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lrütrio de Notícias.No dia seguinte, o Diário Ilustrado anun
iir para breve Cânticos do Realismo, livro de estreia de Ce,
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€xemplo, que Cesário contava receber 'hplausos do lado dos r í,r íi) ,ll.,d/r.çr7ro
- corl|enta em tom
jocoso e zombete
grandes revolucion ârios" (apud Rodrigues, p. zu) quando rugcns da composição, rro Pa§
publicou o tríptico "Fantasias do Impossível'l em 1874. Con- utrlor ao ridículo.
com o claro intuito
de expôJa e seu -
Con sta que Cesário
tudo, o que de fato recebeu foi uma repreensão pública de ruratação do jornal reagira, exigindo
O referido diáriq uma
Ramalho Ortigão, que, em uma de suas'farpas", comenta em ll (,l na qual entáo, redimiu-se
em
asse vera que
tom de mofa um poema da série: 'Esplêndida'l TeóÍilo Bra- para fazer
viit de fato extra JUI zo do poema lhe
ído trechos ,bs ha_
ga também teria censurado a composição. Para um amigo de menos asquerosos
n()entos, os menos , OS menos
rePugnan tes': E
Cesário, teria dito que considerava condenável que "um ho- ç4, "Em Petr'z,, seria transcrito
que para lhe fazer
na íntegra, para iusti-
mem, para captar as simpatias de uma mulher" tivesse que dessem comprovar qu e todos
o que Parecia óbyio, Pu-
descer 'ho lugar dos lacaios'l Para TeófrIo, "um poeta amante poema 'é simpl gue ,tada verso
esmente u m vomitório,, clo
e moderno devia ser trabalhadot forte e digno e não se devia Vidq de Cesário (apud Figueiredo,
Verde, pp. tzj_rz4). A
rebaixar assirn' (OC, p. zo3). A polêmica quase acabo
Em 1877 Teófilo edita seu Paaraso Português Moderno,
em tragédia. Segundo
época, Cesário
se pode d ePre
teria desafiado
ender de documentos
da
U
M
uma antologia poética representativa do periodo, segundo Pedro Correia, para
o dir etor do Diário
Llustfttdo,
um duelo, que
criterios do editor. Nela, Cesário nâo comparece. No mesmo "O obstácul o estimula,; Por fim não ocor reu.
ano, Cesário compôem o que pode ser considerado seu pri- diz um hemistíquio
riedades , poema de 'Contra-
em q ue o narrador
meiro grande poema: "Num Bairro Modernoi Dias após sua Poeta culto desprezado
lírico si mula ser um
publicaçâo, em 1878, um leitor do Diário de Portugal alude à
pela crítica. Em
assitDilou e pôs sua obra, Cesário
ern prática este
obra como 'tradução infelicíssima de um falso poeta realis- vista. Em r88o, pensamento de
publica uma de raiz positi-
ta" (apzd Rodrigues, p. zo5). Outro, na Correspondência de tiiv('is: "O Sent rmento suas comPOS içôes
mais no_
dum Oci dental que
Coimbra, afrima que a composição "não é romantismo nem consideraram e , muitos críticos
vem considerando
realismo; é uma coisa medonha, informe, caprichada com re- rlc lírgua port ugue§a, peça canô nica
da poesia
ou me§mo da poesia
quinte, ridícula no ensemble, disparatada nas minudências. // (le todos os I írica ocidental
te mpos. Entre seus leitores
É uma aberraçáo numa preocupaçâo de originalidadet" (apud ('Dlanto, o contemporâneos,
Poema não suscitou m no
Silveira, p. 16). Em depoimento que serviria de carta-prefácio ,r trnr ami ars que silêncio. Em carta
8(), Cesário lamenta
à zr ediçâo de O Livro de Cesário Verde, mas que ficou ina- a in diferença com
h)i recebida: "Ninguém que a obra
escreveu, ninguem
cabado, Fialho de Almeida ("Cesário Verde', p. rz) recorda rxÍiciário, n em numa faiou, nem num
conyer§a c omigo;
o tempo em que "Num Bairro Moderno' apareceu. Por essa ttinguem d tsse ninguém disse bem
mall ... Literari amente
época, alirma, Cesário era motivo de chacota nas redações de rece que Cesário - conclui o poeta _ pa-
Verde nào existe,, (
jornais e nos circulos em que se discutiam literatura e poesia. "O obstáculo OC, p. 228)
estim uia'l mas
O próprio Fialho confessa ter caçoado do poeta. às vezes também
pois de "O Senti abate. De-
mento dum Ocide
lim r879, o poema "Em Petiz" provocâ nova reação violen- ciará por quatro ntal'l a lira cesárica
anos. pelo menos, silen-
l.r. t Jnr (lia após ser publicado, o crítico de plantão do Diário inédiro de Cesár nao se conhece
io divulgado entre nenhum
t/rrvrrrrlrr pcriódico que anunciarâ o lançamento de CAíÍi- de 'O Sentimen ro junho de r8go,
to dum Ocidental,; tiar .l
e 5 de setembro (l(.rl
l4 .: lN I llolrtrr. l.t.t
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Pi,l,À,^§ lt,(rN|l)os
quando a revista Á llastraçrio publica "Nós'l Sobre esta com-
posição, a Mariano Pina, diretor do referido periódico, Ce-
sário diz na cartâ que acompanha o manuscrito: "É talue, a
minha produção Írltima, Íinal" (OC, p. 239). E de certo modo
foi. Depois de "N<is", até onde se tem noticia, Cesário só será
,l z4.ra g- -7.2*-, -a
publicado postumamente.
"Nós" é um poema assombroso. Ser publicado depois de
?2
"O Sentimento dum Ocidental" o faz, de alguma forma, ain- 7^.^.r- -)//')
da mais extraordinário. Este, em sua regularidade de acer-
tos, em sua consciência textual minuciosa, geradora de uma
1 .2,-.2.-
./. , -2:
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espécie de complexo sistêmico ou associativo de imagens e -\
sons, Íigura como culminância da traietória poética de Ce-
sário, como produto final aperfeiçoado de ensaios anterio- HOBAS DE FEBBE
res bem-acabados, como poema de6nitivo, enflm. EsPanta
ver, pois, como após sua obra defnitiva, ou sob sua sombra,
Cesário logra afastar-se desse modelo. que em suas máos se
havia esgotado, e alcança formular outro, em tudo ou quase
t*
diferente do primeiro, mas ainda coerente em seus objetivos
e resultados. Sob certos aspectos, "Nós" inicia e encerra uma
-:..,
nova e derradeira fase da produção cesárica, que em muitos
sentidos supera a precedente quando esta superação era to- I!
talmente inesperada por improvável. No entanto, â mesma
indiferença que envolveu "O Sentimento dum Ocidental"
cercou o lançamento de "Nós'l
tre desprezo, indiferença e admiraçáo. Em notas, ainda que tlrn,'làlvez por isso, no mesmo escrito, Silva Pinto tenha se
breves, iornais noticiaram o falecimento de Cesário Ami- .onrprometido compor um estudo sobre a obrâ de Cesário,
a
I I I lfl [[Uilflflilfl I tI I tflUilflUffi UflflflUUIUUUUil!!UUn
gos também manifestaram Pesar na imPrensa Nestes textos' trrt cnsaio que por fim iustificasse aquela edição e os epítetos
à horn"^, mais que o Poeta, gânhava destaque' Aquele' em l tçados. No entanto, morto em r9rr, ou vinte e quatro anos
suma, era honesto, afável, cultoi este, sobretudo' original - tpós o compromisso firmado, a promessa não se cumpriu.
termo que à ePoca podia assumir conotaçÕes vária§' É provável que, quando editou O livlo de Cesário Vercle,
Embora a poesia de Cesário, à parte as polêmicas, tenha §llva Pinto não preüsse a dimensão que sua atitude alcançaria,
I
despertado admiração e tenha recebido manifestações Pon- que a obra seria considerada uma das mais representativâs da
tuais de apoio, é provável que o silêncio que a cercou nos úl- ;xrcsia portuguesa. É possível que Silva Pinto nem sequer sus-
timos anos de sua produçáo perdurasse e a sepultasse para Ircltasse que â edição particular que custeou em 1887 se trans-
sempre. Ou que Cesário passasse à história como um nome lirrmariaem edição comercial em r9or. O fato é que â recepção
entre outros do Parnasianismo Português' O que impediu tkr conjuntodos poemasfoi diferente daque receberam os poe-
que isso viesse a ocorrer foi a decisão de Antônio Iosé da mas avulsos. No livro, os textos, por assim dizer, se galvaniza-
Silva Pinto de reunir alguns dos poemas disPersos e outros ram por aproximação, por contágio mútuo e redistribuição de
inéditos de Cesário e, afirmando que executava plano deixa- forças. "Nós" jogou luzes sobre "Em Petizi por exemplo, eüce-
do pelo poeta, publicar, em 1887' O Livro de Cesário Verde' -versa. "O Sentimento dum Ocidental" valorizou "Num Bairro
Com este ato, Silva Pinto, crítico e escritor de obra irregular Modernol e tambem este àquele, Lidos em paralelo, campo e
e extensa, ganhou relevo na história da literatura Portugue- civilização articularam-se numa narrativa coesa e complexa. E
sa, tornando-se o maior resPonsável pelo resgate da poesia assim sucessivamente. Afinal, o critério de avaliação crítica de
cesárica que se deu durante século xx. poesia, o modo de sua recepçâo, não se haüa alterado de for-
Cesário conheceu Silva Pinto em 1873, quando ambos ma tão substanciâl entre as décadas de r87o e t89o. A geração
eram alunos no Curso Superior de Letras, em Lisboa' Des- que estimou O Livro de Cesàrio Verde, e assim promoveu sua
de então tornaram-se amigos próximos e inseparáveis' Como segundaedição, foi praticamente a mesma que desbancou seus
crítico, Silva Pinto saiu em defesa de Cesário em algumas po- poemas à época em que se publicaram na imprensa.
