta e relativa de competência, sendo a reserva
exclusiva do Governo e das Assembleias Legislativas Regionais muito restrita.
iii) As leis reforçadas pelo procedimento inserem-se na reserva absoluta.

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iv) As leis de hierarquia material superior inserem-se na sua esfera de poder.
v) Pode autorizar livremente o Governo e os órgãos legislativos regionais, como
órgãos eventualmente competentes, a exercerem competências legislativas no âmbito da reserva relativa de
competência; pode, a qualquer momento, cessar livremente a autorização.
vi) Pode controlar o exercício da função legislativa, através do instituto da
apreciação parlamentar.
vii) O veto presidencial, no caso de leis da Assembleia da República é suspensivo,
podendo ser confirmado.
B. Tipologia das competências legislativas parlamentares.
a) Competência legislativa genérica: prevista no artigo 161, alínea c), consiste na
faculdade do órgão de soberania poder legislar sobre todas as matérias, exceto as que competem exclusivamente
ao Governo. Há que ter em consideração uma esfera concorrencial paralela – no âmbito regional autonómico,
apesar das competências da AR em legislar para o mesmo, tem preferência aplicativa, à luz do princípio da
especialidade, as leis das regiões autonómicas.
b) Competência legislativa reservada: há que considerar a reserva absoluta e a reserva
relativa. A reserva absoluta supõe a faculdade exclusiva da Assembleia da República legislar sobre um conjunto
de matérias, com exclusão total dos demais órgãos legislativos – são as matérias de maior essencialidade política,
não sendo substituível a representatividade do povo (artigo 164º e alíneas b), d), e), f), g) e h) do artigo 161º da
CRP). A reserva relativa integra matérias sobre as quais o Parlamento pode legislar a todo o tempo,
independentemente de, a pedido do Governo ou das assembleias legislativas regionais, conceder a estes órgãos
uma autorização legislativa (artigo 165º, nº2) – esta autorização pode ser revertida a todo o tempo. O Governo,
devido à relação fiduciária com o Parlamento, poderá legislar sobre todas as matérias; as assembleias legislativas
regionais estão limitadas pelo âmbito regional, a matérias que lhes digam diretamente respeito.
c) A densidade reguladora como variável das leis que incidem sobre as diversas classes
de reserva de competência legislativa parlamentar.
i) Densidade reguladora como nível de concretização ou pormenorização
normativa inerente ao conteúdo de uma lei. É possível discernir quatro níveis de reserva parlamentar. Nos
primeiros, as leis da AR devem esgotar todo o conteúdo inovatório da matéria em causa, enquanto que nos
segundos, deve restringir-se a normas parâmetro (domínio reservado de caráter primário) que se entende a normas
que irão concretizar estes parâmetros, ou por eles serão vinculados (domínio sub-primário).
1) Nível integral de uma reserva de densificação total operada por leis
da Assembleia da República. Diz respeito às matérias da reserva absoluta da Assembleia da República, devendo,
assim, toda a dimensão inovadora de uma disciplina normativa que recai sobre uma matéria ter que ser consumida
pela lei do Parlamento.
2) Nível relativo de uma reserva parlamentar de densificação total.
Situação em que a lei parlamentar ou o ato legislativo governamental ou regional autorizados devem consumir ou
esgotar toda a dimensão inovadora de uma matéria – insere-se, assim, na reserva relativa da Assembleia.
3) Nível de generalidade na regulação de matérias de reserva
parlamentar. A reserva parlamentar restringe-se, neste ponto, a normas de conteúdo geral – regimes gerais -,
podendo o Parlamento ou outros órgãos legislativos, como o Governo, adotar disciplinas igualmente inovadoras,
de natureza especial, contidas em normas mais densas e pormenorizadas.
4) Nível básico ou de enquadramento da reserva parlamentar. Consiste
na disciplina menos densa da legislação parlamentar e que pressupõe que as normas tenham um conteúdo
incompleto e um caráter vinculante de outras leis complementares mais densas. Pressupõe, devido ao caráter
incompleto, que sejam concretizadas por outras normas – respeitam, assim, às leis de bases.
ii) A consumpção normativa do âmbito integral ou total da reserva
parlamentar pela lei. No domínio de âmbito integral ou total, a Assembleia da República deve esgotar todo o
conteúdo inovatório da matéria em causa, não podendo, assim, emitir normas de caráter incompleto, passíveis de
serem desenvolvidas por atos legislativos de outros órgãos – decorre, esta necessidade, do postulado da separação
com interdependência de poderes.
iii) A restrição da lei parlamentar a um regime geral. A lei parlamentar só
poderá assumir um caráter de regime geral, nos casos previstos na Constituição, nos artigos 164º e 165º. Esta

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circunstância decorre da necessidade de, nos casos em que se trata de matérias sem referência a regime geral ou
leis de bases, toda a matéria carecer de ser inovatoriamente desenvolvida pela Assembleia (ou pelo órgão
eventualmente competente).
iv) A circunscrição da lei a um domínio de bases e as práticas impróprias neste
domínio. A Assembleia apenas pode proceder à criação de leis de bases nos casos constitucionalmente previstos -
necessidade que decorre da circunstância de as leis de bases poderem ser desenvolvidas por outros órgãos. Ora,
nos casos referidos como regimes gerais, não é possível a criação de leis de bases, por se tratarem os regimes gerais
de normas gerais e não de normas incompletas (como é o caso das leis de bases). Nos casos em que nada se refere
– direitos, liberdades e garantias, por exemplo – toda a matéria deverá ser desenvolvida pela AR, não podendo assumir
forma de leis de bases – se tal acontecesse, o Governo ou as ALR poderiam passar a dispor de competência legislativa
que vai para lá da atribuída pela CRP.
v) O domínio eventual de primariedade delegante em sede de autorização
legislativa.
C. O procedimento legislativo parlamentar.
a) Noção de procedimento legislativo: sucessão encadeada de atos/fases tidos como
necessários para a produção e revelação de uma lei, por parte de um órgão competente para o efeito.
b) Faseologia: o procedimento legislativo é composto por cinco fases distintas e
encadeadas ordenadamente – iniciativa, competência, instrução, controlo de mérito e integração da eficácia.
i) Iniciativa legislativa: consiste no momento de iniciação do processo legislativo
parlamenta. Importa referir que a apresentação de uma iniciativa não pressupõe a sua aprovação ou a discussão –
o Presidente da Assembleia da República pode rejeitar o projeto ou a proposta, caso esta seja inconstitucional ou
padeça de vícios de forma. É certo, ainda, que a iniciativa também pressupõe competência de iniciativa
(pressuposto de um ato legislativo). Por norma, a iniciativa deriva da competência para legislar, podendo, contudo,
alargar-se a mais intervenientes ou, até mesmo, restringir-se. A iniciativa pode ser interna, sob a forma de projeto-
lei, partindo de deputados ou de grupos parlamentares (artigo 167º), ou externa/heterónoma, sob a forma de
proposta de lei, partindo de órgãos diversos da Assembleia da República ou um conjunto de cidadãos – órgãos
competentes para iniciativa são o Governo, as assembleias legislativas das regiões autónomas em matérias que lhe
diga respeito e grupos de cidadãos eleitores (segundo a Lei 17/2003, 35000).
1) Reserva de iniciativa: A iniciativa pode assumir carácter reservado
quando se tratar da Lei das grandes opções de planos e da Lei do Orçamento de Estado (reservadas ao Governo
– alínea 161/g)), dos estatutos político-administrativos das regiões autónomas e respetivas alterações (reservadas
às assembleias legislativas regionais) e das leis orgânicas relativas à eleição de deputados às assembleias legislativas
regiões (reservada às assembleias legislativas regionais). Esta reserva de iniciativa permite atribuir às leis em causa
uma maior rigidez, constituindo este um pressuposto para a atribuição de valor reforçado.
2) Limites à iniciativa: há que considerar a norma-travão, apresentada
no artigo 167/2, como proibição a deputados, assembleias legislativas regionais e grupos de cidadãos eleitores de
apresentarem projetos ou propostas que envolvam, no ano económico em curso, um aumento da despesa ou uma
diminuição das receitas (pode ser uma diminuição da despesa e um aumento das receitas, assim como pode ser
uma proposta para o ano económico seguinte). Ainda, as assembleias legislativas regionais só podem apresentam
propostas que digam respeito às mesmas regiões. Por fim, há que considerar as reservas de iniciativa e as limitações
à iniciativa dos cidadãos (lei 17/2003).
3) Vicissitudes da iniciativa: os projetos/propostas definitivamente
rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa (período anual de funcionamento da AR –
legislatura corresponde a 4 sessões). Caso os atos não tenham sido votados na sessão legislativa em que são
apresentados, não caducam, logo não carecem de renovação, salvo termo da legislatura (alteração da composição
da AR assim o exige). A caducidade ocorre com a demissão ou dissolução do órgão proponente, salvo as iniciativas
que já tenham sido votadas na especialidade.
ii) Instrução: nesta segunda fase, o objetivo é recolher dados, parecer e outros
elementos cognitivos que permitam aos decisores apreciar a oportunidade e o conteúdo da iniciativa com mais
rigor. Pode envolver um exame interno e audições externas a entidades públicas e/ou privadas.
iii) A fase constitutiva: a aprovação da lei exprime a sua fase constitutiva.
Consiste, assim, numa manifestação de um ato de vontade normativa pelo Parlamento, do qual resulta a expressão

