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MANUEL DO CARMO

academia de letras do rio grande do sul


DA

C o n s o lid a ç ã o das le is

===== do VERSO

TRATADO DE VERSIFICAÇAO
/
0 M A I S C O M P L E T O EM L Í N G U A P O R T U G U E Z A

editora
C A SA D Ü PEA T
Rua São B e n t o , 2-B
SÃO PAULO
M ANUEL DO CARMO
DA ACADEM IA DE LETRAS DO RIO GRANDE DO SUL

DO A U T O R :

Publicado:
>A8 L E I !
CnMIMMO DES LUZ (poema), 1909.
O SFÍMCHISMO (prosa), 1913 (Exg.). .
HYMMO Á IN V E JE (poemeto), 1915. c83c8,c83eS3cS,c8>c83cS3c&,cS3cS>cS>cS>cSs
SET EM B RO (versos), 1917.

Para breve :

S E R Õ E S DE INVERNO (poemas). T R A T A D O DE VER S IF IC A Ç Ã O


QUE F n M lL Ifí! (comedia, em verso). 0 MAIS COMPLETO EM LÍNGUA PORTUGUEZA
O pnSSU D IÇ O (lever-de-rideau,. em verso).
EU PENSO HSSIM !... (prosa).
QPÍRGBMEL (poema).

E D ITO RA

Casa d u p r a t - ruasão bento, 21


g^os poetas nooos do 23 pasil

e de 3 ?opfugal

(Zom o capinho que sempce


me despepfupam aquelles que
se iniciam no culfo da mesma
aple que eu humildemente otf-
t?icío,

oíSepeço

|0. £ .
P R E F A C IO

O presente trabalho nada mais é do


que um modesto compêndio de versifi-
cação, que, se muito tem de original na
forma, pouquissima originalidade apre­
senta nos conceitos, quasi todos bebidos
em autorizadas fontes.
0 nosso esforço consistiu na com­
pilação e na synthese da opinião dos
mestres.
A forma imperiosa de Godigo que lhe
demos, era a que mais convinha á conso­
lidação das opiniões diversas de tantos
autores consultados. Não podemos deixar
de confessar que sorrimos a primeira
vez que nos assaltou a idéa de dar esta
forma ao nosso modesto compêndio. E foi
ainda a sorrir que traçámos aquella
‘‘Disposição preliminar ’ ’ , bem como a regras por demais arbitrarias, substi­
sorrir lançámos o titulo da obra. Que tuindo-as por outras mais lógicas.
fazer! E ’ a feição do nosso espirito.
Trabalho de compilação, manda a le­
Aprendemos com Sterne que ‘‘nada neste
aldade declaremos , de muito nos valeram,
mundo se deve levar a serio... comple­
pois, pezar de ás vezes grandemente mo­
tamente.’’ Poder-nos-iam tomar pelo
dificados, não deixaram de ser a base de
Conselheiro Accacio, ou por Monsieur
cada estudo:— para o valor das letras:
P r u d’h om me !
Castilho (muito ampliado pela obser­
Pouca cousa nossa apresentamos, e, vação e pelo estudo de vários autores);
quando o fazemos, é procurando basear a para a contagem das syllabas: Bilac e
nossa opinião na experiencia e na obser­ Guimarães (também grandemente amplia­
vação daquelles pequenos nadas que as dos); para o Livro que trata da cesura:
artes poéticas não ensinam. Dorchain (modificado e adaptado a nossa
Desse critério nasceram alguns a r ­ lingua); para a applicação do verso ao
tigos, bebidos em obras alheias á m é ­ theatro: Voltaire, Ferrigni, Bataille;
trica, mas cuja leituraé indispensável para o Livro em que se estuda o Rythmo,
para se comprehender acreaçâoartistica, Guyau; bem como serviram de base ao con­
taes como ‘‘L ’Art de Penser’’, de Cle- ceito do que seja o poema os estudos de
ment Goh, ‘ ‘L ’Imagination Créatrice’’ , Edgard Põe, e ao estudo da "arte decaden­
de Th. Ribot, além de outros. te" e da evolução do verso, as opiniões
A leitura attenta da obra dos mes­ de Th. Gauthier, Anatole France, Mario
tres , a observação da sua MANEIRA, para Pilo, Rodembach, Remi de Gourmont, Adol-
conseguir belleza, deram origem também phe Boschot, além de outros.
a alguns artigos em que se corrigiram Não repetimos servilmente nenhum
desses autores, nem tampouco quaesquer Bilac, Alberto, Eaymundo, Eugênio de
outros. Do choque das suas opiniões fi­ Castro, mestres incontestados.
zemos resaltar muitas vezes um conceito Além disso, sendo elle o primeiro
n ov o. tratado em lingua portugueza, no qual se

0 nosso principal trabalho foi,como cura do verso livre moderno, que chama­

dissemos, de compilação e de synthese, remos ‘ 1 decadente ’ ’ , nelle terão os

adaptando o que de mais moderno, demais “novos" um guia para a feitura deste verso

serio, de mais util ha sobre o assumpto. tentador e difficil, do qual são mestres
Verhaeren, Eugênio de Castro, Dannunzio,
Tendo, outrosim, a intenção de dar
no qual se ensaia a grande pleiade dos
principalmente a quem se inicia na grande
vates portuguezes actuaes, e grande nu­
arte, tão difficil, do verso, um guia
mero de poetas da nova geração brazi-
util, procurámos imprimir ao nosso tra­
1 eira.
balho um cunho eminentemente pratico,
deixando de parte o que poderiamos dizer
sobre a historia, as origens do verso, MANUEL DO CARMO

para occupar o espaço com exemplos e o


tempo com commentarios elucidativos. Na Paulicéa
Como se verá pelo methodo adoptado 30 - 8— 1918 .
procurámos fazer este compêndio o mais
pratico possivel. Na citação dos autores
com que exemplificamos os vários artigos ,
buscámos mais a qualidade do que a quan­
tidade, sendo que o mesmo autor repe­
te-se innumeras vezes,como acontece com
i (3 Srr^oção crea o 5Vyfhmo ;

© Jly fh m o proòuz a cBeíleza;

(3 belleza òesperfa a êm oção


Un uers bien scandé, sonore, qui semble tout fre-
missant d’émotion, prêt à ehanter, et qui pourtant ne nous
ehante rien au coeur, ressemble à un rcssignol mis en cage,
dont la uoix est iombée auec les ailes; nous pensons à
tout ce qu’ il pourrait nous dire si un eeup d’ai!e le seule-
oait tout à coup, s ’il lui reuenait quelque sentiment de
l ’air libre, et nous n'épreuuons plus deuant lui que tris-
tesse et pitié.
Çuyau.

J a i jadis récité déuotement, en bon parnassien, les


littanies de Sainte-Beuue à ftatre 3)ame la Rime, “ rime
tranchant auiron, frein d o r, agrafe de Yenus, anneau de
diamant, elé de !’arehe” ... — J e ne renie pas ma foi. Jtíais
je puis, sans apostasie, reeonnaitre que la prosodie qui
s ’en ua etait bien iiuresque quand elle exigeait que la rime
fut aussi exaete pour les yeux que pour 1’oreille. Le poete
à ee csup, aecorde trop au scribe. õn ueit trop q’uil est
homme de cabinet, qu’il trauaille sur du papier, qu’il est
plus grammairien que ehanteur. Ç ’est le malheur de notre
poésie detre trop litteraire, trop écrite...

/(natole france.

Quei qu’en pensent nos “ parnassiens” modernes, le


caleul, la patienee, la méthcde, la bonne uolonté sont im-
puissants à produire une grande eeuure: — dans la morale,
]a bonne uolonté est tout, a dit Schopenhauer, dans l ’art et
surtout dans la poésie, elle n’est rien.
IMTRODUCCftO

Art. i B iítto é tudo aquillo que,


impressionando os nossos sentidos, des-
perta em nós uma sensação agradavel.
— “ Le beau pour le crapaud c’est la crapaude” ,
V o l t a i r i ;.

Art. 2. G osto é a faculdade pecu­


liar a cada um de gozar aquillo que lhe
apraz.
—• “ De gustibus et coloribus non est disputan-
dum, diz o provérbio.
O gosto não é entretanto arbitrário, em' se
tratando de arte. As boas leituras, de obras de incon­
testável belleza, fazem o —■ bom-gosto. A admira­
ção pelas obras mediocres e secundarias denota a
falta de gosto. Assim : — de gustibus et coloribus
non est disputandum —• é uma verdade relativa.
i8 CoNSOI.lDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO I ntroducção 19

E só é verdade entre pessoas de gosto apurado Art. 7. E xpressão é a materiali­


cora critério semelhante- Entre um homem de bom-
gosto e um medíocre apreciador sem gosto — de
zação pela arte Üa idéa preconcebida
gustibus ct coloribus, — pelo contrario, — cst dispu- ou do sentimento experimentado.
tandum.
Art. 8. A rte é; a representação de
A rt. 3. E s T h E T i c a é a sciencia do alguma coisa vista, ou sentida, segundo
bello e do gosto. o gosto e a imaginação de cada um.

Art. 9. P oesia é a arte de expri­


Art. 4. E moção é o gozo profundo
mir e de acordar emoções por meio da
de uma sensação esthetica.
palavra rythmada.
—- Poderiamos dizer que é “ o goso intenso e
rápido’ ’ ; e então seguiriamos a lição de Ribpt: Art. t o . P oética é o conjuncto das
“ L/émotion se définit par deux caractères princi-
regras concernentes á poesia.
pau x: 1’intensité, la brièveté” .

Art. 1 1 . V e r s i Eicação é a arte de


Art. 5. I d é a é a concepção que o augmentar o mais possível á linguagem
nosso espirito tem de alguma coisa, as qualidades agradaveis e expressivas
depois da percepção de tudo que pon­ dos sons, auxiliando o menor esforço.
de aprehender a respeito dessa mesma
coisa.

A rt. 6. S en tim en to é a sensação


profunda do júbilo ou da dor, do affe-
cto ou da aversão.
PfiRTE GERHL
DISPOSIÇÃO PRELIMINAR

A rt. i. E sta Consolidação trata das


regras que têm servido aos poetas para
despertar a Emoção por meio do verso.
—■ Não ha nella preoccupações de escolas, antes
procura-se harmonisar a todas, condemnando exces­
sos sem base e acceitando as regras lógicas de cada
uma.
LIVRO I
Dos versos

T IT U L O I
Do verso em geral
Art. 2. O verso é formado por uma
ou mais palavras, cujas syllabas se de­
vem succeder rythmicamente.
E x s .:
— E á noite se faz sol a lua cheia. . . (N obre).
— Aguadeira a regar lyrios de p rata...
(G oui.art de A ndrade).

ititiiiimmmiimMniMiiimmmmiilllll íllll
C onsolidação das L eis do V erso Dos V ersos 23

Art. 3. Para que um verso seja Art. 6. Das syllabas tônicas (art.
bello mister se faz que tenha uma bella 4 ), algumas são mais fortemente accen-
cadência. tuadas que as outras: são as cesuras.
— ‘; De la musique encore et toujours” . E x .:
V erlain E Da paina os vagos fló cos cor de «cve (A lberto).

Art. 4. A cadência, que é dada pelas Art. 7. Nas cesuras, pois que são
as syllabas que mais resaltam no verso,
syllabas tônicas e atonas, será tanto
devem-se pôr aquellas palavras que ex­
mais bella, quanto maior for a varie­
primem as ideas para as quaes se quer
dade dellas. (A rt. 96).
chamar mais a attenção.
E x -:
O’ sol, ó sol, que pintas d’ ono as «vas E x -:
E /azes moreninhas as muí/tcres. Sonho que sou um caval/ciro andante.
Por desertos, por sóes, por noite escura,
(A feonso L opes V ieira ).
Paladino do amor, busco anhe/ante
0 'pa/acio encantado da ventura- (A nthero).
T IT U L O II
Art. 8. Só o verso dá ao espirito
Da constituição do verso este duplo gozo de sentir —- a perpetua
surpreza (art. 1 1 ) unida á segurança
C A P IT U L O 1
constante (art. 9).
Dos re q u is ito s essenciaes do verso
— “ la surprise dans la sécurité. .. ” (D orchain ).
Art. 5. São requisitos essenciaes
do ve rso : syllabas que se succedem; Art. 9. A segurança e firmeza que
cesuras; numero de syllabas; rythmo; o verso traz resultam: do numero re­
gular de syllabas, da volta regular á
rima.

imiitiilltttl:
24 C onsolidação das L eis do V erso Dos V ersos 25

rima e também da harmonia do sentido que se succedem, dos “ encadeamentos”


com o rythmo. (enjambements), da mobilidade das ce-
suras, da variedade de metros.
—■ Dos dois primeiros elementos de segurança
nos fala Dorchain., do segundo porém descura; e — Dorchain nos enumera os dois primeiros ele­
é no emtanto essencial. mentos, mas os outros não se podem esquecer, tão
Numa poesia em que haja alguns “ enjambe- encantadora surpreza trazem elles.
ments ”, que são um dos elementos de “ surpreza” , Veja-se o exemplo do Art- 131.
mister se . faz que a harmonia do sentido com o
rythmo venha trazer a segurança, sob pena de ser C A P IT U L O II
. sacrificada a emoção. Dos re q u is ito s a ccid e n ta e s do verso
Além disso nas poesias em metros variados,
tão cheias de surprezas, a segurança muitissimo se Art. 12. Accidentalmente concor­
apoia nessa harmonia do sentido com o rythmo. rerão para a belleza, segurança e sur­
preza do ve rso : alliterações, variedade
Art. io. A um verso isolado só de vog:aes, maior numero dellas, ono-
podem dar aquelle cunho de aere-peren- matopéas, harmonia suggestiva, asso-
nius o rythmo e mais a idéa ou o senti­ nancias.
mento.
Art. 13. A Alliteração, repetição de
Exs.
consoantes, e a Assonancia, repetição
—■ Sob o plácido olhar das estrellas de p ra ta...
(B ilac ) . de vogaes, são defeitos que, em princi­
— Cantando, os rouxinóes lembram o céo. . . pio, se devem evitar. (A rts. 197 a 258;
(G omes I. eal ). Livro V I ) .

Art. i i . A surpreza, que traz o Art. 14. Sendo, em principio, de­


encanto, resulta: da variedade das ri­ feitos, podem, entretanto, usadas com
mas, da flexível modulação das syllabas talento, concorrer, tanto a Alliteração

11111111111111111111i1iiiiM üim iiiiiiiiiiiiim iiiiiiim iillIlllllllllllllllllllllllllllllllllllllilliillilllllliilll


26 C onsolidação das L e is do V erso Dos V ersos 27

como a Assonancia, para a belleza do rudimentar imitação dos sons, das vozes
verso, não usadas arbitrariamente, po­ da natureza, e busca imitar a cadência
rém, de accordo com o estabelecido no imaginaria deste ou daquelle sentimento
Livro V I, buscando a onomatopéa ou se elle se pudesse materializar. (L ivro
a harmonia suggestiva. V I) .
E x .: (Languidez) :
Art. 15. A Onomatopéa, reminis- A ’ luz suavíssima da sala,
cencia da primitiva linguagem humana, Que ao sonho lânguido convida,
procura suggerir, imitando, por meio Ouve-se alguém cantar esta canção que exhala
A volúpia do amor e a doçura da vida.. .
de sons, as vozes da natureza.
E x s .: A rt. 19. Quanto maior numero de
— Ribomba o céo, além. Rouco pampeiro horrendo vogaes e de elisões tiver o verso, tanto
Rufa no espaço azul o seu tambor de guerra. .. mais cheio nos parecerá elle.
— Tíbios flautins finíssimos gritavam ... (B ilac )- —■ Assim o verso:
“ Sonho que sou um cavalleiro andante ”
Art. 16. O exagero no uso desta que já é cheio, mais cheio se tornará introduzin­
figura redunda em preciosíssimo e, em do-lhe mais algumas vogaes e elisões e transfor­
mando-o neste:
vez de suggerir, torna-se grotesco.
“ Sonhei que cu cra um cavalleiro andante ”

Art. 17. A virtude está 110 uso E se accrescentarmos a est’ outro


parcimonioso das figuras. (L ivro V I ) . “ Vae-se a primeira pomba despertada”
algumas vogaes, tel-o-emos incontestavelmente mais
Art. 18. A Harmonia imitativa cheio:
muitas vezes vae além da simples e “ Vae-se altaneira a pomba alvoroçada".

liimiiiiiiiiiiiiiiimmiiimiiliitiitlt
28 CONSOEIDAÇÃO DAS LfflS DO VERSO Dos V ersos 29

Art. 20 A variedade de vogaes, metros heterogeneos, retardando


concorrendo para a surpreza, atigmenta a segurança.
o encanto do verso. X II. Monotonia, pela falta de varie­
E x .: dade de cesuras.
Nize mimosa como as graças pwra,
Amável N?ze como as graças bclla... (B ocage). Art. 22. Deve-se evitar não só o
cacophaton que forme uma palavra
C A P IT U L O I I I
obscena, como aquelle que faça lembrar
Dos d e fe ito s m a is n o tá v e is do verso
qualquer idéa fóra do que se quer
Art. 2 1. Dos innumeros defeitos suggestionar, pois quebrar-se-ia o en­
que podem prejudicar o verso, quebran- canto.
do-lhe o encanto, resaltam os seguintes:
Art. 23. A variedade de consoan­
I. Cacophaton.
tes e de vogaes é regra que só pode ser
II. Homophonia, pela alliteração.
transgredida quando, propositalmente,
III. Homophonia, pela assonancia.
se procura a harmonia e a onomatopéa
IV . Frouxidão (H iatus).
(A rts. 13 a 18 ; Livro V I : art. 2 5 1 e
V. Dureza (Elisão forçada).
segs.).
V I. Palavras de difficil encaixe.
V II. Palavras rebuscadas ou de pro­ Art. 24. Toda a repetição de con­
nuncia difficil. soantes ou de vogaes fóra destes casos,
V III. Figuras que alteram a pronuncia. é defeito, pois concorre para a dureza
IX . Rimas imperfeitas. do verso.
X. Bordões ou cheville. Art. 25. Duro se torna também o
X I. Prolongamento demasiado da verso cujas syllabas não se elidem natu­
surpreza, pelo “ encadeamento” ralmente, cuja elisão é forçada (art. 74
(enjambement) ou pelo abuso de e seguintes e principalmente 77 e §,§).
30 C onsolidação das L eis do V erso D os V ersos 31

Art. 26. A falta de elisão das vo- Art. 30. Excluem-se da condemna-
gaes, formando hiatus, determina a ção aquellas palavras que, pelo uso, já
frouxidão do verso. adquiriram os fóros de antiguidade, e
são, por assim, dizer, novos vocábulos
E x s .:
A frouxidão no amor é uma offensa.
derivados dos primeiros.
A estrella baixou no horizonte. E x -:
M ór em vez de maior; té em vez de até; inda
em vez de ainda, etc.
Art. 27. A accentuação forçada de
syllaba por onde naturalmente a voz Art. 3 1. A rima, pois que é a uni­
deslizaria na pronuncia, muito concorre formidade de som, deve ser perfeita.
para tornar o verso frouxo. (A rt. 1 1 7 e (L ivro IV , art. 170 e segs.).
119 ) . § Unico. A transgressão desta regra
E x s .: concorre para quebrar o encanto do
Testemunho do meu animo grato. verso.
Lei não conheço que possa obrigal-a.
Art. 32. A determinação previa de
Art. 28. Se a simplicidade é a regra um certo numero de syllabas, dá lugar
a observar pelo poeta, os termos rebus­ a que 0 poeta tenha de recorrer muitas
cados, ou de difficil pronunciação, po­ vezes a artifício s: bordões e ckevilles
dem concorrer para a exquisitice, po­ que enfeiam o verso.
rém nunca para a belleza. Art. 33. A desharmonia proposital
Art. 29. A s figuras que autorizam trazida pelo “ encadeamento” (enjambe-
suppressão ou accrescimo de letras, au­ ment) não deve ser muito prolongada,
torizam vicios e estão ipso-factos con- para que se não prejudique a segurança
demnados. (arts. 80 a 85).
32 CoNSOUDAÇÃO DAS E filS DO VERSO Dos V ersos 33

A rt. 34. Se a mobilidade de cesuras Art. 37. No verso clássico o sentido


traz encanto ao verso, a semelhança de e o rythmo marcham accordes e pare­
accentuações só pode acarretar a- mo­ lhos, dando uma impressão de ordem e
notonia. de harmonia, que, comquanto nobres e
— Ver a nota do art. 49. bellas, não deixam de se tornar um tanto
monotonas, desde que se extendam por
T IT U L O III algumas paginas.
Differentes especies de versos Art. 38. No verso romântico, que
se distingue pela “ concordância retar­
C A P IT U L O 1
dada” , pois termina o sentido muitas
Do v e rs o em re la ç ã o com as v a ria s escolas litt e r a r ia s
vezes antes de terminar o verso, dando
Art. 35 A s escolas litterarias, pro­ logar ao “ encadeamento” (enjambe-
curando modificar a maneira de se ment), ha uma desharmonia momentâ­
exprimirem as ideas, muito têm influen­ nea que muito concorre para a “ sur-
ciado na feitura do verso. preza” .
§ Unico. Conforme as escolas po­ —Esta “ concordância retardada ” integrou-se na
poesia e dá verdadeira belleza ao. verso-,
dem-se classificar os versos em quatro
E x -:
typos principaes: clássicos e românticos;
parnasianos e decadentes. “ Fulge e dardeja 0 sol nos amplos horizontes
Do céo d’Africa...—Ao largo, em plena luz, dos montes
A rt. 36. Do clássico ao decadente Destacam-se os p e r fis ...—
tem variado o verso, evoluindo sensi­ (Bieac).
velmente para a liberdade e para a mais A rt 39. Outro característico do
ampla e natural correspondência da verso romântico é a mobilização da ce-
linguagem com a idéa e o sentimento. sura da sexta syllaba dos alexandrinos
C onsolidação das E eis do V erso D os V ersos 35
34

para a oitava ou outra, o que, augmen- Art. 4.1. O verso decadente caracte­
tanto a liberdade, dá mais azas ao riza-se pela expontaneidade e pelo tri-
rythmo. umpho perenne do rythmo, deixando
— No estudo do verso segundo as escolas, Dor- que a forma ondule com o pensamento,
chain fica no clássico e no romântico. Acceitando flexível, irregular, por vezes brusca.
aquella classificação ampliamol-a com um estudo
sobre a differenciação das duas escolas que actual- Art. 42. No verso parnasiano é
mente dominam: parnasiana e decadente. grande o uso da concordância retar­
Acceitamos o termo “ decadente para cara­
dada; no decadente, não.
cterizar o “ verso livre moderno” como o usam Ver-
haeren e outros. Art. 43. O verso decadente asseme­
Art. 40. O verso parnasiano é a lha-se ao clássico na maneira de fazer
integração das innovaçÕes dos românti­ o sentido e o rythmo marcharem accor-
cos e caracteriza-se pelo apuro da fôr­ des, mas com esta differença: que o
ma, sacrificando ás vezes pela expressão clássico aparava as azas ao pensamento
que deve ser bella, a simplicidade de para que coubesse no verso e o deca­
uma idea, a delicadeza de um 'senti­ dente adapta-se á idéa e a acompanha
mento. flexível, sem tolhel-a.
—Assenta nessa differença profunda da maneira — Vejam-se algumas poesias insertas no respe­
de encarar a arte, a própria differença dos versos ctivo logar: Parte Especial.
de ambas as escolas.
O parnasiano, pela Expressão, é capaz de sacri­ C A P IT U L O II

ficar a idéa ou, diremos melhor abafal-a com bellas Dos versos em c o n ju n c to
vestes; o decadente acha preferível sacrificar a
Expressão desde que o Sentimento ou a Idéa bri­
A rt, 44. Os versos de um poema
lhem- O parnasiano é o cultor da fórma. O deca­ podem ser classificados de differentes
dente deixa que a Emoção conduza 0 Rythmo. maneiras, attendendo:
36 C onsolidação das L e is do V erso Dos V ersos 37

I. á maneira pelo qual se agrupam — Veja-se como são moveis as cesuras nesta
quadra:
no mesmo poema;
Se a cólera que espuma, a dor que móra 2—6— 10
II. aos metros ou ao rvthmo; Na/ma, e destróe cada illucao que nasce 1—4—8—-io
III. ás rim as; Tudo que punge, tudo que devora 4— 10
IV . á concatenação das ideas. O coração, 110 rojto se estampasse 4—6— 10
(R aymundo Corrêa).
C A P IT U L O III
Ora cae na 2.a, 6.” e 10.a syllabas, ora na i.‘ , 4.“,
8." e io." ora na 4." e io.a, etc.
Dos versos q u a n to á m a n e ira pela q u al se a g ru p a m

no poem a Art. 47. Os versos, dispostos sem


a simetria das estancias regulares, con­
Art. 45. Conforme a sua posição trabalançam o que perdem em “ segu­
no poema os versos podem s e r: rança” pelo que adquirem em liberdade.
I. Agrupados fixamente em estro- — Veja-se como é simples e deliciosa aquella
phes; “ Alma em flor ” , de Alberto, em que os versos
livres trazem tanta belleza ao poema. Alli, nos pró­
II. Dispostos livremente:
prios sonetos, o poeta desprezou os exageros da
a) á maneira dos clássicos; sua escola.
b) á maneira decadente. C A P IT U L O IV

Dos ve rso s re la tiv a m e n te ao m e tro


—• De ambas as classificações do art. 45 tratamos
SECÇÃO I
desenvolvidamente na Parte Especial.
Art. 48. Conforme o numero de
Art. 46. Ainda numa estancia re­ syllabas podem os versos de um poema
gular, não deve um verso se parecer em s e r:
tudo ao verso que o precede ou segue, I eguaes (isometricos) ;
quanto ás cesuras, para evitar a mono­ I I com duas medidas;
tonia (arts. 34 e 49). I I I deseguaes (heterometricos) :

tmmtmTimnmirnnT
38 CoNSOI.IDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Dos V ersos 39

j E x s .:
a) á maneira dos clássicos; Finalizando a èstrophe:
b) á maneira decadente. —- A um sincero psychologo moderno
Art. 49. Mesmo eguaes em medida Qual a séde do affecto perguntei.
“ Bem sei que o affecto é um propulsor interno;
devem os versos variar na accentuação
Mas onde está, não sei ” .
e 11a cesura, para que, variando o ry- (A ugusto de L im a ).
thmo, se evite a monotonia. (A rts. 34 Alternadamente:
a 46). ■— O incêndio devorou inteiramente
— Vejam-se os artigos em que se trata da varia­ A casa onde eu nasci;
bilidade das cesuras, no Livro III. Para esquecer o trágico accidente,
Embarquei e parti.
O “ encadeamento ” (enjambement) nos versos
(A ntonio F e ijó ).
isometricos é um bello recurso para evitar a mono­
tonia. Bem combinado com a mobilidade das cesuras
traz ao poema uma belleza seductora.
Art. 52. A combinação de um metro
menor no fim da estrophe, dá, pelo ines­
A rt.' 50. A combinação de dois ou perado, um quê de epigrammatico, e
mais metros diversos traz ao poema um tira-se com ella um bello effeito, quando
certo encanto e, a quem lê, um descanço se deseja gryphar um conceito, para 0
que deleita. qual se quer chamar a attenção.
—■ Ha uma certa semelhança entre a combinação E x -:
de metros e o. prolongamento de sentido pelo “ en­ — Esta mão, esta mão, que ré parece,
cadeamento ” (enjambement). Ambos concorrem Ah não foi uma vez, não foi só uma
para a maior liberdade de expressão, dando mais Que em defeza dos bens, que são do estado,
liberdade ao pensamento. Moveu a sábia pluma.
( D ir c e u ).
Art. 51. Usa-se a combinação de
dois m etros: ou finalizando estrophes ou Art. 53. Os versos, cuja combinação
alternando uns com outros. é mais frequentemente usada, são: os
40 C onsolidação das L e is do V erso Dos V ersos 41

cle io e 12 syllabas, com os de 4, 6 ^ § 3 ." O que divide o verso é a


também de 8 syllabas. cesura. (L,iv. I I I ) .
A rt. 54. A liberdade ampla conquis- Art. 56. Os metros mais frequente­
taram-na os poetas com o verso livre, mente usados sã o : o de 7 syllabas, o
em que são usados todos os metros. de t o , o de 12 e o de 8, sendo os outros,
(A rt. 64). mais usados alternadamente, ou com­
F,X.: binados.
— Um chão de folhas sob um céo de flores, 10
Eis a matta. Recebe-nos á porta io
§ unico. Os de 4, 5 e 6 admittem-se
Do templo de verdura 6 em composições pequenas, como canço­
Azul,trefega, leve borboleta, io netas e odes anacreonticas.
Que volateando inquieta 6
Vae pelo atalho, o espaço corta, 8 Art. 57. O verso de 7 syllabas,
E nos guia na selva espessa e escura. io chamado redondilha, é frequentemente
(A lberto). usado em quadrinhas, villancetes e trio-
SECÇÂO II lets, e é um dos que mais se prestam
Art. 55. O numero de syllabas do ao canto. (A rt. 15 1 e segs.).
verso, em portuguez, pode variar de
Art. 58. O verso de 10 syllabas é
uma, frequentemente até 12. (A rt. 65).
0 verso heroico portuguez, tão nobre
§ i.° Na contagem das syllabas do como o alexandrino, e é dos poucos que
verso vae-se até o ultimo accento tonico, ainda se podem tolerar sem rima. (Arts.
que é a ultima e necessária cesura do 1 54 a 16 1) .
verso.
$ 2.0 Os metros podem ser — sim­ Art. 59. O verso de 12 syllabas
ples: até 4 syllabas; e compostos: desse (alexandrino) equipara-se ao decasyl-
numero em diante. labo, pela pompa e nobreza, sendo que
42 C onsolidação das L eis do V erso Dos V ersos 43

se não admitte sem rima. (A rts. 162 a —Não fizemos livro especial para tratar do metro
169). porque este depende das Syllabas e das Cesuras e
ao tratar de ambas, mais desenvolvidamente trata­
remos do metro.
Art. 60. Poemas longos, em que
SECÇÃO 111
se não alternem metros, só em decasyl-
labos 011 alexandrinos se toleram. Art. 64. Irmão gemeo do verso
livre, á maneira dos clássicos (art. 54),
Art. 61. P ara as obras theatraes, é o verso decadente, em que predomina
em que se exige a naturalidade do dia- o rythmo, em que se não indaga da
logo, 0 alexandrino, se impõe (Parte medida, mas sim da “ musicalidade” .
especial: Livro I - T i t . I I I ) , por ser o — E ’ recommendavel a leitura dos mestres do
mais amplo e de mais recursos. verso decadente: Verhaeren, Dannunzio, Eugênio
de Castro, Henri de Regnier, Ruben Dario, Villaes-
§ unico. P ara as operas, operetas,
pesa; Teixeira de Pascoaes e alguns outros novos
etc., em que o canto predomina, o verso portuguezes como Jayme Cortesão; Antonio Patrí­
deve ser apropriado á musica e variado. cio e outros.
Art. 65. Alem de doze syllabas
Art. 62. O verso de 8 syllabas é
não se usa prolongar o verso em portu-
nobre e cheio, prestando-se admiravel­
guez, excepção feita para o verso deca­
mente aos pequenos poemas, já usados
dente que, sendo baseado no rythmo e
uniformemente, já alternadamente.
11a cadência, admitte maior distenção.
Art. 63 Os versos de 9 e 1 1 sylla­ Art. 66. Para o desejado effeito,
bas devem ser usados parcimoniosa- que se procura obter com o verso pro­
mente, porque a pouca variedade e a longado alem de doze syllabas, mister
fixidez das cesuras torna monotono o se faz que a primeira cesura seja forte­
seu rythmo num longo poema. mente accentuada em relação ás outras.
45
D o s V êrsos

; QHernado com outros,


- mtS ÜO VÊRSO numero, pois *> alter & que se pro-
C oN S O tfD A Ç AO _____^
44 pode elle “ nse/ “ carretar a monotonia,
. , ílava das estrellas põe, sob pena al umas poesias de
_por mais beilas que seja icanos, íeitas cm

versos A » » * » " '


« de t — r r - não deixam <- egsa monotoma. y verso
- aJ m í « - <»■ r : t s * ' “ tho\ r : ” só ler para se remos dizer <Ute ^ dizãa
parodiando 1 or momentos , c „
que o resto smorzando.
Mallarme , do b
^ ir ^ A s c e s u r a s s e ^ s - o g a p itu u o V

v e rs e . ‘

que outra q a a lq u e r^ ^ 1»
. . 7o ,EMW
No ‘ a- rima
tocante r podem
venha Pertu iz Qgter.
gttistico que se 1 prolongado os versos^ de um poema ser.
I " “ fm eth o d icam eu te;
n .® ^ e-tótoi« r s £ b) á vontade.
I I não rimados. ^ casos,

Art- 7 Nt° auienttestão os poe-


l -

rimados metho ^ estrophes e «s ®


_ o ^ » gesioíí ^ r i mas
(Eugskio dê Castro)
forma-tixa. °(W
v r” ^ "
■y^fSO
e III)•

“ a ío ent companhia de outr


4Ó CoNSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Dos V ersos 47

Art. 72. Relativamente ao n.° I b) Art. 76. Em portuguez as palavras


do artigo 70 não ha regras fixas, mas graves são as mais numerosas, além de
o bom gosto manda que se não ponham serem as mais sonoras, devendo por isso
as rimas tão distantes que prejudiquem os versos graves formar a base dos
a percepção do som accorde. poemas.
Art. 73. Sendo a rima um dos
Art. 77. Agudos e esdrúxulos de­
requisitos essenciaes do verso (art. 5),
vem ser usados parcimoniosamente e
necessário se faz que nos versos sem
principalmente entremeados com os
rima seja supprida a falta delia com os
graves.
recursos de cesura, rythmos e varieda­
de de sons. Art. 78. E ’ tão condemnavel um
Art. 74. A rima, uniformidade poema em que se abuse dos agudos
perfeita de som (art. 3 1 ) , quanto mais como dos esdrúxulos, só sendo tolerável
methodica fôr, tanto mais concorrerá o seu uso exclusivo, quando se querem
para a “ segurança” ; quanto mais ines­ tirar effeitos humorísticos, comicos ou
perada, para a “ surpreza” . (Livro I V ) . satyricos.
SECÇÃO n
Art. 79. Os agudos são muito usa­
Art. 75. Os versos são chamados dos finalizando estrophes em que se
agudos, graves ou esdrúxulos, conforme entremeiam g ra v e s:
a sua rima é aguda, grave ou esdruxula. E x .:
E x s .: Vamos, doce companheira;
Agudo: Espumam, fervendo ao s o l .. .; Deixa os prazeres e a dor
Grave: E no oratorio — p equ en o ...; E accendamos a lareira
Esdruxulo: E rola o comboio fú n eb re... Da nossa casa de. amor.

mimtiif! lIMHim im imiii


Dos V ersos 4 9
4 8
C onsolidação das E eis do V erso

E x .:
Olha o sol pela clareira:
— Não cançam no trabalho os musculosos braços
O seu vivido esplendor
Dos guerreiros. Oscilla o muro. Os estilhaços
E ’ uma nota alviçareira
Saltam das pedras... etc.
Contra os pezares e a d o r...
(B ilac ).
Accendamos a lareira
Da nossa casa de amor! Art. 82. A “ desharmonia momen-
(L indolpho Collor). lanea” que traz o “ encadeamento” não
c a p it u l o VI deve ser muito prolongada, pois trans­
Dos versos q u a n to á co n ca te n a çã o das ideas formaria uma virtude num defeito,
aquelle da “ insegurança” .
Art. 8o. Muitas vezes a phrase
que traduz um pensamento termina an­ Art. 83. A “ concordância retarda­
tes de finalizar um verso, ou se prolonga da” não se deve prolongar muito, pois
até parte do verso seguinte, formando transforma a mais bella das poesias em
uma cadeia, dando logar ao “ encadea- pura prosa.
mento” (art. 38). — Abstemo-nos de citar exemplos. Achamos
que para os defeitos elles são desnecessários, além
E x .. disso evitamos ferir susceptibilidades.
_ Estala o raio. Estronda espedaça a fragua
Dos trovões. O universo, e tc ... Art. 84. Após um certo numero
(A lberto).
de versos de “ concordância retardada” ,
deve-se dar a sensação da concordância,
Art. 81. Este “ encadeamento” con­
por assim dizer, classica, podendo imme-
corre para eme se possa condensai num
diatamente a esta seguir-se um novo
mesmo verso, duas ou tres phi ases,
periodo de momentânea desharmonia.
accumulando, portanto, mais idéas, mais
sentimento, mais força nervosa, mais — Assim fazem os mestres. Consulte-se, por
exemplo : “ Volúpia ” , de Alberto; “ Morte de Tapyr ”
emoção.
CON«OT/1DACÃ0 DAS LlhS DO V ^ O
5o

e “ Delcgenda Cartago ” , de Bilac; “ As pombas” , de


Raymundo Corrêa.
A ri. 85. No defeito se assemelham:
o verso com encadeamento e o verso LIVRO II
decadente (art. 2 1, n.° X I ) , e os com
Das syllabas
selhos dos artigos anteriores para a
volta á concordância apos um certo pe­
ríodo de “ surprezas” pode ser applicado T IT U L O I
ao decadente.
Da syllaba em geral
A rt 86 A segurança pela harmo-
nia de rythmos deve ser trazida apos Art. 87. Relativamente ao verso,
um certo período de metros hetero- syllaba é o som produzido por uma só
genèos. emissão de voz, differençando-se por­
tanto do sentido grammatical, em que
" a tarde chora, re za ... Fico a o u vir...
basta haver uma vogal ou um diphton-
O h ! vento dos vanfragios a rugir . . . .
go, para que haja syllaba.
Vento de desvario,
Vento de evocação, Assim a phrase:
Que á hora dos crepúsculos afflictos,
Sonhei que andava em passeio
Sopras num arrepio, t'i .imniaticalmente tem dez syllabas:
Em rajadas de gritos, — So nhei que an da va em pas sei o
Sobre o meu lusitano coração!
|inrém em poesia tem apenas sete:
A minh’Alma conhece toda a vida,
- So nhei quean da v ’em pas sego)
E ’ feita de camadas como a terra;
E o vento, quando sopra, desenterra
Toda a Dor toda a angustia adormecida
Art. 88. O versificador só ao ou­
( J a ym B C ortésao). vido obedece na contagem das syllabas.
D as S ylla bas 53

52 CoNSOU^ÇÃO^D^®_^^=^==2=========^ E xs.:
Synérese : sau da d e;
Elisão : mi nhaal m a;
T IT U L O II Diérese : crc an ç a ;
Hiatus : já hon tem.
Da contagem das syllabas
Art. 93. O guia incontestável, em
C A P IT U L O 1
qualquer dos casos, para se fazer ou
Di sposi ções geraes
não fazer a elisão, é o ouvido, que deve
A rt 8q N a contagem das sylla- portanto ser educado. .
a un vnoaes em frente uma § i.° O rythmo do verso exigirá
ora a absorpção ora a independencia
das vogaes, não se podendo dar uma
elisão. regra absoluta.
A rt QO. A absorpção ou repulsão E x .:
dasT g L no verso pode-se dar ja no Minha patria id e a l! Em vão estendo os braços...
Poesias, pag. 107.
tocabrdo, já na concorrência de duas Paira o espirito ideal que a purifica e anim a...
palavras. Idem pag- 139 (B ilac ).
Art. 9 1. Occorrem por esse íacto § 2.0 O poeta deve ter por norma
quatro figuras distmctas: a s elisões que são feitas naturalmente
duas no interior do vocábulo. syn na pronuncia, pois que não são forçadas.
§ 3.0 A mesma concorrência de vo­
" " t o "acòncorrencia das palavras: gaes pode não formar diphtongo, quan­
elisão e hyatus. do o accento tonico cáe numa dellas e
Art 02 Pela synérese e pela eh- pode formar diphtongo se o accento
são absorvem-se vogaes; pela d.erese e tonico cáe fóra.
pelo hiatus as vogaes se repellem.
D a s S ylla bas s s
54 C onsolidação das E b is do V erso

E x s .:
Art. 96. Baseia-se o dispositivo do
Re al — rea li da de; art. anterior na própria formação na-
Vi a — via du cto; lural de cada diphtongo, pois que elle é
iu a — a ctua li da de;
lauto mais facil de formar quanto mais
pi a no — pia nis si mo.
forte o accento tonico da palavra.
Dos exemplos acima se pode tirar a conclusão
Exs.:
de que, se o rythmo do verso o levar a isso, o poeta T.ealdade forma diphtongo naturalmente; porém
pode fazer ás vezes da mesma concorrência de vo- 11' dl sócom violência o fórma, pois que o accento
gaes, ora uma syllaba, ora duas. tonico não está fóra da concorrência das letras que
0 (levem formar. Para que o diphtongo se fórme,
C A P IT U L O II
nesse caso, é preciso que as cesuras que o precedem
011 seguem (art- 95) sejam bem accentuadas.
Da s yné rese (ou d ip tito n g o )

Art. 94 - Quando duas vogaes se Art. 97. A observância da escala


encontram juntas numa mesma palavra, das vogaes: a, é, i (y ), o, u, é um bom
a mais branda absorve-se na outra, quei guia para a formação dos diphtongos,
uao esquecendo o disposto no artigo
esteia antes quer depois.
E x - : saudade; piedade; Pac; lealdade; qmmc seguinte.

