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Febre de origem desconhecida

ISABEL ALDIR
S. INFECIOLOGIA E MEDICINA TROPICAL / CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA OCIDENTAL, E.P.E.
FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DE LISBOA
Definição de Febre
A temperatura corporal varia ao longo do dia, e é controlada pelo centro
termorregulador, localizado no hipotálamo anterior.
Em média a temperatura corporal é de 36,6 °C (IC 35,3 - 37,7 °C).
O valor mais baixo ocorre às 06:00H e o mais elevado entre as 16:00 e as 18:00H.

Hipertermia – na hipertermia há uma interferência com a capacidade de


termorregulação; a resposta do centro de termorregulação mantém-se inalterada
enquanto a temperatura sobe (exemplo: golpe de calor)

Hiperpirexia – termo aplicável a uma febre muito elevada (>41,5 °C)


Definição de SFI (Síndroma Febril Indeterminada)
Petersdorf e Beeson, 1961
Doença com duração ≥ 3 semanas
Temperatura ≥ 38.3 °C, em diversas avaliações
Ausência de diagnóstico após 1 semana de investigação hospitalar

Durack e Street, 1991


Ausência de diagnóstico após investigação intensiva (após 3 dias hospital ou ≥ 3
consultas ambulatório)

Durack DT, Street AC. Fever of unknown origin – reexamined and redefined. Current Clinical Topics in Infectious Diseases 11: 35-51, 1991
Classificação de SFI
Durack e Street, 1991

SFI clássica
SFI nosocomial
SFI no doente neutropénico
SFI no doente com infeção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH)
Classificação de SFI - SFI nosocomial

◦ Doentes internados

◦ Temperatura ≥ 38.3 °C com > 3 dias duração

◦ Ausência de infeção ou doença em período de incubação à data da admissão


hospitalar

◦ Ausência de diagnóstico após 3 dias de investigação hospitalar (incluindo pelo


menos 48 h de culturas microbiológicas)
Classificação de SFI - SFI no doente neutropénico

◦ Neutrófilos < 500 células/mm3

◦ Temperatura ≥ 38.3 °C com > 3 dias duração

◦ Ausência de diagnóstico após 3 dias de investigação hospitalar (incluindo pelo


menos 48 h de culturas microbiológicas)
Classificação de SFI - SFI no doente VIH
◦ Infeção VIH confirmada

◦ Temperatura 38.3 °C, em diversas avaliações

◦ Duração ≥ 3 semanas (ambulatório) ou > 3 dias (internamento)

◦ Ausência de diagnóstico após investigação intensiva (3 dias hospitalar ou ≥ 3


consultas ambulatório)
SFI - etiologias
SFI clássica:
o infeção; neoplasia; doença reumatológica/auto-imune; fármacos

SFI nosocomial:
o infeções (bacterianas/fúngicas; dispositivos médicos); fármacos; doenças venosas
tromboembólicas

SFI neutropénica:
o infeção fúngica, infeção perianal, infeção bacteriana, fármacos, doença subjacente

SFI VIH:
o infeções (MAC/TB/fúngicas), linfoma, fármacos
UM DOENTE – MUITAS CONDIÇÕES!
Caso clínico 1
R.I.R.S., Sexo feminino, 34 anos

Infeção VIH-1/SIDA desde 2001; má adesão a consultas/tratamento


CD4=41 células/mm3; CV=43.101 cópias/mL (set 2009)

Linfoma linfoplasmoblástico da cavidade oral (set.09)


CHOP (3º ciclo jan.10)
TARc: Tenofovir disoproxil / emtricitabina + darunavir/ritonavir
Caso clínico 1
Serviço Urgência: jan 2010
febre, hemiparésia esquerda, lentificação psico-motora. Rigidez da nuca +

Meningoencefalite com abcesso cerebral por Listeria moncytogenes

◦ Evolução favorável no internamento;


◦ Antibioterapia 6 semanas (ampicilina+ CTX)
Caso clínico 1
Intercorrências no internamento:

Hipoplasia medular
◦ Anemia – transfusões de CE
◦ Neutropenia (leucócitos 450)- G-CSF

Infeção urinária – E. coli ESBL– carbapenem


3ª semana de internamento

Febre baixa, tosse seca persistente

Rx tórax na admissão
Hipoxémia (pO2=55mmHg)

PCR=1,34 mg/dL

Investigação de SFI + Pneumonia hipoxemiante

Rx tórax na ocasião
TAC torácica: cavitação no lobo superior direito,
padrão em vidro despolido, atelectasia dos lobos
inferiores.
Tuberculose pulmonar?
◦ HRZE