valor epitetico que Pouco ou nada dizem sobre a Poesia cesá- da poesia portuguesa moderna. Em Le Mouvement Poétique
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Tomás Ribeiro e Antero. Noutro, intitulado "portugue- ,.r cstá em julgamento o valor estilistico das obras: TeófiIo,
se Poets of To-day'l examina poetas vivos, e considera fun, t ;orncs Leal e Junqueiro são bem-sucedidos poetas maxima-
queiro o mais importânte entre eles. Nas duas obras citadas, lrrtas. Ou seja, há em suas realizaçôes coerência entre proje
nenhuma palavra sobre Cesário. Na última, nenhuma espe- r,' ( produto, entre intenção e realização. No entanto, ainda
cífrca sobre a poesia de TeófrIo. Em r9zz, Aubrey Bell lan- rlrc o resultado seja positivo, ele depende de encontrar um
ça Portuguese Literottre, um estudo histórico-literário mais slinatário predisposto à sua assimilaçâo: o que não ocor-
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abrangente que o anterior, escrito a maior parte em t9r6, mas rcu, em sentido generalizado, no século xx. Na concepção
nâo publicado antes devido à guerra. Na seçâo destinada à rlc l:igueiredo, que reproduz perspectiva dominante à época,
"Escola de Coimbral Teófilo é tratado como historiador Sua
c tlccerto modo válida até nossos dias, a poesia maximalis-
poesia, diz Aubrey Bell, vem sendo julgada de modo varia- tn, grandiosa, titânica "é como a marcha de duma fanfarra,
do, uns consideram-na obra de gênio, outros, tentativa fa- (.[tusiasta e guerreira, que ouvida a primeira vez nos fasci-
lhada de exprimir o sublime (p. 3o9). Os poetas de destaque rrir, mas que de audição em audição vai perdendo seu poder
do período são Antero, |oão de Deus e funqueiro. Em segun- lxsÍtivd' (Literatura Portugueso, p. 3r9). Para um leitor do
do plano, Gonçalves Crespo e Gomes Leal- Acerca dos mais ,'úculo xrx, contemporâneo de Cesário, tal afirmação certa-
novos, despontam Antônio Nobre, Teixeira de pascoaes e nrente a6gurar-se-ia equivocada. Em sentido amplo, prefe-
Eugênio de Câstro. Cesário é descrito numa sentença que ria-se então a fanfarra à música de câmara3.
destaca sua frase clara e seu realismo intenso (p. 33o).
Por esse breve recorte, vê-se que critérios de avaliação
A Importôncia de Fernando Pessoa
crítica do 6m do século xrx e começo do xx vão pôr à som-
bra a poesia de TeófiIo. Junto com ela, com o passar dos () primeiro Modernismo português desempenhou papel de-
anos, começam a decair também )unqueiro e Gomes Leal, r isivo no processo de redimensionamento crítico da poesia
ao mesmo tempo em que Cesário vai ganhando prestígio. tcsárica. Em r9r2, Mário de Sá-Carneiro plblica Princípio,
Em r94r, Fidelino de Figueiredo afirma "O Livro de Cesário
Verde, rewido por Silva Pinto, tem subido sempre na esti-
ma das geraçôes novas, ao contrário do que se veriÍica com
]. Antes de Fidelino de Figueiredo. em 1926, Eugênio de Castro, no tex
os poetas mais identiflcados com a estética da época realista' to que escreveu sobre CesáÍio, exteÍna s€melhanle iuizo: 'Ceúrio Verde foi
(Literotura Portugueia, p. 318). Tal fato deriva, entre outros rrÍÍcmpoÍâneo de Guerra Junqueiro e de Gomes Leâl, desses dois poetas
fatores, de uma separação estilistica que o século xx deter- ,Irr. declârâdos inimigos do Romantismo, aos românticos íoÍam buscar e
I'ri .ipâlmente a Victor Hugo, a ênfase oratóÍia, de que abusaram desmar-
minou e enfatizou entre poetas (e escritores) minimalis-
r,rrlanrente, ênfase que depois se lornou epidérmica nos arraiais da poesia
tas, como Cesário, Nobre e Pessanha, e maximalistas2 como
lr,Íruguesâ, e que de si não deixou vestiSios muilo honrosos, poÍqu€, apâ'
'l'eó6kr,
funqueiro e Gomes Leal. Em última instância, não r.rlos0 mas efêmera, bÍilhante mâs oca, era €omo as bolas de sâbào que as
( rllnços sopram por um canudo, e que estoiÍam de repente, desfazendo-se
r"rt iserável pingo dàgua, depois de terem fulgido magnificamente como
2. Claro está que uso o termo "maximalismo" com o sentido oposto ao '
B&,lxN de cristal irizado" ("CesáÍio Verdel CaÍÍas d€ Tolna Viagem, Lisboa,
de'minimalismol "l v'rcn'l p. 96).
'e26,
22 -: IN'I'ToI)UçAO POEMAS REUNIDÔS,- 21
ilmil
livro de contos. Uma das estórias, intitulada 'Loucura..ll ba l.lnr r924, em uma desuas cartas
de torna_viagem, Eugênio
seia-se no Poema "lronias do Desgosto', de Cesário. Dois rlr ( llstnr escreve para resgatar Cesário
e O tiiro de Císarro
4spois, à questão proposta pelo ioÍnal Repúblíca sobre l'rrír,do "injusto esquecimento em que
"nor
'b mais belo livro das últimas três décadas'l Mário de Sá- cairam,l por esse
lt.|ltlx), a simpatia dos modernistas
não havia surtido efei_
-Carneiro responde citando a obra de Camilo Pessanha - t1, li1 rllr, ojovem )oão Gaspar
ainda não reunida em volume -, o Só, de Antônio Nobre, e o
Simões .r...r. i.p..,"r1.
llrlio sobre o poeta. no qual são a"nniau, . a.^onrrr"à",
'livro do futurista Cesário Verddl (O futurismo aludido não das linhas básicas do estilo cesárico.
'ullutnas É possivel que
é por certo o de Marinetti. Com o termo, Sá Carneiro desta- o lnlcresse de Joào Gaspar pela
poesia cesárica tenha nasci
ca um asPecto que desempenhará papel fundamental, como rÍr 0o contato pessoal com
Jose Regio e com a obra em pro.
uar"rn6s, na leitura de Cesário durante o século xx: o de pre- grcsso de Fernando pessoa.
0 primeiro dedica a Cesário um
6r1ro1 de caminhos da poesia moderna.) rt[ltulo quase inteiro de sua dissertação
' de licenciatura, en_
4 6efesa mais contundente da poesia de Cesário, nesse lrcgue em 1925, e que, refundida,
tornou -se a pequefia Histó_
período, sai da pena de um de seus contemporâneos: Fialho t.l1 d1.Molerna portuguesa,
loesia saída"^ ,94r. p"rro" .itu
de Alrneida. Em texto incompleto, publicado postumamen-
I
(
i.sário de modo reverencial em
alguns _À.rr,o, a. ,ru
I
te em 1917, e que, como já referido, serviria de carta-prefá- ,rlrra. como na "OdeMaritima'l publicad" ,o ,.g, nao
cio à 2, ediçâo de O Livro de Cesário Verde, Fialho escreve ti ne orpheu, em iulho de r9r5. nirn.l
uma esPecie de mea culpa de sua geração, que não soube euando a parii. da década
r94o, o espólio pessoano passa poÍ
'I(. revisào crifica e a ele se
compreender e avaliar a obra cesárica. O modo, aliás, como o"
p;r1l,e lê pelos anos "::l:_:l-u ".r" 8*ndeza que hoje se lhe reconhece, a poesia
a poesia de Cesário sumariza o percurso csilnca, por contágio, também
r
se valoriza. Depois dá Silva
destaiúntos a seus leitores. De início, o cronista pârticipa do l,into, Fernando pessoa pode
serconsideraao o
.oro 49 zombadores do poeta, tido como excêntrico por sua p.nsável pela consagraçâo irlncipat .er_
da obra de C.ra.io. i"_
originalidade inusual. Em r892, de modo sumário, reconhe- ,"Oorre do segundo. e dificil preu"r "ã4io
.. n.rla singularidade um aspecto positivo, especialmente ll:l ll,-T.,r:.
IIx) tomariam "os poemas cesáricos
que des_
no século xx.
quando comParada com a produção poética de sua época: A partir da década de r94o, a bibliografia
cesárica amplia-
"911 tneu loiro e divino irregular Cesário Verde! É lendo os t9l* a busca por poemas dispersos
,::.:.9Th' e por
rapazes do teu tempo que a minha adoração por ti redunda I'nrtes primárias de],icia-se
publicação. Começa-se a ordenação
em fânatismo' (Vida lrônica, p. r84). Por lim, na carta-pre- cro-
rrológica da produçâo cesárica,
a recolha ao _at..l"t .pirtoi".
fácio, de modo ponderado e argumentativo, atribui à poesia rlrr poeta. Pôe-se em questionamento
a d i'/rsão de O ivro de
cesárica valor estético superiorn. ,::",r,1:i r:rd::^ d:as parres.
e especuJa_se até que ponro
v l,tnto teria interferido ou nâo na organizaçào Sil_
da obra e nas
I que tardia, a adesão critica de fialho à poesiâ de Cesário pode
,, r ^inda
,,Í!rPreendida à luz de âfinidades existentes entre a obra do prosâdor e
(\ rilor. Para uma análise comparalivâ
.' ,1,, thctâ. Ou seia, as virtudes qu€ Fiâlho exaha na poesia de Ceúrio sáo desse
,rr.rr.,ao. .Áves Migrado;".#;;,::»:iiTi;ll"i:11,? Í:,ll
,,Irtl, r.s as que, adaptadas à prosâ, o contista e cronista perseguiu em seus
! . Bràta-po(o. Livraria Cruz, std,
ry2J, pp.69-27.
I
,,t rN l ltoDt çÀ()
POEMAS REUNIDOS:. 25
I
I I I I I I E
variantes dos poemas. Novos caminhos se abrem para o estu- lllllt{(ln, visiio alucinatória, presente em alguns momen,
do da poesia de Cesário com a obra de Luís Amaro de Oliveira, lu rli,llrisnro cesárico conectou-o com o Surreâlismo. por
Cesário Verde (Novos Subsídios para o ktudo de Sua Personali- ÍÍlro l do, o imanentismo realista, antimetaíísico,
plásti_
dade), qte sai em 944. |oel Serrão aproveita essa abertura e dá r.l'. r rrlrs limites da matéria reprimem
a expansào emotiva
sua contribuiçâo com Cesário Verde: Interpretaçao, Poesias I)is- rIr rr4cilo e u arroubo dramático do verbo,
abrlu caminho
persas e Cartos, de tgtz Em 1964, Serrão publica a Obra Com-
l'|lr'r (l iDragismo moderno substantivado e concreto, con_
pleta de Cesário Verde, trabalho que sofrerá adendos e correçôes , r,rrtrirrkr e nítido. O formalismo,
até a edição de 1988, considerada defrnitiva por seu autor. - <ie
rr r, rt.rarro
Em paralelo à crítica textual, a obra de Cesário torna-se _consciência,,.r.,;';t;'j:;[1'jt#t"t:;
rrrrrrtea de surdina. mas voltado para
â natureza dinâmica
alvo de crítica exegética ou hermenêutica. Pode-se dizer que rr,r r. §tet)cta, c não lrio, estéril,
ensimesmado, ligou Cesá.