Art. 95. H a tanto mais facilidade Art. 98. Quando duas vogaes occor-
para a absorpção de que fala o artigo m ii num mesmo vocábulo, para que
liuja facil absorpção é preciso que o
anterior, quanto mais accentua a <
accento caia sobre aquella que na escala
a cesura que se lhe segue, ou que a
uccupa o primeiro logar, em relação á
precedeu. oulra, quer (esteja antes quer depois.
1 Artigo 100).
_ Rstrellas da sa«da|de, ardei perpet«amen|te. ..
(B ilac ). Sirvam de exemplos aquelles dos artigos 94 e 95.
D a s S yllabas 57
56 C onsolidação das L eis do VfiRSo

E x . : co ando (part- pres.) não se deve elidir


Art. 99. Quando occorrem algumas para não confundir com quando; etc.
vogaes e duas dellas por si já formam
diphtongo, para que se dê a synérese e Art. 102. Quando se dá o caso do
preciso que o accento caia no refeudo art. 99, e o diphtongo vem em primeiro
diphtongo e este venha em ultimo logai logar, não se dá a absorpção.
(art. 10 2). E x .: f e i o ; desmai o ; c re io ; arr oi o-
Exs. *
.
eguaes; geniacs; desconfiar; manusear. Art. 103. Se ás vogaes preceder um
grupo de consoantes aquellas diíficil-
§ unico. A s palavras curtas for­ mente formam diphtongo.
mam excepção e só se elidem com vio­ E xs.: crcança; preâmbulo.
lência.
_ Veja-se a nota no art. 96. E x .: Le a rs ; fi et. Art. 104. P ara que o diphtongo se
realize, no caso do art. antecedente é
C A P IT U L O 111 preciso que se não perturbe o rythmo
D a diérese do verso e sejam observados os casos
Art. ico. Se se der o inverso do dos arts. 95 e 96: cesuras bem accen-
art. 98, isto é, se a vogal que na escala I liadas.
( a r t 97) occupa o segundo logar toi C A P IT U L O IV
tão accentuada como a outra, não forma Da elisão
diphtongo e temos a diéiese. Art. 105. Quando o encontro das
E x s .: ca iiótico ; ra iz ; hi atus'; saude- <gaes .se dá, não no interior, mas, sim,
Art. 1 0 1 . Quando a absorpçao ac- 11:1 concorrência de duas palavras, dá-se
carrete perturbação do sentido deve-se .1 disão, nos mesmos casos em que se
daiia a synérese (arts. 94 a 99).
:vitar.
D a s S y l l a ba s 59
58 C onsolidação d as L e is do VBRSo

Art. 109. O hiatus é intolerável,


E x s -:
_ On deao pé deuma. lapa cavernosa. . . quando se tem de conservar a bocca
— Saudade, gos too margo dom felizes. . . aberta, para pronunciar as duas vogaes
que o formam, como nestes dois casos:
Art. 106. Tanto mais facil a elisão,
já ha annos; lá z’ae a agua a correr.
quanto mais brandas as vogaes, e quanto
mais accentuadas as cesuras que a pie- Art. 1 t o . O hiatus é tolerável, quan­
cedem ou seguem (art. 9 5 )- do, para a pronuncia da letra seguinte,
sc vae fechando a bocca, como nestes
E x .:
_So proo vên too gemer... Tre moon funá doo vela.. . casos: já hontem ; vaes lá hoje?
(B ilac ) .
Art. u i . O hiatus passa desperce­
Art. 107. Quando entra na elisao bido e é portanto admissivel:
alguma vogal tônica precisa que esta 1'. Nas cesuras, nos hemistichios,
seja tão accentuada que absorva as entre dois verso s: emfim onde
outras. póde haver pausa que abran­
E x .: . ,
de o esforço.
_ O musgo mais sedo sooi/s nea mais le v e ... Ili, Quando o sentido fôr pertur­
( A lberto) •
bado pela sua não observância.
c a p it u l o v 1 1 1(. Quando é formado por uma
Do h ia tu s interjeição.
Art. 108. Quando no caso do ait. T IT U L O III
100, as letras que se repellem pertencem
a palavras diversas, formam hiatus. Do accento tonico
E x. \ Art. 112 . Cada palavra tem o seu
— Dão-me a idé o da morte, ó ove, o teu lamento.. . ncccnio predominante sobre uma syl-
(V. M agalhães ).
6o CONSOI.IDAÇÃO DAS EEIS DO VERSO
D a s S y jx a b a s 61

laba, em que a voz se apoia, pai ecendo


Art. 1 1 5. Os monosyllabos, é claro,
que sobre as outras desliza.
têm de ser agudos.
§ unico. Este accento, que íecae
sobre uma syllaba, mais que sobre as Art. 116 . H a entretanto palavras
outras, chama-se accento tônico. que, apezar de monosyllabas (as encli-
E x s .: ja)U’lla; cândido; coração. licas) perdem a tonicidade, quando pre-
(edem outra, á qual se liguem no sen-
Art. 1 1 3 . O accento tonico é dado, 1 ido: os pronomes, os artigos, as pre­
não pela duração, mas pela intensidade. posições, etc.
— A maneira actual de contar as syllabas no Art. 117 . Nas palavras encliticas a
verso varia muitíssimo da maneira pela qual os \<>z deve deslizar, como se ellas fossem
latinos as contavam. E varia porque variou a ma­ syllabas do vocábulo em que se absor­
neira de encarar a syllaba tônica. Os latinos a enca­
vem, e nunca apoiar-se nellas, o que
ravam pelo lado da duração: uma longa valia duas
breves; nós pelo da accentuação mais forte, sem
alron xaria o verso (art. 27).
que, por isso, seja mais longa. Art. 118 . À tonicidade das palavras
Art. 114 . Conforme a syllaba em da, naturalmente, a tonicidade do verso.
que cáe o accento tonico, a palavra é. Art. iiç ). Se, para a tonicidade do
— aguda (se a voz se apoia mais verso, se forçar a tonicidade de uma
fortemente na ultima). "Utra palavra, 0 verso ficará defei-
Mioso (art. 27).
E x .: íerrão.
__ grave (se na penúltima). Alt. 120. A. variedade de vogaes,
d'- que laia o art. 20, quando recahir nas
E x .: livro-
syllabas tônicas do verso (cesuras),
__ csdruxula (se na antepenúltima).
1*1■1 i'■ bello o tornara, pois que mais se
E x . : codigo.
1,1 'Iara tal variedade.
62 C onsolidação d as L u ís do \ urso

A ri.1 1 2 1. Da observância dessas


leis, se bem que tão simples, nasce o
rythmo em todas a sua belleza (L ivro
LIVRO III
V , Tit. I I ) .
Da cesura
T IT U L O IV
T IT U L O I
Do modo de alterar o numero de syllabas
Da cesura em eeral
Art. 122. A s alterações das syllabas
só devem ser consentidas quando a pio Alt. 123. A cesura é o repouso da
nuncia já o autorizou e de accordo com vnz sobre a svllaba tônica de uma, ou
os arts. 29 e 30. '"•‘ is (le uma, das palavras que consti-
— As figuras granunaticaes que autorizavam o llu>m 0 verso, accentuando deste modo
accrescimo de letras, ou a suppressão dellas, cahiram i-il syllaba mais do que as outras (arts.
em desuso. Tiveram a sua origem na própria pliy-
siologia. A pronuncia variava de um logar palra
outro e era natural que a palavra se modificasse. Ai l. í 24. A variabilidade de cesu-
Assim os poetas portuguezes que usam supprimir o ,HS’ nos vários versos de um poema, dá
e do plural de flores obedecem ao uso do povo; ll(V:‘ " composição, quebrando a mo-
nós brasileiros não o podemos fazer, porque escan­ 11<>11 >11 ia.
dimos todas as syllabas.
Veja-se o exemplo do art. 160.
Hoje as figuras podem ser enumeradas como
mera curiosidade. Eram ellas (digamos assim!) as Mili" ú no tocante á variabilidade da cesura,
seguintes: Próthese (augmento no principio); Epen- lim dus maiores mestres da lingua portugueza- A
thcsc (no m eio); Paragógc (no fim ). Aphercsc •lllrnta (los seus decasyllabos e alexandrinos
(suppressão no começo) ; Syncope (no meio) ; 1 'br. mais convenientes a quem quer manejar o
d'hn
Apócope (no fim).
CoN S O l / I D A Ç Ã O DAS DEIS DO VERSO D a C esura 6s
64

Art. 125. A successão immediata A lt. 128. O uso intelligente das


de duas cesuras é interdieta, desde que cesuras muito pode concorrer para a
entre ellas não haja pontuação. belleza da expressão.
— Desde que haja pontuação admitte-se ccsura
Art. 129. A cesura que recahir so-
consecutiva.
ln e substantivo, alem de ser a mais
E x s .:
— Senhor brutal, pesa o aborrecimento. Imte, exprimirá melhor a substancia;
— Ju racy! Ju racyl Virgem morena e pura. E x .:
( B il a c ). — Formidável clamor, como de mar e vewtos,
_ ]? tudo me fa lou: tu do... Escutando, etc. Resfolgar de trovões, etc.
( B il a c ). ( A lberto) .
— Ver nota no art. 153 e o art. 161, §§ e res­
pectivos exemplos.
a que recahir sobre verbo melhor expri­
mirá a acção;
§ unico. Só se admitte excepçao
E x .:
quando se quer chamar a attenção pai a
— Sonhei que me esperavas e- sonhando
“ duas palavras que, pelo effeito intel-
( B il a c ) .
lectual a produzir, devem ser bem des­
tacadas” . a que recahir sobre adjectivo melhor
exprimirá uma qualidade que se deseja
Art. 126. A voz repousando mais
alientar.
sobre uma palavra, chama naturalmente
I ,v . O musgo mais sedoso, a usnea mais leve.
a attenção para ella.
(A lberto).
§ unico. Rasão porque se devem pôr
nas cesuras as palavras para as quaes Art. 130. Se a cesura grypha a
se quer chamar a attenção (art. 7)- palavra sobre que recáe, na falta delia
A rt. 127. A s cesuras mais fortes " pensamento desliza, até que a primeira
são as que recaem sobre substantivos, * '- .ura chame a attenção para elle.
66 C onsolidação d as L e is do VfiRSo D a C esura 67

§ unico. D' o que acontece nas pa­ ( hitro exemplo do mesmo poeta:

lavras longas, onde a voz desliza, sem (...Es/>rra que eu te sigo.)


Onero também beijar as faces delia!
se perceber o sentido que s<j se accentua
\ voz desliza por sobre os verbos para se
e define com o accento tonico. m. , . ninar eloquentemente, encantadoramente, sobre
" 1 hpressão — as faces delia, que é aquillo para
Art. 1 3 1 . Sendo a cesura o accento •i"1’ o poeta quer chamar attenção.
tonico do verso e, portanto, a accentua- I' ' um dos recursos da prosa, da eloquência,
ção da idéa nelle contida, podemos, ás Milmii.ivelmente adaptados pela poesia, como alliás
vezes, passar sem ella, e até devemos uuiilir, (Hilros.
fazel-o, quando queremos prolongar a ■ \il. 132. Dos versos de sete svl-
espera, chamando melhor a attençao 1 11,1' cm diante, quasi que o ouvido não
para a idéa que se quer accentuar. I" Ml‘ dispensar a cesura, excepção feita
—Vejam-se, para exemplo, estes dois versos de l " '. i i s casos previstos no artigo ante-
Bilac em que o primeiro passa sem cesura alguma, 1 " " ■ ■ inaiiclo se quer accentuar uma idéa.
nem quiçá a da rima, para que o primeiro accento ( Í<i\ i'n \ . Do rythmo).
forte venha cahir na primeira syllaba do verso se­
guinte, accentuando-o extraordinariamente. -\'i 133. A cesura pode ser:
I. /'(intlfativa: como nos versos
Vaes desapparecendo,
Terra do nosso amor/
dc poucas syllabas;
Berço dos nossos /ílhos! II Obrigatória e fix a : como nos
versos de nove e oncc syllabas
E ’ um recurso admiravel. Vejam como aquella
c geral mente nos de oito.
terra ficou saliente. Porque? Porque o factor in­
consciente, a inspiração do grande vate fez com
III ( ibngatoria, porém inovei e
que a vo : deslizasse por sete syllabas para vir apoiar •iii dupla: como nos decasylla-
todo o seu esforço, até então contido, na primeira bn'. ç alexandrinos e, raranten-
cesura que se lhe deparou ter, lc, nus de oito.
68 C onsolidação da s Lfiis do Vnao D a C esura 69

§ unico. A superioridade do deca- Art. 137. A cesura começa a ser


svllabo portuguez sobre o francez re­ apreciável, porque assim o requer o
pousa nisto: no portuguez a cesuia e natural descanço da voz, do verso de
movei, no francez é fixa. i uiís syllabas em diante.
Art. 134. Cesura fix a não quer Art. 138. Nos versos até sete syl­
dizer que seja só uma a possivel, mas labas a cesura é mobilissima, podendo
quer dizer que escolhida uma syllab uTaliir variadamente em todas as sylla-
para cesura, nessa syllaba tera ella de bas, respeitado o dispositivo do art. 125.
cahir sempre em todo o poema.
— Vejam-se os exemplos do Titulo IH- Art. 139. A base da cesura é o
ai cento tonico; e o accento tonico das
Art. 135. Escolhida uma syllaba
palavras graves de oito syllabas, por
para nella recahir a cesura, assim se 1 M inplo, só cáe na sétima, deslizando a
deve conservar por todo o poema sob Vn/ nas outras.
pena de quebrar o encanto (art. I 4 7 b
\rt. 140. Dahi, por analogia, o
t it u l o II > A 1 o ouvido dispensar a cesura nos
Dos versos em que a cesura e facultativa Vei de um certo numero de syllabas.
g e n e r a l id a d e s
~ N.i melrica franceza a cesura é:
Art. 136. dispensar a cesura:
P o d e m
Im ultativa: nos versos até 5 syllabas;
frequentemente, os versos ate c i n c o "In ÍKatoria: nos de 6, 7 e 8;
ulil ÍKiiluria e fixa : nus de 9, 10 e II.
svllabas, e até SÉTU, raramente.
_ Nos versos de 6, 7 e também 8 syllabas so 1 D, 1ii 1,• ,111 alexandrino, ha, como amplamente
por excepção (art. 13 1) se pode prescmd.r da ' - ....... ..... iliain, o alexandrino de cesura fixa
sura, e como um recurso de belleza. |) ai, «fiiiili mu de cesura movei-
70 C onsolidação d as L e is do V erso D a C esura 71

Do v e rs o de T R E S sy lla b a s Sobre o uso desse versos de 4 syllabas, bem


Art. 14 1. O verso de três syllabas ".uio sobre os de 5 e 6, ver o art- 56 § único.
O verso de 4 syllabas é muito usado nas com­
póde passar sem a cesura ou póde ter binações de estrophes.
cesura na i .a syllaba (art. 12 5 ).
jrx • Cesura na :
Do ve rso de C IN C O s y lla b a s
Baiccho, inspi|ra! 1.“—3-a
Tan]ge a ly |ra, i.a—3-”
Que suspi|ra ----- 3-“ Art. 143. O verso de c i n c o sylla-
Sem falar] ! ----- 3-“ chamado “ de redondilha menor” ,
Vem| ! impri|me i.a—3-“ !’" (lc passar sem cesura, ou pode tel-a
Um subli|me ----- 3-a n'r ' Ires primeiras (art. 12 5 ).
Som] na ly|ral i.a—3-a
Cesura n a :
Do v e rs o de Q U A T R O s y lla b a s 1'ulgidas estre|llás — S-
Art. 142. O verso de q u a t r o syl­ l.ogo se ainorte[cem, ----- 5 -
labas já possue mais recursos rythmicos, 1 auto que appare|cem ----- 5 -
De Titão os rai|os. ----- 5 -
e pode passar sem cesura ou tel-a nas
duas primeiras (art. 12 5 ). 1 ainbein] se Mari|lia 2-a—5.
Cesura 11a Moslra a fa|ce pu|ra


U1l
Tol|dam-se os a|res l-a—4.“ 1 "da a formosu|ra — s-1
Mur]cham-se as fio |res, i.a—4." I'aile|ce tlesmai|os. 2.“— 5 -'
Morrei], amo|res 2.a—4 a
Que Ignez morreu 2.“—4.” C' D .1 I>1 imcira quadra, pode-se dizer, passa
Mi|sero espo|so, i.”—4.“ • ' Hí •i»*‘ •• a não ser a das rimas.
Desa]ta o pran to, 2.a—4-“ l ,>n|rrtMii>s fazer cesura em F ue Jgidas ou em
Que 0 teu encan]to ----- 4-a " Imiti areentuar essas idéas, mas poderemos
Já não é teu]. ----- 4-a |§jii iis.il ,1, lambem 11a leitura. Se deixarmos des-
(B ocage). I ’• ■ entretanto, na i.* quadra sem accentuar

iimmiltlIlIttlflIllllllIlllllillllllllllllllllllllllHIIIIIIIIIIlir
D a Césura 73
72
rwnTJDACÃo DAS leis do V ^ sq
E x .: Cesura na
nenhuma syllaba, mais forte, muitíssimo
Adeus |, aguas queri|das 2. "—6.“
resaltarà o - também da comparaçao que começ
Do Te|jo encantador|. 2."—6."
na quadra seguinte. Adeus|, casaes| risojnhos, 2-“—4.“—6.“
Essas pequeninas coisas é que dao belleza
Pelo pendor| descen|do 4.'1—6.a
poemas. Dás encos|tas flori|das ! 3-a—6.”
Art. 144- K ’ commum, neste verso Vaes desapparecendo —
fazer a cesura fix a na 2.a syllaba (e na Te|rra do nosso amor|, i.n—6-a
C A por todo um poema, compensando Ber|ço dos nossos fi|lhos ! i.a—6.a
a falta de variedade pela “ segurança . (B icac ).

Cesura na: I >uas coisas são dignas de nota no exemplo


E x .:
De lo|to e de murjtas 2.“- 5-a sriin,i a cesura dupla do terceiro verso que lhe dá
Num lei|to virenlte, 2.a—5-“ t iiiu amplidão e a falta de cesura no sexto de que
Beben|do conten|te, 2.a—5-a jft nos oecupamos commentando o art. 131.
Me voul recostarj: 2 “— 5-“
lambem este verso, que se presta ás peque-
i,! - "de-, 0 cançonetas, é muitíssimo usado, como
E os cojpos alegres 2'a~ '5'a
" s dr | c 5 syllabas, em combinação com outros de
M.e vejnha Cupildo, 2’ ~ 5\ !!!ai..i numero.
De ga|la vesti|do 2-*—^
Aquil ministrar). 2.'1—S-
(G arrêtt) ■ T IT U L O III

DO v e rso de S E IS s y lla b a s i >«is versos em que a cesura é


obrigatória e fix a
A rt 145. No vers0 de SÍ;IS sylla" Alt 1 |<>. São versos de cesura obri-
bas em que a cesura pode cahir nas qua­
t r o primeiras, os recursos rythnucos sao
mtnriii c rigorosamente fix a (arts 134
já bem grandes.
I I E, ) "■•• de NOVE e os de onze syllabas.

iiiniiiiiiiim I IIliiíiiiiilIliiiiiimililllliiliilliiHiiiltiimimm..... ..
D a C esura 75
C onsolidação das L a ís do_ V e r so
74
E ’ esta a maneira mais usada pelos decadentes.
Do v e rso de N O V E sylla b a s
0 que a outra disposição tem de monotona,
a rt
I47. O verso de n o ve syllabas tem esta de encantadora. A primeira foi muitís­
apresenta dois rythmos diversos, con- simo explorada; a segunda é relativamente moderna.
Z 4 e a fixidcz escolhida para a cesura.
Do ve rso de O N Z E s y lla b a s
' " x O poema pode ser composto
Art. 148. O verso de o n z e sylla-
de versos com a cesura fixa na 3 - -&■
b;is apresenta também dois rythmos
e 9.- syllabas. CesoIa diversos, se bem que em ambos a cesura
fnrle caia na 5.“ syllaba.
SouTttmlto «ue ?>!*»*• <1'“ E A -A § 1 ,° O que faz variar o rythmo é
Sem prinlcipio, sem ímp, sem ^
V o ,, levanldo » v e n U ip . e a t o í lí , tuna leve cesura anterior á da 5.a syl-
Voa leraald , as v a id a d e d , vid a. ^ i.iha e que num rec.ae 11a 3 / e no outro
na ~’,n
V’ de notar o maravilhoso effeito conse d 2." O verso de 1 1 syllabas, mais
d,a . .d e. P « r « a de ama
it .idu pelos românticos foi o que tinha
corrida, no uso do rythmo citado. _
iis . usuras na 3-a, 5-a e n . a
__ Este é o metro mais usado na composição
I Cesura na:
hymnos que se destinam ao canto.
1 in,uii|a horrilvel- Noite de invernajda 3 .a- 5-a-H-“
§ 2.° Pode a cesura recahir tam icm |*rlti 1 uh|ulio antijgo, sob a ramalha|da 3 .a-J.a- i i . ”
|t«i. Huuigiiei|ras ne|gras—trágico tropel]-.. 3 .a- 5.a- n .”
m A a e Q.a syllabas.
n a 4- J J Cesura na: In1.1 ]11a zu|nem, folhas sêccas vo|am, 3.ai5.a- n .a
| „ •• 1111.1 len|tos arrastados so|am, 3.a-5.a- ii- 11
Além ' nos a|res, tremulamen|te
ÍI fb ai i (dei a,|diis como os de um corcel|. — 5*"1 1 *
Que visão branjca das nuvens sae| ^ ( A lberto).
Luz entre as fran|ças, fria e »den|te, 4- ^
Além nos a|res, tremulamenjte, _ a 1 ;" () outro rythmo, mais moder-
Balão acce|so> subindo \ a e |... ^ __ A,,v |}tt, . aiiuelle em que ha possibilidade de
(R aymundo C orrêa).
D a C esura 77
76 C onsolidação das L e is do ^Vêrso

Art. 150. O verso de oito syllabas


cesura na 2.a e cesura forte na 5-a syl-
pode também ser classificado entre os
laba. de cesura movei e então ella pode re-
jjx . Cesura na :
cahir nas seis primeiras syllabas.
Além| na tapa|da das Quatorze Cruzes 2-"-S.a- n .”
Que tris|te velhi|nha que vae a passar| ! 2 .°-5 .-n . I odemos dizer que ao verso de oito syllabas
Não le|va candei|a; hoje o Céo não tem portuguez acontece como ao alexandrino francez;
[lu|zes isto é: que ha dois versos de oito syllabas: o de
Caute|la, velhi|nha, não vás tropeçar| ! 2.1-S.“- n .“ 1 1 sura fixa, de que trata o art. 149, e este de cesura
(A ntonio N obre)- movei que possue menos segurança, mas muito mais
inesperado.
— Antonio Nobre usa com rara felicidade este
rythmo combinado com versos de cinco syllabas em E x .: Cesura 11a
varias poesias dignas de uma attenta leitura. A ’s vezes pa|sso horas intei|ras 4-*—8.“
( lllios fi|tos nestas brazei|ras 3'”—8.a
Sonhando 0 tem|po que lá vae|. 4.“—8.*
T IT U L O IV
No arame oscillante do fi|o, ----- 8.*
Do verso de oito syllabas, em que a Ama|vam (era 0 mez do ci|o) 2.”—8."
cesura pode ser fixa ou movei l.cvandislcas e tentilhões|. 3-a—8.a
Art. 149. O verso de o i t o syllabas Descança, minha Avó|, que sim| ! 6."—8.a
é frequentemente usado com a cesui a (A ntonio N obre) •
fixa, na 4." (e S.a). <> effcito conseguido com a dispensa da ce-
E x .: Cesura 11a suiH 110 quarto verso citado é surprehendente. Dá
Vi-te peque|na: ias rezan|do 4."—8.” íT - i 'l.i oscillação, pela inconsistência, que a falta
Para a primei|ra communhão| : 4.“—8-” ■li ii tua trouxe ao verso.
Toda de bran|co murmuran|do, 47 —8 .*
Machado de Assis usou também, na primeira
Na fronte 0 véo|, rosas na mão| 47—8.“
l"""'1' Phalenas, o verso octosyllabo com ce-
Não ias sój ; grande era 0 ban|do. .. 4.”—8.“ niía movei.
(B ilac ).
D a C e su r a 79
7 8
C onsolidação das L e is do V erso

Art. 152. A cesura dupla no inte­


T IT U L O V rior do verso septisyllabo, como alliás
acontece a todos, traz um .extraordi­
Dos versos em que a cesura pocle ser
nário encanto ao poema.
movei e além disso dupla
E x .: Cesura 11a:
C A P IT U L O i
1 1llia de atro|zes degre|dos! i.*—4."—7.“
Do s e p tis y lla b o Cinge um mu|ro de roche|dos ----- 3."—7.“
Art. 1 5 1. O verso de SETE syllabas Crus flan|cos. Gro|sso, a espumar|, 2.“—4.“—7-"
(“ redondilha m aior” ), que raramente Contra a dura penedi|a, 7-'
B«|tc, arreb<?n|ta, assobi|a, I.*—4-“— 7 *
pode prescindir da cesura interioi, po­ la'lum|ba, estrodeija o mar\. 2.“—5."—7.”
de tel-a indistinctamente nas cinco pti- (R aymundo Corrêa).
meiras syllabas (e na y.").
£x . Cesura n a : O grande poeta attingiu nos tres últimos
mi o', da estrophe o ponto culminante a que podia
Sauda|des mal compensa|das 2."—7-'1
i hrn.ii uo verso septisyllabo: Variedade de vogaes :
Porque moti|vo as tomei|? 4-'1— 7-''
í. h, r, i. ü, ei, ar; dispensa da cesura 110 4.“
Como agora as deixarei|? 7-
m11 '■ o, preparando o effeito para o verso seguinte;
Ho|je por cousas passa|das i . '—7 ' iiaiii.i dupla e. além disso movei nos dois últimos
E só por vosso respei|to 7-' : 11111 11a 1." e 4.“ outro na 2.“ e 5-a
Vara|do vejo o meu pei|to, 2."—7.”
Senho|ra, por se|te espa|das- 2." 5. 7- \rl. 153. Se o verso septisyllabo,
(G oulart de A ndrade). ' mu 1 <111.1 dupla, adquire maior belleza,
— Como se vê 110 3.0 verso a cesura da ter­ ;<<Im1■11< 1 111 que, além de dupla, concorrer
ceira syllaba é fraca e quasi não se deve accentuar n 1 n ui .0 do art. 125 § unico, tornar-
na leitura. Outra coisa digna de mensao é-a bella ít a rloi|iicnte e encantador.
cesura dupla do 6.° verso e a do 7-°, onde o apoio
da voz na quinta syllaba salienta mais a expressão Ciimn vimos, a transgressão do preceito que
(Ullitit rviliii duas cesuras consecutivas, parado­
—• sete espadas.
8o C onsolidação das D e is do V erso
D a C e su r a 81

xalmente concorre para a belleza. E ’ que são poucos


os casos em que a regra pode ser desobedecida, e C A P IT U L O II
quando o é, a rasão é tão forte que por si justifica
Do d e ca sylla b o
a excepção-
AUiás não é o unico caso, em poética, em que Art. 154. Antes da introdueçao do
a transgressão de uma regra geral pode concorrer alexandrino, foi sempre o decasyllabo o
para a producção de uma belleza: na onomatopéa verso heroico portuguez.
o mesmo se dá. A homophonia deve ser evitada; a
homophonia proposital, que é a excepção, pode pro­ Art. 155. A incontestável superio-
duzir bellezas. I idade do decasyllabo portuguez sobre
Reatando, diremos : a successão de duas cesuras
também no verso de sete syllabas, pois que, por
II I ranccz está nisto de que a cesura do
assim dizer, grypha a segunda cesura, augmenta o 11 anccz é fixa (4.a-io .a, 5.a-io .a, 6.a-i0 .a)
encanto do verso. '• ■' do portuguez além de mobilissima
R x .: Cesura n a : I"'du ser até dupla (sem falar na rima:
Sijno, coração| da aldei|a; i.”— 5-“—7-* " ura final).
Coração|, si|no de gen|te 3-“—4-“—7-‘
Um| a sentir|, quan|do ba|te i.a—4.*— (S-a) —7-“ An 156. Acontece por isso com o
Ou|tro £'. bater|, quan|do sen|te. i-a—4.“— (5.*)—7-a d " ,1 vllabo portuguez quasi o que acon-
(C orreia de Oliveira ). ln t mm o alexandrino francez:
— Nos dois últimos versos, o fazer a cesura 1 ) pela mobilidade das cesuras,
na i.a e na 4.“ ou na 4.1* e na 5-a é mera questão maiores effeitos de rythmo;
de gosto. Quem quizer salientar a comparação de In pela duplicidade das cesuras, ac-
um. . . — outro. . . é só accentuar taes vocábulos. iriiiuaçao de mais uma idéa no
Quem, entretanto, desejar fazer a semelhança de
nieaiio verso.
ambos mais pelas acções, pelos verbos, ahi então
adquire mais energia, deslizando pelas primeiras '■ o i',;. I’ela mobilidade das ce-
syllabas, fazer cesura em sentir e bater e logo após pUtHs pode se marear a evolução do
nos dois quandos da comparação.
ipfiayllabo poi |iiipie/., que partiu da
D a C e su r a 83
82 C onsolidação d as L e is do V erso

— O de Bocage pode ser dado como o modelo


accentuação comraum na 6.a até á mo­ desta nova accentuação.
bilidade completa num crescendo de
E x .: Cesura na :
liberdade e de belleza. Nize mimo|sa, como as gra|ças pu|ra; 4.*-8."-io.*
Art. 158. A accentuação mais com- Amável Ni|ze, como as gra|ças bej 11a 4-“-8.a-io.°
mum entre os antigos é: 2.a-6.aio.a, ou :'.e inda em teus o|lhos me perten|ce aque|lla 4.“-8.a-io.a
Mavio|sa affeiçãoj que fere e cu|ra. 3."-6-il-io.“
3.a-6.a-io .a, ou ainda 4.a-6.a-io .a Ver todo o soneto, em que ha ainda outras
— O verso de Camões pode ser dado como o
cerniras 11a 4.°-8.“-io.a
modelo daquella accentuação, que chamaremos clas-
sica.
E x .: Cesura na: Art. 160. H oje o decasyllabo attin-
As ar mas e os barões | assignala dos, 2.a-6.a-IO.a •m á evolução completa pela mobilidade
Que da Occidental prai|a Lusita|na —6.“-io-a d i . cesuras:

p\
to
Por ma|res nunca dan|tes navega|dos

c
() de Bilac, para citarmos um dos mestres
Passa|ram inda além’] da Taproba|na; 2 .a-6 -a-IO.a
imn pn|iulares, pode ser dado como exemplo dessa
Em peri gos, e gue|rras esforça|dos 3.a-6.a-io.a
1 m lUil.ulora mobilidade-
Mais do que prometti|a a força huma| n a ; •—6.“-io-a
Qualquer soneto da Via-lactca é um modelo, de
E entre gen|te remo|ta edifica|ram 3.a-6.a-io.a
i 1 tlllll n moderno.
Novo reiIno, que tan|to sublima|ram: 3."-6-a-io.'1
(C amões ). E Cesura n a .
H n n lir1 que mr es]iera|vas. E, sonhan|do —6.a-io.a
Prosperamen|te os ven|tos assopran|do, 4"-6.a-io.a
fiSllll, iUiciiiMi por te ver| : corri|a... 2 .a- 8 .a- I 0 .a
Quando uma noi|te estan|do descuidajdos. 4.ll-6.aio.a
(C am ões ). ! Iii|i 1". ,io ver-me tão depressa andanjdo , —2 .a- I 0 .a
fã.inli, 111!h‘ 1 0 logar| para onde eu i [a. 3.a-6-a-io.a
— Este é o typo do verso dos Lusíadas; e é
o typo clássico-
í llltl ,1 nu l,i/i)ii|, /«|do! Escutanjdo ó.a-7.a-io.a
Art. 159. M ais modernamente já I í flil pn|mkiin, u(ravez| da ramari|a, 2 -a-6 .“ - I 0 .a

se combinam aquellas cesuras com ou­ bus dlr»pei:lndo‘, pa|ssaros.o ban|do : —6.a-io.a
ü V-t. main ,1, |,1 r a 1 Parabensl!” dizila. 4.a-8.a-io-a
tras na 4.a-8.a-io .a

miiiniimiillliiIllIllilllinTUTT
84 C onsolidação d as L e is do V erso D a C e su r a 85

Disse o luar[| “ Espe|ra! que eu te si|go: 4.a-6.aio-a § 2.° N a 7.“ só no caso de cesura
Quero também beijar as fajces de| 11a ! ” —8.a-io.a
consecutiva, quando ha apoio na 6.a
E disse o aro|ma: “ Vae[, que eu vou com ti|go!”
f4.“-ó-“-io.a E x s .: Cesura na :
■ Dentro é tudo mudez]. Flejbil murmu|ra 6.*-7.a-io.‘
E chegueij. E.
ao chegar |, disse uma estre|lla: (B ilac ).
[3.“-6.a-io.”
Como és feliz] ! como és feliz|, amijgo 4.a-8.“-io.a -Vesper fulgura além]... Ves|per ! Só ella 6.a-7.a-io,a
Que de tão perjto vaes ouvi[l-a e ve|l-a! ” 4.a-8.“-io.a (R aymundo ) .
(B ilac ).
Que em chegando ao Pinhão| fo|ge á direita
—- Os mais bellos sonetos decasyllabos moder­ [ó.“-7-a-io.a
nos têm esta encantadora mobilidade. Os exemplos (A lberto).
são innumeros-
C A P IT U L O II I
Art. 16 1. A cesttra no decasyllabo Do a le x a n d rin o
jámais pode cahir na 9.11 syllaba e só Art. 162. Mais longo do que o
excepcionalmente na 5.“ e na 7.“ dn a sy 11 abo, tem o alexandrino os mes-
§ i.° N a 5_a só no caso de cesura iii'» . re<|uisitos daquelle, relativamente
consecutiva, quando se apoia também .1 nmbilidade e pluralidade de cesuras,
na 4.“ (art. 12 5 ). |">v,nítido além disso maior numero
E x s .: Cesura na : • b ll.i c portanto muito mais recursos
— Senhor brutal], pé|sa o aborrecimen|to... 4.a-5.a-io-a i \ I llllMCi )S.
(B ilac ).

—■ Chóro por vós|, ar|vores seculares... 4-a-s.a-io.a \i 1 163. O alexandrino clássico é,


(A lberto). l •*1»i»1 linda o romântico, formado de
—- Correm veloz], lar|ga e fogosamente... 4.“-5.a-io.a ‘ ;i • m i ;ns de seis syllabas, ligados en-
(R aymundo ). " 1 |" li» liemistichio da sexta syllaba.
L/A CESURA O/
86 CoNSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO

pre jvarias cesuras no interior do pri­


Art. 164. A ligação dos dois versos
meiro verso, porém sempre também com
obedeceu sempre entre os clássicos e os
a cesura forte na 6.a syllaba.
românticos a tres le is:
— Estes de Bilac obedecem á regra classica:
a) quando o primeiro verso ter­ Ful|ge e darde|ja o sol| nos amjplos horizonltes
mina por palavra aguda o se­ [i.a-4.a-6.“ etc.
guinte pode começar por vogal l)o céo d’A|frica. Ao lar|go, em plena luz|, dos
ou consoante; [mon[tes 3i“-6-a etc.
I)csta|cam-se os perfis]. Tremulamente ondei|a
b) quando termina por grave esta [2-“-6.|a etc.
deve ser singular e a palavra Vasto ocea|no de pra|ta, a requeimada arei|a.
seguinte tem de começar por [3.“-6.!' etc.
vogal ou h mudo para haver (B ieac ).
elisao;
c) o primeiro não pode terminar Art. 166. A mobilidade das cesuras,
em esdruxula. mesmo conservando a tradicional pos­
ei hil idade de parar na sexta syllaba,
Exs. : —• a) Hemistichio em aguda:
—Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!
varia extraordinariamente o rythmo do
•—-Enfara-me este azul e desmedida umbella... alexandrino.
( M achado de A s s i s ).
Art, 167. Excepcionalmente pode o
b) Hemistichio em grave:
—Que da grega colxmna á gothica janella, ili aiidrino prescindir do accento na
—Bailando no ar, gemia inquieto vagalume : — o " syllaba.
(M achado de A s s i s ).
único. Nesse caso ha necessidade
Art. 165. Como o decasyllabo clás­ dr que as cesuras que o substituem sejam
sico (art. 15 7 ) o alexandrino teve sem­ In m .icrcntnadas.
C onsolidação d as L e is do V erso
D a C e su r a 89

E x s .: Cesura n a :
Moços de Portugal[, neste livro heis de achar| 6."-i2.a escolas nelle foram integrando, á plena
Alguma coi[sa que senti|sseis algum dija,: 4.a-8.a-io.a evolução e maior vibratilidade possível.
Gloria perdi|da, sonho aljto, alma a penar| 4.a-8.“-lo / pela mobilidade e multiplicidade de
E o grande amor] da nossa Te|rra o alu- cesuras;
[mi|a. 4.a-8.a-i2;a
pela cesura consecutiva: na 6,a e J."
Têm do meu sanjgue os versos to|dos
syllabas.
[que aqui vêdes, 4;a-8.a- i2.Í
Como sahi|ram», bons ou maus|, assim E x s ..
[lá vão|. 4.a-8.ai2.a — Cesuras : — na 6.a—i2.a:
(A eeonso E opes V ieira ). Vinha tombando a noijte, escuridão sem fim[.
—■ na 4.'1—8.a—i2.a:
—Suspeita de sorri|so innocente disfar[ce — 6-a-i2.” Kapazes d’ho|je, este poe|ma é p’ra voceis|.
Sombra de alguém que vi|uha e recúa — na 3."—6.a—p.a—i2.a:
[indeci[so —• 6,a-i2.a Sobre as onjdas oscijlla o batei,| docemenjte.
Astro a pungir|, longinquamen|te, o azul — na 3.”—8.a—12.a :
[do di|a. 4-a-8.a-i2.a (!igantes|ca, estirando o cor|po, de repenjte.
(A madeu A maral ). ■ 11a 3.”—6.a—10.°—12.:
Mudo e tris|te Scipião|, longe dos mais|, no emtatbto.
1.“—4-a—5.“—8.a— 12V :
Art. 168. Sendo fix a a cesura na I 1111M< e darde|ja o solj nos am|plos horizon|tes.
4.a-8.a- I2.a, tornar-se-ia monotono um na 2.“—4 a—6.“—8.a—io.a—12/ :
poema todo escripto naquelle rythmo e ’ " i i afj I sem luz| ! sem Deus|! sem fé |! sem pão| !
portanto deve ser usado parcamente e [sem lar| !
11a 6." e 7.a, além de outras:
alternado com os outros.
I u m iv ! juracy|! Vir|gem morena e pura.
—• Assim o usou Affonso Lopes Vieira.
I >0 alexandrino disse o brilhante critico por-
diuiiio Iddidino de Figueiredo:
Art. 169. O alexandrino moderno \ r is o extenso, dum caracter retumbante e
attingiu, pelas conquistas que todas as 'O '" . ......... . alexandrino contem todos os recur­

iiiiiiimiiiiiiiiuiimiiuiiimimmiuiiiiniiniimiimmimmmH
go C onsolidação das L e is do V erso

sos para a expressão de sentimentos exaltados, para


as imagens arrojadas, para as idéas imprecisas,
mas violentas, para a adjectivação superabundante,
ousada até a extravagancia

— Jamais se deve esquecer o sabio conselho de LIVRO IV


Alberto de Oliveira, que o acha grandioso demais
para as coisas pequeninas : Da rima
“ O alexandrino, poeta,
De que outras .vezes te vales, T IT U L O I
Não cabe dentro do calix
De uma violeta. Da rima em geral
Arreda esse metro austero
Dessa creança formosa; Art. 170. Rima é a uniformidade
E ’ o mesmo que deitar Nero
de som nas cesuras finaes de dois ou
Junto a uma ro sa ... ”
mais versos (arts. 70 a 79).

Art. 17 1. A rima, que nasceu da


própria cadência, pois que é uma ce-
1ira, é reclamada por aquella, como um
descanço, marcando fortemente para o
"iivido o finalizar de um periodo ry-
1 lim ita >.

Ari. 172. A rima é necessária (art.


,i, principalmente agora que o verso
liao (em mais aquella rigidez do verso
92 CoNSOI.IDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO D a R im a 93

clássico, e os encadeamentos e a mobili­ § unico. Ainda se toleram como


dade das cesuras constituem alguns dos auxilio, mas intercaladas com outras
seus característicos. perfeitas, dependendo, para que consi­
Art. 173. A rima é um auxilio, gam agradar, do talento do poeta.
E x .:
pois que ella é uma disciplina.
Pensava em ti. Ante meus olhos ávidos
Tua imagem sorria, j
T IT U L O II Beijava-te estuante e afflicto (eras tão pallida\)
Nella rae embevecia;
Das differentes especies de rimas Pois que és tu no areial dos dias áridos
De minha vida, a flor,
C A P IT U L O 1
A sombra em que descanço, o oásis mágico,
R e la tiv a m e n te á u n ifo rm id a d e de som .
O meu unico amor.
Art. 174. A s rimas podem ser ( A lberto).
toantes ou consoantes.
■§ t.° Toante é a rima em que ha Art. 176. A uniformidade, pois que
apenas semelhança de vogaes, da sylla- ;is rimas são feitas para o ouvido, deve
ba tônica em diante. ser, não de letras , mas sim de som.
E x s .: claro—grato; cândido—pallido.
§ 2.0 Consoante é a rima propria­ Art. 177. Deve-se banir, de accor-
mente dieta, aquella em que ha perfeita d<» com o art. antecedente, as pretenças
conformidade de som, do ultimo accento limas em que uma vogal aberta ( ja -
tonico em diatne. in fla ) pretende rimar com uma fechada
( istrclla).
E xs-: bella—janella; pallido—cálido.
I'.’ digno de nota que os cultores da forma
Art. 173. A s rimas toantes cahi- ........ ‘ xccllcncia usem, contra todos os requisitos do
ram em desuso. ....... K":,lo, rimas como aquellas apontadas. Já tive­
9 4
C onsolidação das L,Ei s do V ír so D a R im a 9 5

mos occasião de escrever nesse sentido, dirigindo


SECÇÃO II
um appelo aos novos para que fossem abolindo tão
Das q u a lid a d e s “ p h y s ic a s ” (s e g u ra n ç a )
feio abuso !
Art. 182. A uniformidade de som
A ri. 178. Uma vogal accentuada é exigida da vogal em que cáe o accento
e prolongada (feri-o) só mediocremente tonico em diante.
rimará com uma que forme dipthongo
( feriu). Art. 183. D ará á rima um caracter
de riqueza a uniformidade que abran­
C A P IT U L O II
ger toda a syllaba, vindo desde a conso­
R e la tiv a m e n te á q u a lid a d e
ante que precede a referida vogal (con­
SECÇÃO I soante de apoio).
Da q u a lid a d e em g e ra l

Art. 179. Rim ar o quanto possível Art. 184. Não deve entretanto ha­
palavras bem semelhantes como som, ver exagero nem esforço no uso da
porém assaz differentes como sentido. consoante de apoio, pois uma “ rima
Art. 180. N a uniformidade de som rica” jamais salvou um verso mau.
repousa a “ segurança” ; na raridade do — “'U ne rime-riche n’a jamais sauvé un mau-
vai.s vers” , diz Guyau.
vocábulo, a “ surpreza” .
Art. 18 r. Riqueza de rimas não é Art. 185. As rimas não devem ser
tanto a raridade dos vocábulos, como a lao ricas que causem mais admiração
variabilidade delles. <|iic emoção.
— Usamos a expressão —• riqueza de rimas
não no sentido da rima rica, mas no sentido em
Art. 186. São bellas as rimas que
que é cpposição a —• pobreza de rimas, pobreza ■■ apoiam em diphtongos, porque são
essa caracterizada pelas rimas em ão, em ado, em i heias.
ente, etc- Des.’: Ouro; raio; repouso; receio, etc.
D a R im a 97
96 C onsolidação das L e is do V erso

E x .:
Art. 187. Dão grande realce ao 1 ui uma mosca azul, azas de ouro e granada,
verso aquellas rimas em que segue á Filha da China ou do Indostão,
vogal accentuada mais de uma conso­ üllr ciilre as folhas brotou de uma rosa encarnada
Em certa noite de verão.
ante.
I mi mulheres em flor, cem nayras superfinas,
E x .:
Aos pés delle, 110 liso chão,
Do gorro azul o meu penacho branco
II MDrpiiicam sorrindo as suas graças finas,
Agita-se de flanco.
E todo o amor que têm lhe dão.
Segue rente ao corcel, batendo a orelha,
(M achado de A ss is ).
Meu galgo, de parelha.
SECÇÃO 111
Mas como estimo que ninguém a estenda
li.ii. q u a lid a d e s " in te lle c tu a e s ” (s u rp re s a )
Dou-lhe a fórma de lenda!
( F ontoura X a v ie r ) .
Ari. 190. A rima, que vem, como
tildas as cesuras, no tumulto das ideas
— Veja-se ainda o canto V II do “ Parahyba ’, dl ve m i “ menos buscada que acceita” .
de Alberto de Oliveira.
Art. iq i. O poeta que se preza, não
n 1 < desleixar na escolha, mas pelo con-
Art. 188. São pobríssimas, por vul­ H Mp 1. deve pôr intelligencia e bom
gares, aquellas de que ha grande quan­ t " ......... seleccionar as, rimas, sem exa-
tidade, como os vocábulos em ão, ado, ar. yrm,

Art. 189. Não ha consoante de apoio A n 192. A emoção nunca deve ser
que salve as rimas referidas no artigo w e illu a d a pelas rimas difficeis (art.
anterior, porém quando usadas com Mi. "ii rebuscadas (art. 18 5).
parcimônia ou em combinação, são tole­ ''«br aqui 0 conceito de Boileau:
" I.* rlmc cst une escave et ne doit qu’obéir ” ,
ráveis e podem dar realce.

ftT T T T T iir ir riiiir iiin iiiiiiiiiitiiiiiiiitiiiiiiiiifiim iiim iiiiiiiiiiiiiiiiiiitiiiiiiitiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiitiiiiiiiiiiiiiiu iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiin iin iiiliiitilIlli 1 I I 1 iiUiiiiiiiiiiilliltiiitliiiiiiiKitiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiimiiiiiiitiiimmiiiiiinm
98 CoNSOUDAÇÃO DAS L u ís DO VERSO D a R tma . 99

Art. 193. A variedade de rimas, já III. substantivos com o verbo de que


nas vogaes, já nas consoantes, já nas derivam (flamma — inflam-
agudas, ou graves, dá uma sensação ma).
vibrante de surpreza e de encanto. IV. substantivos com os seus .syno-
nirnos (tumba — catacumba:
A ri. 194. A “ surpreza” tanto mais
art. 179).
augmenta, quanto mais variarem as es-
V. verbos nos mesmos tempos.
pecies de palavras que entram na rima
(art. 196). Art. 198. As rimas devem estar
"surpresas de se encontrarem juntas
Art. 195. Permitte-se que a mes­ ma . xatisfeitas do encontro” .
ma palavra rime quando tem sentido A expressão feliz é de Banville.
diverso.
C A P IT U L O II I
E x .: O “ espaço”—com: — “ de espaço a espaço” .
R e la tiv a m e n te ao a cce n to to n ic o

-Art. 196. Deve-se procurar sempre \rt. 199. Conforme cáe o accento
rimar palavras de indole grammatical tonico 11a ultima, penúltima ou antepe-
diversa. miltuua syllaba, é a rima:
agu d a;
Art. 197. Denotam não só pobreza grave; ou
de rimas, como, o que é ainda peor, esdruxula.
pobreza de idéas, as palavras da mesma
Ai l 20. A s rimas graves em por-
indole grammatical a rimarem entre si,'
ttupt' formam a base, pois que são a
e principalmente:
ilHiioi ta (art. 76), servindo as outras
I. adjectivos entre si; ji o 1 ii inpcrar e dar variedade (artigos
II. advérbios entre si ; | â 1 7 '0 .

imiiiminmmiiiiiiimiiinii
ioo C onsolidação das L eis do V erso D a R im a io i

Art. 20T. A s rimas agudas, pois Como geralmente se usam nas quadras dos
que terminam bruscamente o verso, têm tos. Ver o Capitulo que trata do Soneto, na
c Kspecial-
algo de epigrammatico, como um ferrão ,
prestando-se por isso ao satyrico.
entrecruzadas;
—Bocage, artista consumado do epigramma, tem
Como nos tercetos em geral e como nal-
grande numero de versos em rima aguda, feitos pro­
as qvtadrinhas.
positalmente.