SRI (síndroma de reconstituição


imunológica)?
- CD4: 77, CV = 44 cp/ml.
◦ Corticóides

LBA+ SB direto e cultural negativo (BAAR neg)


BFO (26.02): granulomas de aspeto caseoso na
parede posterior do BPD
Biopsia brônquica

Necrose extensa da mucosa, com hifas sugestivas de Mucormicose e


células com inclusões sugestivas de CMV
Etiologia SFI
>200 causas conhecidas de SFI
Causas e frequências variáveis com o tempo e o local dos estudos (diminuição das infeções em
países desenvolvidos) e a idade dos doentes.

◦ Infeções (30-40%)
◦ Neoplasias (20-30%)
◦ Doenças reumáticas/imunológicas (15-20%)
◦ Miscelânea (15-20%)
◦ Sem diagnóstico (5-15%)

Adaptado de Mourad O, Palda V, Detsky AS. Arch Intern Med 2003; 163:545.
Etiologia
Infeções
◦ Endocardite; Infeções intra-abdominais; Infeções do trato urinário e respiratório; osteomielite;
arterite infeciosa; micobacteriose, zoonoses; infeções fúngicas; infeções parasitárias; infeções
víricas; (..)

Neoplasias
◦ Doenças linfoproliferativas
◦ Tumores sólidos (rim, metastização hepática)
◦ Doença mielodisplásica
Etiologia
Doenças reumáticas/imunológicas
◦ Doença de Still do Adulto, Arterite de células gigantes, Polimialgia reumática, Lupus
Eritematoso Sistémico, Artrite reumatóide, …

Outras
◦ Sarcoidose, febre mediterrânica familiar, tiroidite, febre medicamentosa, meningite
carcinomatosa, febre factícia, doença veno-oclusiva, (...)
Investigação da SFI
O Básico
Noções Gerais
Dar prioridade à clínica, sendo que tal é decisivo para um diagnóstico em 30 a 70% dos casos

Fazer uma coleção de todos os dados obtidos, sendo que isso não deve substituir o raciocínio
diagnóstico, mas sim servir como dado adicional para esse processo

Ter na imagiologia um apoio tático

Procurar ativamente locais para biopsar – uma biopsia tecidular pode dar o diagnóstico 25% a
35% dos casos

Ref. 2
Diagnóstico
História clínica

Exame objetivo - Certifique-se de que o doente tem febre; o exame


clínico deve ser sistematizado, minucioso e repetido

Exames complementares de diagnóstico


Diagnóstico
História clínica

◦ Caracterização do padrão febril: periodicidade, duração, ritmo circadiano, sintomas


associados.

◦ Antecedentes epidemiológicos – viagens, contacto com animais, atividades de


trabalho/lazer; hábitos sexuais, medicamentosos, alcoólicos, toxicofilia.

◦ Antecedentes pessoais: cirurgias – tipo/tempo; presença de dispositivos médicos


Padrão febril
Febre contínua : permanece acima do normal durante todo o dia, sem flutuação
>1º C em 24 h (ex: pneumonia lobar)

Febre remitente: permanece acima do normal durante o dia, com flutuação >1º C
nas 24h (ex: EI)

Febre intermitente: febre durante algumas horas do dia, voltando ao normal nas
restantes horas (malária, septicémia).

Pel-Ebstein: períodos de apirexia prolongada (dias/semanas) alternando com


períodos de febre (linfoma de Hodgkin)
Caso clínico 2 – Manifestações tardias de patologia endémica
Homem, 82 anos, militar reformado.
Última missão: Guiné-Bissau (há > 40 anos).
Contexto actual: infeção por VIH-2 (CD4=312/µL)

SFI + Úlcera crónica joelho dto.


Ex. anatomopatológico/microbiológico:
H. capsulatum var. duboisii.

