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MÊS DE NOVEMBRO E DEZEMBRO

RELATÓRIO DAS AULAS


INTRODUÇÃO AO DIREITO I

BEATRIZ CORDEIRO JESUS


A22303018
T02P01
Aulas dos dias: 06-11-23 e 13-11-23

Ordens opressivas: as ordens opressivas são sistemas, estruturas ou práticas que exercem
opressão sobre determinados grupos na sociedade, temos como exemplos a prática de Hitler.

A análise formal da Ordem Jurídica é insuficiente para compreender o verdadeiro sentido do


Direito. A Ordem Jurídica, embora tenha estrutura, funções e efeitos, não define objetivamente
o Direito.

A eficácia por si só não é suficiente, sem considerar a carga axiológica do Direito, não seria
verdadeiramente uma ordem de Direito.

Notas Dominantes do Sentido do Direito:

a) Insuficiência Objetiva: é destacada, pois ela não define de maneira objetiva o


Direito. Isso se deve ao fato de que existem ordens sociais que, embora
formalmente semelhantes à Ordem Jurídica, provocam repulsa e estão em
oposição material a ela.
b) Insuficiência da Relação Direito/Estadualidade: apesar da importância atribuída ao
Estado em relação ao Direito, a insuficiência da relação entre eles é destacada. O
autor aponta que diversos sinais relativizam a posição central do Estado, citando
exemplos históricos de estados criminosos organizados para o genocídio. Isso
sugere que a vinculação entre Direito e Estadualidade não é uma característica
inquestionável, enfatizando a necessidade de considerar casos em que o Estado
pode agir de maneira contrária aos princípios jurídicos.

A comparação entre uma Ordem de Direito e a ordem política do Estado não é exata, por três
razões principais:

➢ O Direito e Estado não são entidades idênticas, e a coincidência entre


estadualidade e juridicidade é historicamente acidental, não essencial.
Destaca-se que Direito e Estado são distinguidos devido às suas histórias
distintas, com o Direito antecedendo o Estado, originando-se na Idade
Média com um tipo específico de direito. Assim, a legislação por si só não
engloba todo o Direito, pois existem outras fontes. Mesmo em sistemas
legislativos, o legislador não detém um monopólio, mas apenas uma
prerrogativa na criação do Direito.

➢ Intencional-material entre Estado e Direito- enquanto o Estado é uma


organização de poder político, o Direito é uma ordem normativa. O Estado
não prescinde da coação, esta não define o conceito de Direito. A
racionalidade do Estado é estratégica, voltada para meios e fins, enquanto
a do Direito é uma racionalidade de julgamento, guiada por princípios.

➢ Extensivamente- a ordem de Direito não é criação exclusiva do Estado.


Nem todo o Direito existente é constituído pela imediata mediação do
Estado. O poder político que o Estado titula não é o fundamento da Ordem
Jurídica.

A diferenciação entre Estado e Direito é evidente na expressão "Estado de Direito", que


incorpora duas dimensões: a estadualidade e a juridicidade.
• Estadualidade: a estadualidade refere-se a algo que pertence a um Estado ou que está
relacionado a uma unidade federativa, como um Estado dentro de um país.
• Juridicidade: a juridicidade refere-se á conformidade com as normas e princípios do
Direito. Ou seja, algo que possui juridicidade está em conformidade com a lei e
regulamentos estabelecidos pelo sistema jurídico.

Isso significa que essas duas dimensões estão inter-relacionadas, estabelecendo uma conexão
entre duas realidades distintas. Além disso, argumenta-se que se todo o Direito fosse
exclusivamente estadual, o poder seria seu único fundamento, o que não é o caso. Destaca-se
que o poder político não é o alicerce do Direito, valores jurídicos transcendem a legalidade,
exigindo que uma ordem de Direito esteja inserida no universo da validade, indo além da
simples criação normativa do Estado.

Estado-de-Direito de legalidade formal: refere-se a um sistema em que o poder do governo é


exercido de acordo com leis já estabelecidas, e essas leis são aplicadas de maneira justa e
consciente.

Estado-de-Direito material, ou de justiça: o Estado-de-Direito material vai além da legalidade


formal, incorporando princípios substantivos de justiça e direitos fundamentais.

c) Dimensão Normativa:

Normatividade material:

Sem a normatividade material, não há uma verdadeira Ordem de Direito.

É na normatividade do Direito que podemos reconhecer o sentido do Direito.

A normatividade tem três elementos:

• Imanência intencional da ordem jurídica.


• Intenção normativa fundamentante.
• Validade do Direito.

A dimensão normativa confere sentido ao Direito na Ordem Jurídica, sendo a característica


distintiva entre ordens jurídicas e outras formas de organização.

A intenção normativa, fundamentada em valores críticos, determina a materialidade


normativa da Ordem Jurídica. Essa intenção é vital para a sobrevivência de uma ordem
jurídica, pois ela se mantém vigente ao se apoiar em valores discernidos e mobilizados
pelos destinatários, refletindo a exigência concreta de uma comunidade para realizar seus
princípios na prática. É uma exigência que se funda em valores e que uma comunidade
histórica-socialmente concreta pretende que se realize na prática. Refere-se em suma á
intenção por trás da criação de uma norma ou lei.

o A Dimensão Regulativa do Direito destaca que este não se resume a normas já


existentes, mas é uma intenção e ideia regulativa. Isso é evidenciado na resolução de
lacunas legais, pois o Direito não está completo no que já foi constituído.

A normatividade prática do Direito reside na dimensão regulativa, onde uma ordem


jurídica não é apenas uma ordem estabelecida, mas uma ordem em constante processo de
constituição ou reconstituição.
O Direito é moldado pela intervenção de um regulativo que orienta essa evolução contínua
da Ordem Jurídica.

A constituição do Direito está relacionada ao que as pessoas, de maneira intersubjetiva-


intencional, desejam que seja direito, não apenas ao que é direito. Assim, o direito não é um
objeto estático, mas um projeto normativo baseado em valores que identificam o sentido do
Direito. A intenção normativa deve transcender a normatividade assimilada em determinado
momento histórico.

Em suma: A normatividade em si mesma é um processo em constante formação.

A axiologia que fundamenta a validade de uma Ordem Jurídica vai além do constituído, sendo
transpositiva, o que significa que transcende o plano do pré-objetivado. Nesse sentido, o
Direito é mais do que o que se objetiva em um momento específico.

A dimensão normativa do Direito envolve uma intenção crítico-regulativa, essencial para


decidir os casos contemporâneos.

O Direito é caracterizado como intenção, não objeto, pois sua normatividade expressa um
dever ser que transcende o ser atual, sendo um potencial ser que está em processo de
manifestação, ainda não totalmente atualizado.

o Direito, como ordem de validade, é reconhecido como tal quando nos percebemos
mutuamente como pessoas, não meros objetos de sua imperatividade. Os valores
desempenham um papel crucial no "Direito do Direito", sendo o alicerce de uma
ordem que, mesmo ao nos vincular e sancionar, reconhece, destaca e respeita a
autonomia ética de cada indivíduo.

A Ordem Jurídica torna-se uma ordem de Direito quando é fundamentada em valores éticos.
Esse fundamento legitima a obrigação que ela nos impõe.

Quando essa ordem jurídica demonstra uma validade que reconhece nossa condição como
pessoas, é percebida como uma ordem de Direito, e compreendemos seu significado ao nos
identificarmos com ele.

Ordem Jurídica: uma ordem jurídica tem uma dimensão prescritiva.

A ordem jurídica para que seja considerada como autêntica de Direito tem de ter uma
normatividade material vigente.

Uma Ordem jurídica é uma instituição.

• Dimensão prescritiva: distingue o válido do inválido, o lícito do ilícito.

Refere-se á capacidade do Direito de estabelecer regras, normas e prescrições que orientam o


comportamento dos indivíduos e das instituições numa sociedade.