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do consentimento na formação de um ato legislativo materialmente perfeito ou completo, logo apto para produzir
alterações jurídicas no ordenamento (depois da sua promulgação e publicação). Há assim, três fases aprovatórias.
1) Discussão e votação na generalidade: a discussão na generalidade,
realizada no Plenário, consiste num debate sobre os princípios e o sistema do ato de iniciativa – compreende a
apresentação da iniciativa pelo autor(es), pedidos de intervenção de cada grupo parlamentar, de deputados não
inscritos e de deputados únicos representantes de um partido. Entende-se que a votação favorável apenas certifica
a proposta/projeto para a votação na especialidade. Regra geral, rege-se pela maioria simples (artigo 116º, nº3),
contudo há exceções (patentes no artigo 169/6).
2) Discussão e votação na especialidade: numa segunda fase, ocorre uma
votação que percorre cada artigo, número e alínea de um projeto/proposta de lei. De acordo com o artigo 169/3,
o órgão onde decorre essa votação é o Plenário – pode decorrer em comissão especializada, caso tal seja decidido.
Contudo, será certo de decorre da prática constitucional que a votação na especialidade é feita em comissão
especializada, podendo ocorrer assim um costume contra constitutionem – acórdão 63/91.
a) Reserva de plenário: há uma panóplia de atos que exige a
votação na especialidade em sessão plenária. Entre eles, explicitamente, cabe referir as matérias previstas no artigo
168º/4. Já implicitamente, cabe referir do artigo 168º/5, as leis respeitantes ao 168º/6, alíneas a) e c) e as normas
legais que respeitam às matérias previstas na alínea b), d), e) e f) do 168º/6.
3) Votação final global: seguida da votação da especialidade, a
Assembleia procede à votação final global. Esta conclui o processo de aprovação da lei, exprimindo uma
manifestação de vontade definitiva com a forma do decreto – esta é enviado para o Presidente da República, para
promulgação, como forma de ganhar existência jurídica como lei, para posteriormente ser referendado
ministerialmente. A falta de qualquer fase da votação determina a inexistência jurídica. A votação final global
não é procedida de discussão, contudo cada grupo parlamentar pode fazer uma declaração de voto oral.
a) Redação final: a comissão competente (ou aquela que o
Presidente da Assembleia nomear, no caso de mais de uma), procede a uma redação final dos atos aprovados, não
podendo alterar o pensamento legislativo, apenas aperfeiçoar o estilo e a sistematização do texto (não pode ser
minimamente mudado o pensamento legislativo).
iv) A fase de controlo de mérito: a quarta fase inclui a promulgação e o veto –
poderes do Presidente da República, enunciados no artigo 136. Reporta-se, assim, ao momento que a Assembleia
da República remete, sob a forma de decreto, o ato legislativo ao Presidente da República, para promulgação. O
chefe de Estado deverá exercer um controlo político sobre o ato produzido, no quadro do sistema dos freios e
contrapesos – o poder é partilhado por vários órgãos, fazendo do ato legislativo um ato complexo. O Presidente
aprecia o conteúdo do diploma e formula um juízo positivo ou negativo.
1) Controlo político - Controlo preventivo da constitucionalidade:
após receber qualquer diploma, sob a forma de decreto, o Presidente da República dispõe do prazo de 20 dias
(artigo 136/1), para promulgar ou vetar. No caso de dúvidas relativas à conformidade do ato com a Constituição,
o Presidente deve, no prazo de 8 dias, pedir a fiscalização preventiva da Constitucionalidade (artigo 287/1 e 3).
Caso o Tribunal se pronuncie pela inconstitucionalidade, o Presidente deve vetar o decreto (veto vinculado por
inconstitucionalidade), sendo o diploma devolvido ao Parlamento (artigo 279). Caso o Tribunal se pronuncie pela
não inconstitucionalidade, o Presidente terá o prazo de 20 dias para promulgar ou vetar politicamente. Deduz-se,
assim, que o controlo da inconstitucionalidade é anterior ao controlo político – no plano do controlo de mérito,
foi já descartada a hipótese do controlo preventivo. Caso o Presidente vete politicamente, o diploma é devolvido
à Assembleia, caracterizado pela inexistência jurídica, que se o confirmar, força o Presidente a confirmar.
2) Promulgação: a promulgação significa que, no balanço entre as
valorações positivas e negativos do ato, feitas pelo PR, as primeiras superam as segundas. Pode ocorrer uma
promulgação simples ou uma promulgação com reservas (o chefe de Estado acompanha a promulgação com uma
mensagem, onde exprime preocupações sobre o ato e os aspetos mais delicados – procura tornar claro o
distanciamento do PR em relação à lei). No caso da segunda, ocorre quando o precisa aceita respeitar uma
vontade parlamentar e os aspetos positivos superam em pouco os aspetos negativos. A regência entende a
necessidade deste comportamento do Chefe de Estado, visto que o presidente não pode vetar todos os diplomas,
ficando-se assim pelo alerta de disfunções. A promulgação, tendo em conta a situação, pode ser livre (136/1),
obrigatória (leis de revisão constitucional, decretos confirmados e leis conforme a atos referendados no sentido

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positivo) ou vedada (fiscalização preventiva do decreto sujeito a promulgação como lei orgânica – não pode
promulgar nos primeiros oito dias).
3) Veto: em caso de veto, que para a Assembleia assume natureza
suspensiva, o ato legislativo é reapreciado pelo parlamento, podendo este assumir três condutas. Pode optar pela
desistência do diploma, entendendo que a maioria não é suficiente para a confirmação ou que se prefere não
afrontar o PR (a iniciativa não pode ser renovada na mesma sessão legislativa). Pode, ainda, confirmar o diploma,
superando o veto – a regra geral, é por maioria dos deputados, veto simples (136/2), e a regra especial é uma
maioria agravada de dois terços, superior a 116, veto qualificado (ver exceções, 136/3). Pode, ainda, reformular
o diploma, introduzindo-lhe alterações. Por exceção: nos atos legislativos sujeitos a votação final global por
maioria de dois terços, entende-se que, por identidade de razão com as leis orgânicas, esses decretos devem ser
confirmados por idêntica maioria parlamentar, a qual é igual à sua aprovação originária.
4) Referenda ministerial: consiste no controlo político do Governo
sobre os atos do presidente da República e que é proveniente da Constituição de 1933. Em termos práticos, trata-
se de uma assinatura por parte do Primeiro-Ministro e dos ministros competentes em razão da matéria, dos atos
políticos do Presidente da República (artigo 140/1). A falta de referenda determina a existência jurídica. Segundo
a regência, a ocorrência de recusa faria sentido em situações extremas, como promulgação de leis inconstitucionais
de excecional gravidade ou de outros atos presidenciais inválidos ou ilegítimos que pusessem em perigo a ordem
constitucional democrática. No entanto, a falta de referenda não é prática constitucional no nosso sistema e
implicaria um conflito político de alta intensidade entre Governo (elo mais fraco), de um lado, e Presidente e
Parlamento, do outro – podendo estar em causa o regular funcionamento das instituições democráticas (195/2).
v) A fase integrativa de eficácia: trata a publicação e a data de entrada em vigor.
No artigo 119º/1, alínea c), é determinada a obrigatoriedade de publicação das leis promulgadas no Diário da
República – a falta da mesma determina a ineficácia jurídica. A vigência nunca poderá começar no dia da sua
publicação e, se nada for determinado, a entrada em vigor ocorre quando esgotado o vacatio legis (5 dias).
D. O instituto da apreciação parlamentar de atos legislativos de outros órgãos constitucionais
(artigo 169º): anteriormente à revisão de 1997, correspondia à figura da ratificação. Atualmente, encontra-se
previsto no artigo 169º da CRP.
a) Natureza e características gerais: em termos gerais, caracteriza-se por ser uma
manifestação do primado da Assembleia, sobre os restantes órgãos constitucionais, no que respeita ao exercício
da função legislativa. Assim, a AR dispõe da faculdade de apreciar a grande maioria dos decretos-leis e dos decretos
legislativos regionais autorizados.
b) Atos sujeitos a apreciação: estão, assim, submetidos a apreciação parlamentar, todos
os decretos-leis (exceto os emitidos dentro da competência exclusiva do Governo – 198), e os decretos legislativos
regionais que seja objeto de autorização legislativa da AR.
c) Pressupostos, iniciativas e admissão: a apreciação parlamentar poderá ser iniciada por
dez deputados (mínimo), para efeitos de cessação de vigência ou de alteração, num prazo de 30 dias a contar do
dia da publicação do ato legislativo em causa (devem ser descontados os períodos de suspensão do funcionamento
da AR).
d) Votação: a votação na generalidade incide sobre a cessação da vigência e a votação da
especialidade incide sobre as propostas de alteração, que poderão ser votadas na votação final global.
e) Caducidade: o processo de apreciação parlamentar deverá ser considerado caduco, se
não ocorrer pronúncia sobre a cessação da vigência ou se a lei, com as respetivas propostas de emenda, não haja
sido votada até ao termo da sessão legislativa em curso;
f) Modalidades de apreciação parlamentar: as alterações introduzidas nos diplomas, no
contexto de apreciação, devem revestir forma de lei. Ainda, a AR pode aprovar uma resolução que suspenda, total
ou parcialmente, a vigência do DL até à publicação da lei que o altere ou até à rejeição de todas as propostas de
alteração.
6.2. Introdução à atividade legislativa do Governo (artigo 198, CRP).
A. Introdução histórica ao Governo como legislador: o Governo como legislador, ou seja, a
extensão da função legislativa ao Governo, surge em resposta ao intervencionismo do Estado Social – com maior
força, no período posterior à I Guerra Mundial. A situação dá-se, nestes moldes, em Itália e em Espanha. Portugal,
não foi diferente: a monarquia constitucional viria já a integrar decretos-lei com força de lei, no entanto, estas

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figuras não dispunham, ainda, de representação nas três Constituições; já em 1911, na CRP, limitou a função
legislativa do Governo, vindo, mais tarde, a incluir a admitir autorizações legislativas; já na Constituição de 1933,
com um sistema de chanceler, dá-se uma concentração de poderes no Executivo, o que permitiu a normalidade
dos decretos-leis; até 1945, admitiu-se, igualmente, autorizações legislativas e legislação em caso de urgência.
Progressivamente, foi-se caminhado para a realidade que hoje conhecemos: um Governo que dispõe de várias
atribuições legislativas, que assumem a forma tradicional de decretos-leis. Assim sendo, atualmente, o Governo
não é só titular da função administrativa, é também titular da função legislativa.
B. Tipologia das competências legislativas do Governo.
a) Competências concorrenciais alternadas: no que toca às concorrenciais, corresponde
ao 198/1/a) e ao 161/1/c): ou seja, o Governo poderá legislar, em concorrência com a Assembleia, sobre todas
as matérias não reservadas ao mesmo órgão constitucional. A relação é de concorrência paralela, ou seja, no caso
de colisão, o conflito é resolvido de acordo com o princípio da cronologia.
b) Competências exclusivas: De acordo com o 198/2, cabe ao Governo legislar sobre a
sua própria organização e funcionamento. Acresce que os decretos-lei, quando incluídos nestas matérias, não
podem ser submetidos a apreciação parlamentar nem, quando vetados, podem ser transformados em propostas
de lei da AR.
c) Competências complementares: a competência complementar encontra-se prevista no
artigo 198º/1/c e a), que consiste na faculdade de desenvolver leis de bases, regimes gerais e leis de
enquadramento. Quanto aos decretos leis de base, em matéria concorrencial, não lhes está obrigada a vinculação,
se não invocarem o desenvolvimento.
d) Competências delegadas: respeita à reserva relativa da AR, artigo 165º, conforme
sejam concedidas autorizações legislativas (que sigam as regras estabelecidas).
C. Sinopse sobre o procedimento legislativo governamental.
a) Iniciativa: a Iniciativa cabe ao membro do Governo, nomeadamente ao Ministro
competente em razão da matéria (podem, assim, existir iniciativas conjuntas). Quando haja um processo de
legislação interno, os Ministros formalizam propostas de decretos-lei, que submetem à aprovação do Conselho de
Ministros. Quando o propósito seja a apresentação de uma proposta de lei ao Parlamento, os Ministros enviam a
proposta para o Conselho de Ministro, que a aprova e submete à AR.
b) Instrução: aa instrução participam várias entidades – o Secretário de Estado da
Presidência do Conselho, que realiza uma apreciação preliminar do ato legislativo; os gabinetes
ministeriais/conselho de ministros, por onde circula a proposta, a qual deve ser apreciada; uma Reunião de
Secretários de Estado, como forma de controlo de mérito; podem participar, em termos de audição, as regiões
autónomas, quando seja matéria quem lhes diga respeito.
c) Aprovação: o Conselho de Ministros é o órgão que aprova os Decretos-Leis e as
propostas que seguem para a aprovação e discussão na Assembleia. Como o Conselho de Ministros é um órgão
colegial, aplica-se o disposto no artigo 116º. As deliberações podem, então, ser feitas por consenso ou por votação.
Após a votação, o decreto é assinado pelo Primeira Ministro e pelos Ministros competentes, em razão da matéria
(201º).
d) Controlo de Mérito: quanto à promulgação e ao veto, o decreto aprovado deve seguir
para o Presidente da República para aprovação. Este, no prazo de 40 dias, pode vetar por motivos políticos, pedir
o controlo da constitucionalidade e promulga-lo. No caso do veto, este terá caráter absoluto – logo, não pode ser
superado. Se não corresponder a matéria da exclusiva competência do Governo, poderá ser formulada uma
proposta de lei, enviada à Assembleia, com vista à sua aprovação, por forma a passar por cima do veto. A
promulgação carece, igualmente, de referenda ministerial (artigo 140º).
e) Fase de integração da eficácia: nos mesmos moldes do procedimento parlamentar.
6.3. A atividade legislativa das regiões autónomas.
A. Introdução à autonomia legislativa regional: como Estado unitário que compreende
regionalização político-administrativa parcial, a República Portuguesa é composta pelo continente e por duas
regiões autónomas, Açores e Madeira (artigo 6º/1). Assim sendo, estas regiões são autónomas, a nível político e
administrativos, com órgãos de governo próprio e estatutos que orientam essa autonomia. Note-se que, no
entanto, se mantém um só poder constituinte e uma só Constituição, no entanto, as regiões são orientadas por
leis estatutárias, que devem ser conformes à Lei Fundamental. Os estatutos são leis da Assembleia da República,