todos os grandes nomes do ensaismo literário português r tl, il c('rtâs tendências
da poesia recente qu€ valorizam o
desse periodo empreenderam esforços para ampliar a com- ,, rchral, o matemático, o engenhoso
da foima, em que se
preensão da poesia cesárica. À medida que essa compreen- ,r, orrroda conteúdo sensivel
mas não sentimental. A ficcio_
são se expandiu, as histórias da literatura portuguesa forâm rr,rlrz.rção.da voz enunciante na
poesia cesárica ajudou a
aos poucos deslocando Cesário do grupo de poetas reâlistâs
'1,.\ntantelar o mito da sinceridade Iirica e com isso cont.il
e parnasianos, onde inicialmente apareceÍâ, para dispô-lo l,rrirr para a formação de uma era
da ficção, ou .r. d;;;;
em lugar de maior destaque, até por fim destinar-lhe capi- , ,u
icdade, em que todas as verdades
uir.rn ,ob .urtádia
tulos independentes, ao lado dos principais nomes da lite- ,l,r rlúvida. Dessa forma, Cesário
antecipou o Simbolismo,
ratura portuguesâ. I r.r'rrirndo_
Pessoa, Álvaro de Campos, Alberto
Caeiro, Mu_
r rlr Mendes,
João Cabral de Melo Neto... E desse modo,
a
Cesário Precursor ,'lrra cesárica foi ampliando seu
lugar canônico na literatu-
r.r lx)rtuguesa. Cada herdeiro reconhecido vale um
bônus;
Vanguardas do século xx procuraram na história antepas- (lll rto mais valorizado o herdeiro,
mais valioso o bônus.
sados ilustres, ou potencialmente ilustres, a maioria em bai- ( ) (lue.ajnda nào se íez. ou
fez-se pouco, e cumpre fazê_lo
xa reputaçâo, e tentaram valorizá-los para sacar dividendos rfiori e ter a poesia de Cesário reinserida
em sua instància
dessa valorizaçáo. Com isso, ganhou destaque o viés crítico hisl<irica,lê-la enfim como precursora
de si mesmas.
antecipacionista e â figura do precursor. Foi essa tipologia
de enquadramento que a poesia cesárica recebeu nesse pe-
ríodo, sendo pois valorizada mais pelo que supostamente
5. Nesse sentido, louve-se o rÍabâlho sério
anleviu e pela ressonáncia que alcançou que por suas ine- .
ilÍrgucs, Ceiálío Vede:
e singular de Fálima Ro-
Recep?ào Oitocentista e poir,-.., (Lisboa,
{ Ediçõ;s
rências em busca de diálogo com seus contemporâneos, O "smos. r998,. Sobre â qLre\tào dà 6gurà do precur\or e do viés criti(o an.
balanço harmônico e hibrido, até então imprevisto, do de- r{.(rl\r(lonr\la. verensàio introdulóriode lvan
Terxeira ao romancede Lima
ltãÍrcto, Fim de policaryo euarcsma (Cotia (Sp),
cassílabo e do alexandrino na mesma estrofe fez de Cesário ,Ttiste Áteliê Edirorial,;;;;
*.:'srâ discure a noçáo de pra-r,.r"a*"i,mo
p,rii, áf
um precursor de ritmos simbolistas. A imaginaçáo hiper- lll]..::lll::t:"1 : derignado
r(.rD1o nlslonográh(o
para o penodo. "
26 -: TNTRoDUçÀo
POEMAS REUNIDOS:- 27
/
t, ,,, r rlrrr r rrr.rgntrtica e o bom tom
II. UM PRoBLEMA DE HIsróRIÁ LrrrnÁnre: l,,,,,r1(\ (l('pravadâs.
O DnseNcotrno oe CssÁnro r Ssus
CoNrrÀ,rPonÂNsos I , l,rr,l orrro os pós à marechala.
I {i rrnoi. qttc o lockClub embalsamou,
A questâo é simples: se obra de Cesáriogrânjeou respeito e I rrlr r |l(l!'s dc tigre as regâla'
admiração de gerações de leitores que a sucederam, por que llr ll8rclt (luc por ela apunhalou,
ela foi §eitada ou desprezada em seu tempo? Ou, se Cesá I lllt lullnnte, em Bengala.
rio pode ser considerado, como o faz Eduardo Lourenço (p'
rz5), o grande poeta da Geração de 7o, por que sua poesia foi I ,hrr irlnrt'rrte esplêndidal A cârruagem
incompreendida ou ignorada Por integrantes desse mesmo \it nBrlri subindo devagar;
movimento? Ou ainda, se hoie se reconhece Cesário como I ln, Il, brilhantismo da equipagem,
I l,r, rlc olhos cerrados, cismar
um ilustre representante da Geraçâo de 7o, por que duran-
a
a vorâgem!
te o período em que produziu sua obra esse reconhecimen ^lrticomo
to não foi possível? Que critérios, enfim, fizeram com que a ( h locai()s vão frrmes na almofadal
poesia cesárica fosse marginalizada em sua época e depois
li l rhrce brisa dá-lhes de través
legitimada pela crítica? O episódio envolvendo o poema "Es- Nls capas de borracha esbranquiçada,
ptêndida" e a "farpa' de Ramalho Ortigão pode nos auxiliar Nos chapéus com roseta, e nas librés
nâ tentativa de resPonder a es§as questóes. Abaixo, transcre- l)e forma aprimorada.
ve-se a composição:
li cu vou acompanhando-a, corcovado,
Ei Ia! Como vai bela! Os esplendores No trottoit como um doido, em coN'ulsôes,
Do lúbrico Versailles do Rei-Sol Iebril, de colarinho amarrotado,
Aumentâ os com retoques sedutores l)esejando o lugar dos seus truões,
É como o refulgir dum arrebol Sinistro e maltrajado.
Em sedas multicores.
Fl dâria, contente e voluntário,
Deita-se com languor no azul celeste A minha independência e o meu porvit
Do seu landau forrado de cetim: Parâ set eu poeta solitário,
E os seus negros corcéis, que a espuma veste, Para ser, ó princesa sem sorrir,
Sobem a trote a rua do Alecrim, Teu pobre trintanário.
Velozes como a peste.
/
,rrl, r r, ,t|rHr () contingcntc cotidiano e nrirterial,
,,..,,,r,, r t( n\r() psicoltigicos, liieza de sensitrilidade,
, , r,, lr,,r ,rl ltxtnillho C)rtigilo c(rneça sua crirnica la
r,,,,1,, lrrr.r r tkr satanismo ou "realisrno baudelairia_
r ,lr
,.i,, r'. rt,,\'o\ l)or'lAS portuguescs:
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rápidâ e extr.l()rdinária vulgarizaçiio que
5:6',& ,,' ,,!{ lrrl.rs l,oÍugueses os proccssos literários e os idtais
ãE e ü ãÊsB§iÉÉã1eE E e ,, t
ã iê ai â sÉÉ E-: í á=ã=,
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As FÍtípas, 1874, pp. 75_76.
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ãF?"ir ;;'pjs;;!!; §;' r:gj I )'.|'ols o
cronista passa a discorrer sobre o estilo baudelai_
r t rrr, rrtolldo em contradiçôes, afogado no vício e
na miséria
lrrr,rl, r;uc o poeta francês teria conhecido e experimenta
rir "lluudclaire... é um mundano, um dândi, um corrupto,
ll',.o). (:oerente com padróes de análise da época, Ramalho
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Ilrrrh.;rcrsora lírica epersoza autoral num mesmo plano para
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l€ É rh.vr., cnr suma, estar associado a experiências psíquicas senti-
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rlrrr pckr poeta (ser biossocial), sem o quê o lirismo perde sua
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,rrrrr tle yerdade sentimental - aspecto basilar da poesia se-
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'ó.ê / llm texto de apresentâçáo de poemas de Fradique Mendes, Antero de
é,: l)fr(.olrl assim define o conceito de satanismo: .O satanismo pode dizer-se
r1llc é o rcalismo no mundo da poesia. É a cons.iên€ia moderna (a rurva e
,rIltldr consciência do homem contemporâneol) Íevendo-se no espeláculo
,l s suas misériase âbaixamenros, e extraindo dessa observaçào uma psico_
l(,gin sinistra, rodâ de mal, conrradição e frio desespero. É o coraçáo do ho,
nttnr torturado e desmoralizado, erigindo o seu estado em lei do Universo...
Íi r poesia cantando, sobre as ruinâs da €onsciên cia Ínoderna, §n requiem
c um í.iiei ira€ fatâl e desolador!" ('poemas do Ma cadaÍÍi', O pti,neiro FÍ,,di-
qu. Mendes,loel SeÍrào (oÍg.), Lisboa, Livros Horizonte, 1985, p. 266).
POEMAS REUNIDoS;. 33
gundo a concepçâo romântica e tornâ-se mero exercicio frio rrrrr rro houlevard dos Italiânos e eles vivem na rua dos
Bacalhoei-
um corruPto,logo sua Poesia
de artificios verbais. Baudelaire é ,", . o resuhado é lançarem na circulaçáo uma fâlsa poesia, que nem
é autenticamente corrupta. Baudelaire é um dândi decadente, ,I r orci(, em que nasceu nem para o meio a que se destina.
logo ele está potencialmene capacitado para, com domínio de Ortigão, As Farpos, rg74,pp.78 79.