• Dimensão normativa: refere-se á capacidade das normas jurídicas de prescreverem


comportamentos, estabelecerem padrões e regularem as relações na sociedade.

A ordem jurídica louva-se em 2 tipos de valores:

• Valor critico reflexivamente discernido: no momento da sua constituição.


• Valor espontaneamente mobilizado: no momento da sua atuação.
O direito é uma normatividade que opera no contexto societário, isto é, a sociedade é o
ambiente em que o Direito existe e atua.

Diante disso, surge a indagação sobre a natureza desse ambiente e o papel que o Direito
desempenha nele.

A sociedade é definida como a realidade da convivência humana, proporcionando aos seus


membros uma autonomia específica e objetiva. Nesse contexto, os membros da sociedade
estão interligados por meio de formas comuns de convivência, fins ou intenções gerais,
formando uma realidade unitária compartilhada.

A sociedade, conforme definida, representa o ponto de convergência para a convivência


humana.

Essa definição destaca dois aspetos essenciais:

o Além das Individualidades: A realidade social transcende a simples soma das


individualidades, não sendo apenas um encontro de pessoas.
o Preservação da Individualidade: Contudo, o componente comum não pode ser tão
predominante a ponto de suprimir a individualidade de cada membro. A
verdadeira sociedade equilibra a autonomia dos indivíduos, permitindo relações
autênticas entre cidadãos.

Durkheim estabeleceu formas de socialização para exemplificar essa dinâmica:

• Sociedade Mecânica: Ocorre quando os indivíduos se associam com base no que têm
em comum, coordenando esforços para alcançar uma tarefa ou interesse
compartilhado.
• Sociedade Orgânica, ou sociedade por diferenciação, refere-se à especialização
profissional e à interdependência mútua resultante. Essa forma de sociedade,
predominante nas sociedades contemporâneas, destaca-se pela clara divisão social do
trabalho.

Em resumo, a sociedade é uma rede intricada de interações, onde, materialmente, existimos


como indivíduos, mas estamos interagindo de maneiras complexas, sendo a sociedade
marcada pela especialização e interdependência.

Na estrutura social, os indivíduos são posicionados por meio de estatutos e papéis inter-
relacionados.

Os estatutos, representados por categorias nucleares, definem a posição de cada pessoa na


sociedade, influenciando e sendo influenciados pelos papéis desempenhados.

Os papéis são as atuações específicas derivadas desses estatutos, enquanto a individualidade


de cada pessoa se destaca além desses papéis.

Assim, nas relações sociais, o foco recai nos estatutos assumidos e nos papéis desempenhados.
Esses elementos estão em constante interação e projetam uma concordância de
correspondências mútuas.

Além disso, os valores atuam como um elemento crucial na coesão social, identificando o
consenso comunitário e desempenhando um papel fundamental na integração comunitária.
Uma sociedade não é apenas uma realidade integrativa; o consenso e o conflito são elementos
complementares na sua definição.

O consenso e o dissenso são vetores constitutivos da sociedade, fechando-se no acordo, mas


abrindo-se à mudança e evolução histórica por meio do antagonismo.

• Consenso: o consenso refere-se á aceitação geral ou acordo comum sobre


determinadas normas, valores ou princípios legais.
• Dissenso: refere-se á falta de acordo ou discordância sobre determinadas questões
legais, normas ou políticas.

Essa dialética de equilíbrio instável destaca a complementaridade do modelo de conflito na


compreensão da sociedade. O conflito é essencial para a realização da justiça, mobilizando o
Direito como referente integrante. Cada conflito contribui para enriquecer a normatividade,
identificando novas experiências para fortalecer o corpus iuris.

A tríade - coexistência, correlação e convivência - destaca diferentes formas de interação


social.

o Coexistência: Refere-se ao encontro mais desintegrado, onde elementos estão


espacialmente próximos, mas humanamente separados. Na coexistência, as pessoas
estão fisicamente juntas, mas ignoram-se mutuamente, revelando uma justaposição de
impedimentos. Surge a indiferença e ignorância recíproca, em vez de solidariedade.

Essa explicação destaca a natureza superficial e impessoal da coexistência, onde a


proximidade física não se traduz em interações significativas.

o Correlação conforme Hegel, representa uma pluri dependência em que minha situação
condiciona a do outro, e vice-versa, caracterizando uma mútua dependência
semelhante à interação de Max Weber. As relações de correlação surgem das
carências, e nesse contexto, interagimos uns com os outros por meio da mediação das
coisas. Essa explicação destaca a interdependência mútua que define a correlação
social.
o Convivência ocorre quando há um sentido real no uso do termo "nós". Esse "nós" é
afirmado quando existe um elemento comum que integra e supera as unidades
individuais, mantendo a singularidade de cada pessoa sem perder o sentido do eu. Em
resumo, a convivência implica na coexistência harmoniosa de identidades individuais
dentro de uma unidade compartilhada.

O Direito desempenha o papel de tecido conjuntivo e subsistema normativo regulador nas


relações sociais. Ele atua como o mecanismo que a sociedade utiliza para alcançar uma
integração harmônica das diversas afirmações individuais, seja na perspetiva do consenso
ou do dissenso.

O Direito não pode eliminar todos os conflitos, já que nossa posição pessoal pode divergir
da posição social, e os papéis decorrentes de vários estatutos podem colidir. Considerando
a sociedade de forma estrutural, o Direito é o sub-sistema mobilizado para gerir esses
desafios.

Os elementos materiais irredutíveis da sociedade incluem interesses (dimensão


econômica), poder (dimensão política) e valores (dimensão axiológica cultural).
Essa abordagem destaca a complexidade do papel do Direito na sociedade, lidando com os
diferentes aspetos econômicos, políticos e culturais que a constituem.

o O interesse está relacionado com nossa conexão com o mundo, representando o


que está entre nós e o mundo, ligando-nos a ele como objeto de apetência. Todos
têm interesse no mundo para satisfazer necessidades e alcançar realizações
pessoais, manipulando o mundo para atingir tais objetivos. Até outras pessoas
podem ser objetos de interesse, sujeitas a manipulação.
o Poder: define a dimensão política da sociedade. Refere-se á capacidade de
influenciar, tomar decisões ou controlar recursos dentro do contexto legal e social.
o Valores: são a expressão da dimensão axiológica-cultural da sociedade. Referem-se
aos princípios fundamentais e crenças que orientam as normas e decisões legais.

Em suma, a sociedade é, portanto, a teia integrante das nossas interações.

Resumidamente, diante da escassez de bens, surge o interesse crescente.

A ciência econômica estuda como resolver esses problemas em termos de eficiência


pragmática, enquanto o Direito intervém para estabelecer a distribuição mais válida desses
bens com fundamentação normativa.

A economia preocupa-se com a instrumentalização eficiente de objetos, enquanto o Direito


cuida da distribuição intersubjetiva e normativamente fundamentada de bens escassos, em
termos de autêntica validade prática.

o A política envolve a organização da sociedade para afirmar sua identidade. Nessa


dimensão, a sociedade estrategicamente define seus objetivos fundamentais. O
poder, por sua vez, é a encarnação da política, representando a institucionalização
da dimensão política de uma sociedade. Em suma, a política guia a organização
social para a afirmação coletiva, enquanto o poder é a manifestação institucional
dessa dimensão política.
o A cultura, representando o sistema de valores e significados de uma sociedade, é
fundamental para as interações humanas. A ação humana pressupõe uma
fundamentação cultural, pois os fundamentos são fornecidos pela cultura, que se
estende como uma tradição hermenêutica.

Na relação entre o Direito e essas dimensões, o Direito atua como um articulador, sendo um
critério sobre interesses dentro de um contexto de poder. Ele sintetiza seletivamente valores,
julgando o mérito relativo dos interesses, exercendo uma função crítica sobre o poder.