Arquivo pessoal.
Diagnóstico
Exame objectivo
◦ Repetido diariamente
◦ Exaustivo
◦ Atenção particular a locais por vezes “esquecidos”: tiróide, cadeias ganglionares,
artérias temporais, recto/região peri-anal, pele.
◦ Fundoscopia
◦ Alguns sinais – por ex. bradicardia relativa
Ref. 2
Táticas
O princípio da “navalha de Occam”
◦ Non sunt multiplicanda entia sine necessitate
(As entidades não devem ser multiplicadas sem necessidade – Lei da Parcimónia)
Investigação da SFI
O Método
Método
A investigação segue um método relativamente estandardizado

◦ Lógica de escalada progressiva


◦ Geralmente de atitudes menos invasivas para mais invasivas
(excetuando se pistas clinicamente relevantes)
◦ Dirigida conforme os resultados que se vão obtendo
◦ Métodos descritos bastante similares na diversa literatura publicada
• História clínica completa
• Doença actual
• Antecedentes pessoais
• Antecedentes familiares
• Fármacos
• Dados epidemiológicos

• Exame físico pormenorizado

Ref. 3, 4, 5, 6, 7
• Hemograma completo
• Bioquímica (incluindo LDH, CK,
enzimas hepáticas)
• VS / PCR
• Hemoculturas / Urocultura
• Serologias (EBV, CMV, VIH)
• Outras serologias (Hepatites? Febre
Q?)
• FR
• ANAs / ANCAs
• Proteinograma
• IDR e/ou IGRA?
• Pesquisa Sangue Oculto Fezes?

• Radiografia torácica
• Ecografia abdominal

Ref. 3, 4, 5, 6, 7
• Crioglobulinas, Complemento
• Ferritina
• Culturas de fezes, Medula óssea,
orofaringe
• Observação Oftalmológica

• Ecocardiografia
• TC TAP
• PET ou PET/CT (FDG-PET)

• Biopsia óssea / MO
• Biopsia / excisão ganglionar
• Biopsia hepática
• Biopsia da artéria temporal

Ref. 3, 4, 5, 6, 7
Am Fam Physician 2003; 68:2223-8.
N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
Resultado da investigação da SFI por região e estudo (estruturado versus não estruturado)

JAMA Network Open. 2022;5(6):e2215000. doi:10.1001/jamanetworkopen.2022.15000


O contributo da Medicina Nuclear
FDG-PET/CT (tomografia de emissão de positrões com flurodeoxiglucose ): não invasivo, muito
sensível na localização de processos infeciosos, inflamatórios e neoplásicos, embora não
específico; pode ajudar na eleição de locais para a realização de biopsias ou aspirações.

Alternativa: cintigrafia com leucócitos marcados (gálio, tecnesio-99m ou indium-111); elevado


valor negativo predidtivo; má na deteção de infeções espinhais
Vaidyanathan S, et al., FDG PET/CT in infection and inflammation current and emerging clinical applications, Clinical Radiology (2015), http://dx.doi.org/10.1016/j.crad.2015.03.010
O contributo da Biologia Molecular
Os testes de diagnóstico molecular podem ultrapassar algumas das limitações dos testes
microbiológicos tradicionais, tais como resultados morosos, sensibilidade reduzida com o uso de
antibióticos e resultados serológicos falsos negativos no início do processo da doença.

Estes métodos incluem a sequenciação de nova geração, que envolve a sequenciação de todo o
material genético presente numa amostra.
Além disso, os ensaios específicos para um agente patogénico que visam os genes de ARN
ribossómico 16S ou 18S, a região D1-D2do ADN ribossómico, espaçador interno transcrito e
outras partes dos genomas bacterianos e fúngicos, ganharam uma atenção generalizada nos
últimos anos.
No entanto, os dados sobre o uso por rotina de métodos moleculares em casos de SFI são
escassos e, atualmente, devem ser reservados para casos que permanecem sem diagnóstico.

Clinical Infectious Diseases® 2022;74(5):924–32


N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
Tratamento
Há um tempo para agir e um tempo para esperar
Terapêutica empírica com indicações muito restritas
◦ Doença rapidamente progressiva com instabilidade multiorgânica – corticoides + antibióticos + antiblásticos - Terapêutica
de resgate
Doença crónica progressiva com exclusão da maioria das probabilidades de diagnóstico - Terapêutica de prova - Geralmente
desaconselhada; pode perturbar a eficácia diagnóstica e mascarar a situação.
Exceções (se forte suspeita):
• Tuberculose do SNC, Tuberculose miliar em doente “frágil”, Endocardite com cultura negativa, Arterite temporal ameaçando a
visão, Malária, Leptospirose

A fazer: tratamento de baixo espectro, tendencialmente específico para a doença, ao qual se vai atribuir significado
diagnóstico. Particularidade da Prova terapêutica com antibacilares (sem rifampicina). Teste do Naproxeno (250 mg per os
8/8 h, 3 dias); descida rápida ou apirexia em 24 h sugere doença neoplásica e torna menos provável a etiologia
infeciosa. Utilidade é controversa; possíveis vieses em estudos iniciais; se o resultado do teste for “positivo”, deixar-se-
á imediatamente de lado qualquer hipótese (e toda a subsequente investigação) de infeção?