Art. 202 A s rimas esdrúxulas, pelo Nos teus lábios carminados


prolongamento do som, têm por si algo ( )s meus pousei com amor.’
Os meus ficaram pintados.
de empolado, lembrando-nos o cmpInt­ - K os teus ficaram sem côr.
rico e o ridículo dós vocábulos scienti- ( A ugusto G il ).
ficos, e prestando-se ao comico.
IV. misturadas sem ordem.
T IT U L O III
Inr azul pendia murcha; e, agora,
Da disposição das rimas Kil-a, outra vez, erguida
uslca, a sorrir, fresca, cheirosa e bella.
Art. 203. Differentes são os modos ■ Nume, com 0 aroma e a cor, a vida.
pelos quaes se podem dispor as rimas Lhe deu, de novo? A aurora?
no poema: ■1 i-..L ? O orvalho? A lu z ? ...
—■ Não ! foi aquella
I. em estrophes regulares; ida nympha, cujo olhar piedoso
—- Como se podem ver nos poemas de forma- llor poisara, ha pouco: —■ da saphira
fixa, no respectivo Livro. ' olhar, na do cálice oloroso,
1 lagryma tremula cah ira...
II. intercaladas; ( R a ym u n d o C o rrêa ).

iMniiiiiiiiiHiiiiniiiiMÍiiiiiiriiiiiiiiiiiNiiiiiiiiifi^
102 C onsolidação das L eis do V erso D a R im a 103

— Veja-se como exemplo 110 Livro I Tit- V I


T IT U L O IV da Parte Especial o soneto de Arthur Azevedo, que
começa:
De como usar as rimas segundo o “ Tertuliano, frivolo p e ra lta ...”

genero de composição Art. 207. Ao descriptivo cabem as


rimas raras e que denotam certo capri­
Art. 204. A s rimas ultra-ricas, re­ cho ( art. 204 e nota).
buscadas e também as esdrúxulas, pres­
Art. 208. A poesia amorosa, a can­
tam-se a tudo aquillo em que não ha
dura, requerem rimas brandas e veladas.
emoção a sacrificar.
Ari. 209. A ’ poesia philosophica ada-
Estão neste caso o descriptivo e também
plam se perfeitamente rimas escolhidas,
o comico; aquelle para se tornar pomposo, fazendo
contraste com a simplicidade que deve presidir a
sonoras, porém termos mais abstractos
conclusão a tirar; este, o comico, porque o affectado, que dcscriptivos, além disso simples,
o emphatico, são alguns do recurso do risivel. •cm affectação.
Art. 210. Ao dramatico convêm as
Art. 205. A farça, a parodia, o.poe- limas simples e seguras, sobretudo de
me heroi-comico, que é a affectação da lircoido com o dialogo e com a indole
grandeza, lucrarão em chiste se o poeta d.t pcrsoimagem.
souber usar das rimas a que se refere
o art. antecedente. \ 11 21 1. A s rimas agudas dão real-
ic ,10 cpigrammatico.
Art. 206. A s rimas cheias vão bem Ari. 212. A ’ rima, pois que é a ce­
nas odes, nas poesias heróicas e, além rna linal dos versos, se pode applicar
disso, emprestam muita graça aos versos “ 11n1 ficou dicto no Livro I I I, Titulo I
humorísticos. sobre a “ cesura em geral” .
LIVRO V
Do rythmo

T IT U L O I

Da origem do rythmo
Art. 2 13 . A linguagem rythmada do
verso que tem por fim exprimir emo­
ções, tem ella própria como causa prima
essa mesma emoção.
“ Le rythme du vers est comme le battement
•111 cnirur devenu sensible à 1’oreille et réglant notre
volx, si bien, que les autres coeurs finissent par
briltiv à 1’unisson (G u yau ).

Art. 214. Ouanto mais potente e


iiro se torna 0 pensamento, mais se
■11»i '-senta a palavra rythmada e musical.

Art. 2 15 . Pois que a causa do ry-


1I11110 é a emoção não deve aquelle so-
hreviver a esta, sob pena de revestir
um caracter affectado.
ioõ CONSOUDAÇÃO DAS IvEIS DO VERSO Do R yt h m o 107

Art. 216. A expressão attinge pelo Art. 220. Os monosyllabos não ac-
rythmo, com o mínimo de esforço, o rcntuados (as encliticas), concorrem
máximo de exaltação. par,a essa intermittencia de syllabas tô­
nicas, semi-tonicas e atonas, auxiliando
Art. 217. Physiologicamente a Em o­ a variabilidade de cesuras e o embelle-
ção tende a tornar a linguagem ry- a mento do rythmo.
thmada.
— Guyau e Dorchain deram-nos a base deste Art. 2 21. Nascido da successão de
livro e alguns conceitos emittidos são quasi a tra- •vlhabas, onde a voz se affirm a ou des-
ducção daquelles mestres. li m, assemelha-se o rythmo a ondulação
da-, aguas.
T IT U L O II
Art. 222. A cesura, que é o accento
Da constituição basica do rythmo t"iiico do verso, auxilia a ondulação do
Art. .218. O rythmo nasce da suc- 1 \ ilimo.
cessão das syllabas tônicas e atonas do
\rt. 223. Se num verso pudermos
verso, onde a voz ora se apoia ora des­
p ■ a r sem a cesura, a idea nelle contida
liza.
a i " c accentua e a idéa seguinte mais
Art. 219. Cada palavra tem o seu ft alçará (art. 1 3 1 e notas).
accento tonico que se pode intensificar <) effeito produzido por este recurso ry-
ou attenuar conforme a posição da pa­ H tliin é dos mais encantadores-,, Não é demais o
lavra no verso. » i f ii imil-o. Os poetas decadentes levam nisso a
— Veja-se o art. 6 e os arts. 112 a 121, em (ftia 11 quaesquer outros.
que se estuda o accento tonico base de todo o
rythmo.
Do R ythmo 109
io8 CoNsoi.mAçÃo das I, eis do V erso

r.iliar, dc seleccionar, porém no momento de ebuli-


'.iii em que no dizer de Charles Albert:
T IT U L O III
" 1,’idce naissante cherche à tátons le mot pour
Da idéa em relação com o rythmo >'-* I fermir ” ; no momento em que “ le verbe, pour
piiiaítre dans toute sa gloire, attend la pensée” .
Art. 224. A idéa ou 0 sentimento Ahi a occasião opportuna de intervir o bom
emocionantes determinam o rythmo de M".In do artista no seleccionar a expressão que
d've icvestir o seu pensamento. E ’ nesse momento
cada verso, e o acceleram ou retardam,
■ m qir.' idéa e fórma estão em ebulição completa,
creando a lentidão ou rapidez, quer da ■ ini n artista deve intervir. Quando a intervenção
palavra, quer do verso, quer da estrophe. Ml fu/, depois, a frio, toma geralmente o caracter
i|i 111iliiío, c dahi resulta, muitas vezes “ que seja
Art. 225. A potência ou variedade Jirim .1 emenda que o soneto” .
do pensamento fazem a harmonia do t'.n.i melhor comprehensão recommendamos a
verso. (pitltrH da “ Imagination Créatrice ”, de Ribot-

Art. 226. A mobilidade das cesuras, \ rt. 228. H a idéas que se não accen-
provando que uma emoção profunda (M uh c que se exprimem como que entre
creou o rythmo, dá ao verso a própria p iti ulhesis; e se a idéa crea o rythmo,
vida fremente e mysteriosa que magne- ■ rUi . que se não querem accentuadas
tiza e encanta. p ! nn ,1 sua expressão completa na sup-
j’»■ i" das cesuras de accordo com o
Art. 227. O poeta deve deixar ao (li pndtivo dos artigos 1 3 1 e 132 (e
pensamento e á emoção que communi- f 1 =|'«> 1 ivas notas).
quem ao verso as ondulações da sua pró­
pria sensibilidade. vit Os sentimentos delicados
biMtidns, como a candura e outros,
— Não se infira dahi que se aconselhe a aban­
dono completo. N ã o ! Ao poeta cabe o papel de Bflitu.uu se de leve.
IIO CONSOUDAÇÀO DAS htlS DO V^RSO Do R yt h m o i i i

Art. 230. Os sentimentos fortes e \r 1. 235. O uso simultâneo dos re-


energicos, como o odio, a vingança, 1 mi •.<>'. de que nos falam os artigos
accentuam-se fundamente e requerem fililt t i<ires muito concorre para o en-
cesuras em que se apoiem. ■ iiulu da obra d'arte, evitando também
Art. 231. A própria emoção fará 1 mminlonia, variando o rythmo.
com que a palavra accentuada, que re­ Alt *36. A emoção pode ser conse-
presenta a idea principal, caia na ce- ymd.i 11 .ando: primeiro a cesura movei
sura. 1I11•• .1 a methodica, por pequenos inter-
Art. 232. Sendo as cesuras o subli­ Iftilii*, quer “ durante o poema” , quer
nhar das palavras em que recáem, muito N .u l io da mesma estrophe” .
podem auxiliar a expressão das ideas e ' .10 um Ixdlo exemplo e um recommendavcl
dos sentimentos (arts. 123 a 1 3 1 ) . Ml< le «*a quadras da poesia— “ De volta do baile” ,
tU |ulm .ui .|i ie o eximio metrificador traz a cesura
T IT U L O IV ItMiqu* ■ •m syllabas diversas durante uma porção
m-cb t pi olongando a “ surpreza” , para depois
Dos effeitos conseguidos pelo rythmo
ÍÍ$tr titoa quadra completa e mais alguns versos
Art. 233. A mobilidade das cesuras, I »*o. * uielhod ica, como um descanço, para depois
cahindo num verso em certas syllabas, ii<“ ítincnlc a mobilidade até nova pausa,
no seguinte em syllabas diversas e assim ^Wtlt MHiTufiivamcnte.
por diante, dá ao leitor o encanto da per­ pai........... ul.uiça na mesma estrophe é um bello
petua surpreza (art. 124 ). sfll|’bi 1 l|iu de Dirceu:
Art. 234. A cesura methodica, ca­ Ibii Mmllliii, uao sou alguma vaquei|ro, —3.a-io."
li h * d* uu.inlar| alheio gajdo. 2.“-6-"-io.’
hindo na mesma syllaba durante um
IgSfti 11a j01, dr expressões] grosseiro, 4.a-8.a-l0.a
certo numero de versos, trará, contra­ yi ibn <■ dos sóes| queimado” . 4.a-8.a-io.a
riamente ao artigo anterior, a segu­
rança. ■ ü l tmo clii c logo duas methodicas.
112 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Do R ythmo 113

Art. 237. Inversamente ao art. an­ d mi Ir <11u , alliás, não deve ser muito pro-
terior, pode conseguir-se o effeito usan­ t Mip.id.i ( arts 82, 83, 84).
do: primeiro a cesura methodica depois A il 240. Contrariamente pode co-
a movei, quer “ durante o poema” , quer ii" < 11 pelo Tythmo methodico (segu-
na estrophe. |pHi 1 1 r depois ler uma intermittencias
— O exemplo da mudança no poema é com- dp 1 1!• atleaiiicMito, cjue. trará certa sur-
mum. Dentro da estrophe pode servir de exemplo |MI H
o soneto de Bocage:
' 11 • 1 1. Analoga á mudança de
Nize mimo|sa, como as gralças pu|ra; 4.!'-8."-io.*
Amável Nijze, como as gra|ças be|lla; 4.‘>-8-"-io .11
Umiio pela cesura e pelo encadea-
Se inda em teus o]lhos me perten[ce aque|lla 4.1-8-"-io.a Njgitio 1 1 que se consegue pelo uso do
Mavio|sa affeiçãol que fere e cu |ra... 3 a-6.”-io.“ VO90 ilii.ulonlc (arts. 85 e 86).
A mudança pode-se operar por pequenos inter- Sil • | •. () effeito opposto, partir
vallos ou por grandes, ao gosto do poeta. llfi sipmaiiqa p*ara a surpreza, conse-
Art. 238. Semelhantemente ao cjue Mu> h ti ando prim eiro: rimas metho-
I íN 11 u 11 o semelhante, depois liber-
se dá com as cesuras, pode a mudança
( II I t U l l o d e melros, como de collocaçao
de rythmos ser operada, da “ surpreza
t 1 ílllfln
para a segurança” (art. 236) ou da lio »,»Hii dignas dc leitura e imitação
“ segurança para a surpreza” (art. 237) áj •I* Veilmcrcu.
pelo uso ou não uso do encadeamento
A í 1, ’ ( i Nos Ires casos em que se
( enjambement).
i n íiifilabilidade do rythmo, como um
Art. 239. O encadeamento, que que­ ftfilo ,|t|, ,<• prepara, a surpreza fica
bra a monotonia, pela “ harmonia retar­ espeetativa da imagem
dada” pode vir em primeiro logar (sur­ du idi 1 cjue succede á mesma insta-
preza), trazendo uma certa instabili- I idaijt
114 C onsolidação das R éis do V erso Do R ythmo 115

Art. 244. E ntra nos casos da insta­ tinico. E ’ o que se dá com as ce-
bilidade de que fala o artigo anterior a u! 1 consecutivas em que a segunda
suppressão da cesura, neste ou naquelle miíih'c;,i uma phrase já gryphada (art.
verso, deixando o proprio pensamento 1 v, único).
á espera do verso seguinte, para se fir­ K,
mar, como um passaro que pousa (art. liiiuiv, 111 / Virgem morena e pura
13 1).
i 11.it 11 |m>r vós, arvores seculares...
Art. 245. O rythmo que se baseia
ou se resolve em numero par tem mais 1 ml mi! Kmfim \ Pu de com a mão tremente...
estabilidade, ao passo que o impar é
inconsistente e instável. I íiU11 I Tapir! Tapir! Morre também com ella-

Art. 246. Semelhantemente ao que S11 244. A idea determinando a


prescrevem os arts. 243 e 244, pode a ("iiii.i 1 iva o rythmo, que deve ondular
instabilidade pelo numero ser usada com lutii dia, com ella accentuar-se ou des-
a mesma intenção de preparar o effeito, liííti. pm vezes supprimindo a cesura
ou após a segurança como um smor- M ui, v*S), por vezes prolongando a
iiii 1 ui uaicneia do proprio pensamento,
zando rythmico.
ínt....... tactea (art. 246), por vezes
Art. 247. Se a suppressão das cesu- |i i»i uniu e frizando phrases inteiras
ras, suspende 0 pensamento, a multipli­ h u i *17), por vezes accentuando ines-
cação dellas num verso, accentua as jit 1 ada! 1iciilc uma idéa (art. 248).
ideas todas que esse verso pode conter.
ii ■ ». Que a emoção anime sem-
Art. 248. Uma mudança brusca de 111 *1 ti i" lrophe e que a expressão pro-
rythmo grypha a idea que enche a phra- 1 tu • «1 •11 i 1 a idéa, sem tolhel-a, e o ry-
se onde a mudança começou. *l*i||* • urgira como por encanto.
LIVRO VI

Do papel das letras no verso

T IT U L O I

Da sonoridade em geral

\rl 2 51. Entre os requisitos mais


!n1ri vt r . para o embellezamento do ver-
1 • mrupa logar proeminente a sonori-
ilioli . i|Ut‘ se consegue pela maior ou me-
iimi v,inabilidade de vogaes (art. 12 ).

\n ps - ■ A variedade, de que de-


j mInlc -1 bellcza, mais se accentua quan-
(lo o ui 11 <|ue varia recae nas cesuras.

\ii 253. Os versos em que se não


m 111 ilou a regra que manda variar as
-ti. .1 id ad es, ou ficam duros (art. 24) ou
m loin.im monotonos pela homophonia
"i 1 iis. 11 e III).
l)o P apel das L etras no V erso 119
n8 C onsolidação das L e is do V erso

Ari. 257. Seguindo as regras que


T IT U L O II pic ldiram a formação da linguagem,
In m|c o poeta buscar expressões imitati-
Da homophonia proposital ' .r . por meio da semelhança de sons.
C A P IT U L O 1
Da h o m o p h o n ia em g e ra l Art. 258. A regra geral é a varie-
il.ii Ir ( art. 253) : a homophonia, a exce-
Art. 254. N a linguagem primitiva a
p.,ao, c só se tolera quando buscada pelo
palavra buscava pelo som exprimir a
pi icta.
idéa.
Art. 255. Esta imitação se dava: \ 1 1. 259. Torna-se ainda mais into-
ora com a vogal (assonancia) ; l. 1.1 vt11 a homophonia quando é buscada
E x .: lugubre, fúnebre, em que o w dá a imi­ Iii’ 1<1 artista e este não consegue sugge-
tação.
111 aquilln que desejava.
ora com a consoante (allitera- I ,’ riimmum, entre alguns senhores que se
rtOni mandes artistas do verso, o abuso ou melhor
ç ã o );
II nmu usu <la onomatopéa. Pensam attingir á grande
E x : pampeiro; ribombo, em que o p e 0 b
■ Hi( 1 ,,1.1 apenas ridiculos. Não citamos exemplos
concorrem para a onomatopéa.
imiu ..... ferir susceptibilidades; apenas aconselha-
ora com ambas combinadas; j$l|g (in principiantes que sejam parcos no uso da
i....... phciuia proposital emquanto não adquirirem
E x .: ullular; cicio. Aqui a combinação salta
jlijo ■ .Imln um grande apuro de ouvido... e de
aos olhos; não precisamos, pois, repizar.
'■ oi yúito.
Art. 256. P ara a expressão das idéas
por meio do som buscava a linguagem \ 11 j(>o. De dois modos pode o poe-
primitiva o maior valor representativo 1 1 n .11 do recurso da imitação: ou usan-
desses mesmos sons em onomatopéa. •! ■ m palavras cjue tenham já aquelle
i2o C onsolidação das L eis do V erso Do P apel das L etras no V erso 121

valor imitativo ou creando expressões Art. 265. A onomatopéa deve ser


novas, baseado nas leis que presidiram á ir ada como um auxilio de expressão e
formação daquellas palavras. 11:10 como um fim unico do verso, o que
m t ia ridículo.
Art. 261. O poeta pode attingir o
seu fim que é emocionar, auxiliando a Art. 266. A letra ou palavra, por
expressão, de dois modos: ou procu­ ■1, não tem a virtude immutavel de ex-
rando imitar ou procurando suggerir. piimir pelo som esta ou aquella idéa,
Art. 262. No primeiro caso de que dogmaticamente.
fala o art. anterior temos a “ Harmonia liastain para comprovar a affirmativa os
imitativa” ou Onomatopéa capitulo I I ) ; •l"i lermos — Morticínio e Mortadela, em que o
no segundo, temos a “ Harmonia sugges- «««iiiuln tem mais recursos de som e, no emtanto,
Mml.ulcla é apenas... mortadela...
tiva” , bem mais delicada que a prece­
dente (capitulo U I). \ 1 1. 267. A escolha deve ser diri­
C A P IT U L O II gida intelligentemente pelo talento e
l" I" bom gosto do poeta.
Da H a rm o n ia im ita tiv a : O no m ato péa

Art. 263. A onomatopéa, que é a Art. 268. O sentimento, a emoção


mais rudimentar das harmonias a que di’ qtlc se acha possuído o artista ao can-
se refere o art. 262, busca imitar pro­ ttii, I1.10 de forçosamente seleccionar em
priamente o som. c uide parte os vocábulos que o auxi-
li* m n,i expressão do seu sentir, da sua
Art. 264. P ara o effeito da onoma­ blcli,
topéa deve haver no verso a combinação
que presidiu á formação das palavras \rt. 2(><). Ao poeta cabe no momento
que estão no caso do art. 254. ■ li ohjirt ivur o seu pensamento, dirigir
C onsolidação das do V erso D o P apel das L etras no V erso 123
122 L e is

a selecçao das vozes que possam servir Art. 274. A u xiliar a expressão, nas
para augmentar a belleza da expressão. condições do art. anterior será talento;
lorçal-a, estulticie.
— Cabe aqui, mutatis mutandis, o commentario
do art. 227, para o qual pedimos attenção.
T IT U L O III
Art. 270. Se a emoção não presidir
ao rythmo, o verso será frio, apezar de Do valor de algumas letras
todos os recursos de que se lance mão. • C A P IT U L O I

Do v a lo r im ita tiv o ou s u g g e s tiv o em g e ra l


C A P IT U L O Ml
Da H a rm o n ia s u g g e s tiv a Art. 275. H a letras que, mais do
Art. 271. A harmonia suggestiva, que (miras, se prestam a auxiliar 0 poeta
que nasceu da onomatopéa, é mais deli­ 110 seu desejo de suggerir, e a escolha,
cada do que esta, e não se contenta com cm exaggero, nas normas do Tit. ante-
a rudimentar imitação dos sons. i inr, denota bom gosto.

Art. 272. Pela harmonia suggestiva Ari. 276. Em portuguez não ha syl-
procura o poeta levar a outro ceiebio, lab.i sem vogal, sendo ella que marca
por meio do auxilio de sons selecciona- priui ipalmente 0 fundamento de cada
dos, a suggestao do sentimento ou da vllal.a.
idéa que deseja. Ari. 277. Se bem que a vogal seja
Art. 273. A sensibilidade e a emo­ 1 li.ru' da syllaba, pode no emtanto a
ção conduzem a harmonia suggestiva 1 iiir.nanle modificar o valor suggestivo
em grande parte, como a idéa e o pensa­ >1• 1 snm, de accordo com os seguintes
mento conduzem 0 rythmo. • ilpi tulos.
124 C onsolidação das L eis do V erso Do P apel das L etras no V erso 125

C A P IT U L O II SECÇÃO II
Das vogaes Do som E

SECÇÃO I Art. 279. A vogal e é verde e secca,


Do som A mas também tenue, leve, prestando-se á
languidez, á tristeza, bem como á sere­
A rt. 278. A vogal a é clara e alacre, nidade e também á imprecisão.
prestando-se ao enthusiasmo e á admi­ — O que ha de leve, ou imponderável 110 voo
ração; bem como aos affectos maviosos de nma borboleta exprimiu-o Raymundo Corrêa:

e agradaveis. ...esvoaça, esvoaça,


Como um lave papal solto á marca do vanto ;
— Castilho exemplifica com Camões: Pousa aqui, voa alám, até vir o momento
As armas e os Barões assignalados lim qua de todo amfim, se rasga e dilacera...
Que da Occidental praia Lusitana, i>' borboleta, pára! O’ mocidade, espera!
Por mares nunca dantes navegados
Passaram inda além da Taprobana... - A languidez, a frouxidão de uma réde que se
■ mhala suggeriu-a Bilac, quando cantou divinamente:
— Alberto canta com enthusiasmo: — — A doce Juracy a réde suspendera,
Do serra do Bocaina até São João da Barra, ^ — A réde que, com as mãos finíssimas, tacara
Onde 0 Atlântico o sorve, onde o rumor bravxo Para ella, seu senhor a sau guerreiro amado !
Se lhe abafo da voz, monstro a levar na g a rra ...
SEC Ç Ã O II I
Do som I
— Para os affectos agradaveis e maviosos basta
o exemplo de B ila c: Art. 280. A vogal i é gris e triste,
Na agua mansa do mor passam tremulamente
r lambem subtil e minima, prestando-se
Nureos traços de luz, brilhando esparsos nella. coisas tristes e pequeninas, bem como
Lã desponta o luar. Tu, palpitante e bella, .1 delicadas; e ainda á timidez, á sen­
Canto... etc. il >i1idade.
Do P apei , das L etras no V erso 127
i2 6 C onsolidação das L e is do V erso

_ A expressão das idéas de tristeza muito po­ SECÇÃO IV


dem lucrar com a insistência sobre a vogal *. Dos sons ó e õ

Vêde Camões:
Art. 281. A vogal ó é rósea, sonóra
_ Alma minha gentil que partiste...
c forte , prestando-se aos sentimentos
Vêde Raymundo Corrêa: iórtes e impetuosos.
__ Mas verei com pesar e com remorso infindo
A Raymundo Corrêa foi-lhe poderoso auxilio
Esquecidos de mim os sítios que esquecí.
iquclle som, no caracterizar e suggerir os sentimen-
B uma voz ouvirei das arvores sahmdo.
i" . <le que falamos: Lêde o “ Hymno á Cólera” :
_ Quem és tu? Donde vens, que vens buscar aq u i...

Quanto â pequenez, vêde o exemplo que nos Toda a grandeza de um colosso rhódio.
dá Castilho: Odeio o Odio, que nalma se invetera,
Agora vemos capinhas Cancro incurável; e .0 Rancor odeio,
Muito curtos pelotinhos, 1’ois não é mais que a vil placenta do Odio!
Golpinhos e sapatinhos, N.-iol A Cólera, a Cólera é que eu canto!
Fundas pequenas, muhnhas, Seu brado acorda os echos estridentes, etc.
Gibõeszinhos, barretmlios, etc.
( G a r cia de R e zên d E).
Art. 282. A vogal ô é rôxa e turva,
pi 1■ ■ ■ landi»-se aos mesmos sentimentos, e
_ Como exemplo de timidez, sensibilidade po­
de-se ver toda aquella poesia de Ruben Dano em
111,11'. aos tempestuosos.
que ha esta quadra. l,x,:
En mi jardin se vió una estatua bella;
\ ento, que em noite de medonho aspecto
Se juzgó mármol y era carne viva;
I' 11k | ■ <• passas no arvoredo triste,
Uma alma joven habitava en ella,
l í .n h.mdo os troncos formidáveis, fartos
Sentimental, sensible, sensitiva.
De sombra protectora;
(De “ Cantos de vida y esperanza ).
Do P apbx das L etras no V erso 129
ia8 IM M » '■ « L t U S
SECÇÃO VI
SECÇÃO V Dos d ip h to n g o s

Do som U
Art. 284. Os diphtongos, pois que
Art ^go A vogal « é escura e í«- nelles occorrem duas ou mais vogaes,
ctuosa,'prestando-se ao lugubre e aos são por isso mais cheios e a vogal pre­
dominante chá o som que pode servir á
sentimentos funestos.
<momatopéa.

EX" _ E os sinos dobram a defuntos, Art. 285. Os diphtongos nasalados,


Todos juntos 011 em que predomine letra fechada, têm
E os sinos dobram todos juntos, limito mais resonancia que os outros.
A defuntos!
( A ntonio N obrií)-
C A P IT U L O II I

D as con soantes

SECÇÃO I
, . , , í^ssis na sua admiravel traducçao
Machado de - A<Y11P tirar grande parx DAS EABIAES
d0 “ C o rv o ” de Ed. Pôe, consegue trr.r g
Do som B
tido deste som, por varias vezes-
\ rl *86 Como todas as letras, o
E x .: • . . . . ’ j*<>• l< variar as suas qualidades onorna-
Vae-te não fique no meu casto abrigo li»l»ii .1 c suggestivas conforme a com-
i mhrp essa mentira tua.
Pluma que lembre lliHíii,.m que o poeta com elle fizer (art.
. • • • • ' ‘ ’ _ , e fóra
Jtin ),

Alt 287. As palavras e. os versos


' r o : “ A — :: - **» l
$ m- i|i|i . insistir 11a reptição exclusiva
Q u e ”»»'■
I
130 C onsolidação das L eis do V erso
n° °as N0 V i; rso I3r
do b darão idea de— frouxidão, languor, K xs.;
molleza.
E x s .. baba, bobo, bobó, babão, bebê, basbaque. ...... n , i ; l * r' Sr* * “ * .0
I ara a do art. 289:
Art. 288. O b combinado com outros
■0 apalpar, repellir; pejo ;
sons, como d, t e k, presta-se á repre­
10 empurrão, esparramar;
sentação de sons repentinos e breves. ' ’ P0mpa’ Pampeiro, pampano.
E x s .: baque, abocar, bater.
°o som M

Art. 289. O b na combinação com ,I „ | , 0 » tem grande proprie-


outras letras pode soffrer-lhes a influ­ 1 ,ll;l rxprim ir os affectos a im-i
encia: ora abrandando o som (como na 7 ,h" » 0 nos mesmos
combinação com /) ; 1 fi-" . (In b, no art. 287.
E xs.. labio, balar (das ovelhas), bello; beijo. " lamae’ ,T,imo> amo, maminha.

01 a prolongando-o (como na combina­ Jf. ' ' ' ' () depois da vogal nro-
ção com r r ) ; ;:x • '- m a n e ia , e ames f e / e ™
E x s .: berro, berreiro, rebater.
L ..........1 t j r 0 clos sons rei um'
ora augmentando-lhe a resonancia (co­ ir t im ib iir ; romper.
mo na combinação com ;//).
E x s .: bombo, ribombo, retumbo. . As ldéas de fausto e de
( b '"li.im com a combinação do
Do som P MMI ri ji i|
Ai t. 290. O que se diz do b, exce-
pção feita do art. 287, pode-se applicar m . bastam
T , jgB .i i vorso em clue se fize-
ao p, notando-se que este é ainda mais " birna-sc pomposo.
forte e secco.
.............. ...... .... ,|„ona
J 32 C onsolidação das L eis do V erso
l><) P apel das L etras no V erso
133
Das c o m b in a ç õ e s — bl, pl,
l' vs' : fortc- íortidão, ferro, ferrar, triumphan-
Art. 294. A s palavras em que entra •», Ia 11 farra, fanfarrão.
o som bl auxiliam a expressão das ideas
de coisas cheias e amplas, (bem que \i I. 297. () mesmo combinado com
assim o sejam, ás vezes, ridiculamente). brandos, e as combinações fl, fr,
E x s .:
•ui 'mIi.-imi a expressão de ideas de brisas
a) bloco, blasphem ia;
/iru „s . de perfumes que fluctuam, de
b) blasonar, “ blageur ” , “ hablar
l*opro.s leves.
Art. 295. O som pl, além do valor 11 ■ frescura, insufflar, flauta, flautim, per-
semelhante ao bl do art. anterior, por liiltb , llelul, melífluo; e. mais fortemente: frêmito,
ser mais forte, presta-se a exprimir as llMIirllle, fremir.

pancadas rapidas e os estalos.


N :m " <,s P o d e m o s furtar ao desejo de trans-
E x s .: aplauso, applicar (uma bofetada) ; plan­ ‘ j»ia de Victor Hugo:
tar (um ta p a ); “ planchaço ” (de espada).
'" 1 par/ui n sortait des tou//es das^/rodèles;
SECÇÂO II 1 s"ti///cs de la nuit //ottaient sur Galgala ” .
DAS lab io -d en t a e s c h ia d a s
Dos sons F e V
Al 1 ;,>K- A s ideas de vento, de so-
Art. 296. O som / auxilia a expres­ ....... |,-v,‘s- <k‘ vôo, de velas a fugir e a
são das ideas: ' ''u'- ;i(|(|uirem vida quando auxi-
a) de assoprar, de fole; 11 ' l" '1' ’ soí» A usado com arte e
H x s .: forja, fogo, facho de fogo, foguete, in­ ?1 ui 1 aqgcro.
ferno, fumo, fon-fon.
voo .Ias aves, soprar do vento, fugir das
1 Uns 1 1 In/, veado.
b) de fortaleza, de resistência, quan­
do bem combinada com d, t, rr. .......... ' " r,,,lto a ” iz'ar »as velhas azinhagas-
(G omes L eal ).
134 C onsolidação das L eis do V erso Do P apel das L etras no V erso 1 3 5

—- Uma das paginas mais lindas da litteratura A ri. 299. O som brando de / e //,
portugueza, que conhecemos e que mais comprovam combinados com v, etc. dão a mesma
esta idéa de vôo, de leveza de passaro, é um soneto
idea do vôos e fugas aladas.
de Bilac, em que a attitude da mulher amada nos é
K xs.: rufflar, flamma, flexa.
suggerida num crescendo, como se fôra uma ave
assustadiça. Deve-se a suggestão ao uso, á combi­
Ku//ando a pluma, em /uga, inda um volátil voa,
nação do v, feito pelo mestre com inimitável talento:
/à-rindo em flexa o / undo espaço...

— Quando advinha que vou vel-a, e á escada


SECÇÃO II I
Ouve-me a voz e o meu andar conhece,
das lin gu o - d en ta es
Fica pallida, assusta-se, estremece,
Dos sons D e T
E não sei porque / oge envergonhada.
\rl. 300. Os sons d e t auxiliam a
Eolta depois. A ’ porta, alvoroçada, niinmalopéa e a suggestão de pancadas,
Sorrindo, em fogo as / aces, apparece:
dr baques, bem como de estalidos, tiros,
E talvez estendendo a muda prece
De meus olhos, adianta-se apressada. '• pancadas repetidas e duras.
b. v. queda, topada, batida, saltitar.
Corre, delira, multiplica os passos;
E o chão, sob seus passos murmurando, Vede o exemplo seguinte que é de Bocage:
Segue-a de um hymno, de um rumor de /e sta ... Nus tcctos saltitando a pedra s o a ... ”

E ah! que desejo de a tomar nos braços, h.' de Araguaya o verso


O movimento rápido sustando " ( I infernal re/iníini do embale d’a r m a s ...”
Das duas asas que a paixão lhe empresta.
\i 1. 301. Ambos os sons do artigo
E ’ de notar que só no ultimo verso appareça a o1•1. 1 im , ((liando combinados, soffrem a
idéa de asas, quando já nos dois quartetos, pela
ímiIim ik ia daquelles com que se combi­
suggestão dos sons, nós tinhamos a sensação perfeita
da leveza, do vôo, do esvoaçar de uma ave assus­ nam, c ora se accentuam ora se abran-
tadiça. Exemplos desses é que se devem imitar. >laüi
136 C onsolidação das L e is do V erso Do P apel das L etras no V erso 137

— Essas combinações, não só destes sons como


de quaesquer outros, evitando o exagero, é que mais SECÇÃO IV

auxiliam o valor suggestivo de cada um e depen­ DAS PALATAES


dem do talento e do bom gosto do artista. Do som L

D as c o m b in a ç õ e s : — rd , rt; t-rr-, d -rr-.