recursos literários, criar na Poesia, como criou, o "idioma sifi-
litico do crevetismo", nas palavras de Ratnalho (p. 78)3. licilns as reparações iniciais, de âmbito geral, o cronista
Ocorre, porém, que em Portugal - seguindo sempre a li- l,.r\\.t então a comentar o poema de Cesário, tomado como
nha de pensamento de Ramalho - "há honestos emPregados , rr.rrrplo modelar da 'deplorável influência
do crevetismo na
públicos, probos negociantes, pacíÍicos chefes de familia, dis- l,,rr.sia moderna" (p. S:). Em sintese, os argumentos princi_
cretos bebedores de chá com leite ... que deliberaram seguir 1',rrs rlc Ramalho contra "Esplêndida,, são:
o gênero de Baudelaire" (p. 78). Neste descompasso, residi-
ria, pois, uma impropriedade da poesia: o Êngimento Poeti- t. Nas duas primeiras estrofes, (a) .b poeta abusa
um pouco
co, ou a ficcionalização do sujeito e do conteúdo do discurso rhrs tdornos com que veste sua dama, já envoluendo-a em se_
lirico. "Probos negociantes", como Cesário, não podem, en- ,l.rs nrulticores, o queé de um mal gosto
inadmissivel,já fazen-
frm, sob pena de/alsidade lírica, poetizar a decadência: l
rllr portadora dos esplendores de Versailles, donde
é liclto
,lt.tluzirmos que traria à cabeça o Trianon ou que
viria dentro
Como porém Baudelâire era corruPto e eles não sáo corruPtos, rl,rclrruagem fazendo jogar as suas grandes águas,,; (b) o
lar_
como Baudelaire era um dândi e eles não são dândis'como Baudelaire ,írrr qLre leva a "esplêndida', e..forrado de cetim hzul
celestel
r oisl qus ,rraa ar.guém teve e que a ninguém se permite,,;
(r ) os cavalos que puxam o landau da ..sâo
8. Companheiro de geração de Ramalho, Oliveira MaÍlins lê poe§ia §ob
formosa pretos, o
r;rrc tt de saber que nenhuma mulher elegante
o mesmo critério utilizâdo pelo cronista de Ár FalPds. No prefácio que e§ usa senâo uma
creveu para os Sonetos Cofipletos de Antherc de Quer,ld, (Porto, LoPes & v('z única para sc ir enterrar',; (d) ,Uestes versos salya,se uni_
-
C', r886, p. 18), Mârtins observa: "Heine e EsProcendâ, Nerval e Baudelâire ( illcnte uma coisa verdadeira
e sensata, que é a rua do AIe-
viveram vidas inteiras nesse estado de ironia e de sârcasmo, de desesPero e
r |ini'(p. 8o), completa o cronista num
de raiva,deorgia e de abatimento,de fúÍia e de âton iâ--- [. .] O§ românticos' elogio desdenhoso.
mais ou menos satanistas ou salânizâdos, I...lachândoâPenas silêncio e es_
z. Na quarta estrofe, Ramalho repreende ..mau o gosto do
curidão onde tinham sonhado venturas, ou davâm em bêbâdos como Es' iurlnte, que em vez de lhe dar um narcáor de marta zibeli_
procenda, ou suicidâvam-se como Nerval, ou faziám-se cínicos. à maneirâ rra ou de raposa azul, lhe deu uma pele
de tigre, que nâo ser_
de BaudelaiÍe, cultivando com amor as Flores y'o Mal'l De fato, esse modo
v(' scnâo para capachos, obrigando a altivabela
de leilura de poesia, que opera uma fusão de ideniidâdes entÍe voz liricâ e a regalor as
autor (pessoâ fisica), foi muito difundido âté a metade do §éculo xx Den-
nrii(,s na mesma coisa que a gente embrulha os pés,, (p.
8r).
tro dessâ perspectiva, o poema buscaefeito de intersubjetividade, fenómeno
de leitura que se realizâ quando o leilor, Pôr meio de um lexrc Poético, su_
po§tâmente rerre o que o poelarerlilr e tentou lraduzirem Palavras atravé§ 9-  Íeferência à rua dos Bacalhoeiros paÍece fâzeralusão
indiÍetââ Ce_
do poema. Por esse ângulo, poesia é o esforço de tradução de uma verdade ri(\ que trabalhavâ na rua dos Fânqueiros, local onde se situâva
â loja de
sentimental- E se o sentimento expresso é falso, isto é, não logra Passâr Por {ntlstii.io Verde,paidopoeta. Ambasasruas,próximasenlresi,lo€ali;am-
verdâdeiío, o poema e o poetâ também o sáo. i( rxr ccntÍo de Lisboa.
I
I
rrrrxkr falhou?
valação"o (P 8z).
o seguinte comentário: "E ei§ l'llra ensaiar uma resposta plausível a estas questóes, to-
4. A oitava estrofe provoca
fingida perversão leva.um rrrc sc de inicio a última observação de Ramalho, da sínte-
aoui está linalmente a que uma
de si rr' rlos comentários de sua crônica: "Fazemos a dignidade
il.*, ,rtr., p.rf.ilamente digno e brioso: a afirmar
quer ser Ia- rlrrlc jovem poeta a justiça de acreditar que quebraria
do ideal' que a sua
ni.r.o .o^o u nn" flor Predileta
hcrtgala nas costas de quem lhe atribuísse em prosa as ma-
caio!" (P. 82).
---5. "Fa- llclrus, a ,oilerre, os pensamentos e os instintos de que ele se
E io, leitura do Poema como um todo:
nrn, ,oU,e a
a de acreditar lkrria em verso'. Em paráfrase redutora, para fins de aná-
zeÁos a dignidade deste iovem Poeta
tr" bengala nas costas 'ustiça lhe atribuis-
de quem lllc, o mesmo periodo frasal poderia ser assim expresso:
lr" qu.uruii"
" t guém dissesse ao poetq em prosa o que o poeta aftm.t
os Pensamentos e os lns
,a a* pru"u auneiras' a
"r se gloria em 'oileÍte'
verso' (pp 8z-83)' fu mesmo em yerso, isso confguraria um insulto,
si A afrt-
tintos àe que ele
trtuçâo de Ramalho faz distinçáo entre dois modos de elo-
r uçlo associados a dois modos de recepção: prosa e verso.
Verso e Prosa
( i,nl efeito, pâra uma compreensão mais ampla e adequada
de Mariano rIr problema, necessário se faz desdobrar o modo prosaico
Como iá referido, sabe-se Por depoimento
fin", .ána".potaneo de Cesário' que ao publicar
o
aià"; . tetl "Fantasia do lmpossível" Poeta
"Esplên-
"esPera-
r.rr tlois: prosa de confissâo e prosa de ficção. Em seu tex-
to, Ramalho alude à prosa de conlissão, utilizada nas rela- II
" Tambem §(,cs sociais como forma de comunicaçâo denotada, como
i"-.pt"uro, a,, tuao dos grandes revolucionários'l
de Cesário que Teôfi- lirrguagem unívoca ou tendente à univocidade. A prosa de
como 1á ,.f.riao, sabe-se por cârta
o licç,ro constitui uma yariante da prosa de confrssão. Seus
lo Braga, além de Ramalho Ortigão' censurou Poema'
se pode chegar a partir des- nrccanismos de formulaçào da mensagem são mais com-
A priÁeira conclusão a que
..,'a"aot é: Cesário idealizou de maneira equivocada
seu plcxos e exigem uma participação ativa do destinatário, -
r;uc deve estar munido de conceitos culturais específicos
para decodificar informações dispostas no subsolo do tex- -
em r85! Pâra servir como
ro. A Estràdâ da Cir(unvàlaçáo loi'onstruidà lo. Veja-se um exemplo tomado da prosa de frcçâo realista,
i" ,l"rã* O, ' 'dàde
deL'i\boa' Êm r8só Íorexpandrdaparadelinir -
".0r,. rlue ó o modelo que aqui vai sob análise:
or âtuaÉ limrles dâ càPrlal Porluguesa
POEMAS REUNIDOS: l:
3ó -: INTRoDUçÀo
I
a tÍemer-lhe nas pálpebras que [Luisa] Nr prosit dc confissão, o enunciado busca uma forma de
Foi com duas lágrimâs
da [)ama das Cafiélin' F eatené'id^ n^ nltairc' rllÍlltl( ilçiio direta com o leitor, que procura a mensagem
âcabou as páginas r
com o livro caído no regaço' fazendo recuar a pelicula das unhas' rr,r r[|t.rllcic do texto e a associa metonimicamente a um
rica da prosa de confissão. Por seu turno, a poesia lirica era ,r scrrsibilidade e, por conseguinte, auxilia na edificaçào de
lida como uma yariante seífirflental ou sinceru da prosa de rrrl soçiedade menos hipócrita e mais iusta. Foi, digamos,
confissão. A sinceridade lírica foi um aspecto que os revo- lrr.r hipocrisia, contra a qual se voltaram os novos de Coim
lucionários de Coimbra defenderam contra o convenciona- lrr,r. que Ramalho identif,cou em "Esplêndida" e por isso
Iismo estafado do ultrarromantismo. Na nota que escreve r (rsurou o poema. Mas
- e volte-se o problema outra vez
para a r! edição de s\ras Odes Modernos, publicadas em r86t, t i.sário nâo pretendia ser hipócrita e sim revolucionário, ou
Antero declara: "Este livro é uma tentativa, em muitos pon- no nrenos afinar se com os revolucionários, que admirava.
tos imperfeita, seguramente, n1as sempre sincera, para dar l)ara tanto, Cesário, por influência de Baudelaire, incor-
à poesia contemporânea a cor moral, a feição espiritual da
||orou em "Esplêndida' recursos próprios da prosa de Íicção
sociedade moderna" ("Sobre a Missão'l p. 208). No mesmo rcirlista. O principal deles é a'disparidade de compreensão,
ano, Antero assina o prefácio de Carúos .t Solidôo, volume cnlre personagens, narrador, leitor e âutor que provoca o
de poemas líricos de Manuel Ferreira da Portela; nesse tex rli.ito irônico. Nesse sentido, se pode dizer que Ramalho leu
to, discorrendo sobre arte e ciência, assevera: 'A ciência dá r 1nn agudeza os excessos de mau gosto que o poema descre
ao gênio a segurança, a frrmeza que fazem a consistência e a v(, mas não entendeu, ou recusou se a entende( o viés irô_
exata proporção das obras. Mas a obra, essa sai toda da alma Iico, pelo qual o autor (ou a consciência manipuladora dos
para a alma não há senão uma lei: a sinceridade" ("lntro- rccursos textuais) critica estes mesmos excessos. Tomem-se,
duçãol p. zz9). por exemplo, as duas primeiras estrofes do poema. Nela, Ra-
rnalho repreende o fato de que'b poeta abusa um pouco dos
12. Para oconceito de ironia, trabalhocom â de6niçãode Robert Scholes ldornos com que veste sua damal Mas não haveria nesse
& Robert Kellog, dispostaemThe Núure oí NaffdÍi"e (Oxford UB 1968, p. ahuso uma velada intenção de desmerecê-la? A comparação
24o): 'A ironiâ é o resultado de uma dispâridadede compreensáo. Em qual-
tla esplêndida e sua carruagem com o palácio de Versalhes,
quer situâçào em que uma pessoa sâbe ou percebe mais - ou menos - que
outra, â ironiâ está real ou potencialmente presente. Em qualquer exemplo irmbos atravessando a entâo provinciana rua do Alecrim,
de arte narrâtiva há, de modo 8eral, três pontos de vistâ - o dâs persona' líigura se claramente carnavalizadora e etpôe assim o sen-
gens, odo nârradore o daplâteia. À medidaquea nârrativavai se tornando tido humorístico do texto. Pelo humor, se poderia chegar
mais sofisticada, um quaíto ponto de vistâ deverá ser acrescido, decorrente
ii ironia. Mas Ramalho não chegou, ou não quis chega( e
da nitida distinçáo entre narrâdor e âutor. A ironia narrativa é uma funçâo
(lcstacou negativamente o cetim azul celeste d,o landau da
de dispâridâde entre estas trés ou quatro perspectivas. E os âÍtistas da nar
ração estão sempre atentos pârâ provocâÍ estâ disparidade a 6rn de obter lirrmosa,'toisa que nunca ninguém teve e que a ninguém se
efeitos variadoí1 pcrmite", e a carruagem puxada por cavalos negros, 'que ne-
1., -, INTRÔDlJ.,iÔ
POEMAS REUNIDOS:- 4t
t-
nhuma mulher elegante usa senão uma vez única - para sc \ l,r1 i (luc pnrece ter ofendido mais Ramalho
' foi o rebaixa_
ir enterrar". Mas não seria o enterro da "formosa aristocrata". ,,,, r,r,,,l.r Íigura do poeta. A "fingida perversào,de
um,.pro_
deslocada em um meio provinciano e pegueno-burguês, quc 1,.' ,.,I)t iinlc" representar-se a Si mesmO como um amante
o poema ambiguamente anuncia? i,, \ r,tr((| c nrasoquista insultou a sensibilidade do
cronista.
