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ISABEL ALDIR
S. INFECIOLOGIA E MEDICINA TROPICAL / CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA OCIDENTAL, E.P.E.
FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DE LISBOA
Definição de Febre
A temperatura corporal varia ao longo do dia, e é controlada pelo centro
termorregulador, localizado no hipotálamo anterior.
Em média a temperatura corporal é de 36,6 °C (IC 35,3 - 37,7 °C).
O valor mais baixo ocorre às 06:00H e o mais elevado entre as 16:00 e as 18:00H.
Durack DT, Street AC. Fever of unknown origin – reexamined and redefined. Current Clinical Topics in Infectious Diseases 11: 35-51, 1991
Classificação de SFI
Durack e Street, 1991
SFI clássica
SFI nosocomial
SFI no doente neutropénico
SFI no doente com infeção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH)
Classificação de SFI - SFI nosocomial
◦ Doentes internados
SFI nosocomial:
o infeções (bacterianas/fúngicas; dispositivos médicos); fármacos; doenças venosas
tromboembólicas
SFI neutropénica:
o infeção fúngica, infeção perianal, infeção bacteriana, fármacos, doença subjacente
SFI VIH:
o infeções (MAC/TB/fúngicas), linfoma, fármacos
UM DOENTE – MUITAS CONDIÇÕES!
Caso clínico 1
R.I.R.S., Sexo feminino, 34 anos
Hipoplasia medular
◦ Anemia – transfusões de CE
◦ Neutropenia (leucócitos 450)- G-CSF
Rx tórax na admissão
Hipoxémia (pO2=55mmHg)
PCR=1,34 mg/dL
Rx tórax na ocasião
TAC torácica: cavitação no lobo superior direito,
padrão em vidro despolido, atelectasia dos lobos
inferiores.
Tuberculose pulmonar?
◦ HRZE
◦ Infeções (30-40%)
◦ Neoplasias (20-30%)
◦ Doenças reumáticas/imunológicas (15-20%)
◦ Miscelânea (15-20%)
◦ Sem diagnóstico (5-15%)
Adaptado de Mourad O, Palda V, Detsky AS. Arch Intern Med 2003; 163:545.
Etiologia
Infeções
◦ Endocardite; Infeções intra-abdominais; Infeções do trato urinário e respiratório; osteomielite;
arterite infeciosa; micobacteriose, zoonoses; infeções fúngicas; infeções parasitárias; infeções
víricas; (..)
Neoplasias
◦ Doenças linfoproliferativas
◦ Tumores sólidos (rim, metastização hepática)
◦ Doença mielodisplásica
Etiologia
Doenças reumáticas/imunológicas
◦ Doença de Still do Adulto, Arterite de células gigantes, Polimialgia reumática, Lupus
Eritematoso Sistémico, Artrite reumatóide, …
Outras
◦ Sarcoidose, febre mediterrânica familiar, tiroidite, febre medicamentosa, meningite
carcinomatosa, febre factícia, doença veno-oclusiva, (...)
Investigação da SFI
O Básico
Noções Gerais
Dar prioridade à clínica, sendo que tal é decisivo para um diagnóstico em 30 a 70% dos casos
Fazer uma coleção de todos os dados obtidos, sendo que isso não deve substituir o raciocínio
diagnóstico, mas sim servir como dado adicional para esse processo
Procurar ativamente locais para biopsar – uma biopsia tecidular pode dar o diagnóstico 25% a
35% dos casos
Ref. 2
Diagnóstico
História clínica
Febre remitente: permanece acima do normal durante o dia, com flutuação >1º C
nas 24h (ex: EI)
Febre intermitente: febre durante algumas horas do dia, voltando ao normal nas
restantes horas (malária, septicémia).
Arquivo pessoal.
Diagnóstico
Exame objectivo
◦ Repetido diariamente
◦ Exaustivo
◦ Atenção particular a locais por vezes “esquecidos”: tiróide, cadeias ganglionares,
artérias temporais, recto/região peri-anal, pele.