Art. 305. O som / é um dos mais
pmprios e evocadores, para exprimir e
Art. 302. O r dá a estas combina­
nggerir ideas de molleza, de brandura,
ções um quê de forte e de energico, como,
<lo languidez.
alliás, a todas aquellas combinações em
K xs.: collo, vascillar, oscillar.
que concorre, com o som forte (rr).
E x s .: forte, morte, terror, aterrorizar, derra­ Sobre as ondas osci//a o bate/ docemente.
mar, fartura, enterrar (uma lança, p. ex.). Sopia o vento a gemer, treme enfunada a ve//a
— Quando soar na terra.: a Consciência é m orta! Nitgiia mansa do mar passam tremu/amente
(G om es L e a l ). \ 111 <•<o, traços de /uz brilhando esparsos ne//a...
1 .1 di".ponta o /uar. Tu pa/pitante e be//a...
Das co m b in a ç õ e s : — id, I t ; d - 1-, t - l - .
( B il a c ).
Art. 303. O /, cuja missão é abran­ Entre as outras harmonias que esta poesia en-
dar sons, serve aqui para abrandar o io i:i, ,1 do /, dando a idéa da languidez que ha no
som das pancadas, prolongando-as, sem "si illiti dr um batei, foi conseguida sem a insis-
estrondo. tflli iít demasiada, e só com a collocação a proposito.
E x s .: saltitar, estalo, estalido. A mesma belleza deslumbrante se encontra
'ui Mbrilo naquelles versos em que elle descreve o
D as co m b in a ç õ e s : — nd, n t; d -n -; t-n -; tr-n -. balam,o d.t mangueira e que começam:
A rt. 304. O n (Seccao V ), faz aqui " Kmíia/a-me, balanço da mangueira” ,
o papel contrario ao do /; prolonga o ( “ Segunda série” pag. 207).
som como sempre, com estrondo.
E x s .: estrondo; throno, potente. Vrde esle exemplo que é de Stecchetti:
— “ Como de um rei potente ao retombar de um Qiiesla notte aí/ungai /a passeggiata
[1throno” , Sino .1/ ba/con delia fanciu//a m ia ...
138 C onsolidação das L e is do V erso Do P apel das L etras no V erso 139

Art. 306. A s propriedades que o l Do som R ( fo rte )

tem para suggerir a molleza, a langui- Art. 308. O r (forte) presta-se á


dez, mais se accentuam se se combinar expressão de idéas de fortaleza, de
este som com b e m (arts. 286, 2 9 1). guerra, de raiva, por ser um som rouco
E x s .: balar, balido, bello, embalar, molleza. c que suggere taes sentimentos.
— E ’ encantador o exemplo de Olegario Ma-
Exs.: rouco, raivoso, raio; hurrah; guerra.
riano:
.. .Um rolo
“ Sobe ao beira/. E ’ um berço e ba/anceia I plúmbeo e denso fumo ennegrecido em torno
Ao vento ” , etc. Be estende, como um véo, do comburente forno.
Na horrorosa eversão, dos templos arrancado;
Do som R (b ra n d o ) Vilnn o mármore, salta; abre-se, estilhaçado,
1'udo que o incêndio aperta... E a fumarada cresce,
Art. 307. O r (brando) auxilia e Hnhe vettiginosa, espalha-se, escurece
muito a suggestão de ideas e sentimentos m I o momento. . E, sobre os restos da batalha,
de doçura e caricia. Arde, voraz e rubra a colossal fornalha...
( B il a c ).
E x s .: sereno, sonoro, odorifero, doçura, mur­
múrio. unico. O mesmo som acima, quan­
—• Bulhão Pato, traduzindo Lamartine conser­ do bem achado e combinado, pode sug-
vou o mesmo encanto do francez nestes versos:
• 111 lambem idéa de doçura, de caricia,
—• “ Sob a praia sonora onde murmura di 1 111 regos a correr.
Das aguas do Sorrento I arrulho, sussurro, pequerrucho.
A vaga, ao pé dos laranjaes flo r id o s ...”
Ainda Bilac:
— Viu-se no exemplo do art. anterior alguns .. .Ante elle agora um rio
sons de r auxiliando a onomatopéa e a suggestão ' m ti.i; e a agua também, ao crebro murmurio
da doçura. l)ü ruriente a rolar, gemia anciosa e c la r a :...
“ Sobe ao beirai. E ’ um berço ”, etc. Veja se todo o resto do trecho.
140 C onsolidação das L e is do V erso Do P apei , has L etras no V erso 14 1

Do som Ih Da c o m b in a ç ã o : — nh

Art. 309. O h empresta, na combi­ A rt .3 1 2 . O nh presta-se a exprimir


nação, a resonancia ao estalido que o si ms de líquidos;
/. por vezes, representa, fazendo com que K x .' vinho.
o Ih se preste á expressão de idéas de 011 de coisas miúdas;
marulho, de ramalhar, de espalhar, de l',s.: assimzinho
es folhar, etc. e, bem combinado, a ternura e a mei­
E x s .: batalha, desgalhar, escangalhar; além dos guice.
termos citados no proprio artigo. K xs.: pequenininho, carinho, gracinha.
SECÇÃO VI
Das c om binaçõe s: — bl, pl, f i; b r, p r, fr . DAS CHIADAS
Dos sons J e Ch (X )
Art. 310. Applica-se ás combinações
acima o que se disse sobre o Ze o r bran­ A ri. 313 . Os sons j e ch prestam-se
do, (arts. 305 e 307). .1 siiggonr as idéas de chuva, de repu-
E x s .: pluma, plácido; frouxo, trote, etc. 1 Ini, de jorro.
!■ . estas palavras e mais: chafariz, chocalho,
SECÇÃO V . hem, enxame; (cascata, quando pronunciada á por-
DAS LINGUO-DENTAES nasaladas tupiif na).
Do som N Alberto consegue, no “ Parahyba ” , suggerir a
■ ni|M‘ I. de e a chuva de uma maneira deslumbrante
Art. 3 1 1 . Como o m, o n presta-se i" !•' 11 1 combinado de j e ch:
á expressão dos affectos, da meiguice; ...F u sis rápidos resplandecem,
E x s .: menino, pequenino. 1 iiiiui o iclampe/ar de uma for/a de Brontes.
bem como aos sons retumbantes, quando
‘imhii que ;i estranho impulso, em cada serra
combinado com d_, t e outros (art. 304). \ eiiiutT.ula brutal vê-se (ou r/íorado pranto)
E x s .: estrondo, vingança. Nsilili de i ada fe n d a .... etc.
142 C onsolidação das L eis do V erso Do I ’.si'i'.i, das L etras no V erso 143

Do som 2
S E C Ç Ã O V II

DAS SICIADAS
\ 1 1 3 i D. () som s presta-se á ono-
Do som S (C e) l il íi l u p c .i de zunidos (de balas), zumbi­

Art. 314. O som produzido pelas do- (de m .eeios), vozeio (de multidão).
letras s e c (ce) prestam-se á expressão I - bezerro, voz, zumzum, vozear, zabumba,
das ideas de silvo, cicio, etc. i s1111 < 1 uniu sempre, é o mestre perfeito da
E x s .: sibilo, açoite. m«!Mhíatn|Hd
—- A raguaya diz: . . . “ Enrijam -se esticadas
—• “ o sibilo das balas que gem iam ... ” D ui bicos , íi riilgir, as cordas. Aceradas,
pBitnit .ctins, «unindo. Os dardos, sibilando,
Art. 315 . Bem combinado, o som I III i m •■c..."
das ciciadas presta-se á suggestão dos
II 1 miiliiiiado com o s attingiu á perfeição-
sentimentos de doçura e caricia.
K x s .: doce, docil, caricia, doçura. SECÇÃO V III

— N a traducção de Lamartine, feita por Bulhão DAS GUTTURAES


Pato e de que citamos alguns versos no art. 307, o D o * sons G (u e ), Q (u e )
í auxilia o r de maneira admiravel, no suggerir
Ai I ■; 1 Ambos os sons gue e que
carícias :
1 r v im .1 exprimir ideas de aspereza,
5 ob a praia íonora, onde murmura
D a í agua.c do .Sorrento |ii n 1 |tin !a i 1.
A vaga, ao pé d o j laranjaeí floridoí, 1 ■ 111 u|ii<-, brusco, baque, barranco, descar-
Perto do atalho exúte entre eípeííu ra J, litipo, giiem i, H;i<|ue, escangalhar.
Da ícbe reícendente •
Lapide, humilde, etc. | ii \i 10 di ./iinl.i em queda, em baques aos dor-
[ mentes
E ’ outro exemplo encantador aquelle de Ruben o 11 Uitnliai o lieróc dos valles no regaço...
Dario citado atraz no art. 280-
LIVRO VII
Das licenças poéticas

T IT U L O I
1 >as licenças em geral
V11 d 18. Km principio todas as li-
■ ■ 11■ .t■■ poéticas são condemnaveis.
\il ^i<). Só se devem acceitar
m•jiii II.i (|nc concorrem para a belleza
i harmonia do verso ou para a clareza e
ampla idade do poema, de accordo com
o di po .to no Tit. que segue.
\rt d-’1*- 11 genero satyrico e o hu-
íim i ....... o estylo jocoso toleram mais
t|nr " outros algumas licenças.
1 *H11|*i d c - s e o porque: — não ha emo-
=i «tu i jfj( ur no caso.

t it u l o ii

I >as licenças acceitaveis


MGURAS DE PALAVRAS

d-t t y i Kntrc as licenças acceita-


>• í ■ podem enumerar as figuras,
146 C onsolidação das L eis do V erso D as L ic e n ç a s - P oéticas 147

nos casos previstos nos arts. 29, 30 e \rt. 324. Se o uso intelligente das
122. ! lu 111 ir- denota bom gosto, o abuso, e
E x s .: mór, por m aior; inda, por ainda. iin 11111 o uso sem cuidado, são vicios
' 1 iiidiiiiuaveis.
Art. 322. De accordo com o disposto
\i I 325. A inversão, que, em prin-
no art. 122 consagraram os mestres que
1 ipiM. v condcmnavel, quando lógica deve
a concorrência dos sons com 0 deva ser
■ 1 o 'c ila e até recommendada, pois é
pronunciada co’o.
o........ .. elegante de chamar a attenção
Ex. • p a i a uma ou outra idea que se deseja
“ E um dia inteiro, ao sol, paciente esteve
- Di.-111.11 ( art. 331).
Com o destro bico a architectar o ninho
( A lberto). A própria prosa admitte a inversão nalguns
(«sos sriiirlliunlemente ao que dizemos no art. aci­
F IG U R A S DE S YN TAX E ma I 4' mi i -.-ario o exemplo, tão commum é elle.
Art. 323. A s figuras toleradas na
IIQ U R A S DE R H E T O R IC A
prosa, como a ellipse, o pleonasmo, to­
leram-se também no verso, desde que \W 32Í). () euphemismo e a peri-
estejam no caso do art. 319. p illa c . nijo abuso é condemnavel, são
ih 1 >11 i • <: (|iiando usados para evitar
E x s .: E llip se :
...Trem ulam ente ondeia,
P ...........Iiiilos, de calão ou por demais
Vasto oceano de prata, a requeimada areia. pi - ah 111 ,
(B il a c ).
T IT U L O III
Pleonasm o:
— Vi, claramente visto, o lume v iv o ... I Lia licenças condemnaveis
— No mais interno fundo das profundas
Cavernas altas onde o mar se esconde-
1! 3 q . Sao condemnaveis todas
( C a m õ e s ). llpqi ,1 . quer de palavras, quer de
:*x "•
1 4 8 C onsolidação das L e is do V erso

syntaxe, quer de rhetorica, quando vi­


ciam a palavra ou o discurso.
Art. 328. Jam ais se deve alterar PHRTE ESPECIAL
uma palavra em sua pronuncia por ne­
i »«»'* V E R S O S EM C O N JU N C T O E S U A A P P L IC A Ç Ã O
cessidade de rythmo ou de rima.
Art. 329. Não se admittem licenças LIVRO I
ortographicas, sob pretexto algum.
In» verso segundo 0 genero litterario
A rt. 330. A s rimas de vogal aberta
com vogal fechada devem ser banidas T IT U L O I
(art. 17 7 ). I )(> Genero Epico
Art. 3 3 t. A inversão que não seja C A P IT U L O I
aquella admittida em prosa, para realce, F u n d a m e n to de ste genero
deve ser evitada (art. 325). \ 11 334. Todo o sentimento que
Art. 332. No genero dramatico e ijespriia iMnoções profundas é creador
nos poemas dialogados não se admittem 1I1 1.« 11< .1 r base de obra d’arte.
inversões que não sejam aquellas pró­ A rl 335. A s façanhas nascidas do
prias das palestras, para evitar a affe- ftiM11 i" ii miio, do heroísmo, da bravura,
ctação. li i • d. < . i .|ir emquanto houver poetas
111o •"in cilas se emocionem.
Art. 333. Toda a periphrase desne­
cessária (art. 326) deve ser banida do Al l 33(1. Não pode morrer um ge-
verso. M fu tlt< poesia, quando elle é fecundo
Mjfi uj|inQÕt*S.
150 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Do V erso S egundo o G enero L itterario 151

Art. 337. O poema épico não mor­ \ r I 339. Todo poema é feito para
reu, nem pode morrer emquanto houver ilrv.ii a alma, proporcionando uma
emoção. 1 nu M..u 1 intensa.
— Contestamos a opinião de Sylvio Romero de \ 11 3.40. Não ha poemas longos,
que o épico é genero morto. O que cahiu em desuso IH•1111 u’, ph vsiologicamente, toda a exci-
foi o poema segundo a concepção classica, como 1 n .mi inu-nsa é de curta duração.
procuraremos provar no cap. seguinte. A moderna V Mota no art. 337.
concepção do poema ju stifica a nossa asserção. E s ­
tamos neste ponto com Edgard Püe que feriu a \ 1 1 341. Os chamados poemas lon-
questão com extraordinária lucidez e lógica, fazendo
jjii '. .ui niccessões de episodios, que são,
depender cada poema do regular desenvolvimento
de uma acção, tendente a despertar uma certa emo­
*11ia . ir. verdadeiros poemas, mais ou
ção intensa. Conseguida ella, a excitação se enfra­ iiHiiu aulonomos, concatenados artifi-
quece, e a continuação do poema só póde servir de • i 11111< 111 < pelo assumpto.
preparo a outra emoção nova, e assim successiva- V, 1111 -ao nos " L u s í a d a s ” os poemas a que
mente. -?i ilriani • ■ numes de episodios: “ Batalha de A lju -
Foi o que fizeram os clássicos com os seus ImtiuUi ", " ()■ . doze de In g late rra ", a “ Morte de
“ longos poem as" hoje em desuso. (gin * .li 1 ,1 t i o" , o “ Adamastor ” , etc., unidos pela
imitiu i" do Gama, ou pela do poeta. A unidade de
C A P IT U L O ll ífljAii '|U‘ 11,1 •" In iza cada um desses poemas fal-os-á
D hiih Mi 1 . aí f i rma a genial intuição de Camões.
Do seu c a r a c te rís tic o
A n 34 lísta artificiosa concate-
Art. 338. O poema épico é a narra­ ftfjl. íl «) r 11[i 11■ cahiu em desuso, pela rasão
ção poética em que se celebram acções ÍIH Mtll! (Ir que era artificio.
heróicas: lendarias ou históricas. 9 111 11,1 origem esta concatenação não existia.
—■ Sejam exemplo moderno: “ Delenda Carta- n* 1 M il-IIIM 11.00 destacados; eram “ epopéas natu-
go ” , de B ila c; “ P alm ares", de Goulart. frtM , i l t’íidu 1 io 1 vários poetas e por varias ge-
152 CONSOLIDAÇÃO DAS DEIS DO VERSO Mu V i.uso S egundo o G enero L itterarto 153

rações. Depois é que se foram reunindo e se trans- I r. o que faz com que não seja épico “ O
mittiram atravez dos tempos. Só mais tarde sur­ 1ii nulo '. de Nobre. O seu heróe, feito subjecti-
giram as epopéas devidas a um só poeta: “ epopéas 1 uma bella creação, porém lyrica.
artificiaes ” .
\ i ( 317 . A sua arte deve tender
Art. 343. Outra causa do desuso
piii.i lazer salientar o valor do heróe,
em que cahiu o chamado poema longo
cs 11 llu esquecer a personalidade.
(successão de poemas) foi a preoccu-
pação da unidade métrica muito prolon­ \M 348. A acção deve mostrar o
gada, sendo todos os poemas (episodios) In ine, que apparecerá naturalmente co-
tratados no mesmo estylo, no mesmo iiiíi i/il
metro, nas mesmas estrophes.
Art. 344. Os poemas épicos, no ver­ \ 1 1 34<j. I’ara isto deve o poeta
dadeiro sentido da palavra poema, estão p i1" • dr 1 como um “ realista” , fazendo
em pleno uso e serão eternos. Bom 1jur ,1 . façanhas brilhem por si.
— E x .: “ Monte de T ap yr” , de Bilac; “ Fu­
C A P IT U L O II I
gindo ao Captiveiro ” , de Vicente de Carvalho;
“ Palmares ” , de Goulart. l»p a lg u n s re q u is ito s de fo rm a

Art. 345. O que os distingue é o seu II 330. Ao poema épico convem


caracter objectivo e real. n * -1 \ 1■ • riandioso.
— Empregamos aqui a expressão real no sen­
tido de verdadeiro, já nas descripções, já na psy- Ai 1 j :,i < ) verso deve ser cheio, as
chologia. ■ lii!i > • •1111i11; 1s e os recursos de har-
Art. 346. O poeta não deve defor­ m> in 1 unii.iliva e suggestiva usados
mar o heróe, procurando fazel-o, sub­ * ' Ui iitlf,
jectivamente, á sua imagem. = V >|a ai o respectivo Livro, 11a Parte Geral.
i 54 C onsolidação das Deis do V erso Ou \ 11/.0 S egundo o G enero L itterario 155

Art. 352. A s narrações devem ser


T IT U L O II
bem feitas e cuidadas (art. 349).
— Como se vê no art. 349, dizemos que deve o
I á> Oenero Lyrico
poeta proceder como um realista. Deve portanto C A P IT U L O 1
evitar as “ descripções conjecturaes ” , (a expressão Do seu c a r a c te r is tic í/
é do brilhante critico snr. Fidelino de Figueiredo)
para usar as “ descripções reaes ” . A ii 357. O que caracteriza o ge-
111 i" lyrico v o ser elle subjectivo, pes-
Art. 353 - O poema épico pode ser siud, rinocional.
feito em estrophes regulares, o que au­ \it 35^. O genero lyrico presta-se
xilia a unidade. > !■■■!■> ns sentimentos, sendo o mais
—E x .: Os “ Lusiadas ” , de Camões ; “ O Caçador 11 "I,, cm Iodos os tempos.
de esmeraldas” , de Bilac; “ Palmares” , de Goulart- ;;,o. A este genero pertence a
iitiiiiii'i.i dos poemas de “ forma fix a ”
Art. 354. O poema em estrophes (L ivro III) e de “ forma variavel” (Li-
irregulares tem os inconvenientes e as ■ o, 1\ 1 de que adiante nos occupamos.
vantagens apontadas adiante: Livro II,
\ 11 3G0. O genero lyrico abrange
Tit. I.
i Ui • > ,u roubo da ode pindarica até a
Art. 355. O verso branco dá liber­ lieudtva »• a ternura do villancete;
dade á execução, mas é um tanto mo- §dt .1 ombria nenia até a graciosa
notono. ml* mm 1 rontiea.
Art. 356. O poema épico pode com C A P IT U L O II

vantagem ser tratado em verso livre, (»••= poem as de “ long o fo le g o ”

onde a emoção dirigirá a forma sem S11 !,iu A ’ maneira das epopéas
peias. (HMiniào de poemas sobre de­
1 56 C onsolidação das L eis do V erso
I in Vitimo S hc.undo o G enero L itterario 157

terminado assumpto), usam os moder­


n qur .r. obras de vulto quasi sempre
nos longos poemas em que uma idéa,
■ d do tljcilas.
um assumpto philosophico ou moral,
uma concepção symbolista, são tratados \ 1 1 365. Não deixam d ^ je r pe-
em vários episodios. • 1m1 11• 1 poemas e n n ca te n a d f^ e se os
— Podem servir de typo a esta classe de poe­ ■ h0111.mil *•; de poemas de “ longo folego”
mas o “ Sagramor ” , de Eugênio de Castro, a Morte * I" d que '.ao Iodos encaminhados a um
de D. Jo ã o ” , de Guerra Junqueiro, e o “ Anti- di In lio uiiieo.
Christo” , de Gomes Leal; se bem que estes dois
últimos participem mais do genero satyrico pela A 11 3(1(1. () bom gosto fará com que
intenção que assim os fez. o |"" 1,1 apresente os episodios em vários
iui t i" ui.1 em estrophes, ora em verso
Art. 362. Distinguem-se taes poe­
li» o . apropriados a cada subdivisão
mas do genero épico pelo seu caracter
subjectivo e pelo desenvolvimento inten­ N»1 11 comporta.
cional. \ mmlc cio 1). Jo ã o ” , de Guerra Jun-
ItH
Art. 363. O poeta cria os seus he­
rdes ou defende uma these grandiosa, \h ;(■ , Dos dois artigos anterio-
moral, philosophica ou social, encami­ s podemos extrair a fórm ula: — uni-
nhando o seu poema para um desfecho pftt im concepção; variedade na ex-
que deve ser logico e de que sobresaia f^esAi 1
a idéa defendida.
Vii ■;<'d. () poema pode ser dialo-
Art. 364. Para aventurar-se a obra
ln : |" ulciido lambem ser o dialogo en-
de tal folego deve o poeta apropriar-se
iih iido 1 um as descripçoes em prosa.
da technica, podendo então dar vai ie-
dade ao poema, quebrando a monotonia A^sitn r n "Sagramor”, de Eugênio de
ítn.
I *■ * \ i HMt S ecundo 0 G enero L itterario 159
IS8 C onsolidação d as Lgs do VERSO

Art. 369. Nos episodios, para maioi T IT U L O III


variedade, pode ser usada a forma dos
chamados “ poemas de foi ma íxa I hi (lenero Dramatico
Art. 370. Nestes poemas, mais do C A P IT U L O 1

que em outro qualquer, a emoção, o as- Do seu c a r a c te r ís tic o

sumpto marcam a expressão apropriada. Ari 3 7 1. Consiste 0 genero dra-


m o .......111 pôr ante 0 publico episodios
Art 371. Pode haver nelleS epÍS?'
dios do mais puro lyrismo e outros do ilii \ ida humana.
mais elevado tom épico. Al 1 375. () primeiro requisito do
poilll.l l| lamalico é que haja nelle ob-
Art 372. O talento e o bom gosto
sta i ai ,p 1 da vida real.
do poeta far-lhe-ão buscar um assumpto
ou uma these de palpitante interesse \ 11 370. () segundo é que haja
Viidudi verdade psychologica, ou in-
universal.
0 1 t"i > verdade de expressão, ou ex-
__ A escolha da these aqui equivale á escolha
ii 1 Íi 11
do heróe nos poemas épicos.
E ao poeta que fôr banal na escolha de sua lm n .it . m * d e v e e s q u e c e r a q u illo de B a t a i l le :
these é cabivel, mutatis-mudandis, aqu.llo de Boileau . a l im ji m r s p a r ce q u ’ e lle c o n tie n t de v é -

“ O le plaissant projet d’tm poéte ig^ ran t # i | i i 'iH i r n r iiv r c u o u v e lle choque ses c o n te m p o -
Qni, de tant des héros, va choisir Childebrand. fjlfita 1 '<u In u jo u r s e t s e u le m e n t p o u r ce q u ’ e lle
Ji-ri t i m t f t i i i de v é r ité que c e tte o e u v re e s t a p p e llé
Art 373 Se bem que haja no fundo | l i p i a . 1 d ’ .m s 1’a v c n ir
desses poemas a intenção satyrica de­
vem ser classificados 110 genero lynco, \it 377. Dos dois artigos anterio-
porque a sua expressão obedece a lei­ ■ deduz logicamente o caracter
lt)ntivn do poema dramatico,
tura dos poemas lyricos.
lin Vi uso S egundo o G enêro L itterario 161

ióo C onsolidação das E E is do V erso


d u.iiao logicamente a acção, como na
Art. 378. Jam ais se deve notar, nem vida
de leve, que 0 autor é poeta. \ 1 1 383. A correcçao impeccavel de
— E ’ a difficuldade dos subjectivistas a todo Impingem, a todo transe, não se dá na
transe. Esquecem que quem está em scena sao per­ ' ida 1 cal.
sonagens, que elles procuram surprehender na vida
real, e logo põem-lhes na bocca toda sua alma, e co­ unieo. Decorre deste principio, que
meçam a fazer poesia, a romantizar, com gáudio das o mtni (heatral deve ter por m ira: es-
meninas românticas, mas com grande sacrifício da cfrvri bem, respeitando, por vezes, a
verdade. Exageram as “ tiradas” e fazem dizer ao iiu "i 1 t-cçao de linguagem deste ou da-
personagem aquillo que elles diriam em caso seme­
ijiirllc personagem.
lhante.
11 fiitit, au théatre, tâcher d’écrire bien avec
Art. 379. A linguagem deve ser h>i m in tinii " - diz H. Bataille, judiciosamente.
appropriada a cada personagem, pro­
curando o poeta evitar as tiradas 1110- \ 1 1 384. A obra theatral não deve
*ri njna mera photographia do real,
gicas e subjectivas.
m i deve presidil-a um tanto de philo-
— Vide nota anterior.
sojilua i- de critica, que a conduza a um
Art. 380. Cada personagem deve inii 1 ■ m- universal.
ter a sua autonomia e deve conduzir-se \ vrnlade a que se refere o artigo 376, deve
livremente, tão livremente quanto o o i m i nu ili:ir este espirito critico que a expurga do
pode fazer na vida real. t i ......... itiin c que a conduz áquella harmonia do
■ líi i • iuliiior com o exterior de que nos fala o
A rt. 381. Cada personagem deve fa ­ O Ihitaille, e cujas relações o theatro deve
lar a sua linguagem própria, para natu­ H lftxluilt “ Uapports des vérités intérieurs de l’ame,
ralidade e verdade do dialogo. rt particulièrs, avec les vérités extérieu-
Art. 382. De accordo com os dois
artigos precedentes, os personagens con-
IÓ2 C onsolidação d as L e is do V erso I'o V i 11 s o S egundo o G enero L itterario 163

Art. 385. o genero dramatico abran­ ....... .ui, para que na execução o calor
ge desde o horrível ao essencialmente I»i' ............ communique á obra.
burlesco, comtanto que a verosimilhan- 1 ' 1 íibivcl o preceito do velho Horacio: — Si
tú nu ll. 11, (lolcndum est, primum ipsi tibi” .
ça os presida.
\ 11 3S1). K ’ a especie theatral em
Árt. 386. O genero dramatico com- 11111 1 .irçao deve ser mais intensa, o
prehende duas especies principaes: 1 1 a- t|iíil"M" mais elevado, os episodios mais
o-edia e Comedia, de que trataremos em (lM|inlt;auies (art. 382).
O
seguida. \ 11 (<>(». A elevação do dialogo
— Aos que extranharem num livro de versi- Iftfl dt\e ser affectada, mas depender
ficação ideas assim geraes sobre a obra theatral, ti| vaean moral do proprio persona-
apressamo-nos em declarar que o fazemos para dar
|*iii
as bases, as. linhas geraes que o verso nao deve
perturbar; pelo contrario deve fazer salientar, so Ai* 31)1. Kvitar o quanto possível
pena de transformar o poema dramatico numa obra rilii il 1 al", o declamatório, o empol-
fictícia. Ifui"
Observação, Verdade, Objectivismo — jamais !'a tu . 11.11 .nloxal que, em theatro, se acon-
devem ser sacrificados, embora com versos bellos 1. .. I i|í|ll ! . .1. ■ . evilar o “ theatral” . E ’ que o longo
l lll t i o laiimi.uin. da tirada para produzir effeito,
C A P IT U L O II Niit o •11. .1111 .1 expressão deixasse de ser o que
1. |.t. riiUran natural da vida, encarada
Da T ra g é d ia
ÍMi|n imliiienle, para se tornar a phrase
" 1..... basiiro, o termo sesquipedal. Dahi
Art. 387. A tragédia lembra a epo- ;H«i-Üi
péa e destina-se a commover.
A I! 30 ’ Sem esquecer os preceitos
Art. 386. N a escolha do assumpto »SHp j ini i 11' 11, deve o poeta procurar
deve o poeta seguir o impulso da sua Ml 1 1 1 i>. sejam cheios e sonoros.
ió 4 C onsolidação das L iíis do VB rso
U o VlíHSO S egundo 0 G enero L itterario 165

§ Isto será tanto mais facil,


i .°
A i mordia, fazendo rir, attinge ao fim nietz-
quanto mais o artista se compenetrar
tloáon l,.i disse o mestre 110 seu Zaratustra: “ Com
do personagem que procura fazer fa la i. a * •A. 1 a não, porém com o riso é que se m ata” .
§ 2.° Se o poeta encarnar o senti­ I impini ,1 mm um quê de espirito philosophico e a
fluiu dia 11.1 eterna.
mento do seu heróe, o verso lhe sahira
com a possivel expontaneidade.
V11 31 >(>. A “ A lta Comedia” , a mais
§ 3 . ° Encarnado o personagem, a |i' i )' h.1 interpretação da vida no thea-
phrase lhe ha-de occorrer com a neces­ n ", p"di attingir o tom épico da tra-
sária clareza e o sentimento elevado dara g t t l i i i c ui algumas scenas e o chiste da
a linguagem elevada, sem affectaçao. gomtdia propriamente dita em outras.
C A P IT U L O III - \ Ml.i Comedia é especie relativamente mo-
Da C om edia •...... .. 1 ("i I' ipira a evolução que a produziu. Da
ll^t dio ui,o,. 1. encarando a vida pelo lado funesto,
Art. 393. A comedia, mais do que (JilÍBii 1 oini dia cm que sc buscava ver só 0 ridi-
tudo, deve ser a vida em scena, com da id,t ungiu uaturalmente a hoje chamada
toda a sua naturalidade. t i.iü. dei r.na ninguém, classe alguma da so-
#dr, ■ t ui lempo algum, a vida pode ser uma
Art. 394. Pode ser de costume, de l i f q a n(i uma tragédia perenne.
enredo ou de these, procurando sempre Cd-. . 1, inpna de risos e de dores, de situa-
ferir o ridiculo com chiste. I pHtlcsiHa c dr serias altitudes.
Art. 395. O poeta deve pôr em sce­ i Mm 1 miicdiii qnc procura interpretal-a com
10- miiincnlo aclual da evolução do thea-
na a vida real, encarada pelo seu lado
11 pci Icílu especie do genero dramatico.
ridiculo, sem esquecer o preceito geral,
l .... d. llcrgcrac" é um bello exemplo.
applicavel a obra theatral, exposto no
art. 384.
i66 C onsolidação d as L e is do V erso 11,1 V erso S egundo o G enero L itterario 167

c a p it u l o IV lllls), dn i|ue em referencia ao theatro e ao verso


Das especies m enores ijtli I!Ir r proprio.
Farça» B u rle ta , In te rm é d io , S ainete . I' >1 •» mim, diz o genial poeta, entre ter bom
Mi lo c Ia rr c s t y lo ha uma differença essencial:
Art. 397. N a Farça e na Burleta, IH In ">• • -ivIo significa ter o estylo proprio e con-
por serem de um comico mais rasteiro, I Hlíi Iip íih idéas (jue se expõem ; f a z e r e s t y lo signi-
ha mais liberdade na feitura dos versos. Mi s t..... In m a falta de idéas com phrases redun-
d a iili a ■ ii|i|Miatosas, com aquelles p é r s i c o s a p p a r a t o s
Art. 398. O Intermédio deve ser i|Ui j-1 llon u io queria banidos dos festins e, com
rápido, simples, de um desenlace sem 1.1 iim ainda <lo discurso-
complicações, como um poema que fosse
dialogado. |i lí ei somente (pie 0 snr. O. Martins nunca f a z
Art. 399. O Sainete caracteriza-se 1 é m/ii ■ ai lamente porque tem muitas idéas, etc.

pelo chiste e pela rapidez.


111 |i 1
I )evem presidir a feitura
C A P IT U L O V llM ali 1 res grandes elementos:
vhm i
Do v e rso th e a tra l Wiiii| iíp id.idr, Naturalidade, Sobriedade.
Art. 400. Jam ais o verso deve to­
^ii |"3 Toda a inversão que pre-
lher ou perturbar os requisitos essen-
jtlilii |ip 1 naturalidade deve ser banida
ciaes do poema dramatico, expressos no
| Ml H fe 1 .13' v 332 ).
Cap. I.
tf* 1 1........ pie (pianclo o poeta quer pintar um
Art. 401. A preoccupaçao estylistica
H" Mu* pi 1 -si111.tr.e111 ridiculo e affectado, o uso
perturbaria a expontaneidade do dia­ UH0 • )••• i" na sua palestra ser-lhe-á um bello
logo. *l!í' 1 (imIu 1 niip.e.le com a simplicidade dos outros.
— Nunca foi tão verdadeira a “ trouvaille " de
Anthero de Quental, sobre a differença entre t e r ■ ii |u| \s rimas deves ser sim-
c s t y lo <$ f a z e r c s t y lo (a proposito de Oliveira M ar- t? =1 111 p m 1,11m•111 d a r a .
i68 C onsolidação das B e is do V erso I ><i V erso S ecundo o G rnero L itterario 169

Art. 405. E vitar as elisÕes força­ I ' 1 la harmonia que dá, segundo M. Fer-
iigní siipriinridade ao verso theatral de Sem Be-
das, que se não usem na linguagem
lii ininado-o corredio, natural, fluente, sem tolher
commum. 0 ilielum pioprio da linguagem.
Art. 406. O verso theatral é para \it |o<S. Approximar, consequen­
ser falado'e não para ser dicto ou me­
temente, o mais possível o rythmo da
nos ainda, declamado. plu 1 • do rythmo do verso, para não
— O poeta dramatico deve esforçar-se por me­
1 1 • o 1 cesuras.
recer conceito semelhante áquelle de H. Bataille
sobre o grande actor Guitry: il |D«i. A linguagem theatral de-
“ Guitry est donc un réaliste né- II a 1’horreur V» • ■ .111.1 i 1 em “ discorrer em verso” e
instinctive de ce qui n’est pas conforme á la vie appa- M i" 1.1 eiidi) verso” .
rent.
Observez corame sa diction prend soin d’être
\tl 410. No theatro sobretudo se
toujours parlée et pousse jusqu’au scrupule le souci tflt i 1 >ii,ii a “ cheville” : uma exclama-
de ne pas chanter le moindre mot, de ne pas se MÉU iiiiiü.i . ve/.es etjuivale e até diz mais
laisser aller à la moindre apparence de tirade. II p i qii> tinia phrase.
met de l’air, des tcmps, entre les répliques, quitte à
ralentir le mouvement T IT U L O IV
Antes já tinha dicto do mesmo: “ Le public,
en parlant de lui, s’exclame : “ Comme il est naturel 1.” I >o ( Lucro Satyrico
Possa o publico dizer o mesmo do poeta que C A P IT U L O I
escreve para o theatro: “ Como elle é natural! ” Será L)a S a ty ra em g e ra l
o seu maior elogio.
Sn 1 1 1 Caracteriza o genero, o
Art. 407. Um dos requisitos da na­ il. corrigir costumes, castigar
turalidade reside no seguinte: procurar M ills, upoiilar ridículos.
que o accento do verso (cesura) recaia Is " "I, 111-1 r á comedia, pela intenção que
sobre o accento da phrase. y .. stulun. com a differença apenas da ma-
170 C onsolidação das L,e is do V erso I >u V erso S egundo o G enero L itterario 171

neira de os executar. A comedia é o genero obje- ■i. pendendo isso mais do temperamento
ctivo, em que o autor procura surprehender em do poela.
flagrante, pondo em scena, tal como é na vida, aquelle
ridículo que quer ferir, para que o vejam. O autor \ h 4 15. Do art. anterior decorre
não apparece. A Satyra é o genero subjectivo com • |U' dr duas maneiras se pode exercer
as mesmas intenções, porém nella o autor apparece,
M ' 1' 1 a ou ferindo directamente (Sa-
indignado ou ironico, mordaz ou humoristico e cas­
I Vi a < Kpigramma) ou levando ao ridi-
tiga por suas mãos. Não fica impassível, age. Não
photographa para que vejam. Pelo contrario, viu e t-iiln ( I oema heroi-comico e Parodia).
se indignou, por isso empunha o azorrague- \ m |i(). Além dos poemas referi-
Art. 412. A Satyra pode ser contra 1f • 1,, cNcellontes auxiliares da sa ty ra :
os costumes ou contra certas individua­ n 1 10111 dia c a Pabula.
lidades. V .1 liotu 110 art. 411.
Art. 4 13. Quando contra uma indi­
C A P IT U L O II
vidualidade, deve o autor ter o máximo
Da S a ty ra
cuidado de não descambar para a inju­
ria ou a calumnia. \ n 1 1 y <) tom da Satyra é geral-
— Nunca esquecer a verdade d’aquelles versos |IH* ' 110 v indignado, ou ironico.
de Bocage ao seu rival Agostinho de Macedo, quan­ A h | i í ' < ) sentimento que inspira
do este procurou feril-o, faltando, porém, ao pre­
ími i i d.o lhe á forçosamente o tom,
ceito que consolidamos no art. 413.
1 lit udo o verso.
“ Satyras prestam, satyras se estimam,
Quando nellas calumnia o fél não vérte, IIntIm11 ii■ l<1 mi ironico” , — dissemos. E de
Quando voz de censor, não voz de zoilo, i ÉHMtiliu nl o que dieta a Satyra é aquelle
O vicio nota, o mérito g r a d u a ...” jHljtlt ‘ "011,1 uma instituição ou contra um ho-
B fltfR " i 1 1' li-iln:. de tuna épocha ou contra
Art. 414. No genero satyrico o es- IliflM ih mu i.u.ieter. E esse sentimento pro-
tylo pode ser indignado ou humoristico, 1|« ilu 11111.110.1 nu-uti* encher o verso, empres­
I >n V erso S egundo o G enero L itterario 173
172 C onsolidação d as L eis do V erso
Como se vê, na especie de satyra, de que
tando-lbe a eloquência. Já em seu tempo clamava 0 ala o urligo acima, explora-se o contraste em
Juvenal, o mestre deste genero: “ Facit indignatio '■ "I"- seus recursos. Os requisitos são os exi-
vcrsum ! ” — A indignação faz o verso! 1 Ll ' |'■! 1 a a pompa do verso, com mais liberdade,
t Ililfll.
Art. 419. A Satyra requer versos C A P IT U L O V

cheios e escolhidos. Da P a ro d ia

Art. 420. Os conceitos expendidos At'!. 424. A parodia é o approvei-


devem ser caracterizados pela energia 1 iiii' niii de uma obra seria, de que se
tanto do fundo como da expressão. 1 ■>* um pastic.ho comico, para ridicula-
H >11 .liguem ou alguma acção.
Art. 4 21. O tom ironico empresta
á Satyra um quê de inesperado que au­ liuico. A obra parodiada deve ser
xilia grandemente o effeito a conse- I'msi ii 111 r conhecida para causar effeito.
guir. T IT U L O V
C A P IT U L O II I

Do E p ig ra m m a
I >0 Genero Didactico
Art. 422. O epigramma, auxiliar Ml 425. Genero naufragado, de
poderoso da satyra, é por essencia ferino tjif ' .i.lvott a Fabula (arts. 649 a 653).
e contundente. T IT U L O V I
— Caracteriza-o a concentração num ponto, que
I *o (lenero Humorístico
elle fere. Tem um simile perfeito na ferretoada dos
insectos. Veja-se o exemplo adiante no Livro IV. ii i '(>. Lara melhor o classificar,
h idi 1 c1in cs o humorismo em antigo e
C A P IT U L O IV
iiiht no.
Do P oem a H e ro i-c o m ic o
-- I I aiilipn vem de humor, ou melhor, de bom
Art. 423. Caracteristico: uma acção WSf 11 moderno vem de humour.
ridícula em verso heroico.
C onsolidação das L éis do V erso I >0 V iírso S egundo o G enero L itterario 175
174

Art. 427. Caracteriza o humorismo d* ia/cr rir, sem intenção immediata


antigo o predomínio do riso, sem que <lr * astigo.
uma nota de tom mais serio, mais phi- S.10 modelos alguns contos em verso de
Atiliui Azevedo, o nosso grande humorista (no sen-
losophico o venha perturbar. lid.i Miiligo).

Art. 428. O humorismo antigo creou


Ml. 432. No sentido moderno, o
o carnaval, e tinha um deus: Momo. lumini ismo é um sentimento, em muitos
— Chegada a épocha do riso, Momo imperava e I" *1111 >s contrario ao humorismo antigo,
0 serio era banido. E ’ que os antigos separavam ni­ ■ "mie o riso e a compaixão caminham
tidamente o serio do risivel; o pensar profundo, da pai allclos.
alegria. I ' a lição preciosa, entre outros, de James
fiullj
Art. 429. Os poetas antigos fizeram
deste genero um auxiliar do satyrico e Ml. 433. O humorista é um forte
neste caso temos o castigo pelo riso. <iu< ii e ao mesmo tempo tem pena, ou
inntianam ente: tem grande pena, mas
Art. 430. Neste sentido é o humo­ llft" pude deixar de rir. 9
rismo o pae da comedia. I embrae um homem que tem ao collo uma
N#h' 1 '|ur tomou um grande susto e a quem elle
— Castigar por meio . do ridículo. Ridendo cas-
P ■” h' No meio da compaixão com que lhe di-
tigat mores! é a divisa do poeta comico, que em­
|« 11 'ii consolo, erra por vezes um sorriso, des-
punha o azorrague ainda em nome de Momo, o fculadn pifo ridículo daquelle choro que já não tem
inspirador fecundo da galhofa. ffiâís 1 rtlHH.
A rt. 431. Ainda neste sentido anti­ Ml. 434. O humour está no ponto
go ha um humorismo em que só predo­ iiiltmiianle donde se vê que nem tudo
mina o riso mas com o desejo apenas ptíicic um riso franco, mas também,
iy6 C onsolidação d as L e is do V erso l*n V erso S egundo o G enero L ittêrario 177

por outro lado, nem tudo merece sei iiiiu.c .iquclla. A sua piedade o move: Facit indul-
levado a serio “ completamente” . iiriitiii v e r s u m ! . . .

Art. 435. O humorista moderno é \ ii. 438. O humorista fere com


um pensador cjue raciocina e se contem. i *1 11.1 de 0 fazer.
Art. 436. O humorista moderno já \i 1. 439. Creou o humour um sen-
não desce á gargalhada que é physica e Imii iito determinista, pois o humorista
presuppõe 0 predominio do riso . o 1 iso ■ que o “ sentenciado” é por sua vez
do humorista é espiritual e se esboça miii.i victima de causas determinantes
num sorriso, sempre prompto a ceder d" .eus actos, e que a culpa não lhe
logar ao serio. pih|c eaher totalmente; por isso ao mes-
_ “ Os autores mais espirituosos produzem um .... lempo que fére já perdoa.
sorriso apenas sensível ” — disse Nietzsche.
<> Ileterminismo creou assim o humour, como
Art. 437. Se o humorismo antigo é ■ I,lvrr Arbítrio, por sua vez, já havia creado o
Ptilimi i'í 111 o antigo.
um auxiliar da satyra, o humour é 0
1 rfícotivamente- Quando se escolhia para cas­
contrario delia: — a satyra castig a. 0
tigo .. liso, ria-se impiedosamente. E ’ que se cria
humour perdoa. |M* o merecedor do castigo assim obrou “ porque
__ O poeta satyrico não tinha complacencias. Btii "podendo tel-o feito de outro modo” , não
Punha-se no ponto de vista de um carrasco a vingar fil ■ mio portanto compaixão. Hoje ha mais indul-
a sociedade. E em nome delia, indignado, vibrava os MlU'i.1 o.1 própria pena criminal, quanto mais no
seus açoites. A indignação o movia: Facit mdi- fei-M,:.! .r, transgressões moraes!
gnatio versum!
O humorista contrariamente é um ser de com­ Ari. 440. A satyra é o ferro em
paixão. Encara a vida mais do alto e mais a fundo, |ii m .1 o humour também, por vezes,
sendo por isso mais indulgente para os prazeres fjllt mu, mas leva já, conjunctamente,
humanos. A divisa do humour é absolutamente con-
Pm ImIs.uiio.
I iii V iírso S egundo o G enero L itterario 179
178 C onsolidação da s Lfiis do V gRSQ

Assim como a primeira modalidade nasce da


Art. 441. Fere, mas envolve em ve­ visnn determinista por que se encaram as coisas,
ludos o estylete. 1 1 n,r.ce da visão mais profunda que o humorista
_ Alguém assim procurou cantal-o. It m d.i . coisas humanas, cuja imperfectibilidade me-
_ Humour, humour que eu bemdigo, 111•11 rnxérga.
Tu és o Apollo moderno, 1 .mtigos castigavam totalmente, mas também
Capaz de descer o Inferno, Bilulitiu .1111 totalmente; dahi a concepção do heróe,
Rindo ás ventas de P lu tão ! . . . stt!d..... Intulmcnte, totalmente intangível; dahi a
Apollo, symbolo antigo !> ■•■ ■ ........ da comedia: sempre riso, e da tragédia:
D a magestade do verso, : i ill|r( I (||(>!'(>.
Vibrava, enchendo o Universo, 1 • Iminorista, que é um pensador (art. 435),
A s settas com perfeição! jiei.i i b Mih.i totalmente, como vimos, nem totalmente
illtuint, piiique é da essencia do humour o mar-
Mas de Apollo a flecha hervada
Htatiiii |mi itllelos o riso e a gravidade: a gravidade
Trazia a ponta molhada
(= m sui 1 1 ( art, 432).
Do Lethes 11a lympha a z ed a ...
E tu, sorrindo, com chiste, \ 11 | | |. () humorista vê nos gran-
Ao envial-a cobriste
iFs , 11,i- grandes acções o calcanhar
Com leve manto de sed a! . . .
A 11111*“>, descobrindo nas perfeiçÕes
Art. 442. Do final do art. 433 e
líjiíti' tiic, o ponto imperfeito.
final do art. 434 decorre outra modali­
dade do humorismo moderno, inversa Di 115. I )ecorre do art. 435 que
da que tratamos nos artigos anteriores: ijíiiMido 1 ilm assalta ao humorista, elle
um sorriso em meio das coisas serias. 1 mi" 1.1 o mi um sorriso.
Art. 443. Deste sentimento do hu­ Wftd 1h * 1 1 ,.iiiios accentuar o quanto é humano
mour nasceu a formula artística do hu­ t= |ii ui 111 dl rui sorrir as almas tristes, como
morismo moderno: temperar o riso com > IHttljll, eiiino um allivio. Os exemplos dos
um quê de gravidade: temperar a g ra ­ jíltiis a.. Ininiotir são sem conta. Assim o foi
1- Nu i íi Ihii dizem que o era.
vidade com um leve sorriso.
i8o C onsolidação d as L e is do V e r s o I >o V erso S egundo o G enero L itterario 181

Art. 446. Quando a dor assalta um I que termina:


temperamento philosophico gera o hu- “ ()h meus amigos ! Salvo-erro,
Juro-o pela alma, pelo Céo:
mour.
Nenhum de vós, ao meu enterro,
__ ]jis porque os nossos poetas brasileiros não Irá mais dandy, olhae ! do que eu ! . . . ”
nos deixaram nada, nenhuma pagina de humour:
/eferino Brasil, o delicioso poeta sulista, sorri,
não tinham temperamento philosophico. Não eram
|...i vr/es, com o mais requintado humour, á sua
“ pensadores que se contivessem ” (art. 435) ! quando
;t ........ .1 ncurasthenia. Basta para comproval-o o
a dor lhes sobrevinha tomava conta do seu estro e
llitrU o que se estampa naquella joia que é : “ A Se-
era um chorar sem trégu as. . .
iliiunt M inlVAlm a” .