Em resumo, no âmbito cultural, o Direito é um articulador autonomamente intencional,


sintetizando as diversas dimensões materialmente constitutivas da sociedade. Ele se afirma
como o resultado da interseção diferenciadora, mediada noeticamente, dessas dimensões. A
ordem de direito em constante constituição reflete o princípio de que um arco muito tenso se
rompe, destacando a necessidade de equilíbrio na complexa interação das dimensões sociais.

Superestrutura: aspetos mais amplos que influenciam ou são influenciados por uma estrutura
legal, como a cultura, política e a economia.

Infraestrutura: refere-se geralmente aos elementos fundamentais e estruturais que sustentam


o funcionamento do sistema legal e da sociedade como um todo.
Há teses que indicam que o direito é uma função puramente dependente da sociedade, sendo
um mero reflexo dos elementos materiais constitutivos da sociedade.

Se tivermos em conta essas perspetivas, o direito seria completamente subordinado à


economia, política e cultura, sendo considerado uma realidade fraca, determinada pelas mais
fortes como foi mencionado anteriormente. Essa visão nega qualquer autonomia intrínseca ao
Direito.

Redução do direito á economia:

O economicismo defende a redução do Direito à normatividade econômica, considerando-o


apenas como expressão normativa das relações econômicas.

• Economismo: o economismo refere-se á visão que atribui uma explicação ou solução


predominante aos problemas sociais e políticos com base exclusivamente em princípio
económicos, desconsiderando aspetos como culturais, sociais ou políticos.

Essa perspetiva, exemplificada pelo marxismo originário, vê o elemento econômico como


determinante, relegando o Direito a uma posição subordinada na superestrutura da sociedade.

A história ensina-nos que a relação entre a estrutura econômica e a dimensão ético-jurídica da


sociedade tem variado ao longo do tempo.

Durante a expansão do capitalismo e na Idade Média, o domínio não era exclusivamente


econômico, mas sim ético-jurídico-religioso.

A autonomização da economia só ocorreu nos séculos XVIII-XIX, em estreita ligação com o


individualismo. Embora o referente decisivo hoje seja o econômico, isso nem sempre foi o
caso. Portanto, a relação entre o econômico e o ético-jurídico tem evoluído ao longo da
história.

A racionalidade econômica baseia-se na racionalidade da mera eficiência pragmática, onde a


escolha do meio será a mais eficaz para satisfazer os nossos interesses, é fundamental devido à
escassez de recursos. Essa racionalidade é funcional, instrumental de meios e fins,
caracterizando-se como uma racionalidade técnica. Se a sociedade fosse completamente
dominada pela economia, haveria apenas uma racionalidade técnica.

Entretanto, essa racionalidade técnico-funcional não se afirma como exclusiva, visto que, os
interesses não podem ser avaliados apenas em termos de eficiência pragmática. É necessário
considerar a validade da satisfação desses interesses, incorporando as exigências constitutivas
da prática humana e da significação da vida. Com a pura racionalidade técnico-pragmática,
característica do economicismo que tende para a instauração de um horizonte humano
dominado pela ideia de performance.

Em suma: O domínio ético-jurídico não é exclusivamente determinado pelo econômico.


Considerando que a relação entre o jurídico e o econômico varia ao longo do tempo e que suas
intenções são distintas (eficiência para o econômico, validade para o jurídico), fica evidente
que o econômico não reduz, teórica ou historicamente, a esfera ético-jurídica. Ambos os
domínios precisam ser considerados independentes.

Redução do direito á política:

A relação entre Direito e política existe, mas isso não implica uma identificação necessária
entre os dois, a nossa cultura é caracterizada por um tendencialmente indisfarçável
esvaziamento cultural. A identificação só ocorre se o homem desejar. Há divisão de opiniões
sobre esse ponto: alguns veem a política como a chave da salvação, enquanto outros a criticam
o poder puro e simples, defendendo o Estado de direito material. A questão permanece sujeita
à perspetiva e preferências individuais.

“O Direito não se reduz à política (ao poder)”

Devido às diferentes racionalidades entre eles. Enquanto a política é uma estratégia


finalisticamente prosseguida, o Direito, como normatividade, é universal e fundamentado
dialogicamente. Ao longo da história, política e direito mantiveram-se distintos:

- Na época pré-moderna, o Direito natural opunha-se à política, usando os seus critérios para
avaliar as estratégias políticas, em um momento seguinte, o Direito identificou-se com a
legalidade, e os valores de igualdade, liberdade e segurança eram compartilhados entre o
jurídico e o político, essa coincidência acabaram quando a lei deixou de ser o estatuto
universal, transformando-se em instrumento político, perdendo seu papel filosófico na vivência
comunitária.

Concluindo, o Direito distingue-se da legislação política. Nem todo Direito provém da


legislação política, e a lei não engloba todo o Direito. Enquanto o poder invoca a normatividade
para legitimar-se, a normatividade precisa do poder para existir e subsistir.

Redução do direito ao axiológico- cultural

Contra as visões clássicas que retratavam o homem como teorético, acabado e contemplativo,
a perspetiva contemporânea destaca a personalidade, a historicidade e a transracionalidade da
transcendência do ser humano. Isso justifica a inclusão do jusnaturalismo. Ao circunscrever o
Direito no axiológico-cultural, concluímos que o Direito, embora envolva valores, não se reduz
a eles. Para ser eficaz, o Direito precisa ser também vigente, não se limitando nem ao
econômico, nem à política, nem ao axiológico-cultural. Ele representa uma dimensão
fundamental na humanização da realidade social, indo além dos elementos materiais
constitutivos da sociedade.

Diferença entre positivismo e positividade:

A positividade não se deve confundir com o positivismo, pois o positivismo identifica uma
degenerescência da positividade e a positividade não é antinómica da dimensão de dever-ser
do Direito contra o dualismo jusnaturalista, nós reconhecemos uma tensão constitutiva
fundamentante no próprio Direito positivo.
20-11-23. Outro dia
Epimerismo: o epimerismo refere-se a uma dimensão constitutiva de um discurso
pedagogicamente estruturado

Direito:

O Direito é uma validade normativa em continuo processo de realização problemático.

O Direito é uma instância critica.

• Dizer que o Direito é uma instância critica significa que ele desempenha um papel de
avalização e analise critica em relação às normas, instituições e práticas socias.

O Direito apresenta uma dimensão problemática.

• Dimensão problemática do Direito: refere-se á complexidade e aos desafios inerentes


ao campo do Direito.

A função específica do Direito na sociedade está relacionada com as três condições


fundamentais para sua emergência:

• Condição mundanal: refere-se ao contexto ou ambiente global em que o direito opera


• Condição antropológica: pode aludir às características inerentes aos seres humanos
que moldam a forma como o direito é concebido e aplicado.
• Condição ética: diz nos que para que uma ordem seja considerada de Direito implica
que as pessoas se compreendam como seres de liberdade, dialoguem trocando
exigências e reconheçam-se reciprocamente responsáveis. Quando essa compreensão
coletiva existe, pode-se afirmar que a ordem é uma autêntica Ordem de Direito.

Em suma: As condições mundanal, antropológica e ética devem verificar-se cumulativamente


para que o Direito possa emergir.

A estabilidade das condições mundanal e antropológica contrasta com a condição ética, que se
baseia em uma auto-pressuposição axiológica, relacionada com a compreensão do homem
sobre si mesmo e sobre os outros.

A rutura de qualquer dessas condições torna o Direito impossível.

O Direito fundamenta a prática humana, e ao questionar seu fundamento, deparamo-nos com


o "Por Que" do Direito.

Na compreensão contemporânea do homem como pessoa, essa auto-pressuposição axiológica


constitui o fundamento originário do Direito.