Veja se agora um exemplo extraído de OJ Mdial (1888), lr rllrllx) niio considerou que a coerência narrativa
do poema
de Eça de Queirós. Raquel Cohen e esposa do banqueiro |a' , r ttlr,r llnr sujeitolirico psicologicamente perturbado para que
cob Cohen. Na estória, ela se envolve amorosamente con'l ,, , ,,rrstruísse o elogio irônico da mulher esplêndida.
Uma voz
foão da Ega. O luxo dos Cohens confunde-se um pouco com Irr r, .r rlre proviesse de um narrador consciente
e equilibrado
a imoralidade do capitalismo: ela, bela e adúltera; ele, passi ,1. \r.t titconstruir necessariamente um discurso moralista, e
vo e preocupado com lucros financeiros. Raquel Cohen era, t".,, rlrsllria o ludismo irônico de frngir para ser sincero.
Essa
na sociedade que frequentava, famosa e muito admirada por ,rrrr r.r irlade, no poema, parece manifestar_se
num único ver_
sua fnesse: "Nos iornais, na seçào do High-liJe, ela era 'uma ,,,, r, l)cnúltimo, em que o narrador, em atitude ambígua, po-
das nossas primeiras elegantes': e toda a Lisboa a conhecia, e !1, lrxtit-se de costas para a "formosa aristocratal
a sua luneta de ouro presa por um fio de ouro, e a sua caleche lirr suma, se se ler "Esplêndida', em chave irônica. os elo
azul com cavalos preros" (p. r3o, grifo nosso). llrr's il nlusa do poema tornam-se insultos, e a apologia amo
A confiar nos comentários de Ramalho - que sâo, com r'r\.r lransforma-se em ataque politico e moral contra os
efeito, bastante confiáveis -, deve-se ler, pois, a 'taleche r,rhrrcs que a dama esplêndida representa: luxo, arrogância,
azul com cavalos pretos" de Raquel Cohen como uma no- lr tvolidade, lascívia. E é de se supor, segundo argumentàs
aqui
taçâo irônica do gosto duvidoso e fúnebre da personagem, liln,stos, que Cesário esperasse que o poema fosse lido em
que, em oposição aos leitores e ao autor, vê nestes objetos , h.rvc irônica, e assim ele poderia receber .aplausos do lado
índices de suprema elegância. Na prosa de ficção realista, , i rs grandes revolucionários : mas isso não ocorreu. Em parte.
a ironia acomoda-se naturalmente, e não faria sentido um , r,rx) se vem tentando demonstrar, porque
a tipologia de lei
critico vir a público e dizer a Eça que a caleche azul e os ca- trrrn irônica de poesia não estava difundida à época; em par_
valos pretos de Raquel Cohen depôem contra o texto e o lc lambém porque o humor no poema, ainda que presente,
autor. De fato, depóem contra a personagem e a favor do rriio se manifesta de modo tão claro, o que lhe poderia servir
autor. Mas no caso da 'tsplêndida', faz sentido que Rama- rlc salvo-conduto. Poemas byroniano-irônicos de Álvares de
lho, como leitor de poesia, se melindre com o "mau gosto Azevedo como "Namoro a Cavalo,ou..É Ela! É Ela! É EIa!
É
do amante, que em vez de lhe dar um manchon de marla ljla!'l Por exemplo, possuem quase os mesmos ingredientes
zibelina ou de raposa-azul, lhe deu uma pele de tigre, que que "Esplêndida": prosâísmo (narratividade incluída), ficcio,
não serve senão para capachos, obrigando a altiva bela a nalizaçào da voz lírica, rebaixamento do suieito Iirico, humor.
regalor as mâos na mesma coisa que a gente embrulha os No entanto, este último componente se manifesta de m<tdo
pés'l Afrnal, a aliança secreta entre leitor e autor contra nar- nrarcante, e na sátira vale o gesto carnavalizado de represerr-
rador e personagens é processo típico da prosa de Íicção do tar as instituiçôes (não apenas ciyis, mas retóricas, senlinreD
período, e nâo da poesia lírica. tais) às ayessas. "Esplêndida'tem ares de poerna si,rio, otr liri
42 -: INTRODUçÁO
ll
I I I
lido como poema serio, sem de fato o ser. Sob este asPecto, a Ihrirlirro lirico com poema narrâtivo, gênero largâmente
composição é mais baudelairiana que byroniana. Baudelaire Itíllr n(Lr no tcmpo de Cesário. O poema narrâtivo român- ffi ffi ffi ilf f f tuüff f iiiüff IiIüüüL
cultivou um tipo de enunciado Poético que reclamava dois lh r rh.rlva da epopeia clássica, que o novo modelo poético
destinatários ou leitores ideais: um conservador e outro liberal arl.Itd llo golito da época. O lirismo prosaico é um gêne-
(na acepção mais ampla desses termos). O efeito peculiar do hr lrllr|ldo, que busca produzir efeito de subjetivação senti-
verso baudelairiano consiste em ser lido de modo equivocado ttrr, lll gr(}r meio de recursos prosaicos, em particular a ação
pelo primeiro e, ao mesmo tempo, forjar vínculos de afinida arrrrllv . Seus precursores imediatos no século xIx sâo so-
de com o segundo'3. Em seu esforço para tornar-se moderno, lrl'lttrlrt rt Byron irônico de Poemas narrativos como "Don
Cesário leu Baudelaire com mais amPlitude de compreensão Ir r r r il c os poemas de Jlônerie de Baudelaireta .
leram com parâmetros hugoanos um Poema que foi escrito lr.,rla'ou da "consciência poética1 Estâ, em suma, foÍmula o conhecimento
para ser lido com critérios baudelairianos' os mesmos, aliás, lxú llr.b do pensamento metúsico, e aquela prende-se à lógica materiâlista
-
utilizados pela crítica no século xx. l'.r . o rlo de construçáo do significâdo cultural. Desta, em tese, provém o Í'lu-
r.r Íülonal da discuÍsividade pÍosâicâ que se âjustou à no sociedade e pôs
íllr ( hcquê a verticalidâde mistico'egótica do fenômeno lirico. Em sua EsÍer|a
III. BREVE HIsróntco Do PRosÀísMo NA I rl rr 845), Hegel faz um diâgnóstico claro da questáor "Em épocâs remotas,
r ffi1lll
rlr.odo concepçôês do mundo, determinadâs por crençâs religiosâs ou por
CnÍrtce CrsÁnt c,c. rÍrúlsquer outras, não formavam âinda coniuntos de repÍesentâçôes e de €o-
llhcdrrcnlos racionâlmente sislemáticos e nâo estavâm âinda em condições
A poesia de Cesário âssimila e manipula recursos tíPicos rlr ragrar a atitude humana aonformemente a estes aonhecimentos, a poesia
da prosa de frcção sobretudo realista: suieito lírico ficcional, lx xll,r cxpandir-se com toda a liberdade. Não se encontrava entào em frente dâ
personagens, esPaço e temPo demarcados, ação narrativa, Irí,§n como ante um dominio independente que devesse conquistarou englo-
hlrr, nrirs a sua tarefa consistia apenas em aprofundar as significações e escla-
estilização da linguagem coloquial, enunciado que reclama
r.. cr âs pÍoduções de outÍa consciência, da consciência !,ulgar. Mas quândo a
leitura irônica, motivos cotidianos, imanentismo imaSético.
llrl,sâ cons€guiu atrair para a sua esfera o conjunto do conteúdo do espírito e
Estes aspectos como um todo estão associados ao conceito llrl)rimir o seu cunho em cada um dos seus elementos, â poesia passou a as-
de prosaismo, termo crítico em Seral reduzido a dimensÓes rurnira missáo de se refundir completamente e, dada a rudeza do prosaico e a
r$!.âpacidade de resistência, encontrou'se rodeada de numerosas dificulda'
sintático-lexicais (coloquialismo). Não se deve confundir
dci" lt\tética / Poesia,iad. Álvaro tubeiro, Lisboa, Livrâriâ GuimâÍães, r98o,
Irp.3ó.32). Em sintese, emsua nrissâode refundir se diântedo triuníoda pro
rl. Cl Dolf Oehler, Qaatlros Paisienses, tÍad.losé M M.deMacedo& r. cdâconsciência prosaica, a poesia, marginâlizada, buscou para si novos ca
sâmuel Titan ,r, Sâo Paulo, ComPanhiâ das Letras' 1997 pP. 53 e ss. rrinhos, e um deles foi a assimilaçãode traços do triunfadoÍ
I \-
pria epistemers, que dehne o modo de a consciência humana nl lvl,rri "Nr'rs'l
ainda que independente, é uma célula contí-
racionalizar e sentir a naturezâ. Hoje, enÍim' a combinaçâo rd r.lnscl)ariivel da obra de Cesário.
desses íatores favorece a Poesia cesáric.r. lrr sul rtipicidade, "Desastre" é talvez o único poema
rL,rtrrr ,lvel do conjunto â que pertence. Nesta composiçáo,
IV. DEPOIS DE.ESPLÊNDIDÂ',: HIPóTESE DE I r,ilr h) cnsaia um modo estilístico a que não mais voltará: o
rlrr rtrrrcridade edificante, que busca efeito de intersubietivi-
Tne.lrró nt-e. DA PoESIA CEsÁntce.