Art. 447. Quando o humorista, em


\rl. 448. Caracteriza o genero hu-
meio á gravidade da sua dor, esboça ni'ii t •lien» ( no sentido moderno) este
um sorriso, é natural que este saia do­ >" i i ,m eio da gravidade e do sorriso,
lorido. II mlidos ambos num equilíbrio que ja ­
__ São um exemplo maravilhoso algumas pa­ ntai. m* rompe.
ginas do grande Antonio Nobre. A Morte, o V e l h a ,
Nao é mais a gargalhada physica (art. 436) ;
já lhe mandara 0 seu aviso e elle já a sentia ao
Uh -r rs creita no terreno das ideas. E ’, segundo
seu lado. 1 •11111, eilado por J. Sully, “ 0 r i s o d o e s p i r i t o " .
São de um requintado sabor algumas paginas de
humour que elle traça, sorrindo á Morte, qUe ja com \ 11 449. O genero humorístico não
elle passeia braço dado. Fez-se intimo da V e l h a e
uin genero aparte, pelo contrario,
dá-lhe piparotes. Nasceu assim, entre outras, a B a i ­
|Í|mtle-,iu se em dóses ligeiras em todos
la d a d o C a ir ã o :
3 ■ ■ uiros generos, temperando-os.
“ O meu vizinho é carpinteiro,
Algibebe de Dona Morte. Assim brilha na própria tragédia moderna,
Ponteia e coze, o dia inteiro, |(iii inr, dr Ihsen, por exem plo; encanta nalgumas
Fatos de pau, de toda s o rte ... ll h9 di- Molière, principalmente no “ Misanthro-
1 8 2 C onsolidação das L eis do V erso

po ”, comedia em que não perpassa o riso franco


do comico antigo; infiltra-se no didactico (fabulas) ;
dá brilho a toda a classe de poemas dos mais sé­
rios — como um sorriso em meio á gravidade: An-
tonio Nobre, Zeferino Brasil, nos poemas já cita­ LIVRO II
dos (nota ao art. 447) e esse grande Edgard Poe, Dos poemas em estrophes
entre outras poesias, em “ O Corvo ” traduzido por
Machado de Assis, o mestre do humour no Brasil.
T IT U I. 0 I
Da estrophe em geral
\rt. 450. Estrophe é o agrupamento
li .11 <le dois ou mais versos, offerecendo
i inpre a mesma disposição de rimas e
d' metros.
Algumas estrophes “ decadentes" como, por
• >1111'I' >, quadras com versos irregulares, partecipam
das r-.lmplies regulares pela disposição das rimas e
|« I" mimero de versos, porém das irregulares (art.
n n 'iu parte, pela variedade de medidas.
Kk. :
" I idiii, " toda de espinhos,
f'"!:l ll. fcl !
1 ' .......... .. os teus desdens em tépidos carinhos,
• • n 11 i magre em mel.
Tmiift cm velltido
I •- " <11. lumes, geladas açucenas,
flitlit í,r em brando colchão de pennas
r ■ 11 1 01.11..ui, gelado e s c u d o ...”
( E ugên io de C a stro ).
184 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas em E strophes 185

Art. 451. A estrophe pode ser iso- luirão uma estrophe regular, desde que
metrica (versos de igual medida), ou ‘ He a repita durante um poema regu­
heterometrica (versos de medidas dif- larmente.
ferentes). Art. 457. Bellissimo fica o poema
Art. 452. A unidadde rythmica de Ieito em estrophes irregulares (art.
um poema em estrophes não é mais dada 155)» <luando a mudança dellas obedece
pelo verso em si, mas pelo conjuncto a aiccessão dos episodios.
que forma a estrophe ou estancia. Ksf ão nestes casos os poemas de que fala o
Art. 453. A s estrophes podem ser I I, Tit. II, Cap. II, Poemas de “ longo fo le g o ” .
ainda, relativamente ao poema, regula­
res ou irregulares. T IT U L O II
Art. 454. A s estrophes regulares Da constituição da estrophe
dão mais unidade ao poema; as irregu­
lares mais “ surpreza” , porém perdendo Art. 458. Deve-se attender, na cons-
muito em unidade. 'üiih.ao da estrophe, — ao numero de
Art. 455. Quando um poema é feito is, á collocação das rimas, que de-
em estrophes irregulares, estas devem \<m scr fixas e ao encadcamento (en-
hMihcment).
encerrar um sentido acabado sob pena
de ser a emoção sacrificada. \ 11 .159. A s rimas de uma estrophe
— E ’ um bello exemplo de poema em estro­ !""!ein scr diversas das de outras, de-
phes irregulares, mas em que a regra foi obedecida pltdu, entretanto, conservar a mesma
o de Alberto de Oliveira : “ Por amor de uma lagri­ ili |" 1 k ao.
ma ” , 1." serie das suas “ Poesias ” edição definitiva.
^11 |(io. Nos poemas curtos as ri-
A rt. 456. Toda a combinação de !n 1 |hmIciii se conservar as mesmas até
versos e rimas que o poeta fizer, consti- fim.
186 C onsolidação d as L e is do V erso Dos P oemas em E strophes 187

A rt. 461. As orações devem formar dependendo as combinações dos vários


algum sentido apreciável ao fim de cada metros, do bom gosto do poeta.
estrophe, salva a excepção do art. 463. — São bellos exemplos de estrophes heterome-
Iricas regulares: — o “ Beijo eterno", de B ila c; o
Art. 462. Os encadeamentos que
" Corvo ” , de Machado de A ssis (trad.):
dão belleza no interior da estrophe, cons­
tituem defeito imperdoável, de uma es­ Art. 466. A s estrophes em verso
trophe para outra. decadente trazem pela variedade de ry-
Art. 463. Deixa de ser defeito o l limos uma encantadora surpreza.
E x .:
encadeamcnto entre estrophes, quando Só os teus olhos, teus olhos fundos
elle é a conclusão de um sentido que N a treva densa-
ficou suspenso, e que se termina em Apagam-se astros, calam-se os m undos!
toda a estrophe seguinte como se fosse Mas nos teus olhos claros e fundos
Que sonho pensa?
uma explicação da primeira.
(J0Ã0 de B arros).

T IT U L O I I I Art. 467. A s estrophes mais usadas


Das differentes especies de estrophes mu portuguez têm nome proprio deri-
C A P IT U L O 1 \ .ido do numero de versos de que se
G en eralid ad es • 1mipõem: tercetos, quadras, quintinhas,
Art. 464. As estrophes em portu- • iila vas, décimas.
guez podem constar de 2 até 10 vei sos. Art. 468. Algumas felizes combina-
— Raramente as estrophes excedem de io ver­ 1 n r , d c estrophes fixaram-se de maneira
sos, pela difficuldade de reter o rythmo estrophico I" M ime e assim se têm perpetuado: são
(art. 452). " “ Poemas de forma fix a ” (Livro III,
Art. 4Ó5. A s estrophes heterome- dilunte).
tricas podem variar indefinidamente, I Soneto, bailada, villancete, etc.
1 8 8 C onsolidação das L l is do V lrso Dos P o em a s em E stro ph es

c a p it u l o II A rt 4 71. Desde que dois a dois,


Das e stroph es de d o is v e rs o s : p a re lh a s conservem os versos um sentido apre­
Art. 469. Nas estrophes de dois ciável (art. 4 6 1), podem rimar alterna-
versos estes, geralmente, rimam entre damente, que não deixarão de ser “ pa­
si, mas para que haja verdadeiramente relhas” , formando estrophe.
— E ’ a reciproca do art. 470 e confirm a o que
uma unidade rythmica, é preciso que,
dissemos anteriormente.
ao fim de cada dois versos exista uma Pode servir de exemplo a linda bailada de João
parada apreciável de sentido (art. 4 6 1), Ribeiro: “ D. B ra n c a ” , citado adiante no Livro III,
ao menos frequentemente, se o poema é Tit. II, Cap. I.
mais ou menos longo. Art. 472. A s parelhas em verso he-
—- E ’ um bello exemplo o “ Romance ” , de lerometrico emprestam grande varieda­
A ffo n so Lopes V ieira (citado no Livro IV , Tit. II, de ao poema, tornando-o encantador.
Cap. I V ) ; a “ L a g rim a ” , de Guerra Junqueiro; — São exemplos dignos: a “ Oração ao Pão ” ,
“ Alcacer-Quibir ” , de M ario B eirão ; o “ E n viad o ” , tlr O. Junqueiro; “ D. A n n a ” , de Fontoura Xavier.
do mesmo.
C A P IT U L O II I
Art. 470. Não é só porque rimem Das e stro p h e s de tre s v e rs o s : te rc e to s

dois a dois os versos, que formarão Art. 473. Originariamente, nos ter-
estrophes, mas porque o sentido para ( rios, os versos de cada estrophe rima-
isso também concorre. \ ;11 n entre si.
—■ Assim, se bem que rimem dois a dois não Assim o usaram antigamente os francezes-
podem ser consideradas estrophes os versos da “ De- ' > i Hcbre D i e s ir a e biblico foi escripto em estro-
lenda Cartago ” , de Bilac, da mór parte dos “ Oa- plies de tres versos com uma só rim a:
ristos ” , de Eugênio de Castro; dos alexandrinos Dies irae, dies illa
em geral, tanto do theatro francez, como daquelles Solvet saeclum in favilla
usados pelos nossos poetas. Teste David cum Sibylla. etc.
190 C onsolidação d as L e is do V erso Dos P o em a s em E stro ph ês 191

Art. 474. O terceto clássico portu- Quando a lava descia essa eminencia estranha
Form ava a legião: chamava-se M o n t a n h a ,
guez tem as rimas cruzadas: o verso do
G ir o n d a , C o r d e U i e r s , — phantasmas do T e r r o r , etc.
centro com os dos extremos do seguinte
e assim por diante, finalizando com um Art. 476. Applicam-se ao terceto os
verso isolado que rima com 0 do centro dispositivos dos artigos 461, 470, 471,
do ultimo terceto. 472, sobre o sentido apreciável ao fim
E x .: de cada estrophe e sobre a estrophe he-
N essa noite, no rancho, á voz do oceano
(erometrica.
Juntou a sua, a dar-me a despedida,
A viola gemedora do serrano. Art. 477. O terceto é usado em va­
Ouvi-a com uma lagrim a sentida. rias combinações, principalmente nos
Sôou a cantiga, em suspiroso accento, sonetos.
N as quebradas da serra adormecida, C A P IT U L O IV
E no meu coração, como um lam ento: Das estro p h e s de q u a tro ve rso s: q u a d ra s
( A lberto de O l iv e ir a ) '
— Trata-se novamente do terceto nos “ Poemas Art. 478. A s quadras são as estro-
de form a f i x a ” . I>11 cs de uso mais frequente em portu-
euez, sendo feitas em quasi todos os
Art. 475. Como se dá com a pare­
melros e entrando nas combinações mais
lha, também o terceto pode sahir fora
va riadas.
da exigencia classica da rima entre-
cruzada e ser dividido mais pelo sentido. Art. 47c). A s duas rimas que se al-
— Estão neste caso aquelles da poesia “ T ira- irniam nas quadras e que chegam quan­
dentes ” , de Fontoura X a v ie r: do esperadas, dão á estrophe um quê de
E ra horrível de ver-se o monstro enfurecido, <i * 11 a firmeza que causa um bem estar
Heroico, marcial, esplendido e ferido, -10 ouvido e á emoção que se satisfez
Bramindo de feroz, rasgando-se de d o r ... Idei lamente.
192 C onsolidação das L eis do V erso Dos P o e m a s e m E s t r o p h e s 193

Art. 480. A s quadras rimam geral­ Eis o monarcha das feras


mente dest’arte: A B A B ; ou A B B A . Lhe concedeu liberdade,
Ou por ter delle piedade,
E x .: A B A B :
Ou por não ter fome então.
Da serra azul, onde a palmeira medra, ( C urvo S e m m Edo).
Onde paira a neblina, se deriva,
Entre abertos lisins de esconsa pedra, § 2.0 Alguns usam nas quadras só
Um fio de agua viva. duas rim as: segundo e quarto verso:
(A i.b Erto) .
ABCB.
— ABBA:
Não ha quem a emoção não dobre e vença, — Deste modo rima geralmente as quadrinhas
Lendo o episodio da leòa brava, populares. São assim rimadas as deliciosas “ Canti-
Que sedenta e famelica, bramava, im ” , de Corrêa de Oliveira:

Vagando pelas ruas de Florença. Sendo Maria 0 teu nome,


( R aymundo ). Fiz peccado de heresia:
§ i.° Raramente se dispõem as ri­ Esqueci o Padre-Nosso
mas da maneira seguinte: A A B B ; ou A resar a Ave-M aria.. .

A B B C com D E E C . Art. 481. Os lyricos portuguezes


E x .: A A B B : 11/eram da quadrinha septisyllaba, ape-
Fabio, ao cahir da noite húmida e fria, .11 da sua pequenez um “ poema de for-
Do chupado carão despe a alegria;
111,1 fix a ” de surprehendente belleza.
Não porque chore o sol, do dia enfeite;
Mas porque accende a luz, que gasta azeite.
I Livro III, Tit. II).
( F r . M a n u Ee ). Ex.:
— A B B C ou D E E C : (guando eu canto, o povo em massa,
Sahiu da toca aturdido, Chora ouvindo a minha voz;
Damninho, pequeno rato, Novo Camões da Desgraça,
E foi cahir, insensato, Canto a dor de todos nós-
Entre as garras de um leão. (M ario B eirão ).
194 C onsolidação das L eis do V erso
Dos P oemas Em E strophes 195

Art. 482. Um poema em alexandri­ Art. 484. A superioridade da qua­


nos, dispostos em estrophes de quatro dra decadente sobre a heterometrica,
versos tem um cunho de serenidade e com a qual se assemelha está nisto: a
um quê de perpetuo. heterometrica não decadente obedece
— O “ Parahyba ”, de Alberto é escripto nessa gcralmente a dois metros sobre os quaes
especie de quadras.
Icm de voltar de vez em vez; a decadente
A rt. 483. A s quadra heterometricas obedece ao proprio pensamento do poeta
em que entrem os alexandrinos ou os e a sua emoção é que marca o rythmo.
decasyllabos, unem áquella serenidade Sirvam de exemplo innumeras quadras em
uma deliciosa surpreza. que Kugcnio de Castro vasou a sua grande emoção
— K ’ exemplo admiravel a “ Mosca Azul ” , de 1111 " Sagramor ” .
Machado de Assis. Muitíssimas poesias do “ Can­
cioneiro Chinez” , de Antonio Feijó encantam por C A P IT U LO V
essa disposição.
I M h estr o p h e s de cin co versos: q u in tilh a s
Ao som de flauta, aos homens que passavam
Cantei uma canção; \ 1 1 (.85. A s quintilhas rimam indif-
Mas nunca me entendiam, nem prestavam
ffieniemenle sendo, porém, mais agra-
A minima attenção...
d i iv e r . ao ouvido aquellas que têm as
Erguendo então a flauta, abri os lábios rimas dispostas deste modo: A B A A B .
Para o céo a cantar;
Mostravam grande regosij.o os Sábios Kn,
Nas nuvens a dansar.
I M lívt .1 iniciação para a alegria
E agora os homens já me entendem, quando, Num templo primitivo de paysagem,
Tocado de saudade, Km ijue num fundo aberto de bahia,
Vou as minhas canções acompanhando I Li .iigila das montanhas, emergia
Com a flauta de jade. \ I.a n u azul de um ídolo selvagem.
( A ntonio F e i j ó ) . (F eu ppE d'O l iv Ei s a ).
196 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas Em E strophes 197

C A P IT U L O VI
Art. 486. Os antigos usavam muito Das e str o p h e s de seis ve rsos
a rima alternada dest’arte: A B A B A . SECÇÃO 1
—■ Assim as usaram: Sá de Miranda ( “ Carta a Das s e x ti n a s
D. João I I I ” ) ; Tolentino, (na “ Autobiograpliia ”
a S. Alteza) ; Bocage, (em varias fabulas). Art. 489. As sextinas, cahidas em
Wenceslau de Queiroz, á maneira dos antigos, desuso, eram mais um jogo de palavras
assim dispoz as rimas da poesia “ No Sertão” : para mostrar engenho do que uma for­
O meu cavallo impaciente ma própria a vasar grandes emoções.
Galopando pela estrada,
Não se devem confundir com as sextilhas, de
Caminha presto na frente,
11ue trataremos em seguida. V. as sextinas nos
R á mansa luz da alvorada
“ poemas de forma fix a ” . Foram estas que Castilho
Sacode a crina luzente.
mmlrmnou e não as sextilhas como por engano
(W e n c e s l a u de Q ueiro z ). affirmaram Bilac e Guimarães.

Art. 487, A s quintilhas septisylla- SECÇÃO II

bas prestam-se muito á satyra e ao ge- Das sextilhas

nero humorístico e jocoso. Art. 490. Ao contrario das insulsas


Art. 488. Alguns poetas deixam de srxtinus, as sextilhas são dignas de to­
rimar o primeiro verso, rimando os do acatamento, juntamente com a qua-
quatro restantes alternadamente. di.i <• a oitava.
E x .: Ari. 491. A sextilha classica rima­
Bebeste para esquecer va mí o 2!', 4.0 e 6.° versos.
As magoas do coração;
I■ >■i a maneira adoptada por Gonçalves Dias
Mas elle é que não se esquece,
|fi> i Mi Mias “ iSextilhas de Frei Antão ” :
Elle é que não adormece,
Como adormece a rasão. Hum tempo foy o d’outr’ ora
Chiando 0 reyno era christão,
( J oão de D e u s ),
198 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas em E strophes 199

Quando nas guerras de mouros —■ Ex. da terceira: A A B C C B :


Era o rey nosso pendão,
Ilha de atroz degredos!
Quando as donas consumiam
Cinge um muro de rochedos
Seus teres em devoção. . .
Seus flancos. Grosso a espumar,
A rt. 492. Hoje as sextilhas rimam Contra a dura penedia,
á vontade, sendo, porém, as disposições Bate, arrebenta, assobia,
Retumba, estrondeia o mar.
mais recommendaveis as seguintes: ou
( R a ym u n d o C o rrêa ).
A B A B A B , ou dois a dois, ou A A B C C B .
Ainda se pode usar de vários outros modos,
Ex- da primeira maneira: como A BA C BC , A BC A BC , A BBA C C , etc.
Os olhos claros pelos céos perdidos
Ella os deixa, tristissimos, vogar. Art. 493. Adoptada uma disposi­
— Corsários, buscam sonhos foragidos ção de rimas, deve a uniformidade ser
Pelas ondas do céo — nuvens do mar.
observada em todo o poema.
Vem a noite, e os seus olhos doloridos
Regressam sem os sonhos encontrar.
C A P IT U LO V II
( B elm iro B r a g a ).
Das es tr oph es de sete ve rsos
— O poeta além dessa feliz disposição, ainda
usou outra coisa recommendavel: a alteriiação de
Art. 494. A s estrophes de sete ver-
rimas graves com agudas, em toda a linda poesia.
nos rimam geralmente assim : A B B A A
Ex. da segunda maneira: versos dois a dois: t ‘1 \ e são usadas mais frequentemente
Mnezarete, a divina, a pallida Phrynéa,
im\ villancetes.
Comparece ante a austera e rigida assembléa
Do Areopago supremo. A Grécia inteira admira Kx.:
Aquella formosura original, que inspira Voltando ao Tejo, opulentas,
E dá vida ao genial cinzel de Praxiteles, Com gemmas, oiros e pratas,
De Hyperides á voz e á palheta de Apelles. Eram presas p’los piratas,
( B il a c ). Quebradas pelas tormentas;
202 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Dos P oemas km E strophes 203
'}'
C A P IT U L O IX C A P IT U LO X

Das estr op h es de dez vers os : dé cim as De o u tr o s ty p o s de es tr oph es

A rt. 501. A s décimas classicas, Art. 503. Podem-se ainda fazer


hoje quasi em desuso eram septisylla- estrophes de nove, onze e doze versos,
bas e rimavam: A B B A A C C D D C . mas sem característico apreciável que
— Veja-se adiante Livro III, Tit- III, Cap. I. as distinga (art. 456).

A rt. 502. Hoje usam-se estrophes Art. 504. Algum as odes classicas
de dez versos, isometricos e heterome- eram feitas em estrophes de quatro
tricos, mas sem o minimo rigor de cons- versos sem rima, sendo os tres primei­
trucção das classicas. ros de dez syllabas e o ultimo de seis
ou de quatro.
— Exemplo de uma estrophe moderna composta
de dez versos: E x .:

Em certo dia, á hora, á hora Quem atrevido quer luctar com Pindaro,
Da meia noite que apavora, Fia-se em azas que. pegou com cera
Eu, cahindo de somno e exhausto de fadiga, A arte dedálea — e ha de ir dar seu nome
Ao pé de muita lauda antiga, Ao vitreo pego.
De uma velha doutrina, agora morta, ( G arrett
S — Trad.)-
J
Ia pensando, quando ouvi á porta
Do meu quarto um soar devagarinho, A rt. 505. O iambo, que pela sua
E disse estas palavras taes:
uniformidade póde ser collocado entre
“ E ’ alguém que me bate á porta de mansinho:
“ Ha de ser isso e nada mais os versos estrophicos e os versos soltos,
( M achado de A s s i s — Trad.). compunha-se de um verso longo e um
curto, alternado.
204 C onsolidação das L eis do V erso

— O iambico era usado commummente pelos


poetas mais antigos em odes e satyras imitadas dos
latinos e dos gregos, que frequentemente traduziam.
E x .:
Oh meu amparo, oh doce gloria minha,
Tu com quem me achei sempre LIVRO UI
Na desgraça, na magua e nos pezares Dos poemas de “ forma fixa”
Para me consolar;
Que me dás voz, suspiros, desaffôgo T IT U L O I
Quando a ventura é tanta
Que pesa nalma —■ e o coração é cheio Generalidades
A estalar se não fa lia !
(G a rrett ) .
Art. 506. Os poemas de forma fix a
são combinações, mais ou menos enge­
nhosas, de estrophes diversas, cujo uso
se perpetuou.
— Assim, por ex., o soneto é formado de duas
quadras e dois tercetos; 0 villancete: um terceto
que serve de motte e uma, duas ou mais estrophes
de sete ou oito versos.

Art. 507. Os poemas de forma fixa


prestam-se ás poesias leves e lyricas.
§ unico. Alguns prestam-se tam­
bém ao epigramma.
A rt. 508. Os grandes surtos, bem
como as grandes emoções, requerem
liberdade e simplicidade.
Dos P oemas de “ F orma F i x a ” 207
20Ó C onsolidação das L eis do V erso

—E ’ a bailada classica franceza fixada por


Art. 509. O poeta deve procurar François Villon no século X V e continuada por Clé-
que a inspiração encha os seus poemas, ment Marot 110 século X V I. Melhor regra é o
sob pena de se tornarem meros jogos seguinte exemplo:
de rimas, que, por mais elegantes que
Vi-te pequena: ias rezando
sejam, não se salvam. Para a primeira communhão:
Art. 510. Dos poemas de forma Toda de branco, murmurando,
Na fronte o véo, rosas na mão.
fix a os mais usados em portuguez são
Não ias só: grande era o bando...
os seguintes: Bailada, Pantum, Rondó, Mas entre todas te escolhi:
Rondei, Soneto, Terza-Rim a, Villance- Minh’alma foi-te acompanhando,
te, Triolet, Ouadrinha e Canto-Real. A vez primeira em que te vi.

Tão branca e moça! o olhar tão brando


T IT U L O II Tão innocente o coração!
Toda de branco, fulgurando,
Dos poemas mais usados Mulher em flo r ! flor em botão!
Inda, ao lembral-o, a magua abrando,
C A P IT U LO 1
Esqueço o mal que vem de ti,
Da B a ila d a E 0 meu rancor estrangulando,
Bemdigo o dia em que te vi I
A rt. 5 11 . A bailada caracteriza-se
pela repetição de um verso, de um con­ Rosas 11a mão, brancas... E, quando
ceito, ao fim de cada estrophe. Te vi passar, branca visão,
Vi com espanto, palpitando
A rt. 512. As bailadas mais usadas Dentro de mim, esta p aixão ...
actualmente, e as mais galantes, são O coração puz ao teu mando.. .
aquellas feitas em versos de oito sylla- E, porque escravo me rendi,
bas: tres oitavas e um quarteto com as Ando gemendo, aos gritos ando,
mesmas rimas. — Porque te amei! porque te vi!
208 C onsolidação das L e is do V erso Dos P oemas de “ F orma F ix a 209

Depois fugiste... E, inda te ainando, Ah ! si estiveras tu no meu lo gar!


Nem te odiei, nem te esqueci: Dorme! Das rimas a caudal bemdita
—- Toda de branco. . . ias rezando.. . Desta bocca febril se precipita
Maldito o dia em que te v i ! Num som dulcissimo e acalentador,..
( B i La c ) . A alma que eu trouxe antigamente afflicta,
Como tu, adormece, meu amor.
Art. 513. Usa-se fazer também a Dorme! Nem sabes como contrafeito
bailada em verso decassyllabo: tres dé­ Vejo-te os lábios sem os não b eija r...
cimas e uma cjuintilha. Com que desejo, mas com que respeito
— A disposição das rimas pode ser a da bai­ Contemplo a tua carnação sem p a r!
lada seguinte. O característico é o mesmo da ante­ Dorme! Como tu dorme o nenuphar
rior, apenas o torneio é mais amplo, se bem que não Da fria lympha na prateada fit a ...
seja mais encantador. Ganha em amplitude de ex­ Só de meu coração a surda grita
pressão o que diminue em delicadeza. Se escuta no silencio esmagador!
A lembrança das horas de desdita
E x .:
Como tu, adormece, meu amor.
Pela rosácea do vitral, desfeito
Em côres, entra o pallido luar! ofeertorio
Dorme! Entre as névoas do teu alvo leito
Rainha deste sêr, dorme e acredita
Vejo-te 0 seio brandamente a r fa r ...
Que aos brancos pés te deixo a alma precita
Dorme! Lá fóra dorme o velho mar.
Mixto de ciúmes, de extasis, de ard o r...
Na muda noite a abóbada infinita
Ai dorm e... a voz que estes cantares d ita.. .
Apenas véla, e, tremula, palpita.
Como t u ... adormece... meu am or...
Dorm e! Nos campos adormece a flor,
E a ave no ramo que o favonio agita, (G o ulart de A ndrade ).
Como tu, adormece, meu amor-
Art. 514. Desde que haja repetição
Em vão procuro ouvir, em vão espreito
ilf uni conceito e as mesmas rimas, te­
Si nesse innocentissimo sonhar
mí 1, bailada, mesmo que não obedeçam
O meu nome se escapa de seu peito,
E a minha imagem tentas abraçar.. . .1 disposição classica.
210 C onsolidação das Deis do V erso Dos P oemas de “ F orma F ix a ” 211

Art. 515. Podemos dar o nome de


bailada a qualquer composição em que
“ Tu vaes partir, Dom G il! Sus, cavalleiro ! o pensamento do poeta voeje em torno
“ Essa tristeza da tua alma espanca!
de uma idea só, mesmo que, ás vezes,
“ Deixa o penhor de um beijo derradeiro sáia fóra nalguma pequena divagação.
“ No retrato gentil de Dona B ran c a!’’
— Como se vê pelos dois artigos, 514 e 515 o
II conceito da bailada já não é o mesmo dos tempos
Mas tanto fel no longo beijo havia, passados. Poderiamos dizer que ha duas classes de
E tanta incomparável amargura, bailadas: uma — poema de forma fixa, que é a
bailada classica; outra — poema de forma variavel.
Que o solitário beijo aos poucos ia
Só por uma rasão de methodo, para não ter que
Roubando á téla a pallida figura.
fazer dois titulos para o poema, é que deixamos os
Cresce, recresce as linhas devastando, exemplos do art. 514 e o que se vae seguir, neste
Nodoa voraz pela figura entorna. lugar, quando deviam estar entre os poemas de
Dom Gil, onde se vae, que demorando forma variavel.
Não apparece, aos lares não retorna?!
Kx- de bailada de accordo com o conceito do
E o beijo avulta devorando a trama artigo 515:
Do quadro haurindo a pallida fig u ra ...
Batem leve, levemente
III Como quem' chama por m im ...
Será chuva? Será gente?
Tarde chega Dom Gil. De longe exclama
Gente não é certamente
—• Vou ver-te agora, ó santa creatura!
E a chuva não bate assim ...
Funda tristeza o rosto lhe annuvia;
K’ talvez a ventania;
Quem de Dom Gil esta tristeza espanca?
Mas ha pouco, ha poucochinho,
Havia um beijo — eis tudo quanto havia! Nem uma agulha boi ia
A téla estava inteiramente branca- Na quieta melancholia
( J oão R ireiro) Dos pinheiros do caminho...
212 C onsolidação das L eis do V erso
Dos P oemas de “ F orma F ix a ” 213

Quem bate assim levemente


Mas as creanças, Senhor,
Com tão extranha leveza
Porque lhes daes tanta dor ! ? ...
Que mal se ouve, mal se sente?...
Porque padecem assim ! ? ...
Não é chuva, nem é gente,
Nem é vento com certeza. F, uma infinita tristeza
Uma funda turbação
Fui ver. A neve caia Entra em mim, fica em mim presa.
Do azul cinzento do céo Cae neve na natureza...
Branca e leve, branca e fr ia ... —• E cae no meu coração.
—- Ha quanto tempo a não v ia ! ( A ugusto G il ).
E que saudade, Deus meu!

Olho-a atravez da vidraça,


A rt. 516. Pois rjue o verso que en­
Poz tudo da côr do linho. cerra o conceito de que f ai amos no art.
Passa gente e quando passa 5 1 r é necessário e repetido, e os outros,
Os passos imprime e traça em ultima analyse, clieville engenhosa,
Na brancura do caminho... deve o referido verso ser cheio e bello
Fico olhando esses siguaes para que a bailada tenha encanto.
Da pobre gente que avança
Claro é que nos referimos principalmente á
E noto, por entre os mais,
bailada classica. A outra tem mais liberdade, po­
Os traços miniaturaes
dendo o poeta buscar outros recursos de belleza
Duns pézitos de creança...
além deste.
E descalcinhos, doridos... Sendo a intenção dos commentarios elucidar os
A neve deixa inda vel-os .uligos e dar aos principiantes exemplos dignos de
Primeiro bem definidos, .... . não nos podemos furtar ao desejo de apre­
—• Depois em sulcos compridos, sentai a linda bailada do duello de Cyrano, na qual
Porque não podia erguel-os !. .. l.tmliein é de notar que a disposição de rimas differe
daquella (lo art. 512:
Que quem já é peccador
Je jette avec grace, mon feutre,
Soffra tormentos, emfim!
Je fais lentement 1’abandon
2 i4 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em as de “ F orma F i x a ” 215

Du grand manteau que me calfeutre, Art. 517. Concorrerão para a bel-


Et je tire mon espadon;
]eza da bailada, além da escolha do verso
Élégant comme Céladon,
Agille comme Scaramouche,
a repetir, a escolha das rimas, que de­
Je vous préviens, cher Mirmydon, vem ser cheias, sonoras.
Qu’à la fin de l’ envoi je touche! —• Além do exemplo anterior ( todo repleto
Vous ariez bien dú rester neutre; de rimas cheias: culrc, ouche, combinados com a
Oú vais-je vous larder, dindon?... aguda don também cheia), podemos dar este que
Dans le flane, sous votre maheutre ? ... preenche os requisitos tornando a bailada encan­
Au coeur, sous votre bleu cordon?... tadora :
— Les coquilles tintent, ding-don! Por noite velha, 110 Castello,
Ma pointe voltige: une mouche! Vasto solar dos meus avós,
Décidément.. . c’est au bedon, Foi que eu ouvi, num ritornello
Qu'à la fin de l’ envoi, je touche. Do pagem loiro a doce voz.
Corri á ogiva para vel-o:
II me manque une rime en eu tre...
Vous rompez, plus blanc qu’amidon? Vitraes de par em par abri,
C’est pour me fournir le mot pleutre! E ao ver brilhar o meu cabello,
Elle sorriu-me, e eu lhe sorri.
— Tac! je pare le pointe dont
Vous espériez me faire don; — Venceu-me logo um vivo anhelo
J ’ ouvre la ligne, — je la bouche... Queimou-me logo um fogo atroz;
Tiens bien ta broche, Laridon! E toda a longa noite vélo.
A la fin de l’envoi, je touche. Pensando em vel-o e ouvil-o a sós.
ENVOI Triste, sentado no escabello,
Só com a aurora adormecí...
Prince, demande à Dieu pardon!
Sonho, e no sonho, haveis de crel-o?
Je cart du pied, j 'escaramouche,
Ilida o meu pagem me so rri!
Je coupe, je feinte...
H é ! là donc .Seguindo a amal-o com desvelo,
A la fin de 1’envoi, je touche! Por noite velha, um anuo após,
( E d. R osTa n d ). Termina emfim o meu flagello,
2i6 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de “ F orma F ix a 217

Felizes fomos ambos n ó s... E x .:


Como isto foi, nem sei dizel-o! Sobre as ondas oscilla o batei docemente...
No collo seu desfalleci... Sopra o vento a gemer. Treme enfunada a véla.
E alta manhã no seu morzello, Na agua mansa do mar passam tremulamente
O pagem fo g e ... E inda sorri. Áureos traços de luz brilhando esparsos nella.
Dias depois, do pagem bello,
Lá desponta o luar. Tu, palpitante e bella,
Junto ao solar onde eu o ouvi,
Canta! Chega-te a m im ! Dá-me essa bocca ardente!
Ao golpe horrível do cutello
Sobre as ondas oscilla o batei docemente...
Rola a cabeça — e inda sorri!
Sopra o vento a gemer. Treme enfunada a véla.
( F ilin t o de A l m e id a ).

— Prolongamos propositalmente o numero de Vagas azues, parae ! Curvo céo transparente,


exemplos da bailada, para que o principiante tivesse Nuvens de prata, ouvi! —• Ouça na altura a estrella
modelos dignos de imitação. Ella é uma das especies Ouça de baixo o oceano, ouça o luar albente:
mais deliciosas, porém quando obedece ás regras Ella canta! — e, embalado ao som do canto delia,
estabelecidas: rimas cheias e sonoras, verso forte. Sobre as ondas oscilla o batei docemente.
Sahindo fóra disso é simplesmente uma insulsa ( B il a c ).
repetição de rimas.
Art. 519. A s rimas cheias e sono­
C A P IT U L O H ras. o verso cantante, bem rythmado
Do Rondei e do Rond ó
concorrerão para a belleza do rondei.
SECÇÃO 1
— A elle se podem applicar os dispositivos dos
Do Rondei
arts- 516 e 517.
A rt. 518. O Rondei é feito de duas
quadras e uma quintilha, sendo que os Art. 520. Presta-se 0 Rondei aos
dois primeiros versos da primeira serão nmceitos galantes e madrigalescos, ás
os dois últimos da segunda e o ultimo gentilezas amorosas, aos sentimentos
verso do poema a repetição do primeiro. 1lelicados.
218 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de “ F orma F ix a ” 219

Art. 521. Os metros usados geral- Logrei tu’alma enamorada,


Longes dos males e da dor,
mente são o septisyllabo e o octisyllabo,
Das intemperies segregada.. .
sem exclusão dos outros.
Alli te quero, ó doce amada,
— O exemplo que demos acima, como se vê, é
Tendo a embalar-te o meu amor,
feito em alexandrinos. O Rondei referido é além
Toda num sonho... e repousada
de tudo pela belleza da descripção, pela amplidão
do quadro, urna admiravel marinha, no sentido pi- Na rêde de o u ro ...
cturaí, e pela sonoridade uma barcarolla encan­
Emquanto a lyra apaixonada
tadora. Da mesma poesia tratamos no Livro V,
Vou eu tangendo em teu louvor,
para o qual chamamos a attenção.
Para trazer-te enfeitiçada,
Longe dos males e da dor,
SECÇÃO II
Pelos meus versos embalada
Do Rondó (fr a n c e z ) Na rêde de ouro . ..
A rt. 522. Forma-se 0 Rondó de
— Ha além deste o Rondó dobrado, constituído
uma cjuintilha, um terceto e outra quin-
por seis quadras de duas rimas e só depois do ultimo
tilha, repetindo a locução inicial ao fim verso repetindo a locução inicial. “ A Flor Mara­
das duas ultimas estrophes. vilhosa", de Homero Prates, na “ Torre Encantada” ,
é um bello exemplo.
Art. 523. Não sendo a repetição
tão ampla como no poema anterior, o S EC Ç Ã O II I
poeta, além de ter mais liberdade, póde
Do Rondó (portuguez)
pôr nelle mais idéas, o que concorrerá
para tornar mais agradavel o poema. Art. 524. H a em portuguez outra
E x .: classe de rondós, formados de uma qua­
Na rêde de ouro alcandorada, dra que se repete entre as oitavas que
Do sonho meu, em que depôr constituem o poema.
Dos P oemas de “ F orma F ixa 221
220 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO

prestando-se aos vôos mais arrojados,


Art. 525. Applica-se á quadra que
pois 0 numero de oitavas pode variar á
serve de ritornello o dispositivo do
vontade.
art. 516.
§ unico. Caracteriza-se essa quadra Art. 528. O verso usado é com-
pela repetição da rima de cada verso mummente o septisyllabo.
no meio do verso seguinte. E x .:
E x .: O prazer, a singeleza,
Louco amante e sem ventura A belleza que em ti via,
De ternura suspirando, Num só dia ingrata sorte!
Vou buscando entre estas flores Tudo a morte me roubou.
Os amores que perdi.
Esculpido na memória
Art. 526. A oitava dos Rondós Amo, ó Glaura, o teu semblante;
tem também a sua maneira caracterís­ Nelie vejo a cada instante
Essa gloria que passou.
tica de rimar, melhor explicada no
Volve 0 rio as puras aguas,
exemplo seguinte. Vae correndo e não descança;
E x .: Assim foi minha esperança,
Quando os risos e os amores E só maguas me deixou.
Apparecem nos teus olhos
O prazer, a singeleza,
Até d’asperos abrolhos
A belleza que em ti via,
Vejo flores rebentar.
Num só dia, ingrata sorte!
Mas se deixas este prado,
Tudo a morte me roubou.
A i de mim ! cruéis pesares !
Sinto escuro o céo e os ares Neste bosque, em verde leito,
E enlutado o bosque e o mar. Que já foi por ti ditoso,
Leio o nome teu saudoso,
Art. 527. Esta classe de rondós Que em meu peito o amor gravou.
tem mais amplitude que a anterior,
222 C onsolidação das L eis dc V erso Dos P oemas dr “ F orma F ix a ” 223

Este monte, que já viste O prazer, a singeleza,


Pelas graças habitado, A belleza que em ti via,
Dellas hoje desprezado, Num só dia, ingrata sorte!
Feio e triste se tornou. Tudo a morte me roubou.
(M. I. da S. A lvarenga).
O prazer, a singeleza,
A belleza que em ti via,
C A P IT U L O I II
Num só dia, ingrata sorte!
Tudo a morte me roubou. Do V i l l a n c e t e

Glaura chamo sem conforto, Art. 529. O Villancete é uma es-


E só écho me responde: pecie de rondo, porém onde ha mais
Glaura busco e não sei onde, liberdade de movimentos.
Nem se morto ou vivo estou.
Assim triste passarinho Art. 530. Presta-se como o rondó
A consorte em vão procura, e o rondei ás cantigas amorosas e é de
Que farpada setta dura um sabor cheio de encanto.
Do seu ninho arrebatou-
Art. 5 31. Os Yillancetes a que o
O prazer, a singeleza, poeta consegue emprestar um cunho
A belleza que em ti via,
quinhentista são de uma belleza rara.
Num só dia, ingrata sorte!
Tudo a morte me roubou. Art. 532. O Villancete é composto
Voraz tempo não consome,
de um “ mote” geralmente de tres ver­
Nem abranda meus pezares, sos, seguido de uma ou mais estrophes
Nem eu deixo estes lugares que glosam aquelle e que tomam o nome
Que o teu nome eternizou. clássico de “ voltas” .
Entre os concavos rochedos
Chorarei enternecido,
A rt. 533. A s voltas podem ser de
Onde amor compadecido cinco, seis, sete e oito versos, geralmente
Meus segredos sepultou. septisyllabos.
2 2 4 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO
Dos P oemas de “ F orma F ix a 225

E x .:
Art. 534. Os versos do “ mote” po­
Embora, Senhora, andeis
De finas telas vestida, dem ser repetidos: um em cada estro-
Por meus olhos sois despida. phe, um só em todas, ou com variante
VOI/TAS que conserve a mesma palavra da rima,
De clara hollanda vestis ao fim de cada estrophe.
Vosso corpo, linda Infanta, E x .:
Bello rocal de rubis
Quando as naus iam á índia,
Véla-mc a vossa garganta;
Trazeis manto de velludo, Se eram cem as que abalavam,
Garbosa saia comprida, Vinte apenas regressavam. . .
Mas, apezar disso tudo,
Por meus olhos sois despida. VOETAS
Voltando ao Tejo, opulentas,
Atravez das ricas vestes Com gemmas, oiros e pratas,
Que vos vestem, linda Infanta, Eram presas p’los piratas,
Adivinho os dons celestes
Quebradas pelas tormentas;
Do vosso corpo de santa;
E ao fim de luctas cruentas,
Vossas vestes de setim,
De brocado ou lã garrida, Se eram cem as que abalavam
De vidro são para m im : Vinte apenas regressavam.
Por meus olhos sois despida. Com fé na vossa clemencia,
Mandei-vos naus de esperanças,
Vejo-vos só mãos e cara
Senhora de loiras tranças,
Mas não preciso ver mais
Para calcular a rara Martyrio desta existência;
Graça do que me occultaes. . . E no caes da paciência
Para quê rendas e folhos, Os meus dias suspiravam
Senhora da minha vida, Mas as naus não regressavam ...
Se por estes tristes olhos,
Por meus olhos sois despida. No mar das vossas friezas
Todas se viram quebradas,
( E u g ê n io de C astro ).
Pobres naus! mais desgraçadas
226 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de “ F orma F ix a 227

Que as velhas naus portuguezas; Nunca ninguém desespere


Que destas se em más emprezas Kmquanto lhe a vida dura;
Muitas vezes se encontravam, Na memória se tempere,
Inda algumas regressavam ... Que o mal que então 0 fére
(E ugênio de Castro). Por tempo pode ter cura;
Finja algum contentamento,
Art. 535- Muito concorre para a Desmaio de si sacuda,
belleza do poema a terminação das Porque tam presto se muda
“ voltas” numa maxima, um conceito A fortuna como o vento.
moral, que feche o poema com “ chave Das "T ro va s de Crisfal” -
de ouro” . ITopositalmente puzemos um exemplo qui-
iilirntisla. Ha nas voltas uns tres versos um pouco
—■ Sobre o conceito da “ chave de ouro ” —
fmnvos pela falta de elisão de uma ou outra vogal.
veja-se o soneto.
Çogilr se entretanto que no tempo de Bernardim
E x .: Miiti ■> faziam as elisões como agora e perdóe-se
Esta só rasão me ajuda " pequenino defeito para apreciar a belleza do poe­
Para ter gran soffrimento: ma \ compensação é grande.
Saber certo que se muda
A fortuna como 0 vento.
C A P IT U LO IV

VOLTAS Do T r i o l e t

Tenho já certo, sabido Ari. 536. O Triolet é uma oitava


— Nisto não ha differença — di- um torneio original, com duas únicas
Que o homem bem soffrido
rliu.i , lendo como característica a re­
Nunca pode ser vencido,
Nem ha coisa que não vença.
pelirão dos dois primeiros versos.
Quem do mal quer vencimento, único. A repetição se faz da se-
Com paciência se escuda, m i u i l r form a: o primeiro verso repete-
Porque tam presto se muda ■■ u.1 «piaria linha e os dois primeiros
A fortuna como 0 vento. Iin. 1li.--.1111 a estrophe.
1 >os P oemas de “ F orma F ix a 229
228 C onsolidação das L e is do V erso
Dize, Silvestre de Lima,
E x .: Donde este cheiro, Silvestre?...
Saltem os c lo w n s empoados Ai, que perfume de lima!
Batendo os guizos da rima. Ai, que perfume silvestre!
Gwinplaines sarapintados, Art. 539. O Triolet tem qualquer
Saltem os c lo w n s empoados!
coisa de garoto e presta-se pela repeti­
Metros desarticulados
ção, que é como um grypho, e pela le­
Pelo exercício da esgrima,
Saltem os c lo w n s empoados
veza, que é como uma setta, ao genero
Batendo os guizos da rima. cpigrammatico, do qual se torna um
(F ontoura X avier ). auxiliar terrível.
Os seguintes — “ A um orador e jornalista
Art. 537. A repetição dos versos pequenitate! ” —• podem servir de exemplo:
é que empresta o chiste ao pequeno Quando fala, na “ Tribuna”,
poema. Da asneira rebenta os diques.. .
Parece mosca importuna
Art. 538. A difficuldade, o esforço Quando fala, na “ Tribuna” .
são compensados pelo maravilhoso ef fei­ Não ha mosquito que zuna
Nem pinique qual piniques...
to obtido, na accentuação da idéa ini­
Quando fala, na “ Tribuna ”
cial, cuja graça resalta pela repetição. Da asneira rebenta os diques.
— São celebres os triolets de Fontoura Xavier, Quando fala é um periquito
mestre nessa especie de poemas. O seguinte, ao Pequenino e palrador.
poeta Silvestre de Lima é um modelo de chiste Se a zunir elle é mosquito,
e de leveza: Quando fala é um periquito.
Nos discursos é perito
Ai, que perfume de lim a! Qual realejo massador.
Ai que perfume silvestre ! .. . Quando fala é um periquito
Até me provoca a rima, Pequenino e palrador.
Ai, que perfume de lim a !...
230 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de “ F orma F ix a 231

Pequeno, pedante e pulha, Tons plus nobles que des filous,


Palrador, parlapatão, Ce sont les cadets de Gascogne
Mil parvoices engrulha, De Carbon de Castel-Jaloux:
Pequeno pedante e pulha !
Quer ser rouxinol que arrulha CEil d’aigle, jambe de cigogne,
Mas é papagaio anão... Moustache de chat, dents de loups,
Pequeno, pedante e pulha, Fendant la canaille qui grogne,
Palrador, parlapatão! üiil d’ aigle, jambe de cigogne,
II vont — coiffés d’un vieux vigogne,
Art. 540. O Triolet pode ser usado Dont la plume cache les trous! —:
isoladamente ou em grupo, formando CEil d’aigle, jambe de cigogne,
como que as estrophes de um poema. Moustache de chat, dents de loups !

