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O que é

HISTÓRIA
CULTURAL?
AUTOR: PETER BURKE
APRESENTAÇÃO: JOANA SCHERRER
CARNIEL (UFES)
Peter Burke
→ Historiador inglês nascido em 1937 (82 anos)

→Fez doutorado pela Universidade de Oxford, foi professor de


história das ideias

→Atualmente é professor emérito de Cambridge

→Veio ao Brasil diversas vezes, fala português, foi colunista da


Folha e professor visitante na USP (anos 1990).

→Trabalhos sobre Gilberto Freyre (cultura material)

→Casado com uma historiadora brasileira, a Maria Lucia Garcia


Pallares Burke.
Introdução
→ A história cultural foi redescoberta nos anos 1970 e desde então vem desfrutando
de uma renovação no mundo acadêmico.

→ Objetivo do livro:

Explicar a redescoberta da história cultural

Explicar o que os historiadores culturais fazem

→ Para isso busca combinar duas abordagens: a interna e a externa

17/09/2020
Introdução
O QUE É HISTÓRIA CULTURAL?

Pergunta feita em 1897 por um historiador alemão – Karl Lamprecht.

→ “para o bem ou para o mal, a questão ainda espera uma resposta definitiva”.

→ objetos que podem ser dados como objetos da história cultural: pênis, arame
farpado, masturbação.

Mas ainda assim, sem resposta precisa para uma definição.

Talvez uma solução seria deslocar dos objetos para o MÉTODO. Qual é o método da
História Cultural? Aqui também há dificuldades.

17/09/2020
Introdução
→ alguns trabalham intuitivamente

→ alguns descrevem seu trabalho como a procura de significados

→ alguns focalizam as práticas e representações

“O terreno comum dos historiadores culturais pode ser descrito como a


preocupação com o simbólico e suas interpretações.” (p.10)

A ABORDAGEM do passado em termos de simbolismo é que seria a grande questão


para a História Cultural.

17/09/2020
Introdução
→ Importância da tradição germânica

→ Norte-americanos (Peter Gay e Carl Schorske)

→ tradição francesa – civilização, mentalidade coletiva, imaginário social

→ Annales (Marc Bloc, Lucien Febvre e Le Goff; Fernand Braudel)

*História da história cultural

17/09/2020
Capítulo 1
“A história cultural não é uma descoberta ou invenção nova. Já era praticada na
Alemanha com este nome há mais de 200 anos”. (p. 15)

Burke divide a história da história cultural em 3 fases

1. História cultural clássica (1800 – 1950)

2. A descoberta da cultura popular em 1960

3. A nova história cultural (NHC) a partir dos anos 1970

17/09/2020
História cultural clássica
→ O historiador suíço Jacob Burckhardt – A cultura do renascimento (1860)

→ O historiador holandês Johan Huizinga – O outono da idade média (1919)

Huizinga:

“Que tipo de ideia podemos formar de uma época, se não vemos pessoa alguma
nela? Se só pudermos fazer relatos generalizados, vamos apresentar apenas um
deserto a que chamamos de história”. (p.19)

17/09/2020
Contribuição externa - Sociologia
Max Weber – Ética protestante e o espirito do capitalismo (1904)

→ ponto central da obra (segundo Burke) era apresentar uma explicação cultural para a
mudança econômica

Nobert Elias – O processo civilizador (1939)

17/09/2020
A grande diáspora e a descoberta
do povo
Ideia de “cultura popular”- Alemanha no fim do século XVIII

Ressurgindo na década de 1960

→ Destaque para Edward Thompson, em A formação da classe operária inglesa (1963

Segundo Thompson: “Sem cultura, não há produção”

→ “História vista de baixo”

17/09/2020
Capítulo 2 – problemas da
história cultural
→É preciso questionar as fontes

→“A tentação que o historiador cultural não deve sucumbir é a de tratar os textos e as
imagens de um certo período como espelho, reflexos não problemáticos de seu
tempo”. (p.32 – 33)

→ “Como seus colegas de história politica ou econômica, os historiadores culturais tem


de praticar a critica das fontes, perguntar por que um dado texto ou imagem veio a
existir, e se, por exemplo, seu propósito era convencer o publico a realizar alguma
ação”. (p.33)

17/09/2020
O que é cultura?
Termo “cultura” – problemático

Conceito vago.

Alta cultura, baixa cultura

Na ultima geração a palavra passou-se a referir a uma ampla gama de artefatos


(imagens, ferramentas, casa e assim por diante) e práticas (conversar, ler, jogar).

Os historiadores culturais se apropriaram da noção antropológica de cultura da


ultima geração.