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da exclusiva iniciativa das regiões, o que reforça a unidade do Estado. Ainda, é de notar algumas figuras que
também configuram esta unidade: o Representante da República, com poderes vicariantes do Presidente da
República, e o facto das coletividades autonómicas não disporem de representação própria na câmara parlamentar.
B. Critérios estruturantes de repartição da função legislativa entre os órgãos de soberania e as
assembleias legislativas das regiões: é problema jurídico geral a natureza plurilegislativa dos Estados, dado que,
em certos momentos, se torna impossível contornar a sobreposição, quer das leis do poder central, quer das leis
dos poderes periféricos. Assim, há que determinar o poder legislativo competente para regular certa matéria e, no
caso de concorrência, qual das leis tem preferência aplicativa. Existem, assim, diversos modelos de repartição.
i) Modelo de lista única estadual: associado ao federalismo, consiste numa
enumeração constitucional das competências do poder central, ficando, por exclusão, as matérias não enumeradas
entregues às coletividades autónomas – EUA e Canadá.
ii) Modelo de lista autonómica: consiste na enumeração das competências
regionais na Constituição, sendo as não enumeradas atribuídas aos órgãos de soberania.
iii) Modelo de lista plural: consiste na enumeração das matérias da competência
do poder central e dos poderes autónomos, definindo as matérias concorrenciais e cláusulas com determinações
residuais de competências.
a) Sinopse histórica.
i) Primeiro Período (1976/1989) – o caráter embrionário do sistema: neste
primeiro período, em termos de repartição horizontal, o sistema assentou num modelo em lista plural, com
algumas semelhanças com a Constituição Espanhola. Consagrava, ainda, um acervo de competência mínimas das
regiões e uma remissão para os estatutos, no tocante às matérias concorrências. Em termos de repartição vertical,
operavam uma clausula móvel de interesse regional e as leis gerais da república. Com a revisão de 1982, a definição
das leis da república veio a ser aperfeiçoada – operavam na esfera concorrencial paralela. Em termos gerais, o
modelo tinha uma clara matriz centralista, já que se passava por um período de experimentação do sistema de
autonomia daquelas regiões.
1) Problemas: falta de precisão na enumeração de matérias, falta de
concretização do conceito interesse regional, falta de precisão nos critérios de aplicação (quer das leis da república,
quer dos decretos legislativos regionais) e insuficiência na identificação das leis gerais da república.
ii) Segundo Período (1989/1997) – um alargamento das competências
legislativas regionais com reduzida repercussão: a revisão de 1989 não veio a responder aos problemas sentidos
anteriormente. No entanto, viria a acrescentar uma lista regional de matérias atribuídas aos poderes autonómicos
– autorizações legislativas e desenvolvimento de bases. Contudo, permaneciam muitas imprecisões quanto às
autorizações legislativas.
iii) Terceiro período (1997/2004) – uma devolução desequilibrada e ilógica de
poderes: com a revisão de 1997, viriam a ser acrescentados poderes; ao mesmo tempo, retirava-se outros poderes.
Procurou-se, ainda, dar resposta aos problemas enunciados anteriormente, no entanto, apenas viria a criar mais
incertezas jurídicas. Assim: o sistema de listas sofreu alterações (no âmbito do acréscimo e da perda de poderes).
Quanto ao modelo de lista plural, mantém-se uma lista de competências estaduais e outra de competências
regionais e subsiste a lista estatutária, no entanto, vazia de significado. Acrescentou-se uma faculdade das regiões
poderem legislar sobre matérias que não estivessem previstas nas listas. Procurou igualmente definir-se a noção de
interesse regional, contudo, sem sucesso. Por último, sofrem também alterações as leis gerais da república: no entanto,
tal esclarecimento só veio a acrescentar mais dúvidas ao legislador na definição do conceito, na aplicação do
mesmo e no que seriam os princípios fundamentais (os quais a doutrina procurou, sem sucesso, exemplificar).
iv) Quarto período (2004): implosão do modelo anterior e alargamento das
competências legislativas regionais: em 2004, dá-se uma revisão mais profunda no modelo que regulava estas
relações entre o poder central e o periférico, em resposta à incerteza e coerência que se instaurara no período
anterior. Assim: elimina-se a lista de competências de poderes legislativos regionais da CRP, remetendo-se apenas
para os estatutos; uma definição mais clara de âmbito regional, agora entendida como um critério geográfico e
espacial; uma diminuição da prevalência da lei estadual, em relação à lei regional;
b) Critérios de repartição horizontal.
i) Conceito: a atribuição dos poderes legislativos do Estado e das regiões por listas
de matérias.

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ii) Um sistema atípico de listagem plural: duas listas constitucionais e uma
estatutária. Manteve-se, com a revisão de 2004, o modelo de lista plural, conservando-se dias costas
constitucionais de poderes (uma estadual e outra regional) e uma lista subconstitucional de poderes regionais
(revelando-se um retorno parcial ao modelo da Constituição de 1976).
iii) A taxatividade da lista estatutária: a taxatividade impõe a autonomia
legislativa apenas incide sobre as matérias enunciadas nos estatutos, não previstas constitucionalmente aos órgãos
de soberania (reservam-se, apenas, no direito de exercer a competência legislativa de acordo com os estatutos).
Seria, em conformidade, inconstitucional uma norma estatutária que habilitasse a região a legislar sobre matérias
indeterminadas não previstas no estatuto, já que se trataria de uma norma aditiva de competência e não de
delimitação de matérias e seria uma situação de desvio de poder.
iv) A recomposição dos limites às competências regionais: foram introduzidos
conceitos indeterminados como o limite do âmbito regional e o da reserva de competência explícita e implícita
dos órgãos de soberania (numa variável móvel). Por âmbito regional, entender-se-ia, anteriormente um critério de
interesses (matérias de interesse regional); com a revisão, passou a compor-se por um critério geográfico, ou seja,
matérias que dissessem apenas respeito ao âmbito geográfico da região. Quanto à reserva de competência móvel,
introduzida pelo TC, permitiria, casuisticamente, integrar ou não integrar matérias na reserva de competência dos
órgãos de soberania.
c) Noção e critérios de repartição vertical: a repartição vertical de competências diz
respeito à definição dos tipos de competências legislativas regionais e seus limites específicos. Neste ponto, cabe
referir a importância do conceito de âmbito regional, como critério geográfico, na definição dos limites verticais.
d) Competências legislativas regionais.
i) A competência comum: trata-se de competências que têm por objeto o maior
número de matérias, encontrando-se previsto no artigo 227º/1/a), em conjugação com o 112/4 e o 228/1. Há,
assim, que ter em conta certos critérios: matérias enumeradas nos estatutos, do âmbito regional e não reservadas
aos órgãos de soberania. No caso concorrencial, a aplicação deverá seguir um critério preferencial – a aplicação
subsidiária do direito dos órgãos de soberania terá lugar quando não haja regulação pelas ALRs, quando haja
revogação não substitutiva de diplomas regionais, quando se verifiquem lacunas em leis regionais.
1) Concorrência legislativa: a relação concorrencial que se estabelece
entre órgãos legislativos do Estado e as regiões é paralela (em domínios concorrenciais, no caso de duas leis sobre
a mesma matéria, estas não se podem alterar ou revogar). Difere, assim, da relação entre Governo e Parlamento,
cuja concorrência é alternada, pelo que ato legislativo posterior revoga ato legislativo anterior. Dada a natureza
divergente, nos termos dos decretos legislativos regionais de desenvolvimento, a invocação e a conformidade são
sempre exigidas.
ii) A competência delegada: através das autorizações legislativas, admitidas a
partir de 2004 às regiões autónomas, estas vieram a poder aceder a determinadas matérias da reserva relativa – no
entanto, note-se que muitas matérias não se encontram disponíveis às regiões (página 554, listagem das respetivas
matérias – 2º Edição). No que toca às bases previstas na competência relativa da AR, note-se que não é impossível
a sua delegação à região autónoma; todavia, de acordo com a regência, tal prática seria defeituosa e propiciadora
de problemas jurídicos, pelo que se trata de uma solução que fica entregue ao bom sendo do legislador parlamentar
na concessão e recusa de autorizações legislativas.
1) Exigências formais: as propostas e as leis de autorização devem ser
acompanhadas do anteprojeto do decreto legislativo regional a autorizar, no entanto, a regência entende que o
legislador regional não se encontra vinculado a editar uma normação idêntica ao respetivo anteprojeto, desde que
o novo diploma se encontre dentro dos limites da autorização. Aplica-se, se resto, às autorizações legislativas e aos
decretos legislativos autorizados as regras gerais das autorizações legislativas.
iii) A competência complementar: às regiões é igualmente atribuída a faculdade
de desenvolver e concretizar o conteúdo de leis de bases e de leis de enquadramento – neste desenvolvimento não,
então, limites.
iv) A competência mínima ou residual: trata-se de competência mínimas
previstas no artigo 227º/1 (em algumas alíneas, como por exemplo – i), p), s), h), v)).