— Estão neste caso alguns de Fontoura Xavier, Perce-Bcdaine et Casse-Trogne


como “ Falam as flores ” e “ Rosita ” , o primeiro Sont leurs sobriquets les plus doux;
contendo seis e o segundo cinco estrophes. De gloire, leur âme est ivrogne !
Perce-Bedaine et Casse-Trogne,
Art. 54 t. Os metros geralmente Dans tous les endroits oú l’on cogne
usados são o septisyllabo e também o lis se donnent des rendez-vous. . .
octisyllabo. Perce-Bedaine et Casse-Trogne
Sont leurs sobriquets les plus doux 1
— Com a mesma intenção expressa em nota
ao art. 516, transcrevemos abaixo os formosos trio- Voici les cadets de Gascogne
lets da apresentação dos cadetes da Gasconha, no Qui font cocus tous les jaloux!
segundo acto do “ Cyrano ” de Rostand: O fcmme, adorable carogne,
Ce sont les cadets de Gascogne Voici les cadets de Gascogne!
De Carbon de Castel-Jaloux; Que le vieil époux se renfrogne:
Bretteurs et menteurs sans vergogne, Sonnez, clairons! Chantez, coucous !
Ce sont les cadets de Gascogne! Voici les cadets de Gascogne
Parlant blason, lambei, bastogne, Qui font cocus tous les jaloux!
232 COXSOLIDAÇÃO DAS LfilS DO VERSO Dos P oemas de “ F orma F ixa 233

III
Art. 542. A s rimas escolhidas
cheias, o verso sonoro, concorrerão iiü- Hoje, porém, me excrucia
A longa estação do inverno...
mensamente para a belleza do trioleu
E ’s de o u t r o . . . e adoras o eterno
—Sirvam de exemplo os de Rostand, que acima Nevoeiro que os céos cobria...
transcrevemos. Hoje, porém, me excrucia
— Os seguintes B io lc t s de Wenceslau de Quei­ A longa estação do inverno! . . .
roz são uma modalidade do poema que acabámos
C A P IT U L O V
de estudar.
Da Q u a d r i n h a
Ha nelles o mesmo chiste dos triolets e a
elles se pode applicar o que dissemos nos arts. 537, Art. 543. A Quadrinha portugueza
538 e outros: como “ poema de forma fix a ” , tem a
sua base na estrophe homonima (artigo
4 8 1).
Disseste-me, flor, um dia,
Que não gostavas do inverno: Art. 544. Caracterizam a Quadri­
— Era frio e que um eterno nha, como “ poema” , a harmonia e deli­
Nevoeiro os céos encobria — cadeza do conceito casadas com a deli­
Disseste-me, flor, um dia, cadeza da estrophe, pequena como uma
Que não gostavas do inverno. joia.
E x .:
II Marias da minha aldeia,
E eu sempre te respondia: Todas vós sabeis urdir
— Bella estação que é o inverno! De um certo linho uma teia
Mas, num gesto meigo e terno, Onde todos vão cahir.
( A ugusto G il ).
Replicavas: —• Como é fria !
E eu sempre te respondia: Art. 545. Sem exagero podemos
— Bella estação que é 0 inverno! comparar a feitura da Quadrinha por-
234 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em as de F orma F i x a ” 235

tugueza com a feitura lógica do soneto o que é bastante a assegurar-lhe exis­


(art. 549). tência eterna.
Art. 546. N a Quadrinha como no E x s .:
Soneto (art. 550), prepara-se o effeito Eu bem sei qual é a tinta
Que dás ás faces mimosas:
pela narração nos dois primeiros versos,
E ’ o carmim com que pinta
No céo ha uma janellinha, Deus nosso Senhor ás rosas.
Vê-se Portugal por ella : ( J oão de D e u s )-
seguindo naturalmente para o desfecho **
Maria da P ied ad e!...
pela elevação do assumpto no terceiro,
Que nome te foram pôr. . .
Quando Deus se sente triste Tu cjue não tens piedade
e tirando a conclusão no quarto, com De mim que te tenho amor !
um conceito elevado (A ffonso L opes V ieira ).
* *
Vae sentar-se a essa jan ella...
Soldado que vaes á guerra,
que é como a “ chave de ouro” da Qua­ Põe os olhos 11a Bandeira;
drinha. — Como Deus está na Hóstia,
— Outro exemplo: Nella está a Patria in teira...
Mar, eu bem comprehendo a tua (A. Corrêa d’ Ouveira ).
Magua, que em ondas estalla:
Toda a noite olhas a lu a ... C A P IT U LO VI

E não logras alcaçal-a! Do Soneto

( M arcello G a m a ) . Art. 548. Dos poemas de forma


A rt. 547. C0111 esta feitura lógica, fix a é o Soneto o mais usado em todas
é a Quadrinha portugueza um dos “ poe­ as linguas e o que mais se presta a todos
mas de forma fix a ” mais característi­ os generos litterarios, desde o épico até
cos e de mais encantadora delicadeza, ao humorístico.
236 C onsolidação das L e is do V erso
Dos P oemas de “ E orma F ix a ” 237

A rt. 549. O Soneto para ser bello


deve obedecer á regra tradicional: do Art. 550. Obedecendo aquella re­
parallelismo das ditas rimas dos quar­ gra, que é lógica, consegue o poeta pre­
tetos, dos dois tercetos bem destacados parar: — nos dois quartetos o effeito,
e do conceito no ultimo verso, fechando pela narração, prolongada em oito ver­
o poema. sos;— no primeiro terceto, a elevação
do assumpto, que, seguindo a marcha
E x .:
natural, é como um resumo, para o des­
V i queixosos de Amor mil namorados
fecho que vem no segundo terceto, que
E nenhuns inda vi com seus louvores;
E aquelle que mais chora o mal de amores,
deve encerrar com um conceito forte e
Vejo menos fugir de seus cuidados. justo: “ chave de ouro” .
— Veja-se o excellente exemplo que nos for­
Se das dores de Amor sois maltratados nece este profundo soneto que em tudo obedece á
Porque tanto buscaes de Amor as dores? regra seguida pelos mestres:
E se também as tendes por favores, Meu ser evaporei 11a lida insana
Porque dellas fallaes como aggravados? Do tropel das paixões, que me arrastava;
Não queiraes alegria achar alguma Ah ! cego eu cria, a h ! mísero eu pensava
No Amor, porque é composto de tristeza, Em mim quasi immortal a essencia humana.
Na fortuna que acheis mais agradavel. De que innumeros sóes a mente ufana
Existência fallaz me não dourava 1
Nella e nelle achei sempre a mesma lua, Mas eis succumbe a natureza escrava
Em quem nunca se viu outra firmeza, Ao mal que a vida em sua origem damna.
Que não seja a de ser sempre mudavel.
Prazeres, socios meus e meus tyrannos,
(C a m õ e s ,) . Esta alma, que sedenta em si não coube,
•—■ Note-se a rima de alguma com lua. Hoje No abysmo vos sumiu dos desenganos.
aquellas duas palavras não rimam, porém, ao tempo D eus! ó Deus ! quando a morte a luz me roube,
de Camões a pronuncia era aly~ta e lua : rimas per­ Ganhe um momento o que perderam annos,
feitas. Saiba morrer o que viver não soube!
( B ocage) .
238 C onsolidação das L e is do A^ERso Dos P oemas de “ F orma F ix a 239

Piro mas salvo ... Prostro e desbarato,


Art. 551. A s rimas alternadas, de Mas consolo... Subverto mas resgato...
accordo com o art. 479> devem ser evi­ I'. sendo a Morte, sou a liberdade” .
tadas no soneto pela mesma rasão de (A nthero de Q uentae).
que satisfazem plenamente a emoção, e
Propositalmente demos como exemplos so-
os quartetos são destinados sempre a
uel 1 de Camões, Bocage e Anthero que marcam
preparar o effeito para o desfecho. as trcs phases do desenvolvimento do soneto por-
—■ Só obedecendo á regra classica que damos tugucz.
no art. 550 pode o soneto merecer o conceito de No Brasil os mestres do Soneto são: Ray-
Boileau: imindo Corrêa, Bilac, Alberto, Luiz Edmundo, Gui­
“ Un sonnet sans défaut vant seul un long poème-” . no i .m-, Passos, Zeferino Brasil, Victor Silva sem
Art. 552. No soneto a disposição 1 •qiieccr Annibal Theophilo que cultivou o soneto
ininoneano com raro talento. Entre nós alliás sem-
das rimas deve ser aquella genialmente pir leve o soneto e continua a ter ardentes e talen-
achada pelos creadores desta especie de l|i’’Os cultores, destacando-se ultimamente: Humberto
poema, e que ajudam a prolongar o de Campos, no Rio, Cassiano Ricardo, em S. Paulo,
Itineu Trajano, em P. Alegre, além de outros.
preparo do effeito pela insegurança.
E x .: Art. 553. Excepcionalmente po­
Na tua mão sombrio cavalleiro, dem as rimas ser dispostas de outro
Cavalleiro vestido de armas pretas,
Brilha uma espada feita de cometas,
modo, desde que se não perturbe o pre­
Que rasga a escuridão como um luzeiro- paro do effeito a que se destinam os
Caminhas no teu curso aventureiro,
ifii.i rletos.
Todo envolto na noite que projectas... \ unico. Neste caso deve o requi-
Só o gladio de luz com fulvas betas
Emerge do sinistro nevoeiro.
ho do art. 5 5 1 j cJue se transgrediu, ser
•Upprido com “ encadeamentos” , ou com
— “ Se esta espada que empunho é coruscante,
(Responde o negro cavalleiro-andante) p"ii!nação que auxilie a preparação do
E ’ porque esta é a espada da Verdade. 1 l leito.
D os P oemas de “ F orma F ixa 241
240 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO

— Sirva de exemplo este bello soneto de Luiz \rl. 555. A concordância do senti­
Edmundo, que além disso é também .excellente do com a estrophe não deve ser retar­
amostra de soneto em alexandrinos: dada, a não ser no verso final, em que
o sentido sáe fóra da ultima estrophe
Olhos tristes, vós sois como dois sóes num poente,
Cangados de luzir, cangados de girar,
para ir acabar no verso separado que
Olhos de quem andou na vida alegremente ci mclue o poema.
Para depois soffrer, para depois chorar. Art. 556. O que se diz do verso fi­
Andam nelles agora a vagar lentamente,
nal do Soneto .(art. 550, fim ), igual-
Como as velas das náus sobre as aguas do mar, inciite se pode applicar ao do Terceto.
Todas as illusões do vosso sonho ardente. K x .:

Olhos tristes, vós sois dois monges a rezar. I 's do Tinguy, porém, vingo a montanha!
His de seu alto, abaixo o olhar agora
Ouço ao vos ver assim, tão cheios de humildade, <'irnitnvagando á perspectiva estranha,
Marinheiros cantando a canção da saudade Vejo ora campos e lavouras, ora
Num côro de tristeza e de infinitos ais. I »i 1.1. faixas azues: a da lagôa
I- .1 do mar grosso a rebentar lá fóra.
Olhos tristes eu sei vossa historia sombria
I' pondo o animal que infrenc vòa,
E sei quanto chorais cheios de nostalgia,
I‘ 1 ando a ourela do despenhadeiro,
O sonho que passou e que não torna mais. 1 liule caudal torrente o espaço atrôa.
Km breve atraz me fica e sobranceiro
C A P IT U L O V II V cOracla o monte. Já pela campina
Da Te rza-R im a
Sorvo ás canemas e alecrins o cheiro.
I ' já dr minha terra esta collina,
A rt. 554. Tem a Terza-Rim a, ou Ter­ Aqucllc capão de arvores defronte,
ceira, a sua base na estrophe do mesmo Aqucllr rio e ponte que o domina.
nome e a ella se applica o que da refe­ I ‘ ddla esta cantiga ao pé da fonte,
Iu onde vòa saudosa e vae na toada
rida estrophe se disse no respectivo ca­
M.iMtiar os échos do sopé do monte.
pitulo (arts. 473 a 477).
242 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de “ F orma F i x a ” 243

Sinto-a nesta bafagem perfumada


Art. 560 P ara conservar o encan-
Bebida aos austos, em continuo anceio...
Um passo ainda e ó terra antiga e amada, lamcnlo proprio deve a idéa ir num
Meu verde Palmital, eis-me em teu seio !
1 1 eseendo.
(A lberto de Oliveira ). Km qualquer metro pode ser vasado o Pan-
lum Assim é, que o “ Pantum” de Bilac é feito em
verso dccasyllabo, o que transcrevemos abaixo, “ Se-
C A P IT U L O V III ■ •'ti.il.i 110 R io ” é feito em redondilha e os francezes
o ti',.un geralmente em verso octisyllabo.
Do P antu m
F,x.:
A rt. 557. O Pantum é um poema I)esce a corrente do rio,
em quadras encadeadas pela repetição 0 barco sem remadores.
Que secreto murmurio
de versos, dois a dois.
1 )a ribanceira entre as flores 1
§ unico. A repetição se faz deste
0 barco sem remadores
modo: o 2 0 e o 4.0 versos de cada estro- Oscilla á tôa, fluctua,
phe formarão o i.° e o 3.0 da estrophe 1 )a ribanceira entre as flores
seguinte, finalizando o poema com o Aos frios raios da lua.
mesmo verso que o iniciou. Oscilla á tôa, flu ctu a...
Que figura inteiriçada,
A rt. 558. A repetição de dois ver­ Aos frios raios da lua
Vao nesse caixão deitada!
sos arrancados de uma estrophe para
constituírem metade da estrophe seguin­ Que figura inteiriçada !
Vêde-lhe os olhos sem vida!
te faz com que duas ideas marchem pa-
Viu1 nesse caixão deitada
rallelas, enchendo o poema. Toda de branco vestida.

Art. 559. O Pantum tem, pela ori­ Wde-lhe os olhos sem vida!
Que visão! que fórma estranha!
ginalidade da repetição, um sabor exqui- Toda de branco vestida,
sito que agrada e enleva. I'.' um marmor que a lua banha.
244 C onsolidação d as L e is do V erso
I >o s P o e m a s de “ F o r m a F ix a 245

Que visão! que fórma estranha!


Que neve esmaiada aquella!
T IT U L O I I I
E ’ um marmor que a lua banha...
Soluça alguém j unto delia:
I)(>s poemas menos usados
(Que neve esmaiada aquella!)
— Minha pallida neblina, C A P IT U LO I
(Soluça alguém junto delia) Da O itava e da D é c im a
Dorme que a noite é divina!
Ari. 561. Muito em voga entre os
Minha pallida neblina, Atendes e os Clássicos, çahiram ambos
A morte ao seio te estreita;
Dorme que a noite é divina,
I les poemas quasi em desuso actual-
E em breve estarás desfeita. II lente.
A morte, ao seio te estreita, A rl. 562. Ambos têm a sua ori-
Tua essencia se evapora; !', i t i i nas respectivas estrophes (arts.
Em breve estarás desfeita,
Como as neblinas da aurora.
l'i<> n 5 °2 ), e ambos prestavam-se ge-
i.dmcnte ao genero epigrammatico.
Tua essencia se evapora...
Exemplo de Oitava-rima:
Cala-se a voz de repente.
Como as neblinas da aurora Podes ter com Narciso egual ventura,
Roxêa o clarão do oriente! Mas na causa haverá desegualdade:
Clle morreu de ver sua figura,
. Cala-se a v o z ... De repente Morrerás vendo a tua na verdade.
Surge o dia esplendoroso; Kllr de amor de sua formosura,
Roxêa o clarão . do oriente l'u de medo de tua fealdade...
O barco silencioso. E outra gran differença em ti veremos:
Surge o dia esplendoroso... Por ollc se chorou, por ti riremos.
—• Como um phantasma sombrio, (C a m i n h a ).
O barco silencioso
Desce a corrente do rio. A i í . 563. Para que a Décima apre-
■<111c inteireza e se não possa dividir
( A lberto de O l iv e ir a ) .
1 m iliminte em quintilhas (de que, em
246 CONSOLIDAÇÃO DAS I,ÉIS DO VERSO I )os P o em a s de “ F orma F i x a 247

ultima analyse se origina) deve ter o tui.i t i o poema, é preferível deixar cantar livre-
iii- 111 • .1 emoção, porque é também o meio de fazer
sentido suspenso no quarto verso. iiiiil.it, dr fazer vibrar de accordo com o nosso o
A rt. 564. Mais do que a Oitava .iii-ii.in tlr quem nos lê. Jamais se deve esquecer
.. 11111 dissemos no art. 9 da Introducção. Tendo
presta-se a Décima ao genero epigram- -i.pullii por norma é que a poesia será eterna.
matico e não deve por isso desapparecer.
Exemplo de Décima:
Art. 566. Dentre os poemas cahi-
Ao Parnaso quer subir dti'. em desuso procuraram alguns poe-
Novo rival de Camões: 1.1 restaurar o Canto-Real, a Sextina,
E das loucas pretenções ,1 Yillanella.
As musas se põem a rir.
Apollo sem se affligir, Somente em homenagem aos poetas que tên­
D esfarte diz ao casmurro; is 1.nu instaurar essas especies de poemas é que lhes
— “ Póde entrar que o não empurro; ttli......is espaço nestas columnas.
Não me vem causar abalo;
Já cá sustento um cavallo,
Art. 567. O Canto-Real é uma es-
Sustentarei mais um burro ” . perie de Bailada mais ampla do que
(Contra o Padre José A. de Macedo). .iquella de que tratamos nos arts. 5 1 1
C A P IT U L O 11 d 5 13-
Dos o u tr o s poemas ca h id o s em desuso () Canto-Real consta de cinco estrophes de
u n ir e uma estrophe menor (offertorio), re-
v i 1 m is
A rt. 565. Muitos poemas de forma Itlmii, synthese, conclusão do poema.
fix a desappareceram por serem jogos C.ttla cstrphe é formada pela união de uma
•|t1.1111.1 dr rimas crusadas, uma parelha e uma quin-
de palavras mais ou menos engenhosas
tilh ii, 1 nino se vê no exemplo seguinte:
que não compensavam pela belleza 0 es­
Kigida, heril, soberba, numa altura
forço despendido. I narccssivel quasi, ergue o frontal
— Diriamos melhor “ pela emoção” , pois ás I \i ra o azulado céo, sua moldura
vezes o poema não deixa de ser bello relativa­ I 111 ira, para o resplendor austral,
mente, mas não desperta a emoção. E se esta fra­ \ cidadella em mármore rosado!
camente corresponde ao esforço dispendido na fei- Sinistramente fulgem pelo eirado
248 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em a s de “ F orma F i x a 249

De esguia e branca torre <fe marfim Me vens contar, silenciosa,


As almenaras, sobre as quaes, por fim, Todas as noites, ao luar,
Fluctua, ovante, num deslumbramento, Nos meus jardins côr de rosa?
Longo, escuro, luzente e de setim, De que estrella ou nebulosa
O augusto pavilhão largado ao vento! Desceste, para chorar,
O’ Sombra linda e radiosa!

Goulart de Andrade é um dos poucos poetas Sobre esta Vida enganosa,


brasileiros que cultivam o Canto-Real, alliás com O teu divino pezar,
muita felicidade. Homero Prates que é dos nossos Nos meus jardins côr de rosa?
poetas um dos que com mais carinho e talento culti­ Quando cantas, mysteriosa,
vam os poemas de forma fixa em geral, possue tam­ Vejo azas branças a vòar,
bém bellos Cantos-Reaes, destacando-se o “ Canto- O’ Sombra linda e radiosa!
Real da T o rre” , cujo estribilho é formado pelo
— Em busca da luz preciosa
seguinte verso:
Do teu celeste pomar —
“ Quando nos meus jardins de sonho a noite desce. Nos meus jardins côr de ro sa ...
Que anciedade deliciosa
Art. 568. A Villanella é escripta Me vem, então, de galgar,
em tercetos sob duas rimas unicamente, O’ Sombra linda e radiosa!
repetindo o primeiro e 0 terceiro versos A bella Torre saudosa,
do r.° terceto, ao fim de cada terceto do Onde vives a cantar
()' Sombra linda e radiosa!
poema, alternadamente e repetindo jun­
Nos meus jardins côr de ro sa ...
tos ao fim do poema numa quadra. ( H omero P r a t e s ).
E x .:
C A P IT U LO II I
O’ Sombra linda e radiosa Dos poemas c u j a f o r m a se pode f i x a r
Que escuto, em sonhos, cantar
Nos meus jardins côr de rosa! \rt. 569. A liberdade é como sem-
r fecunda e jamais deve ser sacrifi-
Que historia maravilhosa
De um castello á beira mar, ida cm torneios que tolham a imagi-
O’ Sombra linda e radiosa! i<.ii» r o estro.
250 C onsolidação das Lí is do V erso

Art. 570. Sem embargo do artigo


anterior, pode a disciplina a que o poeta
acostumar a expressão do seu sentir,
leval-o a crear um ou outro arranjo que
elle cultive e fixe.
LIVRO IV
Art. 571. Seguindo a norma do ar­
tigo precedente creou Stecchetti um Dos poemas de forma variavel
poema formado de unia quadra e duas
parelhas que é de um bello effeito. T IT U L O I
E x .: IDos poemas em geral
Un organetto suona per la via,
I,a mia finestra è aperta e vien la sera \ r(. 572. Antigamente era uso cha-
Sale dai campi alia stanzuccia mia
Un alito gentil di primavera.
iu.it se poema só ás epopéas, que alliás
ii=t' 1 são mais de que uma série concate-
Non so perchè mi tremino i ginocchi,
Non so perchè mi salga il pianto agli occhi. Unda de episodios mais ou menos he-
11 liei >s.
Ecco, io chino la testa in sulla mano,
E penso a te che sei cosi lontano. A rl. 573. Em seu verdadeiro sen-
( L orenzo S t ec c h e t t i ) .
ii'l", poema é toda a composição poética
ipi r vntando um caracter de unidade,
líiii.i obra completa, quer como senti-
lut nio quer como narração. (V . nota ao
‘•ft 337)-
A rl. 574. O que caracteriza 0 poe-
m 1 não c a extensão, mas sim o surto
I)os P oemas de F orma V ariavel 253
252 C onsolidação das L e is do V erso

Ari. 578. A maior liberdade de fei-


completo e solido, isto é, a harmonia do
1111.1 faz com que se exiga mais dos poe-
assumpto com essa mesma extensão.
111.is que não têm forma fixa.
—■ Assim em sentido moderno, de accordo com
a opinião que esposamos, tanto é poema a “ Morte Art. 579. Alguns poemas de forma
de T ap yr” , de Bilac, como uma quadrinha de Cor­
rêa de Oliveira. v.uiavel não têm classificação rigorosa
rulrc os enumerados nos capitulos se­
Art. 575. Em ultima analyse não guintes.
ha poemas longos, mas successão ali­
nhavada de poemas curtos (episodios). Art. 580. P ara que um poema pre­
encha o seu papel de creador de emoção
— Bem andam alguns modernos, em fazer em
seus poemas longos (successão de episodios meno­
< preciso que vá num “ crescendo” de
res), a união dos vários poemas breves de que se lirlle/a physica (fórm a) e moral (ins-
forma a obra, em prosa, para não cançar. Ex. “ Sa- piraçáo).
gram or” , já citado em outra nota.
Claro é que “ moral" aqui foi empregado
Art. 576. A superioridade dos poe­ U" Mfiilido simplesmente de “ opposto a material” ,
sipmliraudo a belleza de fundo.
mas de forma fix a está na segurança;
a dos de forma variavel, na surpreza. Ari. 581. Ue conformidade com o
Art. 577. Ainda outro superiori­ ütliqn antecedente deve o. poeta equili-
dade dos de forma variavel sobre os de th.11 pensamento e fórma, de tal arte,
forma fixa, está em que ha entre elles, qii'■ .1 ultima estrophe seja uma conclu­
nos de forma variavel, mais liberdade. iu c como que uma “ chave de ouro” do
poema, sob pena de ser sacrificada a
unico. Além disto o equilibrio da
1 moção.
surpreza e da segurança pode ser con­
seguido pelos meios indicados 11a Parte b,’ a lição de Edgard Põe, a que em notas
(tulrt i< 1 c s já alludimos.
Geral desta obra.
254 C O N S O L ID A Ç Ã O D A S L E IS DO V E R SO Dos P o iím a s d e F o r m a V a r ia v e e 2 5 5

A rt. 582. Por ser de forma variá­ Art. 585. H oje servem ambos para
vel não é que 0 poema deve deixar de 1 .miar tudo aquillo que desperta enthu-
obedecer á regra lógica que torna as •i.isnio.
obras d’arte superiores em belleza, pela Art. 586. Caracterizam-se pela
justa proporção, como acontece, por > ■■.1 Ilação c pelo cunho subjectivo e emo-
exemplo, ao soneto. cional.
Art. 583. O poema deve ter narra­
A ri. 587. Actualmente ha esta dif-
ção mais ou menos prolongada; eleva­
D 1 cuca : a Ode não se destina ao canto,
ção do assumpto, na proporção 3:5 do
........... 11 sua origem, ao passo que o Hy-
poema, e conclusão obedecendo ao dis­
u i n o c m geral é feito para ser cantado.
posto no art. 581.
—Esta proporção encontra-se, como dissemos, no SECÇÃO II
soneto que tem a sua elevação no i.° terceto obe­
Do H y m n o
decendo á regra.
E ’ a lição concretizada por João Ribeiro num Art. 588. O Hymno ainda hoje usa-
dos capítulos das suas “ Paginas de Esthetica” .
do nus casos atraz referidos (arts. 584
T IT U L O II • L T ), c proprio para excitar os senti-
imniir, elevados, corno o patriotismo,
Dos poemas mais em uso p"i exemplo.
C A P IT U L O 1
Do Hymno e da Ode
Art. 589. Neste caso convem-lhe o
S EC Ç Ã O 1
1"a 1 elevado e um desdobramento rá­
Gen era lid ad es
pido e vibrante.
Art. 584. Ambos estes poemas eram A rI1. 590. O íestribilho, que lhe é
antigamente destinados a celebrar fa ­ p* •tiliar, deve ser como uma synthese
çanhas de heróes. do seiiiimento que lhe serve de assum-
256 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de F orma V ariavel 257

pto e separa as estrophes que por sua Recebe o affecto que se encerra
Em nosso peito juvenil,
vez elevem ir num crescendo de exal­ Querido symbolo da terra,
tação. Da amada terra do B rasil!
Sobre a immensa nação brasileira,
A rt. 591. A s estrophes do Hvmno Nos momentos de festa ou de dôr,
devem ser regulares, podendo o estri- Paira sempre, sagrada bandeira,
bilho ser feito em metro differente. Pavilhão da justiça e do amor!
Recebe o affecto que se encerra
E x .: H ym no á B a n d eir a n a c io n a l
Em nosso peito juvenil,
Salve, lindo pendão da esperança! Querido symbolo da terra,
Salve, symbolo augusto da paz! Da amada terra do B rasil!
Tua nobre presença á lembrança ( B il a c ) .
A grandeza da Patria nos traz. S EC Ç Ã O II I

Recebe 0 affecto que se encerra Da Ode


Em nosso peito juvenil, \rl. 592. A Ode caracteriza-se pela
Querido symbolo da terra,
Da amada terra do B ra sil! Mídi-ucia, a viveza, o impeto da expres-
í Rij ,
Em teu seio formoso retratas
Este céo de puríssimo azul, Art. 593. Natural é que o impeto,
A verdura sem par destas mattas, 1 iirdcncia do enthusiasmo conduzam a
E o esplendor do Cruzeiro do S u l...
"•Ir .ipmveitando o que ha de bello e
Recebe o affecto que se encerra • I••111 m■nt e na própria desordem com que
Em nosso peito juvenil,
Querido symbolo da terra, ii" . assaltam os surtos da inspiração.
Da amada terra do B ra sil! 1'oilfau muito bem 0 comprehendeu quando
ir •= •11 - .< da Ode que
Contemplando o teu vulto sagrado,
Comprehendemos o nosso dever: ' .... s 1y 1<- impetueux souvent marche au hasard” ;
E o Brasil, por seus filhos amado, ( IJUD
Poderoso e feliz lia-de s e r ! 1 In * r l l r , un bcaux désordre est un effet de l’a rt” .
258 CONSOI.IDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO I >os P oemas dé F orma V ariavel '59

Art. 594. Duas classes de Odes Solu c o leão de granito esvoaçando ;


( 1 er.lio da floresta e o peregrino
ainda se usam :— a heróica, que canta Une indagador visita estes logares
assumpto grandioso, philosophico ou " M .ilcrloo 1. . . W a te r lo o !...” dizendo, passam.
moral;— a anacreontica, que se destina Aqui morreram de Marengo os bravos!
aos assumptos lyricos, amorosos ou de­ I iitri tanto esse heroe de mil batalhas,
ijiir o destino dos reis nas mãos continha;
licados.
I • heróe que com a ponta do seu gladio
Da Ode h e ró ic a ou p in d a rjc a No mappa das nações traçava as raias,
Art. 595. Destina-se a ode pinda- l.nti' o s seus marechaes ordens dictava.
0 hálito inflammado do seu peito
rica a cantar feitos de algum heróe, po­ Snffmnva as phalanges inimigas
dendo ser em versos rimados ou soltos ! 1 coragem nas suas accendia.
(brancos). ' in 1 aqui estava 0 Genio das victorias,
E x .: N apoi.Eão em , W a TErcoo.
Medindo o campo com seus olhos de aguia!
ii infernal retintim do embate de armas,
Eis aqui o logar onde eclipsou-se 1 O; trovões dos canhões que ribombavam,
O Meteoro fatal ás regias frontes! 1 1 iiliilo das balas que gemiam,
E nessa hora em que a gloria se obumbrava,
(I honor, a confusão, gritos, suspiros.
Além o sol em trevas se envolvia! I Fiim como uma orchestra a seus ouvidos!
Rubro estava o horizonte e a terra rubra!
Dons astros ao ocaso caminhavam; Nml.i o turbava! Abóbadas de balas,
Tocado ao seu zenith haviam ambos; Ib Io inimigo aos centos disparadas,
Ambos eguaes no brilho, ambos na queda. \ -.1 n- pés se curvavam respeitosas,
Tão grandes como em horas de triumpho! Qtlfte* submissos leões, e, nem ousando
I ii! o ao seu giuete os pês lambiam.
Waterloo ! . . . Waterloo !.. . Lição sublime 1 Mi 1 pmnue não venceu? Eacil lhe fôra!
Este nome revela á Humanidade! I oi 'I• ilino ou traição? A aguia sublime
Um oceano de pó. de fogo e fumo. tine (Irv.i -iHva o céo com o vôo altivo
Aqui varreu o exercito invencível, I '• s■ l< us margens do Sena até ao Nilo,
Como. a explosão outr’ ora do vesuvio \ c 1o111.1.mdo as nações com as largas azas,
Até seus tectos inniuidou Ponrpéa. l’ooinr , nivelou aqui com os homens?
O pastor que apascenta o seu rebanho; * ib 1 poique não venceu? O anjo da gloria
O corvo que sanguíneo pasto busca, | l llvinuii da victoria ouviu tres vezes;
2Ó2 C onsolidação d as L e is do V erso Dos I' cem a s de F o rm a V a r ia v e e 263

Elle vê esses reis, que levantara Da Ode philosophica


Da linha de seus bravos, o trahirem. \ 1 1. 596. A ode, com a mesma alta
Ao longe mil pigmeus rivaes divisa,
Que mutilam sua obra gigantesca, <•11•\ acao de vistas, pode cantar algum
Como do Macedonio outr’ora o império ,i ui 11 pi<> philosophico, moral ou social.
Entre si repartiram vis escravos ! . . .
I'udem servir de exemplo dessa classe de
Então um riso de ira e de despeito "'I' .1■ 11 n 11.1s 11nc Anthero de Quental enfeixou sob
Ehe salpica o semblante de piedade. m liliilu dr “ Odes Modernas” . Tomamos uma ao
O grito ainda innocente de seu filho íli i! m1
Soa em seu coração, e de seus olhos ET CAEEUM ET V IR T U S
A lagrima primeira se desliza.
In ui prophetas, que esse céo perscrutam,
E de tantas coroas que juntára
ütir, .1 noites, entre as trevas condensadas,
Para dotar seu filho, só lhe resta
(4 . 11 111 vislo brilhar igueas espadas,
Esse nome que o mundo inteiro sabe !
1 (inui 11'.11 ij 1n, hostis que entre si luctam ...
A h ! tudo elle perdeu! a esposa, o filho,
A patria, o mundo, os seus fieis soldados! I ■11 ' 111 que, na orla do infinito,
Mas firme era sua alma como o marmor; Uniu ir, astros, se vê errar sem tino
Onde o raio batia e recuava! I 10 «-ipectro que traz fulgor divino,
1 "mó o vulto dum deus triste e proscripto...
Jamais, iamais mortal subiu tão alto!
Elle foi o primeiro sobre a t e r r a !... hnlii o', v'»rs passa o espectro gemebundo,
Só elle brilha sobranceiro a tudo, M in imp .11 iiI•■ m o r r a m o s ! aos sóes vivos,
Como sobre a columna de Vendôme I impiina o brilho aos astros primitivos
Sua estatua de bronze ao cêo se eleva; 1 ■' ui Io111 a o alento moribundo...
Acima delle... D e u s!... Deus tão somente! 1 lltiU pa ou fez-se silencio e escuro.
Da liberdade foi o mensageiro. BÍi ii mn 111■ 1 .epulchral varre os espaços,
Sua espada, cometa dos tyrannos, I ui 10 l i, ontre os celestes estilhaços,
Foi o sol que guiou a Humanidade, I .........ii antiga e os germens do futuro!
Nós um bem lhe devemos, que gozamos; 1 11 .i.n. i antiga! ó velho firmamento!
E a geração futura agradecida: Ipltio a', iilinas vacillam e baqueiam!
Napoleão —• dirá cheia de assombro. | a» lio i.la . pleiadas volteiam,
(V isconde; de A raguaya ). ■ pitai) a pm-ira que levanta o vento!
264 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em a s de F orma V a r ia v EL 265

Mas quando o largo céo da crença avita Da Ode anacreontica


Desaba com fragor, e espanto, e treva,
E a luz, a paz, a fé, tudo nos leva \rt. 597. Com 0 mesmo ardor, po-
Nas ruinas da abóbada infinita; 1 <i)i, cantando coisas amorosas, os pra-
Quando um sopro fatal nos deuses vivos -n <-■., ;i alegria, creou Anacreonte a
Toca e em cinzas desfaz seus frios vultos, ntlr que de si toma 0 nome.
E se ergue aquella voz cheia de insultos
Que brada aos deuses pallidos: “ Sumi-vos! I jc, :
A LYRA
Homens de pouca fé! não tenhaes susto:
Fecunda é essa treva e essa ru ina... De gosto cantara Atridas,
Palpita nesse pó vida divina... K a Cadmo erguera louvor;
Rebentam fontes do areai adusto... Porém as cordas da lyra
Só sabem dizer amor.
Sim, podeis crêr, ó gente pouco calma:
Não se aluiu no abismo este universo, Ha pouco, mudando-a toda,
Se entre as cinzas de Deus e o pó disperso Novas cordas lhe assentava,
Ficou de pé, heróica e firme, uma alm a! K de Alcides os trabalhos
A cantar principiava;
Quem bem souber olhar verà no fundo
Dessa alma forte outro infinito erguer-se... Mas contra as minhas tenções,
Em espaços ideaes verá mover-se Km vez de marciaes furores,
Um Deus sem nome, ignoto ao velho mundo I )r teimosa e como a acinte,
Sempre vae soando a m o re s...
Verá, do interno chãos, constellada,
Adeus, heróes! adeus, gloria!
Surgir creação nova e palpitante,
Adeus, guerreiro furor!
Ao sopro ardente, á voz clara e vibrante
As cordas da minha lyra
Do espirito de vida que alli b rad a...
Só sabem dizer amor.
Verá, por um céo novo, novos sóes ( A nacreonte, trad. de Garrett).
Que em novo firmamento o vôo desprendem;
E astros de luz estranha que se accendem Ari. 598. A ode heróica attinge ao
Na consciência estrellada dos heróes!
f)|»ii 11; .1 anacreontica approxima-se das
( A nth ero de Quental)
■ uiq V s , das Aras, dos rondós.
266 C onsolidação d as L íis do V iírso Dos P oS m a s dS F o rm a V ariavrt , 267

Outro e x .: CAPITUL-0 II
—■ Brando leito de verdura, Do C â n tic o , da C anção e da L y r a
Cinda alcatifa de flores, SEC Ç Ã O I
Formoso verger, plantado
G en e ra lid a d e s
Pelas graças e os amores,
\ri. 5 q<). O Cântico, a Canção, e
Recebe estas frescas aguas
Que te deve um grato amante, 1 I v n assemelham-se pela delicadeza
C’rôa-te de nova hervinha, 1jiH* 1 is deve revestir quando o assumpto
Viceja, lugar fragrante ! c n .iiiio r.

Quando lá no ethereo cume Ari, Doo. Canções, Cânticos e Ly-


Raios o sol dardejar,
Almos, benignos favonios rn s como acontece aos Hymnos, pres-
Te venham desaffrontar. 1 nu <■ ás expressões subjectivas e são
As debruçadas alfenas, r ■ 1 .diiicnte destinados ao canto.
Presas num confuso enleio,
Miudo pranto da aurora
SECÇÃO 11
Distillem sobre seu seio. Do Cântico

Dobra-te ao suave peso Ai l. 601. Em sua origem o Canti-


Da minha Armia engraçada, ■ i cia destinado como 0 Psalmo a lou­
Dobra-te, relva mimosa,
var a divindade.
De boninas matizada.
C l. 602. Hoje é um Hynino amo-
Mas depois ergue-te á pressa,
Que se os brincos amorosos ii‘ 11 ( in ipte transparece um sentimento
Amarrotada indicares, ■!1 adoração, de culto por 11111 ente que-
Não faltarão invejosos. riilu, levado á altura da divindade.
( B o ca gí ).
1 iuno bem accentúam Bilac e Guimarães, não
su Imm11 definir precisamente o Cântico. Pode-se
M i I í t I m ii I o i l a r esse nome a toda a especie de can-
— <ui n11‘ ‘ transpareça uma paixão vibrante. Estão
268 C onsolidação das L ê is do V erso I )us P o em a s de F orma V ariavel 269

neste caso algumas de João de Deus. Dellas extra- Que as azas providentes
himos uma, ao acaso: l)o anjo tutelar
D abriguem sempre á sua sombra pura!
—■ Vi o teu rosto lindo,
\ 111 imi hasta-me só esta ventura
Esse rosto sem par;
I )c ver que me consentes
Contemplei-o de longe mudo e quedo,
Olhar de lon ge... olhar!
Como quem volta de áspero degredo
E vê ao ar subindo ( J oão de D eu s )-
O fumo do seu la r !
V i esse olhar tocante, SECÇÃO II I
De um fluido sem egual
Da Canção
Suave como a lampada sagrada,
Bemvindo como a luz da madrugada \ 1 1 (103. A Canção, bem como a
Que rompe ao navegante
Depois do temporal! 1 11 h; i mel a, é nma composição breve, que
Vi esse corpo de ave, ti pir Ia essencialmente ao canto.
Que parece que vae As Modinhas brasileiras, os Fados portu-
Levado como o sol ou como a lua
í.-.i- 1 5 silo canções em que por vezes se reflecte a
Sem encontrar belleza egual á sua;
«liim (lu püYO.
Magestoso e suave,
Que surprehende e attrae!
Attrae, e não me atrevo
\ 11. (104. A Canção deve encerrar
A contemplal-o bem; m11 sentimento vibrante, onde transpa-
Porque espalha teu rosto uma luz santa, ■ i ■ ,1 ;uuor, paixão, ou mesmo odio e vin-
Uma luz que me prende e que me encanta
Naquelle santo enlevo
í ; im.i. mas onde se sinta que pulsa a
De um filho em sua m ãe! 1I111.1 do poeta.
Tremo, apenas presinto JÍU, 1
A tua apparição;
E se me approximasse mais, bastava tui canto amores,
A 11 sol e ao luar,
Pôr os olhos nos teus, ajoelhava!
Não é amor que eu sinto, I 11 1 mito amores.
— E ’ uma adoração ! Mu-, não posso amar.
270 C onsolidação d as L e is do V erso I) i P oe ma s de F orma V a r ia v e l 271

Canto amores ao som da flauta e do pandeiro, lip fd qm é elevar a alma do povo que nellas acha
hH U ') ■ ..Hi do seu sentir. F o i o que se deu com a
Mas já não posso a m a r ...
O meu amor era marinheiro !H , popular "C anção do soldado” , que assim
E morreu no m a r !
>mui çii!
“ Nós somos da patria a guarda,
Tranças còr d’amora, tranças côr do linho,
Fiéis soldados
Estou cheio de dores,
Por ella amados.
Estou entrevadinho,
Nus cores da nossa farda
Já não posso a m a r ...
Rebrilha a gloria,
Mas canto amores
Pulge a victoria.
A o sol e ao lu a r ...
Tranças côr d’amora, tranças côr do linho, I',m nosso valòr se encerra
Ouando me ouvis cantar sob as ramagens, Toda a esperança
Sou qual piloto entrevadinho Que um povo alcança.
Descrevendo as suas viagens. No peito em que ella impera
Rebrilha a gloria,
Eu canto amores, Fulge a victoria.
Ao sol e ao luar,
Eu canto amores Estribilho:
Mas não posso amar. \ paz queremos com fervor,
Todas as flores são murchas, \ guerra só nos causa d o r!
F, mortas todas as e stre lla s... Porém como a patria amada
Sou como um doido, lindas D onzellas! Foi agora ultrajada,
Que se enfeitasse com rosas m u rch as... Luctaremos com valor.
(E ugênio de C astro).
Como é sublime
A rt. 605. A Canção comporta to­ Saber amar,
Com a alma adorar
dos os assumptos e todos os enthusias- \ terra onde se n asce;
mos e, como os Hymnos, pode ser amo­ Am or febril
rosa, guerreira, patriótica. Pelo B r a s i l . . . ” etc.