Esclarecimento cabal do doente e familiares da tentativa de tratamento


Prognóstico
Dependente da doença subjacente

Abordagem multidisciplinar com apoio psicológico/psiquiátrico, social, coesão


na equipa médica e de enfermagem.
Exemplos de etiologias infecciosas que podem cursar com diagnóstico difícil

Endocardite infecciosa
◦ Semiologia negativa
◦ Hemoculturas negativas
◦ AB prévios
◦ Grupo HACEK
◦ Bartonella, Coxiella
◦ ETT negativo
◦ Sensibilidade: ETT 75% ; ETE 90%
Exemplos de etiologias infeciosas que podem cursar com diagnóstico difícil

Endarterite infecciosa
◦ Infeções de vasos arteriais (S. aureus; Salmonella): infeções de enxertos vasculares ; infeções de fístulas
arterio-venosas

Osteomielite
◦ Vertebral
◦ Queixas de dor podem sugerir patologia degenerativa.

Abcessos intra-abdominais
◦ Queixas abdominais por vezes vagas, ausentes
◦ Localização atípica – trato biliar, subfrénico, diverticular, do músculo psoas-ilíaco.
Exemplos de etiologias infeciosas que podem cursar com diagnóstico difícil
Tuberculose
◦ Formas extra-pulmonares com manifestações atípicas

◦ TB miliar
◦ habitualmente com prova da tuberculina negativa.
◦ Padrão miliar Rx tórax muitas vezes ausente.

◦ TB renal
◦ Febre sem focalização clínica
◦ Piúria estéril
TB do psoas
Dicas práticas
Quanto mais prolongado for o quadro febril menor a probabilidade de infeção

Eosinofilia sugere doença parasitária (helmintose), neoplásica (Doença de


Hodgkin) ou medicamentosa
A existência de mialgias e artralgias não são comuns nas causas neoplásicas
Emagrecimento de mais de 1kg de peso corporal por semana sugere neoplasia
eosinofilia sugere helmintose
Teste do naproxeno sugere tumor sólido e doenças reumáticas
Caso Clínico 3
INTERNAMENTO SDI HSM: 11 -01-2006
Identificação
Homem, 41 anos, caucasiano
Designer gráfico
Solteiro (com 1 filho de 11 anos)
Natural e residente em Lisboa
Doença actual
Início de Dezembro – febre vespertina (<38ºC) persistente

Meados de Dezembro – febre mais elevada (39-40º C) de predomínio vespertino, sudação


noturna, astenia

Início de Janeiro: queixas transitórias (3 dias) de dor ligeira + empastamento cervical direito
(atribuído pelo médico assistente a adenopatia) e disfonia. Manteve posteriormente disfonia.

Ao longo das 5-6 semanas ocorreu perda ponderal ligeira não quantificada

Apetite conservado. Sem outras queixas


Doença actual
Medicado com paracetamol/ibuprofeno.

Investigação ambulatória intensiva (>3 consultas) inconclusiva (análises gerais;


serologias, TAC toraco-abdominal; BFC)
Antecedentes pessoais
Doenças próprias da infância; hepatite A
Mononucleose infeciosa aos 30 anos.

Contactos frequentes com meio rural (atividades de lazer – montanhismo e orientação pedestre).
Último percurso no final de Novembro na zona de Bucelas.
Consumo regular de queijo fresco de fabrico artesanal.
No mês de Novembro esteve muito tempo em ambiente com poeiras, bolores e material orgânico em
decomposição - obras no seu escritório na baixa pombalina.

Sem história de consumo de álcool, drogas, fármacos.