rlrrrh., rxr comunhão sentimental entre suieito lirico (porta-
Cesario Vertle, que licou incompleto pela morte do Poeta, Â ccna urbana, o acidente do operário da construçâo ci-
apresenta pontos de afinidades com "Desastre" no que tan- r ll, {s reaçôes dos transeuntes, a notação ágil, a linguagem
ge ao conceito de poesia social' segundo critérios românti- I l!{, tomada de estrangeirismos, tudo isso mostra um poe-
cos. Mas não se sabe que direção "Provincianas" iria tomar' l,r r[rc, cm seu anseio por ser moderno, luta para incorporar
Antes de "Provincianas" - supóe-se que imediatamente an- rr r,lcnrento social. Pois uma dâs questões centrais da época
tes - Cesário comPôs um Poema autobiográfico e memoria- fl,r lomo o artista poderia contribuir para a edificação de
lista: "Nós'l Nessa última fase de sua produção, â voz lirica rrrru sociedade nova, mais iusta e igualitária. Em tese, o poe-
dos poemas cesáricos buscou conciliar-se com a voz auto- l,r rcvolucionário deve, com sua obra, se náo fazer, ao me-
rros iruxiliar a revoluçâo liberal, de fato, em curso no tempo
rk' ( lcsário. E cantar a Justiça para sensibilizar os leitores era
Uma deliniçào con.isa e eli(az do conceito de episteme' segundo
15.
rrrrra alternativa disponível à época.
o concebeu Michel Foucault, en.ontra-se em Líterary Üili'ism: A lntro'
Mas ser revolucionário pelo caminho da sinceridade so-
duction to Theory ani! Prarli.s (2nd. ed., UPPer Saddle River' NL PÍentice
Hall, 1998, p. 242), de Charles E BressleÍ: 'Para Foucault, â História é uma r lrrl não parece ter satisfeito o poeta, que depois da experiên-
complexà inter-relaçáo de vários discuÍsos ou modos discursivos arthti_ r l,r tlc "Desastre" abandonou esse viés. No entanto, apesar de
co, social, politico - pelos quais as Pe§soâs Pensâm ou expressam o mun- rrn singular atipicidade, que empurrou o poemâ para a pe-
do em que vivem. Não é âo acaso que estes discursos inleraSem num dado
r lltria da obra cesáricaró, "Desastre" desenvolve um aspecto
momento histórico, eles estão subordinâdos a um princíPio unificador que
Foulcault chama epirleme: por meio da linguagem e do pensamento, cada ftrrnlal que o integra, ainda que de modo tangencial, ao con-
periodo na Históriâ desenvolve suâ PróPria percePçáo da nâturezâ do real
(ou o que se de6ne Por verdâde) e.riâ suas próPrias normas de comporta_
mento aceitável ou não, além de seus critéíios Para julSar o que é bom ou ró. Depois da primeira publicaçào, em em outubÍo de 1875, "Desastre"
mau, e como as pe§soas exprimem, protegem e su§tenlam PâÍâmetros pelos r o scrá reimpresso integrâlmente até 1961, em Cerário Verde . a "Cidade
quais verdâdes, valores e âçôes sào considerâdos ãceitáveii: ,r.n,i.d (Porto, Tipogrâfia Modesta), de Alberto MoreiÍa.
\
iunto da obra cesárica: o prosaísmo decalcado da ficção rea- Nrtr se sabe a que poemâ está se referindo Cesário.
O
lista. Com efeito, "Desastre" é uma espécie de conto realista l.to (lc uludir à sua "última maneira,, indica porventura
esse
versificado e rimado. O narrador impessoal, o fato trágico, o lr,llt;rr tle experiência, indefinição, ensaio de estilos
diver-
quadro social pintado em âmplitude, o modo de organizar o lu  "irleia de justiça' fez com que Alberto Moreira (p. zr)
tempo com o impacla\te início in tnedias res e o Jlashback
- rotrrltrísse que a composiçâo em causa fosse ,,Desastre,]'pss_
articulador de causa-efeito da narrativa (w. 33-48) - e seu |$ .la fato justiceiro. No entanto, outra hipótese plausível é
sentido analítico, bem como outros elementos do poema lhe I rlc que o poema citado seia ,.Nevroses', (rebatizàdo .Con_
emprestam caráter de prosa reâlista adaptâda ao yerso. Em lr(rl(dades" em O aivro de Cesário Verríe), publicado
quatro
suma, após o 6asco de "Esplêndida'l em "Desastre" Cesário ltÍtcs c meio depois de "Desastre,l e cujo assunto central
éo
altera o modo discursivo (de irônico para sincero), o tom trt,rr.lo injusto com que o mundo
moderno e a nova cultura
elocutório (de humorístico-amoroso para trágico-elegíaco, rh llassas tratam o artista estudioso, consciente
da tradiçâo e
de uma fria e moderna elegia) e o ponto de vista (de pessoal rh.rllcado a seu ofício. Nesse caso, a ..última
maneira,, possui
para impessoal) mas mantém o aspecto prosaico e narrativo, rr.rrtido profético, pois a partir de..Nevroses,l
Cesário càmeça
além do espaço urbano. r rlcíinir sua maneira típica, pela qual será en6m reconheci_
rIr co1p6 pq"1" rno6erno, ou simplesmente poeta,
se não por
" Ney r o ses -C ontruriedades" i(us contemporâneos, pelas geraçóes que o sucederam.
(irmo já se afirmou, entre ..Esplêndida,,e ,,Desastre,,há
Tal como "Esplêndida'l "Desâstre" também não trouxe o urna passagem bastalte marcada da ironia para
a sincerida_
reconhecimento de poeta moderno que Cesário perseguia. do humorismo amoroso para a tragédia social,
rL..
da subje
De fato, até 1875, a poesia cesárica é um laboratório de ex- tlvrçilo sentimental (eu) para a objetivaçâo analitica (outro),
periências em que o escritor luta para encontrar e definir r onro se "Desastre" fosse o reverso de ..Esplêndida, _
o que re_
seu estilo, e por ele se íazer notar. "Esplêndida' é publicado tlrça a tese de que Cesário escreveu ,.Desastrd, como
uma res_
ao lado de "Caprichos-Responso' e 'Arrojos", duas compo- posta deferente aos conselhos de Ramalho
e TeófiIo, ou como
siçôes de estilos diferentes entre si e em relação a "Esplên- rrnra espécie de zea czlpa ,.Esplêndida,r7.
por Sob a luz destas
dida'l "Ironias do Desgosto'l de setembro de 1875, um mês,
pois, antes de "Desastre", ensaia um lirismo de tipo filosó-
fico-decadentista. r7 É possível rambém que Cesário ou Silva pinto renhâ
.. excluido "Es
Em carta sem data a Silva Pinto, Cesário escreve: filodida'de O Lrvro.re Cesário Vede pot contadâs criticas de Ramalho
í 'ltófiIo. No entanro, se Cesário negou "Esplêndid",l
n"g.;;;;
rrrf',rmente sua rdprca ( À [enw "1. "ào
Jatdld e, pot asim dizer. *eu mádelo re
A poesia queeu hoie te mândoéâ minha última maneira. Vês por lónú, dls(ursivo: o do elogio tÍôni(o, em que o conteúdo
dâ menragem e
ela que eu não desprezo de modo algum o coração, que quândo des- rl(sí(rto ou inverrrdo quando âlguns elemento\ tertuais \jo
a(ronador por
prezâdo não deixa brotaÍ nenhufia obra de arte. Mas o que eu desejo ttm lcitor agudo e malicioso. A tópica e o modelo
retórtco de "nsplCndáa;
(rir) Íesgrtados e reeldborddos em composições como ..De\lumbramen-
é aliâr âo lirismo a ideia de iustiça (OC, p. 2ró).
los: Frigidà' e sobreludo..Humilhàçôes,: O fâio de Cesáflo ter trãbalhJ-
do (,,m esses etementos depois de .,Esplêndidâ..nào invalidà â tese de que
duas composiçóes, enlim, "Newoses-Contrariedades" ocuprr lrúrlrlrrr, niio propriamente pela pobreza desta mas por sua
Iugar signif,cativo na trajetória do lirismo cesárico, pois nestc Irt l'l' 1./ riittirifêita e seu comodismo frívolo. Dessa forma, o
poema fundem se, sob certos aspectos, os outros dois. |rI rrrrr rrllicula dois eixos narrativos, o do poeta debruçado
"Contrariedades" (a partir de agora omite-se o título pri lt'lÍr \l nlcsnro (vertical, febril como o narrador de "Esplên-
mitivo) estrutura-se em dois planos narrativos: um poeta em r (, do poeta voltado para a engomadeira (horizontal,
'lt'lú")
revolta porque um jornal lhe rejeitou "um folhetim de versos" Ir tr r r onll o narrador de "Desastre"). Na encruzilhada desses
e uma engomadeira que trabalha e é obseryada pelo poeta. , úllrlIlx)s, o impasse da poesia: como revolucionar, instruir,
O registro discursivo simula sinceridade, mas a ele mescla-se l l,!lhllizar quem não se interessa por revoluçâo, educação,
o efeito de ironia que provém do cruzamento de planos, em ú rtr,í li por que veiculo, se todos estão fechados para o artista
princípio, incongruentes: o do poeta e o da engomadeira. Ela -
nrlr'[llco, comprometido com a tradição e com a moderni
representa o elemento social que a poesia, segundo normas e ,l,rrlr.í llil uma crise cultural localizada no canal da comu-
expectativas culturais da época, deveria abranger ou incorpo- llt, ú\tl, c no destinatário, que desacreditaram da poesia e
rar. Ele representa a consciência da arte superior, marginali- l,rr,k.rcnr a prosa de entretenimento. Como responder, en-
zada pela cultura de massas. Ambos, enfim, irmanam-se pelo Irt. lt csse impasse e seus obstáculos? Uma vez mais, para
sentido de marginalidade social. No entanto, ele revolta-se, t r"'iIio,'b obstáculo estimula': E a resposta parece vir atra
convicto de seu valor, lutando para afirmar sua arte, enquanto rlr rlc "Num Bairro Moderno]escrito cerca de um ano de-
ela resigna-se, alienada, cantarolando "uma canção plangente ;,r rtr rlc "Contrariedades'i
/ duma opereta nova'(w. 6r-6u). Como pode entâo o poeta
moderno cantar o povo se este, em sua alienação resignada, "Num Bdírro Moderno"
está surdo para as artes e se satisfaz, alegre, com manifestaçóes
de baixa cultura? Como revolucionar se os mesmos beneficiá I I rrrodo sumário, no afã de reconhecimento, Cesário tentou
rios da revolução não demonstrâm interesse pela represen- , "I.)splêndida'a musa rica, o sentimento ardente e fingi-
r,rrr
tação de uma sociedade revolucionada? Ao mesmo tempo, ,L r. rr discurso elaborado e irônico, que busca significar às ex-
conte-se o problema da imprensa, que alimenta a sociedade ;,r.rrsls do que diz, e falhou; com "Desastre", cantou o homem
com lixo cultural e barra vozes lúcidas. \lrrl)lcs, do povo, com linguagem franca, objetiya e analítica,
"Contrariedades" atualiza a tópica do desconcerto do mufi onÍ) um cientista, e falhou de novo; com "Contrariedades,l
'
do, correlacionando-a ao universo das artes na sociedade o elitismo da poesia e do poeta, a mercantilizaçâo da
',rrlrc
moderna. O poeta sofre com sua situação e com a da engo- ,rr lc pela implgn$ ç o plebeísmo do trabalho não especiali-
L-.