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v) A competência para transposição de diretivas comunitárias: o artigo 112/8,
com a revisão de 2004, passou a permitir aos DLR a transposição de diretivas, em matérias fora da reserva dos
órgãos de soberania (competência já reconhecida às regiões autónomas italianas e espanholas).
D. Síntese sobre as relações jurídicas imediatas entre os atos legislativas do Estado e das Regiões
autónomas.
a) Critério reitor: o critério geral é o da aplicação preferencial, ou seja, é aplicada
preferencialmente a lei regional e subsidiariamente a lei regional. Não há, deste modo, revogação entre as leis
estaduais e as leis regionais: garante-se que, no caso de falta de lei regional sobre a respetiva matéria, deve ser
aplicada subsidiariamente a lei estadual.
b) Solução de antinomias no plano jurisdicional: os tribunais comuns dispõem de
competências para solucionar antinomias entre as leis estaduais e as leis regionais. Neste sentido, em termos de
inconstitucionalidade e ilegalidade, podem julgar várias situações.
1) Leis de autorização: a violação do objeto e da extensão (inconstitucionalidade
orgânica) e da duração (inconstitucionalidade material).
2) Reserva de estatuto: invasão da norma legal do Estado ou de decreto-
legislativo regional na reserva de estatuto (inconstitucionalidade formal).
3) Âmbito regional: a violação do limite do âmbito regional por decreto
legislativo regional (inconstitucionalidade orgânica).
4) Violação de atos-pressupostos: quando o decreto legislativo regional viole as
bases gerais, leis de enquadramento, regimes gerais ou leis de valor reforçado da AR.
6) Violação dos estatutos: leis dos órgãos de soberania que ofendam direito regionais
compreendidos nos estatutos ou decretos legislativos regionais que violem os estatutos.
c) Solução de antinomias pelo operador administrativo: a administração pública, dado
que não pode solucionar antinomias perfeitas (no âmbito da ilegalidade e da inconstitucionalidade), deve, à luz
do princípio da especialidade, dar aplicação prevalecente aos diplomas regionais sobre os diplomas estaduais,
quando digam respeito a matérias não compreendidas na reserva dos órgãos de soberania.

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PARTE II. A Fiscalização da Constitucionalidade como Garantia Fundamental da Constitucional.
CAPÍTULO I. A Constitucionalidade dos Atos Jurídico-Públicos.
1. Noção de Inconstitucionalidade: desconformidade dos atos jurídico-públicos com o parâmetro constitucional
a que se encontram submetidos.

2. Tipologia Sumária da Inconstitucionalidade.


A. Inconstitucionalidade por ação e por omissão.
a) Inconstitucionalidade por ação: este tipo de inconstitucionalidade envolve a prática de um ato
que ofenda a Constituição.
b) Inconstitucionalidade por omissão: este tipo de inconstitucionalidade pressupõe que um
órgão de abstenha de editar um ato cuja prática seja exigida pela Constituição.
B. Inconstitucionalidade material, formal e orgânica.
a) Inconstitucionalidade material: este tipo de inconstitucionalidade pressupõe a colisão de um
ato jurídico-público com o conteúdo dos princípios e normas constitucionais. Lembrando que o ato jurídico-
público tem dois elementos – a forma e o conteúdo -, este vício afeta o conteúdo.
b) Inconstitucionalidade formal: este tipo de inconstitucionalidade pressupõe a violação das
regras constitucionais que respeitam à produção e à revelação de atos jurídico-públicos, tratando-se assim da
violação de normas de procedimento constitucionalmente previstas para o ato em causa. Lembrando que o ato
jurídico-público tem dois elementos – a forma e o conteúdo -, este vício afeta a forma.
c) Inconstitucionalidade orgânica: este tipo de inconstitucionalidade pressupõe uma violação
das normas constitucionais de competência normativa. Deriva, este, do pressuposto da competência do ato – só
é válido, se o órgão for competente para a emissão.
C. Inconstitucionalidade total e parcial.
a) Extensão: a inconstitucionalidade total afeta o ato num todo, ou seja, toda a sua extensão (por
exemplo, o diploma num todo) e a inconstitucionalidade parcial afeta o mesmo apenas num determinado
segmento (por exemplo, num preceito ou vários preceitos do diploma).
b) Normas e diplomas normativos: a inconstitucionalidade total e a inconstitucionalidade parcial
afetam tanto normas como diplomas normativos.
c) Tipologia da inconstitucionalidade parcial: a inconstitucionalidade parcial pode assumir uma
vertente quantitativa ou horizontal, como uma vertente qualitativa ou vertical.
i) Inconstitucionalidade parcial horizontal/quantitativa: ocorre quando um segmente
da norma é inconstitucional, procedendo-se à eliminação de uma parte do texto normativo.
ii) Inconstitucionalidade parcial vertical/qualitativa: ocorre quando o texto permanece
incólume, sendo apenas eliminada uma norma ideal ou um sentido normativo do preceito, mediante operação
hermenêutica (é, assim, rejeitado um dos sentidos da interpretação). Esta inconstitucional não pressupõe, assim,
a redução do texto nem a eliminação.
d) Inconstitucionalidade parcial qualitativa e interpretação conforme à Constituição: um
preceito constitucional pode ter dois significados obtidos através da interpretação da norma. Pode ocorrer que
um dos significados seja conforme à Constituição e o outro viole a Constituição – deve optar, assim, pela
interpretação conforme à Constituição e aplicar-se um juízo de inconstitucionalidade, sem prejuízo do texto, ao
significado inconstitucional (à interpretação inconstitucional).
D. Inconstitucionalidade originária e superveniente.
a) Inconstitucionalidade originária: o ato jurídico-público, desde a sua formação, colide com a
Constituição (artigo 282º/1).
b) Inconstitucionalidade superveniente: o ato jurídico-público é originariamente conforme à
Constituição, ou seja, no momento da sua formação está conforme à Constituição. No entanto, posteriormente,
torna-se desconforme à Constituição, por força de uma norma constitucional que inicia a vigência num momento
posterior ao ato – por força, portanto, de revisão constitucional (artigo 2828º/2).
E. Inconstitucionalidade presente e pretérita.
a) Inconstitucionalidade presente: ocorre quando há uma simultaneidade entre o momento da
vigência da norma constitucional e do ato que com esta norma é desconforme.

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b) Inconstitucionalidade pretérita: ocorre quando há cessação da vigência da norma
constitucional ou do ato que com ela se encontra em desconformidade, no momento em que a
inconstitucionalidade é apreciada. Pode, ainda, neste âmbito, julgar-se direito revogado, já que há possibilidade
de repristinação, nomeadamente se existirem sujeitos prejudicados e que se sujeitaram, em tempos, à norma.
i) Fundamentos da apreciação da inconstitucionalidade pretérita.
F. Inconstitucionalidade direta, indireta e consequente:
a) Inconstitucionalidade direta: a inconstitucionalidade direta ocorre quando um ato viola a
Constituição numa relação direta (a colisão é direta).
b) Inconstitucionalidade indireta: a inconstitucionalidade indireta ocorre quando um ato, por
intermediário de outro, viola o disposto numa norma constitucional. Assim, o primeiro ato, viola um segundo,
sendo que este segundo se encontra numa relação direta com a Constituição.
c) Inconstitucionalidade consequente: a inconstitucionalidade consequente ocorre quando um
ato é afetado pela inconstitucionalidade de outro ato, dependendo do primeiro por razões lógicas e sistemáticas
ou de hierarquia. Também designada de inconstitucionalidade por arrastamento, sendo o caso, por exemplo, da
inconstitucionalidade da lei de autorização legislativa, que afeta os diplomas autorizados.

3. O valor negativo do ato norma inconstitucional.


3.1. Vício, valor negativo e sanção do ato inconstitucional.
A. Vício: consiste na deformidade de que um ato enferma pelo facto de os seus pressupostos ou
elementos violarem a Constituição – pode a viciação ser formal, material e orgânica.
B. Valor negativo: também designado de desvalor, ocorre quando haja uma depreciação mais ou
menos intensa que é sofrida por um ato inconstitucional, sendo esta depreciação capaz de impedir a produção
dos efeitos jurídicos típicos do ato.
C. Sanção: a sanção consiste na reação por parte do ordenamento jurídico, por norma repressiva,
em relação aos atos que sofram desvalores jurídicos fundados em inconstitucionalidade.
3.2. Síntese da tipologia de valores negativos.
A. Inexistência: juridicamente, o ato não existe.
a) Noção: consiste na total inaptidão de um ato para produzir os efeitos jurídicos
correspondentes ao ato típico, pelo facto de ter em falta requisitos elementares de identificação constitucional.
b) Fundamentos: fundamenta-se orgânicos e formais que prejudicam a imputação do ato
aparente ao órgão competente para emitir, podendo ser atestado por qualquer órgão.
c) Efeitos: é caracterizado pela ausência de consequências jurídicas.
i) Casos de putatividade – exceção.
B. Invalidade
a) Noção: consiste na inaptidão de um ato inconstitucional para produzir a totalidade de
consequências jurídicas que lhe corresponderiam, se eventualmente fosse conforme à Constituição.
b) Regime: é o desvalor-tipo consagrado pela Constituição e previsto no artigo3º/3.
c) Modalidades sancionatórias: em fiscalização abstrata sucessiva, conduz a nulidade
atípica, e em fiscalização sucessiva concreta, conduz a privação da eficácia.
C. Irregularidade
a) Noção: consiste num desvalor imprópria, que não abarca qualquer sanção, e que
pressupõe que os atos inconstitucionais existentes e viciados por desconformidades orgânicas e formais não graves
possam continuar a produzir os seus efeitos jurídicos, como se se tratassem de normas válidas.
b) Regime: encontra-se, o regime típico, previsto no artigo 277/2 e poderá ser alargado a
situações análogas. É exemplo o caso de lei orgânica sem numeração própria e sem legenda, ou seja, que não
respeita essa exigência formal, que, para todos os efeitos, não é grave.

CAPÍTULO II. Introdução ao Objeto e Âmbito do Controlo de Constitucionalidade e Legalidade dos Atos
do Poder Político na Constituição Portuguesa Vigente.
1. Objeto: controlo da constitucionalidade de normas.
A. As normas como o objeto da fiscalização da constitucionalidade (277/1 da CRP): o sistema português
define que o controlo da constitucionalidade incide sobre normas jurídicas, que podem constar de lei ou de outros

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atos normativos do poder público. Assim, encontram-se sujeitas ao controlo do Tribunal Constitucional, as
normas constantes de tratados internacionais, acordos, atos legislativos ou atos com força de lei (leis da AR, DL
do Governo, DLR das ALR) e atos de natureza regulamentar da autoria do Governo, dos Governos Regionais,
dos órgãos do poder local, de certas pessoas coletivas públicas e de certas entidades coletivas não públicas, quando
lhes sejam atribuídos poderes públicos – entre outras, desde que se inscrevam na noção jurídico-pública de norma.
B. Noção funcional de norma jurídico-pública para efeito de fiscalização: de acordo com a regência,
para a noção funcional de norma concorrem dois conceitos distintos. Assim, será norma tudo o que seja geral e
abstrato, independentemente do conteúdo, e será norma tudo o que se contenha numa lei e independentemente do seu
conteúdo. Esta noção é retirada do artigo 268/4, que vem a estatuir uma tutela jurisdiciona independentemente
da forma do ato em causa – a ratio reside na compensação pela dificuldade do cidadão comum aceder ao Tribunal
Constitucional.
C. Atos jurídico-públicos excluídos do sistema de fiscalização: atos, contratos e normas de direito
privado, normas públicas sem eficácia externa (aplicáveis aos cidadãos), atos políticos, atos e contratos
administrativos (estes dois últimos, em princípio, podendo ser apresentados nos tribunais administrativos) e atos
jurisdicionais singulares.