— Quando as canções patrióticas ou guerreiras


\ m (>06 Além das especies referi-
conseguem interpretar 0 sentir de um certo mo­
mento histórico, attingeni desde logo o seu fim prin- H........ai I. anterior, pode a canção ain-
272 C onsolidação d as L e is do V erso D o s P o em as de F orma V a r ia v e l 273

— Am or com amor se paga —


da ser humorística ou satyrica e bac- Eternas contas do a m o r!
chica. Quer-se pouco a quem nos paga,
—• E ’ neste caso a canção um dos mais podero­ Quer-se muito ao d eved o r...
sos auxiliares da satyra propriamente dita. * *
Sobre a ultima, V . o Cap. que trata do Dithy-
— Am or com amor se paga —■
rambo.
O’ meu amor, não me leves
Da C a n tig a Muito a mal, mas já é tempo
De pagar o que me deves !
Art. 607. A Cantiga é uma peque­
na canção em quadrinhas, quintilhas, * *

oitavas, décimas, geralmente septisyl- A cantiga é para a gente,


— São para a gente as cantigas —
labas. Como um modo de falar
— São mestres na Cantiga a maioria dos poe­ P ’los olhos das raparigas 1
tas portuguezes: João de Deus, Corrêa de Oliveira.
A cantiga é a maneira,
Luiz Coelho, um dos mais novos, já attingiu
De chorar o que se sente,
no genero a culminância:
Escondendo o sentimento,
— A Cantiga é como a sombra, Enganando toda a gente 1
Que para a tarde é m aior. . .
* *
— Canta cêdo que mais longe,
Terás cantiga p eo r! — Quem porfia mata caça —
Porém na caça do amor,
A cantiga é como o céo,
Se elle sabe que porfias,
Em tamanho e m aravilh a!
Ai de ti, ó caçador.
—: Só encontro a tua graça
P ara encher a redondilha... * *
A cantiga é a maneira, ■ Ninguém sabe a sua sorte —
— Quando sorrindo se canta — Olha a agua da corren te...
De cantar-se pelos olhos, Senhora minha, anda vêl-a 1
E chorar pela g a rg a n ta ... - L á vae a sorte da g e n te ...
* * (L u iz C oelho ).
C onsolidação das L eis do V erso li<>, P o em as de F o rm a V ariavel
27 4 275

SECÇÃO IV
Vmde, M arilia bella,
Da L y ra I 11 chegas ao fim do dia;
'•< .dguem passa e te saúda,
Art. 608 A L v ra é uma canção era
Urni que seja cortezia,
que se repete de ordinário um esti ibi- ,;i acronde 11a face a cor:
lho ao fim de cada estrophe. Que effeitos são os que sinto?
>'i,in effeitos de amor?
Art. 609. A s L y ra s ás vezes appro-
ximam-se do Idyllio pelo bucolismo, ás Mi rslim, M arilia, comtigo,
Niin leulio um leve cuidado;
vezes do Cântico pela elevação e subje- N1 111 me lembra se são horas
ctivismo; ás vezes da Ode pelo impeto I l levar á fonte o gado.
e pelo grandioso e sempre da Cançao Hr vivo de ti distante,
pela vivacidade e pela harmonia. minuto, ao breve instante
I 1111:1 um dia o meu desgosto:
E x .: litnmis, pastora te vejo
__ Não sei, M arilia, que tenho, Une em leu semblante composto
Depois que vi o teu ro sto , N to veja graça m aior:
Poi quanto não é M arilia Une effeitos são os que sinto?
Já não posso ver com gosto. Seiãu effeitos de amor?
N outra edade me alegrava,
A té quando conversava V111 li' já com o juizo,
Com o mais rude vaqueiro; Marilia, lão perturbado,
H oje, ó bella, me aborrece Qltr im mesmo aberto sulco
Inda o trata lisongeiro Mi ll" de novo o arado.
Do mais discreto pastor: S■1111 im centeio pego,
— Que effeitos são os que sinto? Nmilia parte em vão o sego:
Serão effeitos de amor? ■1 .ileuem commigo conversa,
Saio da minha cabana 1 )tl
mi" respondo, ou respondo
Sem reparar no que faço; Nmiti.i eousa tão diversa,
Busco o sitio aonde moras, Um nexo não tem menor:
Suspendo de fronte o passo. Une effeitos são os que sinto?
Fito os olhos na janella, 1 .i" effeitos de am or?
276 C onsolidação das L eis do V erso P oemas de F orma V ariavee 277

Se geme o bufo agoureiro, ipidi mesmas das ideas de alguns poe-


Só M arilia me desvela,
iii que os usam.
Enche-se o peito de magua,
E não sei a causa d elia! ambos poemas do genero pastoril em
M al durmo, M arilia, sonho In illuit íim Theocrito, V irgilio, Bernardim, Ca-
Que fero leão medonho *"• * *. htiilrigiies Lobo. Muitas lyras de Gonzaga,
Te devora nos meus braços: híílibis 1‘iimlós dc Alvarenga e, modernamente, dada
Gela-se o sangue nas veias, 11 natm.il evolução do genero, que já não tem as
E solto do somno os laços f é .,," ,,1 antigas, muitas das poesias do nosso gran-
A ’ força da immensa dor. ' l l " i | o dc Oliveira podem ser nelle classifi-
— A h ! que os effeitos que sinto, Í8fÍNt
Só são effeitos de amor !
( T h o m a z G onzaga — D irccu).
'1 ! li 13. H oje pode-se classificar
rum- ,1 ■ Eglogas todo o poema em que
C A P IT U L O II I íl ■ lebre o prazer simples e o encanto
Da E g lo g a e do Id y IIio d 1 '"l,i bucólica, sem as exigências do
. l í iliign, sem o gosto arcadico, que quasi
A rt. 610. Eram as Eglogas antiga­
u ivim esta classe de poemas.
mente longas peças, dialogadas ou não,
e destinadas a celebrar a belleza e a Art (>14. Quando feitas obedecen-
felicidade da vida campestre. tl" ü índole tradicional do poema, um
m" de ingenuidade e candura deve del-
Art. 6 n . O abuso, a insistência em
I" • 11 ui ,parecer.
ferir sempre a mesma corda e a imitação
1 l seguinte poema de Eugênio de Castro é
por poetas medíocres desacreditaram mu "1 ll.i exemplo de E glo ga:
esta especie de poemas. i Iu )m t, .1 loira como os girasóes,
A rt. 612. A insipidez e monotonia Mííio, u h puberdade,
\ A ai 11 ulira, fiando os cândidos lençóes
de algumas Eglogas e Idyllios não estão • • I"- lia de amortalhar a çua virgindade.
nos poemas em si, que comportam to­ Sict • ' u i 1, d o i r a d a c o m o 0 d i a ,
dos os metros, mas na monotonia e in- i“ '••• 1 lá dos seus cabellos bellos,
278 C onsolidação das L eis do V erso
I *<>■• 1’ oEm a s de F o rm a V a r ia v e l 279

Que a gente fica sem saber o que ella fia, N*‘ l( iBars, sê sempre ingênua e p u ra ...
Se o loiro linho, se os seus cabellos. ■ pH|>ui muKimM quem colhe b e ijo s ...”
Vendo-me, Ignez, a côr de neve,
Ita loiin It-iiiiv. o labial rubim
Sua delgada roca e seu fuso abandona,
I iiii -ii si n|mla de lunar palor,
E corre ao meu encontro alegre e leve,
■ | m Ih Hlste que se abriu assim:
Toda em sorrisos de belladona.
I Jit nfti 1 nu- tens amor! O que é o a m o r!”
— “ Marcos, foi Deus
Que aqui te trouxe; fuiMi i li.. ,1 mãos magrinhas, desmaiadas,
Deserta estou p’los beijos teus, r u im . liii.., convalescentes,
P ’los doces beijos dessa bocca doce... TtÍst*i-' ......... Kainhas doentes
Destes limoeiros sob os verdes arcos, [h.|iii.|.. 1 molas pelas estradas...
Andava a scismar, fiando IIlialiiT o que é o am or?”
Os lençóes onde dormiremos, quando :A>dlll falei
Formos casadinhos, meu amado Marcos. | s«it ouvido... Chorava o vento sobre n ó s...
Vens cançado, vens? chega aqui, descança... I t -.'li tltmi voz que era uma sombra de voz
Queres merendar? vem ao teu amor:
Ign. . no disse :
Aqui tens o mel desta loira trança
E o queijinho fresco deste seio em flo r ... "'.M íftos, não s e i . . . ”
Senta-te comigo nesta verde gruta, \ .ai ensinar-te o que é o amor. V a m o s!”
Dize-me o que queres, o que mais desejas... Partimos,
Não queres mel nem queijo? gostas mais de fructa?
! ittll's andando pela tarde terna,
Aqui tens meus lábios, aqui tens cerejas. ‘‘ i|in ' ltegamo s a uma cisterna
Que lindas cerejas, que brincos divinos | h , a i i i l h . n l , 1 di. verdes limos.
Para uma Princeza, inda a mais cimeira!
!m, <) sol poente
Que os teus lábios, doidos, travessos meninos,
plm llili iiu endio no mar alto,
Venham colhel-os na cerejeira... i||l alio ui.o, em sobresalto,
Mas não me beijas? Que te fiz eu? Estás mal co-
^Mftsaliii 1111 . febrilmente,
[migo ?
I Éltilrn 1 i a11 seus mantos de cambraia
Não me respondes? —■ Fazes-me louca...
Já não és meu amigo,
(iullftlll |nili| .occorro á praia.
Já aborreces a minha b o c c a ...” " lym ? ingênua que te perdes
lli.s .! não vês uma estrellinha pura
•—■ “ Ignez, mimo de graça e de frescura, H l i i t i 110 escuro da cisterna escura,
Põe um açaimo nos teus desejos... Mito iiiinui esp'rança nuns olhos v e r d e s ? ...”
28o C onsolidação d as L e is do V erso P o em a s de F orma V a r ia v e l 281

— “ Bem a vejo, Marcos, bem a vejo a arder( n 1 1.l. ii.i .ui Sol que do alto céo flammeja
Chamejando, ruiva, entre aguas de gelo; 5 I ilrsiT lento pelas serranias...
Quem m’a déra ter 11 : " l é 11111 fauno que entrelaça e beija
Para o meu cabello !!! H((f h . v.iineiile as arvores esguias.
— “ Pois bem! E ’ tua a estrella prateada, P i'L louro, pelo ar, espanejante,
Vae apanhal-a, se a appeteces tanto... ' nt turbilhão fantástico de abelhas
—■ “ Zombas comigo, meu encanto, Um ■ (b mteadoramente paira deante
Se eu a fosse apanhar, morrería a fo g a d a ...” I ii 11 >11 illns e pétalas vermelhas.
— “ Disseste bem, Ignez, ingênua cabecinha, \ 1'11 p.it.i o trabalho! Ouve-se o côro
Cuja innocencia me consterna... l''i l.ui adores e das raparigas...
Que tu saibas, porém, que o amor é uma estrelünha ! ' i*-1111ii. ao Sol, como um tapete de ouro,
A arder numa cisterna; ' ■ ,d" lleira fulva das espigas.
Não a queiras colher, sejam puros teus dias, 1'• íiiiiiM 1.1 I No teu aspecto amigo,
Sejam sempre puras tuas lindas faces, ' i11■ niaiile c triste muitas vezes,
Não a queiras colher, que, onde julgasses 1jualido chegas pelo ar trazes comtigo,
A fortuna encontrar, a morte encontrarias. tíiiliu a c calma para os camponezes.
Levanta os olhos ás Constellações, Ilfts o k pios fortes e desejos...
Lava no luar as mãos, I . o iiimii' ó seiva, é força, é mocidade.
Enfeita com jasmins as tuas am b ições...” A iiii .i anda a clamar jpelos teus beijos
E beijámo’nos como dois irm ãos... HUi •fu» sementes de fecundidade.
( E ugênio de Castro). (O lEgario M ariano).
A rt. 615. A maior simplicidade
C A P IT U L O IV
deve presidir á feitura de ambos os poe­
Do R om ance
mas, para auxiliar a suggestão da vida
simples que elles celebram. u i U16. O Romance ou rimance
— O Idyllio pode ser exemplificado com a se­ | 11111-1 n imposição poética que se asse-
guinte poesia: ■ §)iüi um lauto á bailada, tendo, porém,
Terra florida. Estação nova. Tanta iiiai amplitude que esta.
Vida em redor! Ser folha quem me dera!
Cada arbusto que vejo é uma garganta, 'u 1 U17. Caracteriza-se o Roman-
Um grito de volúpia á primavera! i I" ia implicidade da expressão com
CONSOI.TDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO 1 1' oRm a s de F orma V a r ia v e l 283
282

Um havia dez noites (mui bem se lembrava)


que o poeta discorre sobre um assum- Uni’ havia dez noites que sempre chorava.
pto terno e tocante, com que desenvolve
1‘ U m . dos seus olhos que a agua arrasava,
uma narração que deve ser singela. I dos seus olhos que o pranto quebrava.
Art. 618. E sta singeleza e um quê 1* d’agua, já quasi cegava,
l ui i t r s

de monotonia, proposital, na expressão, U«t havia dez noites que sempre chorava!
darão ao romance um certo ar de nar­ ' " alrnriii passando ia pela estrada,
Ouvindo lacs vozes logo se quedava.
rativa popular que é a própria alma
desta composição. In negro vestia, de vagar andava,
1 ohí doces olhos scismava, scismava.
E x .: ' i" dn postigo da casa parava,
— Era noite escura, de ha muito fechada, P i ih-ii 11' 1 ;i dentro para quem gritava:
Nem fonte gemia, nem gallo cantava.
Uni muito socêgo (por tudo jurava)
Que noite tão triste, quem por ella andava PfV» M n a s penas, a seus males dava.
Ia depressinha, p’ ra traz não olhava.
■ lie funKr com elle, logo descançava,
Nem o sete-estrello pelo céo brilhava,
li i|iu fico sotnno, não mais accordava... ”
Nem estrellas d’oiro, nem lua de prata.
i*i 1 inini.iiii de dentro quem é que falava,
Ai que noite escura, não se via nada,
MMlwdi ni de fóra que a Morte alli estava.
Nem fonte gemia, nem gallo cantava-
M senhora Morte, já vos esperava,
Mas dentro da casa onde alguém morava
me enmvosco, vamos de longada
Ouviam-se vozes, levava-as o ar.
Eram vozes tristes de quem se matava, | ft Mmle l o d o , todo se abraçava,
Em dores vivia, em penas lidava. /Vi i(Ut- rico sonino!” e já não chorava...

— “ Que havia dez noites ( a voz suspirava) I H -d ii.enera, já 0 sol brilhava,


Que havia dez noites que sempre chorava... foldí ur ini.i, o gallo cantava.
Não tinha socego nem ôlho pregava, (A feonso E opes V ieira ).
Davam-lhe remedios, remedios tomava-
• 1 1 >111 A monotonia pode ser
Remedios, remedios não faziam nada,
E ra sempre o mesmo, nunca melhorava! pela insistência das rimas,
284 C onsolidação das L e is do V erso Dns P o em as de F o rm a V a r ia v e l 285

pela semelhança do rythmo, pela repe ■ Senhor de olhar peregrino,


Wm guiar nosso destino!
tição de alguns conceitos, como na bal
Rei de divina ascendência,
lada. Uncbra a cruz da tua Ausência!
—■ Outro exemplo:
0 ENVIADO I , por entre a cerração,
Ri-surge Dom Sebastião...
—■ Donzella de olhos risonhos,
Por quem esperas em sonhos? (M ario B eirão).
—- Fantasmas, vindos de Além, \ 1 1 i >-20. O metro e 0 rythmo po-
Sabeis de El-Rei, nosso bem?
•I* m \ .1 l iar, desde que se conserve a
— Romeiro de olhar cançado, • m 11, que é a simplicidade, auxilia­
Serás El-Rei, disfarçado?
do |" l,i insistência rythmica.
— Flor ingênua do caminho,
p 1 1 gcncro c tão encantador, que não nos fur-
E ’ s a sua alm a... adivinho!
■ •".■ 3 4" pi.i/rr de dar outro exemplo que sirva de
— Guitarra de cordas de ais, ^ ( íí =. iin pi ineipiante.
A voz de El-Rei me lembraes! 11 ' Itiw it iic r ” (para adormecer Lydia), de Eu-
— Ciprestes, pagens da Morte, piMo di r.islro é um modelo admiravel. Delle
Elle tinha o vosso porte. . . g *l lAltimofi :

—■ Era assim : — prestae ouvidos — Meia noite, meia noite


Esbelto, de olhos perdidos! I Li velha torre cahia;
Km seti camarim real
E partiu ... levou a luz I >1111,1 Mafalda cosia.
No seu olhar de Je su s! I • 11 que estava cosendo
A i de v ó s ! sempre, ás escuras, I '• fina prata par’cia,
A interrogar as alturas! )1111(11 delia, sua mãe
I 111 cama d’oiro dorm ia...
— Noviça, ás grades da cella:
I..... to mantinho de lustro
Desponta, ao largo, uma ve la !
111 svclto corpo envolvia,
Dize: não serão ainda -.... I que tinha no dedo
As caravelas da Vinda? 1m lia s de cor despedia.
Dos P oemas dS F orma V ariavee 287
286 C onsolidação das L eis do V erso

Segura com tal resposta,


Passos na escada se ouviram,
l ogo a mãe adormecia,
Passos d’alguem que subia,
K, vendo-a dormir, Mafalda
Ouvindo tal, a Princeza
Ao seu amado sorria,
A abrir a porta corria- Sorria e nos braços delle,
Ouvindo o gemer da porta, Nos seus braços se mettia;
A mãe os olhos abria, Iorle corrente de beijos
Abriu-os mas não viu nada, Aqitellas boccas prendia.
Que o candil já se morria. Ao barulho desses beijos,
—■ Quem é que anda abrindo portas, A mãe os olhos abria,
Filha, aqui ao pé de mim? AI>riu-os mas não viu nada,
—• Senhora mãe, é o vento, Que o candil já se morria.
Que abre as portas do jardim. Quem c que está dando beijos,
Filha, aqui ao pê de mim?
Segura com tal resposta —j1 Não são beijos, são as fontes,
Logo a mãe adormecia; .Sim as fontes do jardim.
Vendo-a dormitar, Mafalda,
A ’ porta se dirigia. Segura com tal resposta,
Logo a um gesto de Mafalda, l . n g o a mãe adormecia...
Um cavalleiro apar’cia : \ emlo a dormitar, Mafalda
De cochonilha mimosa Ao seu amado sorria,
Era o gibão que vestia. Sou ia e nos braços delle,
Em bello cinto bordado Nu» seus braços se mettia.
Punhal de prata trazia; I a i'da lavrada era
Nos braços do cavalleiro II corpete que a cingia;
Dona Mafalda cahia. ('oillla o peito o cavalleiro
Ao barulho dos abraços, 1 onlia o peito a comprimia,
A mãe os olhos abria, 1 0111 lauta força que a seda
Abriu-os mas não viu nada, D . , .eu corpete rangia.
Que o candil já se morria. A u.se ranger de seda
—■ Quem é que está aos abraços, A mãe os olhos abria,
Filha, aqui ao pé de mim? \hiiu os tuas não viu nada,
— Senhora mãe, são as arvores, Um o candil já se morria.
Que se abraçam no jardim. Quem está machucando sedas,
288 CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO
Dos P oemas de F orma V ariavel 289
1
Pilha, aqui ao . pé de mim? — Soy el Amor — dicen —
-— B ’ o vento que arrasta folhas, Que aqui quiero entrar.
Bolhas seccas no jardim. ■—■ Duérmete, hija m ia !...
Segura com tal resposta Es viento.. . 110 más !
Logo a mãe adormecia... etc.
C A P IT U L O V
Achamos que não será perdido mais um exem­ im E le g ia , da N e m ia , do E p ita p h io e da E nde cha
plo de Romance, tão encantador é o genero. SECÇÂO I
O seguinte é de Villaespesa e é um modelo de
Da E le g ia
delicadeza. O autor deu-lhe o nome de “ La balada
dei amor ” , Comprova mais o que dissemos sobre a A rt. 6 21. A Elegia é um poema em
semelhança entre o Romance e a Bailada. ■ 111< ■■<' exprimem sentimentos tristes e
O pequeno poema de Villaespesa obedece em
miianeolicos.
tudo o dispositivo dos arts. 618, 619, 620. Leiamos:
Hilac e Guimarães exemplificam com algu-
— Llaman a la puerta. '.11. p.r. -agcns da Biblia que são verdadeiras Ele-
Madre íquien será? 1 íh 1 "iiio “ o adeus da filha de Jephté ás suas com-
—- E l viento, hija mia, 1 .mlim ,r. ", “ o livro de Jo b ” , etc.
* Que gime al pasar.
— No es el 'viento, madre,
Ari 622. Em nenhum genero é
iN o oyes suspirar? 111 n rerommendavel a maxirna que en-
— E l viento que al paso m 11.1 ui os versos de H oracio: — se que-
Deshoja un rosai.
i «" 1 1 niimover-me emociona-te primeiro.
— No es el viento, madre. i lt ii"' flore, dolendum est, primum ipsi tibi” .
iN o escuchas hablar? (H oracio).
—• E l viento que agita
Las olas dei mar. A Ijella poesia — “ Adeus ao mundo” , de
i ii do Kabello, pode servir de exemplo de Ele-
— No es el viento. iOiste ijn Pfttnns aqui alguns trechos:
Una voz gritar?
- Já do batei da vida
—>■ El viento que al passo
iiil" toniar-me o leme a mão da morte;
Rompió algún cristal.
E perto avisto 0 porto
2Ç0 C onsolidação das L e is do V erso D " 1; P o em a s de F orma V a r ia v e e 291

Immenso, nebuloso, e sempre noite, ) * 11»- 11 que repete a extrema prece,


Chamado — Eternidade! I mlmiila por ella, e beijar pode
Como é tão bello o sol! Quantas grinaldas ii li 11I111 do Senhor nas mãos maternas!
Não tem de mais a aurora!
|h ‘‘i .11..uln de m im !... Talvez bem cedo
Como requinta o brilho a luz dos astros!
l,"ni:' ila mãe, de irmãos, longe da patria
Como são recendentes os aromas
rnilui de me fin a r... Ramo perdido
Que se exhalam das flores! Que harmonia
Jhi ....... . que o gerou, e arremessado
Não se desfructa no cantar das aves,
Por mão de genio máu á plaga alheia,
No embater do mar e das cascatas,
Mo i .iii i esquecido! Os Céos o querem,
No sussurrar dos limpidos ribeiros,
1 Is C é 'i\ são immutaveis; aos decretos
Na natureza inteira, quando os olhos
D'i l i iihor curvarei a fronte humilde,
Do moribundo, quasi extinctos, bebem
Çortlii clirislão que sou, Eternidade,
Seus últimos encantos !
H“ ' I" nir a teu b o rd o !... Adeus, ó mundo!
A morte é dura ! .. . |n -mi" da geada dos sepulchros
Porém longe da patria é dupla a morte! . . . i ' (hiiokiso frio enregelar-me...
Desgraçado do misero que expira \ 1 hmi|m vejo aberta, e lá do fundo
Longe dos seus, que molha a lingua, secca VIH esqueleto em pé vejo acenar-me...
Pelo fogo da febre, em caldo estranho;
Que vigílias de amor não tem comsigo, telfem os Deve haver nestes lugares
Nem palavras amigas que lhe adoçem pUtliMlça grave na mundana so rte...
O tedio dos remedios, nem um um seio, Um m m mpre a morte achou no lar da vida,
Um seio palpitante de cuidados, l 'i 'i ,1 vida encontrar no lar da morte.
Onde descance a languida cabeça!
Feliz, feliz aquelle a quem não cercam
Nesse momento acerbo indifferentes SECÇÃO II
Olhos sem pranto; que na mão gelada
Da N e m ia e do E picedio
Sente a macia destra da amizade
Num aperto de dôr prende-lhe a v id a !
\i 1 o ',L A Nenia bem como o Epi-
Feliz o que, no arfar da ancia extrema,
De desvelada irmã piedoso lenço,
P", imuialidades da Elegia, destinam-
Húmido de saudades, vem limpar-lhe |t 1 i l e b i a r episodios fúnebres, como
As frias bagas dos finaes suores! ti|"i 11' de alo-uem.
292 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de F orma V ariavee 293

Ex.: Nrm de teus olhos 110 ceruleo brilho


CÂNTICO AO CALVARIO \i liarei um consolo a meus tormentos!
Nnn mais invocarei a musa errante
Eras na vida a pombra predilecta
N« retiros onde cada folha
Que sobre um mar de angustias conduzia
1 1.1 um polido espelho de esmeralda,
O rumo da esperança! eras a estrella,
t ju r i v flectia os fugitivos quadros
Que entre as névoas do inverno scintillava
I '. u s p i r a d o s tempos que se foram!
Apontando o caminho ao pegureiro!
Nftn mais perdido em vaporosas scismas,
Eras a messe de um doirado estio ! 1 ai iilnivi, ao par do sol, nas serras,
Eras o idyllio de um amor sublime! \ finar a trompa sonorosa e leda
Eras a gloria, a inspiração, a patria,
I '" 1 .içadòr que aos lares se recolhe!
O porvir de teu p a e !... A h! no emtanto,
Pomba —• varou-te a flecha do destino! Nfiii mais! A areia tem corrido, e o livro
Astro — enguliu-te o temporal do norte! I '• minha infanda historia está completo!
Tecto — cahiste! Crença — já não vives!
Correi, correi, ó lagrimas saudosas, Ouço o tanger monotono dos sin os...
Legado acerbo de ventura extincta, lU rlilo etn meio de confusas vozes,
Dúbios archotes que a tremer clareiam ' Imu , de phrases pueris, estultas,
A lousa fria de um sonhar que é morto. 1 1 linho mortuário que retalham
Correi! Um dia vos verei mais bellas l iu.i envolver teu corpo! Vejo esparsas
Que os diamantes de Ophir e de Golgonda, í.«ml.ides e perpetuas, sinto o aroma
Fulgurar na coroa de martyrios |in imenso das egrejas, ouço os cantos
Que me circumda a fronte scismadora! I •• m ministros de Deus que me repetem
São mortos para mim da noite os fachos, Um n.10 és mais da te rra !... E choro embalde!
Mas Deus vos faz brilhar, lagrimas santas, Mie. 11.10! Tu dormes no infinito seio
E á vossa luz caminharei nos ermos! I lo Cieador dos seres! Tu me falas
Estrellas do soffrer, gottas de magua, Nh vo/, dos ventos, 110 chorar das aves,
Brando orvalho do céo! sêde bemditas! I d . / das ondas no respiro f lebil!
O’ filho da minha alma ! Ultima rosa In lur contemplas lá do céo, quem sabe?
Que neste solo ingrato vicejava! Nn vulto solitário de uma estrella...
Minha esperança amargamente doce! II -.rio tons raios que meu estro aqueem I
Quando as garças vierem do occidente, 1'oH bem I Mostra-me as voltas do caminho!
Buscando um novo clima onde pousarem, I lt lllii i <■ fulgura no azulado manto!
Não mais te embalarei sobre os joelhos, Mm. mio te arrojes, lagrima da noite,
294 C onsolidação das L e is do V erso Dos P oemas de F orma V ariavel 295

Nas ondas nebulosas do occidente! I1.' Um modelo, e dos mais encantadores,


Brilha e fulgura! Quando a morte fria que termina a “ Cantata ” a Ignez de Castro,
it e lb i
Sobre mim sacudir o pó das azas, Hmage:
Escada de Jacob serão teus raios Toldam-se os ares,
Por onde azinha subirá minha alma. Murcham-se as flores:
( F a g u n d es V a r e l l a ). Morrei, amores,
Que Ignez morreu.
S EC Ç Ã O III
Misero esposo,
Do E p ita p h io Desata o pranto,
Que o teu encanto
A rt. 624. O Epitaphio é uma com­ Já não é teu.
posição breve que serve para gravar so­ Sua alma pura
bre a lapide funeraria. Nos céos se encerra;
Triste da terra
— Sirva de exemplo este de João de Deus, na Porque a perdeu 1
campa de Anthero de Quental: Contra a cruenta
A q u i... jaz pó; eu não; eu sou quem fu i... Raiva ferina,
Raio animado de uma Luz celeste, Face divina
A ’ qual a morte as almas restitue, Não lhe valeu.
Restituindo á terra o pó que as veste. Tem roto o seio,
Thezouro occulto;
— Sobre o Epitaphio ver ainda o que adiante
Barbaro insulto
se diz dos Madrigaes, Disticos, Epigrammas, que
Se lhe atreveu.
todos têm certa semelhança pela brevidade.
De dor e espanto
S EC Ç Ã O IV No carro de ouro
O Numen louro
Da E n d e c lia Desfalleceu.
A rt. 625. A Endecha pertence ao Aves sinistras
Aqui piaram,
genero Elegia pelo assumpto triste, á Lobos uivaram,
Canção pela delicadeza do verso. O chão tremeu.
ag6 Consolidação das L eis do V erso I >os P oemas de F orma V ariav EE 297

Toldam-se os ares, \ fw r azul do Tejo arfa e estremece-


Murcham-se as flores: Svri do largo mar, sôfregas aves,
Morrei, amores, Salve, f ormosas naves!
Que Ignez morreu. I 't 1ipicín o vento vos enfuna as velas,
Desdobra-vos as azas. . .
C A P IT U L O V I Esbeltas caravellas,
Da C a n ta ta I itll. mente vos beijam amorosas,
Cantando, as ondas rasas. . .
Art. 626. A Cantata é um poema, Salve, manhã de rosas!
mais ou menos longo, destinado geral
Solo :
mente ao canto. I I Him a dobrada voz dos sinos tristemente...
Art. 627. A Cantata deve ser com­ 11«1111111 do mar! ao mar que vos reclama!
O perigo te chama,
posta em metros diversos, podendo con­
Aventureira gente!
ter sólos, córos, arias, recitativos. 0 hiui imas de amor dos que ficaes, correi!
Art. 628. A Cantata é por assim \i *I. quem fica só! ai de quem perde o que ama!
Prantos de mãe, ardei!
dizer 0 libreto de uma pequena opera. 1 11,11.1. da saudade, ardei perpetuamente!
— E ’ um exemplo formoso aquella de Bilac,
feita para o 4 ° centenário do descobrimento do C ôro:
Brasil e de onde extrahimos a primeira parte: Farfalham palpitando
As bandeiras de gu erra...
I 1 UniHiii as trompas; trepidos, rolando,
A P A R T ID A biiiiuli ui, atabaques e os tam bores...
Coro :. Adeus, formosa terra!
Plange a dobrada voz dos sin os... Amanhece. Adeus, noivas e flo res!
Salve, manhã dourada ! Adeus, amigos e aves!
Sorrindo, resplandece i ,.11,1, , o dobrada voz plange dos sinos graves...
Em fogo o firmamento. Palpitam no horizonte
E, aos beijos da alvorada Os velames anciosos.. .
E ás carícias do vento, Adeus, vida feliz !
298 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de F orma V ariav El 299

S o lo : Côro :
Gados do verde monte, PUmue a dobrada voz dos sinos graves, plange. . .
Adeus! Nos frescos alcantis umbrosos, \.i mar! Manhã de Março, acolha a tua luz!
mi aniles náus, que vão á procura de um mundo!
Tristonhas emmudecem
As gaitas pastoris... fi( fresca o ve n to !... Ao largo! A cordoalha range...
I.ngol Protegei, astros do céo profundo,
Os vales adormecem.. .
O estandarte da C ruz!
Ermaram-se as campinas...
Adeus doces cantigas,
A ’ sombra maternal
Das arvores amigas! C A P IT U L O V II
Adeus, verdes collinas, Do D ith y ra m b o
A tiritar no banho
Do orvalho matinal! \rt. 629. O Dithyrambo é um poe-
Ribeiros de agua clara,
imi destinado a celebrar 0 vinho, os pra-
Entre o ouro da seara
E a alvura do rebanho ! |tfi es <la meza, o prazer em geral, a ale-
JM ín.
C ôro:

Fulgura o sol nas armas dos guerreiros. Ari. 630. Pode ser composto como
Gritam, rindo, os frautins. Roucos, resoam n f antata em vários metros, e affectan-
Os sistros e os pandeiros... d" uma desordem apropriada a quem
— E as grandes náus, de azas abertas, voam..
1I. lira em honra de Baccho.
S o lo .
Aid. 6 31. Os versos devem ser
Adeus, aguas queridas
Do Tejo encantador! ■ heins, rubicundos, avinhados.
Adeus, casaes risonhos. Dolle disse José Feliciano de Castilho: “ O
Pelo pendor descendo IHllivi,unbo demanda verso cheio, robusto, sonoro,
Das encostas floridas! mlmdo, rubicundo como as faces do beberrão...
Vaes desapparecendo, ■ ■ olhos devêm scintillar mil cores alegres; as ri-
Terra do nosso amor, 1. devem resoar como cálices que se chocam, e
Berço dos nossos sonhos ! iigiecem entoar saúdes'’ .
30o C onsolidação das L eis do V erso Dos P oem as de F orm a V ariavee 301

— Ao acaso, dentre os cultores do Dithyrambo Por entre as aveleiras buliçosas


extrahimos este de Garção, feito á maneira classica: Das balsas espinhosas,
Mil capripedes satyros auritos,
— Os brilhantes trançados enastrando E mil faunos brincões,
Com verde mirto, com cheirosas flores, Já vêm saltando,
Nos lindos olhos, vivo, rutilando A. terra com o ruidoso pé trilhando.
O doce lume
Do cego Nume,
Alvas donzellas, Sobre o prado ameno
A quem vos ama, Tremilhicando o pávido Sileno,
Da crespa rarria, I)o ebrifestivo copo que transborda
Que Bassareu Pela micante borda
Ao mundo deu, Deixa entornar com rubicundo rosto,
<) cheiroso rubi, o quente mosto:
Com as brancas mãos no copo crystalino Kncrespou o nariz, e sacudindo
Lançae ligeiras I )s húmidos bigodes, ficou rindo ! . . .
Douro Falerno, rubido Sabino;
Eia, voae, Evoé,
Deitae, deitae, O’ padre Lyeu.
Gró gró, tá tá, Saboé,
Que cheio está! Evan Bassareu.
Ora brindemos Com Tyrso potente,
As gentis Graças, castos Am ores: Em carro litóente
No mar lancemos De tigres puxado,
Rixas, tristezas, maguas, temores. Dourando este dia,
Desterra o cuidado,
Mas de coradas nuvens, afumados E traze alegria-
Vejo em torno girar os negros montes:
Candida espuma Evoé,
De purpureas fontes O’ padre L y e u ...
Ferve, e se enleia
Na crespa veia,
Com que o ribeiro \rt. 632. O Dithyrambo pode tam-
Corre ligeiro. Iu consistir numa simples canção bac-
3Q2 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oem as de F orma V ariavee 303

—• Sim, sim !
chica em que se observem os requisito Da terras e dos astros todos
do art. anterior. Sentimos a rotação-
E x .: Depois de um jantar profuso,
— Compadres, nossa existência De uma forte libação,
Não passa de um sonho vão, Quem não quer a monarchia?
Quando bebemos entramos Quem não respeita um barão?
No dominio da rasão. Compadres, não é assim?
Compadres, não é assim? — Sim, sim !
—• Sim, sim ! Quem não quer a monarchia?
Quando bebemos entramos Quem não respeita um barão ?
No dominio da rasão. (F agundes V arelea ).
Tudo no mundo é vaidade
Disse o grande Salom ão... C A P IT U L O V III
Elle escreveu talvez isto Do P oem a E p ico ou E popéa
Num dia de indigestão.
Compadres, não é assim? Art. 633. A Epopéa é a celebração
—• Sim, sim !
de acções hèroicas: lendarias ou histo-
Elle escreveu talvez isto
Num dia de indigestão. liras (art. 338).
Não é vaidade a belleza, Art. 634. A Epopéa pode constar
Nem o vinho também, não!
Vemos bons todos os homens
de um só ou de vários episodios conca-
Atravez de um garrafão. 11 nados, podendo ser feita em estrophes
Compadres, não é assim? mi não; em verso rimado ou solto.
— Sim, sim !
Tendo já desenvolvido no Livro I, Tit. I
Vemos bons todos os homens
ilcsla parte, o estudo do Poema Epico, resta-nos
Atravez de um garrafão!
iilirtiiis dar o exemplo que illustre estes artigos e
Quando as taças enxugamos, Ifiiio 0 principiante:
Se aguça nossa attenção:
Da terra e dos astros todos A MORTE DE T aPYR
Sentimos a rotação. 1 ma columna de ouro e purpuras ondeantes
Compadres, não é assim? Subia o firmamento. Accesos véos, radiantes
304 CONSOUDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Dos P o em a s de F o rm a V a r ia v EL 305

Rubras nuvens, do sol á viva luz, do poente


Vinham, soltas, correr o espaço resplendente.
boi a essa hora, — ás mãos o arco possante, á cinta I ntre os sanguineos tons do occaso decaliia...
Do leve enduape a tanga em varias cores tinta, E ira tudo em silencio, adormecido e quedo,...
A aiucára ao pescoço, o kanitar á testa, — I )<- súbito um tremor correu todo o arvoredo:
Que Tapvr penetrou no seio da floresta. 1 d que ha pouco era calma, agora é movimento,
Era de vêl-o assim, com o vulto enorme ao peso
lirinc, agita-se, accorda, e se lastim a... O vento
Dos annos acurvado, o olhar faiscando acceso,
Im I.i : “ Tapir! Tapir 1 E ’ finda a tua r a ç a !”
lurme o passo apezar da extrema idade, e forte-
Ninguém, como elle, em face, altivo e hercúleo, a I cm tudo a mesma voz mysteriosa passa;
[morte V. arvores e o chão despertam, repetindo:
Tantas vezes fito u ... Ninguém, como elle, o braço l.ipir! Tapir! Tapir! O teu poder é fin d o !”
Erguendo a lança aguda atirava no espaço. I .1 essa hora, ao fulgor do derradeiro raio
Quanta vez, do uapy ao ronco troar, ligeiro
I >i 1 s o l , que o disco de ouro, em lúcido desmaio,
Como a corça, ao rugir do estrepito guerreiro
y mi si no extremo céo de todo mergulhava,
O tacape brutal rodando no ar, terrível,
Incólume,' vibrando os golpes, — insensivel \quella extranha voz pela floresta echoava
A ’s preces, ao clamor dos gritos, surdo ao pranto. Num confuso rumor entrecortado, insano...
Das victimas, — passou, como um tufão, o espanto, Cmnii que em cada tronco havia um peito humano
O extermínio, o terror atraz de si deixando 1 yuc sc queixava... E o velho, húmido o olhar, seguia.
Quanta vez do inimigo o embate rechaçando 1 . .1 cada passo assim dado na matta, via
Por si só, foi seu peito uma muralha erguida, Surgir de cada canto uma lembrança... Fôra
Em que vinha bater e quebra-s‘e vencida 1 lesta immensa ramada á sombra protectora
De uma tribu contraria a onda medonha e bruta I <1111 um dia repousara... Além, a arvore annosa,
Onde um pulso que, tal como o seu pulso, á lucta Km cujos galhos, no ar erguidos, a formosa,
Costumado, um por um, ao chão arremessasse \ iluce Juracy a rêde suspendera,
Dez combatentes? Onde um arco, que atirasse A rêde que com as mãos finíssimas, tecera
Mais celere, a zunir, a fina flecha ervada? 1 *n111 elle seu senhor e seu guerreiro amado!
Quanta vez, a vagar na floresta cerrada, \|li... — contae-o vós, contae-o, embalsamado
Peito a peito luctou com as fuivas onças bravas,
lí d i10, ninhos no ar suspensos, aves, flo re s !...
E as onças a seus pés tombaram, como escravas,
('1 ,nlae-o, o poema ideal dos primeiros amores,
Nadando em sangue quente, e, em roda, o echo infinito
11, corpos um ao outro estreitamente unidos,
Despertando ao morrer, com o derradeiro g r ito !...
Quanta vez! E hoje velho, hoje abatido! 1 )x abraços sem conta, os beijos, os gemidos,
3 o6 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em as de F orm a V ar ia v El 307