◦ Fundoscopia
◦ Alguns sinais – por ex. bradicardia relativa
Ref. 2
Táticas
O princípio da “navalha de Occam”
◦ Non sunt multiplicanda entia sine necessitate
(As entidades não devem ser multiplicadas sem necessidade – Lei da Parcimónia)
Investigação da SFI
O Método
Método
A investigação segue um método relativamente estandardizado
Ref. 3, 4, 5, 6, 7
• Hemograma completo
• Bioquímica (incluindo LDH, CK,
enzimas hepáticas)
• VS / PCR
• Hemoculturas / Urocultura
• Serologias (EBV, CMV, VIH)
• Outras serologias (Hepatites? Febre
Q?)
• FR
• ANAs / ANCAs
• Proteinograma
• IDR e/ou IGRA?
• Pesquisa Sangue Oculto Fezes?
• Radiografia torácica
• Ecografia abdominal
Ref. 3, 4, 5, 6, 7
• Crioglobulinas, Complemento
• Ferritina
• Culturas de fezes, Medula óssea,
orofaringe
• Observação Oftalmológica
• Ecocardiografia
• TC TAP
• PET ou PET/CT (FDG-PET)
• Biopsia óssea / MO
• Biopsia / excisão ganglionar
• Biopsia hepática
• Biopsia da artéria temporal
Ref. 3, 4, 5, 6, 7
Am Fam Physician 2003; 68:2223-8.
N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
N Engl J Med 2022;386:463-77. DOI: 10.1056/NEJMra2111003
Resultado da investigação da SFI por região e estudo (estruturado versus não estruturado)
Estes métodos incluem a sequenciação de nova geração, que envolve a sequenciação de todo o
material genético presente numa amostra.
Além disso, os ensaios específicos para um agente patogénico que visam os genes de ARN
ribossómico 16S ou 18S, a região D1-D2do ADN ribossómico, espaçador interno transcrito e
outras partes dos genomas bacterianos e fúngicos, ganharam uma atenção generalizada nos
últimos anos.
No entanto, os dados sobre o uso por rotina de métodos moleculares em casos de SFI são
escassos e, atualmente, devem ser reservados para casos que permanecem sem diagnóstico.
A fazer: tratamento de baixo espectro, tendencialmente específico para a doença, ao qual se vai atribuir significado
diagnóstico. Particularidade da Prova terapêutica com antibacilares (sem rifampicina). Teste do Naproxeno (250 mg per os
8/8 h, 3 dias); descida rápida ou apirexia em 24 h sugere doença neoplásica e torna menos provável a etiologia
infeciosa. Utilidade é controversa; possíveis vieses em estudos iniciais; se o resultado do teste for “positivo”, deixar-se-
á imediatamente de lado qualquer hipótese (e toda a subsequente investigação) de infeção?
Endocardite infecciosa
◦ Semiologia negativa
◦ Hemoculturas negativas
◦ AB prévios
◦ Grupo HACEK
◦ Bartonella, Coxiella
◦ ETT negativo
◦ Sensibilidade: ETT 75% ; ETE 90%
Exemplos de etiologias infeciosas que podem cursar com diagnóstico difícil
Endarterite infecciosa
◦ Infeções de vasos arteriais (S. aureus; Salmonella): infeções de enxertos vasculares ; infeções de fístulas
arterio-venosas
Osteomielite
◦ Vertebral
◦ Queixas de dor podem sugerir patologia degenerativa.
Abcessos intra-abdominais
◦ Queixas abdominais por vezes vagas, ausentes
◦ Localização atípica – trato biliar, subfrénico, diverticular, do músculo psoas-ilíaco.
Exemplos de etiologias infeciosas que podem cursar com diagnóstico difícil
Tuberculose
◦ Formas extra-pulmonares com manifestações atípicas
◦ TB miliar
◦ habitualmente com prova da tuberculina negativa.
◦ Padrão miliar Rx tórax muitas vezes ausente.
◦ TB renal
◦ Febre sem focalização clínica
◦ Piúria estéril
TB do psoas
Dicas práticas
Quanto mais prolongado for o quadro febril menor a probabilidade de infeção
Início de Janeiro: queixas transitórias (3 dias) de dor ligeira + empastamento cervical direito
(atribuído pelo médico assistente a adenopatia) e disfonia. Manteve posteriormente disfonia.