2. Âmbito da fiscalização: o controlo da inconstitucionalidade de normas e legalidade de leis


A. Inconstitucionalidade e ilegalidade de leis: o controlo da inconstitucionalidade é diferente do
controlo da ilegalidade. Ora, na inconstitucionalidade é controlada a conformidade/desconformidade das normas
com a Constituição (uma relação direta). Já a ilegalidade, por sua via, trata da desconformidade dos atos legislativos
com as leis de valor reforçado, ou seja, leis seu parâmetro ou seu pressuposto.
B. Controlo de legalidade e o sistema de garantia de leis com valor reforçado.
C. Virtual falência do controlo da legalidade – um sistema redundante, inútil, e quase abandonado
pela Justiça Constitucional:

3. Introdução aos modelos de fiscalização da constitucionalidade e aos sistemas de controlo no


constitucionalismo português.
3.1 Modelos políticos e jurisdicionais.
3.2. Modelos jurisdicionais: sistema difuso, sistema concentrado, sistema misto luso-brasileiro e sistema
misto francês.
A. Sistema difuso: no sistema difuso, como o próprio nome indica, o poder de controlo da
inconstitucionalidade encontra-se difundido por vários órgãos. Assim, qualquer tribunal pode um poder de
controlo da constitucionalidade.
B. Sistema concentrado: no sistema concentrado, por seu turno, o poder de controlo da
inconstitucionalidade encontra-se centrado apenas no Tribunal Constitucional.
C. Sistema misto luso-brasileiro: em Portugal, prevalece um modelo misto, em que todos os
tribunais podem, no caso concreto, desaplicar normas com fundamento na sua inconstitucionalidade (modelo
difuso presente na fiscalização concreta – artigos 204º e 290º). Para além disto, pode ainda existir recurso da
decisão para o Tribunal Constitucional, no caso concreto (fiscalização concreta), ou pedido direto à pronúncia
(fiscalização preventiva) ou julgamento (fiscalização abstrata) do Tribunal Constitucional (modelo concentrado –
artigo 223º).
D. Sistema misto francês: o sistema francês é peculiar, uma vez que o controlo da
constitucionalidade não é jurisdicional, sendo exercido por um Conselho Constitucional. É sempre um controlo
prévio da norma – fiscalização preventiva -, não havendo fiscalização sucessiva (ou seja, não há fiscalização abstrata
sucessiva nem fiscalização sucessiva concreta).
3.3. Constitucionalismo português: a fiscalização política durante o constitucionalismo monárquico, o
modelo difuso da Constituição de 1911, o modelo misto jurisdicional e político da Constituição de 1933 e o
modelo jurisdicional misto da Constituição de 1976 após a revisão constitucional de 1982.
A. Constitucionalismo monárquico: tratava-se de fiscalização política, realizada pelas Cortes.
B. Constituição de 1911: o controlo era difuso e nominalmente realizado pelos tribunais, no
entanto, verifica-se que não houve práticas – só existia o instituto da fiscalização concreta.

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C. Constituição de 1933: A fiscalização tinha uma componente jurisdicional e uma componente
política. Aos tribunais atribuía-se a possibilidade de uma fiscalização concreta, já a Assembleia Nacional dispunha
de poderes de fiscalização relativos a atos do presidente da republica.
D. Constituição de 1976: entre 1976 até 1982 a fiscalização da constitucionalidade era realizada
pelo Conselho de Revolução, seguindo um modelo concentrado, apoiado por uma comissão constitucional
(órgão consultivo que, através de pareceres, controlava a fiscalização abstrata). No entanto, com a revisão de 1982
é criado o Tribunal Constitucional – alarga-se, no contexto, a fiscalização concreta a todos os tribunais, com
possibilidade de recurso ao TC e atribui-se o controlo da fiscalização abstrata (preventiva, sucessiva e por omissão),
através de pedidos, ao TC.

4. Considerações sobre a natureza jurídica, organização e competência do Tribunal Constitucional português.


4.1. Tribunal Constitucional e organização.
A. Composição e juízes: o Tribunal Constitucional, à luz do artigo 222º da CRP, é composto por
treze juízes, dos quais dez são eleitos pela Assembleia da República, por maioria qualificada de 2/3 (desde que
superior à maioria absoluta = 116+1 = 117), e três juízes são cooptados pelos primeiros, igualmente sujeita a
decisão a maioria qualificada (222º/1, CRP). De entre os treze, sete são escolhidos entre outros juízes e seis entre
juristas. O mandato dos juízes é de 9 anos e não é renovável. O Presidente do Tribunal Constitucional deverá ser
eleito pelos juízes.
B. Regras: encontram-se previstas na Lei Orgânica do Tribunal Constitucional.

CAPÍTULO III. Processos de Fiscalização da Constitucionalidade de Normas e Legalidade de Leis na


Constituição de 1976.
1. Fiscalização Abstrata
1.1. Fiscalização da inconstitucionalidade por ação.
A. Noção: o sindicato por via direta de atos normativos e pré-normativos independentemente da
sua aplicação concreta.
B. Tipologia: controlo preventivo e sucessivo por ação..
C. A fiscalização preventiva da constitucionalidade de normas (artigos 278 e 279, da CRP):
a) Noção: a fiscalização preventiva consiste num processo de controlo da
constitucionalidade e, subsidiariamente, da legalidade, que incide sobre certas normas jurídicas, antes de se
encontrar concluída a sua formação (antes de serem promulgadas). No caso de ser proferido, pelo Tribunal
Constitucional, um juízo pela inconstitucionalidade, dá-se uma preclusão da existência jurídica da norma – a
norma não chega a fazer parte do ordenamento nem a produzir efeitos jurídicos (existem exceções).
i) Processo de fiscalização abstrata: trata-se de um controlo ex ante, em que a
inconstitucionalidade é declarada antes da promulgação do ato (pressuposto necessário à produção dos efeitos
jurídicos).
ii) Controlo-barreira: é, assim, em termos gerais, um controlo-barreira – veda a
possibilidade de o ato fazer parte do ordenamento jurídico - inserido, incidentalmente, antes da fase conclusiva
do procedimento produtivo da norma.
b) Fontes e Origem: não parecem existir fontes internas evidentes, que justifiquem a
origem deste mecanismo. No entanto, nas bases sobre a revisão da Lei Orgânica do Ultramar, fixou-se um mecanismo
de controlo preventivo sore os diplomas legais aprovados pelas assembleias legislativas de duas províncias do
ultramar. Igualmente, é de notar como fonte externa, o paradigma francês da Constituição de 1958.
c) Fins e atributos: a fiscalização preventiva prossegue 5 finalidades principais.
i) Impedir a entrada em vigor de atos que apresentam uma elevada probabilidade
de inconstitucionalidade ou que enfermem inconstitucionalidades.
ii) Garantir a segurança jurídica, impedindo que um ato inconstitucional
produza efeitos na ordem jurídica (impedindo, igualmente, recorrer a processos de fiscalização sucessiva).
iii) Libertação do ordenamento de um ato inconstitucional através de um
processo temporalmente mais certo e eficaz (os restantes processos são mais morosos).
iv) Garantir a interdependência de poderes, na medida em a produção e a
promulgação de atos jurídicos pertencem a órgãos diferentes – reforça o papel do Presidente da República.

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v) Existir um mecanismos que permite acabar com atos que sofram de
inconstitucionalidades graves e manifestas.
d) Sanção: como sanção, não se trata da inexistência jurídica do ato, mas sim da
preclusão. O ato indicado, no caso de pronúncia pela inconstitucionalidade, não conclui a sua formação. A
inexistência pressupõe um ato já aparentemente formado que deixa de produzir os seus efeitos típicos.
e) Requisitos do Processo Comum: os pressupostos processuais consistem nas condições
fácticas e jurídicas que se devem encontrar reunidas para que o Tribunal Constitucional se possa pronunciar sobre
o fundo da causa respeitante ao pedido de fiscalização da constitucionalidade. Os pressupostos podem ser
subjetivos, quando digam respeito ao órgão que tem o dever/poder para requerer a apreciação (legitimidade ativa)
e ao órgão que tem a competência para julgar os pedidos de fiscalização (competência do Tribunal Constitucional).
Ou objetivos, dizem respeito aos requisitos que envolve o processo de fiscalização.
i) Legitimidade ativa: consiste no dever ou poder funcional, que á atribuído pela
CRP, a determinado sujeito/órgão, para que este possa requerer a apreciação preventiva da constitucionalidade
de dado ato jurídico-público, em formação, ao Tribunal Constitucional.
1) Presidente da República: nos termos do artigo 279º, a competência
genérica para requerer a fiscalização pertence ao PR – pode querer de tratados (os quais ratifica), de acordos
internacionais (os quais assina) ou de atos legislativos dos órgãos de soberania (os quais promulga), no âmbito do
controlo de mérito que exerce. O PR deve assumir como próprias as dúvidas – no caso de não o fazer, o TC pode
recusar o pedido. Deve requerer no prazo de 8 dias, desde que recebe o diploma em causa. Assim, o PR: não pode
pedir fiscalização preventiva depois da promulgação do diploma; pode vetar politicamente depois da pronuncia
pela não inconstitucionalidade.
a) Promulgação vedada (artigo 278º/7): o PR deve, em caso de
lei orgânica, aguardar 8 dias, até poder promulgar o referido decreto, e aguardar pela pronúncia do TC, caso esta
tenha sido requerida (o objetivo é salvaguardar a posição do Primeiro-Ministro e de 1/5 dos deputados da AR). A
mesma espera não se aplica ao veto político. Assim, no caso do PM e de 1/5 dos deputados requererem a fiscalização,
os poderes de promulgação do PR ficam congelados. Em caso de violação de regras de promulgação, a regência
considera que se trata de inconstitucionalidade formal, que gera invalidade.
b) Promulgação anterior à pronúncia do TC: no caso do PR
proceder a uma promulgação anteriormente à pronúncia do Tribunal Constitucional, a regência entende que a
melhor solução seria a opção pela ineficácia da decisão do TC. Contudo, poder-se-iam levantar as hipóteses de a
sentença determinar a inexistência da promulgação ou de, no âmbito da referenda ministerial, esta poder ser
recusada pela Executivo (geraria um choque institucional em ambos os casos).
d) Vicissitudes: importa não esquecer que a promulgação não
atribui ao Presidente da República a imputação ato jurídico-público, sendo este apenas imputável à vontade
funcional do órgão que o produziu. Ainda, um veto político por razões de inconstitucionalidade constituiria um
desvio de poder, já que se estaria a recorrer a um género de veto que não segue fins de constitucionalidade – note-
se que o veto político não poderá ser alvo de fiscalização da constitucionalidade.
2) Representante da República: artigo 278º/2, o Representante da
República, pode requerer a fiscalização preventiva, à semelhança do Presidente da República, para diplomas
regionais.
3) Primeiro-Ministro, Deputados: quer o PM, quer 1/5 dos Deputados
da AR podem requerer a fiscalização preventiva da constitucionalidade de leis orgânicas (consiste num trâmite
mais agravado da referida lei reforçada).
ii) Objeto de fiscalização: ao controlo preventivo da constitucionalidade, de
acordo com os artigos 278º, 115º e 223º, estão sujeitas várias normas – decretos enviados para promulgação do
PR como leis ou decretos-leis; diplomas remetidos ao PR para serem ratificados como tratados ou acordos internacionais;
diplomas enviados ao Representante da República para serem assinados como decretos legislativos; propostas de
referendo nacional, regional e local. Não devem igualmente ser excluídas, segundo a regência: as normas de direito
europeu derivado
1) Exclusão da lei de revisão constitucional: são enviadas sob a forma
de lei de revisão, e não sob a forma de decreto; levaria a problemas na confirmação do veto pela AR, em que a