Na Época Clássica Pré-moderna, o homem vivia em uma ordem pressuposta, sendo intérprete
dessa ordem. O Direito, nesse contexto, derivava da translegalidade da ordem natural,
desempenhando a função de explicitá-la declarativamente, refletindo a função humano-social
de esclarecer essa ordem pré-suposta.

Na Época Moderna, o homem era caracterizado pela dúvida universal e crítica radical,
adotando uma postura revolucionária. Esse homem moderno procurava repensar tudo a partir
do zero, ao absolutizar a sua liberdade racional. Na visão desse homem, a ordem político-
jurídica era resultado da deliberação humana. Ao contrário da época pré-moderna, em que a
ordem já estava instituída, agora o homem moderno constituía essa ordem, sendo sua vontade
instituinte criadora do Direito Ex Novo. O "Para Que" do Direito moderno era a universalização
da liberdade, instituindo uma legalidade que articulava as liberdades de forma universal.

Atualmente, com a transformação da liberdade de um estatuto universal que enquadra a ação


concreta para um instrumento de intervenção social e critério imediato da ação concreta, o
direito ainda é associado à lei, mas esta adquiriu um significado diferente. Na época moderna,
a lei era um estatuto abstrato que enquadrava a ação humana; hoje, a lei é um verdadeiro
programa para a ação concreta, perdendo a universalidade que possuía antes e apresentando
uma notória contingência e relatividade. Diante disso, compreende-se que a lei tenha deixado
de ser um absoluto universal para se tornar um instrumento ideológico ou tecnológico. Surge,
então, a questão sobre o "Para Que" do Direito nesse período: ele terá uma função específica
na sociedade humana ou seu propósito se esgotará numa redução a um mecanicismo de
intervenção ideológico-politicamente condicionado ou tecnológico-socialmente determinado?

Função integrante:

O Direito desempenha uma função integradora, tornando possível a convivência de diversos


indivíduos em um contexto comum. A ordenação integradora é essencial para a vida em
comum, permitindo a convivência de diferentes seres de forma comunitariamente integrada.
Isso é crucial, uma vez que, mesmo sendo seres indeterminados, a convivência só se torna
possível quando há integração comunitária, possibilitando o encontro apesar das divergências
individuais. Logo, o Direito desempenha um papel significativo.

A função do Direito inclui três subfunções essenciais.

Subfunção de Tutela:

Em cada cultura, existem valores, bens jurídicos e interesses considerados intocáveis. O Direito
desempenha o papel de defini-los e sancionar comportamentos que os violem.

Essa subfunção é comparada a uma função de imunização, protegendo o sistema social contra
violações dessas exigências. Exemplos desta subfunção é o Direito Penal.

Subfunção de Resolução de Conflitos de Interesses:

O Direito desempenha um papel crucial na distribuição de bens e serviços, fornecendo critérios


para resolver conflitos de interesses que possam surgir nesse contexto. Embora busque a
prevenção de conflitos, o Direito também possui critérios para lidar com disputas emergentes.
Essa subfunção é particularmente evidente no âmbito do Direito privado, abrangendo áreas
como o Direito Civil e Comercial.

Subfunção de Garantia:

O Direito desempenha uma essencial subfunção de garantia ao institucionalizar e,


simultaneamente, limitar o poder. Esta subfunção é normativamente objetivada pelo Direito
Constitucional e o Direito Administrativo também desempenha um papel relevante nesse
contexto. Ao criar padrões e obstáculos, o Direito não apenas limita o poder em benefício dos
indivíduos, mas também possibilita sua atuação ao definir e estabilizar os parâmetros para a
ação.
As subfunções de tutela, resolução de conflitos e garantia conectam-se, contribuindo para
viabilizar a convivência humana e proporcionar segurança na diversidade de perspetivas
sociais.

Essas funções são uma concretização do sentido do Direito, refletindo o efeito imanente da
Ordem Jurídica formalmente considerada.

Função Integrante Formalmente Negativa:

A função integrante formalmente negativa do Direito atua de maneira restritiva. O Direito, ao


titular valores e interesses fundamentais, proíbe sua transgressão, evitando a violação desses
princípios. Ao fornecer critérios para a distribuição de bens e resolver conflitos de interesses,
previne perturbações injustificadas nas posições jurídicas individuais. A consagração do
princípio da legalidade da incriminação também limita a legitimidade punitiva do poder. No
entanto, surge a questão: será que o Direito desempenha exclusivamente uma função
negativa?

Função Positiva do Direito:

Na contemporaneidade, vivemos em um estado social que procura realizar objetivos de


desenvolvimento e bem-estar, especialmente em prol dos mais necessitados. No entanto, essa
função não é simples, pois o Direito corre o risco de se tornar instrumentalizado e perde a sua
autonomia assim serve apenas como meio para cumprir a estratégia do poder.

A autonomia do Direito é crucial para assegurar que ele não seja um instrumento do programa
socioeconômico-político, e sim um regulador que assimila e realiza valores fundamentais,
como a vida, a validade dos meios para atingir os fins, a liberdade e a igualdade. Essa
assimilação, destaca a sua função positiva na sociedade, contribuindo para a afirmação e
realização desses valores na comunidade.

A função positiva do Direito na contemporaneidade é delineada por dois momentos:

1. Momento Regulativo-Constitutivo: O Direito identifica o último referente significativo


da prática, transformando-o em um critério positivo. Esse referente atua um regulativo
intencional antes de ser um critério objetivado. O sistema jurídico, para manter-se
vigente, precisa além do já adquirido.
2. Momento sancionatório: este momento envolve a imposição de penalidades ou
sanções quando as normas jurídicas não são cumpridas em geral ou corretamente.

Esses princípios constituem uma intenção regulativa autêntica e são reconhecidos pelo
homem contemporâneo como fundamentais para a criação de qualquer ordem jurídica em
formação. Esses princípios não são estáticos, são dinâmicos e incorporam a intenção regulativa
necessária para a subsistência do sistema de juridicidade.

Em suma

- Se os vemos como constituidor, estamos a afirmar a função integrante do Direito;

-Se os compreendemos e assumidos como fundamentais de uma ordem jurídica, estamos a


reconhecer a existência de uma normativa axiologia intencionalmente subsistente e a sublinhar
a função regulativo-constitutiva do Direito, pois estamos a dizer que é por petes princinins que
o homem-pessoa se deve orientar para constituir um renovado sistema de Direito, consonante
com as intenções normativas desse tempo novo e, portanto, intencionalmente adequado aos
problemas.

De tudo o que acaba de dizer-se pretendemos acentuar três notas:

- O Direito não se reduz aos critérios jurídicos pré-objetivados;

-A constituição de um novo sistema de Direito, na medida em que pressupões os mencionados


referentes de sentido, é sempre uma reconstituição;

- A função regulativa aponta o caminho para o Direito a constituir, porque nela vão pensados os
valores e princípios conformadores do sentido último da ideia do Direito.

Função regulativa do Direito:

Atualmente o Direito assume uma função de validade perante a política, destacando-se como
uma instância regulativa crítica. Como uma intenção regulativa, os princípios e valores do
Direito funcionam como critérios de validade e crítica para a convivência social e o poder
político. Em sociedades fragmentadas, o Direito é crucial como o último critério de validades
comunitárias que podem ser consideradas universais. Ao mobilizar valores universais e agir por
meio de instituições que os convocam, o Direito mantém uma dimensão axiológica e
desempenha uma função viabilizadora da comunicação intersubjetivamente significativa. Como
instância crítica, o Direito, mesmo sem o uso da força, atua como a má consciência do poder,
utilizando seus princípios para julgar a validade de diversas posições jurídicas.

O Direito e o Homem:

Época clássica pré-moderna:

• Direito: o Direito encontrava o seu critério na trans legalidade da ordem natural e era,
portanto, uma mera instância de explicitação da ordem jurídica.