Heterossexual com uma parceira sexual estável desde há vários anos. Sem uso de preservativo.
Exame objetivo
Bom estado geral. Orientado, colaborante.
Pele e mucosas coradas e hidratadas.
Boca e orofaringe sem alterações.
Sem adenopatias nos territórios ganglionares acessíveis.
Tiróide não palpável.
ACP sem alterações.
Abdómen livre, sem organomegalias ou massas.
MI sem alterações.
Pele sem lesões.
Exame neurológico normal.
Hipóteses de diagnóstico
Etiologia infeciosa
◦ Brucelose?
◦ Febre Q?
◦ Tuberculose (laríngea? / ganglionar?)
◦ Endocardite?
◦ VIH?
Etiologia não infeciosa
◦ Doença linfoproliferativa (linfoma)
◦ Tiroidite de Quervain
◦ Doença auto-imune?
Exames complementares
Avaliação de ambulatório:
◦ Hemograma e Bioquímica normais (Hgb 13,4 VGM 86, WBC 7000- 70% N, plaq 243.000)
◦ VS=58; PCR = 7,9 mg/dl;
◦ Hudlesson, Widal, Weil-Félix negativos
◦ Ag HBs, Ac HBs, Ac HBc negativos; Ac VHC negativo
◦ Urocultura negativa
◦ Rx tórax sem alterações
◦ TAC toraco-abdominal: sem alterações
◦ BFC: cordas vocais simétricas e móveis, carina centrada móvel e cortante, ABD com algumas
tatuagens a nível do LM e LID- fez-se LBA+biopsias. ABE: orifícios segmentares e
subsegmentares permeáveis, mucosa com algumas tatuagens (poluição?). Exames
bacteriológicos diretos negativos; culturais em curso.
Exames complementares
Reavaliação analítica geral
Serologias: febre Q, brucelose (Hudlesson / Rosa Bengala), VIH
Função tiróideia
Hemoculturas em aerobiose (3)
Ecocardiograma transtorácico
Ecografia cervical/tiroídeia
Caso Clínico 3
Reavaliação analítica geral com aumento dos parâmetros inflamatórios
Serologias: febre Q negativa , brucelose (Hudlesson/Rosa Bengala)
negativa, VIH negativa
Hemoculturas em aerobiose (3) negativas às 48 h
Ecocardiograma transtorácico sem vegetações
Caso Clínico 3
Função tiróideia
◦ T3 total : 2,4 (0,6-1,81)
◦ T4= 15 (4,5-10,9)
◦ TSH < 0,01 (0,35-5,5)
◦ FT3 7,25 (2.0 – 4,2)
◦ Ft4 2,99 (0,89 – 1,8)
◦ (Acs anti-tiroideus negativos)
Ecografia cervical/tiroídeia
◦ Tiróide com dimensões ligeiramente aumentadas, de contornos regulares, com
parênquima difusamente heterogéneo. Sem evidência de gânglios com dimensões
patológicas ao longo das cadeias cervicais bilateralmente
Caso Clínico 3
Tiroidite sub-aguda

Alta medicado com corticóides, omeprazol e paracetamol, referenciado para consulta de


Endocrinologia.
Caso Clínico 4
INTERNAMENTO SDI HSM: 13 -04-2008
Caso clínico 4
Doente de sexo ♀, 62 anos, caucasiana.
Residente em meio rural (Distrito de Castelo Branco)

2 meses antes
(fevereiro 2008)

▪ Lesões maculo-papulares, eritematosas, por ▪ 1ª consulta - rosácea

vezes pruriginosas e de carácter evanescente. ▪ 2ª consulta – urticária - Hidroxizina.

▪ Surgiram inicialmente na face, posteriormente Dermatologista


no tronco, poupando as plantas dos pés, palmas
das mãos e mucosas.
Internamento
Abril 2008

Caso clínico 4

3 semanas antes
(março 2008)

▪ Febre (T <39º C) sem predomínio circadiano;


▪ Calafrios; Sudação nocturna;
▪ Astenia, adinamia e anorexia;
▪ Perda ponderal de cerca de 5 kg;
▪ Mialgias generalizadas e Poliartralgias migratórias com envolvimento das grandes articulações;
▪ Limitação das actividades diárias;
▪ Edema e eritema periorbitário bilateral.
Caso clínico 4
▪ Antecedentes pessoais: HTA medicada
▪ Negou contacto com animais e picadas de carraças.
▪ Referiu consumo de queijo fresco de fabrico caseiro e uso de água de fontes.
Hipóteses de diagnóstico
Hipóteses de diagnóstico

Neoplasia ▪ Linfoma / Leucemia.


(Com manifestações cutâneas paraneoplásicas) ▪ Neoplasia Sólida

▪ Doença de Still do Adulto.


Doenças do tecido Conjuntivo
▪ LES.
Miscelânea
▪ Tiroidite Sub-Aguda.
(Com urticária concomitante)
▪ Sarcoidose.