poesia numa sociedâde regida pela banalidade é a especitrli 1,, ,r rrr, s jrrsto (no duplo sentido dejrsfiça e precisoo) a
zação do poeta, seu aperíeiçoamento técnico no lidar conr .r nl, nrr r
( ()ttl() trtista.
caçáo que demanda ]uÍna resoluçAo. Aotestemunhar um con- . coírâquecera demâis pâra poder palpitar com paralelo vigoÍjunto do seu
.orâçào: E complela: "De sorte que â minha âmiga, sem saber, se tornou a
flito de violência moral, o narradot assumindo sua condição
nrinha educadora. E táo dependente fiquei logo desta direçáo, que já náo
implícita de poeta, decide enfim intervir e, para tanto, age de posso conceber os nrovimentos do meu ser senão governados por ela e por
poema, constitui um esforço de fantasia criadora que o nar I l. . ,, tlirvillll a guerra porque viant nela beleza (üelo e
rador empreende para valorizar as frutas e os legumes cuj()s i . i, , ,
l,r ,!\l rrnr rnesnta raiz etimológica). Os românticos, por
preços o criado da mansão regateia com altivez. É enÍim como ,, , , , r torrrirvirnt a face escura da civilizaçào (pobreza, mate-
artista, e não como moralista, que o suieito lírico defende a ,,,1r rrr,r, rI r.rtlóncia dos costumes) para criar beleza através
humilde vendedeira vilipendiada. Em "Num Bairro Moder t, ,1r,, rrrros rlc clàito moral e lenitivo: moralizar e consolar
no', no entanto, o artista não nega o homem comum, imbuí ' , rr.rrrr\rtrr, (lc rlodo particular, buscou beleza no mal e na
do de espírito solidário comum. Findo o discurso digressivo ,,,,,,r.rlr,l.rtle ("O imoral pode ser beloi diz o (ionde Lopo,
de apoio à hortaliceira, o narrador dela se acerca para, num l, \ lr,rt r.s rlc Àzevedo). Cesário enveredou por sendas sata
gesto de esforço agora físico, ajudá-la a erguer seu cesto agrí- ,,r r r, rr.r sórie tle poemas que desenvolve a tópica da dama
cola. O poeta cumpre seu papel de artista, e o homem, de ci- ,,, rl, rtr.rrlc. lcntou combinar Romantismo e Realisrno em
dadão honrado. It, .,r\lrc" e cm poemas satíricos de juventude. Em "NLlm
A cena da metamorfose dos vegetais pode ser considera tt ,ll l\4otlerno'] por fint, a persora vegetal "recomposta por
r, r
da chave na formação e amadurecimento da lírica cesárica. lr.rtorrrr.r'' (v.4r) reproduz tensões paralelas às da cena que
Nela, Cesário Iogra dar uma resposta pessoal ao impasse da llr, .r'r t,irr rle fonte; o eltte artropomórfico é natural e artifi
poesia, seu papel moralizador, edifrcante, engaiado, na era
da prosa, num mundo dominado pela razão ou consciência ,,,rr r"r (livi'râ Drelopeia, as dores da humanidade, ten atormentado o sen
prosaica". Nascido da confluênçia de forças em antagonis- rrrr,lll(, nLerbo dâs suas inenarráveis m,sérias: mas essas dores. essãs misé-
rtrr rr,to us pode ela suprimir" (Ana Maria Almeidâ Martios (org.), Obras
t ,tlúttt!: (:attas ,\oL vx, Lisboâ. Universidade dos Açores/Comunica-
ela enobrecidos. Perfeitâmente sei que tudo o que hoje surge em mim de nl- \,r,,. r,r89, p.951). De certo modo, Cesário responde ao ceticismo anteriano
gum valor ideia ou sentimento, é obrâ dessa educaçào que a sua alma dá à ,.,rr ,r idria de especiâlização técnica do poeta frente ao avanço da ciênciâ
minha, de longe. só com existir e ser compreendid?i' (A ColresPonllôncia de r ,rrx prrrblemas gerados pela civilização. No século xx, Pessoâ irá atirmar
Frítdique MenÍ1es,21ed.. Porto, Livraria Chardron, r9o2, p. r87). No âmbito , fir ( Í'IsoDância com Cesário: "O artista .-. nào tem senâo que exercer â sua
da arte, o escopo do artista e a produçâo de Beleza,.Lljos efeitos no homem rl(., ( urundo de a exercer tào bem quanlo possâ. Todas as outras conside
se dâo como consequência de seu nabalho. r,r1rx,s Ihe devem ser alheias: e assim cumpre o pÍincipio da divisão do tra
19. Em r88r, Antero questiona:"E o queéhore poesià? O que é hoje poe lrrrllro social, e cumpre-o tanio melhor quanto menos deixar entrar pârâ â
ta? Que diz ele ao mundo, que valha a pena ao mundo parar para o escutar? ru,r rrrtc clementos de preocupaçào com tudo quanro à nào seja'l E conclui:
Uma experiência de Berthelot ou de Virchow. uma descoberta de Darwin '\rLi, assim, impossivel o Íipo de uomo uniyersale? Será inrpossivel o indi-
ou Haeckel, uma página histórica de Rnnke ou Renan valem mais, dizem vl(hx) que seja poeta, homem de ciênciâ e político, por exemplo? Nâo; isso
mâis ao espírito do sé€ulo, do que toda â Babel sonora dâsestrofes deVi.tor prri: scr,logo que ele seja poeta quàndo é poeta, politico quando é politico
Hügci (A Poesia na Actudliddde, Lisboâ. Fenda. 1988, pp. 28 29). Em 1889, .'lxÍnem d€ ciênciâ quando homem de ciêncii' (Páginas Í tinas e de Auto.
numa carta a Antonio Molarinho, Antero anota:'A poesia tem embalado, htüt'retaçôo,Lisboa, Atica, r966, p. 1oo).
I-
cial, humano ebizarro, masculino feminino, moderno e l,.r
e Cronologia
dicional'o. Além disso, a imagem participa da consolidaçal,
do estilo mesclado do lirismo cesárico maduro, que se marrr
festa sob várias formas. Em sua condição de ser irônico - pt,l,,
brusco desyio narrativo e pela excessividade da imagem t.
sincero - no sentimento de solidariedade à pobre campon.,
sa -, fantasioso e realista, subjetivado e obretivado, sedutor (. rart l,úrr lo,r(luinr Cesário Verde nâsce em Lisbol a z5 de feverei_
grotesco, mitico e historicizado, o nume hortifrutícola con r,, ,lrr (l( srio (lesário, confesst:r. Segundo lilho de cinco (ou seis,
centra em si traços que definem, se não de todo, em amplitu r,r,, n.\nh( nr).erto) do casâl Jr)sé Anâstácio Verde, próspero co-
de, a poética cesárica. llx rr r,Írt( (lc li'rragens e tecidos, e Mâriâ da Piedâde dos Sant()s
De modo marcante, a partir de "Contrariedades'l Cesário \,r'1., l,rlrcrllS5e5ZacaPitâlPortuguesaévitimadeduasgraves
forja um estilo irregular, mescladoi que escapa a todo mo I l,t,L'nritts, prinleiro a de cólera morbo e depois a de febre amarc'
mento a definiçôes estáveis, que preso a um centro pende ir ln, ,lr( iuntts nlatârâm cerca de toooo pessoas. Por esses anos, s()-
diversas direçôes, sem nunca se 6xar. Isso tornou a leitura l,rrtlr(lo rros nreses de verão, os Verdes fixam sc no campo, nuDla
de sua obra instável. Seu efeito último no leitor é o de inse- ,IrrÍn d.l limilia em Linda a_Pastorà, arredores da caPital. Pâssa_
gurança, ou de segurança provisória. Uma vez identificado ,1,,,' ris.o epidêmico, a fâmilia continua a passar tenlPoradâs enl
um aspecto na poesia cesárica, ele é logo contestado dentro ltrxlir .l I)ast()râ; âssim a inlância de Cesário e de seus irmàos se
de seus próprios limites textuais. O que desponta de inicio ,lt\ kl( cnlrc a cidâde e o câmpo.
como verdade ou realidade, alguns passos adiante mostra tlru Morre Adelaide F.ugênia, irlnã de Cesário, àos três ànos
-se insustentável. E a irredutibilidade faz-se regra. E o de- tlô,t l:(lúârdo Coelho, ex-caixeiro da ltria de losé Anâstácio Verde'
safro perpetua se. Não é dificil pois concluir que a crítica lün(li conl Tomás Quintino Antunes, o /)rário íJe Notíaids' jornâl
positivista yisse nessa maleabilidade multiforme uma fra- ,1rl( lcz e vem fàzendo - hist(iria na imprensa PortLrguesa.
gilidade, uma incapacidade criadora. Ou que visse expostas ttlôt lr-m agosk), Antero de Quental publica Orlr-s Modernas. I'nt
a própria fragilidade e incapacidade analítica frente a obje- rnrtubÍo, eclode a Questâo Coinrbrá, Polêmica que oPõe jovens de
to tão fugidiamente yulnerável. Passado, enfim, o prestigio ( i)Inbra lideràdos por Antero e adeptos do UllrârromantisI1lo'
do Positivismo, a poesia de Cesário ganha evidência em sua ,llio representànte mais ilustre e Antônio Feliciirno de Castilho.
artesania verbal, em sua dúvida assediante, que, em última tt/l l)e maio a iunho, realizam se as Conferênciasdo Cassino Lis
(ou primeira?) instância, encena o principio da precarieda lrorrense, organizadas por um grupo dejovens do qualfazem par_
60 ] r NTRoDUçÂo
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D. Maria da Piedade dos Santos Veda mãe de CcsáÍio Maria lúlio, irmã de CesáÍio.
I
r8Z2 - Morre de Mâria Júlia, irmá de Cesário, aos dezenove anos, (l(
tuberculose.