Época moderna:

• Homem: o homem moderno era o homem da dúvida universal e da critica radical.

Época moderno-iluminista:

• Direito: o Direito era a lei.

O Direito era um normativo universal que se exprimia a liberdade.

O Direito constituía a universalização da liberdade.

• Homem: autonomia do homem (isto quer dizer que o homem que instituía a sua
própria ordem, que se dava a si mesmo a sua lei, que era legislador de si mesmo).
Jurista: o jurista, apesar de se centrar nas controvérsias de quid iuris, não poderia ignorar a
questão do quid ius.

• Quid iuris: “O que é o Direito?”.

Geralmente, usada para expressar a questão essencial ou o ponto central relacionado a uma
situação jurídica.

• Quid ius: “O que é o Direito?”.

Aborda também, a questão fundamental sobre o Direito a as suas implicações.

De tudo o que foi dito, acentuamos três notas:

• A primeira, é a de que o Direito não se reduz aos critérios jurídicos pré-objetivados.


• A segunda, é a de que a constituição de um novo sistema de Direito, na medida em
que pressupõe os mencionados e contituendos referentes de sentido, é sempre,
autenticamente, uma reconstituição.
• A terceira, identifica uma remissão:

A função regulativa, aponta o caminho para o Direito a constituir, porque nela vão pensados os
valores e princípios conformadores do sentido último, da ideia do Direito.

27-11-23
Positivismo Jurídico no Século XIX:

O século XIX destaca-se como a era do positivismo, proporcionando um referencial histórico


crucial para compreender as questões jurídicas contemporâneas.

A herança do positivismo jurídico é fundamental para avaliar os motivos da abordagem


positivista, não é suficiente para lidar com as complexidades da atualidade. O positivismo
jurídico, característico do século XIX, como referido acima, fundamentava-se na ideia de que o
Direito era estabelecido pelo poder legislativo, tornando-se um dado pré-suposto para juristas
e cidadãos.

Para o positivismo, o Direito era um objeto de conhecimento, rompendo com tradições


anteriores. Ao contrário da visão anterior, que considerava o Direito como uma normatividade
complexa em constante construção pelos juristas, o positivismo identificava o Direito com as
leis impostas pelo Estado.

Na época pré-positivista, o Direito era entendido como um problema prático e uma construção
contínua no contexto da resolução de problemas jurídicos relevantes, integrando o domínio da
filosofia prática. Contudo, o positivismo separou o Direito do pensamento jurídico, dualizando
a compreensão, pois, enquanto o Direito continuava a ser uma tarefa prática, o pensamento
jurídico adquiriu um caráter teórico.

A transição para o positivismo envolveu três fases distintas:

Época Clássica Romana do Pensamento Jurídico:


Na Época Clássica Romana, o Direito era fundamentado na prudência das situações concretas,
sendo o Direito Romano caracterizado como uma "Iurisprudentia".

O pensamento jurídico romano era casuístico e centrado em problemas específicos.


Inicialmente, as fontes legais eram limitadas, uma vez que os juristas desempenhavam
eficientemente o papel de fornecer o Direito aos cidadãos.

Os juristas romanos alegavam não criar o Direito, mas sim revelá-lo, destacando a ideia de que
sua função era interpretar e aplicar as normas existentes de maneira apropriada às
circunstâncias.

Época Medieval do Pensamento Jurídico:

Na Época Medieval, o direito continua a ser "Iurisprudential", semelhante à época clássica


romana, mas agora fundamenta-se numa hermenêutica de textos, especialmente no Corpus
Iuris Civilis e no Corpus Iuris Canonici.

A interpretação desses textos era guiada pelo método escolástico, uma dialética problemática
que começava com a apresentação da questão, tomava uma posição provisória, discutia essa
posição usando textos de autoridades para chegar a uma conclusão.

O pensamento jurídico medieval lia o Direito nesses textos, mas não afirmava que o Direito
fosse constituído exclusivamente por eles, diferenciando-se assim do positivismo anterior. Na
época medieval, o texto era considerado uma manifestação de algo além dele: os valores
fundamentais da filosofia prática da época. Estes princípios identificavam a dimensão
autenticamente constitutiva do Direito medieval.

Época Moderna:

Na época moderna, o pensamento jurídico rompeu com as tradições anteriores e passou a


compreender o Direito como uma construção dedutiva baseada em uma racionalidade
axiomaticamente afirmada.

Três razões fundamentais contribuíram para essa mudança:

1. O homem moderno liberou-se da transcendência teológica medieval, procurando


construir uma nova ordem a partir de si mesmo.
2. O humanismo moderno enfatizou os valores da contingência humana, levando ao
surgimento de uma racionalidade sistemática.
3. A ciência moderna adotou a racionalidade dedutiva cartesiana para afirmar-se. O homem
moderno via a verdade na estrutura racional do sujeito pensante e utilizava o mundo
como meio para atingir seus fins.

Até a época moderna, o Direito não se distinguia da filosofia prática.

O positivismo introduziu uma nova conceção, rompendo com a imposição das coisas e
atribuindo a constituição do Direito à vontade política do poder legislativo. Apesar de
continuar identificando o Direito com a lei, essa relação já não se confunde com a lei
moderno-iluminista, marcando assim uma mudança significativa no entendimento do Direito.
Fatores Determinantes do Positivismo Jurídico:

1. Fator Filosófico-Cultural Geral:

- Na época moderno-iluminista, o pensamento humano-cultural passou por uma


transformação significativa. Antes desse período, o homem encontrava o seu sentido fora de si,
mas na Idade Moderna, o homem começou a compreender-se a partir de si mesmo, agindo
com autonomia. Enquanto o homem pré-moderno se reconhecia pela transcendência de uma
ordem natural ou teológica, o homem moderno atuava sua liberdade racional, procurando
construir uma nova ordem a partir de si mesmo.

2. Fator Antropológico:

- O homem moderno, caracterizado pela atuação da liberdade racional, representou uma


mudança antropológica significativa. Passou-se de uma orientação externa para uma
compreensão interna (imanência), onde a razão e a autonomia se tornaram centrais. Esse fator
antropológico foi fundamental para a emergência do positivismo jurídico, que atribuiu a
constituição do Direito à vontade política do poder legislativo.

3. Fator Cultural - Secularismo Moderno:

- A secularização, corrente que dispensa os valores religiosos e reconhece os valores temporais,


históricos e seculares, marcou uma mudança cultural. Os valores não eram mais vistos como
projeções divinas, mas como intrínsecos ao mundo histórico. Nesse contexto, o homem
assumiu a responsabilidade por esses valores, afastando-se de Deus. Essa transformação
cultural teve uma patologia no secularismo, que rompeu completamente com a
transcendência, defendendo que o homem podia dispor livremente de sua prática, afastando-
se não apenas de Deus, mas de qualquer dogma religioso.

➢ Racionalismo:

- O pensamento moderno caracterizou-se pelo racionalismo, doutrina que defende a primazia


da razão. Ao contrário da racionalidade pré-moderna, que procurava fundamentos externos, a
racionalidade moderna afirmava-se como autossuficiente, procurando construir o mundo a
partir de seus próprios axiomas. Essa abordagem dedutiva visava criar sistemas coerentes,
assemelhando-se à estrutura das cadeias dedutivas presentes na matemática e nas ciências
físico-naturais. A hipertrofia moderna revela-se no racionalismo, onde a razão transforma-se
em fundamento de si mesma, em contraposição ao mundo exterior. Esse racionalismo
prenunciava a legislação, exemplificado pela imposição de códigos antes da aplicação,
refletindo o modo de pensamento moderno-iluminista, que conferia ao legislador um papel
central na conceção do Direito natural moderno-iluminista.