E o rumor do noivado, estremecendo a matta, IV


Sob o plácido olhar das estrellas de p rata... Então, Tapyr, de pé, no arco apoiado, a fronte
Ergueu, e o olhar passeou no infinito horizonte:
Juracy! Juracy! virgem morena e pura! \, ima o abysmo, abaixo o abysmo, o abysmo adiante...
Tu também! tu também desceste á sepultura!... E, clara, no negror da noite, viu, distante,
Alvejando no valle, a taba do extrangeiro...
III l'udo extin cto !... Era elle o ultimo guerreiro...
E Tapyr caminhava... Ante elle agora um rio 1 do valle, do céo, do rio, da montanha,
Corria; e a agua também, ao crebro murmurio
De Indo que o cercava, ao mesmo tempo, extranha,
Da corrente a rolar, gemia anciosa e clara:
Emira, extrema, rompeu a mesma voz:
—- “ Tapir! T a p ir! Tapir! Que é da veloz igara,
Que é dos remos dos teus? Não mais as rêdes finas — E ’ finda
Vêm na pesca sondar-me as agüas crystallinas.. . Eodii a raça dos teus: só tu és vivo ainda!
A i! não mais beijarei os corpos luxuriantes, Iiiliyrl Tapyr! Tapyr! morre também com ella!
Os curvos seios nús, as formas palpitantes lá niío fala Tupan no ulular da procella...
Das morenas gentis da tua tribu extincta! A batalhas de outr’ora, os arcos e os tacapes,
Não mais! Depois dos teus de bronzea pelle tinta \ . florestas sem fim de flechas e acanguapes,
Com os suecos do urucú, de pelle branca vieram Indo passou! Não mais a fera inubia á bocca
Outros, que a ti e aos teus nas selvas succederam.. . Ho-, guerreiros, Tapyr, soai medonha e rouca.
A i ! Tapyr ! a i! T ap yr! A tua raça é m orta! ■— ” I 11 nulo o maracá. A tribu exterminada
>E o indio, tremulo, ouvindo aquillo tudo, absorta lloiiuc agora feliz na Montanha S ag rad a...
A alma em scismas, seguiu curvada a fronte ao peito... i A 111 11111a rêde o vento entre os galhos agita!
Agora da floresta o chão não mais direito Nilo mais o vivo som de alegre dança, e a grita
E plano se extendia: era um declive; e quando I i,": Eagés, ao luar, por baixo das folhagens,
Pelo tortuoso anfracto, a custo, caminhando I*.... .. os a re s... Não mais! As poracés selvagens,
Ao crepúsculo, poude o velho, passo a passo Sl guerras e os festins, tudo passou! E ’ finda
A montanha alcançar, viu que a noite no espaço I ihIh ■< raça dos teu s... Só tu és vivo ain d a!”
Vinha a negra legião das sombras espargindo...
Crescia a treva. A medo, entre as nuvens luzindo, V
No alto a primeira estrella o calix de ouro ab ria... i num longo soluço a voz mvsteriosa
Outra após scintillou na esphera immensa e f r ia ... I H|)lrmi... Caminhava a noite silenciosa...
Outras vieram ... e, em breve, o céo, de lado a lado, i riii Inuiquillo o céo; era tranquilla em roda,
Foi como um cofre real de pérolas coalhado. í llin i .1 etn plúmbeo somno, a natureza toda.
308 C onsolidação das L eis do V erso
Dos P o em as de F orma V a r ia v Ee 309
E no tope do monte, era de ver erguido
O vulto de rap yr. . . Inesperado, um ruido Aid. 638. O ser a Satyra em estylo
Secco, surdo, soou, e o corpo do guerreiro ,11 dente ou humorístico depende do tem-
De súbito rolou pelo despenhadeiro...
E o silencio outra vez cahiu... pnamento do poeta; o essencial é ferir
Nesse momento, 0 ponto alvejado.
Apontava o luar no curvo firmamento. E x .: “ Fala da Consciência ao Anti-Christo”
(O lavo B ieac ). (Excerpto)-
M.i-, ai do Im perador!... Ai do Sabio, o Nababo,
' mesmo autor são ainda recommendaveis
modelos: “ Delenda Carthago ” e o “ Caçador de \ ipicm o orgulho faz rispido, agreste, e m á u !...
esmeraldas” ; de Alberto: o “ Parahyba ” ; de Vi­ Olie olha Job com despreso e Abel com menoscábo,
cente de Carvalho: “ Fugindo ao captiveiro ” ■ de ' hie á força de gozar, empederniu ao cabo,
Goulart de Andrade: “ Palm ares” ; além das epo- loimm-se um peito ferreo e um idolo de pau.
péas antigas. Assim te lias feito tú. —■ Deus deu-te a omnipotencia,
1 m1 como outr’ora ao Rei Nabuchodonosor,
C A P IT U L O IX Como ao hebreu Salomão, concedeu-te a Sciencia.
Da S a ty ra I>rulc oiro e cabochões como a Creso, e a Innocencia,
I,yt'io Branco e Real, no teu lar, todo amor.
^ rt- 635. A Satyra caracteriza-se M.r. o Oiro, o bem estar, as grandezas humanas,
pelo seu destino que é atacar seja o que 11 leu peito hão trancado aos carpidos e aos a is !...
fôr. N rio le amargando o sol das lagrimas humanas,
trituraste as Nações, fizeste obras insanas,
A rt. 636. Satyra é propriamente o 1 1 peitos arrancaste ás Filhas ante os Paes.
genero, podendo ser feita em forma dc I •i-. bem. — Agora desce aos lamaçaes infectos,
\(>>. quaes a própria luz recusa o seu s o rrir!...
soneto, de canção, de bailada ou de ou­ I d ,re, desce, através dos reptis e insectos,
tro qualquer modo. I >.>. brejos, dos paúes, dos caractéres abjectos,
! nos Sete Infernos vae aprender a carpir.
Art. 637. Como poema é uma com­ K, quando nas glaciaes entranhas dessas cryptas
posição mais ou menos longa e em tom I o> Horror, tiver’s descido ás tôrvas espiraes...
energico e vibrante, ou ironico, ou ainda {>11.111 <10 cuides ter já exgottado as prescitas
humorístico. I liemas afflicções e as lagrimas malditas,
Imito a ti clamarei: — Desce, desce inda mais!
Dos P o E m v S D E F o R M A V ^ V E I, 30

CO NSOUDAÇÃO D AS L E IS DO V E R S O
3 io
E x . __ a um procurador
Só quando emiim no pó, como um chacal raste , " C o m tão má gambia.andas tanto,
Chorar’s na escuridão, contricto e humilde ja. • • Tanto daqui para alli •
E as lagrimas arando o teu peito altane.ro, _ Procurador, não me enganas.
Der’ s teu ultimo pão a um pária, a um vil trapeiro... Tu procuras para ti. (BocaGê).
Então te sorrirei e Deus te sorrira
Dobra a altaneira fronte ao Fado Irresistível.
Art 641 O Epigramma ganha
Resgata pela Dôr teu passado execrável. _
—Sabe gemer, carpir, peito rude e impassive . ^ nmito em gr»P e “ ustodade
- B e i ja a chaga com pús do roto e o desprezive
-Conhece a Angustia, o Pranto, os ais do Irreparável.
(G o m es L e a l ). ferro em W
C A P IT U L O X do conceito final.
Do E p ig ra m m a e do M a d rig a l Art. 642. O Epigramma dialogado
Do Epigramma ú também de grande effeito.
Art. 639. O Epigram m a é uma pe­
Ex.:
quena composição satyrica e incisiva. Alcoa-.
_ “ O epigramma é uma scentelha — Perdoa, tu tens, Elmano,
Um defeito, entre diversos,
Do espirito do Diabo,
Faisca como um pyrilampo; e ao cabo Que cheira muito a doudice.
Se assemelha Elmano :
A uma abelha, „ Sim ? Qual é ?
Por ter ferrão no rabo! . . .
( F ontoura X a vier )- A lcco :
Eazeres ve rso s...
Elmano
Art. 640. Não tem forma apro­ Oh! Pois tu também tens outro,
priada, caracterizando-se pelo final que E {01gára de o não teres, _
deve resumir 0 conceito ferino e cáus­ Q ue está mui perto da asneira.

tico.
3 i2 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de F orma V ariav El 313

Alceo : Depois de andarem ambos a voejar,


Eu ! Qual é ? Perdidamente,
Cáe o Epigramma sobre o meu rival,
tílm ano:
E em vosso coração... 0 M adrigal” .
Não os fazeres...
( B ocage) .
Art. 646. Todas as formas métri­
A rt. 643. A combinação de-um me­ cas podem servir ao madrigal, sendo
tro menor no fim da estrophe é tam­ mais usados os versos de io e de 6 syl-
bém de grande effeito pois já tem por labas entremeados.
si um quê de epigrammatico pelo tom Ex.:
brusco. — Detesto cordealmente os madrigaes,
Do Madrigal Que são, minha senhora,
Hypocritas antigos e banaes.
Art. 644. I ía uma certa semelhan­ Não é, portanto, um madrigal dos taes
O que dirijo agora,
ça de composição entre a feitura do Curvado, á flor de pétalas reaes.
Epigramma e a do Madrigal, já pela
Quando este leque se agitar, convulso,
concisão, já pela graça, já pela delica­ Na corrente nervosa do seu pulso,
deza. Fará lembrar de certo
Uma esmaltada borboleta, anciosa,
Art. 645. A differença está em que Que do seu rosto olympico anda perto
o Epigramma é feito para ferir e o M a­ Porque o julga a corólla setinosa
drigal para exprimir um galanteio, um O botão entreaberto
Duma fina camélia côr de rosa.
pensamento espirituoso e fino.
(M acedo P a p a n ç a ).
— “ Semelhantes em tudo — o Madrig-al
E o ferino Epigramma: - As duas especies de versos do cap- seguinte
Ambos possuem a chamma, ti in também uma certa semelhança com as que aca-
O mais ardente fogo no final. h.imos de enumerar.
Ambos nasceram do desejo ardente
De ferir, de maguar!
3 i 4 C onsolidação das L e is do V erso
D os P o em a s de F orma V a r ia v El 315
CAPITULO XI CAPITULO XII
Do Distico e da Maxima Do Apologo e da Fabula
Do Distico SECÇÃO I
Generalidades
Art. 647. Em sua origem o Distico
era a reunião de dois versos formando Art. 649. O Apologo e a Fabula
sentido; hoje, por extensão, chama-se são narrações de episodio real ou in­
Distico a qualquer pequena composição ventado e de que se tira um ensina­
poética que encerre sentido perfeito. mento moral.
Assim é que hoje podemos classificar entre Art. 650. Em ambos, os persona­
os Dísticos, como fez João de Deus, os Epitaphios, gens podem ser animaes ou seres ina­
as Maximas e até os Madrigaes, como fez Augusto
Gil no “ Canto da Cigarra
nimados.

Exemplo de Distico neste moderno sentido: Art. 651. Convêm-lhes o estylo


— Esta vida é um mar e neste mar
simples, a narração singela e concisa.
Qual é o astro que nos alumia? Art. 652. A ficção com animaes
Que norte, estrella, ou bússola nos guia ? .. .
Um olhar de mulher, um terno olhar! da lhe um cunho levemente humorístico
( J oão de D e u s ).
que agrada pelo inesperado.
K x .: " A Cabra, o Carneiro c o Cevado”
Da Maxima
Uma vez
Art. 648. A Maxima é um Distico, l 'ma cabra, um carneiro e um cevado
que encerra uma lição de moral, ou uma Iam numa carroça todos tres,
Caminho do mercado...
sentença philosophica.
Não iam passear, é manifesto;
E x .: Mas vamos nós ao resto.
Ia o cevado numa gritaria,
Pobres 1 num só colchão podem caber uns tres ;
Que a cabra e o carneiro
Mas o maior império é pouco p’ra dois reis.
Não podendo na sua boa fé
( F ontoura X a v ie r )- Acertar com a causa do berreiro,
3 16 C onsolidação das E ê is do V erso
Dos P o em as de F orma V a r ia v EL 3 i7

Diziam lá comsigo: “ Miolo! (exclama o outro); pobre tolo!


Que mania! Elle pensa que o levam á tosquia,
Cá este nosso amigo E por isso nem pia.
E companheiro Esta pensa também que vae, de carro,
Por força gosta mais de andar a p é !... Ao tarro,
O caso é, Vasar a teta;
Que o cevado gritou tanto ou tão pouco, Pobre pateta!
Que o carroceiro Deixal-os! lá se avenham;
Perde a cabeça, Mas porcos não se ordenham!
Vae como um louco, Cevados não se ordenham nem tosquiam!
Saca um fueiro Demais sei eu o fim com que me criam ...
E diz-lhe: •—■ Hom’essa ... Demais sei eu !
Passa a m ais! Por isso brado ao céo!
Eu inferneiras taes Por isso choro a minha triste sorte!
Não as aturo! Por isso gritei, grito e gritarei,
Ouvir berrar ha tanto tempo é duro! Do fundo da minha alma até á morte:
Pois o senhor não vê que esta nem chora?! Aqui d’el-rei!
Nem ao menos as lagrimas lhe saltam, Aqui d’el-rei!
Como é tão natural numa senhora?! Falava como um homem! Muita gente
Guellas não lhe faltam, Não discorre com tanta discreção-
E de ferro; Infelizmente
O ponto é que ella as abra; Quando o mal
Mas é cabra... E ’ fatal,
Teve outra creação: A lamúria que vale!
Não dá um berro Que vale a prevenção!
Sem alguma rasão ! Antes ser insensato que prudente;
E julga que este cavalheiro é mudo? Um insensato, ao menos, menos sente;
E ’ serio, tem proposito, é sizudo; Não vê um palmo adeante do nariz;
A ’s vezes berra que estremece tudo, Vê o presente
Mas só quando é preciso; E está contente.. .
Tem j uizo.. . E ’ mais feliz!
( J oão de D e u s ).
M iolo!
3 18 C onsolidação das D e is do V erso D os P o em a s de F orma V a r ia v e l 3i 9

SECÇÃO II
T IT U L O III
Da F a b u la com o a u x ilia r da S a ty ra
Dos poemas menos usados
Art. 653. O mesmo poema pode
C A P IT U L O I
ser: uma fabula pela feitura; uma S a ­
Do P salm o
tyra pela intenção.
Art. 654. O Psalmo é um cântico
E x .: “ O macaco declamando ”
essencialmente religioso, é um hymno
Um mono, vendo-se um dia
Entre brutal multidão, em louvor da divindade e destinado sem­
Dizem lhe deu na cabeça pre ao canto, admittindo todos os me­
Fazer uma prégação. tros, todos os rythmos.
Creio que seria a thema E x .:
Indigno de se tratar,
— Quando ao longe em toda a terra,
Mas isso pouco importava, O’ meu Deus e meu Senhor,
Porque o ponto era gritar. Resplandece de teu nome
Teve mil vivas, mil palmas, O magnifico esplendor.
Proferindo á bocca cheia, Sobre os céos sóbe e se eleva
Sentenças de quinze arrobas, Tua ineffavel grandeza,
Palavras de legua e. meia- E por modos mil a entoa
Toda a vasta natureza-
Isto acontece ao poeta,
Orador, e outros que taes; Os meninos que de leite
Néscios o que entendem menos Molham os beiços recentes
E ’ o que celebram mais. Desatam para louvar-te
Suas linguas innocentes.
( B ocage )
Assim os impios confundes,
De temor sobresaltados:
Teus inimigos se abatem,
De teu ser maravilhados.
321
Dos P oemas de F orma V ariavEL
C onsolidação d a s L e is do V fiR S o
320
A rt 656. H oje ha ampla liberdade
Olho e vejo o sol brilhando,
Lavor de tuas mãos bellas,
na feitura da Epistola, que se pode pres­
Da lua o luzente globo, tar a todos os assumptos e e um pode­
E as rutilantes estrellas.
roso auxiliar da Satyra.
O que é, meu Deus, o homem,
_ Alliás assim já 0 era desde_ os tempos pas­
Para delle te lembrares?!
E com dons de tanto preço sados. As satyras de Nicolau Tolent.no o Passe
Tão pequeno ser ornares ? ! e “ o B ilh ar” foram feitas em forma de Epístola
As “ Cartas Chilenas” , attribiudas a Alvarenga P
Quasi egual aos mesmos anjos xoto, pertencem também ao genero Satyr.co e sao
O fizeste, e meigamente,
Gloriosa, honrada c’roa Epistolas.
Lhe cingiste sobre a frente.
A rt. 657. O tom que convem á
De todo o extenso universo Epistola é o familiar, devendo a simpli­
Soberano o declaraste;
Os bois e as tenras ovelhas cidade presidir á feitura dos versos que
Sob os seus pés collocaste. nunca devem ser rebuscados.
Quantas aves ao céo voam,
*. (S Carta a Manuel .
Quantos peixes que, a milhares,
Volvem corpos escamosos (Excerpto)
Pelos vastos fundos m ares.
Manuel, tens rasão. Venho tarde. Desculpa.
Tudo, ó Deus, tudo lhe déste 1 -Mas não foi Anto, não fui eu quem teve a culpa,
Como é certo, ó meu Senhor, Eoi Coimbra. Foi esta paysagem triste, tn ,
Que transluz por toda a terra A cuja influencia a minha alma nao res.st •
De teu nome o resplendor 1 oneres noticias? Queres que os meus nervos fale •
(S oxjza C aldas).
V á! dize aos choupos do Mondego que se calem
c a p it u l o 11 I' pede ao vento que nao mve e gema tanto.
Da E p ís to la e m fim , « ’

Art. 6 S5 - A Epistola cíassica era » ) . ” ' » « faz ,» U Paoz


feita ora em tercetos, ora em decasy - Dos ursos na aula, peor que beatas correr
labos brancos.
322 C onsolidação das L eis do V erso Dos P oemas de F orma V ariavel 323

De velhas magras, galopando Avc-Marias, C A P IT U L O II I


Peor que um diamante a riscar na vidraça, Do E p ith a la m ío
Peor eu sei lá, Manuel, peor que uma desgraça!
Hysteriza-me o Vento, absorve-me a alma toda,
A rt. 658. O Epithalamío era um
Tal a menina pelas vesperas da boda, poema composto para louvar os noivos
Atarefada mail-a ama, a arrum ar... ou celebrar um casamento.
O Vento afoga o meu espirito num mar
Art. 659. H a ampla liberdade na
Verde, azul, branco, negro, cujos vagalhões
São todos feitos de luar, recordações.
sua feitura, sendo que aquillo que o dis­
A ’ noite, quando estou, aqui, na minha toca, tingue é o assumpto.
O grande evocador do Vento evoca, evoca
C A P IT U L O IV
O meu doido verão, este anno passado,
Do C a n to N a ta lic io ou G e n e th lia c o
(E a um canto bate, alli, cardíaco, apressado,
O tic-tac do relogio do fogão. . . ) Art. 660. Como ao poema anterior
Bons tempos, Manuel, esses que já lá vão! a este o que o distingue é o assumpto.
Isto, tu sabes? faz vontade de chorar.
E pela noite em claro, eu fico-me a scismar, Art. 661. Relativamente a ambos,
Triste, ao clarão da lamparina que desmaia, 0 conselho a dar é que todo o poeta deve
Na existência que tive este verão na praia, fugir da banalidade e não procural-a!
Quando, mal na amplidão, vinha arraiando a aurora,
Ia por esse mar de Jesus Christo fóra, C A P IT U L O v
No barco á vela do moreno Gabriel! Do A c ro s tic o
Vejo passar de negro, envoltos em burel, Art. 662. O que ha a admirar no
Quantos sonhos, meu D eus! Quantas recordações!
Phantasmas do Passado, ophelicas visões,
Acrostico, não é. que houvesse cahido
Que, embora estejam lá, no seu paiz distante, ■ ■ui desuso, é que ainda haja quem o
Oiço-as falar na minha alcova de estudante. 1 IÇil,
C A P IT U L O VI

Da Glosa

( A ntonio N obrE)- Art. 663. A Glosa é uma composi-


■ u< cm que se desenvolve uma outra
_ . e T ÊIS DO VfiRSO
C,onsoijpa Çao L T L _ = = = = = = = = ^

mais curta que toma o nome de

^ o ie‘ . Glosa foi muito usada


Art. 064. em varios poemas l iv r o v
pelos poetas ant ê . Dos poemas em versos entrelaçados
4 VÍ1;T D e e r d e T ;u m e r o d e e s - t it u l o I
trophes d ^ d o numero de versos
Dos versos entrelaçados em geral ^
do Mote.
Mote A rt 666. Diz-se que o poema e
E x':
“ A s a m o ra s, q u e 0
nnm â tem d e a m o re s
(C amões ).
e s n - r a s ís í
Amigos e saudosos_ arv® “ os de alegria,
Onde eu passei meu meus segredos,
Guardae
Como se tu
eu Itora
Z jâ
ja na terra fria.
rimados. . ,
, a Ac nos rústicos penedos, » . Ma Os versos nao rimados
Quantas ver.es Vão

ASTÍ»
f echarpe o j m ,

»—
o a auem vos fale agora
=i-.w
Não digaes nunca ^ eu era> labo. j _„r
Neste pobre exilad , flores! Art. 669. Os rimados podem -
Me vistes namorado a come
dispostos:
A s capellas que «*^ “ ^ “ olhM ’de hera,
Mas fazem-me ** thn de am ores...
cm rimas parallelas;
A s amoras, que ^ B randão).
326 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em as Em V ersos E ntrelaçados 327

Pode servir de exemplo a “ Delenda Carthago ” , Art. 672. Não se deve prolongar
de Bilac.
—-N ã o confundir com a estrophe semelhante!
em demasia a surpreza para não dar a
idéa de desaggregamento.
e em rimas misturadas.
A rt. 673. A “ segurança” necessária
Ex-: * após algum periodo de “ surpreza” , pode
Era um domingo da Resurreição,
Emma; e não foi por causa de preguiça ser conseguida pela maneira estabeleci­
Mui desculpável de accordar tão cedo, da no Livro V da Parte Geral.
Nem foi por falta de religião,
Que nós deixamos de assistir á missa. Art. 674. O poema em versos en­
No sabbado, na vespera, em segredo, trelaçados pode ser “ isometrico” ou
Tínhamos coçnbinado firmemente “ heterometrico” .
Ir para aquelle fim á egreja; embora
Esta distante meia legua esteja Art. 675. Os versos “ isometricos”
Do feliz sitio onde morava a gente. são mais usados sem rima ou em rimas
parallelas.
( R a ym u n d o C o rrêa ).
— São exemplos, respectivamente o “ Ode a
Napoleão ” atraz citada, e a “ Morte de Tapyr, tam­
Art. 670. Os versos em rimas' pa- bém transcripta nos “ Poemas de fórma variavel ” .
rallelas e os brancos se entrelaçam
mais pelo “ encadeamento” (enjambe- Art. 676. Nos “ heterometricos”
ment) ; aquelles em rimas misturadas usam-se mais as rimas misturadas.
mais pelas rimas. Art. 677. O verso heterometrico é
Art. 671. Os versos entrelaçados o chamado verso livre.
causam mais surpreza do que as estro- Art. 678. Por uma diferença de es­
phes, pois não se sabe onde e a que mo­ colas o verso livre divide-se em duas
mento vão encadear; ao passo que cada classes distinctas: verso livre clássico e
estrophe forma um sentido já acabado. verso livre decadente.
328 C onsolidação d as L eis do V erso Dos P o em as em V ersos E ntrelaçados 329

Art. 679. Os versos entrelaçados do hemistiehio da 6.“ para a 4.a e 8.a


dividem-se em quatro grupos: — em syllabas, entremeando assim rythmòs
rimas parallelas (geralmente alexandri­ diversos; se se usarem os recursos de
nos) ; brancos (geralmente decasylla- “ encadeamento” e de “ cesuras” , já re­
b o s ); livre clássico; livre decadente. feridos: se se applicarem as regras da
onomatopéa e da harmonia suggestiva,
T IT U L O II consegue-se fazer do alexandrino o ver­
so mais vibratil actualmente em língua
Dos Versos “ em rimas parallelas”
portugueza.
Art. 680. Os versos entrelaçados — E ’ claro que nos referimos aos versos “ iso-
que rimam dois a dois, differem das es- metricos ” , Dos heterometricos correspondentes a
estes em vibratilidade e belleza trataremos adiante.
trophes de dois versos, pelas razões já
apontadas.
T IT U L O I I I
A rt. 681. Nestes o pensamento tem
mais liberdade, pois pelo “ encadeamen- Dos Versos Brancos ou Soltos
to” a oração pode fazer sentido antes A rt. 684. Os versos brancos em
de terminar o verso ou no interior do portuguez são geralmente usados em
verso seguinte. decasyllabos.
Art. 682. O metro mais usado em Art. 685. Os versos brancos que
rimas parallelas é 0 alexandrino. já foram muito usados em tragédias,
§ unico. O decasyllabo vae melhor poemas, satyras, odes, epístolas, estão
em estrophes quando se quer rimar dois hoje em relativo desuso.
a dois. — “ Em relativo d e su so ...” porque hoje ainda
0 usam grandes poetas em obras impereciveis. Assim,
A rt. 683. Se se aproveitarem os para citar dois dos maiores, temos Corrêa de Oli­
recursos atraz apontados: de mudanç veira em Portugal e Alberto de Oliveira no Brasil.
330 C onsolidação das L e is do V erso Dos P o em a s em V ersos K n t r k i .u , a i ><> . \ ii

Aquelle fez em verso branco o seu profundo livro — O iambo usado em portuguez é formado de
“ Tentações de S- Frei G il” , este o bello poema um decasyllabo seguido de um verso de seis syl-
“ No Seio do Cosmos ” . labas.
Podem servir de exemplo aquelles de Almeida
Art. 686. Prestam-se os versos Garrett, que começam:
brancos aos poemas em que uma idéa — Oh meu amparo, oh doce gloria minha,
moral ou philosophica é desenvolvida. Tu com quem me achei sempre,
Na desgraça, na magua e nos pezares
—■ Estão neste caso os dois poemas acima refe­
Para me consolar;
ridos.
Que me dás voz, suspiros, desaffôgo
— A proposito do verso branco disSe o grande Quando a ventura é tanta
Castilho que elle se presta mais que os outros “ aos Que pesa nalma — e o coração é cheio
assumptos em que se expressam as paixões vehe- A estallar se não fa la !
mentes, como a tragédia, os que, como a comedia
ou simples dialogo, têm indeclinável dever de ser
naturalissimos; deverão preferir o verso solto, por­ A rt. 689. O verso branco é um
que a rima a cada linha nos está descobrindo ar­
tificio ” . — Discordamos nisso do grande mestre.
passo dado para a liberdade, mas a falta
Para os assumptos acima referidos o alexan­ de rima 0 torna ás vezes nronotono, ape-
drino é o que mais se presta, pela amplitude, pelos zar dos recursos de “ encadeamento” ,
recursos rythmicos, pela vibratilidade- Deve-se levar
variedade de vogaes, cesuras múltiplas,
em conta que quando Castilho escreveu o seu “ Tra­
tado de Metrificação ” ainda não tinha o alexan­ com que 0 poeta o pode dotar.
drino attingido, em portuguez, ao gráo de evolução
actual. T IT U L O IV
A rt. 687. Os versos brancos são Do Verso Livre. Clássico
geralmente isometricos, podendo ser he-
terometricos por excepçao. Art. 690. A superioridade do ver­
so livre é incontestável.
A rt. 688. Os versos brancos hete-
rometricos são geralmente usados em Art. 691. A liberdade na colloca-
iambos ou em estrophes. ção das rimas e no prolongar a expres­
332 C onsolidação das L e is do V erso Dos P oemas Em V ersos E ntrelaçados 333

são das ideas pelo “ encadeamento” , no decadente, sem entrar no estudo da con­
uso de vários metros alternados, traz a cepção mesma do verso, segundo a es­
este verso grande variedade e surpreza cola que o produz.
que lhe emprestam muito encanto. Art. 696. Aos poucos as conven­
—■ Veja-se para exemplo: a “ Missa da Resur- ções empyricas cedem lugar ás regras
reição ” , de Ravmundo Corrêa; o poema “ Alma
em flo r” , de Alberto; grande parte da “ Morte de dictadas pela lógica.
D. João ” , de Guerra Junqueiro. Art. 697. O conservantismo a ou-
A rt. 692. O verso livre clássico já trance é ridículo.
é um passo mais para a liberdade fe­ Art. 698. Toda a condemnação
cunda, mas ainda o acompanham algu­ systematica de uma lei por pertencer a
mas regras arbitrarias. esta ou áquella escola é arbitraria.
A rt. 693. Apezar da apparente li­ Art. 699. A evolução da métrica
berdade o verso livre clássico é ainda o tem-se feito para a liberdade e para a
leito de Pracusto, em que o pensamento simplicidade.
por vezes deve ser cortado para caber Art. 700. Do verso Clássico para o
110 metro. Romântico já a fôrma se torna ondu-
Art. 694. Os defeitos que ainda se lante pelo encadeamento e pela harmo­
notam neste verso são os proprios das nia retardada. (Arts. 35 a 4 3).
varias escolas que o têm usado. Art. 701. O verso Parnasiano ac-
ceitando e integrando as conquistas dos
T IT U L O V Românticos, mantem ainda regras illo-
Do Verso Livre Decadente gicas e arbitrarias.
—■ H aja vista entre outras exigências a con­
Art. 695. Não se pode tratar das servação do hemistichio na 6.a syllaba dos alexan­
leis que presidem á feitura do verso drinos quando o verso logicamente delle não precisa.
334 C onsolidação das L ê is do V erso Dos P oemas em V ersos E ntrelaçados 335

Art. 702. O verso L ivre Decadente Art. 707. Uma lei não é, não pode
é uma revolução pedindo a liberdade de ser um capricho desta ou daquella es­
rythmo. cola, mas deve ter os seus fundamentos
na physiologia de cujas exigências deve
— Não quer isto dizer que se devam acceitar
as liberdades que na sua ancia de combater a escola ser a expressão, sob pena de não ser lei.
decadente procura impôr. Não. E ’ preciso attentar Art. 708. Quando obedecem ás leis
para a restricção dos arts. seguintes.
eternas e inclestructiveis que têm a sua
Art. 703. Todo o exagero é con- base na physiologia, approximam-se to­
demnavel, mesmo em se tratando de li­ das as artes poéticas.
berdade poética. Art. 709. Dos arts. anteriores se
Art. 704. Do conservantismo das deduz que: um bom verso é bello em to­
escolas combatidas e dos exageros e au- das as escolas.
dacias dos revolucionários que tudo pe­ Art. 710. A belleza da idéa deve
diam, uma coisa ficou: a obediência ás coincidir com a belleza do rythmo.
regras da métrica quando lógicas e a Art. 7 1 1 . Se a idéa se precipita 0
liberdade do rythmo. verso deve seguil-a; se ondula, deve on­
Art. 705. A s exigências illogicas e dular.
arbitrarias de todas as escolas têm cahi- Art. 712. Physiologicamente a
do para dar logar ás verdadeiras leis Emoção tende a tornar a linguagem ry-
eternas, creadoras de belleza. thmada.
A rt. 70Ó. Nenhum conservantismo Art. 713. A Emoção deve, pois, en­
arbitrário se pode sustentar por longo cher a phrase; 0 Sentimento eterno e
tempo; nenhuma innovação sem base vibrante deve objectivar-se creando 0
pode vingar. rythmo.
Dos P o em as bm V ersos E N T O fle A Ç A ^ L j£

_ . c T TuíS do V êrso
336 C onsolidação das sible. . . ” - diz o mestre parnasiano; (Sully Prud-
liomme) ; „ __
Art 7 I a O Pensamento deve fe- _ “ De la musique encorc et toujours
A lt;- / i musical formando o exclama o grande decadente (Verlamc).
cundar a phrase musicai
verso. A rt
7 1 9 - Só assim teremos o su-
Art vm O Verbo humano em ebu- p r e mencanto: a pedra preciosa da
o

r - L i a n d o um meio de objectivar- Idea, brilhando no engaste apropuado

íorma a soa imagem' da fôrma, como uma jota.


A rt 716 . O verso deve amoldar-se _
N otae que escrevemos - “ apropriado ” -
. _ nem “ engaste de ouro . E
a cada sentimento e não o sentimento a e não - formoso , deve brilhar a Idéa, o

cada verso. eSSe tr Snor ma?s deslumbrante que se apre-


ín “ o 'emocionará desde que não seja o apro­
Art 717 - A form a não pode ser
priado.
m ledo de Procusto a esperar a Idea
A rt 7 2 0 . O que é. concebido clara­
mente enuncia-se por si e a palavra para
um “ sapatinlio chinez , c ^ e\ i-
nioldavel como a cera e obediente exprimil-o accorre pressurosa.
gencias da Emoção. _ E ’ a velha sentença de Boileau, eternamente
verdadeira, profunda:
A rt. 71S. Emquanto se n ão o b ]e- u:pn s’enonce clairement,
« r v niie 1 on conçoit Dien „
ctiva o Pensamento, cabe ao poeta d.n Le q u dire arriveut aisement...
Et les mots pour le dire arnvc
f„n rrã 0 cerebral da sekcçao e da
S 'r t que o verso lhe saia o Art 721. A Emoção será eterna-
escolha, paia que
mais musical possível. __ {on_ mente o Deus fecundo, de cuja. w *
depende a belleza creadora da obia
- Nisso concordam as donc
ction de toute P0^ ' ioll naturelle possible d’ arte.
338 C onsolidação das L e is do V erso Dos P oemas em V ersos E ntrelaçados 339

Art. 722. A. Emoção dará eterna­ Art. 727. O verso Livre Clássico é
mente as supremas modalidades do ry- livre porque nelle ha variedade de me­
thmo. tros; o verso Livre Decadente é livre
Art. 723. A forma deve seguir a porque ha nelle variedade de rythmos.
Emoção, alteando o tom no arroubo, Art. 728. Fazer o verso desigual
tornando-se febril no delirio, suavisan- systhematicamente é voltar ao leito de
do-se na caricia. Procusto dos Clássicos e dos Parnasia­
Art. 724. Seguindo a Emoção dei­ nos.
xará 0 poeta que o sentido marque a
Art. 729. Não deve haver preoc-
phrase musical.
cupação em fazer o verso systhematica­
— Da regra se conclue que no Verso Deca­
dente a concordância retardada é uma excepção. mente diverso do que o precede; a pró­
pria Emoção se encarregará dessa di­
Art. 725. Seguindo a Emoção verá versidade.
o poeta que o seu Pensamento, creando
0 verso, dar-lhe-á a medida, a cadência, Art. 730. Se a forma se amoldar a
cada sentimento; se 0 poeta conseguir
o rvthmo.
no seu verso o “ máximo de expressão
Art. 726. Foi essa necessidade de natural possivel” (nota ao art. 718) e
não cercear o Pensamento que creou o deixar que o sentido marque essas phra-
“ encadeamento” (enjambement) ; é ella
ses musicaes, terá verso Livre Deca­
por sua vez que cria o verso livre mo­ dente sem preoccupação de o fazer.
derno.
— E ’ que do encadeamento se fez novo verso — Aquella joia que é a — “ M arinha” — de
para não quebrar o rythmo, como se verá mais Bilac póde ser dada como um modelo dè poesia
adiante. decadente, bastando para isso dividir os versos pelo
340 CüN SOLIDAÇÃO DAS LEIS DO VERSO Dos P o em as em V ersos E ntrelaçados 341

sentido (art. 724 e 725), gryphando algumas idéas Art. 731. A liberdade dos rythmos
para as salientar. Vejamos:
se impõe para que no momento da con­
“ Sobre as ondas oscilla o batei docemente. . .
cepção artistica, a “ Idea possa escolher
Sopra o vento a gemer.
Treme, enfunada, a palavra sobre que se affirme” . *
A vela. — I,e problème de la forme ne se présente pas
Na agua mansa do mar comme un problème distinct. Aucun travail de style
Passam, ne peut aboutir s’ il ne répond à un besoin de pen-
Tremulamente, sée. Dans la lente marche de la production litte-
Áureos traços de luz, brilhando esparsos nella- raire, l'un et 1’autre vont cnsemble, du même pas
et se faisant oppui. — U idée naissante chcrche à
Eá desponta o luar. tâtons le viot pour s’affcrmir. Et le verbe, pour
Tu, paraitre dans toute sa gloire, attend la pensée” .
Palpitante e bella, (C h arles A lbert )-
Canta!
Chega-te a mim! A rt. 732. H a sentimentos ondu-
Dá-me essa bocca ardente ! lantes, outros ha nervosos, caprichosos
Sobre as ondas oscilla o batei docemente... estes, serenos aquelles, e outros ha gran­
Sopra 0 vento a gemer.
diosos e ainda outros m agnificentes: o
Treme, enfunada,
A vela. verso deve seguir a todas as variações.
Vagas azues, Art. 733. Se a serenidade e a cal­
P arae! ma dictam versos serenos, iguaes, a ne-
Curvo céo transparente; vrose, o capricho, a duvida, a incerteza,
Nuvens de prata,
a anciedade, absolutamente não os po­
O uvi!
Ouça na altura a estrella, dem dictar serenos, porque ellas são on-
Ouça de baixo o oceano, dulantes, desiguaes, variaveis, e brus­
Ouça o luar albente: cas e nervosas.
Ella canta!
E, embalado ao som do canto delia, Art. 734. Quem tem a intenção de
Sobre as ondas oscilla o batei docemente” . emocionar, emociona-se primeiro.
342 C onsolidação das L éis do V érso

Art. 735. A Emoção crea o Ry-


thmo.
Art. 736. O Rythmo produz a Bel-
leza. Lista dos autores consultados ou
Art. 737. A Belleza desperta a citados e respectivas obras
Emoção. B randão (Ju lio ), Nuvem de
A
Art. 738. Os tres artigos anterio­ A17BERT (Charles), Qu’ est-ce
Oiro.
B r a z il (Zeferino), Vovó Musa.
res resumem o circulo vicioso da arte que l’ art?
A l e n c a r (Mario), Diccionario
B u l h ã o P ato , Varias obras.
B raga (Belmiro), Rosas.
suprema. de Rimas (Xntr.)
A l m e id a (Filinto d e) Cantos e C
Art. 739. Revogam-se todas as leis Cantigas.
A l v a r e n g a (M. I. da Silva),
C a m in h a , Obras.
C a m õ e s (Luiz de), Obras.
arbitrarias das escolas antigas. Obras Poéticas.
A lv a r e n g a P e ix o t o , Obras.
C a m po s (Humberto de), Poeira.
C a rv a l h o (Adherbal de)— (Ci­
A m a r a l (Amadeu), Espumas. tado por Pinto da Rocha).
Art. 740. Integram-se todas as re­ A n a c r e o n t e , v a r ia s trad u cçõ es. C a rv alh o (Vicente de), Poe­
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ticas. ro da Infancia. rito Litt erário. Bergerac.
346 C onsolidação das L e is do V erso

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parsa.
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S e ix a s ( A r is tê o ) , v a r ia s obras des—), toda a obra.
e artig o s. V a r ELLA CL. N. Fagundes),
Obras poéticas.
S e m m Edo (Curvo). (Citado pe­
lo Dr. Cl. Pinto). V e r h a e r E n (É m ile ), Toda a IKT D I C E
S il v a ( V ic to r ) , obra esparsa. obra.
S u l l y (James),- Essai sur le V e r ís s im o (José), Que é litte-
Rire. ratura e outros escriptos.
S t e c c h e t t i (L o re n z o ), L e R i­ V e r l a in e (Paul), Toda a obra. Pag.
me. ViLLA (Vargas), L a libre E s­ D ed ic a tó ria ................................................................................. 5
tética. Prefacio.......................................................................................... ^
T V i l l a e s p E sa (Francisco), Tor­ D i v i s a ........................................................................................ 13
re de M arfil. Epigraplie .................................................................................. 15
T h e o c r it o , (cit.) V ir g íl io , (cit.) Introducção...................................................................................
T i i EOp h il o ( A n n ib a l), Rimas. V Lettres Philosophi-
o l t a ir E,
T o l En t in o (Nicolau), Obras. ques e outras obras. P A R T E GERAD

Disposição p re lim in a r............................................................. 21


Livro T —■ Dos Versos
O desenho da capa é de Aplecina do Carmo Titulo I— Do verso em g e r a l ........... 21
Titulo II — Da constituição do verso . . . . 22
Titulo I I I — Differentes especies de versos . . . 32

Livro I I — Das syllabas


Titulo I— Da syllaba em g e r a l ........... 5*
Titulo II — Da contagem das syllabas. . . . 52
Titulo I I I — Do accento t o n i c o .................................. 59
Titulo IV — Do modo de alterar o numero das syllabas 62
I.ivro TTT — Da cesura
Titulo I— Da cesura em geral . .. . • ■63
Titulo II — Dos versos em que a cesuraé facultativa 08
Titulo III — Dos vs. em que a ces. é obrigatória e fixa 73
Titulo IV — Do verso de oito syllabas. . . . 76
Titulo V .— ...C e su ra movei e dupla . . . . 78
Livro I V — Da rima
Titulo I —- D a rima em g e r a l .................................. 91
Titulo I I —• Das differentes especies de rimas . . 92
Titulo I I I — Da disposição das r i m a s ........................... 100
Titulo I V — De como usal-as segundo o genero . 102
348 C onsoudação d as h tx s DoJVjRSQ

L iv ro V — Do rythm o ^
Titulo I — Da ° r>gem áo . T hnJ,° ■ ' ' ' ' 106
Titulo I I _ Dü
s s i? r SoMSti” 555— »*>- — •
V I - Do papel das letras no verso
L iv ro ^

Titulo I — Da sonoridade em geral . • ■ ■ • Jl8


Titulo I I — Da homophonia proposital . • ■
Titulo I I I - DO valor de algumas letras . . • ■ 3
L iv ro V I I - Das licenças poéticas ^
Titulo I — Das licenças em g e r a l ........................... I45
T íu o II — Das licenças acceitaveis . ■ ■ ■
Titulo III - Das licençaS condemnave.s . • • •
PA R TE ESPEC IA E
DOS VERSOS EM CONJUNCTO
L iv ro I - DO — o segundo o venero litterario ^

Titulo I — Do Geuero Epiço ■ ' ' ’ ] . .155


Titulo II — Do Genero Lyrico. • . 1 5 9
Titulo I I I — Do Genero D r a m a t i c o ........................... i5
Titulo IV - DO Genero Satynco
Titulo V — Do Genero Didactico . • ■
Titulo V I - Do Genero H u m o r í s t i c o .........................
L iv ro I I — D os poemas em estrophes ^
Titulo I — Da estrophe em geral ■ • ■ ' ' l85
» l í í = S L T S j Ê S i ^species^de ^phes .186
L iv ro I I I - Dos Poemas de “ form a fix a ^ ^

Titulo I — Generalidades • • • • ' ' ' ' 206


Titulo I I — Dos poemas mais usados. ■ 5
Titulo I I I - Dos poemas menos usados . • • •
L iv ro I V - DO, poemas de form a variavel ^ ^

I — Dos poemas em geral * 2S4


Titulo II — Dos poemas mais em uso • 319
Titulo III - Dos poemas menos usados • ■ • •
L iv ro V - D os poemas cm versos entrelaçados
. T _ T)0S versos entrelaçados em geral . • 3 |
IT \° TT- Dos versos em rimas paralelas .■ • 3f
Titulo I I I ~ Dos versos. branc?s ° U SOlt° S ' 33i
Titulo IV — Do verso livre clássico . •■
í u oV - Do vedso liv re decadente •■■ 33
l í s t e dos autores consultados ou citados . . . . 3

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