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maioria de aprovação seria mais elevada que a de confirmação (4/5 > 2/3); esvaziaria a promulgação obrigatória
exigida ao PR para a lei de revisão constitucional.
2) Exclusão de outros atos: excetuando as propostas referendárias, as
restantes normas atípicas da função política não podem ser objeto de fiscalização preventiva da
constitucionalidade. Não podem, ainda, ser objeto de fiscalização os regulamentos administrativos.
iii) Exigibilidade: a doutrina diverge em posições que consideram que a
promulgação deve ser conforme à CRP, logo, em caso de dúvidas da constitucionalidade, deverá o pedido de
fiscalização ser obrigatório, e em posições que desconsideram a obrigatoriedade. A regência entende que o pedido
de fiscalização é uma faculdade e não um dever, logo não é obrigatório (exceto para o referendo), nem o é quando
haja dúvidas (o PR pode considerar a entrada em vigor mais virtuosa para o interesse público, apesar de não estar
a salvaguardar diretamente a Constituição, tomando a decisão com base num juízo de proporcionalidade; pode,
igualmente, preferir a fiscalização abstrata sucessiva, em vez de garantir logo a preclusão do ato).
iv) Processo – iniciativa, prazos, pronúncia e efeitos.
1) Prazo para o pedido: o prazo exigido é de 8 dias, não sendo admitidos
pedidos que não sejam feitos dentro do respetivo prazo. A regência considera, ainda, que o aumento do prazo não
parece ser aceitável.
2) Prazo para a pronúncia: o TC tem 25 para se pronunciar pela
inconstitucionalidade ou pela não inconstitucionalidade da norma em pedido. No caso do prazo não ser
respeitado, a sanção é irregularidade jurídica, sendo que não se inibe a pronuncia pela inconstitucionalidade de
produzir os efeitos jurídicos. No caso de, depois de terminado o prazo, o PR ou o RR já terem exercido o controlo
político de mérito, a decisão é ineficaz. O PR pode ainda exigir a urgência do prazo (só é constitucionalmente
admitida na preventiva) – a CRP não impõe limites à redução do prazo, mas parece que não possa ser drástica ao
ponto de pôr em causa o exercício da fiscalização, devendo assim seguir o princípio da proporcionalidade. Esta
possibilidade de encurtamento do prazo, segundo a regência, não se alarga ao PM e aos deputados em caso de lei
orgânica nem aos RR.
3) Pronúncia pela não inconstitucionalidade: trata-se, não de uma
pronúncia pela conformidade constitucional do diploma, mas pela não desconformidade constitucional das
normas requeridas. Assim, a decisão não faz caso julgado material, não produzindo efeitos ultra partes, ou seja,
não vedando uma possível posterior fiscalização abstrata da constitucionalidade. Não faria sentido que se tratasse
de caso julgado material, já que não é possível garantir definitivamente a conformidade do diploma/norma à
CRP, para além de que muitos problemas constitucionais se revelam no âmbito da aplicação concreta, suscitando
a necessidade da fiscalização concreta. Dada a pronúncia, o PR tem 20 (para diplomas da AR) e 40 dias (diplomas
do Governo) para a promulgação ou veto político; o RR tem apenas 15 dias.
a) Sentença negativa com conteúdo interpretativo: o TC não
se pronuncia pela inconstitucionalidade da norma, desde que seja seguida a interpretação que é conforme à
Constituição, podendo esta ser uma única ou alternativa.
4) Pronúncia pela inconstitucionalidade: como consequências
imediatas, proíbe a promulgação ou assinatura do ato julgado inconstitucional e impõe um veto vinculado, que
envolve a totalidade do diploma e exige a devolução ao órgão que o produziu. Como consequência mediatas,
quando o diploma é devolvido ao órgão que o produziu, pode ocorrer desistência, expurgo ou confirmação. A
desistência envolve a preclusão da norma. O expurgo envolve a eliminação da norma julgada inconstitucional e
a reformulação do diploma – o expurgo em sentido estrito pressupõe a não alteração do texto, mantendo-se intacto
o pensamento legislativo; a reformulação impõe a ablação do texto, ou seja, implica alterações substanciais no
diploma (pode envolver uma reformulação tal que o diploma deixa de ser o mesmo – autónoma). O expurgo faz
caso julgado formal, não havendo possíveis impedimentos à promulgação do diploma. A confirmação é passível
de ser realizada, quer pela AR, quer pelas ALR – no entanto, a regência entende que a confirmação de diploma
vetado por inconstitucionalidade não é admissível para as ALR (Deputados, refere-se apenas aos membros da AR;
e a ALR não deve poder sobrepor-se ao Tribunal Constitucional; nem o interesse da região deve poder sobrepor-se
à unidade jurídica nacional). Perante confirmação, o PR dispõe de competências arbitrais para se recusar a promulgar
o diploma – no caso de promulgação, poder-se-á realizar um processo de fiscalização sucessiva abstrata ou concreta
posteriormente.

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a) Problemas da afetação total do diploma: é oposta à solução
francesa, que permite a separação (se for possível no caso) entre a parte considerada inconstitucional e a parte não
considerada.
f) O processo especial de fiscalização de atos referendários: no caso das propostas de
referendo, a fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade são obrigatórias, quer no que respeita
a referendos de âmbito nacional, quer no que respeita a referendos do âmbito local ou regional. Apesar da
decadência da fiscalização da legalidade, note-se que na fiscalização do referendo a mesma é exigida, sendo que
remete para a avaliação da conformidade da proposta de referenda à Lei Orgânica do referendo que é seu
pressuposto.
D. A Fiscalização Sucessiva de Constitucionalidade de Normas e Legalidade de Leis (artigos
281º e 282º da CRP).
a) Noção: consiste num tipo de controlo abstrato de validade de normas exercido por via
direta ou principal e que tem por finalidade essencial a eliminação das normas jurídicas já publicadas que sejam
julgadas inconstitucionais ou ilegais, bem como os efeitos que as mesmas hajam produzido no passado. Assim, o
ato é avaliado como já formado e potencialmente eficaz.
b) Fins e atributos funcionais: o objetivo principal reside na remoção definitiva do
ordenamento jurídico das normas inconstitucionais e reparar os seus efeitos. Assim, é uma função complementar
à fiscalização preventiva, que apenas filtra os diplomas, podendo entrar em vigor, ainda assim, diplomas
inconstitucionais. É, igualmente, função complementar da fiscalização sucessiva concreta, já que, quando a norma
haja sido desaplicada pelo tribunal a quo, por motivos de inconstitucionalidade, três vezes, deverá ser iniciado um
processo de fiscalização abstrata.
c) Requisitos processuais.
i) Legitimidade: há que distinguir a legitimidade ativa da competência do órgão
para exercer a fiscalização. Ora, assim, a fiscalização abstrata, é da exclusiva competência do Tribunal
Constitucional. Quanto à legitimidade ativa, que pressupõe a competência para requerer o início do processo,
esta é atribuída a vários órgãos, como poder funcional de requerer o controlo da constitucionalidade de quaisquer
normas ou disposições legislativas que desrespeitem leis com valor reforçado. De acordo com o artigo 281º, têm
legitimidade – o Presidente da República, o Presidente da AR, o Primeiro-Ministro, o Provedor de Justiça, o
Procurador Geral da República e um décimo dos Deputados da Assembleia da República.
1) Legitimidade Especial: só pode ser requerida a fiscalização, de acordo
com a alínea g) do 281º, quando esteja em causa a violação de direitos regionais constantes da CRP ou a violação
do estatuto por ato legislativo; ainda, só pode ser requerida se se reunirem certas condições de facto e de direito,
como é o caso da repetição do julgado em três casos concretos (281º/3).
ii) Objeto: poderá ter como objeto normas jurídico-públicas, bem como a
fiscalização da legalidade de normas legais que devam ser conformes a leis de valor reforçado, seu pressuposto.
Para determinar norma, o tribunal adotou um critério funcional – atos legislativos em razão da forma ou da força
(que se contenham numa lei, independentemente do conteúdo) e atos normativos não legislativos, caracterizados
pela generalidade e abstração.
iii) Prazo: decorre implicitamente do artigo 281º e explicitamente do artigo 62º
da LOTC que o pedido de fiscalização abstrata pode ser realizado a todo o tempo (não estando, assim, sujeito a
qualquer prazo).
iv) Exigibilidade: a fiscalização abstrata reveste caráter facultativo, já que nenhum
sujeito dotado de legitimidade para a requerer se encontra juridicamente obrigado a fazê-lo.
d) Efeitos da declaração de inconstitucionalidade e ilegalidade: as decisões do TC
podem assumir natureza processual, não se referindo diretamente à questão de constitucionalidade, e natureza
substancial ou de mérito, dizem respeito ao julgamento da questão de constitucionalidade ou legalidade.
i) Decisões de acolhimento e de rejeição do pedido.
1) Rejeição do pedido: podem ocorrer decisões de rejeição do pedido,
que se incluem nas decisões processuais. Ora, as decisões de rejeição do pedido envolvem um juízo sobre o mérito
do pedido – o TC pode decidir não declarar a norma inconstitucional por discordar da causa de pedir (não
reconhece razões que a possam fundar), por considerar a norma válida ou por considerar que esta não padece de
vícios. Não tem força de caso julgado material nem força obrigatória geral.