1873 - Com apoio de Eduardo Coelho, Cesário estreia como poc
ta em páginas õo Diário de NoÍí.ids. Por esse tempo, além d(
Coelho, Cesário deve ter contado com auxilio de João de Sou
sa Araúio, cscritor de poucos recursos mas beDr relacionâdo, qu(
foi noivo de Maria fúlia. O jovem Cesário, funcionário na loja dc
seu pai, começa então a se dividirentre comércio e literatura. Por
essâ época também, talver: um pouco ântes, José Anastácio Ver
de, que em partilha de família havia herdado sozinho a quinta dc
,s .>í
II I
to considerado marco introdutório do Realismo nas letras portu-
guesas. Desse ano devem ser dois poemâs perdidos de Cesário:
"Voto Negro'e "Subindo':
1875 -
Morte de Antônio Feliciano de Castilho. Comes Leal lançâ
Claridades do Sul, sta obra de estreiâ. Um dos poemas, o sone-
to 'O CânibâI", é dedicado a Cesário. Em carta a Silva Pinto, Ce-
sário diz que está lendo O Mistérío de Edwih Drood, de Charles (i,súíio Vede (à esquerda) aos dezesseis anos, ao lado de
loão tle
Dickens. Em outra carta do mesmo ano, ao mesmo destinatário, \orso Aíaújo, cntão noivo da innô do poeta, MaÍia
Júlia, com queh se
escreve: "Escrevo te sobre uma secretária comercial, cheia de pa- tú rht ào.lisst o ,norta pre aturd da.iovem. A hloÍte de Maria lúlia
péis, de livros, de notas, de trintâ mil coisas que me tornam muito tt o ,tttitt' |t',ttntl do ,,Nó!".
I't L,rrtn nütot it lráJit1t
64 -: cioNoLocra
À
positivo e prático. // Eu náo sou como muitos que estâo no meio
dum grande âjuntânento de gente e completamente isolados e
66.i(:RoNol-ocIÀ
\-
r88o - Cesário publica "O Sentimento dum Ocidental" em porr,rgal Àhel Botelho, Fialho d€ Almeida ê Alberto dê Oliveira (diretor
a Comões, sepaÍâtâ do periódico portuense ,lo rnol de Viagens,lan- ii rcvisÍa Boémia Nova e âmigo de Àntônio Nobre).
çada pam comemorar o terceiro centenário de Câmôes. Ao lado rttrr Morre Joaquim Tomás, irmâo de Cesário, com 24 ânos, de tu-
de "Nós'l "O Sentimento dum Ocidental" é considerado o mais lrrrculose. Desse ano é o proieto, nunca concluído, de fundação
notável poema de Cesário. Não para os leitores contemporâneos d( um iornal republicano, que se chamaria O Mercafitil, e cijos
do poeta, que silenciaram diânte da composição. Cesário queixa- ((lâtores seriam Cesário, Teófrlo Braga e Joáo de Deus.
-se da indiferença do público em carta a Antônio de Macedo pa- r lx r Cesário parte para Paris em viaSem comeÍcial a 6m expandiÍ
pança: "Uma poesia minha, recente, publicada numa folha bem or negócios familiares qu€, nos últimos anos, só fâziam cÍescer.
impressa, limpa, comemorâtiva de Camôes, não obteve um olhar, l,iNsa cerca de um mês entre a capital francesa e Bordéus, e se en-
uú sorriso, um desdém, uma observação! Ninguóm escreveu, .onlra com amigos portugueses que viviam na Fmnça.
ninguém falou, nem num noticiádo, nem numa conversa comi- rti4 - Publica "Nós", seu mais pessoale autobiográfico poema. Desse
goi ninguém disse bem, ninguém disse mal! // Apenas um criti- lno devem ser ainda "De Tarde" e "De Verão I que o poeta possi-
co espanhol chamava às chatezas dos seus patrícios e dos meus vclmente terá publicâdo eín A Folha da Tatde, petiódico de so-
colegas- pérolas - e afirmava - fanfarrâo! - que os meus versos lrÍevivência efêmera, cuios números - à exceção do primeiro, que
'hâcen malisima 6gura en aqtrellas páginas impregnadas de no perderam.
lraz colaboração de Cesário - todos se
ble espíritu nacional"l Data provavelmente de r88o, um texto de rltt - Morte de Victor Hugo. Segundo depoimento de Henrique Lo-
Guerra Junqueiro sobre Cesário. Descrevendo em tom reproba- pes de Mendonça, no dia em que se divulgou em Portugâl â noticiâ,
tório a tendência âbstrâizante do lirismo português diante da na- Cesário teria comentado: 'era o avozinho de nós todos': Por essâ
tureza, Iunquei ro releva o traço lirme, de pintura realista, da líÍica época, a tuberculose, que mâtârá Cesário,já havia se mânifestado.
bucólica de Cesário: "Por isso, entre os modernos poetâs, destacâ, rllSó - Durânte o Carnaval, Cesário discute com Silva Pinto e vâi
com um relevo brilhante iuvenil, pela nota câmpesina, Cesário
e para câsa sob forte chuva. Resfria-se e seus pulmôes começam a
Verde. Ele reproduzâ paisagem do naturalcom um lance deolhos se complicar. tsm maio, o médico dâ familia desengana os paren-
instantâneo, um pincelpor vezes maravilhoso e uma alma sempre tes do poeta. Cesário, no entanto, em carta de ló de junho, escre-
adorável e sonhadoraj ao mesmo tempo graciosâ e melancólica, ve a Macedo Papança com esperanças de cura. A r9 de julho, no
altiva e feminina, cândida e sorridente..." Pâço do Lumiar paÍaonde fora em busca de recuperação, Cesário
l88r - Cesário frequentâ o recém-formado "Grupo do Leãol ter- morre. Suas últimas palavras, ao irmáo Jorge, único sobreviven
túlia de pintores e literatos que se reúne regularmente nâ cerve- te dos frlhos de )osé Ánastácio, forâm: "Nâo quero nada, deixa-
iâria Leão de Ouro, em Lisboa, para discutir arte moderna. Os -me dormir'l Em Á llusrraçdo, Mariâno Pina termina sua crôni-
encontros eram liderados por Silva Porb, pintor português, que ca sobre a morte prematura de Cesário com as seguintes palavras:
havia chegado há pouco de Paris, onde estudara belas,artes com "Náo foi um grânde artista que morreu. Morreu o embriào dum
Charles-François Daubigny. Além de Cesário e Silva porto, par- grande aÍtista, cu.io talento estava destinado a marcâr uma época,
ticipam das reunióes, entre outros, José Malhoa, Rafaele Colum- â triunfar ruidosamente de tudo e de todosl"
bano Bordalo Pinheiro - este, autor do retrâto de Cesário, feito 1887 - Em abril, com ediçâo de Silva Pinto, saem do prelo duzenk)s
de memória, parâ â primeira cdiçáo de O aivro de Cesórío Verde exemplares de O livro de CesáÍio Vetde.
l--
rgor - Publicação da 2ê edição, primeira com erci^|, ó,e O Livro de ( l .*, Critérios de OrgÍrnização .JP
sário VeÍde. O editor é Manuel Gomes, mâs o volume traz n(,r,r
e Estabelecimento dos Textos
que diz "Reimpressão textual da primeirâ edição feita pelo âmiI(,
do poeta Silva Pinto':
r9u Publicaçâo dâ 3, ediçeo de O Livro de Cesário Verde. Os etli
tores são Iosé Antonio Rodrigues & (], mas, tal como a segund,r
ediçâo, esta também leva a nota "Reimpressâo textuâl da primei
ra ediçáo feita pelo amigo do poeta - Silvâ pintol Morte de Silv.r
Lf,i dois modos basicos de aPresentar ao público a obra
I Ipoética de Cesário: por cronologia de Publicaçào alulsa
Pinto e de Fialho de Almeida.
,l,rs Puemas, considerando a versão pela qual estes foram Pu-
rgtz () Almanach de Lembranças Luso-Brasileiro publica poema
o l,lieirdos, ou dividindo a em dois blocos: O Livro de Cesário
"Loira' e o atribui a Cesário através dâ seguinte nota: ..Teve a rârr
li?irc, cujo texto de algumas comPosiçóes aPresenta varian-
felicidâde deencontrar uma poesiade Cesário Verde, inteirâmen
tcs cm relaçáo a suas versóes primitivas, e Poemas disPer-
te desconhecida, o Sr José do Nascimento Monteiro Guimarâes .,os. Ambos os modos apresentam
Problemas, que não cabem
no álbum de uma senhora cujo nome náo pode revelat e o ge
,r(lui discutir pois isso demandaria um estudo à paÍte sobre
neroso bom gosto de a comunicar ao Did, que â ins€riu em seu
tum tema já largamente tratado - mas nunca pacilicado - pela
número de 19 de setembro de r9to, onde fomos buscâr estes pre,
.ritica. O que importa aqui afirmar é que ambos o§ modos
ciosos versos': Ioel Serrâo estudou o caso e concluiu que o apócri
legítimos, ainda que produzam diferentes efeitos, que náo
siro
fo é de âutoria de loão Meira, professor universitário, especiâlista
chegam a comprometer a compreensão geral da obra cesári-
em Pârodiar Poetas.
ca. Ambos os modos são legítimos, enfim, desde que justifi-
r9r9 -
Um incêndio destrói parte da quinta de Linda-a-pâstora. A
cados com argumentos razoáveis. A Presente ediçáo optou
bibliotecâ do casârão é atiginda. Acredita-se que muitos origi_
pela divisáo O Livro de Cesorio Verde e poemas dispersos. A
nâis de Cesário, entre poemas, correspondênciâ ativa e passiva, e
intençâo foi manter o conjunto pelo qual Cesário se imPôs
ânotaçôes diversâs, lá se encontravam. Sai a t'
ediçào de O Livro aos leitores do século xx e agregar a este a Parte preterida
de Cesárío Verde, por losé Antonio Rodrigues & C!, com a nota (pelo poeta ou por Silva Pinto) da obra cesáfica. No entanto,
"Reimpressâo textuâl da primeira edição feita pelo amigo do poe
nas notas aos poemas registram-se, sempre que conhecidas,
ta Silva Pinto': Apesâr desta âdvertênciâ, a 4r edição é â que con as datas de fatura e de publicação alulsa de todas as compo-
tém mais gralhas. "O Sentimento dum Ocidental,l por exemplo, principâis variantes entre as versôes
siçóes, bem como as Pri-
surge renomeado como "O Sentimentalismo dum Ocidental':
mitivas, as da edição de 1887 e emendas Posteriores.
O texto-base de O Livro de Cesário Verde é o da primei-
ra edição (Lisboa, Tlpographia Elzeviriana, r887), preparada
por Silva Pinto. Não se sabe se a organização e as variantes
aos textos tal como eles se apresentam na ediçào de 1887 são
de autoria do poeta, do editor ou de ambos. Dai a polêmi-
ca em torno da ediçôes da poesia de Cesário. A fonte tex-
70 ? CRONOLOGIÂ
t
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CESARIO VE,RDE
(]ESARIO VERDE r873 - !876
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