➢ Historicismo:

- Historicidade refere-se à qualidade do que é histórico, reconhecido como pertencente ao


passado. O pensamento moderno-iluminista gerou uma patologia da historicidade chamada
historicismo. Essa doutrina sustenta que os fenômenos históricos são únicos, cada época deve
ser estudada conforme seus próprios ideais, fragmentando a visão global da história. O
historicismo abre caminho para o positivismo jurídico. Um fator social crucial nesse contexto
foi a liberdade, vontade e razão, cujo conteúdo material estava ancorado nos interesses
econômicos. A emancipação dessas restrições religiosas revelou os interesses econômicos, e a
autonomização do econômico impulsionou o surgimento do capitalismo.
Em suma:

O homem moderno, impulsionado por um radicalismo voluntarista, manifestou várias


hipertrofias ao projetar-se em construções que superavam os antigos paradigmas:

- Afirmou a autonomia, mas hipertrofiou-a no individualismo;

- Insistiu na secularização e caiu no secularismo;

- Propôs a racionalização e cedeu ao racionalismo;

- Libertou os interesses e precipitou-se no economicismo;

- Divorciou a ciência da sabedoria, instaurando a era do cientismo.

A necessidade de construir um sistema político-social a partir da vontade racional do homem,


moldado à sua própria imagem, é um problema tipicamente moderno. Para resolvê-lo, o
homem moderno-iluminista teve de criar um modelo.

Contratualismo: Origens do Direito no Pensamento Moderno Iluminista:

O modelo que emergiu para resolver o desafio de construir um sistema político-social baseado
na vontade racional do homem foi o contrato social.

- O contrato social representa uma vinculação das liberdades, onde os indivíduos afirmam suas
liberdades e buscam gerir interesses comuns. O contratualismo, assim, torna-se o fator
político-jurídico determinante do pensamento moderno iluminista.

A autonomia humana, ao recusar qualquer ordem externa como referência orientadora,


fundamenta o contrato social.

Nasce a ideia de que o Direito tem origem no contrato social, sendo apenas aquilo que este
determina. O Direito é o estatuto de coordenação das liberdades individuais, com regras de
convivência que são leis gerais, abstratas e formais, produto do acordo constitutivo da
sociedade.

Leis Moderno-Iluministas e Ideologias:

As leis moderno-iluministas tinham características gerais (aplicáveis a todos), abstratas


(deduzidas da abstração) e formais (definindo condições do jogo).

Essa abordagem foi potencializada por duas ideologias: o liberalismo e a democracia.

-O liberalismo valoriza a liberdade sobre a igualdade, destacando as garantias individuais,


enquanto a democracia enfatiza a igualdade e a vontade da maioria.

Durante o século XIX, o Estado enfrentou tensões entre liberdade e igualdade, resolvidas por
uma transação que destaca os direitos fundamentais no liberalismo e a participação de todos
na formação da vontade geral na democracia. Os ingleses foram campeões do pensamento
liberal, enfatizando a praticidade, enquanto os franceses, defensores da democracia, estavam
comprometidos com o racionalismo moderno-iluminista.

Estado Representativo Demoliberal e a Revolução Francesa:

As ideologias liberais e democráticas deram origem ao Estado representativo demoliberal,


enfatizando a definição da vivência social por leis como meio de realizar liberdade e igualdade
como valores formais. A Revolução Francesa foi crucial para transformar esse pensamento em
realidade, estabelecendo o Estado de legalidade formal.

O positivismo jurídico passou a ver o jurista como alguém que não colabora na constituição,
mas apenas conhece o Direito. Para o pensamento positivista, o Direito era dado nas leis,
criadas antes para serem aplicadas depois, assim, separou-se o momento da criação do
momento da aplicação do Direito, com o poder legislativo monopolizando a criação e o jurista
competindo na aplicação.

Escola Histórica:

Surgiu na Alemanha como resposta ao legalismo francês, desempenhando um papel


significativo na ascensão do positivismo jurídico, contrapôs-se à racionalidade abstrata
francesa, argumentando que o Direito não era fruto de uma vontade racionalizada de forma
abstrata, mas uma expressão do espírito do povo, moldando-se ao longo dos séculos.

Savigny, um proeminente representante da Escola Histórica, via a sociedade e o Direito como


manifestações de uma cultura enraizada no espírito do povo. Para essa escola, o Direito era
produto da história cultural de cada povo, não sendo arbitrariamente derivado de uma
racionalidade universal. O Direito devia ser procurado nas instituições culturais de cada
sociedade, com juristas identificando os valores jurídicos específicos de cada povo.

A Escola Histórica considerava o Direito como algo pressuposto, não pelo poder, o que
contribuiu para sua ligação com a ascensão do positivismo. Para essa escola, o Direito era
pressuposto porque se manifestava na história de cada povo como uma sedimentação cultural
específica.

A Escola Histórica alemã, simultânea à Escola Exegética francesa, apresentou abordagens


metodológicas paralelas ao problema da interpretação da lei, partindo de diferentes
pressupostos. Enquanto o Jusnaturalismo considerava o Direito uma filosofia prática aplicada, a
Escola Histórica via o Direito como uma realidade objetiva oferecida pela história, expressando
as tradições do povo.

A Escola Histórica destacava o caráter histórico e racional do Direito, associando-o às tradições


culturais do passado, apesar de seu objetivo inicial de criar uma ciência histórica do Direito, a
Escola Histórica acabou focando principalmente nos textos do Direito Romano e na legislação
do Direito comum, baseada no Direito Romano.

Para a Escola, o sistema jurídico era dogmaticamente estrutural e não teleologicamente


prático. Savigny, ao querer converter o histórico em dogmática coerente, abstraiu-se da
contingência histórica, considerando a verdade na estrutura e não na variação empírica.

A ciência do Direito, segundo a Escola Histórica, envolvia três dimensões: histórica, estrutural e
prático-normativa. Savigny enfatizou a dimensão prática do direito, aplicando imediata de
acordo com as necessidades do tempo. Quanto às fontes do Direito, a Escola considerava o
espírito do povo como a fonte primária, com legislação, costume e ciência do Direito sendo
fontes secundárias.

A nobre tarefa do legislador, segundo a Escola Histórica, era interpretar o espírito do povo.
Recapitulando, para esta escola, o Direito era um pressuposto objetivo a ser pesquisado na
história cultural, caracterizando-se por uma ciência que resultava em um sistema
dogmaticamente estruturado e se concretizava na aplicação racional desse Direito pressuposto.
Positivismo Epistemológico na Emergência do Positivismo Jurídico:

O Positivismo Jurídico é resultado do contemporâneo Positivismo Epistemológico,


impulsionado pelo cientismo que queria reduzir todo conhecimento válido ao conhecimento
científico. O cientismo, ligado ao positivismo, visava a supremacia do conhecimento científico,
entendendo a ciência como o domínio experimental de um objeto. Esse enfoque levou
naturalmente à redução do pensamento jurídico a uma ciência empírico-analista.

O Positivismo Jurídico adotou um dualismo metodológico claro: enquanto a tarefa prática de


criação do Direito era atribuída ao poder legislativo, o pensamento jurídico oferecia uma teoria
da interpretação e aplicação das leis preestabelecidas. A função prática de criação do Direito
ficava nas mãos do poder legislativo, e os juristas tinham a responsabilidade de conhecer,
interpretar e aplicar o Direito objetivado nas leis, seguindo os princípios fornecidos pela ciência
jurídica.

Em resumo:

O Positivismo Jurídico reduziu o Direito a uma pré-escrita regulamentação abstrata e


sistemática dos comportamentos, antecipadamente elaborada e logicamente aplicada
posteriormente. A identificação do Direito com a Lei, característica do Positivismo legalista,
resultou da interação de diversos fatores destacados.