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2) Acolhimento do pedido: julgam procedente o objetivo do pedido, no
sentido da inconstitucionalidade e da ilegalidade. O acolhimento poderá ser total ou parcial (remete para
inconstitucionalidade parcial ou total) e implica a aceitação do argumento favorável ao ato impugnado no pedido,
no entanto, pode conduzir à invocação de outros argumentos que não os que justificaram a causa de pedir (iura
novit curia).
ii) Efeitos típicos das decisões de acolhimento em sede de inconstitucionalidade
originária: efeitos típicos de norma inconstitucional desde o momento da sua formação.
1) Efeitos ex tunc da decisão e repristinação do Direito revogado pela
norma nula: as normas originariamente inconstitucionais, desde o momento da sua criação, são desconformes à
Constituição, pelo que, se a norma é eliminada do ordenamento, os efeitos dessa eliminação retroagem ao
momento da criação da norma, eliminando com eficácia ex tunc, todas as situações ainda não transitadas em
julgado. Serão limites a esta retroatividade: casos julgados e o chamado caso decidido administrativo. O efeito
subsequente é a repristinação do Direito revogado pelo ato declarado inconstitucional/ilegal, um processo
automático, sendo que se dá a revivescência das normas que cessaram vigência com a entrada em vigor das normas
declaradas inválidas (o objetivo é restabelecer a situação anterior à entrada em vigor da norma inconstitucional e
o preenchimento de lacunas que possam vir a surgir). Acresce outro efeito: a impossibilidade de reedição da
norma.
iii) Efeitos típicos das decisões de acolhimento em sede de
inconstitucionalidade superveniente: na inconstitucionalidade superveniente, o que importam são os vícios
materiais, já que não põem em causa os requisitos formais ou de competência, por forma no princípio do tempus
regit actum. Assim, de acordo com o artigo 282º/2, os efeitos retroativos produzem-se até à entrada em vigor da
norma constitucional que veio a gerar a inconstitucionalidade superveniente (não remontam, como no caso
anterior, ao momento de criação da norma inconstitucional) – os efeitos situações entre os ex tunc e o ex nunc,
tratando-se de retroatividade limitada. Este regime é imposto por exigência do princípio da segurança jurídico e
do princípio da proporcionalidade. Nestes casos já não se aplica a repristinação de direito revogado, visto que a
norma julgada inconstitucional não pode ser repristinada. Acresce outro efeito: a impossibilidade de reedição da
norma.
Efeitos não Retroatividade apenas até à
afetados Revisão Constitucional

Lei 1 Revisão Constitucional: Fiscalização Constitucional


Lei 1 inconstitucional da Lei 1
iv) A eficácia da Força Obrigatória Geral: como efeito da declaração de
inconstitucionalidade na fiscalização abstrata é de assinalar a declaração de inconstitucionalidade com força
obrigatória geral (DICFOG). Esta abarca três dimensões – a nulidade da norma julgada inconstitucional; a força
de caso julgado formal e material, a questão não pode vir a ser recorrida; uma decisão com extensão erga omnes,
ou seja, obrigatoriedade de acatamento da decisão nos termos do 205º/2 (vinculatividade plena para todos os
cidadãos, para os tribunais comuns e relativa para o Tribunal Constitucional).
v) Limites ordinários aos efeitos da decisão de inconstitucionalidade: como
regra geral, há que referir o princípio da intangibilidade do caso julgado. O caso julgado põe um fim à luta pelo
Direito e impõe o respeito pela segurança jurídica bem como da Justiça Constitucional pelas decisões dos tribunais
comuns – de acordo com o princípio da intangibilidade, não serão tocadas as decisões transitadas em julgado
que tenham aplicado normas inconstitucionais ou ilegais.
1) Exceção à exceção (retroatividade extrema): de acordo com a 2º parte
do artigo 282º/3, se a norma inconstitucional for de natureza sancionatória – se diz respeito a Direito Penal,
disciplinar ou mera ordenação social – e o seu conteúdo for de caráter menos favorável ao arguido, essa decisão
poderá ser alterada. Ora, esta exceção resulta do princípio da aplicação do Direito mais favorável ao agente. Se,
em circunstâncias que não estas, houvesse repristinação do direito antigo, não se tocava no caso julgado – no
entanto, se o direito repristinado é mais favorável, então deve ser alterada a decisão. No entanto, para tal se
realizar, deve resultar de decisão expressa do Tribunal Constitucional.
vi) As sentenças intermédias: as decisões em sede de fiscalização abstrata
sucessiva podem ser simples ou manipulativas. As simples reportam à eliminação da norma inconstitucional, bem

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como a eliminação retroativa dos seus efeitos. As decisões manipulativas ou de caráter intermédio pressupõem
modificações no sentido ou nos efeitos da norma submetida a julgamento. O objetivo é o de garantir a subsistência
de atos jurídicos e mitigar o rigor extremo dos efeitos das decisões. Assim, as decisões manipulativas podem
diminuir os efeitos retroativos ou, até mesmo, eliminar esses efeitos retroativos. A doutrina diverge, no entanto,
na circunstância de saber se os efeitos podem ser determinados para começar apenas num dado momento futuro
posterior ao julgamento da norma inconstitucional (por razões de interesse pública, que requeiram transições
mais suaves). Podem, assim, existirem vários tipos de decisões manipulativas – decisões que alteram a sua eficácia
temporal, decisões interpretativas condicionais, decisões com efeitos aditivos e decisões de
inconstitucionalidade sem sanção de nulidade e decisões de inconstitucionalidade provisória.
1) Decisões manipulativas excluídas do ordenamento português: estão
excluídas as decisões de conteúdo apelativo (decisões sem o efeito da nulidade, decisões de constitucionalidade
provisória, que consideram a norma como provisoriamente constitucional, ou de rejeição com reserva de
acolhimento futuro), as decisões que postergam os efeitos da inconstitucionalidade para o futuro e as decisões
aditivas de conteúdo inovador (incorporam meditas aditadas pela Justiça Constitucional).
2) Decisões manipulativas na ordem constitucional portuguesa: as
sentenças que alteram os efeitos temporais de eficácia retroativa (destinam-se a restringir, no todo ou em parte, os
efeitos retroativos da decisão de inconstitucionalidade da norma – artigo 282º/4 -, com o objetivo de garantir a
segurança jurídica, a equidade e o interesse público de especial relevo). Assim, admite-se uma exclusão total da
retroatividade dos efeitos sancionatórios da decisão, uma limitação do alcance temporal da eficácia sancionatória,
sendo que os efeitos retroativos se limitam até certa data (podendo ainda comportar uma imunidade à nulidade
a determinadas situações individuais), a determinação dos efeitos apenas após a publicação no Diário da República
desses efeitos (salvaguardam-se, assim, as situações pendentes de impugnação contenciosa), e, ainda, a limitação
da repristinação de normas revogadas (o TC pode definir a não revivescência do direito revogado).
3) Sentenças interpretativas de rejeição - condicionais: toda a decisão
do Tribunal Constitucional exige uma interpretação da norma em questão. Contudo, há sentenças cuja decisão
se encontra condicionada à adoção ou exclusão de determinada interpretação – como se viu, a interpretação
conforme à CRP e a inconstitucionalidade parcial qualitativa, são duas variantes das sentenças interpretativas
constitucionais. Para as sentenças interpretativas condicionais é da operação interpretativa que depende a
declaração de inconstitucionalidade ou de não inconstitucionalidade: incidem sobre enunciados que comportam
uma pluralidade de significados, sendo desaplicado o sentido inconstitucional, podem deixar incólume o texto
normativo e determinam interpretações válidas e interpretações inválidas. Fazem, assim, parte da sentença de
rejeição, determinando uma condição para a não inconstitucionalidade daquela norma (isola-se, assim, na
decisão, o sentido não inconstitucional daquela norma).
4) Sentenças interpretativas de acolhimento – inconstitucionalidade
parcial qualitativa ou sem redução de texto: consiste numa operação hermenêutica que determina a
inconstitucionalidade parcial qualitativa ou uma interpretação sem redução de texto. Implica, assim, que a decisão
constitucional elimine um dos significados normativos que emanem da disposição, salvaguardando a potencial
validade do outro significado. São, assim, sentenças redutivas, restringindo o conteúdo real ou hipotético da
norma.
5) Sentenças de acolhimento com efeitos aditivos: consistem nas
decisões positivas de inconstitucionalidade de cujo conteúdo resulte um juízo de invalidade e a indicação de uma
norma/princípio que assegure a criação de condições para que o direito que conformou o objeto da sentença se
compatibilize futuramente com a Constituição. Assim, por norma, são decisões de acolhimento, aditando-se um
critério normativo ao segmento remanescente de um preceito julgado inconstitucional – são, por isso, também
decisões manipulativas, já que tentam reparar a inconstitucionalidade. Estas adições podem ser ablativas, em que
é eliminada ou desaplicada uma parte do preceito, ou reconstrutivas, em que se criam condições através de outro
critério ou preceito normativo.
1.2. Fiscalização da inconstitucionalidade por omissão (artigo 283º da CRP).
A. Noção: consiste na abstenção de órgão do Estado Coletividade em cumprir deveres ou
obrigações ativas que lhe sejam imperativamente determinadas pela Constituição. Ao desrespeitar um dever
imperativamente imposto pela CRP, o órgão incorre em inconstitucionalidade material por omissão. O artigo
283º, no entanto, determina que apenas podem ser fiscalização as omissões legislativas.

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B. Legitimidade ativa: de acordo com o artigo 283º, apenas três órgãos constitucionais têm
legitimidade para desencadear um processo de fiscalização abstrata, sendo eles o Presidente da República, o
Provedor de Justiça e os Presidentes das Assembleias Legislativas Regionais (estes últimos estão circunscritos a
omissões que violem direitos das regiões autónomas).
C. Efeitos: do julgamento de inconstitucionalidade por omissão não aplica qualquer sanção
jurídica. Assim, o Tribunal Constitucional dá conhecimento ao órgão legislativo competente da norma legal em
falta. No entanto, esta comunicação não reveste caráter sancionatório nem de recomendação. Note-se, em
acréscimo, que outros efeitos indiretos podem ser aplicados, nomeadamente, o Estado e as regiões autónomas
podem ser constituídos em responsabilidade civil.