17/09/2020
Capítulo 3 – A vez da
antropologia histórica
“Um dos aspectos mais característicos da prática da história cultural entre as
décadas de 1960 e 1990 foi a virada em direção à antropologia.” (p.44)

→Expansão da cultura

→Popularização do termo cultura

→Explicações culturais

17/09/2020
Capítulo 3 – A vez da
antropologia histórica
“De 30 anos pra cá, ocorreu um deslocamento gradual no uso do termo pelos
historiadores. Antes empregado para se referir à alta cultura, ele agora inclui também a
cultura cotidiana, ou seja, costumes, valores e modo de vida. Em outras palavras, os
historiadores se aproximaram da visão de cultura dos antropólogos.” (p. 47)

Clifford Geertz e sua influência sob os historiadores:

Para Geertz “cultura é um padrão, historicamente transmitido, de significados


incorporados em símbolos, um sistema de concepções herdadas, expressas em
formas simbólicas, por meio das quais os homens se comunicam, perpetuam e
desenvolvem seu conhecimento e suas atitudes acerca da vida”. (p. 52)

17/09/2020
Capítulo 4 –Um novo paradigma?
→ A expressão “nova historia cultural” (NHC) entrou em uso no fim dos anos 1980. A
historiadora note americana Lynn Hunt publicou um livro com este nome.

→ Expressão que teve sucesso nos Estados Unidos, mas foi um movimento
internacional

→A palavra “nova” é para distinguir da clássica em que ele se reporta no primeiro


capítulo.

→A palavra “cultural” – dando ênfase em mentalidades, suposições e sentimentos – a


distingue da história social e da história intelectual (mais antigas e mais precisas).

17/09/2020
Quatro teóricos
Burke foca em quatro autores cujas obras foram centrais para a nova história cultural:

Mikhail Bakthin (1895-1975)

Norbert Elias (1897-1990)

Michel Focault (1926-1984)

Pierre Bourdieu (1930-2002)

17/09/2020
As vozes de Mikhail Baktin
→teórico russo da linguagem e da literatura cujas ideias se tornaram também
interessantes para os estudos culturais.

→Cultura Popular na idade média e no renascimento: o contexto de François Rabelais


(1965)

→Popularizou conceitos como: “carnavalização”, “destronar”, “linguagem do mercado”,


“realismo grotesco”.

→noção de “polifonia”

17/09/2020
A civilização de Nobert Elias
Obra importante: O processo civilizador (1939), publicado em 1939 mas que na década de
1960 teve influencia sobre antropólogos e historiadores culturais.

Traz alguns conceitos chave, entre eles:

“fronteira da vergonha”

“fronteira da repugnancia”

“pressão social pelo autocontrole”

“competição”

“habitus”

“figuração”

17/09/2020
A civilização de Nobert Elias
Críticas:

- deixar de lado a Idade Média

- não falar muito da Itália e de sexo

- superestimar a influência das cortes

- subestimar a influência das cidades

- e a suposição de Elias de que “civilização” seja um fenômeno ocidental.

17/09/2020
O regimes de Michel Foucault
→primeiro filósofo depois historiador (segundo Burke) fez sua reputação estudando a
loucura, as prisões, a vigilância sobre a sexualidade. *destaca-se a preocupação de
Foucault com os excluídos, os marginalizados.

No que se refere a Nova Historia Cultural:

Foucault contribuiu com a crítica a uma história teleológica, rejeitando a correlação entre
história e progresso.

Sua abordagem em termos de genealogia, destaca as rupturas, as descontinuidades


culturais.

Foucault chama os sistemas que utilizamos para classificar as palavras e as coisas de


epistéme, ou regimes de verdade.

17/09/2020
O regimes de Michel Foucault
Em A ordem das coisas (1966) Foucault estuda os “discursos” do século XVII e XVIII.

“O problema para os possíveis seguidores de Foucault é que a noção de discurso para


este autor é ambígua”. (p.75)

“Quantos discursos haviam na França do século XVIII? 3, 30 ou 300?” (p. 75)

→ Destaca também o conceito de prática – ligado a “microfísica” do poder.

→Em Vigiar e Punir (1975) Foucault faz uma série de paralelos entre as prisões, os
hospitais, as escolas, as fábricas e os quarteis como instituições produtoras de “corpos
dóceis’’.

17/09/2020
Os usos de Pierre Bourdieu
• Bourdieu “filósofo que se transformou em antropólogo e sociólogo, não escreveu
história” (p. 76)

→ O conceito de “campo” – literário, linguístico, artístico, intelectual ou científico – refere-se


a um domínio autônomo que, em dado momento, atinge a independência em uma
determinada cultura e produz as próprias convenções culturais.

→Reprodução cultural - processo pelo qual um grupo, mantém sua posição na sociedade
por meio de um sistema educacional, que parece ser autônomo e imparcial, embora na
verdade selecione para a educação superior alunos com qualidades que lhes são
inculcadas desde o nascimento naquele grupo social.