Ao longo das 5-6 semanas ocorreu perda ponderal ligeira não quantificada
Contactos frequentes com meio rural (atividades de lazer – montanhismo e orientação pedestre).
Último percurso no final de Novembro na zona de Bucelas.
Consumo regular de queijo fresco de fabrico artesanal.
No mês de Novembro esteve muito tempo em ambiente com poeiras, bolores e material orgânico em
decomposição - obras no seu escritório na baixa pombalina.
2 meses antes
(fevereiro 2008)
Caso clínico 4
3 semanas antes
(março 2008)
▪ Brucelose
▪ Febre Tifóide
Infeciosas
▪ Febre Q.
(Com urticária concomitante)
▪ Endocardite infeciosa
▪ Menos prováveis – TB , VIH
Avaliação Analítica
01.04.2008 09.04.2008
Eritrocitos (x1012/L) 3,81 4,07
Hemoglobina (g/dL) 11 11,9
Hematócrito (%) 31,5 35,1
VGM (fL) 82,7 86,2
Leucócitos (x109/L) 9,83 15,7
Neutrófilos (%) 74,8 80,1
Eosinófilos (%) 0,3 0,5
Basófilos (%) 0,1 0,7
Linfócitos (%) 19,7 16,3
Monócitos (%) 5,1 2,4
Plaquetas (x109/L) 277 438
VS (mm/h) 70 97
PCR (mg/L) 18,5 7,5
Glicose (mg/dL) 180 101
Ureia (mg/dL) 28 43
Creatinina (mg/dL) 0,8 0,7
01.04.2008 09.04.2008
AST (U/L) 40 28
ALT (U/L) 37 29
LDH (U/L) 615 487
γ GT (U/L) 25 33
Fosfatase Alcalina (U/L) 57 90
Bilirrubina (mg/dL) 0,5
Colesterol Total 145
(mg/dL) 39
Colesterol HDL (mg/dL) 168
Triglicéridos (mg/dL) 20
Amilase (U/L) 68
Proteinas totais (g/L) 3,4 4,1
Ferro (mg/dL) 54
CTFF (mg/dL) 238
Sat. Transferrina (g/L) 23
Ferritina (ng/mL) >1500
FT3 (pg/mL) 2,75
FT4 (ng/mL) 1,22
TSH (mU/L) 2,3
Avaliação Serológica
Resultados
Vírus
VIH 1 e 2 Negativa
Hepatite A Positiva (IgG)
Hepatite B Negativa
Hepatite C Negativa
Epstein-Barr Positiva (IgG)
CMV Positiva (IgG)
Bactérias
Brucelose Negativa
Sífilis Negativa
Febre Tifóide Negativa
Febre Q Negativa
Toxoplasma Positiva (IgG)
Estudo da Autoimunidade
▪ Estudo do complemento (C3, C4 e CH50) com valores normais e auto anticorpos negativos (ANA,
ANCA, antiDs DNA).
Culturas
Exames de Imagem
Internamento
Abril 2008
Naproxeno
250 mg tid
Ausência de um teste específico para esta patologia, sendo o diagnóstico sugerido pela associação entre dados clínicos
e laboratoriais (critérios de Yamaguchi e de Fautrel):
Febre
Artralgias;
Exantema maculopapular, evanescente e eritematoso, ligeiramente pruriginoso;
Leucocitose com neutrofilia; ANA negativo;
Exclusão das restantes hipóteses (infeciosa, neoplásica e reumática).
Ferritina sérica: marcador importante na Doença de Still do Adulto (> 1000 ng/ml, valor 5 x LSN), podendo ser
utilizado para avaliar o grau de atividade da doença.
Comentários Finais
Comentários Finais
Estamos numa época de franco desenvolvimento tecnológico a nível de exames de imagem e
técnicas para identificação de microrganismos.
No entanto, a disponibilidade dos exames é limitada e estes devem ser requisitados seguindo
uma lógica de bom senso clínico e não seguindo uma tabela pré-formatada para todos os
doentes.