I- Positivismo na Coordenada Político-institucional:

O positivismo jurídico teve origem na compreensão do contratualismo individualista e no


surgimento do Estado representativo demoliberal, fundamentado nas revoluções inglesas,
estadunidense e francesa, originou o Estado de Direito de legalidade formal, procurando uma
dimensão jurídica para o problema político-social resultante do encontro das liberdades.

O Estado de Direito de legalidade formal representou uma tentativa histórico-cultural de


solucionar juridicamente o problema do poder, visando dominar juridicamente o poder,
estruturado por três princípios: separação dos poderes, legalidade e independência judiciária.

• Estado de Direito de legalidade formal: este Estado de Direito significa que a ação do
governo e dos seus agentes deve estar estritamente em conformidade com a lei.
a) Princípio da Separação de Poderes:

Associado a Montesquieu e Locke, visa garantir a defesa da liberdade por meio da moderação
do poder.

-Montesquieu propôs a repartição dos poderes legislativo, executivo e judicial, representando


diferentes estratos sociais.

O poder legislativo, considerado supremo, representava aristocracia e povo, enquanto o


executivo representava o rei.

O poder judicial, apesar de não representar ninguém, aplicava as ordens dos outros poderes.
Inicialmente concebida para evitar o despotismo, a separação de poderes evoluiu, com o
legislativo tornando-se supremo devido à ênfase democrática.

A assembleia legislativa passou a definir o quadro de atuação do executivo e do judicial,


subordinando-os apesar da separação formal dos poderes.
b) Princípio da Legalidade:

Afirma que a lei é a base fundamental de todas as relações na sociedade.

Os poderes executivo e judicial devem agir em conformidade com o que é prescrito pela lei. A
lei, neste contexto, representa a expressão geral da vontade da maioria na sociedade.

c) Princípio da Independência Judicial:

Os tribunais são independentes e devem obedecer apenas à lei.

Procuram garantir que os juízes não recebam ordens externas ao decidir casos concretos. A
neutralidade, formalidade e imutabilidade das sentenças são almejadas pela estrita aplicação
lógico-dedutiva de uma legalidade geral e abstrata, assegurando a igualdade.

II- Coordenada Especificamente Jurídica:

O Direito é equiparado à lei, constituindo uma inovação na época.

A validade da ação concreta baseia-se na racionalidade formal, não no seu conteúdo. A


validade do Direito não possui fundamentação material, mas sim racionalidade formal. A
validade das leis está vinculada à sua natureza de serem gerais, abstratas, formais e imutáveis.

III- Coordenada Axiológica do Positivismo Jurídico:

A racionalidade universal e abstrata desta perspetiva garante a igualdade perante a lei e a


certeza jurídica procurada pelo positivismo.

A axiologia positivista é estritamente formal, sendo indiferente ao conteúdo das leis.

A igualdade é assegurada se as leis forem gerais, abstratas e formais, enquanto a segurança é


garantida se forem objetivamente pré-enunciadas.

O positivismo é caracterizado como um pensamento formal, inclusive nos valores que


promove.

IV- Coordenada Funcional do Positivismo Jurídico:

No contexto do positivismo, há uma distinção clara entre a esfera política e a jurídica.

Antes do positivismo, não havia separação entre a intenção do pensamento jurídico e o


Direito, após o positivismo, a função constitutiva do Direito pertence exclusivamente ao poder
legislativo, dissociando-se do pensamento jurídico na determinação do conteúdo.

O positivismo introduz a separação entre o momento político da criação e o momento jurídico


da aplicação do Direito.

O papel do jurista torna-se teórico e axiomaticamente aplicativo, preocupando-se apenas em


conhecer o Direito-objeto, enquanto a validade e justiça são questões do poder legislativo.

Em resumo:

O positivismo distingue claramente a criação do direito da sua aplicação, e a interpretação do


jurista concentra-se na apreensão semântica da norma para a sua posterior aplicação.

V- Coordenada Epistemológico-Metódica do Positivismo Jurídico:


Epistemologicamente, a ciência do Direito no positivismo era uma construção conceitual
baseada nos elementos do sistema jurídico normativo.

Metodologicamente, o Direito era reduzido à legalidade pré-escrita, aplicada formalmente por


meio da única racionalidade reconhecida: a lógico-dedutiva.

O pensamento jurídico positivista representava essencialmente um método para orientar o


conhecimento exegético da lei. A atividade do jurista consistia em conhecer e interpretar a lei,
sendo necessária a aplicação das regras da hermenêutica filológica tradicional.

O Direito, nesse contexto, era considerado uma expressão pré-escrita que o jurista deveria
conhecer e interpretar de acordo com as regras da exegese gramatical. A interpretação
procurava extrair apenas o sentido semanticamente comunicado pelo texto normativo.

Em resumo:

O positivismo jurídico estruturava-se pela identificação do Direito verdadeiro ao Direito


positivo, pela exclusão de manifestações não positivas do conceito de Direito, e pela redução
da racionalidade no tratamento científico do Direito Positivo a uma lógica da validação.

04-12-23
Positivismo: o positivismo (mais especificamente jurídico) é uma abordagem que considera o
Direito como um fenómeno social, desvinculando de considerações morais ou éticas.

“O positivismo apareceu-nos, justificadamente, como o imediato referente histórico para uma


lograda (re-)compreensão do sentido específico do Direito, hoje.” – afirmação retirada do livro
“Lições de Introdução ao Direito” de Fernando Bronze.

O positivismo tinha como fundo o intelectualismo científico, que referia as realidades culturais
a um paradigma: o das ciências da natureza, ou ciências experimentais, ou ainda ciências
empirico-analiticas.

• Intelectualismo científico: o intelectualismo científico, enfatiza a análise objetiva e


científica do Direito, desconsiderando juízos de valor pessoais ou morais.

Segundo esta perspetiva, o trabalho do jurista consiste em identificar e descrever as normas


jurídicas existentes, sem fazer avaliações subjetivas sobre a sua validade moral.

Ius:

O ius não é um fenómeno isolado, ou seja, reflete-se sempre sobre o contexto histórico-
cultural e político-social em que se manifesta.

Problemas práticos e problemas técnicos:

• Problemas práticos: estes problemas práticos referem-se a desafios concretos


enfrentados na aplicação e administração do Direito.

EX: Eficácia das leis, eficiência do sistema judicial, interpretação consistente das normas legais
e á resolução prática de casos específicos.

• Problemas técnicos: estes problemas técnicos referem-se a desafios práticos


relacionados á aplicação e interpretação das normas legais.
Estes problemas não envolvem considerações morais ou éticas, mas sim questões
operacionais, tais como: a clareza na redação das leis, a consistência na sua aplicação pelos
tribunais e a eficácia na resolução de disputas legais.

“A técnica consiste na mobilização-aplicação de um determinado conhecimento para se


alcançarem certos fins… - pelo que se pode dizer que toda a técnica é… hipotética” – afirmação
retida do livro “Lições de Introdução ao Direito” de Fernando Bronze.

“É que os problemas práticos são diferentes dos problemas técnicos: se este tem a ver com o
saber fazer, aqueles preocupam-se com o reto agir, pelo que enquanto os primeiros implicam
uma relação meio fim, visando a eficiência, os segundos pressupõem uma validade, que se
projeta numa relação de fundamento a consequência.” – afirmação retirada do livro “Lições
de Introdução ao Direito” de Fernando Bronze.

Superação do Positivismo:

A superação do positivismo envolve dois aspetos fundamentais: uma transformação completa


no contexto histórico-cultural e político-social em que o positivismo surgiu e se desenvolveu, e
uma profunda modificação que recentemente abalou o horizonte jurídico específico
pressuposto por ele

1. Fatores Histórico-Culturais e Político-Sociais na Superação do Positivismo:

- O positivismo sucedeu ao jusracionalismo moderno-iluminista, que concebia o Direito como


derivado de uma natureza hipotética.