2. Introdução ao Processo de Fiscalização Sucessiva Concreta da Constitucionalidade e Legalidade na


Constituição e na lei (artigos 204º e 280º da CRP).
2.1. Linhas de Força.
A. Considerações sobre o controlo incidental.
a) Noção: consiste num instituto de controlo da vaidade de atos normativos, suscetível
de ser exercido por qualquer tribunal, sempre que os mesmos atos sejam aplicáveis a um caso singular que se
encontre por ele a ser julgado num processo jurisdicional comum. É um processo de fiscalização em que qualquer
tribunal é um órgão competente para realizar essa fiscalização. O tribunal que julga a questão principal e que,
em primeira instância julga a questão da constitucionalidade é denominado de tribunal a quo; o tribunal ao qual
se recorre da decisão designa-se por ad quem. É assim uma questão incidental, que surge da apreciação da questão
principal.
i) É um direito-dever: é um direito, na medida em que aos tribunais não deve
ser recusada a faculdade de apreciarem a constitucionalidade das normas a serem aplicadas, e um dever, na medida
em que o tribunal deve garantir, oficiosamente ou a requerimento dos sujeitos processuais, a apreciação da
compatibilidade das normas aplicáveis à Lei Fundamental.
ii) Efeitos: no caso de ser proferida uma decisão de invalidade
(inconstitucionalidade ou ilegalidade) a norma não deve ser aplicada ao caso concreto. Note-se que, em situações
distintas, o tribunal pode apreciar a mesma norma válida e, posteriormente, inválida (desarmonia de julgados, por
julgamento por diferentes Secções, que são escolhidas aleatoriamente). Para solucionar, prevê-se a intervenção do
plenário do TC, por forma a ser fixada uma orientação (uniformização da jurisprudência). Ainda, prevê-se que,
caso a mesma norma seja julgada inconstitucional 3 vezes, no caso concreto, seja, por iniciativa do Ministério
Público ou por iniciativa de juízes, declarada inválida com força obrigatória geral.
b) Natureza: assim um controlo de natureza incidental, que surge da apreciação da
questão principal e não com o especial propósito de avaliar a validade da norma em questão. O processo de
fiscalização é um instrumento, que permite determinar a norma aplicável ao caso singular e a decisão do tribunal.
É, assim, um controlo de constitucionalidade difuso na base, já que todos os tribunais conhecem e decidem sobre
a constitucionalidade das normas que aplicam nos feitos submetidos a julgamento, mas concentrado no topo, já
que a última decisão cabe, ou pode caber, ao TC, por via de recurso.
c) Caracterização processual: o processo de fiscalização é iniciado em resultado de
dúvidas que são suscitadas durante a questão principal. Neste sentido, a aplicação da norma levanta dúvidas de
conformidade constitucional, pelo que o processo é suspenso e é avaliada a norma que seria aplicada. A resolução
da questão de constitucionalidade é condição para o julgamento do processo principal. Depois da decisão sobre
a validade da norma, parte-se para a resolução do caso concreto – decisão final poderá ser recorrida para instâncias
superiores ou, até mesmo, para o Tribunal Constitucional. No caso de recurso para o TC, este pronuncia-se pela
questão de inconstitucionalidade – envia a decisão ao tribunal comum, que a aplica ao caso concreto.
d) Pressupostos processuais.
i) Pressupostos processuais subjetivos - legitimidade processual para recorrer: a
legitimidade para recorrer determina os sujeitos que, no plano ativo, estão habilitados ou vinculador a interpor o
recurso de constitucionalidade ou legalidade.
1) Legitimidade processual das partes: pressupõe a legitimidade das
partes – sejam as partes principais, terceiros direta e efetivamente prejudicados e o Ministério Público, quando
intervenha como parte principal. A legitimidade das partes fundamenta-se na titularidade de um direito

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subjetivo. De acordo com o artigo 7pº/1, da LTC, todo o sujeito processual prejudicado por aplicação ou
desaplicação de determinada norma, com fundamento em invalidade, pode recorrer da decisão.
2) Legitimidade processual do Ministério Público: nas decisões
negativas de inconstitucionalidade ou ilegalidade, o Ministério Público só pode recorrer se for parte principal no
processo (se for parte acessória, não terá legitimidade ativa para recorrer). O Ministério Público pode, ainda, estar
obrigado/vinculado a recorrer – decisões positivas de inconstitucionalidade ou ilegalidade em relação a
convenções internacionais, leis e decretos regulamentares (artigo 72/3); em decisões negativas proferidas em
desarmonia com o sentido de anteriores decisões (art. 72/3); em decisões de dada Secção que estejam em
desarmonia com outras decisões proferidas pelo mesmo órgão (art. 79ºD/1);
ii) Pressupostos processuais objetivos.
1) Parâmetros de controlo: de acordo com o artigo 280º/1 e artigo 70,
a fiscalização concreta procura garantir a constitucionalidade das normas e a legalidade dos atos legislativos.
2) Objeto do recurso: o objeto de recurso, não repousa nas decisões, mas
nas normas jurídicas e nas interpretações que por elas são aplicadas ou desaplicadas. Este objeto deve respeitar as
exigências do artigo 75º/A, da LTC – caso não respeite, poderá ser deferido.
4) Prazo para recorrer: de acordo como artigo 75º da LTC, o prazo para
recorrer para o TC é de 10, sendo também aplicável ao Ministério Público. No entanto, poderá haver recurso até
3 dias depois do termo prazo, se o recorrente pagar a multa devida – esta possibilidade está também aberta ao
Ministério Público que não terá, contudo, de pagar multa.
ii) Princípios processuais específicos: prevalecem, na fiscalização concreta, o
princípio do conhecimento oficioso das questões de constitucionalidade de normas e legalidade de leis, pelo que
o juiz deve decidir a desaplicação da norma, se for caso disso, e o princípio da igualdade de armas entre os sujeitos
processuais, que pressupõe uma situação de igualdade de deveres, ónus, meios de defesa, que conduzem a posições
de igualdade substancial.
B. Tipologia e regime de recursos de constitucionalidade.
a) Recursos das decisões positivas de inconstitucionalidade e ilegalidade (1º tipo):
consiste num recurso interposto ao Tribunal Constitucional da decisão de um tribunal comum que recuse, num
processo submetido a julgamento, a aplicação de uma norma com fundamento na inconstitucionalidade (artigo
70/1/a)) e de uma lei com fundamento na ilegalidade (70/1/c), d), e)).
1) Recurso pelas partes e outros interessados: o recurso, para os interessados,
assume natureza facultativa.
2) Recurso obrigatório pelo Ministério Público: de acordo com o artigo 72º/3,
o Ministério Público é obrigado a recorrer sempre que seja recusada a aplicação de convenção internacional, de
uma lei (incluindo-se as leis de revisão constitucional) ou de decreto regulamentar, com fundamento na
inconstitucionalidade ou ilegalidade – a ratio reside na natureza do MP, como defensor do interesse público.
b) Recursos das decisões negativas de inconstitucionalidade e ilegalidade (2º tipo):
consiste num recurso de uma decisão que, no caso concreto, aplique a norma cuja inconstitucionalidade ou
ilegalidade tenha sido adequadamente suscitadas durante o decurso do processo, por parte ou pelo Ministério
Público, como parte. Aplicam-se, a este tipo de recurso, várias regras: obrigação da parte que recorre em suscitar
previamente a questão de invalidade, de forma processualmente adequada; o esgotamento das instâncias até ao
recurso ao TC; suscetibilidade de se recusar a admissão do recurso por razões de fundo.
1) Recurso pelas partes e outros interessados: o recurso, para os interessados,
assume natureza facultativa.
2) Recurso pelo Ministério Público: o recurso do Ministério Público é, neste
tipo de recurso de natureza facultativa, contudo a sua legitimidade é condicionada. Esta legitimidade está
dependente da circunstância do Ministério Púbico ser parte do processo, ou seja, atuando como parte vencida –
já no caso de intervenção acessória, não parece que possa ser admitido o recurso pelo Ministério Público.
c) Recursos de decisões negativas de inconstitucionalidade e ilegalidade de normas já
previamente julgadas inconstitucionais e ilegais pelo tribunal constitucional e Comissão Constitucional (3º
tipo): consiste num recurso de decisões judiciais que apliquem normas já anteriormente julgadas inconstitucionais
ou ilegais pelo Tribunal Constitucional e pela extinta Comissão Constitucional (proveniente da Constituição de
1976). Encontra-se previsto nas alíneas g) e h) do nº1 do artigo 70º da LTC. Em termos gerais, este tipo de recurso

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pretende ultrapassar possíveis situações de desarmonia de decisões de inconstitucionalidade ou de não
inconstitucionalidade, em relação à mesma norma – por forma a garantir a segurança jurídica. Podem essas
normas ter sido julgadas inconstitucionais em sede de fiscalização preventiva, nos casos em que se verifique
confirmação por parte da AR do diploma inconstitucional, ou em sede de fiscalização abstrata, quando o juiz
comum desrespeite uma decisão com força obrigatória geral – pode, esta decisão, ser desconhecida para o juiz em
causa. Assim, nos termos do artigo 72º/3, o Ministério recorre obrigatoriamente das decisões.
1) Recurso pelas partes e outros interessados: o recurso, para os interessados,
assume natureza facultativa.
2) Recurso pelo Ministério Público: o MP deve recorrer obrigatoriamente de
decisões que apliquem uma norma considerada anteriormente inconstitucional. Esta obrigatoriedade resultada
do império da autoridade jurisdicional do TC, da uniformidade de jurisprudência e da certeza jurídica, associada
à repetição do caso julgado. Note-se, no entanto, uma exceção: o artigo 72/4 da LTC prevê uma exceção ao nº3,
permitindo uma abstenção por parte do MP caso, em jurisprudência do Tribunal Constitucional, a norma tenha
sido aplicada – pode ter sido num caso concreto considerada inconstitucional e num caso posterior aplicada,
situação constante de jurisprudência uniformizada (a dita norma passa a ser considerada conforme a CRP). Nestas
situações, o MP pode sempre recorrer, no entanto, já não se vinculado a fazê-lo.
C. Processo de interposição de recurso: a parte requer o recurso ao tribunal a quo. Este pedido
de recurso é enviado ao tribunal da decisão – o tribunal a quo, que julgou a causa -, que decide da sua possibilidade
– pode ocorrer casos em que a decisão seja irrecorrível. No caso de ser admitido o recurso, a parte tem um prazo
para acrescentar as alegações do recurso e para apresentar o recurso ao Tribunal Constitucional, seguindo a fase
do julgamento. Entende-se, assim, que o TC não julga a decisão, mas sim a questão de inconstitucionalidade ou
ilegalidade, enviando a decisão para o tribunal a quo, que a aplicará ao caso concreto.

3. O Princípio do Pedido e os Poderes de Conhecimento e de Decisão do Tribunal Constitucional


A. O Princípio do Pedido e a Causa de Pedir: à luz do princípio do pedido, o tribunal constitucional
está vinculado, na decisão, ao objeto do pedido, mas não está vinculado à causa de pedir. Ora, o pedido consiste
na solicitação da declaração de inconstitucional de uma ou várias normas. Já a causa de pedir consiste na nas
normas ou princípios constitucionais que se consideram violados e as razões que justificam a decisão. Assim, o
TC só pode declarar a inconstitucionalidade das normas que tenham sido requeridas no pedido, no entanto pode
apresentar outras justificações (iura novit curia).
a) O problema da inconstitucionalidade consequente: se a norma ferida por
inconstitucionalidade consequente não for objetivo de um pedido específico de fiscalização, a sua
inconstitucionalidade não pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal (decorrência do princípio do pedido e
da passividade da faculdade do juiz). A regência entende que deveriam ser reformulados os poderes oficiosos dos
juízes, por forma a investir o TC de competência para declarar a inconstitucionalidade consequente de normas
não impugnadas, por forma a conseguir-se eliminar imediatamente normas do mesmo diploma ou de outros
diplomas.
b) O pedido refere inconstitucionalidade e o TC declara a ilegalidade: uma parte da doutrina
entende, em conformidade com o TC, que tal só seria admissível – à luz do princípio do pedido – se o autor do
pedido requerer a fiscalização da constitucionalidade e da legalidade. A regência discorda, considerando que o
princípio do pedido apenas vincula na fiscalização da norma, não obrigando o Tribunal a optar pela invalidade
ou pela inconstitucionalidade (conforme fosse requerido), e que a sanção para a ilegalidade e para a
inconstitucionalidade é a mesma, pelo que faz sentido que o Tribunal possa pronunciar-se por qualquer uma
como causa.

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