▪ Brucelose
▪ Febre Tifóide
Infeciosas
▪ Febre Q.
(Com urticária concomitante)
▪ Endocardite infeciosa
▪ Menos prováveis – TB , VIH
Avaliação Analítica

01.04.2008 09.04.2008
Eritrocitos (x1012/L) 3,81 4,07
Hemoglobina (g/dL) 11 11,9
Hematócrito (%) 31,5 35,1
VGM (fL) 82,7 86,2
Leucócitos (x109/L) 9,83 15,7
Neutrófilos (%) 74,8 80,1
Eosinófilos (%) 0,3 0,5
Basófilos (%) 0,1 0,7
Linfócitos (%) 19,7 16,3
Monócitos (%) 5,1 2,4
Plaquetas (x109/L) 277 438
VS (mm/h) 70 97
PCR (mg/L) 18,5 7,5
Glicose (mg/dL) 180 101
Ureia (mg/dL) 28 43
Creatinina (mg/dL) 0,8 0,7
01.04.2008 09.04.2008

AST (U/L) 40 28
ALT (U/L) 37 29
LDH (U/L) 615 487
γ GT (U/L) 25 33
Fosfatase Alcalina (U/L) 57 90
Bilirrubina (mg/dL) 0,5
Colesterol Total 145
(mg/dL) 39
Colesterol HDL (mg/dL) 168
Triglicéridos (mg/dL) 20
Amilase (U/L) 68
Proteinas totais (g/L) 3,4 4,1
Ferro (mg/dL) 54
CTFF (mg/dL) 238
Sat. Transferrina (g/L) 23
Ferritina (ng/mL) >1500
FT3 (pg/mL) 2,75
FT4 (ng/mL) 1,22
TSH (mU/L) 2,3
Avaliação Serológica

Resultados
Vírus
VIH 1 e 2 Negativa
Hepatite A Positiva (IgG)
Hepatite B Negativa
Hepatite C Negativa
Epstein-Barr Positiva (IgG)
CMV Positiva (IgG)
Bactérias
Brucelose Negativa
Sífilis Negativa
Febre Tifóide Negativa
Febre Q Negativa
Toxoplasma Positiva (IgG)
Estudo da Autoimunidade

▪ Estudo do complemento (C3, C4 e CH50) com valores normais e auto anticorpos negativos (ANA,
ANCA, antiDs DNA).

Culturas

▪ Hemoculturas (3) e urocultura – negativas.

Exames de Imagem

▪ ETT – pequena lâmina de derrame pericárdico anterior; exclusão da patologia valvular.


▪ TC Toraco-abdominal-pélvica – sem lesões sugestivas de doença linfoproliferativa ou lesões tumorais
de órgãos sólidos.
Após a exclusão de várias patologias foi colocado o diagnóstico de Doença de Still do Adulto, como a etiologia mais
provável neste caso.

Internamento
Abril 2008

Naproxeno
250 mg tid

▪ Febre desaparece um dia após o início da


terapêutica;
▪ Melhoria das artralgias e das lesões
cutâneas com cerca de 7 dias de terapêutica.
Caso Clínico 4
A Doença de Still do Adulto é descrita como uma doença inflamatória sistémica rara ou doença reumatológica
com etiologia desconhecida, cujo diagnóstico apenas pode ser obtido por exclusão de outras patologias.

Ausência de um teste específico para esta patologia, sendo o diagnóstico sugerido pela associação entre dados clínicos
e laboratoriais (critérios de Yamaguchi e de Fautrel):
 Febre
 Artralgias;
 Exantema maculopapular, evanescente e eritematoso, ligeiramente pruriginoso;
 Leucocitose com neutrofilia; ANA negativo;
 Exclusão das restantes hipóteses (infeciosa, neoplásica e reumática).
 Ferritina sérica: marcador importante na Doença de Still do Adulto (> 1000 ng/ml, valor 5 x LSN), podendo ser
utilizado para avaliar o grau de atividade da doença.
Comentários Finais
Comentários Finais
Estamos numa época de franco desenvolvimento tecnológico a nível de exames de imagem e
técnicas para identificação de microrganismos.

No entanto, a disponibilidade dos exames é limitada e estes devem ser requisitados seguindo
uma lógica de bom senso clínico e não seguindo uma tabela pré-formatada para todos os
doentes.

Assim, a experiência do clínico e a sua capacidade de integrar esses conhecimentos, aliados a


uma história clínica completa e a um exame físico detalhado (e aos “velhos” meios de
diagnóstico), continuam a ser primordiais na investigação da febre de origem indeterminada.
Bibliografia
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Agradecimentos
Jorge Velez
Patrícia Pacheco
Susana Peres

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