• Jusracionalismo moderno-iluminista: o jusracionalismo moderno-iluminista refere-se a


uma abordagem do Direito influenciada pelo pensamento racionalista da Era moderna
e pelas ideias iluministas.

O positivismo transformou essa visão, considerando o Direito como contingente político-social,


rompendo com a ideia de um Direito absoluto e histórico. A superação do positivismo leva-nos
a analisar os atuais contornos do Direito e do pensamento jurídico em relação a essa mudança
de perspetiva.

a) Fatores Histórico-Culturais na Superação do Positivismo:

O Direito reflete o contexto histórico-cultural e político-social, sendo influenciado por


diferentes aspetos interconectados. O positivismo tinha raízes no intelectualismo científico do
século XIX, que valorizava as ciências experimentais. A sociedade liberal desse período focava
na definição do estatuto das ações individuais para garantir igualdade e certeza. As leis
moderno-iluministas procuravam estruturar essas ações individuais, destacando a importância
dos interesses individuais na dinâmica social.

No final do século XIX, o cientismo enfrentou uma crise, reconhecendo-se que a ciência não
resolvia todos os problemas humanos, especialmente os existenciais e práticos. Os problemas
práticos, ligados ao agir ético, escapavam à abordagem das ciências empírico-analíticas, que
eram eficazes para questões técnicas. Surgiu um novo panorama epistemológico com a
valorização de ciências históricas, culturais e hermenêuticas, refletindo a complexidade da
realidade humana. O homem deixou de ser meramente um objeto de análise para ser
considerado como uma pessoa concreta inserida na história. Além da racionalidade lógico-
abstrata, outras dimensões mais alinhadas com a prática foram reconhecidas.
O discurso epistemológico do positivismo era limitado às ciências naturais, operando com um
empirismo-naturalista e uma lógica analítica e empiricamente verificável. Contudo, essa
abordagem excluía o significativo no âmbito humano. Surgiram as ciências do espírito e da
cultura como uma oposição às ciências físico-naturais, ampliando o escopo da investigação.

A recuperação do significado da prática foi crucial para superar o positivismo. Enquanto o


cientismo positivista reduziu a prática a uma técnica operatória, o pensamento subsequente
restabeleceu seu significado original: a prática como comunicação na história, um diálogo de
ações com troca de sentidos culturalmente densificados.

A reabilitação da prática reposicionou a reflexão no âmbito histórico-concreto, convocando


fundamentos significantes. A Filosofia do Direito deu lugar à teoria geral do Direito.

O pensamento jurídico contemporâneo é profundamente influenciado pelo "logos prático",


priorizando problemas juridicamente relevantes que envolvem as relações humanas.

b) fatores políticos-sociais

O individualismo liberal do contratualismo moderno-Iluminista, ao considerar os homens


abstratamente livres e iguais, adotou uma conceção formal da legalidade, ignorando
compromissos sociais.

A igualdade formal proposta escondeu desigualdades materiais e injustiças na realidade


concreta da vida humana.

Conscientização da dimensão social dos problemas humanos levou à necessidade de


intervenção concreta, indo além das regras abstratas do jogo delineadas pelo liberalismo
contratualista.

Surgimento do Estado Social ou Estado Providência como resposta a essas necessidades, para
resolver carências e problemas humanos. No entanto, a crise atual desse modelo decorre de
seus defeitos perversos, como a diminuição da responsabilidade individual e a potencial
opressão política e despersonalização ética.

O Estado Providência, ao tentar satisfazer todas as necessidades e resolver todos os problemas,


pode conduzir à dependência excessiva das pessoas no sistema social. Isso resulta em uma
lógica em que as demandas incessantes colocam uma carga insustentável sobre o Estado e
sobre os indivíduos, levando à frustração e à busca constante por mais. A confiança excessiva
no Estado pode, portanto, contribuir para a lógica do Estado Providência, que, talvez, derive de
uma compreensão da política como a projeção da frustração individual sobre o coletivo.

2. Fatores Jurídico

Questionamento do juridicismo formal do positivismo, que considerava o conteúdo do direito


como exclusivamente político, definindo o direito apenas por sua formalidade. A experiência
revelou que o Direito não poderia ignorar as soluções concretas dadas aos problemas
juridicamente relevantes, levando à substituição do juridicismo formal por uma preocupação
jurídica material.

Surge a ideia de uma autêntica juridicidade materialmente densificada, rompendo com a visão
positivista de que o Direito era separado de seu conteúdo.
Exemplos dessa mudança incluem artigos específicos do Código Civil, como os artigos 473°,
405° e 406°. Esses artigos refletem a evolução em direção a uma compreensão mais substancial
e material do Direito.

Superando a visão positivista, o princípio da igualdade não é mais compreendido como


proposto pelo positivismo, que o associava à mera aplicação abstrata da lei.

Atualmente, a igualdade não se limita à igualdade perante a lei de forma abstrata. O Direito-
Lei, que é geral e abstrato para os casos previstos, é criticado por duas razões: os casos podem
ser abstratamente iguais, mas concretamente diferentes, e a lei prescreve um critério para
casos selecionados por ela mesma.

Síntese:

Juridicidade para Além da Lei:

- O Direito não se resume à lei; existe uma juridicidade trans-legal baseada em princípios
normativos e jurídicos que fundamentam e devem ser respeitados pela legalidade.

- Diferentemente do positivismo, não é possível pré-escrever abstratamente o Direito, pois os


problemas concretos ultrapassam as possibilidades lógicas do sistema pressuposto.

Amplitude da Normatividade:

- O campo da normatividade jurídica vai além da legalidade positiva; lacunas são evidentes.

- Contra o positivismo, não apenas o legislador constitui o Direito; os julgadores também


desempenham esse papel.

Dupla Transcendência da Norma Legal:

- A norma legal serve como critério orientador, mas é transcendida pelos princípios
fundamentais que a embasam.

- É também transcendida pelo caso concreto, no qual é adaptada, concretizada ou corrigida.

Distinção Fundamental:

- Reitera que Direito e Lei não são sinônimos, destacando a complexidade da relação entre
normatividade jurídica e realidade jurídica.

- O princípio da igualdade hoje tem um caráter material e concreto perante a legislação


vigente. Não é suficiente garantir a igualdade perante a lei; é necessário impor à própria lei a
exigência material da igualdade.

- A igualdade material exige que a lei seja apenas um meio para alcançar a igualdade, não
sendo seu critério definitivo. Surge uma distinção entre uma igualdade prático-normativa
perante o Direito e uma igualdade teorético-lógica pré-escrita perante a lei.

Resumo:

- A lei não engloba todo o Direito; o Direito é resultante de sua realização concreta.

- A Lei é um critério mobilizável durante a aplicação concreta do Direito.


- O Direito é uma questão em evolução, não algo preestabelecido.

- A superação do positivismo ocorreu não apenas no nível normativo, mas também no


institucional, reconhecendo que os tribunais não são meros aplicadores da lei, mas também
demiurgos da normatividade vigente.

- A superação implica a transição de um Estado de legislação para um Estado de jurisdição,


onde os tribunais desempenham um papel crucial na avaliação da validade das leis.

- O Direito atual demanda uma legitimidade além da prescrita pelo poder legislativo, sendo os
tribunais os responsáveis por mobilizar esse referente de legitimação.

- A metodologia jurídica não é mais apenas uma exegese aplicadora; agora, é também uma
tarefa normativamente constitutiva, requerendo que o decidente reflita sobre o sentido do
Direito para realizar sua aplicação concreta.

- Em conclusão, o Direito contemporâneo superou o positivismo, não sendo mais restrito ao


que é pré-escrito e incorporando a participação ativa de mediadores na constituição do Direito.
Um Estado de Justiça pode, em certas situações, criticar a legalidade em nome do Direito, sem
comprometer as qualidades do Estado de Direito.

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