17/09/2020
Os usos de Pierre Bourdieu
→ Outra contribuição é a de “habitus” ou “teoria da pratica” – reagindo à rigidez das ideias
estruturalistas, Bourdieu examinou a prática cotidiana em termos de improvisação

→Juntos, esses quatro teóricos levaram os historiadores culturais a se preocuparem com


as representações e as práticas, os dois aspectos característicos da NHC segundo um de
seus líderes, Roger Chartier.

17/09/2020
Práticas
→Novo paradigma

→Afetou diversos campos, o campo da linguagem, da religião, arte e ciência.

→Criou novas abordagens, como por exemplo a historia das viagens.

→A história das práticas vem tendo impacto sobre campos relativamente tradicionais da
história cultural, como o estudo do Renascimento.

→O estudo das coleções, do supérfluo.

17/09/2020
História da leitura
→Michel de Certeau (teoria cultural) enfatiza o novo foco sobre o papel do leitor

→Roger Chartier – grande historiador da leitura – que compreendeu a leitura como prática
social, bem como noção de que a leitura implica uma elaboração de significados que não
estão apenas nas palavras escritas, mas precisam ser construídos pelo leitor, e os
diferentes significados que cada um se apropria do texto que lê.

→Reações dos leitores aos textos também estão sendo bastante estudadas.

→ Historiadores da Ásia oriental também estão se voltando para a história da leitura.

17/09/2020
Representações
→ Exemplo famoso desse tipo de história é o livro As três ordens (1978), do historiador francês
Georges Duby, um estudo sobre as circunstâncias que cercam a construção da famosa
imagem medieval da sociedade como composta de “três estados”.

→Duby apresenta essa imagem não como simples reflexo da estrutura social medieval, mas
como uma representação, com o poder de modificar a realidade que parece refletir.

→Outra contribuição: Le Goff e o Nascimento do Purgatório (1991)

→Fazendo existir representações da estrutura social, representações do trabalho;


representações das mulheres como deusas, prostitutas, mães ou feiticeiras; e
representações do “outro” (dos judeus pelos gentios, dos brancos pelos negros e assim por
diante).

17/09/2020
Orientalismo na Música
→Edward Said e seu estudo Orientalismo de 1978

→E suas influências em outras áreas (musicólogos), demonstrando a interdisciplinaridade


dos estudos culturais

→Em 1993: Said analisou uma ópera musical (Aída, de Verdi) que demonstrava o
estereótipo ocidental do Oriente, como “um lugar essencialmente exótico, distante e
antigo, onde os europeus podem ostentar certo poder”. (p.87)

17/09/2020
A história da memória
→Exemplo: caso dos protestantes do sul da França, estudados pelo historiador Philippe Joutard.
Ele mostra como, em uma cultura impregnada pelas escrituras, as memórias da perseguição
da comunidade protestante pelos católicos foram contaminadas ou mesmo moldadas por
histórias bíblicas de perseguição ao povo escolhido.

→No interior de cada comunidade, a observação de Geertz – “historia que eles contam sobre si
mesmos” – pode nem sempre ser válida pois católicos e protestantes não contam as mesmas
historias sobre si mesmos, então, complementando Geertz, Burke afirma ser necessário fazer
a grande pergunta social: “De que memória estamos falando?” Homens e mulheres, ou a velha
e a nova geração, podem não se lembrar do passado da mesma maneira. Em uma dada cultura,
as memórias de um grupo podem ser dominantes, e as de outros, subordinadas.

17/09/2020
Cultura material
→A maioria dos estudos sobre cultura material enfatiza o clássico trio de temas —
alimentos, vestuário e habitação — e muitas vezes focaliza a história do consumo.

→Em La culture des habits (1989), o historiador francês Daniel Roche voltou-se para a
história das roupas, por achar que “elas nos dizem muito sobre as civilizações”. Códigos
de vestuário revelam códigos culturais. “Por trás do vestuário”, observa Roche, “é
possível encontrar estruturas mentais.”

→Inclusão do espaço na cultura material – exemplos de Habermas e Foucault

17/09/2020
História do corpo
→Outro domínio muito próspero da NHC

→ Estudo de Gilberto Freyre (1930) estudou as aparências dos escravos nos jornais do
século XIX

→Grande “virada corporal” nos anos 1980.

→Estudos sobre o corpo masculino e feminino, corpo como experimento e como símbolo, o
corpo dos atletas, dos anoréxicos, dos santos, dos pecadores -> Revista Body and
Society (1995).

→A história dos gestos – reivindicação dos historiadores

→Foucault e Bourdieu – rompem com a noção da separação entre mente e corpo

17/09/2020
Revolução na história cultural?
→Tentativa de demonstrar a variedade de abordagens praticadas sob a rubrica da NHC

→Novos temas e novos conceitos foram e estão sendo explorados

→A NHC desenvolveu-se a partir da antropologia histórica

→“Para o historiador, não existem coisas banais”, já que “instrumentos e objetos são
decorrências de atitudes fundamentais perante o mundo”. (p. 97)

17/09/2020
BURKE, Peter. O que é história cultural? 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.

17/09/2020

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